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agenda e discurso sobre o índio na mídia em Pernambuco

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOCENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃOPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSujeitos s<strong>em</strong> voz:<strong>agenda</strong> e <strong>discurso</strong> <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong><strong>na</strong> <strong>mídia</strong> <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbucoPatricia Bandeira de MeloDissertação apresentada como requisito parcialpara a obtenção do título de Mestre <strong>em</strong> Comunicaçãopela Universidade Federal de Per<strong>na</strong>mbuco, sob aorientação da Profª Drª. Wilma Peregrino de Morais.Recife, set<strong>em</strong>bro de 2003Data da defesa: 17 de outubro de 2003Local: auditório do PPGCOM – Centro de Artese Comunicação da UFPEHora: 9h30Banca exami<strong>na</strong>dora:Prof. Dr. Antônio de Fausto Neto (Unisinos – RS)Profª. Drª. Cristi<strong>na</strong> Teixeira de Melo(UFPE)Profª. Drª. Wilma Peregrino de Morais (UFPE)


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOAgradecimentosA construção desta dissertação foi um trabalho árduo para mim.Embora tenha uma vivência de jor<strong>na</strong>lismo de batente – fui repórter doJor<strong>na</strong>l do Commercio por sete anos, além de ter realizado estágios <strong>em</strong>outros veículos de comunicação de Per<strong>na</strong>mbuco – teorizar <strong>sobre</strong> aprática se tor<strong>na</strong> difícil quando participamos dos dois lados daconstrução da notícia: <strong>na</strong> condição de repórter e <strong>na</strong> condição deassessor de imprensa. Ao ingressar no Programa de Pós-graduação <strong>em</strong>Comunicação da Universidade Federal de Per<strong>na</strong>mbuco, eu sabia quequeria estudar a exclusão das vozes das minorias do <strong>discurso</strong>jor<strong>na</strong>lístico. Faltava-me, porém, base teórica suficiente que mepermitisse transformar o fato <strong>em</strong> pesquisa.Três professores do PPGCOM foram fundamentais <strong>na</strong> construção destadissertação, trazendo-me o referencial teórico necessário para suaelaboração. Inicialmente, a professora Wilma Morais, a qu<strong>em</strong> escolhicomo orientadora, que me fez estreitar o espectro da pesquisa, atéchegar ao segmento indíge<strong>na</strong> como grupo social relevante parajustificar o meu objeto de estudo. Sua orientação e paciência até queeu me adaptasse novamente ao meio acadêmico foram fundamentaispara a evolução de minhas idéias.O professor Luiz Momesso trouxe as primeiras leituras para que eupudesse crescer metodologicamente e dar visibilidade à minha idéia. Aprofessora Cristi<strong>na</strong> Texeira fechou este ciclo, trazendo um toque fi<strong>na</strong>lao participar, juntamente com o professor Momesso, de minha bancade exame de qualificação. Foi depois de passar pelo crivo da banca dequalificação que confirmei que de fato meu trabalho tinha existênciaacadêmica.Uma pesquisadora de fora do PPGCOM, porém, foi responsável pelacompreensão delicada da condição do <strong>índio</strong> <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco. Aprofessora Vânia Fialho indicou livros, conversou e fez a leitura inicial3


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdeste trabalho, tor<strong>na</strong>ndo-se fundamental para que eu pudesseconstruir grande parte desta pesquisa.A todos os familiares e amigos que entenderam minha ausênciaprolongada – especialmente meus pais que deram os primeiros passosjunto a mim para que eu tivesse os ensi<strong>na</strong>mentos básicos que mefariam ser qu<strong>em</strong> sou – agradeço a paciência por esperar este momentoque se concretiza. Aí novamente entra <strong>em</strong> ce<strong>na</strong> a professora Wilma.Sua capacidade de orientar de modo pontual, simples e sereno, dandoa fundamentação teórica necessária para a elaboração deste trabalho,levou-me a este resultado fi<strong>na</strong>l que entrego à banca exami<strong>na</strong>dora paraanálise.4


ResumoPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOO jor<strong>na</strong>lismo passou a exercer um papel fundamental <strong>na</strong> produção deconhecimento e <strong>na</strong> formação de consensos <strong>na</strong> sociedade. Na esferapública, os meios de comunicação tor<strong>na</strong>ram-se um segmentolegitimado para debater assuntos de maior ou menor influência nocotidiano. Mesmo com um aparente consenso <strong>sobre</strong> a necessidade depôr fim ao processo de exclusão social, paradoxalmente, a imprensamuitas vezes serve para reforçar o status quo. Esta dissertação visa aexplicar como a ideologia está presente <strong>em</strong> todos os segmentos denossa vida, de forma subjacente, atingindo também os meios decomunicação. A imprensa acaba, assim, por refletir <strong>em</strong> seu <strong>discurso</strong> aideologia domi<strong>na</strong>nte, baseando-se no senso comum da sociedade.A partir desta análise, apresentamos as conclusões que foram tiradasacerca da presença de grupos excluídos <strong>na</strong> pauta da imprensa – ouseja, <strong>na</strong> esfera pública – e de que forma se dá o <strong>discurso</strong> midiático<strong>sobre</strong> o indíge<strong>na</strong>. Para <strong>em</strong>preender a análise proposta, tomamos comoreferencial teórico a Teoria do Agenda-setting, que estuda a notíciacomo um fato marcado ideologicamente de modo sublimi<strong>na</strong>r eimperceptível. Ainda como arcabouço teórico da pesquisa, estadissertação parte da perspectiva da Análise do Discurso Francesa, quenos ajuda a observar o <strong>discurso</strong> como a expressão de várias vozessociais (polifonia). O silenciamento de determi<strong>na</strong>dos sujeitos e ascaracterísticas do <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico são a<strong>na</strong>lisadas segundo estasduas perspectivas teóricas.O objeto de estudo desta dissertação é o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico <strong>sobre</strong> oindíge<strong>na</strong> <strong>na</strong> imprensa <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco. Para isso, foi feita umaretrospectiva da chegada dos portugueses ao País, do início dosilenciamento do <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong> <strong>na</strong> história, a formação daidentidade brasileira e o pensamento vigente <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> noimaginário social.5


AbstractPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOThe Jour<strong>na</strong>lism has a fundamental function to product knowledge andto connect our society. In public sphere, the media became alegitimized place to debate issues with greater or smaller influencenowadays. Even after a pretended thought about the necessity to endthe social exclusion, in fact, the media works to maintain the statusquo. This thesis aims the expla<strong>na</strong>tion how ideology is present in ourlives, reaching the means of communication too. So, the media reflectsin its discourse the domi<strong>na</strong>nt ideology, based on common sense of thesociety.In this a<strong>na</strong>lysis, we present the conclusions we can have about theexcluded groups in media <strong>agenda</strong> – or in public sphere – and howmedia discourse talks about indigenous people. To make the a<strong>na</strong>lysis,we based this thesis in two theories: the Agenda-setting Theory, andFrance Discourse A<strong>na</strong>lysis. The first one talks about news as a fact thatis marked ideologically, but not perceptible. Yet as a theory in thisissue, we study the France Discourse A<strong>na</strong>lysis, that sees the discourseas an expression of a lot of social voices (polyphony). The silence fromsome subjects and the characters of the media discourse are a<strong>na</strong>lyzedbehind these two theories.The object of this thesis is media discourse about indigenous people inPer<strong>na</strong>mbuco press. To do so, we made a retrospective about thearriving of Portuguese People in Country, the beginning of indigenoussilence in the History, the Brazilian identity formation and the thoughtabout indigenous social imagi<strong>na</strong>tion.6


ÍndicePROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOIntrodução 09I. Hipótese, objetivo e corpus da pesquisa 09II. Justificativa da escolha do <strong>índio</strong> como segmento a serpesquisado 10III. Referencial teórico 12IV. Metodologia 151. Ideologia, senso comum e os meios de comunicação social 161.1. Esfera pública, espaço que não se concretiza 251.2. Representações sociais e manipulação da história 291.3. Campos sociais e segmentos excluídos 372. A notícia 442.1. Agenda dos meios de comunicação, espaço parahierarquias 472.2. Imprensa: efeito de <strong>agenda</strong> 522.3. Seleção de notícias: formação da <strong>agenda</strong> midiática 552.4. O sujeito autor, o gatekeeper e o newsmaking 582.5. Critérios de noticiabilidade: produzindo o jor<strong>na</strong>la partir dos valores-notícia 662.6. Urgência do texto: atendendo às necessidadesbásicas do leitor comum 752.7. Gêneros jor<strong>na</strong>lísticos: as formas de apresentaçãoda notícia 763. O sujeito e o <strong>discurso</strong> 823.1. O sujeito e o outro 843.2. Heterogeneidades discursivas 853.3. O sujeito ativo 893.4. O sujeito passivo, aquele de qu<strong>em</strong> se fala:o silêncio do sujeito 913.5. Falando <strong>em</strong> <strong>discurso</strong>s 953.6. O <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico 974. Comunidades indíge<strong>na</strong>s: o <strong>índio</strong> como sujeitopassivo da história 1024.1. A formação da identidade brasileira 1054.2. O senso comum e o imaginário <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> 1104.3. O <strong>discurso</strong> religioso <strong>na</strong> História do Brasil:a campanha da fraternidade 2002 1134.4. Quadro histórico-geográfico dos <strong>índio</strong>s <strong>em</strong>Per<strong>na</strong>mbuco 1185. O <strong>índio</strong> <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco: <strong>discurso</strong> e representação 1235.1. Processo de Análise 1235.1.1. Indicadores do <strong>discurso</strong> 1245.1.1.1. Verbos Introdutores de Opinião 1257


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5.1.1.2. O Discurso Relatado: o Uso de Aspas 1275.1.1.3. Marcas de Heterogeneidade 1295.1.2 Tipos de Fonte 1305.1.2.1. Fonte Ativa 1305.1.2.2. Fonte Passiva 1325.1.3. Tipos de Discurso 1335.1.3.1. Discurso Lúdico 1335.1.3.2. Discurso Autoritário ou Discurso do Poder 1335.1.3.2. Discurso Polêmico 1345.2. Quando e como o <strong>índio</strong> é notícia: quadrosestatísticos do <strong>agenda</strong>mento midiático 1355.2.1. Quadro 1 – Jor<strong>na</strong>l do Commercio:gêneros X editorias 1375.2.2. Quadro 2 – Diario de Per<strong>na</strong>mbuco:gêneros X editorias 1385.2.3. Quadro 3 – Jor<strong>na</strong>l do Commercio:t<strong>em</strong>as X editorias 1395.2.4. Quadro 4 – Diario de Per<strong>na</strong>mbuco:t<strong>em</strong>as X editorias 1415.2.5. Quadro 5 – Jor<strong>na</strong>l do Commercio:t<strong>em</strong>as X gêneros 1435.2.6. Quadro 6 – Diario de Per<strong>na</strong>mbuco:t<strong>em</strong>as X gêneros 1455.3. Análise dos quadros estatísticos 1475.4. O <strong>índio</strong> como fonte jor<strong>na</strong>lística: <strong>discurso</strong> e<strong>agenda</strong>mento <strong>na</strong> imprensa <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco 149Conclusão 184Bibliografia 190Anexo I: Índice t<strong>em</strong>atizado de notícias 199Anexo II: Corpus específico da pesquisa 2138


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOIntroduçãoI. Hipótese, objetivo e corpus da pesquisaO jor<strong>na</strong>lismo passou a ter um papel fundamental <strong>na</strong> produção deconhecimento e <strong>na</strong> formação de consensos. Dentro da esfera pública,os meios de comunicação tor<strong>na</strong>ram-se a are<strong>na</strong> de debates de assuntosde maior ou menor influência no dia-a-dia. A seleção dos fatos a ser<strong>em</strong>noticiados, a forma de divulgação e o debate gerado por sua difusãosão el<strong>em</strong>entos da imprensa moder<strong>na</strong>, que chega hoje de formamassiva a toda a sociedade.A imprensa t<strong>em</strong> uma característica que define a sua legitimidade <strong>na</strong>sociedade: sua tarefa é delegada pelos vários segmentos sociais,tor<strong>na</strong>ndo-a um veículo de representação discursiva desses segmentos.Na realidade, porém, observa-se que alguns setores parec<strong>em</strong> ter umadimensão maior, conseguindo se <strong>sobre</strong>ssair no espaço dos meios decomunicação.Embora haja um aparente consenso de que é preciso pôr fim àexclusão social, paradoxalmente, a imprensa muitas vezes reforça ostatus quo. O esforço de vários segmentos – <strong>sobre</strong>tudo entidades nãogover<strong>na</strong>mentaise outras instituições de caráter social - ainda não foisuficiente para reduzir o quadro de exclusão social. A hipótese destetrabalho é de que alguns segmentos sociais são relativamenteimpotentes e têm pouca ou nenhuma influência <strong>sobre</strong> os meios decomunicação, sendo sist<strong>em</strong>aticamente excluídos e silenciados no<strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico.Entre os sujeitos que se enquadram nesta perspectiva, estão ascomunidades indíge<strong>na</strong>s. Tanto <strong>em</strong> nível <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l como regio<strong>na</strong>l, o <strong>índio</strong>parece não estar conseguindo se expressar de modo ativo através dosmeios de comunicação, ou seja, parece integrar o <strong>agenda</strong>-setting da9


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO<strong>mídia</strong> dentro de outros t<strong>em</strong>as considerados mais relevantes pelaimprensa. O objeto de estudo desta dissertação é o <strong>discurso</strong> midiático,com um recorte específico <strong>sobre</strong> o <strong>discurso</strong> do <strong>índio</strong> <strong>na</strong> imprensaper<strong>na</strong>mbuca<strong>na</strong>.No veículo de comunicação, faz-se a transposição de fatos <strong>na</strong>rradosrepletos de significados, que r<strong>em</strong>et<strong>em</strong> aos vários sist<strong>em</strong>as de valores<strong>em</strong> circulação <strong>na</strong> sociedade. Se o jor<strong>na</strong>l diário não é – e n<strong>em</strong> poderiaser – a realidade que viv<strong>em</strong>os todos os dias, mas a representaçãodesta realidade, o que l<strong>em</strong>os <strong>na</strong> edição diária n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre é a quebrade estigmas. Ao contrário, a imprensa acaba por reproduzir e reforçaros valores domi<strong>na</strong>ntes. O objetivo desta dissertação é justamenteidentificar as formas de representação discursiva das comunidadesindíge<strong>na</strong>s per<strong>na</strong>mbuca<strong>na</strong>s <strong>na</strong> imprensa escrita do Estado, verificando apresença de t<strong>em</strong>as relacio<strong>na</strong>dos aos <strong>índio</strong>s <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> midiática.O corpus da pesquisa engloba textos jor<strong>na</strong>lísticos de julho de 2001 aabril de 2002, publicados nos jor<strong>na</strong>is Diario de Per<strong>na</strong>mbuco e Jor<strong>na</strong>l doCommercio. Como o espectro da pesquisa é amplo, reunindo 127textos jor<strong>na</strong>lísticos, decidimos escolher um total de 23 do total denotícias catalogadas, visando a cont<strong>em</strong>plar de modo equilibrado osvários gêneros jor<strong>na</strong>lísticos existentes – reportag<strong>em</strong>, editorial, fotolegenda,artigo, nota, nota comentada e carta à redação – e os t<strong>em</strong>asdo <strong>agenda</strong>mento verificados no período pesquisado, de modo a obteruma análise o mais objetiva e ampla possível. Em anexo à dissertação,segue um índice t<strong>em</strong>atizado das notícias do período estudado e ascópias dos textos jor<strong>na</strong>lísticos a<strong>na</strong>lisados.II. Justificativa da escolha do <strong>índio</strong> comosegmento a ser pesquisadoA escolha dos <strong>índio</strong>s per<strong>na</strong>mbucanos neste estudo se deve ao fato derepresentar<strong>em</strong> a quarta população indíge<strong>na</strong> do Brasil, perdendo10


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOape<strong>na</strong>s para as comunidades existentes nos estados do Amazo<strong>na</strong>s, doMato Grosso (norte e sul) e do Pará, o que coloca este segmento comorepresentativo de uma parcela da população do Estado e do País. Nocaso desta pesquisa, não foi escolhida uma etnia específica, a<strong>na</strong>lisandode modo geral a representatividade social e o <strong>discurso</strong> do <strong>índio</strong> <strong>na</strong>imprensa per<strong>na</strong>mbuca<strong>na</strong>.É curioso observar que, no período definido para o corpus da pesquisa(quando foi realizada a coleta de textos jor<strong>na</strong>lísticos <strong>na</strong> imprensa dePer<strong>na</strong>mbuco), ocorreu o lançamento da Campanha da Fraternidade de2002 pela Igreja Católica, que teve como t<strong>em</strong>a a questão indíge<strong>na</strong> noBrasil: Fraternidade e Povos Indíge<strong>na</strong>s. Esta iniciativa contribuiu pararatificar a escolha do nosso objeto de estudo. Assim, achamos sensatoverificar também, nos textos jor<strong>na</strong>lísticos publicados durante olançamento da campanha, se a Igreja conseguiu influenciar o<strong>agenda</strong>mento da imprensa com relação aos probl<strong>em</strong>as indíge<strong>na</strong>s e suarelação com o branco 1 , de modo a reforçar o objetivo de análiseproposta.Três outros fatos significativos também ocorreram durante a coleta dedados: o líder xucuru Chico Quelé foi assassi<strong>na</strong>do, os quatro rapazesacusados pela morte do <strong>índio</strong> Galdino, <strong>em</strong> Brasília, foram julgados, ehouve a tentativa de prisão do <strong>índio</strong> Paulinho Paiakan, acusado deestuprar uma professora no Pará. Outros episódios de repercussão –como a prisão do acusado da morte do cacique Xicão, também xucuru– ocorreram no período da pesquisa. Todos estes fatos ajudaram aconstruir o corpus da dissertação, tor<strong>na</strong>ndo-se indicativos daimportância da escolha do segmento indíge<strong>na</strong> como el<strong>em</strong>ento depesquisa.1 Ressalvo que estou utilizando o termo “branco” no decorrer desta dissertação como um termoreferencial para efetivar uma determi<strong>na</strong>ção sociocultural, uma identidade <strong>em</strong> contraste com aidentidade indíge<strong>na</strong>, ou seja, para separar <strong>índio</strong>s e não <strong>índio</strong>s, como faz Maria Hele<strong>na</strong> OrtolanBastos (2001).11


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOIII. Referencial teóricoAo realizarmos esta pesquisa, partimos da pr<strong>em</strong>issa de que todo<strong>discurso</strong> é heterogêneo constitutivamente, ou seja, compõe-se devárias vozes para sua formação. Também no <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico, osvários segmentos sociais expressam suas representações e valores,compondo o texto midiático. Embora a edição do jor<strong>na</strong>l busque daruma homogeneidade a este texto, a própria <strong>mídia</strong> t<strong>em</strong> uma “funçãocitativa” que denuncia seu caráter heterogêneo.Além deste caráter básico de reunir e viabilizar <strong>discurso</strong>s, o <strong>discurso</strong>jor<strong>na</strong>lístico t<strong>em</strong> uma compreensão t<strong>em</strong>atizada do dia-a-dia: os fatosacontec<strong>em</strong> e são compreendidos a partir de grandes t<strong>em</strong>as que sãopré-definidos pela <strong>mídia</strong>. Este <strong>agenda</strong>mento sugere que assuntos sãoincluídos e excluídos da pauta jor<strong>na</strong>lística, segundo o nível de impactodo fato e o grau hierárquico dos indivíduos envolvidos no eventonoticiável.Esta dissertação se compõe de análises quantitativa e qualitativa, apartir de duas perspectivas teóricas apresentadas: a Teoria doAgenda-setting e a Análise do Discurso Francesa (AD). A Teoria doAgenda-setting se fundamenta no princípio de que a imprensaselecio<strong>na</strong> e lista uma série de t<strong>em</strong>as e os hierarquiza, de modo adefinir o que é e o que não é notícia, formando a <strong>agenda</strong> midiática. Jáa Análise do Discurso Francesa (AD) é uma linha de pesquisa daLingüística que estuda <strong>discurso</strong>s a partir de uma perspectivaideológica, psicológica e estrutural. A AD estuda enunciados e suapercepção dentro das várias formações discursivas, de acordo com aprática discursiva do sujeito que fala.Para que estas duas teorias foss<strong>em</strong> utilizadas adequadamente noprocesso de análise, alguns conceitos fundadores – como ideologia,senso comum, processo de construção da notícia, sujeito e <strong>discurso</strong> –12


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOtiveram que ser pesquisados e apresentados nesta dissertação. Estetrabalho está, assim, dividido nos seguintes capítulos:Capítulo 1 – Ideologia, senso comum e os meios de comunicação socialT<strong>em</strong> como objetivo explicar como a ideologia está presente <strong>em</strong> todosos segmentos de nossa vida, de forma subjacente, atingindo tambémos meios de comunicação. A imprensa acaba, assim, por refletir <strong>em</strong>seu <strong>discurso</strong> a ideologia domi<strong>na</strong>nte, baseando-se no senso comum dasociedade. Neste capítulo, trabalhamos com Louis Althusser, MichèleBarrett, Mikhail Bakhtin, Pierre Bordieu, Marile<strong>na</strong> Chauí, MichelFoucault, Jürgen Harbermas, Antonio Gramsci, Denise Jodelet, SandraJovchelovitch, Sheva Maia da Nóbrega, Adriano Rodrigues Duarte,Slavoj Zizek, Hughes Portelli, entre outros autores.Capítulo 2 – A notíciaAqui, a Teoria do Agenda-setting é esclarecida segundo seuselaboradores. A compreensão da notícia e como ela se apresenta nosmeios de comunicação, como a ideologia permeia o trabalho dojor<strong>na</strong>lista <strong>na</strong> produção do seu texto, como se dá a seleção de notícias equais os critérios de noticiabilidade. Alguns autores estudados nestecapítulo são Mauro Wolf, Michael Kunczik, Miquel Rodrigo Alsi<strong>na</strong>, Teunvan Dijk, Cr<strong>em</strong>ilda Medi<strong>na</strong>, Cristi<strong>na</strong> Teixeira de Melo, Isalti<strong>na</strong> de MelloGomes, Wilma Morais, Lorenzo Gomis, Mar de Fontcuberta, Sérgio LuizGadini, Jorge Pedro de Sousa, Nelson Traqui<strong>na</strong>, João Carlos Correia,José Marques de Melo, Sonia Fernández Parratt, G. Martín Vivaldi.Capítulo 3 – O sujeito e o <strong>discurso</strong>Como o sujeito é a<strong>na</strong>lisado, dentro da perspectiva da Análise doDiscurso Francesa. O <strong>discurso</strong> como a expressão de várias vozes(polifonia), sejam elas expressas ou constitutivas. O silenciamento dedetermi<strong>na</strong>dos sujeitos e as características do <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico13


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOsegundo a AD. Nesta parte, trabalhamos com Eni Orlandi, DominiqueMaingueneau, Jacqueline Authier-Revuz, Sírio Possenti, MichelPêcheux, Norman Fairclough, José Luiz Fiorin, entre outros autores.Capítulo 4 – Comunidades indíge<strong>na</strong>s: o <strong>índio</strong> como sujeito passivo dahistóriaA chegada dos portugueses ao Brasil e o início do silenciamento do<strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong>. A formação da identidade brasileira e o pensamentovigente <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> no imaginário brasileiro. Como o <strong>discurso</strong>religioso participou do processo de domi<strong>na</strong>ção do indíge<strong>na</strong> e como aIgreja Católica modificou este <strong>discurso</strong>, visando pautar a <strong>mídia</strong> para aquestão dos <strong>índio</strong>s. Os autores pesquisados neste capítulo foramRodrigo de Azeredo Grünewald, João Pacheco de Oliveira, Edson Silva,Eni Orlandi, Maura Pen<strong>na</strong>, Vânia Fialho e Souza, Regi<strong>na</strong> Vieira, SôniaMaria Ramires Almeida, Gilda Araújo e Mary Francisca do Careno, JoséMaurício Andion Arruti, Alfredo Bosi.Capítulo 5 – O <strong>índio</strong> <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco: <strong>discurso</strong> erepresentaçãoAqui, será descrito o processo de análise dos textos jor<strong>na</strong>lísticosselecio<strong>na</strong>dos, quando será feito um estudo do <strong>discurso</strong> midiático, apartir das duas perspectivas teóricas (Análise do Discurso Francesa eTeoria do Agenda-setting). Quando o <strong>índio</strong> é notícia e como se dá o<strong>discurso</strong> <strong>sobre</strong> ele <strong>na</strong> imprensa será o foco deste capitulo. Para esteestudo, duas categorias de análise foram elaboradas: fonte ativa efonte passiva, que serão alicerçadas por outros critérios de análiseestudados no decorrer da dissertação. Os vários autores estudadospara a construção deste capítulo inclu<strong>em</strong> Eni Orlandi, Luiz AntônioMarcuschi, Antônio Fausto Neto, Maria José Alfaro Freire, Maria Hele<strong>na</strong>Ortolan Matos.14


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOCapítulo 6 – conclusãoA partir desta análise, apresentamos as conclusões que foram tiradasacerca da presença de grupos excluídos <strong>na</strong> pauta da imprensa – ouseja, <strong>na</strong> esfera pública – e de que forma se dá o <strong>discurso</strong> midiático<strong>sobre</strong> o indíge<strong>na</strong>.IV. MetodologiaO método de análise desta dissertação partiu de conceitos jáfundamentados nos Estudos do Jor<strong>na</strong>lismo – a noção de fontejor<strong>na</strong>lística – e da Análise do Discurso – a noção de sujeito. A partir daconexão entre estas definições foi elaborado o conceito de fonte ativae fonte passiva. Esta definição, associada ao estudo <strong>sobre</strong> <strong>discurso</strong>s,servirá para organizar o processo de análise realizado nesta pesquisa.A explicitação de toda a metodologia está claramente esboçada nocapítulo 5 desta dissertação. É importante, porém, salientar que oprocesso a<strong>na</strong>lítico desta dissertação foi construído a partir dosel<strong>em</strong>entos estudados ao longo da pesquisa, numa tentativa de reunirpressupostos teóricos que favorecess<strong>em</strong> a análise possível da presençadiscursiva do <strong>índio</strong> <strong>na</strong> imprensa de Per<strong>na</strong>mbuco.15


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO1. Ideologia, senso comum e os meios decomunicação socialA ideologia é uma força quase imperceptível que permeia as relaçõessociais, uma representação de mundo, a partir da visão da classedomi<strong>na</strong>nte. A ideologia não representa, assim, a totalidade dopensamento de uma época, mas a parte que se <strong>sobre</strong>ssai por ser frutodas idéias de um ou de alguns grupos que detêm o poder político,cultural e econômico. Segundo Marile<strong>na</strong> Chauí, "o que tor<strong>na</strong> possível aideologia é a luta de classes, a domi<strong>na</strong>ção de uma classe <strong>sobre</strong> asoutras"(CHAUÍ, 1980: 87). De acordo com ela, "o que faz da ideologiauma força quase impossível de ser destruída é o fato de que adomi<strong>na</strong>ção real é justamente aquilo que a ideologia t<strong>em</strong> por fi<strong>na</strong>lidadeocultar" (CHAUÍ, 1980: 87).Assumindo o papel de ser a “imag<strong>em</strong> e s<strong>em</strong>elhança” do pensamentoque predomi<strong>na</strong> <strong>em</strong> toda a sociedade, a ideologia está impreg<strong>na</strong>da <strong>em</strong>todo lugar, nos <strong>discurso</strong>s, no comportamento social. Essa definiçãomarxista de ideologia indica porque ela prevalece sob o véu que amascara. Ainda segundo Marile<strong>na</strong> Chauí (1980), “a ideologia resulta daprática social dos homens no momento <strong>em</strong> que estes representampara si mesmos essa atividade, e vimos que essa representação és<strong>em</strong>pre necessariamente invertida” (CHAUÍ, 1980: 92). A consciênciahuma<strong>na</strong> está impreg<strong>na</strong>da de conteúdo ideológico, o que ocorre noprocesso de interação social. Para Mikhail Bakhtin (1992a):“A consciência adquire forma e existência nossignos criados por um grupo organizado no cursode suas relações sociais. Os signos são o alimentoda consciência individual, a matéria de seudesenvolvimento, e ela reflete sua lógica e suasleis. A lógica da consciência é a lógica dacomunicação ideológica, da interação s<strong>em</strong>iótica de16


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOum grupo social. Se privarmos a consciência de seuconteúdo s<strong>em</strong>iótico e ideológico, não sobra <strong>na</strong>da. Aimag<strong>em</strong>, a palavra, o gesto significante, etc.constitu<strong>em</strong> seu único abrigo”. (BAKHTIN, 1992a:35-36).Tudo que é ideológico possui um significado e se relacio<strong>na</strong> com algoque se encontra fora de si mesmo. Para Bakhtin, s<strong>em</strong> signos nãoexiste ideologia. Ele afirma que “cada signo ideológico é não ape<strong>na</strong>sum reflexo, uma sombra da realidade, mas também um fragmentomaterial dessa realidade” (BAKHTIN, 1992a: 33). Sendo fragmento,parte da realidade, e não sua totalidade, a ideologia escamoteia essarealidade <strong>na</strong> medida <strong>em</strong> que faz os m<strong>em</strong>bros da sociedade acreditar<strong>em</strong>que as idéias domi<strong>na</strong>ntes somam o todo dos pensamentos autônomosdos vários segmentos sociais, e não o que verdadeiramente são: opensamento dos grupos que se <strong>sobre</strong>ssa<strong>em</strong> política e economicamentee que, através da ideologia, faz<strong>em</strong> prevalecer a ord<strong>em</strong> social vigentecomo fruto de forças alheias à vontade huma<strong>na</strong> – ou seja, submetidaàs forças <strong>sobre</strong><strong>na</strong>turais que, segundo Marile<strong>na</strong> Chauí, seriam "deuses,Natureza, Razão, Estado, destino, etc."(CHAUÍ, 1980: 86-87). KarlMarx e Frederich Engels, <strong>em</strong> A Ideologia Al<strong>em</strong>ã, ressaltam (MARX &ENGELS, apud CHAUÍ, 1980):“as idéias da classe domi<strong>na</strong>nte são, <strong>em</strong> cada época,as idéias domi<strong>na</strong>ntes, isto é, a classe que é a forçamaterial domi<strong>na</strong>nte da sociedade é, ao mesmot<strong>em</strong>po, sua força espiritual (...) Na medida <strong>em</strong> quedomi<strong>na</strong>m como classe e determi<strong>na</strong>m todo o âmbitode uma época histórica, é evidente que o façam <strong>em</strong>toda a sua extensão e, conseqüent<strong>em</strong>ente, entreoutras coisas, domin<strong>em</strong> também como pensadores,como produtores de idéias; que regul<strong>em</strong> a produçãoe distribuição de idéias de seu t<strong>em</strong>po e que suasidéias sejam, por isso mesmo, as idéias domi<strong>na</strong>ntes17


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOda época” (MARX & ENGELS, 1965: 14, apudCHAUÍ, 1980,93).Este conceito é reforçado por Slavoj Zizek, para qu<strong>em</strong> "estamos dentrodo espaço ideológico propriamente dito no momento <strong>em</strong> que esseconteúdo - 'verdadeiro' ou 'falso' (se verdadeiro, tanto melhor para oefeito ideológico) - é funcio<strong>na</strong>l com respeito a alguma relação dedomi<strong>na</strong>ção social ('poder', 'exploração') de maneira intrinsecamentenão transparente: para ser eficaz, a lógica de legitimação da relaçãode domi<strong>na</strong>ção t<strong>em</strong> que permanecer oculta" (ZIZEK, 1996: 13-14). E,fazendo-se oculta, a ideologia se encobre, disfarçando-se de verdade.Assim, a ideologia é uma comunicação distorcida da realidade, que sepropaga através de um texto (fala ou escrita) impreg<strong>na</strong>do deinteresses inconfessos – de domi<strong>na</strong>ção e de prevalência de vontades.Neste <strong>discurso</strong>, existe uma lacu<strong>na</strong> que separa seu sentido público“oficial” e sua verdadeira intenção. (ZIZEK, 1996: 16). E a intenção daideologia é se fazer passar por um pensamento consensual do conjuntoda sociedade, quando <strong>na</strong> verdade retrata ape<strong>na</strong>s os valores e idéias dogrupo domi<strong>na</strong>nte, fazendo-os vingar e prevalecer <strong>sobre</strong> todas asoutras formas de pensamento. Para Bakhtin, “a classe domi<strong>na</strong>ntetende a conferir ao signo ideológico um caráter intangível e acima dasdiferenças de classe, a fim de abafar ou de ocultar a luta dos índicessociais de valor que aí se trava, a fim de tor<strong>na</strong>r o signo monovalente”(BAKHTIN, 1992a: 47). Ele alerta ainda:“Esta dialética inter<strong>na</strong> do signo não se revelainteiramente a não ser <strong>na</strong>s épocas de crise social ede comoção revolucionária. Nas condições habituaisda vida social, esta contradição oculta <strong>em</strong> todosigno ideológico não se mostra à descobertaporque, <strong>na</strong> ideologia domi<strong>na</strong>nte estabelecida, osigno ideológico é s<strong>em</strong>pre um pouco reacionário etenta, por assim dizer, estabilizar o estágio anteriorda corrente dialética da evolução social e valorizar a18


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOverdade de ont<strong>em</strong> como sendo válida hoje <strong>em</strong> dia.Donde o caráter refratário e deformador do signoideológico nos limites da ideologia domi<strong>na</strong>nte”(BAKHTIN, 1992a: 47) [destaque nosso].No conjunto dos meios produtivos da sociedade, também os meios decomunicação estão maculados pela ideologia e pelo <strong>em</strong>bate de forçasentre os vários segmentos sociais, entre eles o segmento indíge<strong>na</strong>.Segundo Chauí, "a ideologia consiste <strong>na</strong> transformação das idéias daclasse domi<strong>na</strong>nte <strong>em</strong> idéias domi<strong>na</strong>ntes para a sociedade como umtodo, de modo que a classe que domi<strong>na</strong> no plano material (econômico,social e político) também domine no plano espiritual (dasidéias)"(CHAUÍ, 1980: 93-94). Em decorrência da divisão de classes dasociedade e da prevalência de umas <strong>sobre</strong> as outras, o que se observaé que as idéias difundidas como sendo da maioria são, <strong>na</strong> verdade, opensamento imposto pelo grupo domi<strong>na</strong>nte, assumidas como válidas,verdadeiras e racio<strong>na</strong>is pelos vários outros setores, mesmo os quepossu<strong>em</strong> diferenças culturais, como os indíge<strong>na</strong>s (ver capítulo 4). Deacordo com Chauí:"Para que todos os m<strong>em</strong>bros da sociedade seidentifiqu<strong>em</strong> com essas característicassupostamente comuns a todos, é preciso que elassejam convertidas <strong>em</strong> idéias comuns a todos. Paraque isso ocorra é preciso que a classe domi<strong>na</strong>nte,além de produzir suas próprias idéias, tambémpossa distribuí-las, o que é feito, por ex<strong>em</strong>plo,através da educação, da religião, dos costumes, dosmeios de comunicação disponíveis" (CHAUÍ, 1980:94) [destaque nosso].Mesmo que ocorram movimentos sociais para tentar reverter umquadro de domi<strong>na</strong>ção, s<strong>em</strong>pre prevalece a ideologia domi<strong>na</strong>nte porqueos intelectuais responsáveis por se colocar<strong>em</strong> contra a burguesia19


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOmuitas vezes acabam por defender idéias que são aceitas pelas classessubalter<strong>na</strong>s, que se acham incapazes de dirigir seu própriopensamento. Esse fenômeno de permanência das idéias domi<strong>na</strong>ntesmesmo nos momentos de luta contra a classe domi<strong>na</strong>nte é acaracterística fundamental do que Gramsci chama de heg<strong>em</strong>onia, ou “opoder espiritual da classe domi<strong>na</strong>nte" (CHAUÍ, 1980: 97). Aheg<strong>em</strong>onia é justamente a conservação da validade das idéias evalores dos domi<strong>na</strong>ntes, até quando se t<strong>em</strong> a percepção da domi<strong>na</strong>çãoe se luta contra ela. Michèle Barrett assim define a heg<strong>em</strong>oniagramscista:"A melhor maneira de entender a heg<strong>em</strong>onia écomo a organização do consentimento: osprocessos pelos quais se constro<strong>em</strong> formassubordi<strong>na</strong>das de consciência, s<strong>em</strong> recurso àviolência ou à coerção" (BARRETT, 1996: 238, inZIZEK 1996) [destaque nosso].Como instrumento de domi<strong>na</strong>ção, a ideologia está no pensamento detodos os m<strong>em</strong>bros da sociedade, e aparece como sendo o pensamentopróprio de cada um. Segundo Chauí, "falar <strong>em</strong> ideologia dosdomi<strong>na</strong>dos é um contra-senso, visto que a ideologia é um instrumentode domi<strong>na</strong>ção". 2 (CHAUÍ, 1980: 115). Isso ocorre, por ex<strong>em</strong>plo, nosjor<strong>na</strong>is, onde jor<strong>na</strong>listas se ilud<strong>em</strong> ao pensar <strong>na</strong> liberdade de imprensacomo uma forma de lutar contra a ideologia domi<strong>na</strong>nte. MichaelKunczik (1997) afirma que "uma das grandes ilusões de muitosprincipiantes é a idéia de que os jor<strong>na</strong>listas sejam livres eindependentes" (KUNCZIK, 1997: 18). É que não se pode perder devista que os jor<strong>na</strong>listas são <strong>em</strong>pregados dos meios de comunicação e aeles têm que se submeter e acatar os níveis de hierarquia. Aceitar osníveis de autoridade é obedecer à ideologia dos meios de comunicação,2 Marile<strong>na</strong> Chauí afirma que "esses enganos nos faz<strong>em</strong> sair da concepção marxista de ideologiapara cairmos <strong>na</strong> concepção positivista de ideologia" (CHAUÍ, 1980, 115). Segundo ela, somentese pode contrapor ideologia e crítica à ideologia (op. cit.).20


