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o índio na mídia - Fundação Joaquim Nabuco

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necessária a relação entre o contexto social, econômico e político em que se dáo discurso, operando a linguagem como o meio de representação. Para SandraPesavento, "todo fato histórico – e, como tal, fato passado – tem uma existêncialingüística, embora o seu referente (o real) seja exterior ao discurso.3. O <strong>índio</strong> e sua representação <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> em Per<strong>na</strong>mbucoNormalmente, quando se reproduzem opiniões de outro, faz-se a escolha depalavras para construir o discurso. Embora isso pareça uma atitude ingênua,nunca está livre da carga ideológica de quem faz o texto, uma vez que estaseleção não é aleatória. Segundo Luiz Antônio Marcushi (1991), "apresentar oucitar o pensamento de alguém implica, além de uma oferta de informação,também uma certa tomada de posição diante do exposto" (MARCUSHI, 1991:75). E acrescenta: “é muito difícil informar sem manipular, por melhores quesejam as intenções” (MARCUSCHI, 1991: 92). No texto jor<strong>na</strong>lístico, o redator setransforma em uma ante<strong>na</strong> que recebe informações e as emite para oleitor/espectador, tarefa que é impossível de acontecer de forma neutra. Nabusca de marcas lingüísticas que possam mostrar o posicio<strong>na</strong>mento e aparcialidade seja do meio, seja do repórter – como sujeito autor da história queconta – assim como das representações sociais do indíge<strong>na</strong> <strong>na</strong> imprensa,a<strong>na</strong>lisamos mais adiante alguns textos jor<strong>na</strong>lísticos que falam do <strong>índio</strong> emPer<strong>na</strong>mbuco.Atualmente, existem mais de 200 etnias conhecidas no Brasil, das quaisnove estão em Per<strong>na</strong>mbuco, o que dá ao Estado a quarta posição emquantidade de povos indíge<strong>na</strong>s no País. Isso, porém, não é suficiente pararomper a fixação da agenda-setting da imprensa per<strong>na</strong>mbuca<strong>na</strong> e permitir apresença do discurso indíge<strong>na</strong> no temário da <strong>mídia</strong> local. Um levantamentoprelimi<strong>na</strong>r feito nos jor<strong>na</strong>is DIARIO DE PERNAMBUCO e JORNAL DOCOMMERCIO no período de julho de 2001 a abril de 2002 demonstra que o<strong>índio</strong> só entra <strong>na</strong> pauta da imprensa em questões muito específicas: em primeirolugar, quando é vítima ou autor de violência; em segundo, quando representaalgo exótico ou inusitado, ou seja, no enfoque do inesperado. Questões comosaúde, educação, ciência, terra e cultura indíge<strong>na</strong>s não são enfocadas ou sãotratadas segundo o senso comum formado sobre o <strong>índio</strong>, conceitos concebidos apartir da ideologia da classe domi<strong>na</strong>nte, no qual vigora um senso comum quereflete o pensamento e as idéias dessa classe domi<strong>na</strong>nte.Segundo Gramsci (1978), o senso comum é a vivência do mundofenomênico, quando temos contato ape<strong>na</strong>s com a aparência das coisas, semmanter ligação com a essência da coisa em si. Esse senso comum constitui-senuma forma de pensamento vigente, que domi<strong>na</strong> um ou vários estratos sociais.O indíge<strong>na</strong>, integrante de um grupo social, tem sua concepção própria demundo, fora da realidade circulante no restante da sociedade. Ainda vigora <strong>na</strong><strong>mídia</strong> o senso comum sobre o indíge<strong>na</strong> como o selvagem catequizado,amansado, ingênuo, ignorante e em harmonia com a <strong>na</strong>tureza. Segundo SôniaMaria Ramires de Almeida (1985), a cinematografia brasileira se baseou <strong>na</strong>literatura indigenista, trazendo heróis para a tela e mostrando as curiosidades deum Brasil desconhecido (ALMEIDA, 1985; 55). A violência atribuída ao <strong>índio</strong> pelocinema decorre da compreensão de que ele possui o que Sônia Almeida definecomo "maldade <strong>na</strong>tural". Segundo ela, no cinema - mesmo nos documentários -vigora a plasticidade das cores, danças e rituais, com cantos tribais, uma5


exaltação a uma cultura desti<strong>na</strong>da a desaparecer, registro de debates entrelideranças indíge<strong>na</strong>s que se caracterizam como uma denúncia e reflexões sobrea exploração do <strong>índio</strong>, <strong>na</strong> condição de segmento social margi<strong>na</strong>lizado e objetode entidades protecionistas.Segundo Rodrigo de Azeredo Grünewald, "quando se fala de <strong>índio</strong>s noBrasil, logo se pensa nos xinguanos ou em tribos que habitam recônditosamazônicos" (GRÜNEWALD, 1999; 137). Para ele, “a imagem mais freqüente éa de `selvagens', `aborígenes', `autóctones', que se apresentam a nós,`ocidentais' e `civilizados', como exóticos em sua língua, seus trajes, seuscostumes" (GRÜNEWALD, 1999, 137). O geógrafo Melhem Adas (1998) alertaque "gerações de brasileiros receberam dos livros e de relatos a serviço dosconquistadores a imagem distorcida dos indíge<strong>na</strong>s como gente `preguiçosa'"(ADAS, 1998; 37). Segundo ele, essa imagem se firmou porque os <strong>índio</strong>sofereciam resistência às tentativas dos brancos colonizadores de escravizá-los."Como a história tem sido geralmente escrita pelo branco e se encontraimpreg<strong>na</strong>da da ideologia da classe domi<strong>na</strong>nte, compreende-se, então, que essavisão até serviu para justificar o tráfico de escravos africanos e obscurecer acompreensão da cultura indíge<strong>na</strong>" (ADAS, 1998; 37). Esta visão ainda éexpressa no senso comum da sociedade, um tipo de preconceito que é aceitopela sociedade brasileira sem qualquer senso crítico.Como prevalece o senso comum sobre o indíge<strong>na</strong> como selvagempacificado, o <strong>índio</strong> entra <strong>na</strong> pauta da imprensa dentro de um temário mais amplo,a violência, que há muito é constitutivo da agenda-setting dos meios decomunicação brasileiros. O indíge<strong>na</strong> figura <strong>na</strong> imprensa quando o assunto éviolência porque, sendo vítima, não é qualquer um que é agredido, mas aqueleque integra um grupo em extinção, ignorante e ingênuo; quando é autor daviolência, entra <strong>na</strong> pauta pelo inesperado, pois mesmo que a maldade lheocorra, a civilização branca o transformou no "bom selvagem", catequizado, dequem não se espera mais uma atitude agressiva. Ou, mesmo, para justificar seuextermínio, se a civilização não conseguiu amansá-lo, então exterminá-lo é omeio para se garantir o fim da violência que lhe é peculiar (o senso comum sobrea sua "maldade <strong>na</strong>tural", como definiu Sônia Almeida).4. Análise dos textos jor<strong>na</strong>lísticos: como o <strong>índio</strong> entra <strong>na</strong> pauta dos jor<strong>na</strong>isNa análise dos textos jor<strong>na</strong>lísticos em questão, é importante verificarcomo foram nomeados os referentes (no caso, os indíge<strong>na</strong>s) e os fatos a elesrelacio<strong>na</strong>dos, colocando o sujeito em duas condições <strong>na</strong> posição de fontejor<strong>na</strong>lística: ativa ou passiva. As fontes jor<strong>na</strong>lísticas são hierarquizadas segundosua capacidade de dar informações como representantes de um grupo ou deuma instituição, especialmente as fontes consideradas de alto nível, quereforçam o fato <strong>na</strong>rrado, logo, têm papel ativo. Já a fonte jor<strong>na</strong>lística passivaassume mais o papel de objeto que de sujeito do discurso; ela é falada poroutra(s) fonte(s) que assumem a sua representação no texto jor<strong>na</strong>lístico ou temseu discurso reproduzido antecedido de verbos introdutores de opinião quefragilizam o seu significado. O discurso sobre o <strong>índio</strong> é focado em temasmaiores no qual ele é incluído seja pelo caráter exótico, seja por uma concessãoda <strong>mídia</strong>. O estudo prelimi<strong>na</strong>r feito em 115 reportagens e notas veiculadas nosjor<strong>na</strong>is citados no período de julho de 2001 a abril de 2002 mostra que ora comovítima, ora como autor da violência, o indíge<strong>na</strong> apareceu 60 vezes nos dois6


