Bleichmar (1983), em seu importante trabalho Depressão, um estudo psicanalítico,usa o termo “<strong>melancolia</strong>” para nomear as psicoses, e “<strong>de</strong>pressão” para nomear apsicopatologia em neuróticos. Entretanto, trata tanto uma quanto a outra como fenômenos<strong>de</strong>pressivos, pondo em <strong>de</strong>staque a questão da perda como a condição <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>stesestados. Para este autor, o que Freud esclareceu em Luto e <strong>melancolia</strong>, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente dadiscussão que envolve as especificida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada quadro, foi que, em todos os estados<strong>de</strong>pressivos, os indivíduos afetados sentem que algo se per<strong>de</strong>u; trata-se <strong>de</strong> um estado no qualum <strong>de</strong>sejo se apresenta como irrealizável. Este autor ainda leva em conta tanto os aspectosnarcísicos quanto os ambivalentes, propondo uma divisão dos estados <strong>de</strong>pressivos em“<strong>de</strong>pressão narcísica”, “<strong>de</strong>pressão culposa” e “perda simples” – esta última mais próxima doluto. Anos mais tar<strong>de</strong>, Bleichmar (1997) continua a sustentar sua visão sobre a <strong>de</strong>pressão, e<strong>de</strong>staca, como a essência dos transtornos <strong>de</strong>pressivos, os sentimentos <strong>de</strong> impotência e<strong>de</strong>sesperança para a realização <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sejo ao qual se está intensamente fixado.Marucco (1987) enten<strong>de</strong> a <strong>de</strong>pressão como muito próxima do quadro melancólico e sepergunta se a primeira não seria uma forma disfarçada da segunda. Os sentimentos <strong>de</strong>diminuição <strong>de</strong> auto-estima e a perda do sentimento <strong>de</strong> si, aspectos tão próprios da <strong>melancolia</strong>,são os componentes habituais das <strong>de</strong>pressões – o que ele consi<strong>de</strong>ra como modos <strong>de</strong> expressãohabitual das afecções narcisistas. Retomando a idéia <strong>freudiana</strong>, o autor afirma que o conflitocentral na <strong>de</strong>pressão e na <strong>melancolia</strong> é a tensão entre o i<strong>de</strong>al e o ego. De acordo com autor, otema da <strong>melancolia</strong> é importante, tendo em conta que esta forma <strong>de</strong> pa<strong>de</strong>cimento assola omundo atual. A <strong>de</strong>pressão, segundo este entendimento, seria o paradigma psicológico <strong>de</strong>nosso tempo, como uma implicação da <strong>de</strong>gradação dos laços amorosos como um <strong>de</strong> seussignificativos mal-estares. Esta <strong>de</strong>gradação dos vínculos amorosos po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>sembocar,segundo Marucco, em <strong>de</strong>pressões e <strong>melancolia</strong>s.Laplanche (1987, p.293), por sua vez, refere-se ao tema que abarca <strong>de</strong>ntro dapsicanálise as <strong>de</strong>pressões, <strong>melancolia</strong>s e afins, por “campo <strong>de</strong>pressivo” ou “campo das<strong>de</strong>pressões”. Sua posição é a <strong>de</strong> que a <strong>melancolia</strong> seria uma forma mais grave <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão, e<strong>de</strong> que no texto Luto e <strong>melancolia</strong> Freud volta-se para um tipo muito particular <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão,chamada <strong>de</strong> “<strong>de</strong>pressão melancólica”. O autor revela ainda que existe uma distinção vigentena psicanálise entre <strong>de</strong>pressão neurótica e <strong>melancolia</strong>, um tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão <strong>de</strong> culpabilida<strong>de</strong>,que é <strong>de</strong>signada por “psicose”. Laplanche lembra ainda que a <strong>melancolia</strong>, segundo a indicação<strong>de</strong> Freud em Neurose e Psicose, estaria na charneira entre a neurose e a psicose. Sua leitura da<strong>melancolia</strong> é bem fiel ao apresentado em Luto e <strong>melancolia</strong>.78