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOfazendo, assim, com que as idéias do grupo domi<strong>na</strong>nte prevaleçam <strong>na</strong><strong>mídia</strong> como idéias universais, legitimando uma linha de pensamento efacilitando o processo político, cultural e econômico vigente. HughesPortelli (1977) ressalta que, segundo a análise de Gramsci <strong>sobre</strong>heg<strong>em</strong>onia, exist<strong>em</strong> três tipos de grupos sociais no interior do blocohistórico 3 :"por um lado, a classe fundamental que dirige osist<strong>em</strong>a heg<strong>em</strong>ônico; por outro lado, os gruposauxiliares que serv<strong>em</strong> de base social à heg<strong>em</strong>onia ede viveiro para seu pessoal; enfim, excluídas dosist<strong>em</strong>a heg<strong>em</strong>ônico, as classes subalter<strong>na</strong>s"(PORTELLI, 1977: 80).Seguindo esta classificação gramscista, pod<strong>em</strong>os identificar claramenteos meios de comunicação entre os grupos auxiliares que "serv<strong>em</strong> debase social à heg<strong>em</strong>onia". Louis Althusser, baseado <strong>em</strong> Gramsci,incluiu os meios de comunicação social como um Aparelho Ideológicode Estado (AIE), distinguindo-o dos Aparelhos Repressivos de Estadopor não usar a violência no processo de convencimento. Pela visãoalthusseria<strong>na</strong> (ALTHUSSER, 1970, in ZIZEK, 1996), a <strong>mídia</strong> seconstitui <strong>em</strong> uma instituição ideológica que funcio<strong>na</strong> pela ideologia, ouseja, reproduz a ideologia domi<strong>na</strong>nte, visando assegurar umaharmonia, às vezes tensa, entre as classes e o poder estatal. Eficiente<strong>na</strong> difusão das idéias domi<strong>na</strong>ntes, a <strong>mídia</strong> des<strong>em</strong>penha o papel decontribuir <strong>na</strong> coerção das classes subalter<strong>na</strong>s através da difusão dopensamento domi<strong>na</strong>nte. Para Sousa, a Teoria da Heg<strong>em</strong>onia de3 De acordo com Portelli (1977), o conceito de bloco histórico, fundamental para o pensamentogramscista, é de que ele seria o conjunto das relações entre estrutura e superestrutura (ou seja,das classes dependentes das forças produtivas e da classe domi<strong>na</strong>nte, que detém as forçaspolíticas de uma sociedade), vinculadas organicamente pelos intelectuais, especialistasresponsáveis pela organização da superestrutura ideológica, jurídica e política da sociedade <strong>em</strong>questão num dado período <strong>em</strong> que uma classe dirigente se mantém <strong>na</strong> domi<strong>na</strong>ção. Com a quedadessa classe, a desagregação da heg<strong>em</strong>onia e a substituição por outro grupo domi<strong>na</strong>nte, t<strong>em</strong>início um novo bloco histórico e assim sucessivamente.21


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOGramsci ajuda a entender o papel da <strong>mídia</strong> como contribuinte dasuperestrutura ideológica domi<strong>na</strong>nte:“Toda a sociedade contribuiria para que aheg<strong>em</strong>onia ideológica <strong>sobre</strong>vivesse e seexpandisse, uma vez que essa heg<strong>em</strong>oniadecorreria da capacidade modeladora da ideologiadomi<strong>na</strong>nte enquanto sist<strong>em</strong>a de interpretação e designificação usado globalmente pelo meio social.Neste campo, a comunicação jor<strong>na</strong>lística, ao darvisibilidade ape<strong>na</strong>s a certos acontecimentos ecertas idéias e ao participar nos processos deinterpretação e de significação construídos <strong>sobre</strong>esses acontecimentos e <strong>sobre</strong> essas idéias seriauma das mais importantes forças de sustentação eamplificação da ideologia domi<strong>na</strong>nte e heg<strong>em</strong>ônica”.(SOUSA, 1999: 75) [destaque nosso].Para Stuart Hall, é fundamental o estudo da ideologia para acompreensão da estrutura social de poder. Em 1980, Hall descreveuassim as funções dos meios de comunicação social:“1. Provimento e construção seletiva doconhecimento social através do qual perceb<strong>em</strong>os omundo, as realidades vividas de outros, ereconstruímos imagi<strong>na</strong>riamente a sua vida e anossa num mundo global inteligível. Assiste-se,assim, a integração dos fragmentos informativosnum todo;2. Refletir e refletir-se nessa pluralidade, provendoum inventário constante dos léxicos, estilo de vida eideologias objetivadas. Estas ideologias sãoentendidas como estruturas ideológicas depensamento e de significação que se impõ<strong>em</strong> às22


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpessoas s<strong>em</strong> que estas se consciencializ<strong>em</strong> do fato.Assim, a comunicação social classificaria eorde<strong>na</strong>ria os diferentestipos de conhecimentosocial, providenciando contextos referenciais quecontribu<strong>em</strong> para dar sentido ao mundo;3. Organizar, orquestrar e unir o que se representoue classificou seletivamente. Produz<strong>em</strong>-se consensose constrói-se a legitimidade”. (SOUSA, 1999: 77).Sousa salienta que, segundo Hall, para que essas funções seconcretizass<strong>em</strong>, “a comunicação social reproduziria os <strong>discurso</strong>sdomi<strong>na</strong>ntes através dos quais se dá significado à realidade,perpetuaria as idéias domi<strong>na</strong>ntes através da linguag<strong>em</strong> e dos sist<strong>em</strong>assimbólicos e estruturaria os acontecimentos selecio<strong>na</strong>dos mediantesesqu<strong>em</strong>as ideológicos” (SOUSA, 1999: 77). Sousa cita mais uma vezos estudos de Hall, recordando que, <strong>em</strong> The Rediscovery of ideology:Return of the repressed in media studies, Stuart Hall definiu os meiosde comunicação como produtores e reprodutores de ideologias, apesarde suas pretensões de independência. Na verdade, a imprensaparticipa <strong>na</strong> produção e <strong>na</strong> reprodução da estrutura social: difundindoidéias de forma sist<strong>em</strong>ática, os meios de comunicação acabam porestabelecer a ideologia como senso comum. Segundo Chauí, aideologia (transformada <strong>em</strong> senso comum):"se populariza, tor<strong>na</strong>-se um conjunto de idéias e devalores concate<strong>na</strong>dos e coerentes, aceitos por todosos que são contrários à domi<strong>na</strong>ção existente e queimagi<strong>na</strong>m uma nova sociedade que realize essasidéias e valores. (...) Ou seja, o momento essencialde consolidação social da ideologia ocorre quandoas idéias e valores da classe <strong>em</strong>ergente sãointeriorizados pela consciência de todos osm<strong>em</strong>bros não domi<strong>na</strong>ntes da sociedade".(CHAUÍ,1980: 108).23


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOPara Antonio Gramsci (1978), o senso comum é a vivência do mundofenomênico, quando t<strong>em</strong>os contato ape<strong>na</strong>s com a manifestação, aaparência das coisas, s<strong>em</strong> manter uma ligação de fato com a essênciada coisa <strong>em</strong> si. Esse senso comum constitui-se numa forma depensamento vigente, que domi<strong>na</strong> um ou vários estratos sociais.Segundo Gramsci, um grupo social "se move como um conjuntoorgânico, t<strong>em</strong>, por razões de submissão e subordi<strong>na</strong>ção intelectual,uma concepção <strong>em</strong>prestada por outro grupo e afirmada <strong>em</strong> palavras eque julga seguir, porque a segue <strong>em</strong> t<strong>em</strong>pos normais, ou seja, quandoo comportamento não é independente e autônomo, mas,precisamente, submisso e subordi<strong>na</strong>do". (GRAMSCI, 1978: 23-24).O senso comum se constitui no pensamento que é compartilhado portodos, mesmo os que não tiveram acesso à educação formal, <strong>sobre</strong>assuntos que circulam <strong>na</strong> sociedade, formando idéias préestabelecidas<strong>sobre</strong> fatos, acontecimentos, pessoas. Denise Jodelet(s/d) destaca que o senso comum <strong>em</strong> que se transforma a ideologia é"o conhecimento 'espontâneo', 'ingênuo' que tanto interessa <strong>na</strong>atualidade às ciências sociais, esse que habitualmente se denomi<strong>na</strong>conhecimento de senso comum, ou pensamento <strong>na</strong>tural, por oposiçãoao pensamento científico" (JODELET, s/d: 473) [tradução nossa]. Elaressalta:"Este conhecimento se constitui a partir de nossasexperiências, mas também das informações,conhecimentos e modelos de pensamento quereceb<strong>em</strong>os e transmitimos através da tradição, daeducação e da comunicação social. Deste modo,este conhecimento é, <strong>em</strong> muitos aspectos, umconhecimento socialmente elaborado ecompartilhado" (JODELET, s/d: 473) [tradução edestaque nossos].24


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO1.1 Esfera pública, espaço que não se concretizaPara circular, a ideologia precisa dos meios de comunicação, e é aimprensa que faz os <strong>discurso</strong>s dos vários segmentos sociais ser<strong>em</strong> deconhecimento público. A imprensa ocupa um espaço de destaque <strong>na</strong>formação da esfera pública. De acordo com Jürgen Habermas,(HABERMAS, apud GOMES, W., 1998), a esfera pública seria "o âmbitoda vida social <strong>em</strong> que interesses, vontades e pretensões quecomportam conseqüências concernentes a uma coletividadeapresentam-se discursivamente e argumentativamente de formaaberta e racio<strong>na</strong>l" (HABERMAS, apud GOMES, W., 1998: 155). ParaSandra Jovchelovitch (2000a), "Habermas define a esfera pública comoum espaço <strong>em</strong> que cidadãos se encontram e falam uns com os outrosde forma que garanta acesso a todos. É a esfera onde o princípio datransparência e prestação de contas se desenvolve" (JOVCHELOVITCH,2000a: 69). Assim, idéias somente passariam a ter valor quandoexpressadas através da comunicação, ou seja, através do <strong>discurso</strong> queconsegue circular. Neste espaço, aberto à argumentação, qu<strong>em</strong>participasse do debate ingressaria <strong>na</strong> esfera pública despojado decondições sociais privilegiadas, cargos, títulos ou posição social.Segundo Wilson Gomes:"A paridade prelimi<strong>na</strong>r da esfera pública implica quenela o sujeito se introduz s<strong>em</strong> portar consigo osprivilégios e vantagens extra-discursivos da realezae das posições da hierarquia social, isto é, <strong>na</strong>condição de pessoa privada; ingressa aí <strong>na</strong> condiçãode hom<strong>em</strong> livre, sujeito de razão e consciência".(GOMES, W., 1998: 156).Contrário ao pensamento de Althusser, para Habermas a imprensa nãoserviria para consolidar a ideologia domi<strong>na</strong>nte, mas seria uma formade garantir a <strong>em</strong>ancipação dos indivíduos de todas as formas de25


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdomi<strong>na</strong>ção, ou seja, da ideologia domi<strong>na</strong>nte. Enfatizando o livre<strong>discurso</strong>, ele defende a comunicação como uma força atuante noterreno da crítica à ideologia, rompendo com o consenso existente, eassumindo um compromisso com a verdade, através da validaçãoconsensual. De acordo com Gomes, a imprensa ocuparia um lugarestratégico como instituição e instrumento da esfera pública. Existiriauma vinculação entre <strong>mídia</strong> e público, só havendo de fato a imprensaquando a transmissão regular de informações fosse acessível a todos,independente de classe ou segmento social. Associada à idéia deopinião pública, a imprensa seria instrumento de legitimação dedecisões políticas perante o fórum público. Entretanto, Gomes destacaque, há muito, a esfera pública não existe do modo concebido porHabermas. “Criou-se a ilusão de que a esfera pública moder<strong>na</strong> ter-seiamantido <strong>na</strong>s nossas sociedades, quando <strong>na</strong> verdade ela há muitodeixou de existir enquanto tal, conservando-se ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong> aparência deuma pseudo-esfera pública, ence<strong>na</strong>da, fictícia, cuja característicamaior parece consistir <strong>em</strong> ser domi<strong>na</strong>da pela comunicação e cultura d<strong>em</strong>assas” (GOMES, W., 1998: 162).O projeto i<strong>na</strong>cabado do Iluminismo – que deveria, entre outras coisas,ter consolidado a esfera pública – permitiu que a imprensa (vistainicialmente como um "instrumento privilegiado da esfera pública"GOMES, W., 1998: 164) – se tor<strong>na</strong>sse não <strong>em</strong> um meio de debate dosvários <strong>discurso</strong>s presentes <strong>na</strong> sociedade, mas <strong>em</strong> "um meio decirculação de opiniões estabelecidas às quais se espera uma adesão, omais amplamente possível, de um público reduzido a uma massachamada de t<strong>em</strong>pos <strong>em</strong> t<strong>em</strong>pos a agir plebiscitariamente" (GOMES,W., 1998: 164), situação essa corroborada <strong>em</strong> t<strong>em</strong>pos eleitorais ou <strong>em</strong>momentos de crise econômica. O que se conclui é que a esfera pública,tal como é pensada inicialmente por Habermas, já não existe, <strong>em</strong>boratenha sido inspiradora <strong>na</strong> constituição de vários mecanismos dad<strong>em</strong>ocracia moder<strong>na</strong>, como o voto universal, a liberdade de opinião, ogoverno parlamentar. Para Gomes:26


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO"Na verdade, aqui se pode flagrar a entrada <strong>em</strong>ce<strong>na</strong> de outra forma de publicidade, entendida nãomais como exposição discursiva das posições numdebate acessível a todos os concernidos econduzido com razoabilidade, mas como exposiçãode posições e produtos para os quais se desejaformas concretas de adesão. A diferença entre asduas posições consiste <strong>sobre</strong>tudo <strong>em</strong> que dasegunda estão excluídos seja o debate quanto aracio<strong>na</strong>lidade: as posições são verbalizadas paraconvencer, não para d<strong>em</strong>onstrar dialogicamente.Este convencimento prescinde da discussão e daracio<strong>na</strong>lidade, porque não quer conseguir convicçãológica: precisa, sim, da simpatia da boa vontade, daadesão não importando se a sua orig<strong>em</strong> é racio<strong>na</strong>lou meramente <strong>em</strong>ocio<strong>na</strong>l - por isso serve-se dasedução". (GOMES, W., 1998, 165) [destaquenosso].Se a idéia de Habermas <strong>sobre</strong> esfera pública e <strong>mídia</strong> se firmasse, estateria como exigência que os públicos não foss<strong>em</strong> excludentes, quetodos tivess<strong>em</strong> acesso para dar visibilidade aos seus <strong>discurso</strong>s esist<strong>em</strong>as de valores, dando espaço para que todos pudess<strong>em</strong> falar eser contestados, não havendo como, ocultamente, firmar a ideologiado grupo domi<strong>na</strong>nte. A imprensa, entretanto, ao se referir às minoriasou aos grupos excluídos, t<strong>em</strong> reservado um espaço/t<strong>em</strong>po e dado umtratamento determi<strong>na</strong>do pela predominância discursiva da classedomi<strong>na</strong>nte. O <strong>discurso</strong> midiático - que deveria ser o terreno da crítica àord<strong>em</strong> vigente para romper com o consenso que não seja resultado dedebate público - se transformou <strong>em</strong> um reforço da ideologia domi<strong>na</strong>ntee, assim, da permanência da exclusão de minorias.Para Michel Foucault (1996), a produção do <strong>discurso</strong> <strong>em</strong> todasociedade é controlada e selecio<strong>na</strong>da, visando impedir a sua27


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOmaterialidade. Foucault alerta que “não se t<strong>em</strong> o direito de dizer tudo,que não se pode falar de tudo <strong>em</strong> qualquer circunstância, que qualquerum, enfim, não pode falar de qualquer coisa” (FOUCAULT, 1996: 09).Ele destaca:“Por mais que o <strong>discurso</strong> seja aparent<strong>em</strong>ente b<strong>em</strong>pouca coisa, as interdições que o ating<strong>em</strong> revelamlogo, rapidamente, sua ligação com o desejo e como poder. (...). O <strong>discurso</strong> não é simplesmente aquiloque traduz as lutas ou os sist<strong>em</strong>as de domi<strong>na</strong>ção,mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder doqual nos quer<strong>em</strong>os apoderar” (FOUCAULT, 1996:10).Foucault traz como ex<strong>em</strong>plo o <strong>discurso</strong> do louco, que desde a IdadeMédia não pode circular como os outros; é um <strong>discurso</strong> consideradonulo, não é b<strong>em</strong> recebido. Esta separação – entre o <strong>discurso</strong> que t<strong>em</strong>poder, logo visibilidade, e o que não t<strong>em</strong> – é que dá, segundoFoucault, a ord<strong>em</strong> do <strong>discurso</strong>: os que têm poder, falam, os que nãotêm, silenciam. O controle do <strong>discurso</strong> que circula é feito a partirdaquele que fala, o seu autor, e da autoridade que lhe é investida:“Ninguém entrará <strong>na</strong> ord<strong>em</strong> do <strong>discurso</strong> se nãosatisfizer a certas exigências ou se não for, deinício, qualificado para fazê-lo” (FOUCAULT, 1996:37).Assim, quando se fala, fala-se de um lugar social: o <strong>índio</strong>, quando fala,não se despoja de sua orig<strong>em</strong>, ele fala a partir dela. E para que seu<strong>discurso</strong> tenha consistência e visibilidade, precisa circular e ter umaord<strong>em</strong> que o delimite. Assim, a crença de Habermas no despojamentodo sujeito de suas condições sociais privilegiadas, cargos, títulos ouposições não se efetua <strong>na</strong> hora <strong>em</strong> que se expressa <strong>na</strong> esfera pública,28


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO<strong>na</strong> imprensa; o <strong>discurso</strong> é marcado pelo lugar social de onde fala osujeito. O que se supõe é que não há o livre <strong>discurso</strong>.1.2 Representações sociais e manipulação dahistóriaQu<strong>em</strong> fala, representa o papel do lugar social ao qual pertence ou seinsere. Assim, quando um <strong>índio</strong> busca expressar idéias, faz isso comointegrante de uma comunidade indíge<strong>na</strong>. As representações sociaistêm como base a existência da comunicação, uma vez que exist<strong>em</strong>para simbolizar – através do diálogo, do <strong>discurso</strong>, dos rituais, dacultura – uma dada realidade. A compreensão de um signo consiste<strong>em</strong> aproximá-lo de outros signos já conhecidos, de modo a apreendêlonesse contexto. Esse processo de aproximação e reconhecimentotraduz a representação social. Segundo Sandra Jovchelovitch (2000a),"as representações sociais são uma estratégia desenvolvida por atoressociais para enfrentar a diversidade e a mobilidade de um mundo que,<strong>em</strong>bora pertença a todos, transcende a cada um individualmente.Neste sentido, elas são um espaço potencial de fabricação comum,onde cada sujeito vai além de sua própria individualidade para entrar<strong>em</strong> domínio diferente, ainda que fundamentalmente relacio<strong>na</strong>do: odomínio da vida <strong>em</strong> comum, o espaço público" (JOVCHELOVITCH,2000a: 81). A ideologia, perpetuando-se no senso comum, determi<strong>na</strong>a linha de pensamento dos m<strong>em</strong>bros da sociedade nesse processo derepresentação, consistindo-se num:"Conjunto lógico, sist<strong>em</strong>ático e coerente derepresentações (idéias e valores) e de normas ouregras (de conduta) que indicam e prescrev<strong>em</strong> aosm<strong>em</strong>bros da sociedade o que dev<strong>em</strong> pensar e comodev<strong>em</strong> pensar, o que dev<strong>em</strong> valorizar e comodev<strong>em</strong> valorizar, o que dev<strong>em</strong> sentir e como dev<strong>em</strong>sentir, o que dev<strong>em</strong> fazer e como dev<strong>em</strong> fazer. Ela29


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOé, portanto, um corpo explicativo (representações)e prático (normas, regras, preceitos) de caráterprescritivo, normativo, regulador, cuja função é daraos m<strong>em</strong>bros de uma sociedade dividida <strong>em</strong> classesuma explicação racio<strong>na</strong>l para as diferenças sociais,políticas e culturais, s<strong>em</strong> jamais atribuir taisdiferenças à divisão da sociedade <strong>em</strong> classes, apartir das divisões <strong>na</strong> esfera da produção”. (CHAUÍ,1980: 114).Conhecimentos fundados <strong>na</strong> superioridade de raça, classe ou sexo ouno interesse de um grupo quantitativamente minoritário, mas quedetém o poder, tend<strong>em</strong> a se tor<strong>na</strong>r heg<strong>em</strong>ônicos, favorecendo aservidão e a instrumentalização do hom<strong>em</strong>, <strong>na</strong> medida que setransformam <strong>em</strong> senso comum. Segundo Bader Burihan Sawaia(1993), o estudo de Moscovici <strong>sobre</strong> representações sociais indica astrês fases de evolução da ideologia: "a fase científica, da criação deuma nova teoria; a fase representacio<strong>na</strong>l, que envolve a sua difusãoatravés da sociedade e a criação de representações sociais; e porúltimo a fase ideológica, caracterizada pela apropriação darepresentação por algum grupo ou instituição e pela sua reconstruçãocomo conhecimento criado pela sociedade como um todo e legitimadopor seu caráter científico" (SAWAIA, 1993: 78).De acordo com ele, o termo ideologia é utilizado para definir "oconjunto de representações que se tor<strong>na</strong> partilhado coletivamente pelareificação por meio da sua apropriação por órgãos estatais ou escolasde pensamento e não pelo consenso e interação" (SAWAIA, 1993: 78).Segundo Pierre Bourdieu, o mundo das representações é "um campode manifestação de lutas sociais e de um jogo de poder" (BOURDIEU,apud PESAVENTO, 1995: 18). Para Bourdieu, "a palavra concentra ocapital simbólico acumulado pelo grupo que o enuncia e pretende agir<strong>sobre</strong> o real, agindo <strong>sobre</strong> a representação desse real" (BOURDIEU,apud PESAVENTO, 1995: 18).30


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOA idéia de Bourdieu <strong>sobre</strong> a palavra já era anteriormente defendida porMikhail Bakhtin (1992a). Segundo Bakhtin, “tudo que é ideológicopossui um significado e r<strong>em</strong>ete a algo situado fora de si mesmo. Emoutros termos, tudo que é ideológico é um signo. S<strong>em</strong> signos nãoexiste ideologia” (BAKHTIN, 1992a: 31). Embora Bakhtin considere apalavra “o fenômeno ideológico por excelência” (BAKHTIN, 1992a: 36),ele atribui à palavra a condição de certa pureza e neutralidade, <strong>na</strong>medida <strong>em</strong> que pode pertencer a vários e diferentes <strong>discurso</strong>s aomesmo t<strong>em</strong>po, inclusive contraditórios entre si. Isso porque o <strong>discurso</strong>de partidos diferentes, de classes sociais diversas ou mesmo de gruposétnicos específicos difer<strong>em</strong> <strong>em</strong> seus sentidos, mas utilizam o mesmoinstrumento: a palavra. Bakhtin ressalta:“Cada um dos d<strong>em</strong>ais sist<strong>em</strong>as de signos éespecífico de algum campo particular da criaçãoideológica. Cada domínio possui seu própriomaterial ideológico e formula signos e símbolos quelhe são específicos e que não são aplicáveis aoutros domínios. O signo, então, é criado por umafunção ideológica precisa e permanece inseparáveldela. A palavra, ao contrário, é neutra <strong>em</strong> relação aqualquer função ideológica específica. Podepreencher qualquer espécie de função ideológica:estética, científica, moral, religiosa. (BAKHTIN,1992a: 36-37).Bakhtin explica b<strong>em</strong> a condição de pureza e neutralidade da palavra aoafirmar que ela se constitui num material flexível, ou seja, que estápresente <strong>em</strong> todo e qualquer <strong>discurso</strong>. Ele ressalta:“é preciso fazer uma análise profunda e aguda dapalavra como signo social para compreender seufuncio<strong>na</strong>mento como instrumento de consciência. É31


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdevido a esse papel excepcio<strong>na</strong>l de instrumento daconsciência que a palavra funcio<strong>na</strong> como el<strong>em</strong>entoessencial que acompanha toda criação ideológica,seja ela qual for. A palavra acompanha e comentatodo ato ideológico (BAKHTIN, 1992a: 37)[destaque nosso].Bakhtin reforça que, como unidade da língua, “as palavras não são deninguém e não comportam um juízo de valor. Estão a serviço dequalquer locutor e de qualquer juízo de valor, que pod<strong>em</strong> mesmo sertotalmente diferentes, até mesmo contrários” (BAKHTIN, 1992b: 309).Somente através do enunciado concreto a palavra adquire aspectosexpressivos, ou seja, passa a expressar valor. Bakhtin a<strong>na</strong>lisa apalavra sob três aspectos: como palavra neutra da língua, por nãopertencer a ninguém; como palavra do outro, pois pertence ao<strong>discurso</strong> enunciado alheio; e como palavra minha, pois carrega aminha intenção discursiva através da minha expressividade. Eleressalta:“Todas as propriedades da palavra que acabamosde exami<strong>na</strong>r – sua pureza s<strong>em</strong>iótica, suaneutralidade ideológica, sua implicação <strong>na</strong>comunicação huma<strong>na</strong> ordinária, sua possibilidadede interiorização e, fi<strong>na</strong>lmente, sua presençaobrigatória, como fenômeno acompanhante, <strong>em</strong>todo ato consciente – todas essas propriedadesfaz<strong>em</strong> dela o objeto fundamental do estudo dasideologias” (BAKHTIN, 1992a: 38) [destaquenosso].Sendo um instrumento de domi<strong>na</strong>ção, a ideologia, através da palavra– ou, mais precisamente, do <strong>discurso</strong> – manipula não ape<strong>na</strong>s opresente, mas o passado e o futuro. Isso porque fabrica um passadoconveniente e prevê um futuro baseado no presente também já32


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOmanipulado. Para Chauí, "porque a ideologia não t<strong>em</strong> história, masfabrica histórias imaginárias que <strong>na</strong>da mais são do que uma forma delegitimar a domi<strong>na</strong>ção da classe domi<strong>na</strong>nte, compreende-se por que ahistória ideológica (aquela que aprend<strong>em</strong>os <strong>na</strong> escola e nos livros) sejas<strong>em</strong>pre uma história <strong>na</strong>rrada do ponto de vista do vencedor ou dospoderosos". (CHAUÍ, 1980: 123), o que será observado mais adiantecom relação à história do Brasil e os <strong>índio</strong>s (capítulo 4). Chauí ressalta:"não possuímos a história dos escravos, n<strong>em</strong> a dosservos, n<strong>em</strong> a dos trabalhadores vencidos - não sósuas ações não são registradas pelo historiador,mas os domi<strong>na</strong>ntes também não permit<strong>em</strong> querest<strong>em</strong> vestígios (documentos, monumentos) dessahistória. Por isso os domi<strong>na</strong>dos aparec<strong>em</strong> nos textosdos historiadores s<strong>em</strong>pre a partir do modo comoeram vistos e compreendidos pelos própriosvencedores" (CHAUÍ, 1980: 123-124).O vencedor consegue fazer prevalecer seu <strong>discurso</strong> no momento <strong>em</strong>que a história é contada. Ele dificulta a existência da "história dosvencidos", pois, sendo estes derrotados, perderam o direito de contarsua versão dos fatos. A ação dos poderosos, dos vencedores, consistejustamente <strong>em</strong> tentar elimi<strong>na</strong>r os vencidos, sua m<strong>em</strong>ória e os traçosde sua existência, que somente <strong>em</strong>erge através de ações deresistência (nos lapsos discursivos, melhor explicados à pági<strong>na</strong> 95)."Não é assim, por ex<strong>em</strong>plo, que os estudantes negros ficam sabendoque a Abolição foi um feito da Princesa Isabel? As lutas dos escravosestão s<strong>em</strong> registro e tudo que delas sab<strong>em</strong>os está registrado pelossenhores brancos. N<strong>em</strong> para o <strong>índio</strong>. N<strong>em</strong> para os camponeses. N<strong>em</strong>para os operários" (CHAUÍ, 1980: 124). Marile<strong>na</strong> Chauí afirma:"História dos 'grandes homens', dos 'grandes feitos',das 'grandes descobertas', dos 'grandesprogressos', a ideologia nunca nos diz o que são33


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOesses 'grandes'. Grandes <strong>em</strong> quê? Grandes por quê?Grandes <strong>em</strong> relação a quê? No entanto, o saberhistórico nos dirá que esses 'grandes', agentes dahistória e do progresso, são os 'grandes epoderosos', isto é, os domi<strong>na</strong>ntes, cuja 'grandeza'depende s<strong>em</strong>pre da exploração e domi<strong>na</strong>ção dos'pequenos'. Aliás, a própria idéia de que os outrossão os 'pequenos' já é um pacto que faz<strong>em</strong>os com aideologia domi<strong>na</strong>nte. Graças a esse tipo de história,a ideologia burguesa pode manter sua heg<strong>em</strong>oniamesmo <strong>sobre</strong> os vencidos, pois estes interiorizam asuposição de que não são sujeitos da história, masape<strong>na</strong>s seus pacientes" (CHAUÍ, 1980: 124-125).A manipulação faz artimanhas com os sonhos coletivos e com astradições herdadas, trapaceando <strong>na</strong> criação de mitos e crenças. Não sepode reduzir o imaginário à ideologia, mas é preciso ter <strong>em</strong> mente quea formação deste imaginário é perpassado por interesses. De acordocom Sandra Jatahy Pesavento (1995), “não se pode esquecer que oimaginário social é uma das forças reguladoras da vida coletiva,normatizando condutas e pautando perfis adequados ao sist<strong>em</strong>a"(PESAVENTO, 1995: 23). O imaginário social seria expresso através desímbolos, ritos, crenças, <strong>discurso</strong>s e representações alegóricasfigurativas. Ela acrescenta:"O imaginário é, pois, representação, evocação,simulação, sentido e significado, jogo de espelhosonde o 'verdadeiro' e o aparente se mesclam,estranha composição onde a metade visível evocaqualquer coisa de ausente e difícil de perceber. (...)Não será este o verdadeiro caminho da História?Desvendar um enredo, desmontar uma intriga,revelar o oculto, buscar a intenção?" (PESAVENTO,1995: 24).34


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOAquilo que se representa, a partir do senso comum, é, pois, não frutode um consenso extraído da homogeneidade de idéias acerca doobjeto representado, mas sim forjado <strong>em</strong> condições socialmentedesiguais, como defende Sheva Maia da Nóbrega (1990). Resultanteda divisão social do trabalho, ou seja, da divisão da sociedade <strong>em</strong>classes - e, conseqüent<strong>em</strong>ente, <strong>em</strong> grupos e segmentos diferentes,divergentes e <strong>em</strong> condições socioeconômicas desiguais - asrepresentações sociais serv<strong>em</strong> para transmitir para grande parcela dosm<strong>em</strong>bros da sociedade o conhecimento selecio<strong>na</strong>do pelos pensadoresda ideologia domi<strong>na</strong>nte como o conhecimento que deve ser difundido eaceito como consistente e majoritário, aquele que deve prevalecer.Para Sheva:"As representações são imersas <strong>em</strong> um movimentocontínuo das incessantes e infatigáveis ondas decomunicação. Elas circulam nos <strong>discurso</strong>s ondedançam as palavras numa coreografia de idéias eimagens, que se materializam <strong>na</strong>s condutas"(NÓBREGA, 1990: 16). [destaque nosso].Assim, o que se constata é que o sentido de um <strong>discurso</strong> expresso <strong>em</strong>um texto, <strong>na</strong> palavra veiculada pelos meios de comunicação, é s<strong>em</strong>predado e percebido a partir de um extra<strong>discurso</strong>, sendo necessária arelação entre o texto e o contexto social, econômico e político <strong>em</strong> queele se dá, operando a linguag<strong>em</strong> como o meio de representação. ParaSandra Pesavento:"Todo fato histórico - e, como tal, fato passado -t<strong>em</strong> uma existência lingüística, <strong>em</strong>bora o seureferente (o real) seja exterior ao <strong>discurso</strong>.Entretanto, o passado já nos chega enquanto<strong>discurso</strong>, uma vez que não é possível restaurar oreal já vivido <strong>em</strong> sua integridade. Neste sentido,35


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOtentar reconstituir o real é reimagi<strong>na</strong>r o imagi<strong>na</strong>do,e caberia indagar se os historiadores, no seuresgate do passado, pod<strong>em</strong> chegar a algo que nãoseja uma representação" (PESAVENTO, 1995: 17)[destaque nosso].As representações sociais são, desta forma, meios encontrados pelosvários grupos sociais para orientar as ações do cotidiano. Se, porém,um determi<strong>na</strong>do segmento se <strong>sobre</strong>ssai - a classe domi<strong>na</strong>nte - éprevisível que também se <strong>sobre</strong>ssaia sua linha de pensamento, aideologia domi<strong>na</strong>nte. Assim, os conteúdos que circulam <strong>na</strong> sociedade -através, inclusive, dos meios de comunicação social - são marcadospelo jogo de forças e pressões, de modo que prevalec<strong>em</strong>discursivamente confirmando e mantendo as relações sociaisconvenient<strong>em</strong>ente.De acordo com Mary Jane Spink (1993), "<strong>na</strong> história das mentalidades,a constatação de que muitas das nossas verdades <strong>sobre</strong> o mundosocial são historicamente datadas; o relativismo decorrente dasreinterpretações geradas pelas reflexões a partir de movimentospolíticos de minorias (negros, mulheres, gays etc.) que passam areescrever a história a partir de sua própria ótica" (SPINK, 1993: 128)comprovam que não t<strong>em</strong>os nenhuma certeza de que a interpretaçãoescolhida é mais verdadeira que outras possíveis leituras da realidade.A <strong>mídia</strong> se transformou <strong>em</strong> instrumento fundamental de coesão social,uma vez que lida com a produção, reprodução e circulação derepresentações sociais que transpõe as barreiras geográficas. MiquelRodrigo Alsi<strong>na</strong> define a notícia como “uma representação social darealidade cotidia<strong>na</strong> produzida institucio<strong>na</strong>lmente que se manifesta <strong>na</strong>construção de um mundo possível” (ALSINA, 1989: 18). Entretanto, asrepresentações sociais desfizeram o vínculo com o mundo real,tor<strong>na</strong>ndo-se simulacros. E é a partir desses simulacros que seconstró<strong>em</strong> as identidades sociais <strong>na</strong> pós-modernidade. No mundo onde36


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOprevalec<strong>em</strong> as imagens a partir do crescimento dos meios eletrônicosde massa, cada vez mais o indivíduo se afasta do real e percebe a si eaos outros como imagens que circulam, que se publicizam <strong>na</strong> <strong>mídia</strong>,criando um mundo imaginário que é composto de "técnica e ficção."(JUNQUEIRA, 1999: 06). E, enquanto a imprensa se modifica, modificaa realidade e vice-versa. De acordo com Sérgio Luiz Gadini (1999):"os <strong>discurso</strong>s midiáticos - enquanto espaços deprodução de sentidos entre interlocutores - têm apossibilidade de reinventar, questio<strong>na</strong>r, construirou, mesmo, desestruturar a lógica social daorganização da vida dos grupos humanos" (GADINI,1999: 12) [destaque nosso].1.3 Campos Sociais e segmentos excluídosComo já diss<strong>em</strong>os, se é <strong>na</strong> esfera pública que os vários segmentosganham visibilidade, essa visibilidade só é garantida através dos meiosde comunicação social, que publicizam os <strong>discurso</strong>s dos vários grupos,inclusive o <strong>discurso</strong> das comunidades indíge<strong>na</strong>s. É preciso, porém,compreender b<strong>em</strong> como se dá a divisão da sociedade <strong>em</strong> segmentosou grupos sociais. Apesar da divisão da sociedade <strong>em</strong> classes terexplicado o funcio<strong>na</strong>mento da domi<strong>na</strong>ção de alguns grupos <strong>sobre</strong>outros, sua definição não foi suficiente para explicar <strong>na</strong> totalidade oprocesso de circulação dos atores sociais entre os vários segmentos:por ex<strong>em</strong>plo, o pai, militar e m<strong>em</strong>bro de uma determi<strong>na</strong>da religiãocircula entre os segmentos família, Exército e Igreja; o mesmo ocorrecom o indíge<strong>na</strong>, pai, marido, pajé, que circula nos segmentos família ecúpula de um grupo indíge<strong>na</strong>. A concepção de estratificação socialreelaborada por Pierre Bourdieu observa que o conceito de classe érestrito, sendo mais fecunda a definição de grupo social de Gramsci,onde seus m<strong>em</strong>bros pod<strong>em</strong> circular segundo outros aspectos além doeconômico. Segundo Bourdieu (1999):37


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“a classe social não é ape<strong>na</strong>s um `el<strong>em</strong>ento´ queexistiria <strong>em</strong> si mesmo, s<strong>em</strong> ser <strong>em</strong> <strong>na</strong>da afetado ouqualificado pelos el<strong>em</strong>entos com os quais coexiste,mas é também uma `parte´, ou seja, um el<strong>em</strong>entoconstituinte, determi<strong>na</strong>do por sua integração numaestrutura, v<strong>em</strong>os que a ignorância dasdetermi<strong>na</strong>ções específicas que uma classe socialrecebe do sist<strong>em</strong>a de suas relações com as outrasclasses pode levar-nos a estabelecer identificaçõesfalsas e a omitir a<strong>na</strong>logias reais. (...) Por ex<strong>em</strong>plo,a classe superior de uma cidade peque<strong>na</strong> apresentaa maioria das características das classes médias deuma cidade grande; isto não significa ape<strong>na</strong>s (...)que os m<strong>em</strong>bros dos círculos mais fechados dasociedade da província seriam freqüent<strong>em</strong>enteexcluídos dos círculos equivalentes de uma cidadegrande, mas quer dizer, acima de tudo, que,colocados <strong>em</strong> posições sociais estruturalmentediferentes, eles se distingu<strong>em</strong> por inúmerascondutas e atitudes dos indivíduos com os quaispod<strong>em</strong> partilhar certas características econômicas,sociais e culturais” (BOURDIEU, 1999: 04-05)[destaque nosso].Bourdieu defende que a posição de uma pessoa ou de um segmentosocial <strong>na</strong> estrutura da sociedade não pode ser definida com rigorestático – classes superior, média ou inferior – uma vez que é precisose considerar o que ele chama de trajeto social, ou seja, as posiçõesde ascensão ou declínio dentro da estrutura social. Além disso, duasclasses sociais possu<strong>em</strong> propriedades <strong>em</strong> comum, apesar depossuír<strong>em</strong> diferenças significativas. Bourdieu afirma que:38