jor<strong>na</strong>is estudados. Isso é um indicativo do quadro grave da violência no País,não de uma preocupação com o <strong>índio</strong>, assunto esse que entrou <strong>na</strong> agenda daimprensa há alguns anos por força da crise <strong>na</strong> segurança pública, o aumento deseqüestros e assaltos a banco, atingindo fortemente a classe domi<strong>na</strong>nte.Um <strong>índio</strong> como praticante de violência é citado pelo caráter inesperado,pois desfaz a imagem do senso comum do "bom selvagem", produto da mãocivilizatória da Igreja no processo de catequização. Além disso, do lado do <strong>índio</strong>,há ainda resquícios de uma imagem associada ao canibalismo e primitivismo (a"maldade <strong>na</strong>tural") considerados traços da perso<strong>na</strong>lidade do <strong>índio</strong> já superadospelo processo de dinâmica social. Mesmo com a Campanha da Fraternidadepela Igreja Católica em 2002 - "Fraternidade e Povos Indíge<strong>na</strong>s" - abordando aquestão indíge<strong>na</strong> do direito à terra, o discurso da <strong>mídia</strong> sobre o <strong>índio</strong> nãomudou: por 11 vezes a campanha foi notícia, mas, curiosamente, <strong>na</strong>comemoração da Páscoa, três reportagens foram feitas sobre a data religiosasem que, em duas delas, a Campanha da Fraternidade fosse citada. Numaterceira reportagem, foi feita uma alusão à presença de atores querepresentavam <strong>índio</strong>s numa comemoração religiosa no Recife, sem qualquerreferência à ausência de líderes ou representantes de comunidades indíge<strong>na</strong>s<strong>na</strong> celebração que faz referência à luta indíge<strong>na</strong> pela terra. Definimos a seguir ostipos de discurso, formas de apresentação da notícia, quantidade dereportagens, artigos, editoriais ou notas sobre o <strong>índio</strong> nos dois jor<strong>na</strong>isa<strong>na</strong>lisados. Para este trabalho, tomamos emprestada a definição sobrediscursos apresentada por Marcushi (1991). Eles são os seguintes:a) Discurso do Poder – é o discurso do governo representado pelos trêspoderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), além das Forças Armadas. Reúneainda a opinião oficial, mas de origem mais abaixo <strong>na</strong> hierarquia do governo(universidades, instituições gover<strong>na</strong>mentais), além de outras entidades ligadas aele (como a Igreja). Este tipo de discurso também é o originário de instituiçõesde poder em oposição ao governo (sindicatos, representantes de entidades quefazem oposição ao governo).b) Discurso de Populares – é o discurso produzido por pessoas anônimasou de grupos de peque<strong>na</strong> representação no poder ou mesmo <strong>na</strong> oposição aopoder. É precedida ou seguida por um número de verbos introdutores de opiniãomuito reduzido, com características estigmatizadas. A maior incidência é doverbo dizer e de construções adverbiais que ganham um caráter de confissão enão de afirmação ou exposição de princípios ou propósitos (como ocorre no tipode discurso anterior).Os verbos ajudam a compreender os tipos de discurso existentes <strong>na</strong>imprensa. Marcushi afirma que os verbos introdutores de opinião funcio<strong>na</strong>mcomo "parafraseantes sintéticos, pois resumem em uma só palavra o sentidogeral do discurso a relatar" (MARCUSCHI, 1991; 77). Como exemplo, podemoscitar:a) Verbos indicadores de posições oficiais e afirmações positivas – declarar,afirmar, comunicar, anunciar, informar, confirmar, assegurar;b) Verbos indicadores de força do argumento – frisar, ressaltar, sublinhar,acentuar, enfatizar, destacar, garantir;c) Verbos indicadores de retomadas opositivas, organizadores dos aspectosconflituosos – comentar, reiterar, reafirmar, negar, discordar, temer, admitir,apartear, revidar, retrucar, responder, indagar, defender, reconhecer,reconsiderar, reagir;7


d) Verbos introdutores de opinião do discurso popular – contar, prosseguir,lembrar, confessar e, com mais freqüência, o verbo dizer.Além desta classificação, uma opinião pode ser expressa <strong>na</strong> imprensaatravés de nomi<strong>na</strong>lizações de verbos (a declaração, o argumento, o elogio, aconfirmação, a denúncia), procedimento considerado mais incisivo, ou medianteconstruções adverbiais, que tentam dar neutralidade, mas que <strong>na</strong> verdadetransferem a responsabilidade da opinião a quem a emite, como no caso danomi<strong>na</strong>lização. É diferente quando antecede uma opinião que vem entre aspas.As expressões mais freqüentes são "segundo fulano", "de acordo com...", "<strong>na</strong>opinião de...", "para fulano". A classificação dos verbos não é rígida, uma vezque, pela forma do discurso, o verbo adquire uma nova feição discursiva. A partirdesta definição, poderemos verificar em que tipologia discursiva as comunidadesindíge<strong>na</strong>s se enquadram <strong>na</strong> imprensa.4.2 O que nos dizem os jor<strong>na</strong>isNo período entre julho e setembro de 2001, 32 tipos diferentes denotícias foram veiculadas nos jor<strong>na</strong>is Diário de Per<strong>na</strong>mbuco e Jor<strong>na</strong>l doCommercio no Estado. Deste total, os seguintes assuntos foram abordados:violência contra o <strong>índio</strong> - 10 vezes; violência do <strong>índio</strong> - 9 vezes; elimi<strong>na</strong>çãodo racismo - 8 vezes; arte - 3 vezes; educação indíge<strong>na</strong> - 1 vez; saúdeindíge<strong>na</strong> - 1 vez.Verificamos que, embora o <strong>índio</strong> apareça em 18 reportagens, o períodoestudado coincidiu com a Conferência da Organização das Nações Unidas(ONU) contra o Racismo, a Xenofobia e a Intolerância Correlata, encontrorealizado em Durban, <strong>na</strong> África do Sul. E em grande parte das reportagens,ape<strong>na</strong>s o nome "<strong>índio</strong>" é referido, sem qualquer aprofundamento ouaproximação da reportagem à realidade indíge<strong>na</strong> brasileira ou regio<strong>na</strong>l, bastantediversa em virtude das variantes culturais de cada região onde há comunidadesindíge<strong>na</strong>s. Também no período houve uma tentativa de dissidência entremembros do povo Xucuru (Pesqueira-PE), fato que virou notícia em virtude daviolência ocorrida entre os <strong>índio</strong>s. Para uma análise discursiva e darepresentação do <strong>índio</strong> <strong>na</strong> <strong>mídia</strong>, optamos por trazer a análise breve de algunstextos de jor<strong>na</strong>l: reportagens (2); nota (1); nota comentada(1).Índios Tere<strong>na</strong> libertam reféns (JC, 30.07.2001) nota - ao afirmar que os <strong>índio</strong>slibertam reféns, transparece a posição de que os <strong>índio</strong>s assumiram a posição deseqüestradores, sem associar o fato a uma reivindicação pela terra, que para acultura dos <strong>índio</strong>s têm um valor diferenciado, sendo a base da sobrevivência eexistência como povo. Somente ao fim da nota é feita referência, indireta, a umapromessa do Incra de assentar os indíge<strong>na</strong>s em uma fazenda. Não fica claro omotivo dos <strong>índio</strong>s terem feito reféns, mas se e<strong>na</strong>ltece a promessa do discursopara-oficial (domi<strong>na</strong>nte). O verbo prometer dá força ao discurso do poder paraoficial(o Incra,) enquanto a ação dos <strong>índio</strong>s assume a idéia de bader<strong>na</strong>,perdendo a vinculação com a reivindicação pela terra. Os Tere<strong>na</strong> não têm suaopinião expressa <strong>na</strong> nota, sua discursividade é mantida no silêncio e suarepresentação é distorcida.8


TEMAVIOLÊNCIA DO ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO GOVERNO/AUTORIDADEDISCURSO DO PODER PARA-OFICIAL (INCRA)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:PROMETERNOMINALIZAÇÕES:A NEGOCIAÇÃO FOI FEITA...TIPO DE FONTEFONTE ATIVATIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:LIBERTARNÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DIRETA DODISCURSO INDÍGENA (SILENCIAMENTODO SUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVAÍndio Xucuru assassi<strong>na</strong>do em Pesqueira (DP, 24.08.2001) reportagem - aviolência, tema constitutivo da agenda-setting da <strong>mídia</strong>, aparece nesta matériacom o assassi<strong>na</strong>to do líder indíge<strong>na</strong> Chico Quelé, tratando do conflito entrefazendeiros e <strong>índio</strong>s no município de Pesqueira. Mesmo sendo um crime contrauma liderança indíge<strong>na</strong>, ocupa o espaço de uma colu<strong>na</strong> de jor<strong>na</strong>l. Ao relatar ascondições do assassi<strong>na</strong>to, o jor<strong>na</strong>lista joga a responsabilidade da <strong>na</strong>rração aoConselho Indigenista Missionário, dando margem à dúvida sobre o fato:"segundo a versão divulgada pelo conselho Indigenista