MATERIAL & MÉTODOSÁrea <strong>de</strong> estudo e coleta <strong>de</strong> dadosRealizamos o estudo na praia da Barra do Una, nomunicípio <strong>de</strong> Peruíbe, localizado no litoral sul doestado <strong>de</strong> São Paulo. Coletamos dados <strong>em</strong> <strong>dois</strong> <strong>ambientes</strong>:uma área <strong>de</strong> restinga e um costão rochoso.Nossa pr<strong>em</strong>issa é que o costão rochoso apresentamaior <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> recursos, dado que exist<strong>em</strong>concavida<strong>de</strong>s no solo que acumulam nutrientese água. Por outro lado, o solo da restinga, por sermuito arenoso, apresenta <strong>baixa</strong> <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong><strong>de</strong> nutrientes e água na superfície. Em relaçãoàs condições ambientais, tais <strong>com</strong>o t<strong>em</strong>peraturae umida<strong>de</strong>, os <strong>dois</strong> <strong>ambientes</strong> pod<strong>em</strong> ser consi<strong>de</strong>radossimilares.Em cada ambiente, amostramos plantas <strong>de</strong> cincofamílias diferentes <strong>de</strong> modo a minimizar o efeito da<strong>de</strong>pendência filogenética entre as espécies: Schinusterebinthifolius (Anacardiaceae), Tibouchina clavata(Melastomataceae), Guapira opposita (Nyctaginaceae),Clusia criuva (Clusiaceae) e Myrsineparvifolia (Myrsinaceae). Coletamos amostras<strong>de</strong> cinco indivíduos <strong>de</strong> cada espécie na restinga ecinco no costão. Os indivíduos amostrados <strong>de</strong> umamesma espécie estavam a pelo menos a 5 m <strong>de</strong> distânciaum do outro. Para cada indivíduo, sorteamoscinco ramos e coletamos, <strong>de</strong> cada ramo, a terceirae quinta folha a partir do ápice. Para espécies <strong>com</strong>folhas opostas, sorteamos entre as folhas 3-4 e 5-6.Usamos o método proposto por Dirzo & Dominguez(1995) para estimar o índice <strong>de</strong> herbivoria (IH) <strong>em</strong>todas as folhas coletadas. Adotamos esse métodopor ser rápido e eficiente, permitindo a análise <strong>de</strong>gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> folhas <strong>em</strong> pouco t<strong>em</strong>po. Classificamosas folhas <strong>de</strong> cada indivíduo visualmente<strong>em</strong> seis categorias (Tabela 1), sendo o IH <strong>de</strong> cadaindivíduo a média dos valores das categorias paraas 10 folhas amostradas.Tabela 1. Categorias utilizadas para calcular o índice<strong>de</strong> herbivoria <strong>de</strong> Dirzo & Domínguez (1995).% <strong>de</strong> área foliarCategoriaconsumida0 01 0,1-6,02 6,1-12,03 12,1-25,04 25,1-50,05 > 50Análise <strong>de</strong> dadosCalculamos o IH para cada uma das espécies e,<strong>em</strong> seguida, calculamos a média geral do IH dosindivíduos na restinga e no costão rochoso. Adiferença entre o IH <strong>de</strong> cada ambiente foi nossaestatística <strong>de</strong> interesse. Testamos a diferença doIH do costão e da restinga contra um cenário nulo,gerado a partir <strong>de</strong> 10.000 aleatorizações dos IHsdos indivíduos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> cada espécie. Calculamosa probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> encontrar valores iguais oumaiores do que a diferença observada, rejeitando ahipótese nula caso a probabilida<strong>de</strong> calculada foss<strong>em</strong>enor do que 5%.RESULTADOSDas cinco espécies amostradas, apenas S. terebinthifoliusnão apresentou diferença no IH entre os<strong>ambientes</strong> (p = 0,158). As d<strong>em</strong>ais espécies apresentaramIH maior no costão do que na restinga(T. clavata: p = 0,010; G. opposita: p = 0,013; C.criuva: p = 0,022; M. parvifolia: p = 0,012; Figura1). A média (± DP) do IH foi maior no costão rochoso(2,356 ± 0,840) <strong>em</strong> relação à restinga (1,204 ± 0,358;p < 0,001; Figura 2).Figura 1. Média do índice <strong>de</strong> herbivoria (IH) <strong>de</strong> cadauma das espécies na restinga e no costão rochoso. Aslinhas conectam os IHs <strong>de</strong> uma mesma espécie; a linhatracejada representa a espécie <strong>em</strong> que o IH foi maior narestinga e as linhas contínuas representam as espécies<strong>em</strong> que o IH foi maior no costão.Figura 2. Boxplot do índice <strong>de</strong> herbivoria na restingae no costão rochoso. As linhas <strong>em</strong> negrito representamas médias, o retângulo representa o limite do primeiroe terceiro quantil, as linhas tracejadas representamos <strong>de</strong>svios padrões e os asteriscos representam pontosextr<strong>em</strong>os.Curso <strong>de</strong> Pós-Graduação <strong>em</strong> Ecologia - Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo2