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“Uma classe não pode jamais ser definida ape<strong>na</strong>spor sua situação e por sua posição <strong>na</strong> estruturasocial, isto é, pelas relações que mantémobjetivamente com as outras classes sociais.Inúmeras propriedades de uma classe socialprovêm do fato de que seus m<strong>em</strong>bros se envolv<strong>em</strong>deliberada ou objetivamente <strong>em</strong> relações simbólicascom os indivíduos das outras classes, e com issoexprim<strong>em</strong> diferenças de situação e de posiçãosegundo uma lógica sist<strong>em</strong>ática, tendendo atransmutá-la <strong>em</strong> distinções significantes. É aindependência relativa do sist<strong>em</strong>a de atos eprocedimentos expressivos, ou por assim dizer, dasmarcas de distinção, graças às quais os sujeitossociais exprim<strong>em</strong>, e ao mesmo t<strong>em</strong>po constitu<strong>em</strong>para si mesmos e para os outros, sua posição <strong>na</strong>estrutura social (e a relação que eles mantêm comesta posição) operando <strong>sobre</strong> os ´valores` (nosentido dos lingüistas) necessariamente vinculadosà posição de classe, uma duplicação expressiva queautoriza a autonomização metodológica de umaord<strong>em</strong> propriamente cultural” . (BOURDIEU, 1999:14) [destaque nosso].A conceituação de campo social de Adriano Duarte Rodrigues (1990),que, ao nosso ver v<strong>em</strong> compl<strong>em</strong>entar o pensamento de Bourdieu,define o campo como um todo unido por um ímã, cujo sist<strong>em</strong>a devalores lhe dá as características de grupo ou segmento social. Deacordo com ele:“Um campo social constitui uma instituição social,uma esfera de legitimidade. O religioso, a família, omilitar, o político, o científico, o econômico sãoindiscutivelmente campos sociais.(...) Defin<strong>em</strong>39


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOesferas de legitimidade que impõ<strong>em</strong> comautoridade indiscutível atos de linguag<strong>em</strong>, <strong>discurso</strong>se práticas conformes, dentro de um domínioespecífico de competência. A legitimidade é assim ocritério fundamental de um campo social.Reconhece-se pelo fato de poder ocupar o lugar desujeito de enunciação: ‘a família exige’, ‘a economiadeve e exige’, ‘a política impõe’ são enunciados quecolocam instituições sociais no lugar de sujeito deum dizer ou de um fazer e r<strong>em</strong>et<strong>em</strong> para acapacidade de impor com legitimidade indiscutívelalgo ao conjunto do tecido social” (RODRIGUES, A.,1990: 143-144) [destaque nosso].Dentro do conjunto de campos sociais, a comunicação surge como umcampo cuja legitimidade é delegada pelos d<strong>em</strong>ais campos. Enquantocada segmento busca se legitimar à medida que t<strong>em</strong> parte de seu<strong>discurso</strong> expresso e difundido <strong>na</strong> <strong>mídia</strong>, os meios de comunicação selegitimam exatamente por ser o responsável por esta difusão. Oespaço que oferece para que os diversos campos sociais apresent<strong>em</strong>suas representações discursivas é que dá ao campo comunicacio<strong>na</strong>lsua garantia de existência. Bakhtin defende que a consciência huma<strong>na</strong>passa a ter forma a partir dos signos criados por um grupo organizadono curso das relações sociais. Para ele, “os signos são o alimento daconsciência individual, a matéria de seu desenvolvimento, e ela refletesua lógica e suas leis. A lógica da consciência é a lógica dacomunicação ideológica, da interação s<strong>em</strong>iótica de um grupo social”(BAKHTIN, 1992a: 35-36).Baseado <strong>na</strong> teoria marxista, Bakhtin considera que o ser humanoconfronta seus interesses sociais nos limites de uma comunidades<strong>em</strong>iótica, onde ocorre a luta de classes. Ele ressalta que “classesocial e comunidade s<strong>em</strong>iótica não se confund<strong>em</strong>. Pelo segundo termoentend<strong>em</strong>os a comunidade que utiliza um único e mesmo código40


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOideológico de comunicação. Assim, classes sociais diferentes serv<strong>em</strong>-sede uma só e mesma língua” (BAKHTIN, 1992a: 46). Entretanto,mesmo valendo-se da mesma língua, as palavras que dela faz<strong>em</strong> parteadquir<strong>em</strong> valores contraditórios <strong>na</strong> disputa discursiva entre as classese segmentos sociais. “O signo se tor<strong>na</strong> a are<strong>na</strong> onde se desenvolve aluta de classes. Essa plurivalência social do signo ideológico é um traçoda maior importância”, defende Bakhtin (BAKHTIN, 1992a: 46), umavez que é exatamente esta característica viva da língua, de suamultiplicidade, que gera a tensão da luta social, à medida que os<strong>discurso</strong>s são manifestados e utilizados para cooptar grupos e disputarespaços.Para Sérgio Luiz Gadini, cada grupo humano possui um corpo del<strong>em</strong>branças comuns, fatos marcantes registrados, que criam a“m<strong>em</strong>ória de grupo” (GADINI, 1997: 09). Como campo legitimado pelacapacidade de apresentação dos <strong>discurso</strong>s dos outros campos, a <strong>mídia</strong>reproduz o conjunto de valores expresso pelos vários grupos sociaisexistentes <strong>na</strong> sociedade, servindo de campo de mediação dos vários<strong>discurso</strong>s (a esfera pública definida por Habermas). Entretanto, apresença do <strong>discurso</strong> de um determi<strong>na</strong>do segmento será tanto maisforte e evidente quanto mais forte for este segmento. Assim, ao invésde tor<strong>na</strong>r-se espaço para a apresentação equânime dos vários<strong>discurso</strong>s <strong>na</strong> busca de um consenso – independente de posições sociaisou hierarquias, como imaginou Habermas – a imprensa parece darmais visibilidade aos campos que se <strong>sobre</strong>ssa<strong>em</strong> política eeconomicamente, ou seja, tor<strong>na</strong>-se difusora da ideologia domi<strong>na</strong>nte.Bourdieu afirma que:"Tendo a pensar que a estrutura da maioria doscampos, da maioria dos jogos sociais, é de talord<strong>em</strong> que a competição - a luta pela domi<strong>na</strong>ção -é inevitável. Ela é evidente no campo econômico,mas até no campo religioso verifica-se que essadescrição é correta. Na maioria dos campos,41


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpod<strong>em</strong>os observar o que caracterizamos como umacompetição pela acumulação de diferentes formasde capital (capital religioso, capital econômico etc.)e, do modo como são as coisas, a comunicação nãodistorcida a que Habermas se referiu é s<strong>em</strong>pre umaexceção" (BOURDIEU & EAGLETON, 1991, in ZIZEK,1996: 271) [destaque nosso].A institucio<strong>na</strong>lização dos noticiários se converteu <strong>em</strong> uma atividadesancio<strong>na</strong>da pela sociedade. Miquel Rodrigo Alsi<strong>na</strong> ressalta que a“relação entre o jor<strong>na</strong>lista e seus desti<strong>na</strong>tários está estabelecida porum contrato fiduciário social e historicamente definido” (ALSINA, 1989:31) [tradução nossa]. Ele destaca:“Este contrato se baseia <strong>em</strong> atitudes epistêmicascoletivas que se vão forjando pela implantação douso social dos meios de comunicação comotransmissores da realidade social de importânciapública. Os próprios meios são os primeiros quelevam a cabo uma contínua prática deautolegitimação para reforçar este rol social”(ALSINA, 1989: 31) [tradução nossa].Entretanto, progressivamente, a opinião pública v<strong>em</strong> ficandodependente desse novo campo de legitimidade, os meios decomunicação, que para Rodrigues é o campo que cada vez mais tor<strong>na</strong>seautônomo <strong>em</strong> relação aos d<strong>em</strong>ais campos sociais, “como esferaobrigatória da visibilidade e da notoriedade. Nele se reflet<strong>em</strong> todos osrestantes campos sociais, e a legitimidade do poder alimenta-seatravés dele pela publicidade que assegura às restantes dimensões daprática social” (RODRIGUES, A., 2002: 03 in MOUILLAUD & PORTO,2002). Ainda para o autor:42


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“É este o objetivo que o poder acalenta <strong>em</strong> relaçãoao campo dos media: discipliná-la, convertê-la <strong>em</strong>antê-la como regime policial das opiniões livres,não sujeitas à repressão física, como caixa deressonância amplificadora da sua voz, comodispositivo de inscrição capilar da sua ord<strong>em</strong>,domesticando-a através da prática de uma escritaregistradora conforme ao senso comum, às idéiasfeitas, às idéias populistas, numa palavra, a tudoquanto lisonjeia e mobiliza a vertente pulsio<strong>na</strong>l deque o poder moderno se alimenta”. (RODRIGUES,A., 1990: 168-169) [destaque nosso].A fixação de um consenso, <strong>na</strong> medida que se divulga, legitima esancio<strong>na</strong> a ideologia domi<strong>na</strong>nte, dá ao campo social midiático o papel,já atribuído por Althusser, de Aparelho Ideológico de Estado. Aomesmo t<strong>em</strong>po, as classes subalter<strong>na</strong>s ou os grupos sociais com poderreduzido têm acesso restrito aos meios de comunicação ou chanceslimitadas de expressão de seus valores, permanecendo sob adomi<strong>na</strong>ção. Ou seja, mesmo <strong>na</strong> pós-modernidade e diante deconceitos da nova realidade da divisão social de classes, os meios decomunicação prevalec<strong>em</strong> como AIE, <strong>na</strong> definição althusseria<strong>na</strong>,difundindo a ideologia do segmento domi<strong>na</strong>nte. E a redefinição dadivisão da sociedade <strong>em</strong> classes serve para compreendermos que,mesmo circulando <strong>em</strong> mais de um campo social, não há garantia parao sujeito de dar visibilidade ao seu <strong>discurso</strong>, permanecendo <strong>na</strong>condição de subalterno, se o campo ao qual preferencialmente estáinserido não tiver dimensão suficiente para ganhar espaço nos meiosde comunicação.43


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO2. A notíciaO que vai ser lido no jor<strong>na</strong>l do dia seguinte n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre é umaincógnita, uma caixa de segredos a ser aberta <strong>na</strong>s primeiras horas dodia. Para Sérgio Luiz Gadini, “o jor<strong>na</strong>lismo implica s<strong>em</strong>pre num recortet<strong>em</strong>ático que redesenha o mundo social, a partir de um determi<strong>na</strong>doenfoque desses eventos” (GADINI, 1997: 14). Porém, para começar atratar do <strong>agenda</strong>mento e da delimitação do t<strong>em</strong>ário da imprensa, éimportante definir o que é notícia. Segundo Jorge Pedro Sousa (1999),notícias, no sentido jor<strong>na</strong>lístico do termo, seriam:“artefatos lingüísticos que procuram representardetermi<strong>na</strong>dos aspectos da realidade e que resultamde um processo de construção e fabrico ondeinterag<strong>em</strong>, entre outros, diversos fatores de<strong>na</strong>tureza pessoal, social, ideológica, cultural e domeio físico/tecnológico, que são difundidos pelosmeios jor<strong>na</strong>lísticos e aportam novidades comsentido compreensível num determi<strong>na</strong>do momentohistórico e num determi<strong>na</strong>do meio sócio-cultural,<strong>em</strong>bora a atribuição última de sentido dependa doconsumidor da notícia. Registre-se ainda que<strong>em</strong>bora as notícias represent<strong>em</strong> determi<strong>na</strong>dosaspectos da realidade quotidia<strong>na</strong>, pela sua meraexistência contribu<strong>em</strong> para construir socialmentenovas realidades e novos referentes”. (SOUSA,1999: 02).O texto jor<strong>na</strong>lístico é uma organização discursiva onde são expressasdiversas versões <strong>sobre</strong> um fato. Como produtora de sentidos, deve-secompreender a notícia como um relato de fatos do mundo real, masnão da sua totalidade: parte do todo é <strong>na</strong>rrado. Esta parte é escolhida,selecio<strong>na</strong>da. Por isso, é essencial ver <strong>na</strong> linguag<strong>em</strong> não uma descrição44


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOda realidade, mas sua representação. Recolher dados, selecioná-los,hierarquizá-los, posicio<strong>na</strong>ndo-os no texto segundo critérios deimportância, resume o processo de produção do texto jor<strong>na</strong>lístico. Combase <strong>em</strong> perspectivas ora pessoais, ora culturais e sociais – tendocomo pano de fundo a ideologia, como visto no capítulo anterior – ojor<strong>na</strong>lista hierarquiza as informações no processo produtivo – ou seja,faz do texto jor<strong>na</strong>lístico, além de representacio<strong>na</strong>l da realidade, umtexto autoral, apesar das tentativas de se camuflar a presença dojor<strong>na</strong>lista nesta produção. Sousa (1999) faz a seguinte classificaçãodas interferências <strong>na</strong> produção da notícia:“1) ação pessoal – as notícias resultamparcialmente das pessoas e das suas intenções;2) ação social – as notícias são fruto das dinâmicase dos constrangimentos do sist<strong>em</strong>a social,particularmente do meio organizacio<strong>na</strong>l <strong>em</strong> queforam construídas e fabricadas;3) ação ideológica – as notícias são origi<strong>na</strong>das porforças de interesse que dão coesão aos grupos, sejaesse interesse consciente e assumido ou não;4) ação cultural – as notícias são um produto dosist<strong>em</strong>a cultural <strong>em</strong> que são produzidas, quecondicio<strong>na</strong> quer as perspectivas que se têm domundo quer a significação que se atribui a ess<strong>em</strong>esmo mundo (mundivivência);5) ação histórica – as notícias são um produto dahistória, durante a qual interagiram as restantescinco forças que enformam as notícias que t<strong>em</strong>os(ações pessoal, social, ideológica, cultural etecnológica)” (SOUSA, 1999: 03).A notícia, para Sousa, pode ser classificada, segundo a visão anglosaxônica,da seguinte maneira:45


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO1. hard news – notícias “duras”, “fortes”, relacio<strong>na</strong>das aosacontecimentos <strong>na</strong>rrados;2. soft news – notícias “brandas”, relacio<strong>na</strong>das a fatos s<strong>em</strong> muitaimportância e somente divulgadas quando há interesse pelo veículode comunicação;3. hot news – seriam notícias que, sendo também hard news, estãorelacio<strong>na</strong>das a episódios recentes, “quentes”;4. spot news – são as notícias referentes a fatos imprevistos, quefog<strong>em</strong> do controle do processo de <strong>agenda</strong>mento da <strong>mídia</strong> (que serávisto a seguir);5. running stories – são notícias relacio<strong>na</strong>das a fatos cujoacontecimento está se desenvolvendo enquanto se processa suadivulgação.Na seleção de fatos que são excluídos ou viabilizados como notícia,Sousa alerta que, <strong>em</strong>bora estes acontecimentos, para ser<strong>em</strong>noticiados, devam ser singulares, concretos e observáveis, <strong>na</strong>realidade o que se verifica é que também a <strong>mídia</strong> impõe uma ord<strong>em</strong> aot<strong>em</strong>po, ou seja, faz um <strong>agenda</strong>mento do cotidiano, tentando capturaros fatos de modo a reduzir os riscos de imprevistos. O planejamento ea previsibilidade resultante dele norteiam a coleta de informações paraa produção do texto jor<strong>na</strong>lístico. Daí a Teoria do Agenda-setting.Em 1972, McCombs e Shaw expuseram pela primeira vez <strong>em</strong> umartigo um novo paradigma que veio situar o processo de seleção denotícias pela <strong>mídia</strong>, baseados <strong>em</strong> estudo da campanha eleitoral para apresidência dos Estados Unidos de 1968. Segundo eles, os meios decomunicação defin<strong>em</strong> o que é e o que não é notícia a partir de umt<strong>em</strong>ário pré-estabelecido, o chamado <strong>agenda</strong>-setting. O <strong>agenda</strong>mentoseria, assim, a roti<strong>na</strong> diária dos veículos de comunicação, no que serefere à escolha, corte e peso dos fatos a ser<strong>em</strong> <strong>na</strong>rrados pela <strong>mídia</strong>.46


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO2.1 Agenda dos meios de comunicação, espaçopara hierarquiasDe acordo com Nelson Traqui<strong>na</strong> (1999), o termo <strong>agenda</strong> refere-se a“uma lista de questões e acontecimentos que são vistos numdetermi<strong>na</strong>do ponto no t<strong>em</strong>po e classificados segundo uma hierarquiade importância” (ROGERS & DEARING, 1988: 565, apud TRAQUINA,1999: 15). Definido inicialmente com o objetivo de a<strong>na</strong>lisar o ambientepolítico criado pelas campanhas eleitorais no campo jor<strong>na</strong>lístico, ahipótese do <strong>agenda</strong>-setting é apresentada da seguinte forma porMcCombs e Shaw:“A capacidade dos media <strong>em</strong> influenciar a projeçãodos acontecimentos <strong>na</strong> opinião pública confirma oseu importante papel <strong>na</strong> figuração de nossarealidade social, isto é, de um pseudo-ambiente,fabricado e montado quase completamente a partirdos mass media” (MCCOMBS & SHAW, 1977: 7,apud TRAQUINA, 1999: 16).Segundo Traqui<strong>na</strong> (1999), o processo do <strong>agenda</strong>-setting compõe-se detrês el<strong>em</strong>entos: o primeiro seria os estudos da <strong>agenda</strong> midiática(media <strong>agenda</strong>-setting), definido como os estudos do conteúdo dosmeios de comunicação; os estudos da <strong>agenda</strong> pública, conceituadocomo a pesquisa <strong>sobre</strong> a importância dada pelos indivíduos para osvários acontecimentos e assuntos que permeiam nosso dia-a-dia; e osestudos <strong>sobre</strong> a <strong>agenda</strong> das políticas gover<strong>na</strong>mentais (policy <strong>agenda</strong>setting),que se constitui no estudo da <strong>agenda</strong> de ações dasinstituições gover<strong>na</strong>mentais. As pesquisas indicaram a ligaçãoexistente entre as <strong>agenda</strong>s jor<strong>na</strong>lística e pública. O efeito observado éde que a <strong>agenda</strong> pública é determi<strong>na</strong>da pela <strong>agenda</strong> dos meios:questões que estão direta ou indiretamente ligadas às pessoas acabampor fazer parte do seu universo a partir de sua veiculação pela47


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOimprensa. Mar de Fontcuberta (1993) reforça este pensamento,afirmando que a t<strong>em</strong>atização praticada pela <strong>mídia</strong> – ou seja, a escolhade determi<strong>na</strong>dos t<strong>em</strong>as <strong>em</strong> detrimento de outros – se constitui <strong>em</strong> ummecanismo de formação da opinião pública. Traqui<strong>na</strong> cita váriosex<strong>em</strong>plos, entre os quais o da Guerra do Golfo:“Na Guerra do Golfo, a cobertura massiva, comdestaque para a CNN, colocou o Kuweit (sic) nocentro das atenções mundiais e o ‘vazio’ (deatitudes pré-existentes) facilitou a imposição dosenquadramentos. No entanto, é também necessárionão esquecer que a colocação da invasão de Kuweitpor parte do Iraque <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> pública requereuigualmente uma potente promoção (envolvendo amobilização de importantes recursos) por parte denews promotors poderosos”. (TRAQUINA, 1999: 25)[destaque nosso].O <strong>agenda</strong>-setting é a pré-determi<strong>na</strong>ção do que deve ser notícia nosmeios de comunicação, correspondendo ao estabelecimento do t<strong>em</strong>árioque deve todos os dias ser focado como reportag<strong>em</strong>. Traqui<strong>na</strong> (1999)alerta que o poder do <strong>agenda</strong>mento da <strong>mídia</strong> acaba por definir o que ée o que não é importante para o público. E o uso do poder pordetermi<strong>na</strong>das pessoas, grupos sociais ou instituições é marcante <strong>na</strong>classificação do t<strong>em</strong>ário escolhido para ser noticiado, uma vez que acada forma de <strong>discurso</strong> social corresponde um conjunto de t<strong>em</strong>as.Segundo Shaw (SHAW, apud WOLF, 2001), "<strong>em</strong> conseqüência daacção dos jor<strong>na</strong>is, da televisão e dos outros meios de informação, opúblico sabe ou ignora, presta atenção ou descura, realça ounegligencia el<strong>em</strong>entos específicos dos cenários públicos. As pessoastêm tendência para incluir ou excluir dos seus próprios conhecimentosaquilo que os mass media inclu<strong>em</strong> ou exclu<strong>em</strong> do seu próprioconteúdo" (SHAW, 1979: 96, apud WOLF, 2001: 144). De acordo comBer<strong>na</strong>rd Cohen (COHEN, apud TRAQUINA, 1999), a imprensa:48


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO"pode, <strong>na</strong> maioria das vezes, não conseguir dizer àspessoas como pensar, mas t<strong>em</strong>, no entanto, umacapacidade espantosa para dizer aos seus própriosleitores <strong>sobre</strong> o que pensar. O mundo parecediferente, dependendo do mapa que lhe édesenhado pelos redatores, editores e diretores dojor<strong>na</strong>l que lê<strong>em</strong>" (COHEN, 1963: 72, apudTRAQUINA, 1999: 20) [destaque nosso].Traqui<strong>na</strong> afirma ainda que as conclusões de McCombs indicam que “osatributos enfatizados pelo campo jor<strong>na</strong>lístico pod<strong>em</strong> influenciardiretamente a direção da opinião pública. Tanto a seleção dasocorrências e/ou das questões que constituirão a <strong>agenda</strong>, como aseleção dos enquadramentos para interpretar essas ocorrências e/ouquestões são poderes importantes que o paradigma do <strong>agenda</strong>-settingagora identifica depois de mais de vinte anos de vida intelectual”(TRAQUINA, 1999: 26). Para Fontcuberta (1993), as pessoas falam oque fala a televisão, o rádio e a imprensa e ignoram o que estápróximo a eles, mas que não foi classificado como notícia pelos meiosde comunicação. Ou seja, a <strong>mídia</strong> é um dos principais impulsio<strong>na</strong>doresda circulação do conhecimento. Voltando a citar McCombs e Shaw:“O <strong>agenda</strong>-setting é consideravelmente mais que aclássica asserção que as notícias nos diz<strong>em</strong> <strong>sobre</strong> oque pensar. As notícias também nos diz<strong>em</strong> comopensar nisso. Tanto a seleção de objetos quedespertam a atenção como a seleção dosenquadramentos para pensar esses objetos sãopoderosos papéis do <strong>agenda</strong>-setting”. (MCCOMBS &SHAW, 1993: 62, apud TRAQUINA, 1999: 26)[destaque nosso].49


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOMcCombs e Shaw reformulam o pensamento de Cohen, descritoanteriormente, da seguinte forma:“O clássico somatório de Ber<strong>na</strong>rd Cohen (1963) do<strong>agenda</strong>-setting – os media pod<strong>em</strong> não nos dizer oque pensar, mas serão incrivelmente b<strong>em</strong>sucedidos ao dizer-nos <strong>em</strong> que pensar – foi viradodo avesso. Novas investigações, explorando asconseqüências do <strong>agenda</strong>-setting e doenquadramento dos media, suger<strong>em</strong> que os medianão só nos diz<strong>em</strong> <strong>em</strong> que pensar, mas tambémcomo pensar nisso, e conseqüent<strong>em</strong>ente o quepensar”. (MCCOMBS & SHAW, 1993: 65, inTRAQUINA, 1999: 27) [destaque nosso].Traqui<strong>na</strong> alerta para alguns questio<strong>na</strong>mentos importantes: “que atoresdo campo político são os principais new promotors? Até que ponto sãoos atores do campo político e não outros agentes sociais as principaisfontes?” (TRAQUINA, 1999: 27). Segundo ele, a <strong>agenda</strong> pessoal –aquilo que preocupa, que dirige os pensamentos e esforços de umindivíduo – é orientada pelas experiências pessoais e pelas conversasinterpessoais. Entretanto, o que sai <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> norteia estas conversas eacaba por ter uma forte ingerência <strong>na</strong> formação das <strong>agenda</strong>s pessoais,ou seja, <strong>sobre</strong> o que é importante para cada um, o que para Traqui<strong>na</strong>representa a “redescoberta do poder do jor<strong>na</strong>lismo” (TRAQUINA, 1999:28). De acordo com Male<strong>na</strong> Rehbein Rodrigues, “a <strong>agenda</strong> interpessoalreforça a dos media, pois as pessoas acabam conversando o que écolocado como principal pelos meios de comunicação” (RODRIGUES,M., 1997, 03).Estes new promotors representam, <strong>na</strong> verdade, os m<strong>em</strong>bros dossegmentos sociais que possu<strong>em</strong> influência <strong>sobre</strong> os meios decomunicação, representantes de grupos que, pelo lugar social queocupam e ao qual se referiu Foucault (1996), pod<strong>em</strong> dar mais50


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOvisibilidade a determi<strong>na</strong>dos <strong>discurso</strong>s e agir <strong>na</strong> formação do <strong>agenda</strong>settingdos meios de comunicação. Segundo Fontcuberta (1993), oconteúdo da <strong>mídia</strong> depende do jogo de interesses dos próprios meiose dos vários setores da sociedade. Ape<strong>na</strong>s no que chamamos deconcessões dadas pela imprensa é que segmentos sociais excluídosconsegu<strong>em</strong> entrar <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> da <strong>mídia</strong> e “furar” o <strong>agenda</strong>-setting préestabelecidopelos segmentos domi<strong>na</strong>ntes da sociedade, o quechamamos de lapsos discursivos (ver capítulo 3 – p. 95).É b<strong>em</strong> verdade que os meios de comunicação pod<strong>em</strong> ser espaço paradebate e, <strong>em</strong> alguns casos, funcio<strong>na</strong>m como agentes de vigilância econtrole dos poderes e das organizações. Segundo Sousa (1999), “osmeios jor<strong>na</strong>lísticos são um instrumento vital de troca de informações ede estimulação da cidadania, <strong>em</strong> que o jor<strong>na</strong>lista-mediador assume oudeve assumir um papel essencial. Pelo menos, será este oenquadramento ‘ideal’ da imprensa” (SOUSA, 1999: 05). Para WilmaMorais (1997), “o jor<strong>na</strong>lismo enquanto técnica de produção einterpretação de informações, é uma das ferramentas sociais deconstrução da realidade que mais força t<strong>em</strong> para interferir diretamente<strong>sobre</strong> os fatos, potencializando, com isto, sua capacidade de formaçãoe controle da opinião pública” (MORAIS, 1997: 144). [tradução nossa].Sousa ressalta, entretanto, que para os estudos culturais – entre elesa teoria da heg<strong>em</strong>onia, de Gramsci – os veículos de comunicação sãoinstrumentos de perpetuação e consolidação do poder. De acordo como pesquisador, “os meios jor<strong>na</strong>lísticos são também usados <strong>em</strong> funçãode interesses particulares, como os interesses de determi<strong>na</strong>dospoderes, podendo, igualmente, contribuir para a amplificação dospoderes e para a sustentação do status quo”. (SOUSA, 1999:05). Estepensamento é compartilhado por Teun A. van Dijk (1990), para qu<strong>em</strong>as notícias, mesmo criando uma ilusão de credibilidade, acabam porlegitimar o quadro social domi<strong>na</strong>nte. Ainda com relação a essaquestão, Sousa salienta:51


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“Destaca-se <strong>sobre</strong>tudo a idéia de que os meiosjor<strong>na</strong>lísticos são estruturas que tend<strong>em</strong> arepresentaras relações sociais domi<strong>na</strong>ntes depoder, <strong>na</strong>turalizando-as, tor<strong>na</strong>ndo difícil imagi<strong>na</strong>routras relações de poder no seio da sociedade e,por conseqüência, trabalhando no sentido deinviabilizar quaisquer mudanças sociais”. (SOUSA,1999: 05).2.2 Imprensa: efeito de <strong>agenda</strong>Para Wolf (2001), a influência dos meios de comunicação <strong>sobre</strong> opúblico varia segundo o veículo. Televisão e jor<strong>na</strong>l, assim, possu<strong>em</strong>um poder diferenciado <strong>sobre</strong> o telespectador/leitor. O <strong>agenda</strong>mento émais fort<strong>em</strong>ente marcado pela imprensa escrita, que trabalha commais espaço e detalhamento dos fatos. Segundo Wolf, porém, é difícilcomparar os dois veículos, uma vez que não exist<strong>em</strong> estudos quetenham utilizado a mesma metodologia. McCombs defende uma“eficácia t<strong>em</strong>poralmente graduada e diferenciada dos vários massmedia” (MCCOMBS, apud WOLF, 2001: 161). Ele ressalta:“Os jor<strong>na</strong>is são os principais promotores da <strong>agenda</strong>do público. Defin<strong>em</strong> amplamente o âmbito dointeresse público, mas os noticiários televisivos nãosão totalmente desprovidos de influência. Atelevisão t<strong>em</strong> um certo impacte, a curto prazo, <strong>na</strong>composição da <strong>agenda</strong> do público. O melhor modode descrever e distinguir essa influência será,talvez, chamar ‘<strong>agenda</strong>-setting’ à função dos jor<strong>na</strong>ise ‘enfatização' (ou spot-lighting) à da televisão. Ocarácter fundamental da <strong>agenda</strong> parece,frequent<strong>em</strong>ente, ser estruturado pelos jor<strong>na</strong>is, aopasso que a televisão reorde<strong>na</strong> ou ressist<strong>em</strong>atiza os52


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOt<strong>em</strong>as principais da <strong>agenda</strong>” (MCCOMBS, 1976: 6,apud WOLF, 2001: 161-162) [destaque nosso].De acordo com Wolf, a imprensa escrita t<strong>em</strong> a função de produzirinformação secundária ou t<strong>em</strong>atizada, que “amplia a notícia,contextualizando-a e aprofundando-a” (WOLF, 2001: 164), eficáciaessa atribuída por ele ao jor<strong>na</strong>lismo escrito e não à televisão.Enquanto a notícia veiculada pelos jor<strong>na</strong>is se estrutura <strong>em</strong> torno dam<strong>em</strong>ória acerca dos acontecimentos, a televisiva está centrada <strong>na</strong>atualidade. De acordo com Lorenzo Gomis (1991), uma das funções da<strong>mídia</strong> é oferecer um presente social contínuo: precisa ser novo paranos impressio<strong>na</strong>r e velho para que se possa conhecê-lo e relatá-lo, <strong>na</strong>medida <strong>em</strong> que o assimilamos e incorporamos ao nosso repertório deinformações, ou seja, o presente se ancora no passado, o novo seancora no antigo. A interferência de perso<strong>na</strong>gens a partir dos fatosrelatados causa mudanças no fato já ocorrido, refletindo no <strong>discurso</strong>que é reconstruído a cada novo presente jor<strong>na</strong>lístico. Segundo GOMES,I., MELO, C. & MORAIS (1998):"Os meios apresentam como ações não termi<strong>na</strong>das,<strong>em</strong> t<strong>em</strong>po presente, o que ocorreu antes, formandosincronicamente um período com fatos passados,outros que pod<strong>em</strong> estar sucedendo no momento eoutros ainda que se espera que ocorram <strong>em</strong> umfuturo próximo" (GOMES, I., MELO, C. & MORAIS,1998: 05).Ao fazer seu vínculo com o mundo, "o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico presentificaaspectos e realidades do cotidiano, atendendo às d<strong>em</strong>andas de seupúblico-alvo" (GADINI, 1999: 14). Deste modo, qualquer <strong>discurso</strong> criaefeitos de sentido no imaginário social, causa reações e interesses e<strong>agenda</strong> o cotidiano, de acordo com a hipótese de <strong>agenda</strong>-setting. ParaGadini, os meios de comunicação veiculam um <strong>discurso</strong> resultante dacolag<strong>em</strong> de vozes e sentidos, gerando uma compreensão singular do53


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdia-a-dia, ou seja, "configuram uma compreensão de situaçõest<strong>em</strong>atizadas" (GADINI, 1999:15). Jovchelovitch reforça, citando Rowe& Schelling: "a <strong>mídia</strong> destrói as bases da m<strong>em</strong>ória popular e descolasímbolos e sentidos dos contextos <strong>em</strong> que são produzidos" (ROWE &SCHELLING, 1991, apud JOVCHELOVITCH, 2000b: 91).Não é ape<strong>na</strong>s a quantidade de informações que configura at<strong>em</strong>atização e, conseqüent<strong>em</strong>ente, o efeito de <strong>agenda</strong>-setting. Ocaráter público do t<strong>em</strong>a e a sua relevância social, ou seja, queimportância ele t<strong>em</strong> para ser divulgado, são delimitadores para adefinição do que deverá ser t<strong>em</strong>a no jor<strong>na</strong>l. Wolf explica:“N<strong>em</strong> todos os t<strong>em</strong>as ou acontecimentos sãosusceptíveis de t<strong>em</strong>atização; são-nos ape<strong>na</strong>saqueles que revelam uma importância políticosocial.Por isso, os mass media t<strong>em</strong>atizam dentrode limites que esses t<strong>em</strong>as e esses acontecimentosnão defin<strong>em</strong>, num território que não delimitam, queape<strong>na</strong>s reconhec<strong>em</strong> e alqueivam.Quanto ao efeito de <strong>agenda</strong>-setting, a t<strong>em</strong>atizaçãoapresenta-se, pois, como uma possibilidadelimitada pela selecção dos assuntos passíveis de sert<strong>em</strong>atizados. Enquanto, <strong>em</strong> princípio, é possívelpensar-se num efeito de <strong>agenda</strong>-setting a propósitode qualquer série de assuntos, contanto que sejaextensivamente coberta pelos mass media, at<strong>em</strong>atização (com consequente <strong>agenda</strong>-setting) sódeveria ser possível <strong>em</strong> domínios já providos deuma relevância ‘institucio<strong>na</strong>l’ própria”. (WOLF,2001: 164).De acordo com Karel Kosík (1963), "só mediante a abstração, at<strong>em</strong>atização e a projeção, tomando-se como ponto de partida est<strong>em</strong>undo da realidade pleno e inexaurível, se isolam determi<strong>na</strong>das54


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOzo<strong>na</strong>s, facetas e esferas que o <strong>na</strong>turalismo ingênuo e o positivismoconsideram como as únicas autênticas, como a única realidade,enquanto suprim<strong>em</strong> aquilo que resta como pura subjetividade"(KOSÍK, 1963: 30). É isso o que faz a <strong>mídia</strong>, <strong>na</strong> medida que selecio<strong>na</strong>o que divulga como sendo a realidade, e não sua representação. ParaGOMES, I., MELO, C. & MORAIS (2000), "a representação da realidadepode estar numa imag<strong>em</strong> sugerida que pode ser referenciada atravésde figuras de linguag<strong>em</strong> <strong>na</strong>scidas de um enunciado verbal, capazes decriar um mundo visual paralelo e particular <strong>na</strong>s mentes dosreceptores" (GOMES, I., MELO, C. & MORAIS, 2000: 02). Gerando <strong>em</strong>nossas mentes a idéia de uma realidade, a imprensa faz, <strong>na</strong> verdade, arepresentação de parte desta realidade.2.3 Seleção de notícias: formação da <strong>agenda</strong>midiáticaPara que se estruture a <strong>agenda</strong> dos meios de comunicação, é precisoum reconhecimento da <strong>agenda</strong> pessoal dos desti<strong>na</strong>tários da notícia.Medir a quantidade de vezes <strong>em</strong> que um assunto surge no jor<strong>na</strong>l não ésuficiente para explicar a sua inserção <strong>na</strong> <strong>agenda</strong>. Segundo Zucker(1978), “poucos anos após um assunto ocupar uma posição relevantenos mass media, já a maior parte das pessoas t<strong>em</strong> uma idéia acercadele e, portanto, é menos suceptível de ser influenciada quanto à data<strong>em</strong> que a issue (questão) se tornou, pela primeira vez, relevante nosmass media” (ZUCKER, 1978, apud WOLF, 2001: 172) [traduçãonossa]. Para Wolf, isso significa que os conhecimentos adquiridos peloleitor já integram sua enciclopédia, sua m<strong>em</strong>ória, o repertório deinformações que está sob seu domínio.Os t<strong>em</strong>as considerados importantes <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> individual variamsegundo cada pessoa; cada um t<strong>em</strong> preocupações que não sãonecessariamente coincidentes. Wolf destaca que “n<strong>em</strong> todos os t<strong>em</strong>astêm a mesma saliência e o mesmo limiar de relevância para os55


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdesti<strong>na</strong>tários; <strong>em</strong> relação a esta condição de partida, o ‘grandeesforço’ levado a cabo pelos mass media para colocar<strong>em</strong> <strong>em</strong> <strong>agenda</strong>t<strong>em</strong>as diversamente salientes, constitui uma fase de grandeimportância mas de êxito incerto, ligado a múltiplas variáveis” (WOLF,2001: 175). Para Lang-Lang (1981), é de se supor que o processo de“construção da <strong>agenda</strong> seja um processo colectivo, com um certo graude reciprocidade” (LANG-LANG, 1978: 465, apud WOLF, 2001: 175).As fases relevantes para a formação do <strong>agenda</strong>-setting, segundo Wolf,são as seguintes:“1. Os mass media dão um tal relevo a umacontecimento, uma acção, um grupo, umaperso<strong>na</strong>lidade, etc, que eles passam para o primeiroplano. Tipos diferentes de t<strong>em</strong>as requer<strong>em</strong>quantidades e qualidades diferentes de coberturapara atraír<strong>em</strong> atenção. Esta é a fase da focalização,mas é ape<strong>na</strong>s a primeira, necessária mas nãosuficiente, por si própria, para determi<strong>na</strong>r ainfluência cognitiva;2. o objecto focalizado pela atenção dos massmedia deve ser enquadrado, deve ser interpretadoà luz de um qualquer tipo de probl<strong>em</strong>a que elesimboliza: é a fase do framing, isto é, da‘imposição’ de um quadro interpretativo àquilo quefoi intensivamente coberto;3. <strong>na</strong> terceira fase, estabelece-se uma ligação entreo objecto ou acontecimento e um sist<strong>em</strong>a simbólico,de forma que o objecto se tor<strong>na</strong> parte de umpanorama social e político reconhecido; é a fase <strong>em</strong>que os mass media são decisivos para associar<strong>em</strong>acontecimentos pouco importantes, descontínuos, auma vivência constante, que se desenrola comosolução de continuidade;56


