Narrativas sobre o processo de modernizar-se - capes
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Ronaldo de Oliveira CorrêaTese de Doutorado PPGICH UFSC | outono 200888o poder de interferir na circulação, isto quer dizer, na comercialização, sem, contudo, fazê-lo noprocesso de trabalho diretamente” 137 .O dinheiro passou a ser acumulado como capital e a produção passou a ser deexcedentes, no lugar da produção para um consumo próprio, i.é., a oferta de podutos não estavamais vinculada a uma demanda. O capitalista passou a monopolizar a matéria-prima e as fontesde financiamento e o trabalhador, mesmo parcialmente dono de suas ferramentas de trabalho(meios de produção), trabalhava a domicílio para o dono do capital, subordinando suascondições de produção (os ritmos de trabalho, os horários, os modelos que lhe foram igualmentealienados). As pautas de consumo, ditadas pelos circuitos de circulação, determinaram novasnecessidades, estilos de vida e, conseqüentemente, produtos para satisfazê-las. Neste contextosócio-produtivo, as relações sociais entre os homens e mulheres e destes com os sistemas deobjetos – agora industriais, passaram a ser mediadas pelos circuitos de circulação e consumo 138 .O que evidenciam Marx e Engels, e que não está explícito - e não estou seguro queesteja implícito - na classificação maussiana, é que o processo histórico ocidental, e com ele ahistória das formas sociais de produção estão entrecortadas por contradições entre as forçasprodutivas e as formas de intercâmbio. Isso numa perspectiva que vê na produção o “momentodeterminante de todo o ciclo econômico” 139 . Esta caracterização do conflito, ou melhor, dacontradição como elemento constituinte do circuito produção-circulação-consumo, ajuda aentender as formas sociais de produção artesanais urbanas, distintas de uma produção motivadasomente pela tradição, e historicamente congeladas. Igualmente, localiza estas formas sociaisde produção e o sistema de objetos artesanais em meio aos fluxos contemporâneos demercadorias e manifestações culturais sobrepostas em um circuito globalizado, ou seja, épossível utilizar a lente/narrativa dos processos históricos do capitalismo e sua atualconfiguração – a globalização, para entender/contextualizar o fenômeno econômico artesanal.Localizar a economia simbólica do artesanato em uma arena de contradições não podepretender reduzi-la a um único elemento determinante das interações sociais na sociedadecontemporânea. Construir a questão (ou a arena) levando em consideração os outros elementos137 A citação original, a saber: “(...) la capacidad de trabajar por un tiempo estipulado a cambio de un salario quenunca es equivalente a los valores que crea con su trabajo; puede intervenir en la circulación, es decir, en lacomercialización, sen hacerlo en el proceso de trabajo directamente; (…)” . NOVELO, Victoria. In: BESTMAUGARD, Adolfo (1982) op. cit. p. 261.138 Conferir ILLADES, Carlos (2001) op. cit. e NOVELO, Victoria. In: BEST MAUGARD, Adolfo (1982) op. cit.139 A citação original é: “el momento determinante de todo el ciclo económico”, ILLADE, Carlos (2001) op. cit. p. 11
Ronaldo de Oliveira CorrêaTese de Doutorado PPGICH UFSC | outono 200889que participam desta relação de conflito entre forças produtivas e formas de intercâmbio,significa expor a “sobrevivência” 140 de múltiplas formas sociais de produção (entre elas aartesanal) simultâneas e, às vezes, subterrâneas à manufatura e à fábrica (ou à pós-fábrica).Expondo a continuidade de diversas formas de trocas material e simbólica (estratégias decirculação e consumo) também simultâneas à troca que tem por base a moeda.Penso estas “sobrevivências” como simultâneas e subterrâneas para expor que nadescrição dos processos históricos que narram as formas de produção-circulação-consumoocidental, muitas vezes estas formas subalternas, ou foram obscurecidas e localizadas nasperiferias – tanto geográficas quanto produtivas dos processos escolhidos como hegemônicos.Ou, ainda, foram narradas como momentos/estágios históricos/produtivos “superados” ou aserem superados em rumo da sociedade de progresso social e tecnológico. Lançando mão, paraisso, de estratégias de hierarquização de saberes, discursos e práticas que estabelecem elegitimam desigualdades simbólicas, políticas e históricas.Ao modo de uma alegoria desta localização e configuração de seu traçado, ou seja, suacosmografia, cito a representação da sociedade moderna e tecnológica que Frintz Lang 141projetou em princípios do Século XX, em seu filme Metrópolis. Acima, o idílico jardim onde todossão irmãos e irmãs infantilizados e privados de desejo, por baixo dos pés daqueles (as), ummundo maquíneo e alienador. Nesta cosmografia tecno-científica, o umbral foi representado porcavernas, onde a luz aos poucos esmorece e dá lugar às sombras ou, então, por imensos dutosde concreto, onde homens, mulheres e crianças, como peças de um monstro técnico eburocrático, nominado em meio à vertigem de seu movimento e uma alucinação de molok,sobre-vivem privados (alienados) até da possibilidade de ver o céu.O que quero dizer com isso é que nesta arena de disputas que construo ao longo destetexto, vejo necessário expor a continuidade (sobreposição) de formas econômicas, de produçãoe de sistemas de objetos “alternativos” ao intercâmbio contabilizável (em moeda) capitalista àprodução industrial massiva e aos objetos industriais. Estas formas e sistemas de objetos140 A utilização do termo “sobrevivências” tem por função, aqui, marcar que as formas de produção subalternas sãoassim classificadas por animadores dos discursos desenvolvimentista ou economicista, cujo fundamento teóricopode ser resumido a um tipo de evolucionismo social (e produtivo/tecnológico) etnocêntrico que, mascarado deprogresso, legitima as formas de estar e viver da sociedade e cultura ocidental, subordinando a esta as outrasformas possíveis de relações econômicas. Esta perspectiva vê nas formas sociais de produção que com-vivem comaquelas capitalistas “puras”, tal qual formas de produção ultrapassadas, como sobrevivências ancestrais, a-históricas e inferiores, que somente continuam a existir por uma idiossincrasia cultural. FERNANDES, Florestan(2003) op.cit.; PRICE, Sally (2000) op.cit. e outros.141 LANG, Frintz (1927) Metrópolis. Alemanha. Preto e Branco. 115 min.
