isto para nós é claro e evi<strong>de</strong>nte. Freud repetiu em vários <strong>de</strong> seus trabalhos que a <strong>melancolia</strong>po<strong>de</strong> ser encontrada em formas clínicas diferentes e apontou a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> agrupá-las emuma única classe, chegando assim a se referir a ela como “as <strong>melancolia</strong>s”, no plural. Ora,assim como o texto <strong>de</strong> Laplanche (1987), citado no início <strong>de</strong>ste tópico, nos revelou, estadificulda<strong>de</strong> ainda persiste nos tempos atuais, sendo facilmente constatada por uma pesquisamais atenta. Procurando por uma <strong>de</strong>finição mais precisa, logo se impõe o fato <strong>de</strong> que <strong>de</strong>vemosrenunciar por buscas <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>s absolutas ou que fechem as questões.Solomon, escritor americano, sentiu na pele o drama <strong>de</strong>sta dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição aoser acometido <strong>de</strong> um estado <strong>de</strong>pressivo que o con<strong>de</strong>nou a um intenso sofrimento. Seu estado,que não era facilmente diagnosticável, recebeu uma série <strong>de</strong> <strong>de</strong>nominações distintas, o quelevou o autor a um sofrimento ainda maior. Estimulado por seu pa<strong>de</strong>cimento e pela variaçãodos termos e classificações que seu estado recebia, Solomon (2002, p.300), em seu Demôniodo meio-dia, realiza um completo e amplo estudo histórico da <strong>melancolia</strong> até os dias atuais econclui, em uma precisa colocação, que as doenças <strong>de</strong>pressivas são um <strong>de</strong>stino comum aoqual muitos caminhos conduzem, e que qualquer quadro clínico po<strong>de</strong> ser a expressão daassociação ou não <strong>de</strong> qualquer um <strong>de</strong>stes caminhos.Sobre a <strong>de</strong>nominação em Freud para as manifestações melancólicas e <strong>de</strong>pressivas,observamos variações <strong>de</strong> acordo com a época. Entretanto, parece-nos que ele muitas vezesutilizava o termo “<strong>de</strong>pressão” <strong>de</strong> maneira mais livre ao se referir a um estado mais brando <strong>de</strong>humor penoso <strong>de</strong>ntre os inúmeros quadros patológicos que estudava, inclusive a <strong>melancolia</strong>.Assim, o termo “<strong>de</strong>pressão” seria tomado para se referir a um afeto, estado ou sintoma. Estaconstatação vai ao encontro da afirmação <strong>de</strong> Delouya (2001, p.19; 2002, p.22) <strong>de</strong> que a<strong>de</strong>pressão, elevada à categoria <strong>de</strong> um quadro psicopatológico, nunca chegou a fincar seus pésno campo psicanalítico, e, principalmente na teoria <strong>freudiana</strong>, ela surge apenas como corolário<strong>de</strong> alguns estágios da constituição psíquica. Quanto ao termo “<strong>melancolia</strong>”, Freud quasesempre o utilizava para se referir a um estado <strong>de</strong>pressivo mais intenso, mais grave, no qual seacrescentavam diversos elementos. A palavra “<strong>melancolia</strong>” seria usada para <strong>de</strong>finir umquadro com predomínio <strong>de</strong> afetos <strong>de</strong>pressivos intensos. Frente a isto, obviamente afirmamoshaver uma diferença entre <strong>de</strong>pressão e <strong>melancolia</strong> na teoria <strong>freudiana</strong>; porém,predominantemente no que se refere à <strong>de</strong>scrição do quadro clínico. “Melancolia” é empregadapara fazer referência a uma psicopatologia específica bem <strong>de</strong>marcada, enquanto “<strong>de</strong>pressão” éusada para <strong>de</strong>screver estados, afetos e sintomas <strong>de</strong> natureza penosa envolvendo tristeza,<strong>de</strong>sgosto, preocupação e inibição geral.74