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO4. fi<strong>na</strong>lmente, o t<strong>em</strong>a adquire peso, se puderpersonificar-se <strong>em</strong> indivíduos que dele seconstituam ‘porta-vozes’. A possibilidade de darforma à <strong>agenda</strong> reside, <strong>em</strong> grande parte, <strong>na</strong>habilidade desses indivíduos para comandar<strong>em</strong> aatenção dos mass media, num processo de<strong>em</strong>polamento que volta a propor todo o ciclo defases” (WOLF, 2001, 175-176).A escolha dos fatos a ser<strong>em</strong> noticiados se submete a critérios diversos,seguindo uma escala de fatores como: “pro<strong>em</strong>inência/celebridade,importância do fato pelas conseqüências, raridade, vida, interessehumano, rivalidade, conflito ou luta, utilidade, entretenimento”(MEDINA, 1978: 68). Cr<strong>em</strong>ilda Medi<strong>na</strong> admite que esses critérios sãosubjetivos e ressalta:“Toda matéria jor<strong>na</strong>lística parte de uma pauta quepode ser intencio<strong>na</strong>l, procurada ou ocasio<strong>na</strong>l(acontecimento totalmente imprevisto) e essapauta t<strong>em</strong> <strong>em</strong> si a primeira força do processo, quepode ser chamada angulação.(...)A <strong>em</strong>presa que,por sua vez, está ligada a um grupo econômico epolítico (<strong>em</strong> bases b<strong>em</strong> características <strong>na</strong> AméricaLati<strong>na</strong>), conduz o comportamento da mensag<strong>em</strong> dacaptação do real à sua formulação estilística. N<strong>em</strong>s<strong>em</strong>pre é fácil chegar a este componente, porqueele não se apresenta claramente. Estudar apresença difusa e subjacente da <strong>em</strong>presajor<strong>na</strong>lística <strong>na</strong> mensag<strong>em</strong> expressa ou mesmo nocomportamento do repórter que aí trabalha é umatarefa de pesquisas que envolv<strong>em</strong> instrumentaleconômico, sociológico e psicológico” (MEDINA,1978: 73-74) [destaque nosso].57


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOPara Sandra Jovchelovitch (2000b), mesmo que os efeitoscontraditórios da <strong>mídia</strong> <strong>em</strong> nossas sociedades sejam enfatizados, "suatendência para produzir significados e valores heg<strong>em</strong>ônicos não deveser subestimada" (JOVCHELOVITCH, 2000b: 90). Para ela:"A <strong>mídia</strong> é ela mesma um ator chave no exercíciodo poder, particularmente <strong>na</strong>quelas sociedadesonde a <strong>mídia</strong>, a indústria e o governo estão <strong>na</strong>smãos da mesma família e onde a ausência de umaesfera pública forte impede o escrutínio dosinteresses privados que dirig<strong>em</strong> a indústria dascomunicações" (JOVCHELOVITCH, 2000b: 90).A pauta, seja ela ocasio<strong>na</strong>l, procurada ou intencio<strong>na</strong>l, é marcada pela<strong>agenda</strong> dos meios de comunicação; a escolha do que será notícia nodia seguinte não ocorre aleatoriamente, obedece a um t<strong>em</strong>ário préestabelecido.Segundo Sandra Jovchelovitch, "há a questão de <strong>em</strong> qu<strong>em</strong>edida a <strong>mídia</strong> impõe definições <strong>sobre</strong> a vida pública quando apóiaabertamente algumas políticas e seus defensores e exclui outros"(JOVCHELOVITCH, 2000b: 91). Ou seja, ao fomentar algumas práticase idéias, rechaça outras <strong>em</strong> sua <strong>agenda</strong>, deixando que os assuntosexcluídos somente entr<strong>em</strong> <strong>em</strong> seu t<strong>em</strong>ário através de concessões: oexótico ou inusitado, <strong>em</strong> datas com<strong>em</strong>orativas ou de protesto ou comoparte de um outro t<strong>em</strong>ário maior e já constitutivo do <strong>agenda</strong>-setting.Até mesmo o espaço desti<strong>na</strong>do à notícia, o formato dela <strong>na</strong> pági<strong>na</strong> e otítulo indicam a pro<strong>em</strong>inência jor<strong>na</strong>lística dada ao fato.2.4 O sujeito autor, o gatekeeper e o newsmakingEmbora o jor<strong>na</strong>lismo deseje ser referencial, como se o fato contasse asi mesmo, por trás de qualquer dizer há um sujeito – o repórter, oeditor, o dono do jor<strong>na</strong>l – apesar da tentativa da imprensa de apagaresse sujeito, numa estratégia discursiva de legitimar o <strong>discurso</strong>58


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOmidiático, que aparece como imparcial e objetivo. A escolha dos fatosque serão cobertos pelos repórteres é função do editor, que coorde<strong>na</strong>e julga a viabilidade de cobertura. De acordo com Cr<strong>em</strong>ilda Medi<strong>na</strong>, oeditor é (ou deveria ser) “o sujeito ‘b<strong>em</strong> informado’, sensível àd<strong>em</strong>anda, que antevê a oportunidade de determi<strong>na</strong>das coberturas, quesabe selecio<strong>na</strong>r as informações essenciais que o repórter traz, quesugere perguntas e, acima de tudo, que angula a matéria” (MEDINA,1978: 79). Ela afirma:“Muitas vezes, a <strong>em</strong>presa jor<strong>na</strong>lística oferece aorepórter, ao redator, ao editor, modernos recursosde processamento dos dados, mas o conteúdo, dapauta à edição, está marcado por um modelopater<strong>na</strong>lista de decisão <strong>na</strong> escolha dos t<strong>em</strong>as, noencaminhamento da edição e, portanto, noresultado fi<strong>na</strong>l. A tecnologia apressou o fluxonoticioso, agilizando os processos de codificação,mas esse fluxo não se põe a serviço integral dad<strong>em</strong>anda social. A informatização proporcio<strong>na</strong> oeficiente aprofundamento das fontes de informação,mas por enquanto ela só serve aos interesseseconômicos da circulação no mercado” (MEDINA,1978: 138).Reforçamos que, a partir da definição de <strong>agenda</strong>-setting, ou seja, dafixação de uma <strong>agenda</strong> de t<strong>em</strong>as pelos meios de comunicação – ondeassuntos são incluídos e excluídos - percebe-se que a <strong>mídia</strong> não é (en<strong>em</strong> poderia ser) a realidade que viv<strong>em</strong>os todos os dias, mas arepresentação dessa realidade, com fragmentos recortados er<strong>em</strong>ontados do cotidiano. No veículo de comunicação, faz-se atransposição de fatos <strong>na</strong>rrados, repletos de significados. Ao contráriodas teses defendidas <strong>em</strong> manuais de redação e <strong>na</strong> publicidade dosvários meios de comunicação <strong>na</strong> defesa do mito da imparcialidade (quenão se concretiza), partimos da assertiva de que o texto jor<strong>na</strong>lístico é59


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpleno <strong>em</strong> parcialidade: verificamos a presença autoral do jor<strong>na</strong>lista (etoda a carga ideológica e cultural que carrega) e da <strong>em</strong>presa para aqual trabalha <strong>em</strong> reportagens, notas e editoriais. A imparcialidade"transformou-se <strong>em</strong> mito e v<strong>em</strong> permitindo aos veículos decomunicação camuflar a tendenciosidade das notícias veiculadas"(GOMES, I., MELO, C. & MORAIS, 1998: 01). As autoras ressaltam:"A aparente neutralidade das informaçõesproporcio<strong>na</strong> uma ilusão de imparcialidade e, <strong>em</strong>conseqüência, conquista a credibilidade da opiniãopública" (GOMES, I., MELO, C. & MORAIS, 1998:01).Segundo Sérgio Luiz Gadini (1999), os meios de comunicação"des<strong>em</strong>penham hoje b<strong>em</strong> mais um papel de mecanismos deconstituição dos universos simbólicos. Apresentam-se, pois, comoel<strong>em</strong>entos cada vez mais indispensáveis no processo de identificação,apreensão e compreensão das relações sociais pelos indivíduos"(GADINI, 1999: 12). A ação discursiva da imprensa t<strong>em</strong> umacompreensão singular dos eventos t<strong>em</strong>atizados, fazendo s<strong>em</strong>pre um"recorte t<strong>em</strong>ático" que reconfigura o mundo social, a partir do enfoqueescolhido para tratar os fatos. Gadini acrescenta:"Falar <strong>em</strong> jor<strong>na</strong>lismo é, então, falar <strong>em</strong> fragmentosde realidade, resultante de um jogo de fatores ecódigos de produção discursiva". (GADINI, 1999:14).No texto jor<strong>na</strong>lístico, o redator se transforma <strong>em</strong> uma ante<strong>na</strong> querecebe informações e as <strong>em</strong>ite para o leitor/espectador, tarefa que éimpossível de acontecer de forma neutra: <strong>na</strong> condição de gatekeeper –o “guardião da entrada de notícias” –, escolhe, selecio<strong>na</strong>, passando porcritérios sujeitos à subjetividade e à ideologia. Conceito elaborado porKurt Lewin, <strong>em</strong> 1947, o gatekeeper é uma espécie de selecio<strong>na</strong>dor ou60


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOde guardião, um indivíduo ou grupo que filtra e controla a informação.Ele t<strong>em</strong> o poder de decidir se a informação será publicada oubloqueada. Embora o conceito tenha surgido para a<strong>na</strong>lisar asdinâmicas dentro dos grupos sociais (especialmente <strong>sobre</strong> asmudanças de hábitos alimentares), White (1950) trabalhou a mesmaconcepção para verificar como se desenvolve o fluxo de notícias dentrodos meios de comunicação, observando os pontos que permit<strong>em</strong> arejeição ou a publicação da informação. Wolf relata:“A pesquisa de White revela que ‘das 1333explicações para a recusa de uma notícia, cerca de800 atribuíam-<strong>na</strong> à falta de espaço e cerca de 300referiam ou uma <strong>sobre</strong>posição com histórias jáseleccio<strong>na</strong>das, ou falta de interesse jor<strong>na</strong>lístico oufalta de qualidade da escrita. Outros 76 casosdiziam respeito a acontecimentos <strong>em</strong> áreasd<strong>em</strong>asiado afastadas do jor<strong>na</strong>l e, por isso,presumivelmente desprovidas de interesse do leitor(...). Estatisticamente, no que respeita àsexplicações fornecidas pelo jor<strong>na</strong>lista e relatadaspor White, estas normas profissio<strong>na</strong>is superavam asdistorções subjectivas’ (HIRSCH, 1977: 22, apudWOLF, 2001: 181). Pesquisas posteriores realçaramigualmente o facto de, <strong>na</strong> selecção e <strong>na</strong> filtrag<strong>em</strong>das notícias, as normas ocupacio<strong>na</strong>is, profissio<strong>na</strong>ise organizativas parecer<strong>em</strong> ser mais fortes do queas preferências pessoais”. (WOLF, 2001: 181)[destaque nosso].Para DeGeorge (1981), o espaço e o formato ocupado pela notícia nojor<strong>na</strong>l são reflexos do <strong>agenda</strong>mento e da “mão” do gatekeeper. Eleafirma:61


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“A capacidade dos meios de comunicação socialpara produzir<strong>em</strong> mudanças através dos efeitoscognitivos pode ser atribuída ao permanenteprocesso de seleção realizado pelos gatekeeper nosmedia, os quais, <strong>em</strong> primeiro lugar, determi<strong>na</strong>mque acontecimentos são jor<strong>na</strong>listicamenteinteressantes e quais o não são e lhes atribu<strong>em</strong>diferente relevância <strong>em</strong> função de diversasvariáveis, como a extensão (<strong>em</strong> t<strong>em</strong>po ou <strong>em</strong>espaço), a importância (tipos de títulos, localizaçãono jor<strong>na</strong>l, freqüência de aparecimento, posição noconjunto das notícias) e o grau de conflituosidade (aforma como se apresenta o material jor<strong>na</strong>lístico) detodos os itens que dev<strong>em</strong> passar o crivo. Algumasnotícias são tratadas detalhadamente, outrasmerec<strong>em</strong> uma atenção supérflua; enquanto outrasserão completamente ignoradas. Da mesma forma,os meios audiovisuais pod<strong>em</strong> servir-se de uma‘estória’ desde o seu início ou pod<strong>em</strong> prescindirdela. (...) O <strong>agenda</strong>-setting postula que a audiênciaadota este tipo de afirmação t<strong>em</strong>ática e que,fazendo-o, incorpora um conjunto igual derelevâncias <strong>na</strong>s suas próprias <strong>agenda</strong>s”.(DEGEORGE, 1981: 219-220, apud SOUSA, 1999:82) [destaque nosso].Na verdade, o processo de seleção obedece não a critérios objetivos,mas a um esqu<strong>em</strong>a que envolve o contexto profissio<strong>na</strong>l, burocrático eorganizativo ao qual está inserido o jor<strong>na</strong>lista. Wolf afirma que:“As pesquisas são unânimes <strong>em</strong> esclarecer que, <strong>na</strong>selecção, as referências implícitas ao grupo decolegas e ao sist<strong>em</strong>a das fontes, predomi<strong>na</strong>m <strong>sobre</strong>as referências implícitas ao próprio público.62


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOEnquanto este é pouco conhecido pelos jor<strong>na</strong>listas,o contexto profissio<strong>na</strong>l-organizativo-burocráticocircundante exerce uma influência decisiva <strong>na</strong>sescolhas dos gatekeepers: o já clássico estudo deBreed (1955) <strong>sobre</strong> controlo social <strong>na</strong>s redacções –a<strong>na</strong>lisando os mecanismos de manutenção da linhaeditorial e política dos jor<strong>na</strong>is – confirma que essalinha, raramente explicitada e discutida, éapreendida por ‘osmose’ e é imposta, <strong>sobre</strong>tudo,através do processo de selecção dos jor<strong>na</strong>listas nointerior da redacção. A principal fonte deexpectativas, orientações e valores profissio<strong>na</strong>isnão é o público, mas o grupo de referênciaconstituído pelos colegas ou pelos superiores”.(WOLF, 2001: 182).De acordo com Wolf, Breed distingue seis motivos que dãoconformidade à orientação do jor<strong>na</strong>l: “a. a autoridade institucio<strong>na</strong>l e assanções; b. os sentimentos de dever e estima para com os superiores;c. as aspirações à mobilidade profissio<strong>na</strong>l; d. a ausência de fidelidadesde grupo contrapostas; e. o caráter agradável do trabalho; f. o factode a notícia se ter transformado <strong>em</strong> valor” (WOLF, 2001: 182). ParaWolf, as razões que justificam a escolha e a forma dada às reportagenssão fundamentais para explicar a “transição dos estudos <strong>sobre</strong>manipulação explícita da informação para a questão da ‘distorçãoinconsciente’ (unwitting bias) que se verifica constant<strong>em</strong>ente <strong>na</strong>cobertura informativa” (WOLF, 2001: 183).A imag<strong>em</strong> da realidade social criada pelos meios de comunicação estádiretamente relacio<strong>na</strong>da à organização e à produção desses meios.Isso significa que, para além da manipulação planejada, pensada apartir de pressões exter<strong>na</strong>s, existe uma distorção inconsciente porparte do jor<strong>na</strong>lista, que está relacio<strong>na</strong>da às práticas profissio<strong>na</strong>is, à63


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOroti<strong>na</strong> de produção, aos valores individuais e partilhados pelo grupo deredação, enfim, à ideologia. Wolf destaca:“As distorções inconscientes que, dia após dia,realçam uma determi<strong>na</strong>da representação darealidade social, margi<strong>na</strong>lizando alguns dos seusaspectos <strong>em</strong> favor de outros, são um el<strong>em</strong>ento queentra <strong>em</strong> jogo <strong>na</strong> dinâmica da difusão de efeitoscognitivos ligados àquela imag<strong>em</strong> da realidade.(...). Dos mass media - que constitu<strong>em</strong> um núcleocentral da produção simbólica, <strong>na</strong> sociedade actual– é necessário conhecer-se não ape<strong>na</strong>s os sist<strong>em</strong>asde valores, de representações, de imagináriocolectivo que eles propõ<strong>em</strong>, mas também o modo,os processos, as restrições e as limitações <strong>em</strong> quetudo isso acontece.” (WOLF, 2001: 184) [destaquenosso].As características da organização e da estrutura do veículo decomunicação determi<strong>na</strong>m a forma de reprodução da realidade social.Os estudos indicam a existência da distorção inconsciente orientandotanto a seleção dos fatos que serão notícias como o modo de suaapresentação. Wolf ressalta que isso não se restringe aos casosexcepcio<strong>na</strong>is, mas “alarga-se ao andamento rotineiro” (WOLF, 2001,185) da cobertura do veículo de comunicação. Assim, o newsmakingseria o produtor de informação, que segue uma roti<strong>na</strong> de produçãoque, por si, já é delimitadora e seletiva. A cultura profissio<strong>na</strong>l dosjor<strong>na</strong>listas e a organização do trabalho e dos processos produtivos sãodois aspectos fundamentais <strong>na</strong> análise <strong>em</strong> questão. Para Tuchman(1977):“O objectivo declarado de qualquer órgão deinformação é fornecer relatos dos acontecimentossignificativos e interessantes. Apesar de ser,64


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOevident<strong>em</strong>ente, um propósito claro, este objectivoé, como muitos outros fenômenos aparent<strong>em</strong>entesimples, inextricavelmente complexo. O mundo davida quotidia<strong>na</strong> – a fonte das notícias – éconstituído por uma superabundância deacontecimentos (...). São esses acontecimentos queo órgão de informação deve seleccio<strong>na</strong>r. A selecçãoimplica, pelo menos, o reconhecimento de que umacontecimento é um acontecimento e não umacasual sucessão de coisas cuja forma e cujo tipo sesubtra<strong>em</strong> ao registo. O objectivo de seleccio<strong>na</strong>rtornou-se mais difícil devido a uma característicaposterior dos acontecimentos. Cada um deles podeexigir ser único, fruto de uma conjunção específicade forças sociais, económicas, políticas epsicológicas que transformaram um acontecimentoneste acontecimento <strong>em</strong> particular (...). Do pontode vista do órgão de informação, é impossívelaceitar essa pretensão quanto a todos osacontecimentos. Como qualquer outra organizaçãocomplexa, um meio de informação não podetrabalhar <strong>sobre</strong> fenômenos idiossincrásicos. T<strong>em</strong> dereduzir todos os fenómenos a classificaçõeselaboradas propositadamente, como os hospitaisque ‘reduz<strong>em</strong>’ cada doente a um conjunto desintomas e de doenças (...). Essas exigências, quesão devidas à superabundância de factos queacontec<strong>em</strong>, indicam que os órgãos de informação,para produzir<strong>em</strong> notícias, dev<strong>em</strong> cumprir trêsobrigações:1. dev<strong>em</strong> tor<strong>na</strong>r possível o reconhecimento de umfacto desconhecido (inclusive os que sãoexcepcio<strong>na</strong>is) como acontecimento notável;65


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO2. dev<strong>em</strong> elaborar formas de relatar osacontecimentos que não tenham <strong>em</strong> conta apretensão de cada facto ocorrido a umtratamento idiossincrásico;3. dev<strong>em</strong> organizar, t<strong>em</strong>poral e espacialmente, otrabalho de modo que os acontecimentosnoticiáveis possam afluir e ser trabalhados deuma forma planificada. Estas obrigações estãorelacio<strong>na</strong>das entre si (TUCHMAN, 1977: 45,apud WOLF, 2001: 188-189) [destaque nosso].Na produção de notícias t<strong>em</strong>os a cultura profissio<strong>na</strong>l, que abarca desdea formação do jor<strong>na</strong>lista como ser humano, indo de estereótipos,símbolos, táticas, representações de papéis, rituais, convenções até aconcepção do produto notícia. Para Garbarino (1982), “a ideologiatraduz-se, pois, numa série de paradigmas e de práticas profissio<strong>na</strong>isadoptadas como <strong>na</strong>turais” (GARBARINO, 1982: 10, apud WOLF, 2001,189). O jor<strong>na</strong>lista faz parte de uma <strong>em</strong>presa com estrutura hierárquicaque exerce o controle e influencia a produção intelectual. MichaelKunczik salienta que “uma das grandes ilusões de muitos principiantesé a idéia de que os jor<strong>na</strong>listas sejam livres e independentes”(KUNCZIK, 1997: 18).No aspecto organizativo da <strong>em</strong>presa de comunicação de massa, hárestrições ligadas à organização do processo produtivo <strong>na</strong>s redações,onde são criadas convenções “que determi<strong>na</strong>m a definição de notícia,legitimam o processo produtivo, desde a utilização das fontes até àselecção dos acontecimentos e às modalidades de confecção, econtribu<strong>em</strong> para se precaver contra as críticas do público”(GARBARINO, 1982: 12, apud WOLF, 2001: 189).2.5 Critérios de noticiabilidade: produzindo ojor<strong>na</strong>l a partir dos valores-notícia66


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOEm que consiste a noticiabilidade de um fato? Ao conjunto de critérios– a cultura profissio<strong>na</strong>l, a formação pessoal do jor<strong>na</strong>lista, o processoprodutivo – que levam o jor<strong>na</strong>lista a escolher dentro de um númeroimprevisível de acontecimentos aqueles que serão notícia. São asações de caráter pessoal, social, ideológica, cultural e histórica quegeram a interferência <strong>na</strong> produção da notícia aos quais já nosreferimos. Para Altheide (1976), “as notícias são aquilo que osjor<strong>na</strong>listas defin<strong>em</strong> como tal” (ALTHEIDE, 1976: 113, apud WOLF,2001: 190). Para Sho<strong>em</strong>aker (SHOEMAKER, 1991, apud SOUSA,1999):“Os critérios de noticiabilidade geralmente inclu<strong>em</strong>,sob a forma de uma lista, fatores como aoportunidade, a proximidade, a importância, oimpacto ou a conseqüência, o interesse, o conflitoou a controvérsia, a negatividade, a freqüência, adramatização, a crise, o desvio, o sensacio<strong>na</strong>lismo,a pro<strong>em</strong>inência das pessoas envolvidas, a novidade,a excentricidade e a singularidade (no sentido depouco usual). (SHOEMAKER, 1991: 21-22, apudSOUSA, 1999: 48).Mas a noticiabilidade implica <strong>em</strong> um outro conceito: valores-notícia.Segundo Wolf, “esses valores constitu<strong>em</strong> a resposta à perguntaseguinte: quais os acontecimentos que são consideradossuficient<strong>em</strong>ente interessantes, significativos e relevantes para ser<strong>em</strong>transformados <strong>em</strong> notícias?” (WOLF, 2001: 195). Os valores-notícianão indicam ape<strong>na</strong>s o que deve ser transformado <strong>em</strong> reportag<strong>em</strong> <strong>na</strong>edição do dia seguinte, mas também a sua forma de apresentação: oque deve ser realçado ou omitido <strong>na</strong> preparação do texto para opúblico. A distorção involuntária, ligada às roti<strong>na</strong>s de produção e aosvalores profissio<strong>na</strong>is, perpassa todas as etapas de trabalho <strong>na</strong> redação.De acordo com Wolf:67


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“O rigor dos valores-notícia não é, pois, o de umaclassificação abstracta, teoreticamente coerente eorganizada; é, antes, a lógica de uma tipificaçãoque t<strong>em</strong> por objectivo atingir fins práticos de umaforma programada e que se desti<strong>na</strong>, acima de tudo,a tor<strong>na</strong>r possível a repetitividade de certosprocedimentos.Por isso, os valores-notícia dev<strong>em</strong> permitir que aselecção do material seja executada com rapidez,de um modo quase ‘automático’, e que essaselecção se caracterize por um certo grau deflexibilidade e de comparação, seja defensável postmort<strong>em</strong> e, <strong>sobre</strong>tudo, que não seja susceptível ded<strong>em</strong>asiados impedimentos” (WOLF, 2001: 197-198).Para Kunczik, os valores-notícia resultam de “suposições intuitivas dosjor<strong>na</strong>listas com referência àquilo que interessa a um públicodetermi<strong>na</strong>do, àquilo que chama a sua atenção” (KUNCZIK, 1997: 243).Um indicativo da existência prática dos valores-notícia é aespecialização t<strong>em</strong>ática presente nos jor<strong>na</strong>is. É a forma deapresentação real dos valores-noticia <strong>na</strong> prática organizativa, quepermite dividir o jor<strong>na</strong>l <strong>em</strong> partes, editorias e setores t<strong>em</strong>áticosespecíficos: economia, política, esportes, cultura, sindicalismo, ciência,meio ambiente, educação. “Estes t<strong>em</strong>as fornec<strong>em</strong> a maior parte dasnotícias e espera-se que forneçam acontecimentos dotados denoticiabilidade credível (realible newsworthiness)” (GOLDING-ELLIOTT,1979: 100, apud WOLF, 2001: 200).Segundo João Carlos Correia, “a linguag<strong>em</strong> jor<strong>na</strong>lística tende areproduzir o que é socialmente aceitável e predictível. Os valoresnotíciareflet<strong>em</strong> critérios de seleção do inesperado que é s<strong>em</strong>pre onegativo do que é tido por adquirido” (CORREIA, 2002, 02). Tanto68


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOKunczik (1997) quanto Wolf (2001) relacio<strong>na</strong>m os critérios quedetermi<strong>na</strong>m o processo de seleção de notícias. Partindo da perspectivade Wolf, t<strong>em</strong>os os seguintes critérios:1. critérios substantivos das notícias (conteúdo);2. disponibilidade do material/produto informativo;3. público;4. concorrência.No primeiro it<strong>em</strong>, t<strong>em</strong>os dois fatores: a importância e o interesse danotícia. Entretanto, esses fatores não são suficientes, uma vez que épreciso objetivar o que v<strong>em</strong> a ser a importância e o interesse. ParaWolf, quatro variáveis determi<strong>na</strong>m o critério da importância: o grau enível hierárquico dos indivíduos envolvidos no acontecimento noticiável(segundo Wolf (2001), Kunczik (1997) e Sousa (1999), quanto mais oacontecimento refere-se a países ricos e desenvolvidos ou pessoas deelite, mais provável que se torne notícia); o impacto <strong>sobre</strong> a <strong>na</strong>ção e<strong>sobre</strong> o interesse <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l (eventos que pod<strong>em</strong> atuar <strong>sobre</strong> osinteresses do País ou Estado receb<strong>em</strong> destaque); quantidade depessoas envolvidas no fato (quanto mais elevado o número, maischances de se tor<strong>na</strong>r notícia); e relevância do acontecimento comrelação a uma evolução futura (eventos de duração prolongada sãomais facilmente transformados <strong>em</strong> notícia).Dentre as variáveis acima, destacamos a primeira como a maissignificativa. De acordo com Wolf, “alguns dos factores que defin<strong>em</strong>,operativamente, o valor-notícia ‘importância’ de um acontecimento,são, portanto, o grau do poder institucio<strong>na</strong>l, o relevo de outrashierarquias não institucio<strong>na</strong>is, a sua ‘visibilidade’ (isto é, apossibilidade de ser<strong>em</strong> reconhecidas fora do grupo de poder <strong>em</strong>questão), a amplitude e o peso dessas organizações sociais eeconómicas” (WOLF, 2001: 202). Para ele, que destacou dentro doscritérios substantivos os fatores importância e interesse, no momentodo processo seletivo, o fator de interesse resulta de posições69


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOsubjetivas, portanto, menos vinculadas do que o fator importância.Assim, vale o bordão: se o cachorro morde o hom<strong>em</strong> não é notícia,mas se o hom<strong>em</strong> morde o cão, com certeza será. O interesse queindica o valor-notícia baseia-se, assim, no insólito, no curioso,seguindo o interesse humano, o heróico e o excepcio<strong>na</strong>l. É o queKunczik classifica de “qualidade do inesperado” (KUNCZIK, 1997: 245).No segundo it<strong>em</strong>, o critério é econômico e espacial: quanto a <strong>em</strong>presajor<strong>na</strong>lística terá que despender para o deslocamento físico do repórterpara que ele faça a cobertura do fato? Se as informações sãoacessíveis e se estão disponíveis dentro de uma distância consideradade fácil acesso, estará obedecendo a esse critério. Mas, o maisimportante a se observar é que notícias como a do hom<strong>em</strong> qu<strong>em</strong>ordeu o cachorro – que caracterizam a alteração da roti<strong>na</strong>, oinesperado – têm mais chance de ser notícia. E se o fato é negativo,aumentam as possibilidades de ganhar espaço no veículo. A infração, odesvio, a ruptura s<strong>em</strong>pre são destacados. Sobre isso, Kunczik afirma:“quanto mais negativo for o fato <strong>em</strong> suas conseqüências, maisprovável será que ele se torne matéria de notícia(...). As notíciasnegativas são mais inesperadas do que as positivas” (KUNCZIK, 1997:246-247).Ainda no it<strong>em</strong> relativo ao produto, a atualidade do fato – mesmo queseja atual ape<strong>na</strong>s para os jor<strong>na</strong>listas e que já seja fartamenteconhecido para as fontes da informação – é passível de divulgação.Outro ponto neste it<strong>em</strong> é a questão da repetitividade: se um fato éconsiderado repetitivo ou s<strong>em</strong>elhante a outros já publicados, não éconsiderado noticiável.No critério relacio<strong>na</strong>do ao público, Wolf ressalta que “os jor<strong>na</strong>listasconhec<strong>em</strong> pouco o seu público; mesmo que os órgãos de informaçãopromovam pesquisas <strong>sobre</strong> as características da audiência, os seushábitos e as suas preferências, os jor<strong>na</strong>listas raramente as conhec<strong>em</strong> epouco desejam fazê-lo” (WOLF, 2001: 212-213). Na Al<strong>em</strong>anha,70


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOsegundo Kunczik, o público que busca, por ex<strong>em</strong>plo, entretenimento<strong>na</strong>s pági<strong>na</strong>s dos jor<strong>na</strong>is, é pouco conhecido pelos jor<strong>na</strong>listas, que têmuma imag<strong>em</strong> depreciativa dos leitores:“os jor<strong>na</strong>listas os vê<strong>em</strong> como pessoas inócuas, s<strong>em</strong>opiniões firmes, ávidas de sensações, de baixonível de inteligência, primitivas e interessadasape<strong>na</strong>s superficialmente <strong>na</strong>s coisas intelectuais. Oleitor desqualificado é usado como justificativa peloresultado do que está sendo feito” (KUNCZIK,1997: 107).Dentro do último it<strong>em</strong>, a concorrência, traz à to<strong>na</strong> a questão daexistência de vários veículos de comunicação que, competindo entre si,lutam para trazer, <strong>na</strong> edição do dia seguinte, um diferencial, umpormenor <strong>em</strong> seu noticiário que faça o seu jor<strong>na</strong>l mais completo.Segundo Gans, “os mass media compet<strong>em</strong> <strong>na</strong> obtenção de exclusivos,<strong>na</strong> invenção de novas rubricas e <strong>na</strong> feitura de peque<strong>na</strong>s ‘caixas’ <strong>sobre</strong>os pormenores” (GANS, 1979: 177, apud WOLF, 2001: 214).Obedecendo a estes critérios – uns mais, outros menos, segundo ofato ao qual se deve decidir <strong>em</strong> <strong>na</strong>rrar ou não – o jor<strong>na</strong>lista precisapreencher todos os dias as pági<strong>na</strong>s do jor<strong>na</strong>l impresso ou ocupar osblocos do telejor<strong>na</strong>l. Para isso, o newsmaking – ou o construtor danotícia, que comanda o processo seletivo do material – leva o veículo aprivilegiar qu<strong>em</strong> traz a informação com garantias: as fontesinstitucio<strong>na</strong>is e as agências de notícias, o que acaba por levar os meiosde comunicação à homogeneidade e à uniformidade do que venha aser notícia, <strong>em</strong> virtude da dependência dos veículos a um númeroreduzido de agências <strong>em</strong> todo o mundo.Esta homogeneidade no seio da cultura profissio<strong>na</strong>l jor<strong>na</strong>lística vaialém das fronteiras territoriais, tor<strong>na</strong>ndo o conteúdo dos meios decomunicação social repetitivo. Sobre esta questão, Kunczik avalia que71


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOo alto grau de consonância entre os veículos de comunicação acabapor prejudicar uma possível multiplicidade de ângulos da notícia, oumesmo da escolha dos fatos noticiados. Noelle-Neumann (NOELLE-NEUMANN, 1973, apud KUNCZIK, 1997: 251) ressalta que, mesmoque o público tenha a capacidade de escolher entre os vários veículosde comunicação, o processo de escolha se faz restrito pela grandeconsonância entre os meios, que utilizam os mesmos critérios deseleção de notícias e as mesmas fontes de informação.As fontes, aliás, são hierarquizadas segundo sua capacidade de darinformações como representantes de um grupo ou de uma instituição.De acordo com Kunczik, “a supressão de certos t<strong>em</strong>as se deve àintegração da imprensa local à estrutura de poder local” (KUNCZIK,1997: 172). Na prática, isso pode significar privilégios para algunssegmentos da sociedade <strong>em</strong> detrimento de outros, cuja força comofonte é praticamente inexistente. Embora os meios de comunicaçãosejam capazes de determi<strong>na</strong>r que probl<strong>em</strong>as sociais dev<strong>em</strong> serenfatizados no processo de escolha dos fatos a se transformar<strong>em</strong> <strong>em</strong>notícia, pode também excluir fatos que deveriam subir <strong>na</strong> escala deprobl<strong>em</strong>as a ser<strong>em</strong> t<strong>em</strong>a do noticiário. De acordo com Kunczik, “podesefazer com que certos probl<strong>em</strong>as sociais se torn<strong>em</strong> invisíveis”(KUNCZIK, 1997: 253).Em Wolf, destaca-se que “as noticiais são, entre outras coisas, ‘oexercício do poder <strong>sobre</strong> a interpretação da realidade’” (SCHLESINGER,1972: 4 e GANS, 1979: 81, apud WOLF, 2001: 223). A estrutura sociale de poder indicam a importância da fonte (o que será melhorexplorado no capítulo 5). Kunczik reforça Wolf, afirmando que arelação de alguns jor<strong>na</strong>listas com seus informantes beira à intimidade,e ressalta: “eles têm uma crença quase cega <strong>na</strong>quilo que lhes é dito,porque os jor<strong>na</strong>listas acham que essas pessoas têm maisconhecimento que eles mesmos” (KUNCZIK, 1997: 173). SegundoGans:72


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“Aqueles que detêm o poder económico ou políticopod<strong>em</strong>, facilmente, ter acesso aos jor<strong>na</strong>listas e sãoacessíveis a estes; aqueles que não têm qualquerpoder, mais dificilmente se transformam <strong>em</strong> fontese não são procurados pelos jor<strong>na</strong>listas até as suasacções produzir<strong>em</strong> efeitos noticiáveis enquantomoral ou socialmente negativos” (GANS, 1979: 81,apud WOLF, 2001: 224) [destaque nosso].Wolf acrescenta:“Por sua vez, esta estruturação das fontes contribuipara reforçar a ideologia da notícia como factoexcepcio<strong>na</strong>l, ruptura da norma, desvio” (WOLF,2001: 224).Kunczik alerta para a condição organizativa dos receptores das notícias– eles mesmos possíveis fontes de informação:“Entre os componentes principais do ambiente deuma organização que produz mensagens <strong>em</strong>massa encontram-se os receptores nãoorganizados– leitores, ouvintes de rádio,telespectadores –, que são relativamenteimpotentes e não têm influência <strong>sobre</strong> os meios decomunicação. Os receptores organizados, como ospartidos políticos, a Igreja, os sindicatos, asorganizações de trabalhadores etc. são, <strong>em</strong>comparação, muito mais poderosos e influentes doque os que não estão organizados” KUNCZIK,1997: 18).Entretanto, o processo de selecio<strong>na</strong>r fatos para transformá-los <strong>em</strong>notícias exige que o jor<strong>na</strong>lista dê a esta escolha um caráter de73


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOobjetividade. Assim, ele legitima a seleção <strong>na</strong> medida <strong>em</strong> que recorre aartifícios e técnicas que encobr<strong>em</strong> a real subjetividade da escolha. Deacordo com Kunczik, algumas das formas para dar credibilidade àescolha do fato a ser noticiado estão:1. apresentação de opiniões contrárias no mesmo texto jor<strong>na</strong>lístico –isso causa a sensação no leitor/espectador de que as váriasperspectivas do fato foram abordadas;2. apresentação de evidência corroborativa – para dar confiabilidadeao fato <strong>na</strong>rrado, outros fatos adicio<strong>na</strong>is são veiculados de modoassociado;3. <strong>em</strong>prego de aspas – a opinião de várias pessoas, especialmente defontes consideradas de alto nível, dão força ao fato <strong>na</strong>rrado. Alémdisso, ao citar a opinião do outro, o jor<strong>na</strong>lista se exime deexpressar sua própria opinião abertamente, fazendo isso de mododisfarçado e encoberto pela opinião alheia.Na edição propriamente do material selecio<strong>na</strong>do, acontece algosignificativo: a descontextualização e recontextualização dos fatos.Para obedecer ao formato do veículo, os acontecimentos são contadosde forma fragmentada, partida, e inseridos dentro do modelo de jor<strong>na</strong>lpré-existente. Segundo Wolf, “a fragmentação dos conteúdos e daimag<strong>em</strong> da realidade social situa-se, exactamente, entre esses doismovimentos: por um lado, a extracção dos acontecimentos do seucontexto; por outro, a reinserção dos acontecimentos noticiáveis nocontexto constituído pela ‘confecção’, pelo formato do produtoinformativo.A rigidez do formato (uma duração preestabelecida e estável, umaord<strong>em</strong> no esqu<strong>em</strong>a prefixada e respeitada) acaba por constituir oparâmetro ao qual são adaptados os conteúdos dos noticiários” (WOLF,2001: 244). A edição, assim, constitui-se num processo <strong>em</strong> que osacontecimentos são adequados e adaptados de forma a se transformar74


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOnuma representação sintética, breve, mas coerente, com fatossalientados de modo a dar visibilidade à notícia. Wolf destaca:“De um <strong>discurso</strong>, serão retomadas ape<strong>na</strong>s aspassagens mais significativas e só essas serãoutilizadas; de um acontecimento, serão montadosos momentos mais importantes” (WOLF, 2001:245).2.6 Urgência do texto: atendendo as necessidadesbásicas do leitor comumEditar um jor<strong>na</strong>l impresso ou um telejor<strong>na</strong>l se reveste de um caráterde urgência inerente à imprensa. Assim, preparar uma reportag<strong>em</strong> élutar contra o t<strong>em</strong>po de edição e garantir o espaço no veículo.Segundo Morais (1997), “se confirma a argumentação primeira de quea notícia se constrói ante a necessidade dos meios de preencherespaços vazios <strong>em</strong> função da urgência do t<strong>em</strong>po. Essa necessidadeinfluirá também <strong>na</strong> decisão tomada acerca do tratamento que deve serdado a cada assunto” (MORAIS, 1997:148). [tradução nossa].Para atender a esta luta contra o t<strong>em</strong>po, o jor<strong>na</strong>lista deve preparar seutexto jor<strong>na</strong>lístico dando respostas a seis perguntas básicas: qu<strong>em</strong>,quê, quando, onde, como e por quê. Atendendo a estas questões, eleterá escrito o chamado lide da notícia, onde são passadas asinformações básicas do fato para o leitor comum. Mas qu<strong>em</strong> é o leitorcomum? Para Morais, o leitor médio ou comum é aquele que t<strong>em</strong> nosjor<strong>na</strong>is diários sua referência da atualidade. Segundo ela:“Este leitor comum de qu<strong>em</strong> falo é aquele querecebe a informação modelada pelos meios e, muitoprovavelmente, responde a esta interpretaçãomodelada s<strong>em</strong> haver participado dela ou sequer75


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOquestio<strong>na</strong>do acerca de seu interesse. Em certosentido, o leitor médio t<strong>em</strong> a característica – ou atendência – de aderir ao texto recebido, de formaque a informação passada se concretize e alcance aopinião desejada pela imprensa. Portanto, o leitormédio estará s<strong>em</strong>pre condicio<strong>na</strong>do a estabelecerrelações a partir do já difundido e antes tomadopela imprensa como notícia”. (MORAIS, 1997: 152).[tradução nossa].2.7 Gêneros jor<strong>na</strong>lísticos: as formas deapresentação da notíciaO fato pode ser <strong>na</strong>rrado <strong>em</strong> vários formatos e estilos <strong>na</strong> <strong>mídia</strong>,especialmente <strong>na</strong> imprensa escrita. Entretanto, o sist<strong>em</strong>a convencio<strong>na</strong>lde categorização de gêneros está no foco do debate por serconsiderado insuficiente para acomodar a grande quantidade devariações no formato de apresentação dos textos jor<strong>na</strong>lísticos,inclusive com a mistura de formas e a influência dos meiosaudiovisuais (como o uso de infografias, por ex<strong>em</strong>plo) e, maisrecent<strong>em</strong>ente, da informação on line via Internet. Enfim, as fronteirasentre os formatos de apresentação das notícias não estão mais claros.Apesar da discussão <strong>sobre</strong> a definição dos gêneros, uma classificaçãomínima é acad<strong>em</strong>icamente necessária, pois ajuda as pesquisas nocampo jor<strong>na</strong>lístico no sentido de definir que formatos de texto paraapresentação das notícias estão sob análise. Várias teorias foramdesenvolvidas, desde a Teoria do Esqu<strong>em</strong>a de Discurso, defendido porVan Dijk, Teoria dos Gêneros, como define Lorenzo Gomis, e Teoriados Sist<strong>em</strong>as de Texto, de Héctor Borrat, entre várias outras deorig<strong>em</strong> norte-america<strong>na</strong>, al<strong>em</strong>ã e espanhola. Nesta pesquisa,seguimos a seguinte categorização de gêneros, com base no estudo76


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdos professores José Francisco Sanchez e Fer<strong>na</strong>ndo López Pan(PARRATT, s/d: 04/05) e do professor José Marques de Melo (1994):Gêneros de Jor<strong>na</strong>lismo/Jor<strong>na</strong>lismo Informativo – t<strong>em</strong> comocaracterística a atualidade, que obriga a publicação danotícia <strong>em</strong> um prazo curto, segundo a periodicidade do meiode comunicação. Segundo José Marques de Melo, “osgêneros que correspond<strong>em</strong> ao universo da informação seestruturam a partir de um referencial exterior à instituiçãojor<strong>na</strong>lística: sua expressão depende diretamente da eclosãoe evolução dos acontecimentos e da relação que osmediadores profissio<strong>na</strong>is (jor<strong>na</strong>listas) estabelec<strong>em</strong> <strong>em</strong>relação aos seus protagonistas (perso<strong>na</strong>lidades ouorganizações)” (MELO, J., 1994: 64). São os seguintes osestilos aqui incluídos e que se encontram <strong>em</strong> nossapesquisa:Reportag<strong>em</strong> - trata-se da <strong>na</strong>rração de um fato com aapresentação das várias opiniões e perso<strong>na</strong>gens envolvidos<strong>na</strong> questão, <strong>na</strong> busca do equilíbrio entre os vários <strong>discurso</strong>sconcernentes à matéria, ou seja, ao assunto desenvolvidopela reportag<strong>em</strong>. Marques de Melo (1994) define areportag<strong>em</strong> como uma <strong>na</strong>rração ampliada de um fato querepercutiu socialmente e, por isso, foi percebido pelaimprensa. Luiz Amaral (1997) define a reportag<strong>em</strong> como arepresentação de um fato ou acontecimento, a partir daobservação feita pelo jor<strong>na</strong>lista. Ela segue o formato básicoaprendido <strong>na</strong>s escolas de comunicação, o lide, que consiste<strong>em</strong> <strong>na</strong>rrar a matéria a partir do que é considerado maisimportante, novo ou curioso, seguindo o esqu<strong>em</strong>a dos 5 W e1 H, criado pelos americanos, para a apresentação danotícia: qu<strong>em</strong> ou com qu<strong>em</strong> aconteceu o fato (who), o queaconteceu (what), quando (when), onde (where), por quê(why) e como se deu este fato (how). Segundo o Manual de77


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCORedação e Estilo de O Globo (1998), a reportag<strong>em</strong> pode sertanto a cobertura de um fato importante e de impacto do diacomo um assunto que não tenha ligação direta com a ediçãodo dia. Para G. Martín Vivaldi (1993), a reportag<strong>em</strong>, nosentido amplo, equivale à informação. Estritamente, seria aexposição de um fato seguindo um formato préestabelecido,de acordo com o conceito de pirâmide invertida(que consiste <strong>em</strong> <strong>na</strong>rrar os acontecimentos a partir do que émais importante e descer gradualmente aos fatos de menorinteresse <strong>sobre</strong> a mesma questão) e dos 5 W e 1 H;Retranca – é parte da reportag<strong>em</strong>, escrita <strong>em</strong> texto anexo auma reportag<strong>em</strong> maior, onde um assunto expressoanteriormente no texto anterior r<strong>em</strong>ete o leitor para estesegundo texto, mais detalhado, o que pode acontecer <strong>em</strong>uma ou mais retrancas. Também conhecido pelo nome debox (do inglês, quadro);Foto-legenda – também chamada de texto-legenda, tipo delegenda mais extensa, associada a uma foto. Segundo LuizAmaral, é “a legenda mais ampla” (AMARAL, 1997: 55), umavez que se constitui de um texto mais longo que o de umalegenda comum (chegando aproximadamente a umparágrafo de texto). Segundo o Manual de Redação e Estilode O Globo (1998), “é a legenda seguida de informações quelhe permit<strong>em</strong> ter existência independente como notícia”(MANUAL DE REDAÇÃO E ESTILO DE O GLOBO, 1998: 50).Gêneros de Jor<strong>na</strong>lismo Especializado/Jor<strong>na</strong>lismo Opi<strong>na</strong>tivo –textos cuja especificidade se dá por seus desti<strong>na</strong>tários, ouseja, a qu<strong>em</strong> se desti<strong>na</strong> o texto. Aqui estão incluídos críticas,crônicas especializadas e resenhas, que não foram objeto denossa pesquisa. O jor<strong>na</strong>lismo opi<strong>na</strong>tivo classificado por78


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOMarques de Melo (1994) integra tanto este perfil de textojor<strong>na</strong>lístico como os descritos abaixo.Gêneros de Autor/Jor<strong>na</strong>lismo Opi<strong>na</strong>tivo – a característicafundamental é a transmissão de um modo pessoal ouinstitucio<strong>na</strong>l ao texto. É importante ressaltar que, tantoneste gênero como no anterior, a interpretação do fato podeestar presente:Editorial - consiste num texto opi<strong>na</strong>tivo, que assume o papelde descrever a opinião do jor<strong>na</strong>l, uma vez que, mesmosendo escrito por uma só pessoa (o editorialista), segue apolítica e, conseqüent<strong>em</strong>ente, a linha de pensamentoteoricamente assumida pelo jor<strong>na</strong>l. Para Luiz Amaral, “a suaforça está ligada à conduta do jor<strong>na</strong>l” (AMARAL, 1997: 77) et<strong>em</strong> como fi<strong>na</strong>lidade apresentar um posicio<strong>na</strong>mentojor<strong>na</strong>lístico <strong>sobre</strong> um acontecimento (geralmente polêmico)que está sendo <strong>na</strong>rrado no jor<strong>na</strong>l do dia sob a forma dereportag<strong>em</strong>. Marques de Melo (1994) considera o editorial a“opinião oficial da <strong>em</strong>presa” (MELO, J., 1994: 95). De acordocom o Manual da Redação da Folha de S. Paulo, o editorial“deve apresentar com concisão a questão de que vai tratar,desenvolver os argumentos que o jor<strong>na</strong>l defende” (MANUALDA REDAÇÃO DA FOLHA DE S. PAULO, 2001: 64);Artigo - também consiste num texto opi<strong>na</strong>tivo, mas decaráter pessoal, ou seja, o seu autor assume aresponsabilidade pelas idéias expressas no texto, nãocorrespondendo necessariamente à linha de pensamento dojor<strong>na</strong>l. Para G. Martín Vivaldi (1993), o artigo consiste <strong>em</strong>texto amplo, com formas diversas segundo o seu autor, quevaloriza ou explica um fato ou uma idéia atual, segundo asconvicções do articulista. Marques de Melo (1994) considera79


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOo artigo o gênero capaz de d<strong>em</strong>ocratizar a opinião nojor<strong>na</strong>lismo;Nota - consiste <strong>em</strong> um pequeno texto normalmenteintegrante de uma colu<strong>na</strong> assi<strong>na</strong>da por um jor<strong>na</strong>lista da<strong>em</strong>presa jor<strong>na</strong>lística. Marques de Melo (1994) ressalta que acolu<strong>na</strong> surge a partir de informações de bastidores. LuizAmaral (1997) define a colu<strong>na</strong> como “uma espécie de áreaprivativa” (AMARAL, 1997: 95), onde notícia e comentário,humorismo e tom grave são dados <strong>em</strong> textos curtos. Deacordo com G. Martín Vivaldi (1993), o jor<strong>na</strong>lista colunistaescreve de modo interpretativo e valorativo <strong>sobre</strong> os fatosnoticiosos. Gozando de liberdade de expressão, o colunistaacrescenta às notícias divulgadas no jor<strong>na</strong>l “o lado pitorescodo acontecimento, o detalhe curioso de uma decisão”(AMARAL, 1997: 95). A colu<strong>na</strong> chega, entretanto, a sertambém um espaço onde a direção do veículo jor<strong>na</strong>lístico seaproveita para dar lugar às notícias de interesse próprio ou,como destaca Luiz Amaral, “a vala comum de notíciasmenores de interessa da direção da <strong>em</strong>presa, de suasrelações, das agências de relações públicas e publicidade edos amigos do colunista” (AMARAL, 1997: 96). A notatambém aparece no jor<strong>na</strong>l fora das colu<strong>na</strong>s assi<strong>na</strong>das, comoum resumo de matérias consideradas menos relevantes peloeditor e que, por isso, são transformadas <strong>em</strong> notas, nestescasos, editadas ao lado ou abaixo de reportagens de maiorrelevância (neste caso, seria classificada no gênero dejor<strong>na</strong>lismo);Nota comentada - t<strong>em</strong> as mesmas características do estiloanterior, sendo um pequeno texto integrante de uma colu<strong>na</strong>do jor<strong>na</strong>l, mas seguido de comentários do jor<strong>na</strong>listacolunista que identificam mais claramente a linha de80


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpensamento do repórter e/ou do meio de comunicação que oveicula;Carta à redação – este gênero se constitui <strong>em</strong> um espaço deopinião reservado ao leitor. Pode-se incluí-lo, assim, <strong>em</strong>gênero opi<strong>na</strong>tivo, mas que busca refletir o pensamento doleitor do jor<strong>na</strong>l, ou seja, é o espaço reservado para a crítica,concordância e expressão de opinião de pessoas alheias aoprocesso produtivo do jor<strong>na</strong>l.81


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO3. O sujeito e o <strong>discurso</strong>Somente uma teoria que abarque os conceitos marxistas <strong>sobre</strong>ideologia e sujeito se mostra capaz de estudar <strong>discurso</strong>s para além dasconcepções do Estruturalismo. Isso porque o significado do que se diznão está fundado no signo, <strong>na</strong> palavra <strong>em</strong> si, mas no sentido históricoe ideológico que ele carrega quando o <strong>discurso</strong> se dá. A ideologiadetermi<strong>na</strong> a linguag<strong>em</strong> e, seguindo a perspectiva de Althusser, alinguag<strong>em</strong> se coloca “como uma via por meio da qual se podedepreender o funcio<strong>na</strong>mento da ideologia” (MUSSALIM, 2001: 104).Para a Análise do Discurso Francesa (AD), o <strong>discurso</strong> é umamanifestação da ideologia e o sujeito é aquele que enuncia de umdetermi<strong>na</strong>do lugar social que ocupa. O <strong>discurso</strong>, para Althusser, é um“aparelho ideológico” através do qual ocorr<strong>em</strong> os conflitos entreposicio<strong>na</strong>mentos distintos.Partindo desta pr<strong>em</strong>issa, se o sujeito é o locutor de um dado <strong>discurso</strong>,o <strong>índio</strong> é o locutor de um <strong>discurso</strong> relacio<strong>na</strong>do à sua comunidade, ojor<strong>na</strong>lista id<strong>em</strong>. Para os teóricos da AD, este sujeito não é livre nomomento <strong>em</strong> que fala, <strong>em</strong> suas escolhas discursivas. Embora seimagine enunciar livr<strong>em</strong>ente, o indivíduo está inserido num contextohistórico, social, antropológico e psicológico que delimita e norteia suafala. Iludido, o sujeito se pensa capaz de definir e fazer opções <strong>na</strong>seleção do que vai dizer. Na verdade, para a AD, o indivíduo estáassujeitado a um contexto que limita o seu <strong>discurso</strong>: qu<strong>em</strong> seexpressa <strong>em</strong> sua fala é uma ideologia. Segundo Foucault (1971), “nãose pode falar de qualquer coisa <strong>em</strong> qualquer época; não é fácil dizeralguma coisa nova; não basta abrir os olhos, prestar atenção, outomar consciência, para que novos objetos logo se ilumin<strong>em</strong>, e que aoprimeiro raio de sol lanc<strong>em</strong> sua primeira claridade” (FOUCAULT, 1971:59).82


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOAinda para os teóricos da AD, o sujeito não é autor do próprio <strong>discurso</strong>n<strong>em</strong> leitor-intérprete absoluto do texto que lê. Ele é assujeitadoideológica, estrutural e psicologicamente e a língua é um produtohistórico, sociológico e psicológico. A liberdade de se expressar, decompreender e de defender valores e idéias não acontece de fato: oindivíduo está submetido às relações concretas do seu cotidiano, aoseu inconsciente e à estrutura (gramática) da própria língua. Mas,como se dá este assujeitamento? O indivíduo reconhece-se comosubmetido ao seu meio, à estrutura da língua e à sua formaçãohuma<strong>na</strong>?Todo ser humano, desde a infância, passa por um processo deformação como cidadão. Neste processo, concorre o modeloeducacio<strong>na</strong>l ao qual é submetido, o seu entorno social (que lhe dá umarcabouço ideológico) e a própria língua que aprende como meio parase comunicar (e suas estruturas gramaticais). Este processo enquadrao hom<strong>em</strong> dentro de uma formação discursiva que vai marcar o seupensamento. Mais: vai determi<strong>na</strong>r que seu <strong>discurso</strong> não é seu, é oamálgama de vários outros <strong>discurso</strong>s que circularam e circulam <strong>na</strong>sociedade. Segundo José Luiz Fiorin (2002):“A cada formação ideológica corresponde umaformação discursiva, que é um conjunto de t<strong>em</strong>ase de figuras que materializa uma dada visão d<strong>em</strong>undo. Essa formação discursiva é ensi<strong>na</strong>da acada um dos m<strong>em</strong>bros de uma sociedade ao longodo processo de aprendizag<strong>em</strong> lingüística. É comessa formação discursiva assimilada que o hom<strong>em</strong>constrói seus <strong>discurso</strong>s, que ele reagelingüisticamente aos acontecimentos. Por isso, o<strong>discurso</strong> é mais o lugar da reprodução que o dacriação. Assim como uma formação ideológicaimpõe o que pensar, uma formação discursivadetermi<strong>na</strong> o que dizer” (FIORIN, 2002: 32).83


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOFiorin afirma ainda que “o <strong>discurso</strong> não é pois, a expressão daconsciência, mas a consciência é formada pelo conjunto dos <strong>discurso</strong>sinteriorizados pelo indivíduo ao longo de sua vida” (FIORIN, 2002: 35).Tanto Fiorin como Sírio Possenti (1993) alertam para o fato do sujeitoestar s<strong>em</strong>pre repetindo <strong>discurso</strong>s outros <strong>em</strong> sua fala, apesar de nãoestar consciente disso. Segundo Possenti, “quando se pensa que se dizuma coisa nova, logo se pode descobrir que se diz uma coisa antiga,im<strong>em</strong>orial, um chavão, repete-se um enunciado de uma ideologia”(POSSENTI, 1993; 17).3.1 O sujeito e o outroDentro da perspectiva da Análise do Discurso, o <strong>discurso</strong> é do outro,somos marcados pela presença da fala do outro que contami<strong>na</strong> nossodizer, pois não somos autores de nossa enunciação: falamos o que jáfoi dito e reproduzido <strong>em</strong> vários <strong>discurso</strong>s. Para Possenti:“O indivíduo que fala é s<strong>em</strong>pre porta-voz. Você nãofala, é um <strong>discurso</strong> anterior que fala através devocê(...). Os enunciados que compõ<strong>em</strong> os <strong>discurso</strong>ssão poucos, e são ditos muitas vezes, daí a falação,mas também a repetição. Os enunciados não têmorig<strong>em</strong>, são <strong>em</strong> grande parte im<strong>em</strong>oriais, e ossentidos que carregam são conseqüência dos<strong>discurso</strong>s a que pertenceram ou pertenc<strong>em</strong>, e nãode ser<strong>em</strong> ditos por você ou por outro nestainstância da enunciação” (POSSENTI, 1993: 17).Para compreender o sentido do que se fala, é preciso saber a qualformação discursiva pertence o enunciado, podendo ter mais de umsentido se pertencer a mais de uma formação. A formação discursivaconsiste <strong>na</strong> materialização da formação ideológica, psicológica e84


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOlingüística do sujeito, ou seja, a que grupo ou classe social pertence,<strong>em</strong> que campo social circula e de que forma está heg<strong>em</strong>onicamenteinserido <strong>na</strong> sociedade. Como ressalta Fiorin, “não dev<strong>em</strong>os esquecernosde que assim como a ideologia domi<strong>na</strong>nte é a da classedomi<strong>na</strong>nte, o <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte é o da classe domi<strong>na</strong>nte” (FIORIN,2002: 32). Ele compl<strong>em</strong>enta:“As visões de mundo não se desvinculam dalinguag<strong>em</strong>, porque a ideologia vista como algoimanente à realidade é indissociável da linguag<strong>em</strong>.As idéias e, por conseguinte, os <strong>discurso</strong>s sãoexpressão da vida real. A realidade exprime-sepelos <strong>discurso</strong>s” (FIORIN, 2002: 33).De acordo com Ângela Cristi<strong>na</strong> Trevisan Felippi (1999), “o sujeito éentendido como efeito discursivo, não causa n<strong>em</strong> orig<strong>em</strong> do <strong>discurso</strong>.O sujeito se constitui no ato enunciativo e constitui também o outro, osujeito-alocutário”. (FELIPPI, 1999: 08). Para Jacqueline Authier-Revuz(1990), o <strong>discurso</strong> de um s<strong>em</strong>pre estará marcado pela presença do<strong>discurso</strong> do outro, <strong>discurso</strong> pré-existente que é ape<strong>na</strong>s repetido ereafirmado pelo sujeito. É o <strong>discurso</strong> produto do inter<strong>discurso</strong>.3.2 Heterogeneidades discursivasA alteridade – a presença do “outro” <strong>em</strong> nosso <strong>discurso</strong> - éinconsciente a ponto do sujeito não conseguir perceber marcas queindiqu<strong>em</strong> a presença deste outro no <strong>discurso</strong> que assume como seu.Fiorin enfatiza a importância da alteridade no <strong>discurso</strong>, assi<strong>na</strong>lando:“A alteridade é uma dimensão constitutiva dosentido. Não há identidade discursiva s<strong>em</strong> apresença do outro. Poderíamos até constituir o85


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOseguinte mote: fora da relação com o outro, não hásentido”. (FIORIN, 1994: 36).Fiorin (2002) salienta que todos os <strong>discurso</strong>s têm uma “funçãocitativa” (expressão de Edward Lopes) <strong>em</strong> relação a outros <strong>discurso</strong>s.Para a Análise do Discurso, o sujeito t<strong>em</strong> ape<strong>na</strong>s a ilusão de controle<strong>sobre</strong> seu enunciado, ao se pensar capaz de fazer escolhas, terintenções e tomar decisões no momento da fala. Segundo JacquelineAuthier-Revuz (1990), esta ilusão é necessária para o equilíbrio do eu,que, para a AD (baseada <strong>na</strong> Psicanálise freudia<strong>na</strong>) é descentrado,fendido, assujeitado pelo meio. Sua fala é produto inconsciente da falado segmento ao qual está inserido.Esta visão é fruto dos estudos de Michel Pêcheux <strong>sobre</strong> o sujeito.Baseado <strong>em</strong> trabalhos anteriores de Michel Foucault, de MikhailBakhtin e de Jacques Lacan, Pêcheux defendeu a polifonia comofundamento dos <strong>discurso</strong>s. O trajeto de um <strong>discurso</strong> faz com que, nocaminho, “arraste” com ele el<strong>em</strong>entos de outros <strong>discurso</strong>s, formandoum <strong>discurso</strong> outro que já não é o mesmo formulado anteriormente,rico <strong>em</strong> várias vozes sublimi<strong>na</strong>res que tor<strong>na</strong>m o <strong>discurso</strong> polifônico. Aexistência da polifonia é constitutiva dos <strong>discurso</strong>s, onde ficaregistrada uma m<strong>em</strong>ória discursiva que traz uma carga de ideologia ehistória. Segundo Felippi:“A idéia de polifonia, de Bakhtin, v<strong>em</strong> dos estudosdesse autor <strong>sobre</strong> dialogismo, que decorre dainteração verbal que se estabelece entre oenunciador e o enunciatário, no espaço do texto. Éconstitutivo da linguag<strong>em</strong> e de todo <strong>discurso</strong>. É arede interativa que articula as vozes de um <strong>discurso</strong>(...). Os textos são dialógicos porque resultam do<strong>em</strong>bate de muitas vozes sociais e pod<strong>em</strong> produzirefeito de polifonia ou monofonia, esse quando o86


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdiálogo é mascarado e uma só voz faz-se ouvir(FELIPPI, 1999: 08).A língua é o lugar <strong>em</strong> que o outro se estabelece mesmo s<strong>em</strong> que sepossa sentir. Não há como produzir textos e sentidos s<strong>em</strong> a presençado outro. Ou seja, não existe monofonia, mas um <strong>discurso</strong> polifônicoque se disfarça. Fiorin fala da simulação a que está submetido o<strong>discurso</strong>: ele finge ser do indivíduo, quando <strong>na</strong> verdade é um produtosocial de uma cadeia de <strong>discurso</strong>s. Edward Lopes conclui:“Combi<strong>na</strong>ndo uma simulação com umadissimulação, o <strong>discurso</strong> é uma trapaça: ele simulaser meu para dissimular que é do outro” (LOPES,1978: 100, apud FIORIN, 2002: 42).Bakhtin foi precursor da idéia de que todo <strong>discurso</strong> t<strong>em</strong> a presença deum outro, de outras vozes que “falam” através dele e que oconstitu<strong>em</strong>. O dialogismo foi o ponto que Bakhtin defendeu como basepara a formação do <strong>discurso</strong> e sua percepção como fundamento daheterogeneidade. A interação de várias enunciações, o diálogo, é abase de qualquer <strong>discurso</strong>: não há monofonia e a polifonia – apresença de várias vozes no <strong>discurso</strong> – pode não estar marcada,determi<strong>na</strong>da, mas é constitutiva do <strong>discurso</strong>.Fiorin observa que, ao tentarmos excluir o outro do nosso <strong>discurso</strong> –através da desqualificação e do desmerecimento que faz<strong>em</strong>os do seu<strong>discurso</strong> – usamos palavras presentes <strong>em</strong> ambos os enunciados, masque não falam a mesma coisa. Como já diss<strong>em</strong>os, para Bakhtin(1992a) a palavra é neutra porque pode integrar e pertencer aqualquer <strong>discurso</strong>, e seu sentido se adequa à função ideológica doenunciado no momento <strong>em</strong> que passa a ser usada pelo sujeito. Ou,como afirma Pêcheux, as palavras “mudam seu sentido de acordo comas posições de qu<strong>em</strong> as usa” (PÊCHEUX et al., 1979: 33, apudFAIRCLOUGH, 2001: 52). Segundo Authier-Revuz (1990), a palavra é87


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOple<strong>na</strong>, carregada, atravessada pelos <strong>discurso</strong>s que compuseram aformação social do sujeito, reproduzindo as teias que compõ<strong>em</strong> estaformação. Possenti (2002) observa que “a significação depende dos<strong>discurso</strong>s <strong>em</strong> que as palavras e enunciados ocorr<strong>em</strong>” e “que são certaspalavras que faz<strong>em</strong>, <strong>em</strong> boa medida, com que textos sejamconsiderados racistas, machistas etc”. (POSSENTI, 2002: 41).Segundo Dominique Maingueneau (1987), “todo <strong>discurso</strong> define suaidentidade <strong>em</strong> relação ao outro. Isso quer dizer que o <strong>discurso</strong>apresenta uma heterogeneidade constitutiva” (MAINGUENEAU, 1987:81-93, apud FIORIN, 1994: 33). Tanto Maingueneau como JacquelineAuthier-Revuz estudaram a heterogeneidade constitutiva dos <strong>discurso</strong>se a definiram metodologicamente <strong>em</strong> duas instâncias:1. heterogeneidade constitutiva não-mostrada;2. heterogeneidade constitutiva mostrada.As heterogeneidades constitutivas inscrev<strong>em</strong> o outro no nosso <strong>discurso</strong>de modo evidente, marcado, mostrado, ou de modo não-mostrado,onde a inscrição do outro no <strong>discurso</strong> é implícita, “não localizável e nãorepresentável” (AUTHIER-REVUZ, 1990: 32). A heterogeneidad<strong>em</strong>ostrada apresenta-se identificada no <strong>discurso</strong>. O outro é referidodiretamente através de aspas, <strong>discurso</strong> indireto livre, imitação, ironia.Expressões como “segundo fulano”, “para fulano”, “como diz fulano”etc. marcam a heterogeneidade mostrada, apontando o momento <strong>em</strong>que o outro aparece, “fala” no <strong>discurso</strong>.A heterogeneidade não-mostrada se afirma <strong>em</strong> sua constituição: <strong>em</strong>seu <strong>discurso</strong>, o sujeito enuncia a fala do outro de forma insconscientee s<strong>em</strong> marcar explicitamente o momento do dizer alheio, uma vez queele mesmo não se apercebe desta alteridade. Maingueneau ressaltaque “mesmo <strong>na</strong> ausência de qualquer marca de heterogeneidad<strong>em</strong>ostrada, toda unidade de sentido, de qualquer tipo que seja, podeser inscrita numa relação essencial com uma outra, a do ou dos88


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO<strong>discurso</strong>s <strong>em</strong> relação às quais o <strong>discurso</strong> de que ela depende definesua identidade” (MAINGUENEAU, 1987: 88, apud FIORIN, 1994: 33).Jacqueline Authier-Revuz (1990) salienta que:“Heterogeneidade constitutiva do <strong>discurso</strong> eheterogeneidade mostrada no <strong>discurso</strong> representamduas ordens de realidade diferentes: a dosprocessos reais de constituição dum <strong>discurso</strong> e ados processos não menos reais, de representação,num <strong>discurso</strong> de sua constituição” AUTHIER-REVUZ,1990: 32).3.3 O sujeito ativoPossenti (2002) conjuga à Análise do Discurso Francesa uma certadose da Teoria Pragmática ao dar um relativo papel ativo ao sujeito.Ele defende que há espaço para a inscrição do indivíduo no <strong>discurso</strong>,onde ele pode deixar a sua marca - mesmo <strong>na</strong> condição deassujeitado. O indivíduo assume um papel ativo, apesar de estarsubmetido às questões ideológicas, estruturais e psicológicas da suaformação discursiva, <strong>na</strong> qual se encontra inserido. Na perspectivadefendida por Possenti, o assujeitamento não se dá de forma ple<strong>na</strong> e osujeito t<strong>em</strong> “uma certa competência” <strong>na</strong> escolha de seu materialdiscursivo. Segundo ele,“mesmo atravessado pelo inconsciente e/ou pelaideologia, não está impedido de adquirir o domíniode certas regras e de poder controlar, até certoponto, os efeitos de seu <strong>discurso</strong>, ou de fazer comque determi<strong>na</strong>dos el<strong>em</strong>entos do <strong>discurso</strong> soframuma inflexão específica, com efeitos circunstanciais”(POSSENTI, 2002: 88).89


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCODe acordo com Pêcheux (1990), no momento <strong>em</strong> que o <strong>discurso</strong>ocorre, <strong>em</strong> seu acontecimento, é que se dá o sentido, que seestabelece <strong>na</strong> enunciação e não no enunciado. Ou seja, o sujeito fala apartir de uma determi<strong>na</strong>da posição social, de um lugar que ocupa.Assim, mesmo repetindo o <strong>discurso</strong> já dito, um novo valor pode seragregado. É o que ocorre, por ex<strong>em</strong>plo, nos meios de comunicaçãoquando um texto jor<strong>na</strong>lístico é produzido: ele deverá ter a marca doautor, a marca da <strong>em</strong>presa <strong>na</strong> qual trabalha o jor<strong>na</strong>lista e poderádefender um <strong>discurso</strong> já dito, trazendo a ele uma atualização, umrevigoramento, a partir da posição ocupada pelo(s) sujeito(s) quefala(m).Esta concepção de sujeito ativo pressupõe que o indivíduo fazescolhas, <strong>em</strong>bora seja ele mesmo afetado pelo <strong>discurso</strong>. Para Possenti,“a presença do outro não é suficiente para apagar a do eu, é ape<strong>na</strong>ssuficiente para mostrar que o eu não está só” (POSSENTI, 2002:64/65). O a<strong>na</strong>lista de <strong>discurso</strong> americano Norman Fairclough (2001)considera um equívoco a visão de que o sujeito é ape<strong>na</strong>s efeito do<strong>discurso</strong> e afirma que a potencialidade do indivíduo <strong>em</strong> fazer escolhasdiscursivas e de mudar as condições de assujeitamento sãonegligenciadas.Na hora de ler/ouvir um enunciado, porém, o leitor/ouvinte não sabe,<strong>em</strong> tese, <strong>em</strong> que formação discursiva se alinha o texto determi<strong>na</strong>do,<strong>em</strong>bora haja indícios, gramaticais, inclusive, que apontam <strong>em</strong> quedireção ideológica o <strong>discurso</strong> caminha. No momento de redizer, acriação acontece <strong>na</strong>s escolhas das citações, dos verbos, dos adjetivos,muitas vezes ancorando o novo <strong>em</strong> algo já conhecido. Como jádiss<strong>em</strong>os, a escolha do que se diz está marcada histórica, ideológica eestruturalmente, não sendo um ato de total liberdade, masdependente do repertório do autor e de sua inscrição social (ou <strong>em</strong>que formação discursiva e grupo social se insere).90


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOA palavra ganha sentido quando enunciada pelo sujeito e, nest<strong>em</strong>omento, o sentido que carrega traz a intenção do enunciador,mesmo que seja marcado pelo saber histórico acumulado peloindivíduo <strong>em</strong> sua vivência – o que reforça a concepção de sujeito ativode Possenti. Para ele, o enunciador é “um sujeito que intervémativamente e produz algo novo – e, ouso dizer, que sabe o que estáfazendo. Pelo menos, <strong>em</strong> boa parte, porque há certamente uma boaquota de trabalho do inconsciente nesses casos” (POSSENTI, 2002:71). O sujeito, mesmo num contexto de assujeitamento, age,manobra, ainda que o resultado de seu <strong>discurso</strong> não sejapossivelmente o que intencionou, pois está limitado socialmente econdicio<strong>na</strong>do às relações de poder.3.4 O sujeito passivo, aquele de qu<strong>em</strong> se fala: osilêncio do sujeitoPara ganhar consistência, todo <strong>discurso</strong> precisa ganhar visibilidade,precisa circular. Na condição de fonte privilegiada pelo poder políticoou econômico que exerce, um determi<strong>na</strong>do indivíduo terá maischances de transformar seu <strong>discurso</strong> ou o <strong>discurso</strong> do segmento <strong>em</strong>que inscreve <strong>em</strong> notícia, dando visibilidade à fala de seu grupo social.Um dado <strong>discurso</strong> adquire uma posição <strong>na</strong> hierarquia social de valorese, quanto mais forte for o peso do sujeito que fala, mais dificilmenteterá seu enunciado contestado ou passível de comentários e réplicas.Foucault (1971) questio<strong>na</strong>: “qu<strong>em</strong> fala? Qu<strong>em</strong>, no conjunto de todosos indivíduos-que-falam, está autorizado a ter esta espécie delinguag<strong>em</strong>? Qu<strong>em</strong> é seu titular?” (FOUCAULT, 1971: 65). Estasperguntas indicam claramente que o sujeito fala de um determi<strong>na</strong>dolugar social, de uma posição que assume. Segundo Fairclough, “oseventos dignos de se tor<strong>na</strong>r notícia se origi<strong>na</strong>m de limitado grupo depessoas que têm acesso privilegiado à <strong>mídia</strong>, que são tratadas pelosjor<strong>na</strong>listas como fontes confiáveis, e cujas vozes são aquelas que são91


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOmais largamente representadas no <strong>discurso</strong> da <strong>mídia</strong>” (FAIRCLOUGH,2001: 143). Isso reforça o que já diss<strong>em</strong>os antes <strong>sobre</strong> o grau e nívelhierárquico dos indivíduos envolvidos num evento noticiável e mesmoa confiabilidade reservada às fontes institucio<strong>na</strong>is, <strong>em</strong> detrimento deoutras.Se há qu<strong>em</strong> tenha “autoridade” para falar, há os que estãodesautorizados, porque ocupam uma posição s<strong>em</strong> significância socialou política. Este espaço é ocupado por integrantes de segmentosmenos expressivos social e economicamente. Apesar da idéia inicial deHabermas de que o indivíduo deve se despir de condições sociaisprivilegiadas para expor seu <strong>discurso</strong> através dos meios decomunicação, o que se observa é que o sujeito s<strong>em</strong>pre fala de umdetermi<strong>na</strong>do lugar. Foucault (1996) destaca que o <strong>discurso</strong> segue umaord<strong>em</strong> que expressa exatamente de que posição fala este sujeito.Estratégias discursivas acabam por silenciar a voz de determi<strong>na</strong>dasfontes ou de marcá-las de modo a enfraquecer o seu <strong>discurso</strong>.Normalmente, quando opiniões de um outro são reproduzidas <strong>em</strong> umtexto, faz-se a escolha de palavras para construir o <strong>discurso</strong>. Emboraisso pareça uma atitude ingênua, nunca está livre da carga ideológicade qu<strong>em</strong> faz o texto, uma vez que esta seleção não é aleatória.Segundo Luiz Antônio Marcushi, "apresentar ou citar o pensamento dealguém implica, além de uma oferta de informação, também uma certatomada de posição diante do exposto" (MARCUSHI, 1991: 75). Eacrescenta: “é muito difícil informar s<strong>em</strong> manipular, por melhores quesejam as intenções” (MARCUSHI, 1991: 92). Esta seleção no <strong>discurso</strong>s<strong>em</strong>pre incorre num não-dizer, pois quando algo é escolhido, algo épreterido e deixado de lado no <strong>discurso</strong>. Segundo Eni Puccinelli Orlandi(2002a), este silêncio é constitutivo do <strong>discurso</strong>. Há, porém, o silêncioresultante da censura, aquilo que não se pode dizer dentro de umcontexto. De acordo com Orlandi (2002a),92


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO“as relações de poder <strong>em</strong> uma sociedade como anossa produz<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre a censura, de tal modoque há s<strong>em</strong>pre silêncio acompanhando as palavras.Daí que, <strong>na</strong> análise, dev<strong>em</strong>os observar o que nãoestá sendo dito, o que não pode ser dito etc”(ORLANDI, 2002a: 83).A relação do sujeito com a sua história particular é silenciosa porqueela “s<strong>em</strong>pre se dá nos limites da significação” (GADINI, 1997: 15).Todo <strong>discurso</strong> repousa <strong>sobre</strong> o já-dito, que n<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre se constitui<strong>em</strong> algo pronunciado, expresso previamente, mas um <strong>discurso</strong> outroque pode nunca ter sido manifestado, um silêncio que se encontraabaixo do enunciado, e que o <strong>discurso</strong> expresso tudo faz para mantercalado. Este silêncio que constitui o <strong>discurso</strong> é também o espaçolatente de sujeitos que, ocupando posições sociais que lhe imped<strong>em</strong> dedar ord<strong>em</strong> ao <strong>discurso</strong>, acabam assumindo um papel passivo noenunciado.Orlandi (2002b) distingue entre a existência do “silêncio fundador”,que existe a cada escolha <strong>sobre</strong> o que falar – significando o espaço donão-dito – e a “política do silêncio”. É o silêncio fundador que sustentaa tese de que a linguag<strong>em</strong> é política. A “política do silêncio” é dividida<strong>em</strong>: a) o silêncio constitutivo (para dizer, é preciso não-dizer, pois“uma palavra apaga necessariamente as ‘outras’ palavras” (ORLANDI,2002b: 24); b) o silêncio local, promovido pela censura. É estesegundo que nos interessa, pois ele representa as interdições, oefetivo silenciamento de vozes no <strong>discurso</strong>. Orlandi esclarece estaforma de silêncio:“Em face dessa sua dimensão política, o silênciopode ser considerado tanto como parte da retóricada domi<strong>na</strong>ção (a da opressão) como de suacontrapartida, a retórica do oprimido (a daresistência). E t<strong>em</strong> todo um campo fértil para serobservado: <strong>na</strong> relação entre <strong>índio</strong>s e brancos, <strong>na</strong>93


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOfala <strong>sobre</strong> a reforma agrária, nos <strong>discurso</strong>s <strong>sobre</strong> amulher, só para citar alguns terrenos já exploradospor mim” (ORLANDI, 2002b: 31).[destaque nosso]Este sujeito silenciado, passivo t<strong>em</strong> seu <strong>discurso</strong> rebaixado pelo<strong>discurso</strong> do outro: alguém se apresenta e fala <strong>em</strong> seu lugar, diz o queo sujeito deveria falar, poderia falar ou talvez não quisesse falar;enfim, este outro fala o que lhe convém falar. Aqui, o silêncio não é aausência de palavras, mas a escolha de palavras que produzam osentido que se quer, apagando outros possíveis sentidos, interditandoum dizer. Como afirma Orlandi (2002b), “proíb<strong>em</strong>-se certas palavraspara se proibir<strong>em</strong> certos sentidos” (ORLANDI, 2002b: 78). A autorareforça que a imposição do silêncio não é o mesmo que calar o sujeito.Segundo ela, “às relações de poder interessa menos calar ointerlocutor do que obrigá-lo a dizer o que se quer ouvir. A issochamamos a injunção ao dizer” (ORLANDI, 1996: 263/264). Estainjunção, porém, não é consciente: o sujeito fala, mas dado o seuassujeitamento, fala segundo a formação ideológica domi<strong>na</strong>nte, logo,reproduz o senso comum e fortalece os sentidos do <strong>discurso</strong>domi<strong>na</strong>nte como os sentidos literais.Mesmo colocado como sujeito passivo, ele não se contrapõe ao sujeitoativo por sua incapacidade pessoal de ter certas intenções <strong>em</strong> seu<strong>discurso</strong>, mas por sua incapacidade política, social e econômica de seruma fonte ativa para ocupar espaço no campo midiático e expressar o<strong>discurso</strong> inerente à sua formação discursiva e ao seu segmento social.À fonte jor<strong>na</strong>lística ativa se contrapõe a fonte passiva. A primeira t<strong>em</strong>voz e peso social que lhe confer<strong>em</strong> condições de falar a partir daposição que ocupa; a segunda é, <strong>em</strong> grande parte, silenciada e <strong>sobre</strong>ela outras vozes falam, sua identidade é afetada e o lugar social queocupa é deslocado (os conceitos de fonte ativa e fonte passiva serãoesclarecidos no capítulo 5 desta dissertação).94


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOEste apagamento,porém, não é monolítico. Assim como háintecio<strong>na</strong>lidade no sujeito ativo – mesmo parcial e sob certas condiçõeshistóricas, sociais e psicológicas – o sujeito que é apassivado tambémpode, nos lapsos discursivos 4do <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte, expressar osconflitos e contradições existentes no processo de domi<strong>na</strong>ção <strong>em</strong> quese encontra inserido. É o que Orlandi (2002b) define como “retórica daresistência”. Como o silêncio <strong>em</strong> si possui seu significado, o silêncioprovocado pela interdição do dizer assume um sentido de resistência.Orlandi (2002a) salienta:“Uma sociedade como a nossa, pela suaconstituição, pela sua organização e funcio<strong>na</strong>mento,pensando-se o conjunto de suas práticas <strong>em</strong> suamaterialidade, tende a produzir a dominância do<strong>discurso</strong> autoritário, sendo o (<strong>discurso</strong>) lúdico o quevaza, por assim dizer, nos intervalos, derivas,margens das práticas sociais e institucio<strong>na</strong>is. O<strong>discurso</strong> polêmico é possível e configura-se comouma prática de resistência e afrontamento”(ORLANDI, 2002a: 87).As observações indicam, entretanto, que um <strong>discurso</strong> de resistêncianormalmente é contido ou cooptado pelo <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte. Mas éesta resistência silenciosa que nos permite observar o que o <strong>discurso</strong>domi<strong>na</strong>nte “não está dizendo quando está dizendo”.3.5 Falando <strong>em</strong> <strong>discurso</strong>sEni Orlandi (1996) e Luiz Antônio Marcuschi (1991) apresentamalgumas definições de tipologia de <strong>discurso</strong>s. Orlandi ressalva a4 Encontramos <strong>em</strong> Orlandi (2002b) uma definição que ajuda a compl<strong>em</strong>entar o que chamamos<strong>em</strong> nosso trabalho de lapso discursivo: “o lapso coloca <strong>em</strong> relação os dois lados da poliss<strong>em</strong>ia:comete um excesso (diz d<strong>em</strong>ais) e mostra uma falta (algo que está <strong>em</strong> silêncio). Há formasorganizadas e formas não-organizadas de manifestação do silêncio fundador: o lapso é umaforma não-organizada, a censura é uma forma organizada” (ORLANDI, 2002b: 95).95


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOimportância da classificação para o estudo da linguag<strong>em</strong>, destacandoque, apesar de sua “aplicação relativa”, tor<strong>na</strong>-se uma necessidad<strong>em</strong>etodológica da pesquisa. Ela fala dos seguintes tipos de <strong>discurso</strong>:Discurso lúdico – nele, é possível a reversibilidade entre interlocutores,ou seja, um sujeito pode ocupar o espaço do outro. É o <strong>discurso</strong>comum dos momentos de uso da linguag<strong>em</strong> pelo prazer (poesia,conto, romance e outras formas de <strong>discurso</strong> onde a poliss<strong>em</strong>ia estápresente);Discurso polêmico – a poliss<strong>em</strong>ia é controlada, ou seja, os sentidos do<strong>discurso</strong> são geridos de modo a disputar o sentido que se quer fazerprevalecer. Neste caso, há confronto entre formações discursivasdiferentes;Discurso autoritário – é aquele <strong>em</strong> que se tenta fazer prevalecer umsentido uno, a verdade é imposta. “O <strong>discurso</strong> autoritário tende àmonoss<strong>em</strong>ia, uma vez que esse <strong>discurso</strong> se caracteriza pela poliss<strong>em</strong>iacontida, estancada (...). Não pod<strong>em</strong>os afirmar que o <strong>discurso</strong>autoritário é um <strong>discurso</strong> monossêmico mas sim que ele tende para amonoss<strong>em</strong>ia” (ORLANDI, 1996: 240). Embora todos os sentidos sejampossíveis, no <strong>discurso</strong> autoritário o sentido domi<strong>na</strong>nte é reforçadocomo sentido literal, institucio<strong>na</strong>lizando a literalidade como produto dahistória. Entre os ex<strong>em</strong>plos, t<strong>em</strong>os o <strong>discurso</strong> religioso e o <strong>discurso</strong> dogoverno (marcadamente numa ditadura ou <strong>em</strong> um país cujad<strong>em</strong>ocracia ainda não está fortalecida).Em Marcuschi, encontramos a seguinte distinção:Discurso do poder - subdividido <strong>em</strong> <strong>discurso</strong> oficial, <strong>discurso</strong> paraoficiale <strong>discurso</strong> da oposição. O primeiro deles trata do <strong>discurso</strong> dogoverno representado pelos três poderes (Executivo, Legislativo eJudiciário), além das Forças Armadas. O segundo reúne ainda aopinião oficial, mas de orig<strong>em</strong> mais abaixo <strong>na</strong> hierarquia do governo96


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO(universidades, instituições gover<strong>na</strong>mentais), além de outras entidadesligadas a ele (como a Igreja). O terceiro é o originário <strong>em</strong> instituiçõesde oposição ao governo (sindicatos, representantes de entidades quefaz<strong>em</strong> oposição ao governo);Discurso de populares - é o <strong>discurso</strong> produzido por pessoas anônimasou de grupos de peque<strong>na</strong> representação no poder ou mesmo <strong>na</strong>oposição ao poder. É precedida ou seguida por um número muitoreduzido de verbos introdutores de opinião, com característicasestigmatizadas. A maior incidência é do verbo dizer e de construçõesadverbiais que possu<strong>em</strong> um caráter de confissão e não de afirmaçãoou exposição de princípios ou propósitos (contrariamente ao queocorre nos dois outros tipos de <strong>discurso</strong>). Também é comum asopiniões vir<strong>em</strong> expressas s<strong>em</strong> o uso de um verbo introdutor parainscrevê-la no contexto (o uso desses verbos servirá de indicador paraa análise desta dissertação e será melhor detalhado no capítulo 5).3.6 O <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lísticoRepresentar a realidade, usar a linguag<strong>em</strong> para representar oacontecimento. Este é o papel básico do <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico. Fruto docontexto e da história, o texto jor<strong>na</strong>lístico é repleto de significados queo transforma não numa parte da realidade, mas num enunciado queinterliga interlocutores, produzindo efeitos de sentido <strong>em</strong> qu<strong>em</strong> lê ououve a notícia. De acordo com Ângela Cristi<strong>na</strong> Trevisan Felippi (1999),“o que está <strong>em</strong> jogo é a ilusão referencial da linguag<strong>em</strong>. A linguag<strong>em</strong>não descreve, ela constitui o que representa, produz significados, é,portanto, processo produtivo” (FELIPPI, 1999: 05).Como visto no capítulo 2, o campo social midiático, contrariamente aosoutros campos sociais, t<strong>em</strong> sua autonomia marcada pela busca dodomínio da experiência dos outros campos sociais, que tenta relatar<strong>em</strong> seu <strong>discurso</strong>. Esta tentativa de dar visibilidade aos <strong>discurso</strong>s dos97


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOvários segmentos sociais é que confere legimitidade à imprensa. Ela“dessacraliza” o <strong>discurso</strong> autorizado e especializado dos vários grupossociais <strong>na</strong> medida <strong>em</strong> que os expressa para uma massa deleitores/espectadores. Daí sua função mediadora de <strong>discurso</strong>s.Segundo Adriano Duarte Rodrigues:“É a instituição midiática que des<strong>em</strong>penha, <strong>na</strong>ssociedades moder<strong>na</strong>s, este papel estratégico decomposição e de conseqüente cimentohomogeneizador da vida coletiva. Nela v<strong>em</strong> refletirse,como num espelho, a diversidade das funçõespedagógicas, simbólicas, mobilizadoras ereparadoras das restantes instituições”(RODRIGUES, A., 2002: 224).É preciso ampliar a noção de que uma reportag<strong>em</strong> seja ape<strong>na</strong>s umamensag<strong>em</strong> transmissora de informações: o jor<strong>na</strong>lismo é uma leitura darealidade e a notícia existe ape<strong>na</strong>s enquanto <strong>discurso</strong> midiático. ParaSandra Jovchelovitch (2000b), “os jor<strong>na</strong>is perpetuam e ao mesmot<strong>em</strong>po constro<strong>em</strong> representações sociais” (JOVCHELOVITCH, 2000b:103). Entretanto, esta leitura do real não é subjetiva <strong>em</strong> suatotalidade, uma vez que tenta se aproximar do referente/objeto (o fatonoticiado), mas, quando é feita, produz efeitos de sentido entre osleitores/telespectadores, pois traz <strong>em</strong> si uma referência extra-textual.Segundo Felippi:“O <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico é <strong>discurso</strong> polifônico, váriasvozes ‘falam’ através dele: as fontes, o <strong>em</strong>issor, osujeito enunciado, o interlocutor. Mas busca apagaros muitos enunciadores que possui, congregando oapagamento das posições enunciativas dos‘sujeitos-jor<strong>na</strong>listas’ e as posições enunciativas quese mostram (<strong>na</strong>s vozes dos articulistas, cronistas echargistas ou no espaço editorial) resultando numa98


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOunificação majoritária do conjunto das vozes queinterfere no resultado textual fi<strong>na</strong>l (MARIANI, 1998,apud FELIPPI, 1999: 09). A <strong>mídia</strong> funcio<strong>na</strong> comoel<strong>em</strong>ento fundamental <strong>na</strong> representação ereprodução dos ‘consensos de significação’resultantes das heg<strong>em</strong>onias políticas ou, aocontrário, pode participar de sua dissolução”(FELIPPI, 1999:09).No <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico, o sujeito-autor do texto não é o sujeito quefala no texto. Ele reproduz o <strong>discurso</strong> do outro e faz escolhas <strong>sobre</strong>que partes deste <strong>discurso</strong> irá relatar. Isso o transforma também <strong>em</strong>sujeito presente e ativo, uma vez que esta seleção é fundada <strong>em</strong> suaprópria prática discursiva 5 . As condições citadas anteriormente nocapítulo 2 como características do processo produtivo da notícia –classificação das interferências de ord<strong>em</strong> pessoal, social, ideológica,cultural e histórica; fases da formação do <strong>agenda</strong>-setting; critérios denoticiabilidade; e formas de credibilidade – constitu<strong>em</strong>-se <strong>em</strong>el<strong>em</strong>entos de uma determi<strong>na</strong>da formação discursiva. Essa formaçãodiscursiva, que interdita e/ou favorece o que pode ser dito e comodeve ser dito, é parte da formação ideológica do jor<strong>na</strong>lista, sujeitoautordo texto jor<strong>na</strong>lístico. Miquel Rodrigo Alsi<strong>na</strong> (1989) afirma ser<strong>em</strong>os jor<strong>na</strong>listas “construtores da realidade de seu entorno” (ALSINA,1989: 15) [tradução nossa]. Para Felippi:“Noticiar é tor<strong>na</strong>r acontecimentos visíveisdetermi<strong>na</strong>ndo um sentido e impedindo que sentidosindesejáveis circul<strong>em</strong>. O <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico é umamodalidade de <strong>discurso</strong> <strong>sobre</strong>, falar <strong>sobre</strong>.Discursos <strong>sobre</strong> atuam <strong>na</strong> institucio<strong>na</strong>lização desentidos, causam efeito de linearidade e5 Para Foucault (1971), prática discursiva é “um conjunto de regras anônimas, históricas, s<strong>em</strong>predetermi<strong>na</strong>das no t<strong>em</strong>po e no espaço, que definiram, <strong>em</strong> uma época dada, e para umadetermi<strong>na</strong>da área social, econômica, geográfica ou lingüística, as condições de exercício dafunção enunciativa”. (FOUCAULT, 1971: 147).99


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOhomogeneidade da m<strong>em</strong>ória, representam lugaresde autoridade <strong>em</strong> que se efetua algum tipo detransmissão de conhecimento, colocam o mundocomo objeto e contribu<strong>em</strong> para a constituição doimaginário social e cristalização da m<strong>em</strong>ória dopassado e construção da m<strong>em</strong>ória do futuro”.(FELIPPI, 1999: 07).Todo <strong>discurso</strong> carrega <strong>em</strong> si a poliss<strong>em</strong>ia como característica,abrigando sentidos múltiplos. Mesmo funcio<strong>na</strong>ndo como el<strong>em</strong>entofundamental <strong>na</strong> representação e reprodução dos “consensos designificação” (FELIPPI, 1999), produto das heg<strong>em</strong>onias políticas, o<strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico é polifônico constitutivamente. Isso porque, alémda formação discursiva do autor do texto jor<strong>na</strong>lístico, concorre para apolifonia textual uma regra básica do jor<strong>na</strong>lismo: os vários lados danotícia têm que ser ouvidos. Teoricamente, a cada fato <strong>na</strong>rrado,corresponde um conjunto de fontes que irão compor o texto e dar asua versão. O conjunto de idéias circulantes nos vários <strong>discurso</strong>s acabapor compor os t<strong>em</strong>as que vão formar a pauta de notícias do jor<strong>na</strong>l –ou seja, irá definir o <strong>agenda</strong>-setting do veículo.Fica claro, deste modo, como a heterogeneidade é evidente no<strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico: polifônico, híbrido, com a presença das “vozes”da fonte – aquele que fornece a informação e cujo <strong>discurso</strong> éreproduzido no texto jor<strong>na</strong>lístico, seja de forma marcada ouconstitutiva – e do <strong>em</strong>issor – o jor<strong>na</strong>lista que é autor do texto ecamufla sua presença autoral, por trás de uma pretensa objetividade.Mas, apesar da estratégia de se fazer passar por um <strong>discurso</strong>imparcial, o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico deixa de marcar ou mesmo apaga as“vozes” de alguns enunciadores e do próprio autor do texto,apagamento que resulta numa ilusão de linearidade. Comoconseqüência, parece fazer, muitas vezes, prevalecer a voz do <strong>discurso</strong>domi<strong>na</strong>nte <strong>na</strong> sociedade como sendo o <strong>discurso</strong> de consenso. O<strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico tenta se passar por algo acabado e completo. Para100


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCORodrigues (2002), “o uso predomi<strong>na</strong>nte da terceira pessoa garante ao<strong>discurso</strong> midiático, como aliás também aos <strong>discurso</strong>s histórico ecientífico, uma estratégia de universalidade referencial dos enunciados,uma credibilidade da <strong>na</strong>rração dos fatos independente do lugar de falado enunciador” (RODRIGUES, A., 2002: 218).É importante, assim, ter <strong>em</strong> mente que, para estudar <strong>discurso</strong>s, épreciso conhecer o contexto e a história, verificar o material verbal ecomo a relação entre os el<strong>em</strong>entos interfere <strong>na</strong> produção de sentido,uma vez que a relação entre significante e significado não é direta,<strong>na</strong>tural, única ou eter<strong>na</strong>. Segundo Felippi, “é preciso entender osentido como um efeito de uma enunciação, um ato de um sujeitohistórico submetido às condições de produção, <strong>em</strong> que osinterlocutores estão situados <strong>em</strong> lugares, ocupando posições”.(FELIPPI, 1999: 05). Estas marcas lingüísticas pod<strong>em</strong> mostrar oposicio<strong>na</strong>mento e a parcialidade, seja do meio, seja do repórter - comosujeito-autor da história que conta - assim como das representaçõessociais e do senso comum, por ex<strong>em</strong>plo, <strong>sobre</strong> o indíge<strong>na</strong> <strong>na</strong>imprensa, como ir<strong>em</strong>os mostrar a seguir.101


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO4. Comunidades indíge<strong>na</strong>s: o <strong>índio</strong> comosujeito passivo da históriaHá pouco mais de 500 anos, a chegada dos portugueses no Brasil foitratada como a descoberta de um novo mundo. Quando aquichegaram, porém, não encontraram um enorme “terreno baldio” porser ocupado: o Brasil era um território habitado por cerca de 6 milhõesde habitantes, com culturas diversas e línguas específicas dos mais de900 povos indíge<strong>na</strong>s (TEXTO-BASE DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE2002). O <strong>discurso</strong> <strong>sobre</strong> a orig<strong>em</strong> do Brasil t<strong>em</strong> como base, entretanto,a chegada do branco e o processo de catequização dos <strong>índio</strong>s. O<strong>discurso</strong> que se projetou <strong>na</strong> época foi “o <strong>discurso</strong> das descobertas,<strong>discurso</strong> das conquistas, <strong>discurso</strong> da domi<strong>na</strong>ção” (ORLANDI, 1990:19). Foi o primeiro silenciamento dos <strong>índio</strong>s, quando suas línguas esuas práticas culturais foram suplantadas pela língua portuguesa epela cultura européia, que domi<strong>na</strong>ram o território brasileiro.Quando começa a nossa história? Orlandi adverte <strong>sobre</strong> a idéia de“começo do Brasil”:“Vale perguntar: A Itália faz aniversário? A Françafaz aniversário? Os limites no t<strong>em</strong>po e no espaçosão fluidos e indetermi<strong>na</strong>dos, sujeitos à dúvida.Neste caso, por que não escolher a data daindependência para começar o Brasil? (ORLANDI,2000: 121).A busca por terras, bens, a ocupação predatória do espaço, os saques,a extração desmedida de pau-brasil e outros produtos <strong>na</strong>turais, comoo ouro, o extermínio e o subjugamento de vários povos indíge<strong>na</strong>s –tudo feito “<strong>em</strong> nome de Deus” – faz parte do que Marx concebeu comoação mercantil dos povos desde a Antiguidade, momento <strong>em</strong> que aideologia domi<strong>na</strong>nte se acondicio<strong>na</strong> <strong>em</strong> um <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte102


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOtentando encobrir as reais intenções de qu<strong>em</strong> detém o poder. Nesteprocesso, o genocídio e a escravidão dos <strong>na</strong>tivos e mesmo estilosviolentos de interação social se faz<strong>em</strong> sob a justificativa do <strong>discurso</strong>religioso: coexistindo com a domi<strong>na</strong>ção, a religião tenta converter e“salvar” os <strong>índio</strong>s das suas cerimônias de transe, da sua “falta deDeus”. Este contato fez com que os povos indíge<strong>na</strong>s passag<strong>em</strong> d<strong>em</strong>aioria para minoria étnica no Brasil, correspondendo a 0,2% dapopulação do País (VIEIRA, 2000: 15).Para Orlandi, “o devotamento do missionário faz parte da derrota do<strong>índio</strong>. A violência do poder do Estado precisa (é sustentada, t<strong>em</strong> seucontraponto como sustentáculo) da generosidade dos missionários”(ORLANDI, 1990: 127). É a “generosidade” da Igreja <strong>em</strong> converter os<strong>índio</strong>s que indica o lugar subalterno que lhe é desti<strong>na</strong>do. A posiçãocrítica de Alfredo Bosi (2001) <strong>em</strong> relação à colonização é bastant<strong>em</strong>arcada:“A colonização não pode ser tratada como umasimples corrente migratória: ela é a resolução decarências e conflitos da matriz e uma tentativa deretomar, sob novas condições, o domínio <strong>sobre</strong> a<strong>na</strong>tureza e o s<strong>em</strong>elhante que t<strong>em</strong> acompanhadouniversalmente o chamado processo civilizatório.”(BOSI, 2001: 13).“As motivações expressas dos colonizadoresportugueses <strong>na</strong>s Américas, <strong>na</strong> Ásia e <strong>na</strong> Áfricainspiram-se no projeto de dilatar a Fé ao lado dedilatar o Império, de camonia<strong>na</strong> m<strong>em</strong>ória.” (BOSI,2001: 15).À parte toda a violência histórica a que os indíge<strong>na</strong>s foramsubmetidos, o governo brasileiro promoveu, no ano 2000, a “Festa doDescobrimento”, <strong>em</strong>barcando no <strong>discurso</strong>, antes do colonizador, hoje103


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOcapitalista. A voz dos <strong>índio</strong>s não foi ouvida e, mais uma vez, a históriafoi determi<strong>na</strong>da pelo <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte. Durante as com<strong>em</strong>orações,os <strong>índio</strong>s fizeram uma série de manifestações, mas tiveram seusprotestos reprimidos pela ação do governo:“Os povos indíge<strong>na</strong>s foram fort<strong>em</strong>ente reprimidos,violência esta que simbolizou as práticas genocidase os massacres desses 500 anos. A paz foiinterrompida com as bombas do autoritarismo. Omesmo autoritarismo que deixou marcas profundas<strong>na</strong> história de cinco séculos da América Lati<strong>na</strong>inclusive <strong>na</strong>s manifestações do dia 22 de abril”(TEXTO-BASE DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE2002: 37).A Igreja Católica, assumindo um <strong>discurso</strong> conciliatório com os <strong>índio</strong>s,participou das com<strong>em</strong>orações oficiais do que chamou de “chegada doEvangelho <strong>na</strong> Terra de Santa Cruz” (TEXTO-BASE DA CAMPANHA DAFRATERNIDADE 2002: 39). Nesta ocasião, fez o pedido de perdão aos<strong>índio</strong>s e negros pela participação <strong>na</strong> domi<strong>na</strong>ção portuguesa econseqüente subjugação de suas culturas.O Instituto Socioambiental (ISA) fez um balanço da “Festa doDescobrimento”, a qual chamou de “vexame i<strong>na</strong>creditável” (ISA, 2000:70). Segundo o Instituto, “as imagens de <strong>índio</strong>s apanhando correrammundo, transformando o que poderia ter sido uma festa popular numfiasco com poucos precedentes” (ISA, 2000: 70). O saldo de 22 e abrilde 2000: 141 prisões de manifestantes realizadas pela tropa dechoque e um <strong>índio</strong> pisoteado, Gildo Tere<strong>na</strong>, <strong>em</strong> Porto Seguro (BA).Ao mesmo t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que acontecia a festa oficial, os povos indíge<strong>na</strong>spromoveram a Marcha e Conferência Indíge<strong>na</strong> 2000 – Brasil Outros500. A marcha percorreu por vários dias o caminho dos colonizadoresaté a aldeia Pataxó de Coroa Vermelha, <strong>em</strong> Santa Cruz Cabrália (BA),104


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOno dia 17 de abril de 2000. No evento, foi produzido o documento “OBrasil que a gente quer são outros 500”. Algumas reivindicações dodocumento dão conta de situações desconhecidas pela maioria dapopulação, como a punição de responsáveis pela esterilização d<strong>em</strong>ulheres indíge<strong>na</strong>s. Um outro it<strong>em</strong> exige que a história do Brasil sejarecontada: “que a verdadeira história deste País seja reconhecida eensi<strong>na</strong>da <strong>na</strong>s escolas, levando <strong>em</strong> conta os milhares de anos deexistência das populações indíge<strong>na</strong>s nesta terra” (CIMI, 2001: 21).4.1 A formação da identidade brasileiraA identidade do brasileiro se formou a partir da perspectiva do brancoeuropeu, colonizador, catequizador, <strong>em</strong> busca de terras e de riquezas.O <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte – que vangloria a “descoberta” de algo que nãoestava escondido n<strong>em</strong> encoberto, ape<strong>na</strong>s estava lá, existindo –e<strong>na</strong>ltece que “somos uma mistura”, no qual o “descobridor”,“povoador”, “os primeiros a chegar” são os responsáveis por trazer àterra um padrão de cultura e tecnologia considerado superior. Avalorização desta mistura, <strong>na</strong> verdade, não se concretiza. O brasileironão se identifica com o negro, n<strong>em</strong> com o <strong>índio</strong> e também não se vêigual ao branco europeu, mas pior: é uma cópia do origi<strong>na</strong>l, e umaimitação nunca se equipara ao origi<strong>na</strong>l. Orlandi salienta:“De um lado, os europeus procuram absorver asdiferenças, projetando-nos como cópias <strong>em</strong> seusimaginários, cópias malfeitas e a ser<strong>em</strong> passadas alimpo; enquanto do outro lado, assumindo acondição de simulacros – imagens rebeldes eavessas a qualquer representação – os brasileirosàs vezes ader<strong>em</strong>, às vezes não, ao <strong>discurso</strong> dascópias.” (ORLANDI, 1990: 21)105


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOComo brasileiros, s<strong>em</strong> saber precisar que parte de nós é índia, negra ebranca, somos o “outro” do europeu, mas um “outro” que é apagadoatravés do <strong>discurso</strong> do colonizador, <strong>na</strong> medida que o europeu é ocentro, o início absoluto da construção de nossa história. Cresc<strong>em</strong>ossob a égide de dois <strong>discurso</strong>s: o da colonização – que justifica achegada dos portugueses, a extração de bens <strong>na</strong>turais, o extermínio ea domi<strong>na</strong>ção dos <strong>índio</strong>s – e o <strong>discurso</strong> religioso – um <strong>discurso</strong> deconversão, que segundo Orlandi “ence<strong>na</strong> um diálogo”, mas <strong>na</strong> verdadeimpõe sublimi<strong>na</strong>rmente ao indíge<strong>na</strong> uma fala que não é sua, mas queo branco quer que ele reproduza, ajudando, assim, que o <strong>índio</strong>reconheça a superioridade do branco. Um ex<strong>em</strong>plo marcante dessaidentidade fugidia é do <strong>índio</strong> Marcos Tere<strong>na</strong>, uma das lideranças daUnião das Nações Indíge<strong>na</strong>s, que escondeu “sua condição indíge<strong>na</strong> soba identidade de japonês durante 14 anos” (PENNA, 1992: 78).O ex<strong>em</strong>plo de Marcos Tere<strong>na</strong> enfatiza como a manipulação do processode formulação de identidades se vale de características visíveis paraqualificar os indivíduos segundo a classificação domi<strong>na</strong>nte. SegundoMaura Pen<strong>na</strong> (1992), o reconhecimento de um grupo passa por estaclassificação domi<strong>na</strong>nte, oficial, e tudo que isso pode significar numdado momento histórico. Ou seja, uma identidade é definida a partirde sua diferenciação <strong>em</strong> relação a uma identidade domi<strong>na</strong>nte. Pen<strong>na</strong>destaca um estudo de Maria Rosário de Carvalho (1984) <strong>sobre</strong> gruposindíge<strong>na</strong>s do Nordeste, que já perderam o isolamento, e que tiveramsua identidade étnica instituída e recuperada por uma autoridade, apartir de ações como a delimitação de suas terras. Ela reproduz oseguinte depoimento: “Eu é que não sabia que era <strong>índio</strong> (...) Essalíngua de <strong>índio</strong> foi de poucos t<strong>em</strong>po. Era caboclo, não tinha certacompreensão, n<strong>em</strong> explicação de <strong>na</strong>da” (PENNA, 1992: 68).Segundo Rodrigo de Azeredo Grünewald (1999), <strong>na</strong> verdade, exist<strong>em</strong><strong>índio</strong>s que têm como língua o português, vest<strong>em</strong>-se de modo igual àspopulações regio<strong>na</strong>is do seu entorno e cujos costumes se aproximamaos dos regio<strong>na</strong>is, fenômeno decorrente da etnogênese, processo106


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdinâmico de reelaboração e organização da cultura, que permite a<strong>em</strong>ergência de novas identidades e a reinvenção de etnias járeconhecidas "<strong>em</strong> um contexto político de luta pela terra e direitossociais" (SILVA, 2000; 112). Para ser <strong>índio</strong>, muitas vezes, é precisouma legitimação oficial e a partir dela é que se recupera uma m<strong>em</strong>óriae se reconstrói a simbologia do grupo. Esta “legitimação” é feita porantropólogos da Fundação Nacio<strong>na</strong>l do Índio (Fu<strong>na</strong>i), que buscamcritérios técnicos para “reconhecimento” do indivíduo <strong>índio</strong>, deixandomuitas vezes à marg<strong>em</strong> o significado do sentir-se <strong>índio</strong>. Os própriosfuncionários da Fu<strong>na</strong>i reconhec<strong>em</strong> não acreditar <strong>na</strong> legitimidade daidentidade indíge<strong>na</strong> no Nordeste, pensamento compartilhado eutilizado como instrumento de manipulação dos latifundiários paradificultar a d<strong>em</strong>arcação das terras dos <strong>índio</strong>s (SOUZA, 1998).O processo de formação das comunidades indíge<strong>na</strong>s no Nordeste passapela definição do que alguns pesquisadores chamam de"r<strong>em</strong>anescentes de <strong>índio</strong>s", os caboclos, mestiços que reivindicaram acondição de <strong>índio</strong> e lutaram para garantir seu direito à terra. Para tal,chegaram a "atribuir a si próprios tradições, tais como o órgão tutorexigia para o reconhecimento de reservas indíge<strong>na</strong>s no Nordeste"(GRÜNEWALD, 1999; 138). Isso confirma o pensamento de Gramsci(1978) de que grupos minoritários tend<strong>em</strong> a tomar <strong>em</strong>prestado dogrupo domi<strong>na</strong>nte a sua concepção de mundo, <strong>na</strong> sua condição desubordi<strong>na</strong>do, para poder se enquadrar <strong>na</strong> perspectiva domi<strong>na</strong>nte. Essaidéia de “r<strong>em</strong>anescente”, porém, é até certo ponto pejorativa; passauma idéia de resto, sobejo, aquilo que restou. O processo de“<strong>em</strong>ergência” dos povos indíge<strong>na</strong>s, diferent<strong>em</strong>ente de uma perspectivafatalística do futuro dos <strong>índio</strong>s, procura chamar atenção para oprocesso constante de reelaboração cultural dinâmica, inerente aqualquer sociedade huma<strong>na</strong>. Não há r<strong>em</strong>anescentes, mas ressurgidos(ver it<strong>em</strong> 4.4).Para ter direito à terra, seu recurso básico de <strong>sobre</strong>vivência, muitos<strong>índio</strong>s tiveram que reinventar para si uma cultura: o Toré (festa107


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOtradicio<strong>na</strong>l religiosa indíge<strong>na</strong>) foi incr<strong>em</strong>entado por várias comunidadesindíge<strong>na</strong>s, numa atitude política, para se estabelecer<strong>em</strong> como etniajunto ao antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), hoje Fu<strong>na</strong>i. O SPIconsiderava que somente os grupos indíge<strong>na</strong>s que soubess<strong>em</strong> dançaro Toré eram "de fato" <strong>índio</strong>s. Isso garantia o direito dessascomunidades. Na prática, raramente a política indigenista oficialcumpre seu papel, fato que se comprova pela situação <strong>em</strong> que viv<strong>em</strong>os <strong>índio</strong>s: desde a Constituição de 1988, todos deveriam estar com asterras d<strong>em</strong>arcadas, mas isso ainda não aconteceu e prossegu<strong>em</strong> osconflitos pela terra – direito constitucio<strong>na</strong>l, por ser<strong>em</strong> os indíge<strong>na</strong>sseus primeiros habitantes, mas que ainda não se concretizou. Esseassunto, porém, nunca é abordado <strong>na</strong> imprensa, <strong>em</strong>bora sejarelevante <strong>em</strong> termos de cultura, história e denúncia das práticasimpositoras dos órgãos tidos como de "proteção ao <strong>índio</strong>" para garantiro direito dos indíge<strong>na</strong>s. Segundo José Maurício Andion Arruti, o SPI:"institui a performance do Toré como critério básicodo reconhecimento da r<strong>em</strong>anescência indíge<strong>na</strong>,tor<strong>na</strong>do então expressão obrigatória da indianidadeno Nordeste" (ARRUTI, 1999; 255) [destaquenosso].O livro A Verdade <strong>sobre</strong> o Índio Brasileiro apresenta um resumo dopensamento ainda vigente <strong>em</strong> relação ao indíge<strong>na</strong>, mais próximo àdescrição de perso<strong>na</strong>gens de uma história <strong>em</strong> quadrinhos:"O chefe da tribo se chama cacique; o chefereligioso (sacerdote) é o Pajé; os <strong>índio</strong>s falam alíngua Tupi; os <strong>índio</strong>s viv<strong>em</strong> exclusivamente da caçae da pesca; todos os <strong>índio</strong>s dorm<strong>em</strong> <strong>em</strong> rede; os<strong>índio</strong>s são indolentes: só as mulheres trabalham"(FARIA (ed.),1981; 18).108


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOPor outro lado, Darcy Ribeiro assim conceitua o <strong>índio</strong>:“Indíge<strong>na</strong> é no Brasil de hoje, essencialmente,aquela parcela da população que apresentaprobl<strong>em</strong>as de i<strong>na</strong>daptação à sociedade brasileira,<strong>em</strong> suas diversas variantes, motivados pelaconservação de costumes, hábitos ou meraslealdades que a vinculam a uma tradição précolombia<strong>na</strong>”(RIBEIRO, 1979: 254, apud VIEIRA,2000: 16).Obras recentes também traduz<strong>em</strong> uma imag<strong>em</strong> <strong>sobre</strong> o indíge<strong>na</strong>baseada <strong>na</strong> cultura ocidental capitalista. Expressões como “a enxadanunca se firmou <strong>na</strong> mão do <strong>índio</strong>”; “a mulher índia possuía umasexualidade bastante exaltada e libidinosa. Entregava-se a qualquerbranco”; e “os homens, muitas vezes, eram verdadeiros parasitas” sãodo texto de Inácio Rei<strong>na</strong>ldo Strieder publicado no ano 2000, onde fazuma releitura da obra de Gilberto Freire, Casa Grande & Senzala(STRIEDER, 2000: 79-82 in BRANDÃO, 2000). Em decorrência dodesprezo ao processo da dinâmica cultural, muitas obrasantropológicas faz<strong>em</strong> referência às comunidades indíge<strong>na</strong>s doNordeste pelo que foram do século XVI ao século XIX, e muitas vezess<strong>em</strong> qualquer compreensão do que era para os <strong>índio</strong>s a nudez, aexpressão da sexualidade ou o conceito de trabalho.Segundo Oliveira (1999), "tais povos e culturas passam a ser descritosape<strong>na</strong>s pelo que foram (ou pelo que supõe-se que eles foram) háséculos atrás, mas sabe-se <strong>na</strong>da (ou muito pouco) <strong>sobre</strong> o que elessão hoje <strong>em</strong> dia" (OLIVEIRA, 1999; 13). Mas qual é o senso comum<strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> que prevalece hoje? Para melhor focarmos a questão daimag<strong>em</strong> do indíge<strong>na</strong> para o branco <strong>na</strong> sociedade moder<strong>na</strong>, achamospertinente ao trabalho a discussão deste assunto, desenvolvida nopróximo tópico.109


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO4.2 O senso comum e o imaginário <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong>Entre outras formas de expressão cultural, a cin<strong>em</strong>atografia brasileirase baseou <strong>na</strong> literatura indigenista, trazendo heróis para a tela, <strong>em</strong>ostrando as curiosidades de um Brasil desconhecido. Segundo SôniaMaria Ramires de Almeida (1985), "há ainda filmes pretensamenteeducativos, revestidos de um didatismo preconceituoso, herdado deinterpretações precárias da história" (ALMEIDA, 1985; 55). A violênciaatribuída ao <strong>índio</strong>, pelo cin<strong>em</strong>a, decorre da compreensão de que elepossui o que Sônia Almeida define como "maldade <strong>na</strong>tural". No cin<strong>em</strong>a- mesmo nos documentários - vigora a plasticidade das cores, dançase rituais, com cantos tribais, uma exaltação a uma cultura desti<strong>na</strong>da adesaparecer, registro de debates entre lideranças indíge<strong>na</strong>s que secaracterizam como uma denúncia e reflexões <strong>sobre</strong> a exploração do<strong>índio</strong>, <strong>na</strong> condição de segmento social margi<strong>na</strong>lizado e objeto deentidades protecionistas. Veja a análise de Almeida <strong>sobre</strong> o filme"República Guarani", de Sílvio Back:"As interpretações do passado histórico nos falamde hoje, da função de uma determi<strong>na</strong>dahistoriografia que pretende guardar <strong>em</strong> vitrinesfragmentos da vida, tombando igualment<strong>em</strong>onumentos e seres humanos. Cristalizandoimagens mudas de seres conde<strong>na</strong>dos a ser<strong>em</strong>objetos da história e não seus agentes" (ALMEIDA,1985; 68) [destaque nosso].Também uma análise de livros didáticos <strong>sobre</strong> a História do Brasilpermite uma compreensão histórica <strong>sobre</strong> o senso comum estabelecido<strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> <strong>na</strong> sociedade. Segundo Dia<strong>na</strong> Luz Pessoa de Barros(2000), um dos probl<strong>em</strong>as <strong>na</strong> análise da imag<strong>em</strong> do <strong>índio</strong> nos livros ésaber quando começa a nossa história e se eles faz<strong>em</strong> parte dela. Emsua análise, fica claro que a presença do <strong>índio</strong> antes de 1500 é tratadacomo Pré-história do Brasil. O país somente passou a ter história com110