Missionário (Cimi),Chico Quelé, que não possuía registro de <strong>na</strong>scimento e tem a idadeestimada em 50 anos, seguia para uma reunião do Conselho deLideranças....foi assassi<strong>na</strong>do". Se é uma versão, há espaço para outras, o queenfraquece a tese do assassi<strong>na</strong>to. Claro que é preciso uma investigação para aconclusão de que foi um assassi<strong>na</strong>to, mas é impossível que alguém morra vítimade um tiro de espingarda de calibre 12 que não seja assassi<strong>na</strong>do. A construçãoadverbial (“segundo a versão...”) é um recurso que transfere para o Cimi aresponsabilidade da afirmação de que foi um assassi<strong>na</strong>to, eximindo o jor<strong>na</strong>l e orepórter pelo dito. O discurso indíge<strong>na</strong> (popular) é reduzido e substituído poroutro mais forte (para-oficial, do Cimi). No decorrer do texto, a opinião do <strong>índio</strong>Marcos Luidson aparece seguida dos verbos denunciar, afirmar. O primeiroaponta o discurso de oposição, mas a declaração é enfraquecida mais adiante,quando o <strong>índio</strong> declara: "muitos deles (fazendeiros) não querem sair (das terrasdemarcadas) e prometem matar a mim e outras lideranças", afirmou MarcosLuidson". Isso é uma ameaça de morte, mas o verbo introdutor de opiniãoafirmar não dá a isso o valor devido. A preocupação com a falta de registro de<strong>na</strong>scimento enfraquece a identidade indíge<strong>na</strong> da vítima, retomando o sensocomum do <strong>índio</strong> como selvagem.9


TEMAVIOLÊNCIA CONTRA O ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE – DISCURSODE OPOSIÇÃO/POLÊMICO (CIMI)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:QUERER, PONDERARUSO DE ASPAS:APESAR DA “TRÉGUA”...CONSTRUÇÃO ADVERBIAL:SEGUNDO A VERSÃO DIVULGADAPELO CONSELHO INDIGENISTAMISSIONÁRIO (CIMI), CHICO QUELÉ....FOI ASSASSINADOTIPO DE FONTEFONTE ATIVATIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POLÊMICO/POPULAR(RETÓRICA DO OPRIMIDO)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:DENUNCIAR, AFIRMAR, DIZERUSO DE ASPAS E METÁFORA:“ISSO AQUI É UM BARRIL DEPÓLVORA”TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA5. Breve ConclusãoOs textos jor<strong>na</strong>lísticos a<strong>na</strong>lisados nos permitem dizer que arepresentação social do indíge<strong>na</strong> <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> em Per<strong>na</strong>mbuco, Brasil, se dá atravésde um discurso popular, de acordo com a definição de Marcuschi, ou seja, éenfraquecido por verbos introdutores de opinião que não impõem força aosistema de valores do discurso do <strong>índio</strong>, sujeito que assume, assim, a condiçãode fonte passiva dentro do discurso jor<strong>na</strong>lístico. O senso comum que prevalece éainda de que os <strong>índio</strong>s precisam da tutela do Governo, que surge no papel oficialdo poder constituído, no papel da Igreja, representando o discurso do poder. Hánotícias veiculadas sobre o <strong>índio</strong> onde não há sequer espaço para averbalização do discurso indíge<strong>na</strong>. O <strong>índio</strong> não é sujeito de seu discurso e nemtem poder para construir sua própria história. Quem tem poder para fazerdeclarações e anúncios é a Fu<strong>na</strong>i, o Governo e a Igreja, reforçando o discursooficial e retirando dos <strong>índio</strong>s o direito de se agrupar e reagrupar, enfim, deorganizar seu discurso e ocupar espaço <strong>na</strong> imprensa de modo a ser sujeito ativoe verbalizar seu discurso. Isso nos leva a concluir que o espaço midiáticoreproduz as relações sociais da sociedade, com a classe domi<strong>na</strong>nte mantendo aforça de seu discurso <strong>na</strong> imprensa e os grupos subalternos se mantendo àmargem. Não seria a <strong>mídia</strong> também responsável pelo reforço de uma imagemestereotipada dos <strong>índio</strong>s? Será que só é possível pensar <strong>na</strong> presença indíge<strong>na</strong>numa “terra sem males”, distante da sociedade capitalista? Não seriam elesseres humanos ape<strong>na</strong>s diferentes, capazes também de se articular com asociedade de maneira mais ampla, inclusive como sujeito de sua própriahistória?10


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