esvaziado e incapaz. A marca <strong>de</strong>sta relação é, então, a <strong>de</strong>pendência sentida pelo sujeito emrelação ao objeto, uma <strong>de</strong>pendência narcísica que o torna i<strong>de</strong>alizado, vital na vida do sujeito,que se sente incapaz <strong>de</strong> sobreviver sem ele. O sujeito não po<strong>de</strong> contar com seu i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> egopara satisfazer-se, pois o objeto é colocado em seu lugar, tornando-o ainda mais vulnerável.No entanto, como po<strong>de</strong>mos avaliar nas situações clínicas, o sujeito geralmente não po<strong>de</strong>contar com a satisfação a partir <strong>de</strong> seus recursos internos, procurando por isso ligar-se aosobjetos visando suprir esta <strong>de</strong>ficiência. Então, o sujeito colocou o objeto no lugar <strong>de</strong> seu i<strong>de</strong>al<strong>de</strong> ego, já por sentir que não podia contar com seu próprio i<strong>de</strong>al.Freud oferece ainda uma distinção entre este estado <strong>de</strong> estar amando, ou <strong>de</strong> servidão, eo processo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação:No caso da i<strong>de</strong>ntificação, o objeto foi perdido e abandonado; assim ele é novamenteerigido <strong>de</strong>ntro do ego e este efetua uma alteração parcial em si próprio, segundo omo<strong>de</strong>lo do objeto perdido. No outro caso, o objeto é mantido e dá-se umahipercatexia <strong>de</strong>le pelo ego e às expensas do ego (FREUD, 1921, p.123-24).A i<strong>de</strong>ntificação seria o contrário do estar amando, um caso em que o ego se enriquececom as proprieda<strong>de</strong>s do objeto introjetado em si próprio. No segundo caso, po<strong>de</strong>mos observarum gran<strong>de</strong> empobrecimento do ego, uma substituição <strong>de</strong> seu constituinte mais importantepelo objeto. Entretanto, Freud alerta que as coisas não são bem assim, separadas e diferentes,pois é possível encontrar casos em que o estado <strong>de</strong> estar amando é acompanhado por umestado em que o ego introjetou o objeto em si próprio.A contribuição mais importante <strong>de</strong>ste capítulo para nosso estudo da <strong>concepção</strong><strong>freudiana</strong> <strong>de</strong> <strong>melancolia</strong> é que ele <strong>de</strong>fine o status do objeto presente na <strong>melancolia</strong>: o status <strong>de</strong>objeto i<strong>de</strong>alizado, que é colocado no lugar do i<strong>de</strong>al do ego.No capítulo XI – “Uma gradação diferenciadora no ego” – ainda do mesmo trabalhoPsicologia <strong>de</strong> Grupo e Análise do Ego, Freud volta a se referir à <strong>melancolia</strong> e, principalmente,à mania. Como o próprio título do capítulo indica, o tema tratado é aquele em que ele se<strong>de</strong>teve anteriormente, no capítulo VII, referente ao i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> ego.No artigo Luto e Melancolia, o autor havia se <strong>de</strong>parado com um problema: <strong>de</strong> quemaneira uma <strong>melancolia</strong> se transformaria em mania? Esta questão é retomada neste capítuloutilizando a idéia <strong>de</strong> i<strong>de</strong>al do ego para solucioná-la. Veremos também que novamente a<strong>melancolia</strong> é invocada para solucionar enigmas da vida psíquica em geral.No final do capítulo VII, Freud afirmava que o valor da distância entre o i<strong>de</strong>al do egoe o ego real é muito variável <strong>de</strong> um indivíduo para outro e que, em muitas pessoas, essa142
diferenciação <strong>de</strong>ntro do ego não vai além da que suce<strong>de</strong> em crianças. Agora, no capítulo XI,Freud volta à questão afirmando que, em muitos indivíduos, a separação entre o ego e o i<strong>de</strong>aldo ego não se acha muito avançada e ambas as instâncias coinci<strong>de</strong>m facilmente; todavia, oego conserva sua primitiva satisfação narcisista <strong>de</strong> si mesmo. Em Sobre o narcisismo, Freud(1914) mostra que o sujeito <strong>de</strong>ve renunciar à satisfação narcisista, dando origem ao i<strong>de</strong>al doego. Teria algo acontecido ainda na fase narcisista para que esta separação não se efetuasse <strong>de</strong>forma suficiente. Uma especulação po<strong>de</strong> aqui advir, pois seria possível que, ao ter estaseparação prejudicada, o indivíduo acabe por funcionar segundo uma necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mantereste estado, procurando sempre satisfações narcísicas. Em outras palavras, o sujeito viveriasempre buscando alcançar aquela satisfação <strong>de</strong>sfrutada no narcisismo da infância, umarelação <strong>de</strong> indiscriminação com o objeto primário, através <strong>de</strong> relações narcísicas com osobjetos externos. Este linha <strong>de</strong> pensamento que estamos <strong>de</strong>senvolvendo ao longo <strong>de</strong> nossasleituras almeja revelar uma <strong>concepção</strong> <strong>freudiana</strong> <strong>de</strong> <strong>melancolia</strong> que, embora nem sempre clarae evi<strong>de</strong>nte, po<strong>de</strong> ser aprendida a partir das relações entre os conceitos. Freud fala também <strong>de</strong>uma dupla espécie <strong>de</strong> vinculo entre os indivíduos, a i<strong>de</strong>ntificação e a substituição do i<strong>de</strong>al doego por um objeto exterior.Reflitamos que o ego ingressa agora na relação <strong>de</strong> um objeto para com o i<strong>de</strong>al doego, <strong>de</strong>le <strong>de</strong>senvolvido, e que a ação recíproca total entre um objeto externo e o egocomo um todo, com que nosso estudo das neuroses nos familiarizou, <strong>de</strong>vepossivelmente repetir-se nessa nova cena <strong>de</strong> ação <strong>de</strong>ntro do ego (FREUD, 1921, p.140).Temos então uma relação <strong>de</strong> objeto que acontece <strong>de</strong>ntro do aparelho psíquico. Aonascermos, diz Freud, entramos em um estado <strong>de</strong> transição que vai <strong>de</strong>s<strong>de</strong> um narcisismoabsolutamente auto-suficiente até o reconhecimento <strong>de</strong> um mundo externo variável e a<strong>de</strong>scoberta dos primeiros objetos. No entanto, esta situação não po<strong>de</strong> ser mantidain<strong>de</strong>finidamente, e periodicamente nos recolhemos para o estado <strong>de</strong> sono, um estado protótipodaquele do narcisismo primário, a uma situação <strong>de</strong> ausência <strong>de</strong> estímulos e fuga dos objetos.O mesmo acontece com a repressão. Uma separação ocorre entre um ego coerente e uma parteinconsciente e reprimida que é <strong>de</strong>ixada <strong>de</strong> fora por ser inaceitável pelas resistências. Noentanto, esta separação também não po<strong>de</strong> ser mantida <strong>de</strong> forma absoluta, e o que foi <strong>de</strong>ixado<strong>de</strong> fora sempre acaba por retornar à consciência <strong>de</strong> forma disfarçada, burlando as resistênciase obtendo prazer. O humor e os chistes, por exemplo, seriam algumas formas <strong>de</strong>ste retorno doque fora excluído da consciência.Na <strong>melancolia</strong>, como já foi colocado anteriormente, há um conflito entre o ego – quese i<strong>de</strong>ntificou com o objeto – e o i<strong>de</strong>al do ego exigente. Na mania, a separação entre o ego e o143
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