23procura se expandir pelo mundo a procura <strong>de</strong> novas fontes <strong>de</strong> recursos (materiais ehumanos), mas que se revela verda<strong>de</strong>iramente como um modo <strong>de</strong> vida irracional eincompatível com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sobrevivência dos próprios seres humanos noplaneta. Eis, pois, a contradição humana fundamental, aquela que procura modos <strong>de</strong>perpetuar a vida nos limites restritivos <strong>de</strong> sua própria existência. Eis, pois, acontradição mo<strong>de</strong>rna da globalização, aquela que se constrói pela quebra <strong>de</strong>barreiras que limitam e cerceiam a ação dos Estados Nacionais.Mas <strong>de</strong> forma inusitada, se constrói essa nova época, que enquanto fraçãodo t<strong>em</strong>po histórico se <strong>de</strong>fine como um período novo na história do capitalismo, mas,que <strong>de</strong> maneira concomitante, revela-se como momento <strong>de</strong> crise <strong>em</strong> função dos<strong>em</strong>bates constantes das variáveis sob as quais se edifica o sist<strong>em</strong>a. Assim, osconflitos que se apresentam nesta nova fase expõ<strong>em</strong> um capitalismo s<strong>em</strong> <strong>em</strong>prego,<strong>de</strong> diminuição drástica <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalho, <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong> receitas dos Estadose ampliação <strong>de</strong> seu endividamento, ao mesmo t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que se constata o aumentoastronômico nos lucros das <strong>em</strong>presas transnacionais e fortalecimento das forçasneoliberais.Os <strong>em</strong>presários <strong>de</strong>scobriram a pedra do reino. Eis aqui a nova fórmula mágica: capitalismos<strong>em</strong> trabalho mais capitalismo s<strong>em</strong> impostos. A receita dos impostos cooperativos e dosimpostos sobre o lucro das <strong>em</strong>presas caiu 18,6% entre 1989 e 1993. A parcela <strong>de</strong>contribuição na receita estatal já caiu quase pela meta<strong>de</strong>. (...) Mas nesta construção – e nãoum <strong>de</strong>smanche- é preciso também que se pergunte por que ele se tornou aparent<strong>em</strong>entenão-financiável. Os países da União Européia viram suas riquezas crescer<strong>em</strong> entrecinqüenta e setenta por cento nos últimos vinte anos. A economia cresceu muito maisrapidamente do que a população. Apesar disso, a União Européia conta agora com vint<strong>em</strong>ilhões <strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>em</strong>pregados, cinco milhões <strong>de</strong> pessoas vivendo na pobreza e cinco milhões<strong>de</strong> s<strong>em</strong>-teto. Para on<strong>de</strong> foi toda esta riqueza adicional? Sab<strong>em</strong>os que nos estados Unidos ocrescimento da economia só gerou riqueza para os <strong>de</strong>z por cento mais abastados. Estes<strong>de</strong>z por cento receberam noventa e seis por cento da riqueza adicional. Na Europa ascoisas não foram tão mal assim, mas n<strong>em</strong> muito melhor.Na Al<strong>em</strong>anha o lucro das <strong>em</strong>presas cresceu noventa por cento <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1979, e os salários,seis por cento. Mas a arrecadação sobre os salários duplicou nos últimos <strong>de</strong>z anos; aarrecadação <strong>de</strong> impostos corporativos caiu pela meta<strong>de</strong> e representa apenas treze porcento do total da arrecadação. Em 1980, eles ainda representavam vinte e cinco por cento;<strong>em</strong> 1960, chegavam a trinta e cinco por cento, se permanecess<strong>em</strong> <strong>em</strong> vinte e cinco porcento o estado teria uma arrecadação adicional <strong>de</strong> oitenta e seis bilhões <strong>de</strong> marcos porano 20 . (BECK, 1999, p. 20-21)Ou, como muito b<strong>em</strong> coloca SANTOS (2007, p. 34): “Por intermédio dodinheiro, o contágio das lógicas redutoras, típicas do processo <strong>de</strong> globalização, leva20 Grifos no original.
