mais prejudicial ele será. A fórmula seria expressa da seguinte maneira: quanto mais afastadada realida<strong>de</strong> a i<strong>de</strong>alização se torna, mais condicionante e absoluto será o vínculo e maior seráa <strong>de</strong>silusão ao seu fim. A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> energia para manter uma i<strong>de</strong>alização exagerada éelevada e difícil <strong>de</strong> ser mantida, exige muito do sujeito e do objeto; o i<strong>de</strong>alizado em exageronão se alcança nunca. Neste sentido, quanto maior a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> i<strong>de</strong>alização, menor aqualida<strong>de</strong> do vinculo com o objeto – teremos um vínculo totalitário, incondicional, único eexclusivo. Estamos falando <strong>de</strong> uma qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> i<strong>de</strong>alização: uma qualida<strong>de</strong> que po<strong>de</strong> serchamada <strong>de</strong> “narcísica”. O objeto i<strong>de</strong>alizado narcisicamente se torna precioso e, por isto,imperdível. Retomaremos este ponto mais adiante.As perdas <strong>de</strong> nossas i<strong>de</strong>alizações po<strong>de</strong>m ser vivenciadas em um luto – semprevivemos isto em nossa vida, ao i<strong>de</strong>alizarmos os objetos ou ao “erigirmos” i<strong>de</strong>ais. Porém, esteluto seria uma tristeza, um recolhimento, um período necessário para que ocorra um<strong>de</strong>sinvestimento e uma elaboração do mesmo, sem um <strong>de</strong>masiado abalo na auto-estima e semas características auto-acusações melancólicas. O que viria, portanto, ocasionar uma reaçãomelancólica ao invés <strong>de</strong> uma reação <strong>de</strong> luto seria o vínculo narcísico com o objeto ou o i<strong>de</strong>al.O que a caracteriza realmente a <strong>melancolia</strong> é o aspecto narcísico nela contida 19 .Freud (1923) aponta que, no processo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação narcísica, a libido, ao regredirpara o ego, passa por uma <strong>de</strong>sfusão entre a pulsão <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong> morte, possibilitando assimque os aspectos agressivos sejam apo<strong>de</strong>rados pelo superego. O conflito psíquico <strong>de</strong>ntro doindividuo é um conflito entre o ego e o superego que se apo<strong>de</strong>rou do sadismo. Neste pontoencontramos a ambivalência, tema que será tratado a seguir.3.2 Ambivalência e <strong>melancolia</strong>Em Luto e <strong>melancolia</strong> (1917[1915]), Freud enfatiza, além do narcisismo, outracaracterística presente na psicodinâmica da <strong>melancolia</strong>: a ambivalência afetiva presente narelação com o objeto. Neste trabalho, afirma que provavelmente existia uma acentuadaambivalência na relação do sujeito com o objeto perdido, e isto <strong>de</strong>vido a dois fatores. Seria ouuma característica constitutiva do próprio ego no modo <strong>de</strong> se relacionar com seus objetos, ou19 Freud aponta também para o aspecto ambivalente da vinculação com o objeto: o objeto perdido era amado eodiado e a perda torna-se uma situação em que o ódio vem à tona ou domina os sentimentos pelo objeto. Porém,o aspecto central é o narcísico, já que a ambivalência sem vínculo narcísico não acaba em <strong>melancolia</strong>. E eleinsiste em dois aspectos básicos do vinculo com o objeto: o aspecto narcísico e o aspecto ambivalente;.porém,sua ênfase é muito maior no aspecto narcísico. (LAPLANCHE, 1987)148
uma característica <strong>de</strong>senvolvida a partir <strong>de</strong> repetidas experiências que envolveram a ameaça<strong>de</strong> perda do objeto e que, como conseqüência, <strong>de</strong>spertou a vivência sistemática <strong>de</strong> sentimentos<strong>de</strong> ambivalência (FREUD, 1917[1915]).Nas situações <strong>de</strong> perda, a ambivalência afetiva fica reforçada, alimentando um gran<strong>de</strong>ódio contra o objeto, um ódio que será voltado, mais tar<strong>de</strong>, contra o próprio ego, on<strong>de</strong> oobjeto perdido se encontrará alojado. Convém ressaltar que muitas vezes este ódio não tinhaespaço na relação, que era mascarada por um i<strong>de</strong>al absoluto <strong>de</strong> intenso amor. O que seobserva é uma luta entre o ódio – tentando separar a libido do objeto perdido – e o amor – quetenta resistir a esta separação. O ódio não permite que o sujeito perceba o amor pelo objeto, esua conseqüente importância e valor, impedindo assim qualquer tipo <strong>de</strong> elaboração ouconsciência da causa do sofrimento. A questão que se põe neste caso é a seguinte: Por quesofrer por um objeto que não se ama, que não tem valor em minha vida? Entre outras coisas, éa impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reconhecer o objeto como amado, apesar <strong>de</strong> odiado, que não permite aelaboração do luto, dando origem a uma prisão melancólica.Uma consi<strong>de</strong>ração das mais pertinentes, contidas em Luto e <strong>melancolia</strong>, é a <strong>de</strong> que asituação <strong>de</strong> perda se constituí em um eficiente gatilho para que se disparem os sentimentos <strong>de</strong>ódio e <strong>de</strong> agressivida<strong>de</strong> reprimidos na relação com o objeto. Isto quer dizer que a situação <strong>de</strong>perda é uma ótima oportunida<strong>de</strong> para que a ambivalência, até então oculta, se manifeste.O conceito <strong>de</strong> ambivalência afetiva apareceu formulado pela primeira vez no artigo Adinâmica da transferência, em 1912. No entanto, a idéia <strong>de</strong> uma inter-relação entre amor eódio, ambos voltados para o mesmo objeto, já aparecia indiretamente em muitos escritos <strong>de</strong>Freud, como nos casos clínicos publicados em 1909, sobre o Pequeno Hans e o Homem dosratos (LAPLANCHE, 1998, p.17). Não será em poucos trabalhos que Freud <strong>de</strong>finirá aambivalência como a principal característica da neurose obsessiva – a neurose estudada nestesdois casos clínicos. Em Totem e tabu (1913 [1912-1913]) a ambivalência é <strong>de</strong>finida como aexistência simultânea <strong>de</strong> amor e ódio para como o mesmo objeto, estando presente em maiorou menor grau na disposição inata <strong>de</strong> cada indivíduo.No entanto, o conceito <strong>de</strong> ambivalência é elaborado e <strong>de</strong>senvolvido em termosmetapsicológicos no artigo Os instintos e suas vicissitu<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> 1915. Neste trabalho o conceitoem questão é formulado em relação à teoria dos instintos, sendo o conflito entre amor e ódioequiparado ao conflito entre os instintos sexuais e os instintos do ego. Com a elaboração daúltima dualida<strong>de</strong> pulsional – as pulsões <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong> morte – a ambivalência é diretamenteligada ao conflito entre estas duas pulsões, especialmente nos trabalhos Além do princípio doprazer, <strong>de</strong> 1920, O ego e id, <strong>de</strong> 1923, e O mal-estar na civilização, <strong>de</strong> 1930. Neste último149
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