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A Escrava Isaura

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meios de libertar a menina; ela bem merece esse sacrifício.Enquanto Leôncio abre a carteira, e conta e reconta muipausadamente nota por nota o dinheiro, mais para ganhar tempo arefletir sobre o que deveria fazer naquelas conjunturas, do que para verificarse estava exata a soma, aproveitemo-nos do ensejo para contemplar afigura do bom e honrado português, pai da nossa heroína, de quem ainda nãonos ocupamos senão de passagem.Era um homem de mais de cinqüenta anos; em sua fisionomia nobree alerta transpirava a franqueza, a bonomia, e a lealdade.Trajava pobremente, mas com muito alinho e limpeza, e por suasmaneiras e conversação, conhecia-se que aquele homem não viera aoBrasil, como quase todos os seus patrícios, dominado pela ganância deriquezas. Tinha o trato e a linguagem de um homem polido, e deacurada educação. De feito Miguel era filho de uma nobre e honradafamília de miguelistas, que havia emigrado para o Brasil. Seuspais, vítimas de perseguições políticas, morreram sem ter nada que legarao filho, que deixaram na idade de dezoito a vinte anos. Sozinho, semmeios e sem proteção, viu-se forçado a viver do trabalho de seusbraços, metendo-se a jardineiro e horticultor, mister este, quecomo filho de lavrador, robusto, ativo e inteligente, desempenhavacom suma perícia e perfeição.O pai de Leôncio, tendo tido ocasião de conhecê-lo, e apreciandoo seu merecimento, o engajou para feitor de sua fazenda com vantajosascondições. Ali serviu muitos anos sempre mui respeitado e queridode todos, até que aconteceu-lhe a fatal, mas muito desculpável fraqueza,que sabemos, e em consequência da qual foi grosseiramente despedidopor seu patrão. Miguel concebeu amargo ressentimento e mágoaprofunda, não tanto por si, como por amor das duas infelizes criaturas,que não podia proteger contra a sanha de um senhor perverso e brutal.Mas forçoso lhe foi resignar-se. Não lhe faltava serviço nem acolhimentopelas fazendas vizinhas. Conhecedores de seu mérito, os lavradores emredor o aceitariam de braços abertos; a dificuldade estava na escolha.Optou pelo mais vizinho, para ficar o mais perto possível de sua queridafilhinha.Como o comendador quase sempre achava-se na corte ou emCampos, Miguel tinha muita ocasião e facilidade de ir ver a menina, àqual cada vez ia criando mais entranhado afeto. A esposa do comendador,na ausência deste, dava ao português franca entrada em sua casa,e facilitava-lhe os meios de ver e afagar a filhinha, com o que vivia elemui consolado e contente. De feito o céu tinha dado à sua filha napessoa de sua senhora uma segunda mãe tão boa e desvelada, comopoderia ser a primeira, e que mais do que esta lhe podia servir deamparo e proteção. A morte inesperada daquela virtuosa senhora veiodespedaçar-lhe o coração, quebrando-lhe todas as suas lisonjeiras esperanças.Muito pode o amor paterno em uma alma nobre e sensível!...Miguel, sobrepujando todo o ódio, repugnância e asco, que lhe inspirava apessoa do comendador, não hesitou em ir humilhar-se diante dele,importuná-lo com suas súplicas, rogar-lhe com as lágrimas nos olhos, queabrisse preço à liberdade de <strong>Isaura</strong>.- Não há dinheiro que a pague; há de ser sempre minha, -respondia com orgulhoso cinismo o inexorável senhor ao infeliz e aflito

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