No entanto, não é bem nestes termos que Moreira (2002) compreen<strong>de</strong> a questão.Segundo esta autora – uma importante referência brasileira nos estudos sobre a <strong>melancolia</strong> –,Freud utilizava os termos “<strong>de</strong>pressão” e “<strong>melancolia</strong>” como sinônimos, mas mostrava umapreferência para o uso do segundo <strong>de</strong>les em seus trabalhos:Na psicanálise, a revisão da obra <strong>de</strong> Freud tem indicado que ele não supõediferença <strong>de</strong> natureza psíquica entre <strong>melancolia</strong> e <strong>de</strong>pressão, mas tão-somente umaescolha <strong>de</strong> termos, e ele ten<strong>de</strong> a nomear como <strong>melancolia</strong> os quadros a que <strong>de</strong>dicaestudos mais extensos, como o próprio Luto e <strong>melancolia</strong>, Uma neurose <strong>de</strong>moníacado século XVII e Dostoiewski e o parricídio. (MOREIRA, 2002, p.73).Não nos parece que em Freud encontramos os termos predominantes como sinônimos,mas sim que apenas em alguns momentos <strong>de</strong> seus escritos ele os utiliza como equivalentes. Ofato <strong>de</strong> não ter realizado um <strong>de</strong>senvolvimento teórico específico em que o termo “<strong>de</strong>pressão”toma a cena principal, nos permite dissolvê-lo na <strong>melancolia</strong>? Formulado <strong>de</strong> outra maneira: épossível ver como equivalentes estes termos por não encontrarmos um espaço teóricoespecífico para a <strong>de</strong>pressão no texto freudiano? A afirmação <strong>de</strong> que Freud não supõe naturezapsíquica para estes estados psíquicos é digna <strong>de</strong> investigação, e acreditamos que ela po<strong>de</strong>riaser formulada como se segue.Com Luto e <strong>melancolia</strong>, Freud inaugurou um campo <strong>de</strong> estudo e compreensão que,como Laplanche (1987, p.293) bem <strong>de</strong>nominou, se constituiu como campo das <strong>de</strong>pressões eque abarcou, ao menos em algum nível, todo tipo <strong>de</strong> patologias <strong>de</strong>pressivas. Embora não hajana teoria <strong>freudiana</strong> uma teoria explícita da <strong>de</strong>pressão, sua aproximação com a <strong>melancolia</strong>revela-nos algo em comum; parece que a <strong>de</strong>pressão, como estado afetivo, está contida na<strong>melancolia</strong>, <strong>de</strong>finida como uma entida<strong>de</strong> clínica específica, embora a segunda, como entida<strong>de</strong>clínica, não esteja contida na primeira. Isto quer dizer que, se a <strong>melancolia</strong> guarda algo da<strong>de</strong>pressão, <strong>de</strong>finida por Freud como um estado afetivo penoso, então a compreensão dapsicodinâmica melancólica – inaugurada magistralmente em Luto e <strong>melancolia</strong> – tambémrevela algo do estado <strong>de</strong>pressivo: assim, o estudo da <strong>melancolia</strong> também contribui para a<strong>de</strong>pressão. Freud, com sua teoria da <strong>melancolia</strong>, revelou-nos a existência dos elementosmelancólicos presentes no psiquismo. Compreen<strong>de</strong>r a teoria <strong>freudiana</strong> da <strong>melancolia</strong> talvezseja a<strong>de</strong>ntrar o reino <strong>de</strong>stes elementos melancólicos, que figuram na constituição dopsiquismo. Ao formular estas afirmações, resta saber se os “elementos melancólicos” po<strong>de</strong>mser tomados como equivalentes da expressão “elementos <strong>de</strong>pressivos”; afinal, é possível<strong>de</strong>marcar diferença <strong>de</strong> caráter psíquico nestes elementos?Este problema po<strong>de</strong> ser resolvido se recorrermos ao registro principal <strong>de</strong>stes estados –o registro da perda, entendida aqui em seu sentido mais amplo, como perda real ou i<strong>de</strong>al.75
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Capítulo 4A concepção freudiana
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PERES, U. T. Melancolia. São Paulo