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21.07.2015 Views

62por isso, rebelde – e sua apropriação pela literatura romântica mais expressiva. Em José deAlencar o índio entra em comunhão com o colonizador. Peri é escravo de Ceci, a quemvenera, e vassalo fiel de D. Antônio. No desfecho do romance o indígena é batizado pelofidalgo, evitando sua morte. O índio, convertido muda igualmente de nome, adotando o nomedo senhor colonial que o batiza. Os aimorés aparecem sempre associados às palavras:carniceiros, satânicos, horrendos e ferozes [...] (BOSI, 2005, p. 178). A história de Iracema ésimilar – a entrega ao branco é incondicional. Segundo Bosi, Iracema e O guarani fundaram oromance nacional, e expressam pontos de vista que disseminaram-se na cultura brasileira.Mas o mesmo autor diferencia os vários conceitos possíveis de cultura brasileira,denominando-os “culturas brasileiras”: uma cultura criadora, que envolve escritores, artistasetc, configurando uma cultura erudita; uma cultura de massas, que envolve a cultura popular eindústria cultural; a cultura universitária; e a criação cultural individualizada – demonstrandoque convivem vários níveis da cultura, cuja apropriação pode ser feita em muitos tipos desegmentação, ou no geral, como algo em construção. Relembra a frase de De Gaulle (“oBrasil não é um país sério”) em um tom algo otimista, afirmando que a interação primeiromundistaapagaria da nossa memória essa associação com o atraso. Mas, perguntando-seporque é tão difícil para um país capitalista assumir o exercício da modernidade e daracionalidade weberiana, coloca a questão em termos culturais e reflete sobre o papelconjunto a ser desempenhado, além da performance econômica, pela mídia e pelaUniversidade – entidades criadoras e veiculadoras de parte da cultura nacional – quando o“coração da inteligência” voltar-se para um ideário humanista , longe da “mediocridade e dovazio do social liberalismo” (BOSI, 2005, p. 373).A mesma preocupação é compartilhada por Santos (2006), que denomina “ainterrogação nacional” a investigação de por que, em um país tão desigual como o Brasil, nãoconstituem-se movimentos populares capazes de promover reformas significativas na vidanacional. A manutenção desses desequilíbrios sociais e econômicos é visualizada através doque chamou de “inércia social”. O aparente conformismo nacional, assim, pode ser analisadopor diversos prismas, mas a ciência política não pode compreendê-lo sem uma visão histórica(que o mesmo autor empreendeu em inúmeras obras) e, por sua vez, a história não podeprescindir da perspectiva da formação cultural do povo brasileiro e sua identidade, chave paraa compreensão da noção de cidadania (ou não-cidadania) que foi construída no país.Ribeiro (1995), em sua “antropologia da civilização” tentou responder à indagaçãosobre o fracasso do Brasil em alcançar o pleno desenvolvimento, investigando as relações domundo ibérico com a cultura negra e a cultura indígena, em uma perspectiva simultaneamente

63histórica e antropológica. As matrizes étnicas do povo brasileiro são estudadas em Ribeiro(1995) para assinalar várias características incorporadas à cultura do país: o “cunhadismo”, deorigem indígena, que consistia em incorporar estranhos à comunidade através de laços deparentesco; e a “desindianização” isto é, contrariamente à maioria dos países vizinhos, osindígenas foram reduzidos a uma participação minoritária na população, com exceção daregião amazônica, inclusive pela não assimilação em casamentos inter-étnicos. Da matriznegra, Ribeiro (1995) assinala que a diversidade das procedências não conferia ao contingenteescravo uma unidade cultural, nem lingüística, nem religiosa – obrigando-os a mesclar suacultura com a cultura que aqui encontravam, incorporando-se passivamente ao universocultural da nova sociedade que se criava – não havia núcleos solidários que retivessem opatrimônio cultural original. Isso os diferenciava dos grupos indígenas que, tentandoconservar desesperadamente suas tradições, minguavam até o desaparecimento. Segundo oautor “índios e brasileiros se opõe como alternos étnicos em um conflito irredutível, quejamais dá lugar a uma fusão” (RIBEIRO, 1995, p. 113). E, refletindo sobre o horror daescravidão, observa que a marca do escravismo em nossa cultura nos coloca a “a mais terrívelde nossas heranças”, a de “levar sempre conosco a cicatriz de torturador impressa na alma epronta a explodir na brutalidade racista e classista”, como na “autoridade brasileirapredisposta a torturar, seviciar e machucar os pobres que lhes caem às mãos”. “Todos nós,brasileiros, somos carne da carne daqueles pretos e índios supliciados. Todos nós brasileirossomos, por igual, a mão possessa que os supliciou” (RIBEIRO, 1995, p. 120).Nos processos sócio-culturais Ribeiro (1995) observa ainda que, contrariamente àimagem de povo cordial, ao longo da história inúmeros conflitos marcaram a vida cotidianado povo brasileiro – e observa que esses conflitos freqüentemente escondiam um componenteracial, mesclado às querelas geográficas ou religiosas. Ao longo dessa longa história, novosbrasileiros oriundos da imigração foram surgindo – mantendo mais (japoneses) ou menos(italianos ou árabes – estes últimos, segundo o autor, de assimilação mais completa) suasculturas originais – mas “nunca houve aqui um conceito de povo, englobando todos ostrabalhadores e atribuindo-lhes direitos” (RIBEIRO, 1995, p. 441). Os imigrantes, lembraRibeiro (1995), freqüentemente passam a comportar-se com desprezo e incompreensão paracom os brasileiros, esquecendo os problemas dos lugares de onde vieram que os tornaramexcedentes.O autor lembra que, segundo Sérgio Buarque de Holanda, seriam características dacultura brasileira, herdadas dos povos ibéricos, a sobranceria, o desleixo, a plasticidade, oapreço à lealdade e um gosto maior pelo ócio que pelo trabalho – desdizendo a idéia de que