DISCUSSÃOOs resultados obtidos aqui para cinco espécies <strong>de</strong>planta indicam que a herbivoria é maior no costãorochoso do que na restinga. Essa relação inversaentre <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> recursos e herbivoria está<strong>de</strong> acordo <strong>com</strong> a hipótese da <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong>recursos (HDR). Vale ress<strong>alta</strong>r, entretanto, que aHDR foi proposta inicialmente <strong>com</strong> base <strong>em</strong> umestudo que avaliou o efeito da <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong>luz sobre a herbivoria. Partindo da pr<strong>em</strong>issa quea intensida<strong>de</strong> luminosa na restinga e no costãorochoso é s<strong>em</strong>elhante e que a principal diferençaentre os <strong>dois</strong> <strong>ambientes</strong> é a <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong>nutrientes, mostramos que a HDR também po<strong>de</strong>ser aplicada para plantas <strong>em</strong> áreas <strong>com</strong> diferentes<strong>disponibilida<strong>de</strong></strong>s <strong>de</strong> nutrientes no solo e não apenaspara a intensida<strong>de</strong> luminosa. Fine et al. (2004)também avaliaram o efeito da <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong>nutrientes sobre a produção <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesas das plantas<strong>em</strong> uma área da floresta Amazônica. Os autoresencontraram que plantas <strong>em</strong> <strong>ambientes</strong> pobres <strong>em</strong>nutrientes (solos arenosos) tend<strong>em</strong> a investir mais<strong>em</strong> <strong>de</strong>fesa química do que plantas <strong>em</strong> <strong>ambientes</strong>ricos <strong>em</strong> nutrientes (solos argilosos). Esse investimentodiferencial estaria relacionado ao elevadocusto <strong>de</strong> produzir novos tecidos <strong>em</strong> <strong>ambientes</strong> <strong>com</strong><strong>baixa</strong> <strong>disponibilida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> recursos.Folhas <strong>em</strong> expansão concentram três vezes maismetabólitos secundários do que folhas maduras, ouseja, é mais custoso produzir folhas novas do qu<strong>em</strong>anter folhas maduras (Coley & Barone, 1996).Além <strong>de</strong> ser<strong>em</strong> menos custosas, folhas madurassofr<strong>em</strong> menos herbivoria do que folhas novas, poispossu<strong>em</strong> menor quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nitrogênio e água esão menos palatáveis (Coley & Borone, 1996). Uma<strong>de</strong>fesa eficiente contra a hebivoria seria, portanto,o investimento <strong>em</strong> <strong>de</strong>fesas nas folhas novas. Sugerimosque a menor incidência <strong>de</strong> herbivoria nosindivíduos que ocorr<strong>em</strong> na restinga seja resultadodo maior investimento <strong>em</strong> <strong>de</strong>fesas <strong>em</strong> folhas novas.No entanto, <strong>com</strong>o nosso estudo avaliou apenas osdanos foliares <strong>em</strong> geral, são necessários estudosfuturos que <strong>com</strong>prov<strong>em</strong> que o mecanismo ligadoao padrão encontrado é resultado <strong>de</strong> um maiorinvestimento <strong>em</strong> <strong>de</strong>fesa química dos indivíduosda restinga.Além das respostas particulares da planta àherbivoria, há mais processos que pod<strong>em</strong> estarenvolvidos no padrão <strong>de</strong> herbivoria encontrado.Caso a abundância das plantas estudadas vari<strong>em</strong>uito <strong>de</strong> um ambiente para o outro, é esperadoque a herbivoria seja maior no ambiente <strong>em</strong> que aplanta é mais frequente, simplesmente pela maiorprobabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> encontro do herbívoro. Por outrolado, a abundância <strong>de</strong> herbívoros também po<strong>de</strong> variarentre os <strong>ambientes</strong> estudados. É esperado queno ambiente <strong>com</strong> maior abundância <strong>de</strong> herbívoros,a herbivoria seja maior. Assim, estudos adicionaissão necessários para confirmar quais fatores explicamo padrão <strong>de</strong> herbivoria encontrado.REFERÊNCIASColey, P.D & T.A. Mitchell. 1991. Comparison ofherbivory and plant <strong>de</strong>fense in t<strong>em</strong>perate andtropical broad-leaved forest, pp. 26-49. Em:Plant-animal interactions: evolutionary ecologyin tropical and t<strong>em</strong>perate regions (P.W. Price,T.M. Lewinsohn, G.W. Fernan<strong>de</strong>s & W.W.Benson, eds.).Coley, P.D. & J.A. Barone. 1996. Herbivory andplant <strong>de</strong>fenses in tropical forests. Annual Reviewof Ecology and Syst<strong>em</strong>atics, 27:305-335.Dirzo, R. & C. Domingues. 1995. Plant-animalinterection in Mesoamerican tropical dry forest.Seasonally dry tropical forests (S.H. Bullock,H.A. Mooney & E. Medina, eds.). CambridgeUniversity Press, Cambridge.Fine, P.V.A.; I. Mesones & P.D. Coley. 2004. Herbivorespromote habitat specialization by treesin Amazonian forests. Science, 305:663-665.Jolivet, P. 1998. Interrelationship between insectsand plants. Library of Congress, Washington.Price, P.W. 1991. The plant vigor hypothesis andherbivore attack. Oikos, 62:244-251.Pugnaire, F.I. & F. Valladares 2007. Plant ecology.CRC Press, Boca Raton.Richards, L.A. & P.D. Coley. 2007. Seasonal andhabitat differences affect the impact of food andpredation on herbivores: a <strong>com</strong>parison betweengaps and un<strong>de</strong>rstory of a tropical forest. Oikos,116:31- 40.Stamp, N. 2003. Out of the quagmire of plant<strong>de</strong>fense hypotheses. The Quartely Review ofBiology, 78:23-55.White, T.C. 1984. The abundance of invertebrateherbivores in relation of the availability ofnitrogen in stressed food plants. Oecologia,63:93-105.Orientador: Braulio Almeida SantosCurso <strong>de</strong> Pós-Graduação <strong>em</strong> Ecologia - Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo3