CAPÍTULO III52MUDANÇAS NO SISTEMA SUPERIOR DE ENSINO E LEGISLAÇÃO: AFLEXIBILIZAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE EXPANSÃO DA REDE PRIVADANo capítulo anterior estabelec<strong>em</strong>os uma relação entre a crise do capitalismo iniciadana década <strong>de</strong> 70, a conseqüente alteração das políticas econômicas <strong>em</strong> nível mundial,estimuladas sobretudo pelos organismos multilaterais, e os impactos <strong>de</strong>sse processo naformulação <strong>de</strong> diretrizes para a educação superior no Brasil. O estímulo à expansão privada ea redução dos investimentos na estrutura pública, conforme já <strong>de</strong>monstramos, sãoconseqüências diretas <strong>de</strong>ssas transformações.A passag<strong>em</strong> do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> Estado intervencionista e <strong>de</strong> b<strong>em</strong>-estar para o neoliberal, nadécada <strong>de</strong> 90, é o marco da impl<strong>em</strong>entação <strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> mudanças que acabaramalterando profundamente o perfil do sist<strong>em</strong>a superior <strong>de</strong> ensino no Brasil. A criação <strong>de</strong>universida<strong>de</strong>s por campo <strong>de</strong> saber; o fim da proposta <strong>de</strong> indissociabilida<strong>de</strong> entre as esferas <strong>de</strong>ensino e pesquisa; a criação <strong>de</strong> centros universitários, com autonomia para abrir novos cursose estabelecer currículos; a criação dos cursos seqüenciais 24e o estímulo à educação adistância, são algumas das medidas impl<strong>em</strong>entadas (MENEGHEL, p. 237-238).Todas essas medidas guardam íntima relação com as teses <strong>de</strong>fendidas pelosorganismos multilaterais. Na essência, po<strong>de</strong>mos afirmar que todas elas foram inspiradas noprincípio da flexibilização. As novas formas <strong>de</strong> organização das instituições universitárias e osurgimento <strong>de</strong> cursos mais curtos, voltados exclusivamente para o mercado, sãocaracterísticas marcantes das recentes transformações operadas na educação <strong>de</strong> nível superior.24 Os cursos seqüenciais, <strong>de</strong> curta duração, foram introduzidos pela LDB <strong>em</strong> 1996, tendo sido regulamentados,<strong>em</strong> seguida, por sucessivas Portarias. Atualmente, vigora a Portaria nº 514/01. “A legislação <strong>em</strong> vigor <strong>de</strong>fineque exist<strong>em</strong> duas modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cursos seqüenciais: a) cursos seqüenciais <strong>de</strong> compl<strong>em</strong>entação <strong>de</strong> estudos e b)cursos seqüenciais <strong>de</strong> formação específica. Ambos têm duração <strong>de</strong> dois anos. A diferença fundamental entre oscursos <strong>de</strong> compl<strong>em</strong>entação <strong>de</strong> estudos e <strong>de</strong> formação específica resi<strong>de</strong> no fato <strong>de</strong> que os primeiros dão direitoapenas a um certificado, enquanto os últimos oferec<strong>em</strong> diplomas aos formandos (MARTINS, 2004).
Essa tendência, que não se restringe à realida<strong>de</strong> brasileira 25 , está criando, aparent<strong>em</strong>ente <strong>em</strong>ritmo irreversível, dois mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> instituições universitárias:[De um lado, t<strong>em</strong>os as instituições on<strong>de</strong> predominam] “‘critérios’ e ‘indicadores’ como: ausência <strong>de</strong>estrutura <strong>de</strong> pesquisa e pós-graduação strictu sensu consolidada e reconhecida; presença majoritária <strong>de</strong>docentes <strong>em</strong> regime <strong>de</strong> t<strong>em</strong>po parcial ou horista e s<strong>em</strong> qualificação pós-graduada que habilite parapesquisa; isolamento das unida<strong>de</strong>s, ou porque únicas ou porque agregadas apenas formalmente;<strong>de</strong>dicação quase exclusiva às ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ensino; estrutura administrativa-acadêmica voltada para aformação <strong>de</strong> profissionais, etc.”. [De outro, t<strong>em</strong>os instituições on<strong>de</strong> predominam] “‘critérios’ ou‘indicadores’ como: presença <strong>de</strong> estruturas <strong>de</strong> produção científica e <strong>de</strong> pós-graduação strictu sensuconsolidada e reconhecida; presença majoritária <strong>de</strong> docentes <strong>em</strong> regime <strong>de</strong> t<strong>em</strong>po integral e comqualificação pós-graduada que habilite para a pesquisa; integração das unida<strong>de</strong>s <strong>em</strong> torno <strong>de</strong> projetoscomuns <strong>de</strong> ensino e pesquisa; associação <strong>de</strong> ensino e pesquisa e extensão <strong>em</strong> diferentes níveis; estruturaadministrativo-acadêmica voltada para a formação <strong>de</strong> profissionais e para a formação <strong>de</strong> pesquisadoresna maioria das áreas do conhecimento.” (SGUISSARDI, 2004, p. 41-42).Apesar dos el<strong>em</strong>entos que compõ<strong>em</strong> os dois mo<strong>de</strong>los estar<strong>em</strong> presentes <strong>em</strong> escalasvariáveis <strong>em</strong> cada uma das instituições que faz<strong>em</strong> parte do sist<strong>em</strong>a nacional <strong>de</strong> educaçãosuperior, observa-se nitidamente um <strong>de</strong>sprestígio do princípio da indissociabilida<strong>de</strong>, quehistoricamente esteve presente na legislação brasileira para esse nível <strong>de</strong> ensino. Des<strong>de</strong> 1931a legislação 26 insiste <strong>em</strong> dizer que “no ensino superior a universida<strong>de</strong> 27 <strong>de</strong>veria ser a regra,enquanto que os institutos isolados seriam a exceção” (SOUZA, 1997, p. 150). Em 1968,novamente a observância <strong>de</strong>sse parâmetro é ressaltada pela legislação, s<strong>em</strong> no entanto serimpl<strong>em</strong>entada na prática.A questão da viabilida<strong>de</strong> da expansão do ensino superior através <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo único,<strong>em</strong> que a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino fosse <strong>de</strong>senvolvida <strong>em</strong> paralelo à pesquisa, <strong>de</strong>sperta intensos<strong>de</strong>bates entre os especialistas e no seio da comunida<strong>de</strong> universitária. Divergências à parte, ofato concreto é que o incentivo da legislação para a diversificação ou flexibilização dosist<strong>em</strong>a, a partir da década <strong>de</strong> 1990, constituiu-se num fator impulsionador da expansãoprivada.É claro que há outros el<strong>em</strong>entos importantes nesse processo, como os históricosprivilégios que beneficiaram boa parte das instituições educacionais privadas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década5325 Sobre a flexibilização ou diversificação das instituições <strong>de</strong> ensino <strong>em</strong> outros países, ver: SANTOS, 2005;SGUISSARDI, 2003; YARZÁBAL, 2003.26 Decreto nº 19851/1931.27 As universida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>v<strong>em</strong> obrigatoriamente aten<strong>de</strong>r ao princípio da indissociabilida<strong>de</strong> entre as esferas <strong>de</strong> ensino,pesquisa e extensão.
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