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOa chegada dos portugueses: eles são os fundadores de nossa cultura ede nosso conhecimento.O livro didático de Melh<strong>em</strong> Adas (1998) alerta para o fato de geraçõesde brasileiros ter<strong>em</strong> recebido de livros e de relatos a serviço doscolonizadores uma imag<strong>em</strong> distorcida dos <strong>índio</strong>s como gente“preguiçosa”. Essa imag<strong>em</strong> se firmou porque os <strong>índio</strong>s ofereciamresistência às tentativas dos brancos colonizadores de escravizá-los."Como a história t<strong>em</strong> sido geralmente escrita pelo branco e seencontra impreg<strong>na</strong>da da ideologia da classe domi<strong>na</strong>nte, compreendese,então, que essa visão até serviu para justificar o tráfico deescravos africanos e obscurecer a compreensão da cultura indíge<strong>na</strong>"(ADAS, 1998; 37). De acordo com Adas, este tipo de preconceito aindaé aceito pela sociedade brasileira s<strong>em</strong> qualquer senso crítico.Como prevalece o senso comum <strong>sobre</strong> o indíge<strong>na</strong> como selvag<strong>em</strong>pacificado, não é necessário um olhar mais aguçado para perceber queo <strong>índio</strong> entra <strong>na</strong> pauta da imprensa dentro de um t<strong>em</strong>ário mais amplo,a violência, que há muito é constitutivo do <strong>agenda</strong>-setting dos meiosde comunicação brasileiros 6 . O indíge<strong>na</strong> figura <strong>na</strong> imprensa quando oassunto é violência porque, sendo vítima, não é qualquer um que éagredido, mas aquele que integra um grupo <strong>em</strong> extinção, ignorante,ingênuo e sob a tutela do poder, quase um “monumento tombado”,logo, s<strong>em</strong> autonomia; quando é autor da violência, entra <strong>na</strong> pauta pelaqualidade do inesperado, pois mesmo que a “maldade <strong>na</strong>tural” lheocorra, a civilização branca o converteu no "bom selvag<strong>em</strong>", não seesperando mais dele uma atitude agressiva. Ou, mesmo, parajustificar seu extermínio: se a civilização não conseguiu amansá-lo,então exterminá-lo é o meio para se garantir o fim da violência que lheé peculiar.6 A análise detalhada encontra-se no capítulo 5 desta dissertação.111


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOSob a tutela da Fu<strong>na</strong>i, os <strong>índio</strong>s foram orientados a abando<strong>na</strong>rcondutas consideradas “desviantes” segundo os códigos domi<strong>na</strong>ntes.Levado pelo tutor a ingressar no mundo civilizado, o indíge<strong>na</strong> éconsiderado como “portador de uma cultura primitiva, incapaz por sisó de aprender ou adaptar-se às condições de uma cultura superior”(SOUZA, 1998: 51). Assim, no aspecto exótico, qualquer iniciativa dosindíge<strong>na</strong>s que fuja do esperado para a "civilização" – mesmo queesteja ass<strong>em</strong>elhada ao comportamento dos brancos – pauta aimprensa, mas, pelo que se observa, s<strong>em</strong> qualquer profundidade deanálise <strong>sobre</strong> o fato <strong>em</strong> si.De acordo com Silva (2000), um silêncio oficial aconteceu no País apartir da segunda metade do século XIX com relação aos povosindíge<strong>na</strong>s no Nordeste. "Fundamentou esse silêncio a idéia deassimilação que influenciou as reflexões históricas e os primeirosestudos antropológicos regio<strong>na</strong>is que afirmavam o desaparecimentodos indíge<strong>na</strong>s no processo de miscige<strong>na</strong>ção racial, integração cultural edispersão no conjunto da população" (SILVA, 2000; 111). Gilda MariaLins de Araújo e Mary Francisca do Careno (2000) alertam que a lutados antropólogos e indigenistas s<strong>em</strong>pre foi pela defesa de que o <strong>índio</strong>seria aquele que se assume como <strong>índio</strong>, aceitando assim o processo<strong>na</strong>tural da dinâmica cultural que aproxima a etnia indíge<strong>na</strong> da branca.Sobre o senso comum <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong>, Silva ressalta:"Apesar de conhecidos como caboclos no sensocomum da sociedade nos lugares onde existiramantigos aldeamentos e ter<strong>em</strong> essa caboclizaçãojustificada <strong>em</strong> diversos estudos regio<strong>na</strong>is, apermanência indíge<strong>na</strong> pôs <strong>em</strong> dúvidaconceitualizações preconceituosas, implodiu asteorias explicativas do desaparecimento,comprovando que o caboclo identificado comomestiço de orig<strong>em</strong> indíge<strong>na</strong>, é antes de tudo umaconstrução ideológica imposta no século XIX pelo112


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCObranco, mais do que uma categoria social concreta,resultante do complicado jogo de reconhecimento eauto-reconhecimento que caracteriza a elaboraçãoda identidade étnica" (PORTO ALEGRE, 1992/1993,in SILVA, 2000; 111).Diferente do que o senso comum costuma postular, a identidade socialnão é inerente e <strong>na</strong>tural ao hom<strong>em</strong> ou ao grupo. Segundo MauraPen<strong>na</strong> (1992), a identidade é formada por atribuições “interessadas”,ou seja, se faz a partir do interesse de se perceber traços queenquadr<strong>em</strong> o indivíduo nesta ou <strong>na</strong>quela classificação, numa formaredutora de se definir sua identidade. O processo de “classificaçãocultural” do indivíduo funcio<strong>na</strong> como forma de inserção <strong>em</strong> um dadogrupo ou classe, com qualidades e valores específicos, que promov<strong>em</strong>reconhecimento social para este indivíduo. Segundo Vânia RochaFialho de Paiva e Souza (1998), “a etnicidade é constant<strong>em</strong>ente sujeitaà redefinição, podendo mesmo até ser manipulada, pois os indivíduospod<strong>em</strong> determi<strong>na</strong>r sua conduta <strong>em</strong> diferentes situações. Porém, ébaseado <strong>na</strong> existência das clivagens entre os grupos que os atoressociais vão determi<strong>na</strong>r suas ações” (SOUZA, 1998: 28).4.3 O <strong>discurso</strong> religioso <strong>na</strong> história do Brasil: acampanha da fraternidade 2002Desde a chegada dos portugueses ao Brasil, o trabalho da IgrejaCatólica consistiu <strong>na</strong> orientação religiosa dos <strong>índio</strong>s. Atualmente, otrabalho da Igreja está orientado sob duas tendências: umaprogressista, a qual está ligada o Conselho Indigenista Missionário(Cimi), e outra mais ortodoxa, que se desvincula das questões políticase estruturais relacio<strong>na</strong>das à cultura e à <strong>sobre</strong>vivência indíge<strong>na</strong>. Oprocesso, entretanto, <strong>em</strong> que se deu a conversão marcou o início daviolência contra os <strong>índio</strong>s: eles foram at<strong>em</strong>orizados contra seuspróprios costumes e chegaram a ser proibidos pelos jesuítas de113


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOrealizar seus ritos religiosos e suas práticas de cura com ervasmedici<strong>na</strong>is. Os religiosos doutri<strong>na</strong>vam as crianças indíge<strong>na</strong>s contra osensi<strong>na</strong>mentos de seus pais, diziam que os pajés mentiam e que só oDeus cristão era verdadeiro, atribuindo o conceito de pecado à nudez eà poligamia. Partindo da caracterização que fizeram dos indíge<strong>na</strong>s, osprimeiros missionários atuaram visando conduzi-los ao cristianismo.Esta “condução” não se deu de forma pacífica e uma convergência<strong>na</strong>tural entre o <strong>discurso</strong> missionário e o <strong>discurso</strong> colonizador fez comque o branco domi<strong>na</strong>dor e o religioso somass<strong>em</strong> suas ações no sentidode “domar” o indíge<strong>na</strong>: de um lado, o controle de suas crenças e a lutapor sua substituição pelo cristianismo; de outro, a subjugaçãoeconômica e cultural. Os religiosos católicos, <strong>na</strong> catequização, tinhamtambém a missão de pacificá-los, o que auxiliava o colonizador. Dia<strong>na</strong>Luz Pessoa de Barros (2000) considera que os missionários foram “osprincipais agentes da aculturação do <strong>índio</strong> e de sua assimilação àcultura européia” (BARROS, 2000: 149). Partilhando a mesmaformação ideológica do colonizador, o <strong>discurso</strong> religioso assujeita o<strong>índio</strong>, <strong>na</strong> tentativa de convertê-lo. Segundo Bosi (1992), “quando selê<strong>em</strong> as palavras de Marx <strong>sobre</strong> o papel da religião <strong>na</strong>s sociedadesoprimidas, capta-se melhor o movimento de certos grupos sociais paraa expressão imaginária dos seus desejos: ‘alma de um mundo s<strong>em</strong>alma, espírito das situações s<strong>em</strong> espírito’” (BOSI, 1992: 30).O domínio da Igreja Católica <strong>sobre</strong> o território era desejado pelo reiportuguês, que apoiou os jesuítas <strong>na</strong> missão de catequização.Destruindo crenças e costumes – sua língua, sua religião e seu modode viver – não restaria força para lutar contra a domi<strong>na</strong>çãoportuguesa. A desunião entre os indíge<strong>na</strong>s, decorrente dos conflitosculturais, favorecia ainda mais a domi<strong>na</strong>ção. Com a cultura indíge<strong>na</strong>suplantada pelo cristianismo, os religiosos assumiram a luta contra aescravização dos <strong>índio</strong>s e pelo direito à terra – nos dias atuais,especialmente a ala progressista da Igreja Católica. Se, antes, adomi<strong>na</strong>ção se dava pela subjugação religiosa, hoje o Conselho114


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOIndigenista Missionário (Cimi) t<strong>em</strong> como uma de suas linhas de ação oecumenismo e o diálogo religioso, com respeito à religião e à culturados povos indíge<strong>na</strong>s. Aliás, foi <strong>na</strong> luta pela terra, e não pela conversãoreligiosa, que integrantes do Cimi conseguiram legitimar sua presençaentre os <strong>índio</strong>s.O lançamento da Campanha da Fraternidade pela Igreja Católica <strong>em</strong>2002 - "Fraternidade e Povos Indíge<strong>na</strong>s" - abordando a questãoindíge<strong>na</strong> de direito à terra, integra o <strong>discurso</strong> atual dos religiosos. Apósa primeira fase, a conversão ao cristianismo, os religiosos se associamaos <strong>índio</strong>s nesta luta, com a criação do Cimi <strong>em</strong> 1972, que teve comomissão atualizar a presença missionária junto aos povos indíge<strong>na</strong>s epromover o diálogo entre as práticas religiosas. A consulta aos textoscatólicos atuais dão conta da perspectiva de luta assumida pela Igreja:“<strong>em</strong> todas as épocas, desde o Brasil colônia até osdias de hoje, os povos indíge<strong>na</strong>s, geralmente, têmsido considerados um estorvo para o progresso e odesenvolvimento. Fala-se muito <strong>na</strong> necessidade desua ‘integração’ compulsória <strong>na</strong> sociedade que seautodenomi<strong>na</strong> ‘<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l’, passando por cima dacultura e da identidade desses povos. E qual é arazão e fi<strong>na</strong>lidade desta permanente proposta de‘integrar’: É o acesso livre aos territórios por elesocupados, a expropriação s<strong>em</strong> controle, o saqueinescrupuloso das riquezas <strong>na</strong>turais existentes <strong>em</strong>seu solo e subsolo” (CONSELHO NACIONAL DEIGREJAS CRISTÃS DO BRASIL, 2000: 66/67).No texto-base da campanha da fraternidade de 2002, a Igreja ressaltatodo o processo de extermínio a que foram submetidos os povosindíge<strong>na</strong>s nestes 500 anos e as políticas de integração, assimilação,discrimi<strong>na</strong>ção e exclusão social, que sist<strong>em</strong>aticamente negam ao <strong>índio</strong>o direito à diferença. É salientada ainda a mudança da postura da115


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOIgreja neste processo, com um “pedido de perdão pelos pecados dosfilhos da Igreja contra os povos indíge<strong>na</strong>s e os negros trazidos daÁfrica como escravos” (TEXTO-BASE DA CAMPANHA DAFRATERNIDADE 2002: 39), admitindo-se o apoio dos missionários àcolonização e todas as conseqüências que advieram dela.O <strong>discurso</strong> religioso transmitido via meios de comunicação mantém oobjetivo de conversão. No caso das campanhas da fraternidade, oobjetivo é de buscar a solidariedade social <strong>em</strong> torno de uma situaçãoou probl<strong>em</strong>a, sob o prisma do cristianismo. Tentando colocar <strong>na</strong><strong>agenda</strong> pessoal dos indivíduos a preocupação com o próximo, a IgrejaCatólica racio<strong>na</strong>liza e aperfeiçoa seu <strong>discurso</strong> <strong>em</strong> direção à sociedadeconsumidora de jor<strong>na</strong>is. No texto-base da campanha da fraternidadede 2002, afirma-se que seu objetivo é:“motivar a conversão das pessoas, da sociedade eda própria Igreja para a solidariedade, a justiça, orespeito e a partilha, dando especial destaque,desta vez, aos povos indíge<strong>na</strong>s. (...). Ao refletirmos<strong>sobre</strong> a causa indíge<strong>na</strong>, vamos assumir umcompromisso concreto com suas lutas, <strong>em</strong> defesade suas identidades étnicas, ‘suas organizaçõessociais, costumes, línguas, crenças e tradições, e osdireitos originários <strong>sobre</strong> as terras quetradicio<strong>na</strong>lmente ocupam’ [CONSTITUIÇÃO DOBRASIL, art. 231] (TEXTO-BASE DA CAMPANHA DAFRATERNIDADE 2002: 06).Também é claramente exposta a importância de “conquistar espaços<strong>na</strong> grande <strong>mídia</strong>” para denunciar a violência contra o <strong>índio</strong>, a invasãode suas terras e a omissão do Estado. Apesar do contato com obranco, o indíge<strong>na</strong> ainda mantém com a terra e com a <strong>na</strong>tureza umarelação crucial de <strong>sobre</strong>vivência e uso sustentável. Os espaços sãoocupados coletivamente e utilizados não só para o plantio, mas para116


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOsuas festas e práticas religiosas. É interessante reproduzir estesentimento <strong>na</strong> voz de um <strong>índio</strong>, Nailton Muniz Pataxó Hã-Hã-Hãe:“Diz<strong>em</strong> que nós não somos civilizados. Os <strong>índio</strong>ssão civilizados, mas não com civilização dosbrancos. T<strong>em</strong>os o jeito de ser de cada povo. Hojenós olhamos, quando chegamos numa cidade,muita gente que se diz civilizada, mas que maltrataseu s<strong>em</strong>elhante, que deixa suas crianças pedindoesmola, passando dificuldades.Você entra nos órgãos públicos, vê tanto luxo,depois, lá fora, vê gente passando fome, genteigual, só que pobre. Então, o medo que nós t<strong>em</strong>osde perder nossas terras é de ver realmente o nossopovo <strong>na</strong> rua, dormindo de baixo de viaduto, caído<strong>em</strong> marquises, mendigando. Porque essa não é anossa maneira de ser civilizado. Nós somos de umpensamento diferenciado, não ensi<strong>na</strong>mos nossosfilhos a competir, ensi<strong>na</strong>mos a repartir e a lutar.Nós não deixamos nosso povo sofrer. Como vocêspod<strong>em</strong> ver suas crianças <strong>na</strong> rua? Como pod<strong>em</strong> verfamílias s<strong>em</strong> ter o que comer, revirando lixo? Nósnão deixamos. Nós t<strong>em</strong>os alegria <strong>em</strong> repartir. Seuma família t<strong>em</strong> pra comer e chega outros que nãot<strong>em</strong> ela faz alimento suficiente para todos. Nós nãot<strong>em</strong>os corag<strong>em</strong> de deixar um parente sair comfome, se t<strong>em</strong>os comida guardada. A gente comejunto, depois se apega com Deus e vai, comcerteza, adquirir. Por isso também, se t<strong>em</strong>os anossa terra d<strong>em</strong>arcada e <strong>na</strong> nossa mão, t<strong>em</strong>oscondições de adquirir nosso alimento e de repartirentre nós. Nós não t<strong>em</strong>os cadeia <strong>na</strong>s nossasaldeias, t<strong>em</strong>os conselhos pra dar ao nosso povo eeles acatam. Nós procuramos educar nossos filhos117


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpra acatar os conselhos dos mais velhos. Asociedade branca t<strong>em</strong> que entender e respeitar onosso jeito de viver. Nós não estamos lutandocontra eles, somos também parte dessa sociedade,só que com nossas diferenças” (TEXTO-BASE DACAMPANHA DA FRATERNIDADE 2002: 07).4.4 Quadro histórico-geográfico dos <strong>índio</strong>s: asituação <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbucoExist<strong>em</strong> pouco mais de 200 etnias conhecidas no Brasil, nove delas <strong>em</strong>Per<strong>na</strong>mbuco. Atualmente, das 771 terras indíge<strong>na</strong>s brasileiras, 68%ainda não tiveram o processo de d<strong>em</strong>arcação concluído e, <strong>em</strong> 178delas, o processo não foi sequer iniciado (TEXTO-BASE DA CAMPANHADA FRATERNIDADE 2002). Do total das terras brasileiras -851.196.500 hectares - 12,18% são ocupadas por <strong>índio</strong>s. Exist<strong>em</strong> hojecerca de 350 mil indíge<strong>na</strong>s no Brasil vivendo <strong>em</strong> comunidades e mais192 mil nos grandes centros urbanos. Estes números são estimativas –apresentados tanto pelo Instituto Socioambiental (ISA) como pelo Cimi– pois não há um censo indíge<strong>na</strong> no País.A domi<strong>na</strong>ção que começou com a chegada dos portugueses continua<strong>na</strong> atualidade através das invasões das terras indíge<strong>na</strong>s, perseguições,assassi<strong>na</strong>tos de seus líderes para garantir o domínio <strong>sobre</strong> seuterritório; a execução, pelo poder público, de projetos comohidrelétricas e rodovias dentro das áreas indíge<strong>na</strong>s; o roubo derecursos como a biodiversidade e os conhecimentos dos <strong>índio</strong>s; e oturismo ecológico que invade o espaço de vida dos indíge<strong>na</strong>s. Entre osanos de 1995 e 2001, foram mortos <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco, <strong>em</strong> virtude daluta pela terra: Hilda Maria de Jesus (Atikum); Adel Rodrigues da Silva(Xukuru); José Erivaldo Frazão (Xukuru); Pedro Gomes da Silva (Fulniô);Manoel José Torres (Pankararu); Eronilde Lopes da Silva (Xukuru);118


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOFrancisco de Assis Araújo, Xicão (Xukuru); e Francisco de AssisSanta<strong>na</strong>, Chico Quelé (Xucuru).A resistência das comunidades indíge<strong>na</strong>s ao longo dos anos, porém,t<strong>em</strong> garantido a sua <strong>sobre</strong>vivência e até mesmo o reaparecimento depovos que eram considerados extintos. Muitos viv<strong>em</strong> <strong>em</strong> centrosurbanos – <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco, <strong>em</strong> cidades próximas às comunidadesindíge<strong>na</strong>s, como Pesqueira e Águas Belas. Há ainda os povosressurgidos ou <strong>em</strong>ergentes, que se mantiveram no anonimato <strong>em</strong>decorrência das perseguições e que estão <strong>em</strong> processo dereorganização e reconstrução de suas culturas, com a conseqüenteluta por suas terras. Segundo o documento oficial da campanha dafraternidade 2002:“Após tantos anos de dispersão, impedidos devivenciar suas práticas culturais, s<strong>em</strong> realizar seusrituais, festas, s<strong>em</strong> falar sua língua, s<strong>em</strong> ter maisuma organização social própria, as pessoasconsegu<strong>em</strong> reencontrar-se, reorganizar-seenquanto grupo social distinto dentro da sociedadedita <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l e reivindicar o direito de ser<strong>em</strong>reconhecidas e respeitadas como tal. Mais ainda,assumir uma identidade étnica vinculada àspopulações denomi<strong>na</strong>das autóctones, os <strong>índio</strong>s aquiencontrados pelos portugueses <strong>em</strong> 1500” (TEXTO-BASE DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2002: 35).Segundo Rodrigo de Azeredo Grünewald, "quando se fala de <strong>índio</strong>s noBrasil, logo se pensa nos xinguanos ou <strong>em</strong> tribos que habitamrecônditos amazônicos" (GRÜNEWALD, 1999; 137). Os <strong>índio</strong>s são tidoscomo “selvagens”, “aborígenes”, “autóctones”, que se apresentam anós, da “civilização” como exóticos por sua língua, trajes, e costumes,o que ajuda a descaracterizar os <strong>índio</strong>s que ainda viv<strong>em</strong> no Nordeste.119


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOEstes esclarecimentos são importantes porque, no fi<strong>na</strong>l do século XIX,alardeava-se que já não existiam <strong>índio</strong>s no Nordeste. Deixaram de serconsiderados <strong>índio</strong>s e passaram a ser classificados comor<strong>em</strong>anescentes ou descendentes de <strong>índio</strong>s, uma saída antropológica dopoder público para se abster da obrigação de d<strong>em</strong>arcar e respeitar asterras indíge<strong>na</strong>s. Entretanto, estes povos se reorganizaram eassumiram sua condição indíge<strong>na</strong>, passando a exigir a d<strong>em</strong>arcação doseu território. Para conseguir firmar sua identidade étnica, estes povosestão reconstruindo sua cultura e atualizando-as, como ocorre com ahistória de qualquer sociedade. Aqui <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco, ressurg<strong>em</strong> osPipipã, no município de Ibimirim, após mais de um século dedecretação de sua extinção.Segundo o ISA (2001), o processo de retomada de identidadescoletivas não é exclusivo do Brasil, também <strong>na</strong> Bolívia e <strong>na</strong> Índia estáacontecendo. Embora a questão seja polêmica, um fato é interessante:se de um lado o extermínio levou à redução ou à extinção de povosindíge<strong>na</strong>s, por outro lado a resistência promoveu a formação de novosgrupos, situação <strong>na</strong>turalmente vinculada à questão fundiária do País.Ao longo do processo de domi<strong>na</strong>ção portuguesa até os dias atuais, 30povos foram considerados extintos <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco (CIMI, 2001: 223).Entre os nove grupos indíge<strong>na</strong>s do Estado ainda existentes, ape<strong>na</strong>s um– os Fulni-ô – ainda cultiva sua língua <strong>na</strong>tiva, Ya:thê, como forma decomunicação. As outras oito comunidades – Atikum-Umã, Kambiwá,Kapi<strong>na</strong>wá, Pankararu, Tuxá, Truká, Xucuru e Pipipã – falam oportuguês. Esta característica dos Fulni-ô os ajuda a conservar d<strong>em</strong>odo mais eficaz sua identidade cultural, pois preservam, através dalíngua, um modo de ser. Segundo Rosely de Souza Lacerda (2000),mesmo não possuindo uma língua <strong>na</strong>tiva, os outros gruposdesenvolveram mecanismos de resistência para garantir a unidadecultural da comunidade. Se, por um lado, há <strong>índio</strong>s que valorizam suaspráticas e culturas, muitos quer<strong>em</strong> se moldar à identidade da culturadomi<strong>na</strong>nte, como forma de se sentir<strong>em</strong> “iguais aos outros”. A ilusão120


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdesta <strong>na</strong>turalização visa a dar reconhecimento e um lugar social maisconfortável aos <strong>índio</strong>s, assumindo a posição do “outro”, o branco. Paraser<strong>em</strong> reconhecidos <strong>na</strong> “sociedade civilizada”.Não se deve, porém, pensar a cultura de uma etnia como algo único elógico. Rodrigo de Azeredo Grünewald (1999) salienta que “umacultura não precisa ser homogênea ou mesmo particularmentecoerente” (GRÜNEWALD, 1999: 147). Assim, é importante ver que ascomunidades indíge<strong>na</strong>s de Per<strong>na</strong>mbuco não são grupos totalmentediferenciados entre si e <strong>em</strong> relação à sociedade branca. O processo deacomodação cultural e reconhecimento étnico hoje é definido pelosantropólogos como processo de etnogênese, e não mais aculturação,quando a cultura indíge<strong>na</strong> era considerada suplantada pela culturabranca. Segundo Grünewald, a etnogênese “é uma tentativa de fazersua própria história buscando mover-se além das condições impostas<strong>sobre</strong> eles” (GRÜNEWALD, 1999: 153). Nesta perspectiva, não háperdas para a cultura indíge<strong>na</strong>, mas “a reinvenção histórica do grupo<strong>em</strong> questão” (GRÜNEWALD, 1999: 154). Veja <strong>na</strong> figura 1 o número e alocalização das comunidades indíge<strong>na</strong>s no Estado.POVOS INDÍGENAS EM PERNAMBUCONOME LÍNGUA MUNICÍPIO ESTIMATIVAPOPULACIONAL/ANOAtikum - Car<strong>na</strong>ubeira da Penha 2.743 (1999)Fulni-ô Ya:thê Itaíba/Águas Belas 2.930 (1999)Kambiwá - Floresta/I<strong>na</strong>já/Ibimirim 1.578 (1999)Pipipã - Ibimirim ?Kapi<strong>na</strong>wá - Ibimirim/Tapa<strong>na</strong>tinga 422(1999)Pankararu - Tacaratu/Petrolândia 4.146 (1999)Truká - Cabrobó 1.333 (1999)Tuxá - I<strong>na</strong>já 1.630 (1999)Xucuru - Pesqueira 6.363 (1999)TOTAL 21.145(1999)FIGURA 1 – O número de <strong>índio</strong>s <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco (FONTE: INSTITUTOSOCIOAMBIENTAL)121


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOOcupando <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco o quarto lugar <strong>em</strong> quantidade de <strong>índio</strong>s doBrasil, as comunidades indíge<strong>na</strong>s representam um importantesegmento da sociedade no Estado. A seguir, ir<strong>em</strong>os realizar umaanálise <strong>sobre</strong> o <strong>discurso</strong> e a representação social dos <strong>índio</strong>s <strong>na</strong>imprensa per<strong>na</strong>mbuca<strong>na</strong>, com o objetivo de verificar como se dá o<strong>agenda</strong>mento da <strong>mídia</strong> com relação a estes grupos e que tipo de<strong>discurso</strong> está sendo veiculado com relação aos indíge<strong>na</strong>s nos jor<strong>na</strong>isDiário de Per<strong>na</strong>mbuco e Jor<strong>na</strong>l do Commercio. A pesquisa t<strong>em</strong> comobase teórica o que já estudamos até este capítulo, especificamente asTeorias do Agenda-Setting e da Análise do Discurso.122


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5. O <strong>índio</strong> <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco:<strong>discurso</strong> e representaçãoSegundo uma <strong>agenda</strong> midiática cujos t<strong>em</strong>as são previamente definidosde acordo com o que circula <strong>em</strong> um determi<strong>na</strong>do contexto social, o<strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico funcio<strong>na</strong> produzindo efeitos de sentido. Assim,qualquer análise que se faça é o que chamamos de uma das leituraspossíveis, pois a posição do a<strong>na</strong>lista – assim como a do jor<strong>na</strong>lista e detoda a cadeia produtiva dos meios de comunicação – não é neutra. Seo sujeito não é único ao dizer, se os significados não são literais, massocialmente construídos, o a<strong>na</strong>lista sai da posição de leitor e tentaassumir um lugar cont<strong>em</strong>plativo diante do enunciado, <strong>em</strong>bora el<strong>em</strong>esmo esteja envolvido no processo interpretativo. Não há, destaforma, como impedir que opere a ideologia.Partimos da pr<strong>em</strong>issa que toda análise ocorre dentro de um universoonde as várias formações discursivas conviv<strong>em</strong>, não podendo abrangertodas as significações possíveis. Assim, alertamos que esta análise nãoé a significação dos <strong>discurso</strong>s estudados, mas aquela que se tornoupossível dentro da perspectiva de que o a<strong>na</strong>lista é assujeitadoideológica, estrutural e piscologicamente, como qualquer sujeito.5.1 Processo de AnáliseNa análise dos textos jor<strong>na</strong>lísticos cujo t<strong>em</strong>a foi o indíge<strong>na</strong> <strong>em</strong>Per<strong>na</strong>mbuco é importante definir critérios de análise atendendo àsduas perspectivas teóricas alavancadas nesta pesquisa: a Hipótese doAgenda-Setting e a Teoria da Análise do Discurso Francesa. Para isso,estabelec<strong>em</strong>os pontos de conexão entre os conceitos de fontejor<strong>na</strong>lística e sujeito ativo e passivo, passando a trabalhar com doisconceitos compostos para a análise: fonte ativa e fonte passiva.123


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOPara processar nossa análise, trabalhamos com a definição deindicadores do <strong>discurso</strong>, para os quais utilizamos principalmente adefinição de Marcuschi (1991) <strong>sobre</strong> os verbos introdutores de opinião;o uso de aspas observado por J. Authier-Revuz (1990) e porDominique Maingueneau (2002); e o conceito de heterogeneidadesdiscursivas de J. Authier-Revuz (1990). Estes indicadores irão apontaros tipos de fonte, conceituados <strong>em</strong> nosso trabalho, e os tipos de<strong>discurso</strong>, segundo a tipologia discursiva de Eni Orlandi (1996) eMarcuschi (1991).A observação dos textos a partir destes conceitos irá permitir umaanálise que irá resultar <strong>na</strong> figura 2:IndicadoresDoDiscursoTiposde FonteTipos deDiscursoFonte Ativa Fonte Passiva Discurso doPoder ouDiscursoAutoritárioDiscurso Popularou DiscursoLúdicoDiscursoPolêmicoFIGURA 2 – Indicadores de Análise do Discurso5.1.1 Indicadores do <strong>discurso</strong>Os indicadores do <strong>discurso</strong> são el<strong>em</strong>entos que permit<strong>em</strong> ainterpretação de um determi<strong>na</strong>do <strong>discurso</strong>, ou seja, que dão realcepara um tipo discursivo e que levam ao seu enquadramento <strong>em</strong>determi<strong>na</strong>da(s) formação (ões) discursiva(s). Estes índices apontamtambém os tipos de fontes que falam no enunciado. No caso destadissertação, estes indicadores são observados no <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico,124


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpermitindo verificar que papéis assum<strong>em</strong> as fontes (ativo ou passivo)e o(s) tipo(s) de <strong>discurso</strong>(s) presentes no texto.5.1.1.1 Verbos Introdutores de OpiniãoOs verbos introdutores de opinião indicam que houve um ato de fala <strong>em</strong>arcam o limite onde se inicia o <strong>discurso</strong> citado (que v<strong>em</strong> <strong>em</strong> seguidaao verbo no texto, normalmente entre aspas, a<strong>na</strong>lisadas a seguir). Apartir de Marcushi (1991) e de Maingueneau (2002), apresentamoscategorias de uso de verbos introdutores de opinião, que ajudam acompreender os tipos de <strong>discurso</strong> existentes <strong>na</strong> imprensa. Éimportante ressaltar que o uso do <strong>discurso</strong> direto, que resulta <strong>na</strong>exposição do <strong>discurso</strong> relatado, t<strong>em</strong> como fi<strong>na</strong>lidade criar fidelidade<strong>em</strong> relação às palavras do outro, mostrar seriedade ao respeitar edestacar o enunciado alheio ou indicar que não se concorda com o<strong>discurso</strong> do outro, marcando-o conscient<strong>em</strong>ente dentro do seuenunciado.Marcushi afirma que os verbos introdutores de opinião funcio<strong>na</strong>mcomo "parafraseantes sintéticos, pois resum<strong>em</strong> <strong>em</strong> uma só palavra osentido geral do <strong>discurso</strong> a relatar" (MARCUSHI, 1991: 77). De acordocom Maingueneau (2002), uma característica importante é que estesverbos não são necessariamente verbos de fala, mas o fato deacompanhar<strong>em</strong> o <strong>discurso</strong> direto os converte <strong>em</strong> introdutores deopinião. Há momentos no texto, porém, que os verbos introdutoressão suprimidos por razões diversas que, no contexto, pod<strong>em</strong> levar estaomissão a significações diferentes, somente a<strong>na</strong>lisáveis <strong>na</strong>materialidade do <strong>discurso</strong>:• Verbos indicadores de posições oficiais e afirmações positivas -declarar, afirmar, comunicar, anunciar, informar, confirmar,assegurar.• Verbos indicadores de força do argumento - frisar, ressaltar,sublinhar, acentuar, enfatizar, destacar, garantir;125


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO• Verbos indicadores de <strong>em</strong>ocio<strong>na</strong>lidade circunstancial -desabafar, gritar, vociferar, esbravejar, apelar, ironizar;• Verbos indicadores de provisoriedade do argumento - achar,julgar, acreditar, pensar, imagi<strong>na</strong>r;• Verbos organizadores de um momento argumentativo noconjunto do <strong>discurso</strong> - iniciar, prosseguir, introduzir, concluir,inferir, acrescentar, continuar, fi<strong>na</strong>lizar, explicar;• Verbos indicadores de retomadas opositivas, organizadores dosaspectos conflituosos - comentar, reiterar, reafirmar, negar,discordar, t<strong>em</strong>er, admitir, apartear, revidar, retrucar, responder,indagar, defender, reconhecer, reconsiderar, reagir;• Verbos interpretativos do caráter ilocutivo do <strong>discurso</strong> referido -aconselhar, criticar, advertir, e<strong>na</strong>ltecer, elogiar, prometer,conde<strong>na</strong>r, censurar, desaprovar, incentivar, sugerir, exortar,admoestar;• Verbos introdutores de opinião do <strong>discurso</strong> popular – contar,prosseguir, l<strong>em</strong>brar, confessar e, com mais freqüência, o verbodizer;Além dessa classificação, uma opinião pode ser expressa <strong>na</strong> imprensaatravés de:• Nomi<strong>na</strong>lizações de verbos (a declaração, o argumento, o elogio,a confirmação, a denúncia), procedimento considerado maisincisivo. A nomi<strong>na</strong>lização, segundo Fairclough (2001), é aconversão de uma oração <strong>em</strong> um nomi<strong>na</strong>l ou nome (porex<strong>em</strong>plo, ao invés de se afirmar que “x criticou y”, coloca-seque “houve crítica contra y”). Para Fairclough, este recurso126


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpermite omitir o agente (o sujeito) da oração, tendo um aspecto“ideologicamente significativo”. Ele ressalta que “asnomi<strong>na</strong>lizações pod<strong>em</strong> também envolver a omissão de outrosparticipantes além dos agentes (...). A nomi<strong>na</strong>lização transformaprocessos e atividades <strong>em</strong> estados e objetos e ações concretas<strong>em</strong> abstratas” (FAIRCLOUGH, 2001: 227), o que confere aorecurso lingüístico importância cultural e ideológica;• Mediante construções adverbiais que tentam dar neutralidade,mas que <strong>na</strong> verdade transfer<strong>em</strong> a responsabilidade da opinião aqu<strong>em</strong> a <strong>em</strong>ite, como no caso da nomi<strong>na</strong>lização. É diferentequando antecede uma opinião que v<strong>em</strong> entre aspas. Asexpressões mais freqüentes são "segundo fulano", "de acordocom...", "<strong>na</strong> opinião de...", "para fulano", "a seu ver".A classificação dos verbos e os recursos de nomi<strong>na</strong>lizações econstruções adverbiais, porém, não é rígida, uma vez que, de acordocom a forma do <strong>discurso</strong>, o verbo adquire uma nova feição discursiva.O modo como estes recursos se apresentam no texto, <strong>na</strong> suamaterialização, é que os transformam <strong>em</strong> indicativos para a análise do<strong>discurso</strong> e a t<strong>em</strong>atização da <strong>mídia</strong>. A partir desta definição, poder<strong>em</strong>osverificar <strong>em</strong> que tipologia discursiva as comunidades indíge<strong>na</strong>s seenquadram <strong>na</strong> imprensa.5.1.1.2 O Discurso Relatado: o Uso de AspasNa sintaxe gramatical, a pontuação – especificamente o uso de aspas– está sendo considerada neste estudo <strong>em</strong> virtude de o jor<strong>na</strong>lismofazer uso quase s<strong>em</strong>pre do <strong>discurso</strong> relatado. A fi<strong>na</strong>lidade dapontuação é de marcar, no texto escrito, as ento<strong>na</strong>ções e pausas davoz, separar palavras e expressões que se deseja destacar e mesmoelimi<strong>na</strong>r o risco de ambigüidade. As aspas são usadas, entre outrassituações, antes e depois de uma citação considerada textual, ou seja,quando se espera reproduzir as palavras, expressões, frases ou127


