<strong>de</strong> uma pessoa amada, ou à perda <strong>de</strong> abstrações que colocadas em seu lugar, tais comopátria, liberda<strong>de</strong>, um i<strong>de</strong>al etc”.Desta forma é natural que, diante da perda e/ou da separação <strong>de</strong> algo ou <strong>de</strong> alguém queamamos e admiramos em nossa vida, vivenciemos um processo penoso <strong>de</strong> sofrimento. EmSobre a Transitorieda<strong>de</strong> (1916 [1915], p.318), ele afirma que “o luto pela perda <strong>de</strong> algo queamamos ou admiramos se afigura tão natural ao leigo, que ele o consi<strong>de</strong>ra evi<strong>de</strong>nte por simesmo”. Devido ao sentimento imposto pela ausência do objeto amado, instala-se umsofrimento que, <strong>de</strong> tão comum e usual, o aceitamos com ou sem resignação. Sem a presençado objeto, o mundo se torna pobre e vazio, <strong>de</strong>sinteressante e penoso. Assim, é esperadonormalmente que um período <strong>de</strong> sofrimento e penosida<strong>de</strong> seja necessário para o sujeito“habituar-se” psiquicamente à ausência do objeto. Corriqueiramente costuma-se dizer “istopassa, é só dar tempo ao tempo”, “logo você se acostuma”. Assim é o luto, tão natural e usualque sua existência nem chega a ser questionada. No entanto, a naturalida<strong>de</strong> do luto nãosignifica que ele não seja sofrido, doloroso; trata-se <strong>de</strong> um estado muito penoso, em maior oumenor grau, diz Freud. Mas qual é o sentido do luto? Em que ele consiste?É através da teoria da libido que o luto será explicado: “quando o objeto não tiver umsignificado – reforçado por milhares <strong>de</strong> elos – que o torne tão fundamental para o Eu, suaeventual perda não será suficiente para causar nem luto, nem <strong>melancolia</strong>” (FREUD,1917[1915], p.115). Quando ama, uma pessoa estabelece uma relação <strong>de</strong>masiadosignificativa, havendo, segundo a psicanálise, um investimento psíquico em um objeto amado.Falamos aqui <strong>de</strong> um laço afetivo psíquico que liga sujeito e objeto através do investimento <strong>de</strong>uma energia pulsional: a libido. Cargas <strong>de</strong> energia libidinal são investidas nas representaçõespsíquicas do objeto afetivo. Costuma-se dizer que há uma ligação libidinal com o objeto, ouum enlace entre a libido e o objeto. Este objeto po<strong>de</strong> ser tanto uma pessoa querida quanto umi<strong>de</strong>al, projetos a realizar, uma meta a cumprir, uma crença significativa, até mesmo a casa oua cida<strong>de</strong> na qual residimos. O que acontece <strong>de</strong>pois que este enlace é realizado é que o objetose constitui em um objeto <strong>de</strong> gratificação libidinal, e passa a ter uma relevante importância navida psíquica do sujeito. Segundo Freud (1916, p.318), numa etapa ainda muito inicial do<strong>de</strong>senvolvimento, a libido está dirigida para o próprio ego. Depois, esta libido é <strong>de</strong>sviada doego para os objetos, que são levados para o ego, isto é, através do investimento <strong>de</strong>sta energiapulsional nas representações internas do objeto <strong>de</strong>ntro do aparelho psíquico.O problema que acontece após isto tem a ver com a percepção psíquica datransitorieda<strong>de</strong>, que é um aspecto inerente à vida: ao nascer, fazemos um luto pelo corpomaterno, ao <strong>de</strong>ixarmos <strong>de</strong> ser criança, fazemos um luto pela infância perdida – saímos da casa96
dos pais, mudamos <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>, separamo-nos <strong>de</strong> velhos amigos, per<strong>de</strong>mos os amores daadolescência, <strong>de</strong>scobrimos novas coisas, temos <strong>de</strong> abandonar nossas crenças e convicções;enfim, separação e perda são completamente inerentes à vida. Portanto, o luto se impõe comoum processo necessário no qual nos <strong>de</strong>frontamos com a transitorieda<strong>de</strong> da existência através<strong>de</strong> vivencias <strong>de</strong> perdas. O luto é, por assim dizer, o espaço paradigmático <strong>de</strong> elaboraçãopsíquica da perda. A frustração também po<strong>de</strong> ser pensada <strong>de</strong>ntro do registro das perdas eseparações. Ao nos <strong>de</strong>pararmos com um limite e nos frustrarmos, também se faz necessárioum luto pelo que se <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> conseguir ou realizar. Um luto pelo impedimento daquilo queera almejado, e para cuja satisfação a frustração pôs um limite.Perda, separação e frustração são tão certas na vida quanto a certeza <strong>de</strong> que um dia elachegará ao seu fim. Sobre este tema Freud escreveu um breve artigo intitulado “Sobre aTransitorieda<strong>de</strong>”, no qual narra um passeio em um belo campo com dois amigos. Estes,durante a caminhada, <strong>de</strong>svalorizam o valor da natureza e da vida por constatar suaefemerida<strong>de</strong>. O argumento <strong>de</strong>les era o seguinte: se um dia toda esta beleza está fadada a<strong>de</strong>teriorar-se, então qual seria seu valor? Por que admirá-la? Surge para Freud um enigma a<strong>de</strong>cifrar que será solucionado pela seguinte explicação: a constatação da transitorieda<strong>de</strong> dascoisas leva muitas pessoas a se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem inconscientemente da vivência do luto que estáimplícita na finitu<strong>de</strong> das relações. A percepção <strong>de</strong> que um dia aquela beleza se reduzirá ao póremete as pessoas à vivencia do luto inevitável. A lógica seria: “se um dia as flores morrerãoe os campos irão secar, toda esta beleza terá fim; quando isto acontecer enlutaremos pelaperda <strong>de</strong>stes belos campos”. Segundo Freud, a mente tem uma tendência a recuar frente aoque é penoso. Assim, a psique <strong>de</strong>svaloriza estes objetos – neste caso, os campos e sua beleza– como uma tentativa <strong>de</strong> se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r contra a dor que seria infringida pela vivência <strong>de</strong> umfuturo <strong>de</strong> perda e do <strong>de</strong>corrente luto. De fato, a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> investir nos objetos, mesmoquando constatamos a finitu<strong>de</strong> que se impõe a tudo que é vivo, é uma das maiores, maissofisticadas e difíceis conquistas do psiquismo. E preservar tal capacida<strong>de</strong> é um <strong>de</strong>safio quepermeia toda a existência <strong>de</strong> uma pessoa – sua falta estaria intimamente relacionada à<strong>melancolia</strong>.Mas avancemos em direção da explicação do processo no qual elaboramos estasvivências: o luto. Convém frisar que, no artigo Luto e <strong>melancolia</strong>, Freud se refere ao lutocomo reação à perda por morte <strong>de</strong> um ente querido. É sobre este fato específico que ele estápensando neste momento. A noção apresentada aqui, <strong>de</strong> que o luto é um processo que po<strong>de</strong>ser aplicado à compreensão dos mais diversos tipos <strong>de</strong> vivências <strong>de</strong> perdas e frustrações, éuma compreensão posterior.97
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PERES, U. T. Melancolia. São Paulo