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Narrativas sobre o processo de modernizar-se - capes

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Ronaldo <strong>de</strong> Oliveira CorrêaTe<strong>se</strong> <strong>de</strong> Doutorado PPGICH UFSC | outono 2008142Ao modo <strong>de</strong> um duplo Dostoiéviskiano 193 , que <strong>se</strong> encontra consigo mesmo numa noite<strong>de</strong> outono, a ironia consiste em saber <strong>se</strong> este duplo é realmente o mesmo, <strong>se</strong> a boneca russa,que abrimos a partir da narrativa <strong>de</strong> Dona Maricota, é verda<strong>de</strong>iramente um análogo. Talvez aúltima fra<strong>se</strong> do trecho, possa expor a possíbilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que, similar ao duplo criado porDostoiéviski, o tempo análogo <strong>de</strong> Dona Maricota não <strong>se</strong>ja exatamente igual: (...) tem cento equarenta e poucos anos, ali on<strong>de</strong> tem a escola. A escola é o diacrítico da analogia farsante. É aescola instituída há pouco mais <strong>de</strong> quinze anos, que <strong>de</strong>smascara a intemporalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste trechoda narrativa. Ela reor<strong>de</strong>na o tempo (re)establecendo, mesmo que provisoriamente, umapercepção do pre<strong>se</strong>nte, do passado e do futuro na história (re)construída por Dona Maricota.Esta ponte, que <strong>se</strong> <strong>de</strong>sconstrói ao chegar ao outro lado, permite alcançar as questõesrelacionadas com a organização das práticas laborais, <strong>de</strong> forma a dar a dimensão das rotinas edas estratégias utilizadas para repassar os saberes <strong>sobre</strong> o barro. Ou <strong>se</strong>ja, através <strong>de</strong> uma,entre várias, (re)or<strong>de</strong>nação do espaço e do tempo, é possível reconstruir a cotidianida<strong>de</strong> daspráticas laborais, qual um movimento interno propiciado pelo convívio com os (as) mais velhos(as), pois (...) tinha os meus irmãos mais velhos, que trabalhavam, aí trabalhavam em altaprodução, naquela época eles faziam peça utilitária, ((<strong>de</strong> forma explicativa comenta)) que é apeça utilitaria: panela, alguidar, boião para coalhar leite (…). Expõe-<strong>se</strong>, assim, a matéria <strong>sobre</strong> aqual as formas tradicionalmente mo<strong>de</strong>rnas organizam a formação para o trabalho, na forma <strong>de</strong>uma pedagogia doméstica da moral, das técnicas e das estéticas.193 Para esta imagem retomo o <strong>se</strong>guinte fragmento: “O homem misterioso parou à porta da casa do <strong>se</strong>nhorGoliádkin, bateu e (o que noutra ocasião teria espantado o <strong>se</strong>nhor Goliádkin) Petruchka, como <strong>se</strong> não tives<strong>se</strong> idopara a cama e estives<strong>se</strong> à espera <strong>de</strong>le, abriu logo a porta e, com uma vela na mão, foi atrás do homem que entrara.Fora <strong>de</strong> si, irrompeu na sua própria casa o herói da nossa história; <strong>se</strong>m tirar o capote nem o chapéu, passou ocorredor e, como que atingido por um raio, parou à ombreira da porta do <strong>se</strong>u quarto. Todos os pres<strong>se</strong>ntimentos do<strong>se</strong>nhor Goliádkin <strong>se</strong> tinham concretizado plenamente. Tudo o que suspeitara e receara era agora realida<strong>de</strong>. Cortou<strong>se</strong>-lhea respiração, a cabeça começou a andar-lhe à roda. O <strong>de</strong>sconhecido estava <strong>se</strong>ntado diante <strong>de</strong>le, também <strong>de</strong>capote e chapéu, em cima da sua cama, com um ligeiro sorriso e franzindo um pouco os olhos, a acenar-lheamigavelmente com a cabeça. O <strong>se</strong>nhor Goliádkin quis gritar mas não con<strong>se</strong>guiu; quis protestar mas não teveforças. O cabelo pôs-<strong>se</strong>-lhe em pé, os joelhos dobraram-<strong>se</strong>-lhe <strong>de</strong> terror. De resto, tinha razões para tal. O <strong>se</strong>nhorGoliádkin reconheceu categoricamente o <strong>se</strong>u amigo nocturno. O <strong>se</strong>u amigo nocturno mais não era do que elepróprio – o próprio <strong>se</strong>nhor Goliádkin, outro <strong>se</strong>nhor Goliádkin, mas absolutamente igual a ele – numa palavra, o que<strong>se</strong> chamava um duplo <strong>de</strong>le, em todos os <strong>se</strong>ntidos”. Conferir DOSTOIÉVSKI, Fiódor. (2003) O Duplo. Lisboa:Editorial Pre<strong>se</strong>nça. p. 48.

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