Em Sol Negro - Depressão e Melancolia, Kristeva (1989) distingue a <strong>melancolia</strong> da<strong>de</strong>pressão, apontando contudo para a intrincada problemática que as envolve:Chamaremos <strong>de</strong> <strong>melancolia</strong> a sintomatologia psiquiátrica <strong>de</strong> inibição e <strong>de</strong>assimbolia que, por momentos ou <strong>de</strong> forma crônica, se instala num indivíduo, emgeral se alternando com a fase, dita maníaca, da exaltação. Quando os doisfenômenos, do abatimento e da excitação, são <strong>de</strong> menor intensida<strong>de</strong> e freqüência,po<strong>de</strong>mos então falar <strong>de</strong> <strong>de</strong>pressão neurótica (KRISTEVA, 1989, p.16).De acordo com a autora, o termo “<strong>melancolia</strong>” estaria reservado, na psiquiatria, apenasà patologia que necessita <strong>de</strong> anti<strong>de</strong>pressivos, sendo consi<strong>de</strong>rada irreversível. Entretanto, elaafirma que a teoria <strong>freudiana</strong> aponta para um luto impossível do objeto materno, tanto na<strong>de</strong>pressão quanto na <strong>melancolia</strong>. E aceita a diferença clínica e nosológica entre os doisestados, ressaltando contudo que eles se apóiam na intolerância à perda do objeto e nafalência do significante, sendo então, em seu âmago, indistinguíveis. A autora propõe aindaque os termos “<strong>melancolia</strong>” e “<strong>de</strong>pressão” <strong>de</strong>signem um conjunto que se po<strong>de</strong> chamar <strong>de</strong>“melancólico-<strong>de</strong>pressivo”, nos quais os limites na realida<strong>de</strong> são imprecisos.Na mesma direção, Peres (1996, 2003) afirma que os termos “<strong>de</strong>pressão” e“<strong>melancolia</strong>” po<strong>de</strong>m aparecer como sinônimos, mas po<strong>de</strong>m também receber tratamentosdiferenciados: <strong>de</strong>pressão para as formas neuróticas da doença e <strong>melancolia</strong> para a formapsicótica. Entretanto, a autora privilegia o uso do termo “<strong>melancolia</strong>” quando fala a partir dapsicanálise, e “<strong>de</strong>pressão” para <strong>de</strong>signar sintomas.Roudinesco e Plon (1998), em seu Dicionário <strong>de</strong> psicanálise, apresentam o verbetesobre a <strong>de</strong>pressão <strong>de</strong>ntro do verbete “<strong>melancolia</strong>”. Afirmam os autores que a primeira é umaforma atenuada da segunda e <strong>de</strong>signa esta última como um “estado <strong>de</strong>pressivo”. Estariamestes autores sugerindo que ambos possuem a mesma etiologia? É difícil <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r, mas,segundo este ponto <strong>de</strong> vista, <strong>de</strong> que a <strong>de</strong>pressão é uma forma atenuada <strong>de</strong> <strong>melancolia</strong>, umaresposta afirmativa à questão talvez possa ser consi<strong>de</strong>rada.Delouya (2002) nomeia as patologias <strong>de</strong>pressivas em geral por quadros <strong>de</strong>pressivos eafirma sem hesitar que estes são freqüentemente associados às psicoses ou às patologiasfronteiriças. Quanto ao afeto e aos estados <strong>de</strong>pressivos, estes fazem parte da condição humanae figuram entre os quadros clínicos. Assim, a patologia se expressa em impotência vital doagir e do fazer, assim como do sonhar e do pensar. Seus principais sintomas clínicos são, emdiferentes graus, fadiga, astenia, tédio, tristeza, lassitu<strong>de</strong>, enclausuramento, inércia etc. Oautor enfatiza que a <strong>de</strong>pressão e a <strong>melancolia</strong> não po<strong>de</strong>m ser atreladas ou tomadas comoequivalentes. A segunda diz respeito a um fracasso no momento <strong>de</strong> constituição da79
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Capítulo 4A concepção freudiana
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PERES, U. T. Melancolia. São Paulo