62por isso, rebelde – e sua apropriação pela literatura romântica mais expressiva. Em José deAlencar o índio entra em comunhão com o colonizador. Peri é escravo de Ceci, a quemvenera, e vassalo fiel de D. Antônio. No desfecho do romance o indíge<strong>na</strong> é batizado pelofi<strong>da</strong>lgo, evitando sua morte. O índio, convertido mu<strong>da</strong> igualmente de nome, adotando o nomedo senhor colonial que o batiza. Os aimorés aparecem sempre associados às palavras:carniceiros, satânicos, horrendos e ferozes [...] (BOSI, 2005, p. 178). A história de Iracema ésimilar – a entrega ao branco é incondicio<strong>na</strong>l. Segundo Bosi, Iracema e O guarani fun<strong>da</strong>ram oromance <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, e expressam pontos de vista que dissemi<strong>na</strong>ram-se <strong>na</strong> cultura brasileira.Mas o mesmo autor diferencia os vários conceitos possíveis de cultura brasileira,denomi<strong>na</strong>ndo-os “culturas brasileiras”: <strong>uma</strong> cultura criadora, que envolve escritores, artistasetc, configurando <strong>uma</strong> cultura erudita; <strong>uma</strong> cultura de massas, que envolve a cultura popular eindústria cultural; a cultura universitária; e a criação cultural individualiza<strong>da</strong> – demonstrandoque convivem vários níveis <strong>da</strong> cultura, cuja apropriação pode ser feita em muitos tipos desegmentação, ou no geral, como algo em construção. Relembra a frase de De Gaulle (“oBrasil não é um país sério”) em um tom algo otimista, afirmando que a interação primeiromundistaapagaria <strong>da</strong> nossa memória essa associação com o atraso. Mas, perguntando-seporque é tão difícil para um país capitalista assumir o exercício <strong>da</strong> moderni<strong>da</strong>de e <strong>da</strong>racio<strong>na</strong>li<strong>da</strong>de weberia<strong>na</strong>, coloca a questão em termos culturais e reflete <strong>sob</strong>re o papelconjunto a ser desempenhado, além <strong>da</strong> performance econômica, pela mídia e pelaUniversi<strong>da</strong>de – enti<strong>da</strong>des criadoras e veiculadoras de parte <strong>da</strong> cultura <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l – quando o“coração <strong>da</strong> inteligência” voltar-se para um ideário h<strong>uma</strong>nista , longe <strong>da</strong> “mediocri<strong>da</strong>de e dovazio do social liberalismo” (BOSI, 2005, p. 373).A mesma preocupação é compartilha<strong>da</strong> por Santos (2006), que denomi<strong>na</strong> “ainterrogação <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l” a investigação de por que, em um país tão desigual como o Brasil, nãoconstituem-se movimentos populares capazes de promover reformas significativas <strong>na</strong> vi<strong>da</strong><strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. A manutenção desses desequilíbrios sociais e econômicos é visualiza<strong>da</strong> através doque chamou de “inércia social”. O aparente conformismo <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, assim, pode ser a<strong>na</strong>lisadopor diversos prismas, mas a ciência política não pode compreendê-lo sem <strong>uma</strong> visão histórica(que o mesmo autor empreendeu em inúmeras obras) e, por sua vez, a história não podeprescindir <strong>da</strong> perspectiva <strong>da</strong> formação cultural do povo brasileiro e sua identi<strong>da</strong>de, chave paraa compreensão <strong>da</strong> noção de ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia (ou não-ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia) que foi construí<strong>da</strong> no país.Ribeiro (1995), em sua “antropologia <strong>da</strong> civilização” tentou responder à in<strong>da</strong>gação<strong>sob</strong>re o fracasso do Brasil em alcançar o pleno desenvolvimento, investigando as relações domundo ibérico com a cultura negra e a cultura indíge<strong>na</strong>, em <strong>uma</strong> perspectiva simultaneamente

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