24a toda parte um nexo contábil, que avassala tudo. Os fatores <strong>de</strong> mudança (...) são,pela mão dos atores heg<strong>em</strong>ônicos, incontroláveis, cegos, egoisticamentecontraditórios”. Desta forma, <strong>de</strong>paramo-nos diante <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> que caracterizaa atual etapa histórica como um período <strong>de</strong> crise estrutural on<strong>de</strong> a “tirania dodinheiro e a tirania da informação são os pilares da produção da história atual docapitalismo globalizado”. (ib<strong>de</strong>m, p. 35)Dadas essas condições históricas específicas, os Estados-Nação“mergulham” numa seqüência <strong>de</strong> acontecimentos que os <strong>de</strong>ixam absolutamente<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes das forças das <strong>em</strong>presas transnacionais. Enquanto elevam seusgastos por diminuição contínua <strong>de</strong> suas receitas, ao mesmo t<strong>em</strong>po per<strong>de</strong>m acapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interferência no tecido social, dada a impossibilida<strong>de</strong> contínua <strong>de</strong>satisfação das necessida<strong>de</strong>s mais el<strong>em</strong>entares da população. Assim, abr<strong>em</strong>-seespaços para o setor privado, que avidamente se ocupa <strong>em</strong> suprir as <strong>de</strong>mandascontínuas <strong>de</strong> populações cada vez mais carentes, especialmente nos setores que“outrora” eram <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> do próprio Estado.Diante <strong>de</strong> tudo isso, a dinâmica do mo<strong>de</strong>lo atual do processo <strong>de</strong>globalização po<strong>de</strong> ser caracterizada como complexa, contraditória e claramentequestionável. Atravessada por relações, processos e estruturas profundamenteinfluenciadas pelo fator econômico, as dimensões políticas, sociais, culturais,informacionais, ambientais, <strong>de</strong>ntre inúmeras outras, dialogam e se digladiam nosespaços local, regional, nacional, internacional e global. Assim, nas palavras <strong>de</strong>IANNI (2006, p.48-49) o “<strong>em</strong>bl<strong>em</strong>a do Estado-nação” é <strong>de</strong>terminado:pela dinâmica dos mercados, da <strong>de</strong>sterritorialização das coisas, gentes e idéias, enquanto areprodução ampliada do capital se globaliza, <strong>de</strong>vido ao <strong>de</strong>senvolvimento extensivo eintensivo do capitalismo, compreen<strong>de</strong>ndo as forças produtivas, tais como o capital, atecnologia, a força <strong>de</strong> trabalho e a divisão do trabalho social, s<strong>em</strong>pre envolvendo asinstituições, os padrões sócio-culturais e os i<strong>de</strong>ais relativos à racionalização, produtivida<strong>de</strong>,lucrativida<strong>de</strong>, quantida<strong>de</strong>.De acordo com os estudos <strong>de</strong> Wallerstein 21 e Brau<strong>de</strong>l 22 citado por IANNI(2006, p. 31-33) sobre sist<strong>em</strong>a-mundo ou a economia-mundo, qualquer que seja o21Wallerstein, Immanuel. El mo<strong>de</strong>rno sist<strong>em</strong>a mundial (La agricultura capitalista y los origenes <strong>de</strong> laeconomia-mundo europea en el siglo XVI). Tradução <strong>de</strong> Antonio Resines. México: Siglo Veintiunoeditores, 1979. p. 489-491.22Brau<strong>de</strong>l, Fernand. A dinâmica do capitalismo. Tradução <strong>de</strong> Carlos da Veiga ferreira, 2ª ed. Lisboa:Editorial Teor<strong>em</strong>a, 1986. p. 85-87.
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