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Ronaldo <strong>de</strong> Oliveira CorrêaTe<strong>se</strong> <strong>de</strong> Doutorado PPGICH UFSC | outono 200889que participam <strong>de</strong>sta relação <strong>de</strong> conflito entre forças produtivas e formas <strong>de</strong> intercâmbio,significa expor a “<strong>sobre</strong>vivência” 140 <strong>de</strong> múltiplas formas sociais <strong>de</strong> produção (entre elas aartesanal) simultâneas e, às vezes, subterrâneas à manufatura e à fábrica (ou à pós-fábrica).Expondo a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> diversas formas <strong>de</strong> trocas material e simbólica (estratégias <strong>de</strong>circulação e consumo) também simultâneas à troca que tem por ba<strong>se</strong> a moeda.Penso estas “<strong>sobre</strong>vivências” como simultâneas e subterrâneas para expor que na<strong>de</strong>scrição dos <strong>processo</strong>s históricos que narram as formas <strong>de</strong> produção-circulação-consumooci<strong>de</strong>ntal, muitas vezes estas formas subalternas, ou foram obscurecidas e localizadas nasperiferias – tanto geográficas quanto produtivas dos <strong>processo</strong>s escolhidos como hegemônicos.Ou, ainda, foram narradas como momentos/estágios históricos/produtivos “superados” ou a<strong>se</strong>rem superados em rumo da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> progresso social e tecnológico. Lançando mão, paraisso, <strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong> hierarquização <strong>de</strong> saberes, discursos e práticas que estabelecem elegitimam <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s simbólicas, políticas e históricas.Ao modo <strong>de</strong> uma alegoria <strong>de</strong>sta localização e configuração <strong>de</strong> <strong>se</strong>u traçado, ou <strong>se</strong>ja, suacosmografia, cito a repre<strong>se</strong>ntação da socieda<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna e tecnológica que Frintz Lang 141projetou em princípios do Século XX, em <strong>se</strong>u filme Metrópolis. Acima, o idílico jardim on<strong>de</strong> todossão irmãos e irmãs infantilizados e privados <strong>de</strong> <strong>de</strong><strong>se</strong>jo, por baixo dos pés daqueles (as), ummundo maquíneo e alienador. Nesta cosmografia tecno-científica, o umbral foi repre<strong>se</strong>ntado porcavernas, on<strong>de</strong> a luz aos poucos esmorece e dá lugar às sombras ou, então, por imensos dutos<strong>de</strong> concreto, on<strong>de</strong> homens, mulheres e crianças, como peças <strong>de</strong> um monstro técnico eburocrático, nominado em meio à vertigem <strong>de</strong> <strong>se</strong>u movimento e uma alucinação <strong>de</strong> molok,<strong>sobre</strong>-vivem privados (alienados) até da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ver o céu.O que quero dizer com isso é que nesta arena <strong>de</strong> disputas que construo ao longo <strong>de</strong>stetexto, vejo necessário expor a continuida<strong>de</strong> (<strong>sobre</strong>posição) <strong>de</strong> formas econômicas, <strong>de</strong> produçãoe <strong>de</strong> sistemas <strong>de</strong> objetos “alternativos” ao intercâmbio contabilizável (em moeda) capitalista àprodução industrial massiva e aos objetos industriais. Estas formas e sistemas <strong>de</strong> objetos140 A utilização do termo “<strong>sobre</strong>vivências” tem por função, aqui, marcar que as formas <strong>de</strong> produção subalternas sãoassim classificadas por animadores dos discursos <strong>de</strong><strong>se</strong>nvolvimentista ou economicista, cujo fundamento teóricopo<strong>de</strong> <strong>se</strong>r resumido a um tipo <strong>de</strong> evolucionismo social (e produtivo/tecnológico) etnocêntrico que, mascarado <strong>de</strong>progresso, legitima as formas <strong>de</strong> estar e viver da socieda<strong>de</strong> e cultura oci<strong>de</strong>ntal, subordinando a esta as outrasformas possíveis <strong>de</strong> relações econômicas. Esta perspectiva vê nas formas sociais <strong>de</strong> produção que com-vivem comaquelas capitalistas “puras”, tal qual formas <strong>de</strong> produção ultrapassadas, como <strong>sobre</strong>vivências ancestrais, a-históricas e inferiores, que somente continuam a existir por uma idiossincrasia cultural. FERNANDES, Florestan(2003) op.cit.; PRICE, Sally (2000) op.cit. e outros.141 LANG, Frintz (1927) Metrópolis. Alemanha. Preto e Branco. 115 min.