95Mesmo alcançando apenas cerca <strong>de</strong> 26 milhões <strong>de</strong> brasileiros(aproximadamente 14% da população total), um aspecto favorável <strong>de</strong>ssas iniciativasestá relacionado ao fato <strong>de</strong> que 43% dos programas nacionais existentes analisadospela pesquisa foram estabelecidos <strong>em</strong> relação <strong>de</strong> parceria entre as prefeituras eassociações/cooperativas <strong>de</strong> catadores, propiciando um aumento no ganho médioentre 1 e 1,5 salários mínimos para esse grupo social marcado pela “exclusão” domercado formal. Ainda assim, como resultado <strong>de</strong> um quadro marcado pelaprecarização, “aproximadamente 80% dos catadores ainda atuam nos lixões e,sobretudo, nas ruas <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>sorganizada” (AVINA, s/d, p.4)Ao contrário do que o senso comum po<strong>de</strong>ria imaginar, a taxa <strong>de</strong>reaproveitamento <strong>de</strong> resíduos sólidos, <strong>em</strong> nosso país, aponta para um <strong>de</strong>s<strong>em</strong>penhomuito baixo. A reciclag<strong>em</strong> do lixo urbano não ultrapassa o valor <strong>de</strong> 12% do totalcoletado, apresentando taxas sensivelmente maiores apenas para <strong>de</strong>terminadosmateriais 62 que propici<strong>em</strong> maior retorno econômico. Contudo, o volume reciclado<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o ano <strong>de</strong> 2003 aumentou <strong>de</strong> 5 para 5,76 milhões <strong>de</strong> toneladas no ano. A taxa<strong>de</strong> reciclag<strong>em</strong> da parte seca (77 mil toneladas/dia) do lixo urbano é da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong>18%, <strong>em</strong> contrapartida dos 55% que compõe a matéria orgânica 63 .Com valores pequenos, mas ainda assim consi<strong>de</strong>ráveis, as taxas <strong>de</strong>reciclag<strong>em</strong> têm se elevado impulsionando o mercado do setor. Entretanto, essesvalores não são seguidos <strong>de</strong> perto pelo envolvimento <strong>de</strong> entes públicos e tão poucopela participação dos grupos organizados <strong>de</strong> catadores. Diante <strong>de</strong> um aparente“paradoxo”, a indústria da reciclag<strong>em</strong> no Brasil mantém-se <strong>em</strong> gran<strong>de</strong> parte pormaterial coletado por esses trabalhadores informais e não através dos órgãosgovernamentais. São os catadores os principais responsáveis pela coleta, seleção,beneficiamento e comercialização dos resíduos recicláveis <strong>de</strong>scartados na maiorparte dos lixos das cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> nosso país. Mesmo <strong>em</strong> gran<strong>de</strong>s centros urbanos,on<strong>de</strong> é possível perceber mais <strong>de</strong> perto o envolvimento direto <strong>de</strong> entes públicos<strong>de</strong>senvolvendo programas oficiais <strong>de</strong> sucesso, são os catadores os principaisagentes <strong>de</strong>sta ca<strong>de</strong>ia produtiva, ainda que cerceados e limitados pelos níveissuperiores.62 No Brasil a taxa <strong>de</strong> reciclag<strong>em</strong> <strong>de</strong> papelão chega a 77,4% e <strong>de</strong> alumínio a 96,2% do total coletado.63Mesmo com uma taxa elevada <strong>de</strong> material orgânico, o lixo brasileiro é utilizado <strong>de</strong> forma insipiente,uma vez que o processo <strong>de</strong> compostag<strong>em</strong> para a produção <strong>de</strong> fertilizantes não chega a 3%.
96O exame <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas relações <strong>de</strong> trabalho vinculadas às ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> reciclag<strong>em</strong>,b<strong>em</strong> como das interfaces sociais <strong>de</strong>las <strong>de</strong>rivadas, já apontam ao rumo <strong>de</strong> um verda<strong>de</strong>iroparadoxo: o <strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> econômica revestida da tão propalada mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, mas quepo<strong>de</strong> estar, muitas vezes, precarizando o trabalho humano e gerando relações iníquas que,examinadas por certos ângulos, r<strong>em</strong>et<strong>em</strong> a estágios evolutivos que já se julgavamsuperados na história do trabalho. (CONCEIÇÃO, 2005, p.18)Em verda<strong>de</strong>, a catação <strong>de</strong> materiais recicláveis, no Brasil, não é umaespecificida<strong>de</strong> dos t<strong>em</strong>pos atuais, mas ao contrário, é uma ativida<strong>de</strong> bastante antiga,com registros <strong>de</strong> garrafeiros, trapeiros, catadores <strong>de</strong> papel, catadores <strong>de</strong> osso,enfim, catadores <strong>de</strong> materiais recicláveis <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os anos 1950. Já <strong>de</strong>ssa época,aqueles que trabalhavam diretamente com o lixo e conseguiam seu sustento atravésda coleta e seleção dos resíduos gerados pelo <strong>de</strong>scarte da população <strong>em</strong> geral,s<strong>em</strong>pre estiveram excluídos socialmente e, freqüent<strong>em</strong>ente viveram explorados porferros-velhos e atravessadores. Assim, a realida<strong>de</strong> da maioria dos catadores,organizados ou não, ainda é repleta <strong>de</strong> relatos <strong>de</strong> abuso daqueles que se apóiam naignorância e na falta <strong>de</strong> informação da categoria, b<strong>em</strong> como <strong>de</strong> situações <strong>de</strong>exploração que se baseiam na <strong>de</strong>pendência forçada do catador, quer seja pelacobrança <strong>de</strong> taxa/aluguel <strong>de</strong> carrinhos ou carroças, quer por trocas <strong>de</strong> trabalho porcomida ou ainda fornecimento <strong>de</strong> bebidas alcoólicas nos locais <strong>de</strong> trabalho comoforma <strong>de</strong> garantir a subserviência. Enfim, concorda-se com a afirmação <strong>de</strong>BURSZTYN (2000, p.42) quando coloca que, <strong>de</strong> uma maneira geral:o catador <strong>de</strong> lixo é mal incluído economicamente e excluído socialmente. Ele é o elo maisfrágil da ca<strong>de</strong>ia econômica do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>em</strong> que viv<strong>em</strong>os. Eles sãoexcluídos socialmente, pertencendo a um grupo ‘s<strong>em</strong>’ moradia, ‘s<strong>em</strong>’ escola, ‘s<strong>em</strong>’ direito àsaú<strong>de</strong> e previdência social e viv<strong>em</strong> numa situação <strong>de</strong> ilegitimida<strong>de</strong>.4.1.2 Os catadores: excluído, parceiro ou “parceiro excluído”?Catadores, trapeiros, carapirás, “burros s<strong>em</strong> rabo”, carrinheiros, carroceirossão algumas das <strong>de</strong>signações dadas a uma categoria profissional 64 recente que v<strong>em</strong>64Os catadores tiveram seu reconhecimento como categoria profissional – catador <strong>de</strong> recicláveis –através da publicação da Portaria n.º 397, <strong>de</strong> 09/10/2002, do Ministério do Trabalho e Emprego. Naorientação exposta pela Classificação Brasileira <strong>de</strong> Ocupações (CBO), os catadores <strong>de</strong> materiaisrecicláveis são aquelas pessoas que “catam, selecionam e ven<strong>de</strong>m materiais recicláveis. São
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