181.1 O SALTO ONTOLÓGICO DO ANIMAL PARA O HOMEM: A INAUGURAÇÃO DAHISTÓRIA E DA ESFERA SOCIALComo é mais espesso o sangue do cachorrodo que o próprio cachorro.Como é mais espesso um homemdo que o sangue de um cachorro.Como é muito mais espesso o sangue de um homemdo que o sonho de um homem.João Cabral de Melo Neto (O cão sem plumas)Leontiev (1978, p. 60-62), em seu estudo sobre o desenvolvimento dopsiquismo, argumenta que o psiquismo animal desenvolve-se estreitamenterelacionado com sua atividade vital, definida como aquela atividade essencial enecessária à sua reprodução como espécie. De tal modo, quanto maior acomplexidade da atividade, maior a complexidade do psiquismo que a orienta. Nocaso do animal, a atividade vital caracteriza-se por permanecer sempre dentro doslimites biológicos e instintivos, ou seja, é imediatamente natural. O exemplo dado porLeontiev é interessante para demonstrar essa tese: um triângulo pode se constituircomo um objeto da percepção do animal, mas na medida em que não tenha para eleum sentido biológico, não se apresenta como estímulo à sua atividade.Diferentemente, a atividade humana desenvolve-se transcendendo oslimites biológicos e imediatos. Sobre isso, Luria (1979, p. 72) dá um interessanteexemplo. Um homem, mesmo que sedento, não beberá a água de um poço quesaiba envenenado. Isto quer dizer que ele é capaz de desprender-se dasimpressões imediatas, orientando-se não apenas pelo sentido biológico de suanecessidade.A produção da vida humana ocorre pela atividade do trabalho 7 ,caracterizada por ser uma atividade social em que os homens agem sobre anatureza com o objetivo de produzir os meios capazes de suprir suas necessidades.Por atividade social, entendemos não somente o fato de que os indivíduos vivemconjuntamente, mas que a produção de sua vida acontece de forma social. Ao7 Marx, em O Capital, define o processo de trabalho como uma “atividade orientada a um fim paraproduzir valores de uso, apropriação do natural para satisfazer a necessidades humanas, condiçãouniversal do metabolismo entre o homem e a Natureza, condição natural eterna da vida humana e,portanto, independente de qualquer forma dessa vida, sendo antes igualmente comum a todas assuas formas sociais” (MARX, 1988, p. 146).
19produzir os instrumentos de trabalho, por exemplo, o homem transforma a naturezapara satisfazer suas necessidades e objetiva-se nessa transformação. O instrumentoé um objeto transformado para servir a determinadas finalidades no interior daatividade humana, ganhando um novo significado criado pelo próprio homem. Duarte(1993, p. 34) apresenta essa idéia de forma esclarecedora ao dizer que: “O objetoem seu estado natural é resultante da ação de forças físico-químicas e, dependendodo objeto, de forças biológicas. Enquanto instrumento ele passará a ser resultantetambém da vontade e da atividade do homem.”Em contraposição ao animal, cuja atividade é orientada por leis naturais,passa a ser a esfera social, a determinante na atividade humana. De acordo comVigotski (2000b, p. 89, tradução nossa): “É a sociedade e não a natureza o que devefigurar em primeiro lugar como o fator determinante da conduta do homem.”Além da compreensão do trabalho como atividade social, Marx e Engels(2007) propõem que a partir do trabalho a humanidade inaugura outra dimensãoinexistente no mundo animal: a história. De início, em sua concepção de história,constatam que o primeiro pressuposto da história é a existência de seres humanosvivos, que para manterem-se vivos devem produzir os meios para a satisfação desuas necessidades. À produção desses meios, os autores chamam de primeiro atohistórico. Este é um importante aspecto, pois caracteriza a produção humana comoatividade mediada pelos objetos (materiais e simbólicos) da cultura.O modo de produção social da vida dependerá, antes de tudo, da naturezados meios de existência já encontrados e que os homens precisam reproduzir. Asatisfação de necessidades leva à produção de novas necessidades e à produçãode meios não existentes na natureza e que permitem ampliar as capacidadeshumanas na produção de sua vida, levando ao desenvolvimento da história. Nessemovimento, os seres humanos, mesmo sendo parte da natureza e dependendo delapara viver, são capazes de distinguir-se em relação a ela, inserindo-a em suaatividade e transformando-a em seu corpo inorgânico. Em seus ManuscritosEconômico-Filosóficos, Marx (2004) aponta para a interconexão existente entre anatureza e o homem, mostrando que a natureza constitui-se como seu corpoinorgânico, o qual transforma continuamente em seu desenvolvimento históricosocial.A atividade vital humana constitui-se como objeto da consciência, fruto desua genericidade. Como nos diz Marx: “O animal é imediatamente um com a suaatividade vital. Não se distingue dela. É ela. O homem faz da sua atividade vital
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