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A Escrava Isaura

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Leôncio encerrado em seu quarto a ninguém falou, nem apareceudurante alguns dias, e parecia mergulhado no mais inconsolável e profundopesar. Entretanto, não era assim. É verdade que Leôncio nãodeixou de sofrer certo choque, certa surpresa, que não golpe doloroso,com a noticia do falecimento de seu pai; mas no fundo d'alma, - forçaé dizê-lo, - passado o primeiro momento de abalo e consternaçãochegou até a estimar aquele acontecimento, que tanto a propósito vinhalivrá-lo dos apuros em que se achava enleado em face de Malvinae de Miguel. Portanto, durante a sua reclusão, em vez de entregar-seà dor que lhe deveria causar tão sensível golpe, Leôncio, que pormaneira nenhuma podia resignar-se a desfazer-se de <strong>Isaura</strong>, só meditavaos meios de safar-se das dificuldades, em que se achava envolvido,e urdia planos para assegurar-se da posse da gentil cativa. As dificuldadeseram grandes, e constituíam um nó, que poderia ser cortado, masnunca desatado. Leôncio havia reconhecido a promessa que seu pai fizeraa Miguel, de alforriar <strong>Isaura</strong> mediante a soma enorme de dez contos de réis.Miguel tinha pronta essa quantia, e lha tinha vindo meter nasmãos, reclamando a liberdade de sua filha. Leôncio reconhecia também,e nem podia contestar, que sempre fora voto de sua falecida mãe deixarlivre <strong>Isaura</strong> por sua morte. Por outro lado Malvina, sabedora de suapaixão e de seus sinistros intentos sobre a cativa, justamente irritada,exigia com império a imediata alforria da mesma. Não restava aomancebo meio algum de se tirar decentemente de tantas dificuldadessenão libertando <strong>Isaura</strong>. Mas Leôncio não podia se conformar comsemelhante idéia. O violento e cego amor, que <strong>Isaura</strong> lhe havia inspirado,o incitava a saltar por cima de todos os obstáculos, a arrostar todas asleis do decoro e da honestidade, a esmagar sem piedade o coração de suameiga e carinhosa esposa, para obter a satisfação de seus frenéticosdesejos. Resolveu pois cortar o nó, usando de sua prepotência,e protelando indefinidamente o cumprimento de seu dever, assentou deafrontar com cínica indiferença e brutal sobranceria as justas exigências eexprobrações de Malvina.Quando esta, depois de deixar passar alguns dias em respeito àdor de que julgava seu marido acabrunhado, lhe tocou naquele melindrosonegócio:- Temos tempo, Malvina, - respondeu-lhe o marido com toda acalma. - É-me preciso em primeiro lugar dar balanço e fazer o inventárioda casa de meu pai. Tenho de ir à corte arrecadar os seus papéis etomar conhecimento do estado de seus negócios. Na volta e com maisvagar trataremos de <strong>Isaura</strong>.Ao ouvir esta resposta o rosto de Malvina cobriu-se de palidezmortal; ela sentiu esfriar-lhe o coração apertado entre as mãos geladas domais pungente dissabor, como se ali se esmoronasse de repente todo osonhado castelo de suas aventuras conjugais. Ela esperava que omarido fulminado por tão doloroso golpe naqueles dias de amargameditação e abatimento, retraindo-se no santuário da consciência,reconhecesse seus erros e desvanos, implorasse o perdão deles, e sepropusesse a entrar nas sendas do dever e da honestidade. As friasdesculpas e fúteis evasivas do marido vieram submergi-la de chofreno mais amargo e profundo desalento.- Como?! - exclamou ela com um acento que exprimia a um

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