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOtrechos da fala do outro. É a chamada “função citativa”, segundoEdward Lopes (LOPES, apud FIORIN, 2002: 41). Também se utilizamaspas para evidenciar conceitos ou expressões do <strong>discurso</strong> do outro oudo seu próprio <strong>discurso</strong>, dando ao termo aspeado um sentidoparticularizado. Usam-se ainda para destacar expressões populares,gírias, neologismos, palavras estrangeiras ou termos queconsideramos não se adequar totalmente ao caso <strong>em</strong> que é<strong>em</strong>pregado.Segundo Maingueneau (2002), as aspas são usadas:1. Para citar o <strong>discurso</strong> de outro dentro do <strong>discurso</strong> que assumimoscomo nosso, ou seja, para marcar a heterogeneidade no enunciado(<strong>discurso</strong> relatado);2. Para indicar que as palavras ditas num dado enunciado não seadequam b<strong>em</strong> à realidade.De acordo com Maingueneau (2002), o <strong>em</strong>prego das aspas, noprimeiro caso, t<strong>em</strong> como objetivo distanciar o autor do fala relatada,pois muitas vezes o enunciador não concorda ou não quer misturareste dito com aquilo que ele assume como sua parte no <strong>discurso</strong>. Poroutro lado, o jor<strong>na</strong>lista muitas vezes marca o <strong>discurso</strong> do outro comintenção oposta: mostrar respeito à fala alheia, especialmente quandose trata de uma autoridade.O primeiro caso é típico da imprensa, quando as aspas marcam ascitações <strong>em</strong> <strong>discurso</strong> direto, precedido ou sucedido de verbosintrodutores de opinião (já vistos anteriormente). É o tambémchamado <strong>discurso</strong> relatado, quando o jor<strong>na</strong>lista cita entre aspas a falada(s) fonte(s) de seu texto, buscando respeitar a forma origi<strong>na</strong>l do quelhe foi dito. É, enfim, uma forma de dar evidência às palavras de umafonte.128


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCONo segundo, de acordo com Maingueneau, o uso das aspas paradestacar uma determi<strong>na</strong>da palavra “delega ao co-enunciador a tarefade compreender o motivo pelo qual está chamando assim sua atençãoe abrindo uma brecha <strong>em</strong> seu próprio <strong>discurso</strong> (...). Muitas vezes,colocar uma unidade entre aspas significa transferir a responsabilidadede seu <strong>em</strong>prego a outra pessoa” (MAINGUENEAU, 2002: 161). Assim,muitas vezes o destaque feito pelas aspas recai <strong>sobre</strong> palavrasrestritas a grupos políticos, sociais ou a estereótipos e clichês.É interessante salientar que, ao destacar com aspas uma expressão noenunciado, o enunciador pressupõe que o leitor fará uma interpretaçãodentro da mesma formação ideológica para que a leitura seja a que sepretende. Neste caso, é importante observar que o uso de aspasresulta numa transferência de responsabilidade do <strong>discurso</strong> relatado aoseu titular, ou seja, o jor<strong>na</strong>lista deixa clara a orig<strong>em</strong> da fala marcadano texto. Muitas vezes, a função das aspas é questio<strong>na</strong>r o uso ou osentido da palavra usada, muitas vezes numa posição de crítica <strong>em</strong>relação ao seu enunciador.5.1.1.3 Marcas de HeterogeneidadeA heterogeneidade discursiva foi estudada no capítulo 3 destetrabalho. Normalmente, quando destacamos palavras ou expressõesde outro <strong>em</strong> nosso <strong>discurso</strong> – especialmente entre aspas e sob aadvertência de que se trata da uma fala citada através dos verbosintrodutores de opinião – faz<strong>em</strong>os isso para dar relevo, destaque.Segundo Bakhtin, estes destaques “se acomodam aos matizes daatitude do autor – ironia, humor etc” (BAKHTIN, 1992: 163).Como explicamos anteriormente, a heterogeneidade discursiva ocorrede modo marcado ou constitutivo. No primeiro caso, é o <strong>discurso</strong>direto, relatado, normalmente antecedido de verbos introdutores deopinião e entre aspas (como vimos no it<strong>em</strong> anterior). Aheterogeneidade constitutiva, porém, t<strong>em</strong> uma peculiaridade: existe129


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOno <strong>discurso</strong>, mas o autor adere ao <strong>discurso</strong> alheio de tal forma que elepassa a ser integrante de seu enunciado s<strong>em</strong> que se possa distinguirque parte dele é do enunciador e que parte é alheia a ele. Isso podeocorrer tanto consciente como inconscient<strong>em</strong>ente por parte do autordo texto, ou seja, a heterogeneidade está <strong>em</strong> todo <strong>discurso</strong>, mesmoque seu autor não se aperceba dela.Assim, o jor<strong>na</strong>lista ao fazer seu texto, ora marca o <strong>discurso</strong> da fonte,ora absorve e assume parte do enunciado do outro como sendo seu,relatando-o de modo consciente ou não, uma vez que se encontraassujeitado como qualquer sujeito. As marcas da heterogeneidadepod<strong>em</strong> ser vistas exatamente a partir dos indicadores citadosanteriormente: os verbos introdutores de opinião e o uso de aspas <strong>em</strong>citações de expressões ou palavras isoladas. A heterogeneidadeexplica a formação discursiva a que pertence tanto o autor do textojor<strong>na</strong>lístico como as fontes citadas, uma vez que esta formação émarcada ideológica e historicamente <strong>em</strong> ambos.5.1.2 Tipos de FonteO conceito de fontes jor<strong>na</strong>lísticas foi visto no capítulo 2 destadissertação. Como já afirmamos, as fontes são hierarquizadas segundosua capacidade de dar informações como representantes de um grupoou de uma instituição, especialmente as fontes consideradas de altonível, que reforçam o fato <strong>na</strong>rrado. Partindo da conceituação existente,criamos duas categorias de análise para o estudo de textosjor<strong>na</strong>lísticos:5.1.2.1 Fonte ativaPara o jor<strong>na</strong>lismo, a fonte é o sujeito responsável pelas informaçõesque servirão para a construção do texto jor<strong>na</strong>lístico. Como ojor<strong>na</strong>lismo pressupõe que todos os lados da notícia dev<strong>em</strong> ser ouvidos,<strong>em</strong> tese, o jor<strong>na</strong>lista ouve pelo menos duas fontes para construir o130


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOtexto jor<strong>na</strong>lístico, especialmente quando suas opiniões são opostasentre si. A fonte ativa a qual conceituamos nesta pesquisa é a fontejor<strong>na</strong>lística que t<strong>em</strong> papel fundamental <strong>na</strong> produção do texto, pois t<strong>em</strong>sua voz marcada e seu <strong>discurso</strong> reproduzido com verbos introdutoresde opinião que dão força domi<strong>na</strong>nte ao seu significado.A fonte ativa determi<strong>na</strong> o tom do <strong>discurso</strong> do jor<strong>na</strong>lista. O próprioautor do texto jor<strong>na</strong>lístico mistura sua voz com a voz da fonte ativa,ambos operando <strong>na</strong> mesma formação discursiva, o <strong>discurso</strong>domi<strong>na</strong>nte, o que ocorre de modo sublimi<strong>na</strong>r e até certo pontoimperceptível pelo jor<strong>na</strong>lista. O grau e o nível hierárquico da fonte eseu papel <strong>na</strong> estrutura social e de poder indicam a sua importância.São fontes ativas as fontes institucio<strong>na</strong>is, consideradas maisconfiáveis, representantes de segmentos sociais de peso econômico,político, social e religioso. Mesmo não sendo autor consciente de um<strong>discurso</strong>, mas efeito dos sentidos que reproduz, a fonte ativa, para ojor<strong>na</strong>lismo, constitui-se num sujeito associado a uma formaçãodiscursiva, da qual tor<strong>na</strong>-se uma espécie de porta-voz.A fonte ativa enuncia a partir de uma determi<strong>na</strong>da posição social queocupa e da qual não pode, não consegue ou mesmo não quer seafastar. Ou seja, <strong>em</strong>bora o sujeito não seja livre ao dizer, t<strong>em</strong> umacerta intencio<strong>na</strong>lidade ao enunciar dentro de um processo discursivoque provoque os efeitos de sentido esperados. Embora as palavras nãopertençam a esta ou aquela formação discursiva – pois não comportam<strong>em</strong> si mesmas um juízo de valor – ao ser<strong>em</strong> enunciadas dentro de um<strong>discurso</strong>, adquir<strong>em</strong> sentidos muitas vezes opostos aos que assum<strong>em</strong>quando integrantes de uma outra formação discursiva. Assim, o queajuda a identificar a formação discursiva de uma fonte não é a palavraque utiliza, mas como utiliza a palavra no momento <strong>em</strong> que enuncia.131


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5.1.2.2 Fonte passivaA fonte jor<strong>na</strong>lística passiva assume mais o papel de objeto que desujeito do <strong>discurso</strong>; ela é falada por outra(s) fonte(s) que assum<strong>em</strong> asua representação no texto jor<strong>na</strong>lístico ou t<strong>em</strong> seu <strong>discurso</strong>reproduzido antecedido de verbos introdutores de opinião quefragilizam o seu significado. Neste caso, o jor<strong>na</strong>lista marca a entradada voz do sujeito passivo no <strong>discurso</strong>, delimitando, mesmo de modoinconsciente, que não pertence à mesma formação discursiva. A fontepassiva muitas vezes é silenciada, mas quando consegue “furar” obloqueio do <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte, faz isso <strong>em</strong> momentos de lapsodiscursivo dentro do texto jor<strong>na</strong>lístico (<strong>na</strong> definição de Orlandiapresentada à pági<strong>na</strong> 95 desta dissertação), assumindo nest<strong>em</strong>omento um tom polêmico no <strong>discurso</strong>. São fontes passivas sujeitosde pro<strong>em</strong>inência desconhecida ou considerada irrelevante, cujarepresentação t<strong>em</strong> acesso restrito à <strong>mídia</strong>.As fontes passivas normalmente são o objeto da ação do texto, assim,são ouvidas de modo precário ou têm seu <strong>discurso</strong> mal compreendidopelo jor<strong>na</strong>lista, que, no papel de mediador, não consegue atingir osvalores expressos pela fonte <strong>em</strong> sua fala. Disputando espaço no textojor<strong>na</strong>lístico com as fontes ativas, as fontes passivas acabam por terseus <strong>discurso</strong>s silenciados ou assumidos por fontes oficiais ou degoverno, que têm autoridade legal para falar por eles. Nesta condição,as fontes passivas acabam ocupando a posição de receptores do quelhes é apresentado pela <strong>mídia</strong>, o que não significa que aceit<strong>em</strong> estacondição. Há uma luta social pela heg<strong>em</strong>onia dos sentidos, que pelaprópria ord<strong>em</strong> do <strong>discurso</strong>, favorece à fonte ativa.Como os sujeitos tend<strong>em</strong> a ver a si mesmos como a orig<strong>em</strong> de seuspróprios <strong>discurso</strong>s e não como efeitos de sentido de uma dadaformação discursiva, para os jor<strong>na</strong>listas é evident<strong>em</strong>ente difícilacreditar que, <strong>na</strong> construção do texto jor<strong>na</strong>lístico, exista umahierarquia no momento <strong>em</strong> que ele faz falar ou calar determi<strong>na</strong>da132


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOfonte. Somente dentro da perspectiva da Teoria do Agenda-Setting –que explica claramente como se dá o processo de <strong>agenda</strong>mento da<strong>mídia</strong>, a partir da escolha e supressão de certos t<strong>em</strong>as – e da Teoriada Análise do Discurso – que parte da pr<strong>em</strong>issa de que o sujeito não édono de seu dizer, mas ape<strong>na</strong>s porta-voz de um <strong>discurso</strong> pré-existentee que já circula no meio social – o jor<strong>na</strong>lista pode compreender adistinção entre as fontes jor<strong>na</strong>lísticas definidas nesta pesquisa.5.1.3 Tipos de DiscursoOs tipos de <strong>discurso</strong> que serão trabalhados nesta dissertação já foramtratados no capítulo 3. Para a análise, far<strong>em</strong>os uma retomada doassunto para seu aprofundamento.5.1.3.1 Discurso LúdicoNo <strong>discurso</strong> lúdico, a poliss<strong>em</strong>ia existe de modo aberto, ou seja, épossível perceber a existência de vários sentidos circulando entre osinterlocutores. O Discurso Popular definido por Marcuschi (1991) podese enquadrar nesta definição de Orlandi (2002). Para Orlandi, o<strong>discurso</strong> lúdico é aquele que “vaza, por assim dizer, nos intervalos,derivas, margens das práticas sociais e institucio<strong>na</strong>is” (ORLANDI,2002: 87), representando a ruptura no <strong>discurso</strong>. T<strong>em</strong> umacaracterística de leveza <strong>na</strong> forma de apresentação do enunciado.5.1.3.2 Discurso Autoritário ou Discurso do PoderNeste tipo discursivo, a poliss<strong>em</strong>ia é contida, os significados sãopreviamente determi<strong>na</strong>dos pelo enunciador, que tenta controlar ossentidos possíveis e apagar o interlocutor, ou seja, o <strong>discurso</strong> tendepara a monoss<strong>em</strong>ia. Orlandi (2002) considera que o <strong>discurso</strong>autoritário é predomi<strong>na</strong>nte <strong>em</strong> nossa sociedade, “pela sua constituição,pela sua organização e funcio<strong>na</strong>mento, pensando-se o conjunto desuas práticas <strong>em</strong> sua materialidade” (ORLANDI, 2002: 87). Este tipo133


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdiscursivo se caracteriza por expressar a retórica da domi<strong>na</strong>ção(opressão).Nesta categoria, pod<strong>em</strong>os incluir muitas vezes o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico,que, no relato do <strong>discurso</strong> do outro, tenta se aproximar do <strong>discurso</strong> daautoridade. Antônio Fausto Neto (2003) percebe esta aproximaçãoentre o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico e o <strong>discurso</strong> do poder, <strong>na</strong> medida <strong>em</strong> queo jor<strong>na</strong>lista revela intimidade com a fonte oficial ou para-oficial.Segundo ele:“ o lugar do <strong>discurso</strong> de autoridade é explicitadoclaramente pela revelação de ‘intimidade’ com omundo daquele que é citado no corpo da entrevista(...). O ‘perso<strong>na</strong>g<strong>em</strong>’ objeto da citação <strong>na</strong>o se trata,para ela, ape<strong>na</strong>s de uma fonte. Dele sabe muitomais (conhece o pensamento dele). Umacombi<strong>na</strong>ção de virtudes – intimidade e domínio dopensamento do outro – algo que não é pouco paraquando a enunciação midiática quer invocar o<strong>discurso</strong> da autoridade” (FAUSTO NETO, 2003:142).5.1.3.3 Discurso PolêmicoNeste caso, a poliss<strong>em</strong>ia é controlada e há disputa entre os possíveissignificados que circulam no <strong>discurso</strong>. A relação é tensa e este tipodiscursivo é a marca da resistência <strong>na</strong>s relações de poder. SegundoOrlandi (2002), “o <strong>discurso</strong> polêmico é possível e configura-se comouma prática de resistência e afrontamento” (ORLANDI, 2002: 87), ouseja, que se institui a partir da crítica. Também aqui pode se encaixaro Discurso Popular definido por Marcuschi (1991). Este tipo discursivose caracteriza por expressar a retórica do oprimido (resistência).134


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCODestacamos, porém, que não há um <strong>discurso</strong> que se enquadrepuramente nesta ou <strong>na</strong>quela categoria. Os enunciados se misturam epassam a ter um funcio<strong>na</strong>mento de predominância autoritária oupolêmica, por ex<strong>em</strong>plo. Orlandi (2002) ressalta a importância de seevitar as “etiquetas definidoras”, <strong>em</strong>bora salient<strong>em</strong>os que os indíciosque apontam para um determi<strong>na</strong>do tipo discursivo ajudam acompreender a materialidade do enunciado no momento <strong>em</strong> que ele sedá, mostrando como funcio<strong>na</strong> produzindo efeitos de sentido.5.2 Quando e como o <strong>índio</strong> é notícia: uma análisedo <strong>discurso</strong> e do <strong>agenda</strong>mento midiáticoO período de análise desta dissertação foi de 1º de julho de 2001 a 21de abril de 2002 – ou seja, dois dias após o Dia do Índio, o quepermitiu observar como ocorreu o <strong>agenda</strong>mento da <strong>mídia</strong> no período,considerando-se inclusive a influência do lançamento da Campanha daFraternidade 2002. Em nove meses de pesquisa, foram a<strong>na</strong>lisadasprelimi<strong>na</strong>rmente 127 notícias publicadas nos jor<strong>na</strong>is Diario dePer<strong>na</strong>mbuco e Jor<strong>na</strong>l do Commercio, que de alguma forma tratavamdo <strong>índio</strong> nos diversos gêneros jor<strong>na</strong>lísticos: reportag<strong>em</strong>, nota, notacomentada, artigo, editorial, foto-legenda e carta à redação. Das 127notícias veiculadas nos dois jor<strong>na</strong>is (ver anexo 1), definimos o corpusespecífico da pesquisa buscando atender aos vários gênerosjor<strong>na</strong>lísticos existentes, numa média de dois textos de cada gênero(quando houver), trabalhando com um maior número de reportagenspor ser o gênero mais recorrente no período pesquisado, conformever<strong>em</strong>os a seguir. Isso representa o estudo aprofundado de 23diferentes notícias <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> no período da pesquisa (ver anexo 2).Mensalmente, observ<strong>em</strong>os, <strong>na</strong> figura 2, como evoluiu <strong>em</strong> termosquantitativos o t<strong>em</strong>a indíge<strong>na</strong> <strong>na</strong> imprensa per<strong>na</strong>mbuca<strong>na</strong>:135


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOMÊSQUANTIDADEJULHO/2001 02AGOSTO/2001 14SETEMBRO/2001 17OUTUBRO/2001 02NOVEMBRO/2001 20DEZEMBRO/2001 03JANEIRO/2002 12FEVEREIRO/2002 19MARÇO/2002 11ABRIL/2002 27FIGURA 3 – Quantidade de matérias publicadas mensalmenteO gráfico 1 ajuda a visualizar a variação mês a mês:302520151050jul/01 ago/01 set/01 out/01 nov/01 dez/01 jan/02 fev/02 mar/02 abr/02jul/01ago/01set/01out/01nov/01dez/01jan/02fev/02mar/02abr/02GRÁFICO 1 – Visualização da quantidade de matérias publicadas mensalmenteA variação quantitativa mês a mês é aleatória - ou seja, s<strong>em</strong> umalinearidade que aponte para a presença do t<strong>em</strong>a <strong>índio</strong> de modo regular– o que indica que o t<strong>em</strong>a não é prevalente <strong>na</strong> <strong>mídia</strong>, ou seja, surgede modo ocasio<strong>na</strong>l e provocado por uma t<strong>em</strong>ática maior, comover<strong>em</strong>os a seguir. Os quadros <strong>na</strong>s pági<strong>na</strong>s seguintes mostram,também quantitativamente, como se deu o <strong>agenda</strong>mento da <strong>mídia</strong> noperíodo pesquisado: os t<strong>em</strong>as relacio<strong>na</strong>dos ao <strong>índio</strong> que entraram <strong>na</strong>pauta da imprensa, os gêneros jor<strong>na</strong>lísticos mais comuns e as editoriasdos jor<strong>na</strong>is <strong>em</strong> que os t<strong>em</strong>as estiveram presentes.136


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5.2.1 - QUADRO 1 - JORNAL DO COMMERCIOPERÍODO: JULHO/2001 A ABRIL/2002GÊNEROS X EDITORIASGÊNEROSREPORTAGEM NOTA NOTACOMENTADAARTIGO EDITORIAL FOTO-LEGENDACARTA ÀREDAÇÃOTOTALEDITORIASSEGUNDA CAPA /5 4 - - - - - 9ÚLTIMAS NOTÍCIAS/SEGUNDA EDIÇÃOPOLÍTICA / COLUNAS- 1 1 - - - - 2PINGA FOGO EREPÓRTER JCBRASIL 19 11 - - - - - 30INTERNACIONAL 2 - - - - - - 2OPINIÃO / SEÇÃO DE - - - - 1 - - 1CARTASECONOMIA - - - - - - - -CADERNO C 1 1 - - - 2 - 4CIDADES / COLUNA JC 15 6 - - - - - 21NAS RUASTURISMO - - - - - - - -FAMÍLIA 1 - - - - - - 1SUBTOTAL 43 23 1 - 1 2 - -TOTAL GERAL 43 23 01 - 01 02 - 70137


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5.2.2 - QUADRO 2 - DIARIO DE PERNAMBUCOPERÍODO: JULHO/2001 A ABRIL/2002GÊNEROS X EDITORIASGÊNEROSREPORTAGEM NOTA NOTACOMENTADAARTIGO EDITORIAL FOTO-LEGENDACARTA ÀREDAÇÃOTOTALEDITORIASOPINIÃO / SEÇÃO DE - - - 2 - - 1 03CARTASPOLÍTICA / COLUNA- 1 - - - - - 01DIÁRIO POLÍTICOBRASIL 7 1 - - - - - 08ÚLTIMAS 3 8 - - - - - 11ECONOMIA - - - - - - - -VIDA URBANA /23 3 1 - - - - 27COLUNA DIÁRIOURBANOVIVER 4 1 - - - - - 05MUNDO 2 - - - - - - 02SUBTOTAL 39 14 1 2 - - 1 -TOTAL GERAL 39 14 01 02 - - 01 57138


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMASARTE ECULTURA5.2.3 - QUADRO 3 - JORNAL DO COMMERCIOPERÍODO: JULHO/2001 A ABRIL/2002TEMAS X EDITORIASVIOLÊNCIADO ÍNDIOTERRAINDÍGENAEDUCAÇÃOINDÍGENAVIOLÊNCIACONTRA OÍNDIORACISMO/MINORIASAÚDEINDÍGENARELIGIÃO /CAMPANHA DAFRATERNIDADE/ PÁSCOAEDITORIASSEGUNDA CAPA / - 3 - 1 2 1 - 1ÚLTIMASNOTÍCIAS/SEGUNDA EDIÇÃOPOLÍTICA /- - - - 1 - - -COLUNAS PINGAFOGO E REPÓRTERJCBRASIL - 5 2 1 12 1 1 4INTERNACIONAL - - - - - 2 - -OPINIÃO / SEÇÃO - - - - - 1 - -DE CARTASCADERNO C 3 - - - - - - -CIDADES /- 4 - 1 7 1 1 4COLUNA JC NASRUASFAMÍLIA - - - - - 1 - -TOTAL GERAL 03 12 02 03 22 07 02 09139


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMASCIÊNCIA GARIMPO PROTESTOS / SEMANA/ OUTROSINDÍGENA ILEGAL /MEIOCONFLITOS DIA DOÍNDIOEDITORIASAMBIENTESEGUNDA CAPA /- - 1 - -ÚLTIMAS NOTÍCIAS/SEGUNDA EDIÇÃOPOLÍTICA / COLUNAS- - - 1 -PINGA FOGO EREPÓRTER JCBRASIL 1 3 - - -INTERNACIONAL - - - - -OPINIÃO / SEÇÃO DE- - - - -CARTASCADERNO C - - - 1 -CIDADES / COLUNA JC 1 - - 2 -NAS RUASFAMÍLIA - - - - -TOTAL GERAL 02 03 01 04 -140


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMASARTE ECULTURA5.2.4 - QUADRO 4 - DIARIO DE PERNAMBUCOPERÍODO: JULHO/2001 A ABRIL/2002TEMAS X EDITORIASVIOLÊNCIADO ÍNDIOTERRAINDÍGENAEDUCAÇÃOINDÍGENAVIOLÊNCIACONTRA OÍNDIORACISMO/MINORIASAÚDEINDÍGENARELIGIÃO /CAMPANHA DAFRATERNIDADE/ PÁSCOAEDITORIASOPINIÃO / SEÇÃO - - - - - 1 - 2DE CARTASPOLÍTICA / DIÁRIO - - - - 1 - - -POLÍTICOBRASIL - 1 - - 3 - - 2ÚLTIMAS - 3 1 3 3 - - 1VIDA URBANA /1 5 - 2 10 - - 4DIÁRIO URBANOVIVER 3 - - - 1 - - -MUNDO - - - - - 2 - -TOTAL 04 09 01 05 18 03 - 09141


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMASCIÊNCIA GARIMPO PROTESTOS / SEMANA/ OUTROSINDÍGENA ILEGAL /MEIOCONFLITOS DIA DOÍNDIOEDITORIASAMBIENTEOPINIÃO / SEÇÃO DE- - - - -CARTASPOLÍTICA / DIÁRIO- - - - -POLÍTICOBRASIL 1 1 - - -ÚLTIMAS - - - - -VIDA URBANA /- - 1 1 3DIÁRIO URBANOVIVER - - 1 - -MUNDO - - - - -TOTAL 01 01 02 01 03142


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5.2.5 - QUADRO 5 - JORNAL DO COMMERCIOPERÍODO: JULHO/2001 A ABRIL/2002TEMAS X GÊNEROSTEMASARTE ECULTURAVIOLÊNCIADO ÍNDIOTERRAINDÍGENAEDUCAÇÃOINDÍGENAVIOLÊNCIACONTRA OÍNDIORACISMO/MINORIASAÚDEINDÍGENARELIGIÃO /CAMPANHA DAFRATERNIDADE/ PÁSCOAGÊNEROSREPORTAGEM 1 6 2 3 12 5 1 7NOTA - 6 - - 9 1 1 2NOTA- - - - 1 - - -COMENTADAARTIGO - - - - - - - -EDITORIAL - - - - - 1 - -FOTO-LEGENDA 2 - - - - - - -CARTAS À- - - - - - - -REDAÇÃOTOTAL 03 12 02 03 22 07 02 09143


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMASCIÊNCIAINDÍGENAGARIMPOILEGAL /MEIOAMBIENTEPROTESTOS /CONFLITOSSEMANA/DIA DOÍNDIOOUTROSGÊNEROSREPORTAGEM 2 2 - 2 - 43NOTA - 1 1 2 - 23NOTA COMENTADA - - - - - 1ARTIGO - - - - - -EDITORIAL - - - - - 1FOTO-LEGENDA - - - - - 2CARTAS À REDAÇÃO - - - - - -TOTAL 02 03 01 04 - 70TOTAL144


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5.2.6 - QUADRO 6 - DIARIO DE PERNAMBUCOPERÍODO: JULHO/2001 A ABRIL/2002TEMAS X GÊNEROSTEMASARTE ECULTURAVIOLÊNCIADO ÍNDIOTERRAINDÍGENAEDUCAÇÃOINDÍGENAVIOLÊNCIACONTRA OÍNDIORACISMO/MINORIASAÚDEINDÍGENARELIGIÃO /CAMPANHA DAFRATERNIDADE/ PÁSCOAGÊNEROSREPORTAGEM 3 7 - 1 15 2 - 6NOTA 1 2 1 3 3 - - 1NOTA- - - 1 - - - -COMENTADAARTIGO - - - - - 1 - 1EDITORIAL - - - - - - - -FOTO-LEGENDA - - - - - - - -CARTAS À- - - - - - - 1REDAÇÃOTOTAL 04 09 01 05 18 03 - 09145


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMASCIÊNCIAINDÍGENAGARIMPOILEGAL /MEIOAMBIENTEPROTESTOS /CONFLITOSSEMANA/DIA DOÍNDIOOUTROSGÊNEROSREPORTAGEM - 1 1 1 2 39NOTA 1 - 1 - 1 14NOTA COMENTADA - - - - - 01ARTIGO - - - - - 02EDITORIAL - - - - - -FOTO-LEGENDA - - - - - -CARTAS À REDAÇÃO - - - - - 01TOTAL 01 01 02 01 03 57TOTAL146


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO5.3 Análise dos quadros estatísticosA análise quantitativa ajuda a observar como se dá a ocupação dosegmento indíge<strong>na</strong> <strong>na</strong> imprensa <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco. No quadro 1,verificamos que a editoria <strong>em</strong> que o t<strong>em</strong>a indíge<strong>na</strong> ocupa mais espaçono Jor<strong>na</strong>l do Commercio (JC) é a Editoria de Brasil, ou seja, a questãoé tratada mais <strong>em</strong> termos de <strong>agenda</strong>mento <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l do que de<strong>agenda</strong>mento local da <strong>mídia</strong>, apesar do segmento indíge<strong>na</strong> <strong>em</strong>Per<strong>na</strong>mbuco ser o quarto maior do País. No quadro 2, observamos queno Diario de Per<strong>na</strong>mbuco (DP) a situação é inversa: a Editoria de VidaUrba<strong>na</strong> apresenta três vezes mais informações relacio<strong>na</strong>das ao <strong>índio</strong>do que a Editoria de Brasil.O quadro 3, do Jor<strong>na</strong>l do Comercio, ajuda-nos a constatar que o <strong>índio</strong>aparece como notícia dentro de uma t<strong>em</strong>ática maior: a violência. Dototal de 127 notícias diferentes apuradas no período estudado nos doisjor<strong>na</strong>is, 22 se relacio<strong>na</strong>m com violência contra o <strong>índio</strong> e 12 comviolência provocada pelo <strong>índio</strong>, totalizando 34 notícias <strong>em</strong> que violênciae <strong>índio</strong> são relacio<strong>na</strong>dos e entram <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> do Jor<strong>na</strong>l do Commercio(excluindo-se aqui questões menos específicas, mas também relativasà violência, que estão indicadas no quadro sob o nome de protestos,conflitos e garimpo ilegal <strong>em</strong> terras indíge<strong>na</strong>s). No quadro 4,observamos que a <strong>agenda</strong> dos dois jor<strong>na</strong>is é s<strong>em</strong>elhante: no Diario dePer<strong>na</strong>mbuco, a violência contra o <strong>índio</strong> foi noticiada 18 vezes e aviolência provocada por ele, 9, o que soma 27 notícias relacio<strong>na</strong>das aot<strong>em</strong>a violência. Também no Diario, garimpo ilegal, protestos e conflitosforam divulgados. Os quadros 5 e 6 nos permit<strong>em</strong> constatar que ogênero reportag<strong>em</strong> é o mais comum usado <strong>em</strong> ambos os jor<strong>na</strong>is paradivulgar qualquer assunto relacio<strong>na</strong>do ao <strong>índio</strong>. No JC, foram 43reportagens no período estudado; no DP, foram 39.Em toda a pesquisa, ape<strong>na</strong>s um editorial do Jor<strong>na</strong>l do Commercio edois artigos do Diario de Per<strong>na</strong>mbuco falaram da questão147


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOindíge<strong>na</strong>. O editorial do JC e um dos artigos do DP trataram de umaoutra t<strong>em</strong>ática, o racismo, <strong>em</strong> virtude da Conferência da Organizaçãodas Nações Unidas (ONU) contra o Racismo, a Xenofobia e aIntolerância Correlata, encontro realizado <strong>em</strong> Durban, <strong>na</strong> África do Sul.Em grande parte das reportagens <strong>sobre</strong> o evento, ape<strong>na</strong>s o nome"<strong>índio</strong>" é referido, s<strong>em</strong> qualquer aprofundamento ou aproximação dareportag<strong>em</strong> à realidade indíge<strong>na</strong> brasileira ou regio<strong>na</strong>l. O segundoartigo falou da Campanha da Fraternidade 2002, Fraternidade e PovosIndíge<strong>na</strong>s, lançada <strong>na</strong> fase fi<strong>na</strong>l da coleta de dados da pesquisa.Também no período do estudo, houve o assassi<strong>na</strong>to do líder indíge<strong>na</strong>Chico Quelé (xucuru) uma tentativa de dissidência entre m<strong>em</strong>bros damesma comunidade – fato que virou notícia <strong>em</strong> virtude da violênciapraticada entre os <strong>índio</strong>s –, da prisão do assassino do cacique Chicão(também xucuru), além do processo judicial do cacique PaulinhoPaiakan (acusado de torturar uma professora, juntamente com aesposa, no Pará) e do julgamento dos acusados do assassi<strong>na</strong>to do<strong>índio</strong> Galdino (<strong>índio</strong> queimado <strong>em</strong> Brasília por adolescentes enquantodormia <strong>na</strong> rua).O lançamento da Campanha da Fraternidade 2002 elevou o número dereportagens <strong>sobre</strong> a questão indíge<strong>na</strong>: enquanto no mês de marçoforam 11 notícias <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong>, nos 21 dias de abril a<strong>na</strong>lisados onúmero subiu para 27. A campanha, porém, não foi marcante osuficiente para modificar a perspectiva do <strong>agenda</strong>-setting da imprensa:nos textos de jor<strong>na</strong>l a<strong>na</strong>lisados no período, por 18 vezes a campanhafoi notícia, mas, <strong>na</strong> com<strong>em</strong>oração da Páscoa – quando oficialmente acampanha é lançada pela Igreja Católica – três reportagens foramfeitas <strong>sobre</strong> a data religiosa e, <strong>em</strong> duas delas, sequer o t<strong>em</strong>a daCampanha da Fraternidade – que focava a questão indíge<strong>na</strong> – foicitado. Numa terceira reportag<strong>em</strong>, foi feita uma alusão à presença deatores que figuravam como <strong>índio</strong>s numa com<strong>em</strong>oração religiosa noRecife, s<strong>em</strong> qualquer ressalva ou crítica à ausência de verdadeiroslíderes ou representantes de comunidades indíge<strong>na</strong>s de Per<strong>na</strong>mbuco<strong>na</strong> celebração que fez referência direta à luta indíge<strong>na</strong> pela terra.148


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOA violência associada ao indíge<strong>na</strong>, porém, é o t<strong>em</strong>a que mais <strong>agenda</strong> aimprensa. Nesta análise quantitativa, perceb<strong>em</strong>os que o <strong>discurso</strong> <strong>sobre</strong>o <strong>índio</strong> <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> é enquadrado no t<strong>em</strong>a maior violência, no qual o <strong>índio</strong>é incluído. O estudo feito <strong>sobre</strong> as 127 notícias veiculadas nos jor<strong>na</strong>iscitados mostra que, ora como vítima, ora como autor da violência, oindíge<strong>na</strong> apareceu 61 vezes nos dois jor<strong>na</strong>is. Isso aponta para oquadro grave da violência no País, que atinge também os indíge<strong>na</strong>s,assunto esse que entrou <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> da imprensa há alguns anos porforça da crise <strong>na</strong> segurança pública, o aumento de seqüestros eassaltos a banco, atingindo fort<strong>em</strong>ente a classe domi<strong>na</strong>nte.5.4 O <strong>índio</strong> como fonte jor<strong>na</strong>lística: <strong>discurso</strong> e<strong>agenda</strong>mento <strong>na</strong> imprensa <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbucoSeguindo para uma análise do <strong>discurso</strong> do <strong>índio</strong> <strong>na</strong> <strong>mídia</strong>, definimos ocorpus da pesquisa de modo a d<strong>em</strong>onstrar como o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lísticoopera produzindo efeitos de sentido, ou seja, é determi<strong>na</strong>do por uma<strong>agenda</strong> e é a partir dela que ir<strong>em</strong>os aprofundar o estudo. O corpusestá definido <strong>em</strong> 23 textos jor<strong>na</strong>lísticos do período total pesquisado,numa análise que segue os indicadores do <strong>discurso</strong> já detalhadosanteriormente.1. Índios Tere<strong>na</strong> libertam reféns (JC, 30.07.2001) – notaAo afirmar que os <strong>índio</strong>s libertam reféns, transparece a posição de queos <strong>índio</strong>s assumiram o lugar de seqüestradores, logo, uma ação deviolência, s<strong>em</strong> associar o fato a uma reivindicação. Somente ao fim danota é feita referência, indireta, a uma promessa do Incra de assentaros indíge<strong>na</strong>s <strong>em</strong> uma fazenda: "A negociação foi feita pelo ouvidorgeraldo Incra, Gercino da Silva Filho, que prometeu às 300 famíliasdos <strong>índio</strong>s assentá-las <strong>na</strong> Fazenda Mirandópolis, <strong>em</strong> 10 dias". Ou seja,não fica claro o motivo dos <strong>índio</strong>s ter<strong>em</strong> feito reféns, mas se e<strong>na</strong>ltece apromessa da fonte ativa do <strong>discurso</strong> para-oficial (do poder domi<strong>na</strong>nte).149


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOA referência indireta pode levar o leitor a não associar a tomada dosfuncionários do Incra pelos <strong>índio</strong>s à luta pela terra, que para a culturaindíge<strong>na</strong> têm um valor diferenciado, sendo a base da <strong>sobre</strong>vivência eda existência como povo. Além disso, a defesa da terra para os <strong>índio</strong>s,hoje, depende de toda uma burocracia dos brancos, que foge aocontrole dos <strong>índio</strong>s. O verbo prometer dá força ao <strong>discurso</strong> da fonteativa, que representa o poder para-oficial, no caso, o Incra, enquantoa ação dos <strong>índio</strong>s, ao falar ape<strong>na</strong>s da libertação de reféns, assume aidéia de bader<strong>na</strong>, perdendo a vinculação política com a reivindicaçãopela terra. Nenhum <strong>índio</strong> Tere<strong>na</strong> t<strong>em</strong> sua opinião expressa <strong>na</strong> nota, ouseja, seu <strong>discurso</strong> é mantido no silêncio, com a colocação do <strong>índio</strong> <strong>na</strong>posição de fonte passiva, que produz o <strong>discurso</strong> popular. O texto nãomarca a heterogeneidade discursiva, que ocorre de modo constitutivoneste caso, fazendo prevalecer o <strong>discurso</strong> para-oficial – do poder – doIncra.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 1)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DO GOVERNO/AUTORIDADEDISCURSO DO PODER PARA-OFICIAL (INCRA)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:PROMETERNOMINALIZAÇÕES:A NEGOCIAÇÃO FOI FEITA...TIPO DE FONTEFONTE ATIVAVIOLÊNCIA DO ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:LIBERTARNÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DIRETA DODISCURSO INDÍGENA(SILENCIAMENTO DO SUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA150


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO2. Ambientalistas quer<strong>em</strong> de volta terras doadas para os <strong>índio</strong>s(JC, 04.08.2001) – reportag<strong>em</strong>Ambientalistas quer<strong>em</strong> o retorno de terras consideradas depreservação ambiental que foram transferidas para os <strong>índio</strong>s <strong>na</strong> Ilha doBa<strong>na</strong><strong>na</strong>l. Eles argumentam que os <strong>índio</strong>s têm reivindicado "com umafreqüência alarmante" o direito às terras definidas como unidades deconservação. A heterogeneidade discursiva é marcada pela presençade aspas, que r<strong>em</strong>et<strong>em</strong> trechos do <strong>discurso</strong> relatado ao seu autor, epelo uso de verbos introdutores de opinião. Um trecho mostraclaramente qual a posição discursiva dos ambientalistas: "há umconflito constitucio<strong>na</strong>l <strong>em</strong> questão", pondera..."a Constituição diz queas unidades de conservação só pod<strong>em</strong> ser alteradas por lei e estatransferência foi feita por uma portaria do ministro José Gregori...masa Constituição também diz que os territórios tradicio<strong>na</strong>is indíge<strong>na</strong>spertenc<strong>em</strong> aos <strong>índio</strong>s, o que é muito vago. Por este artigo, todo oBrasil é terra indíge<strong>na</strong> e <strong>em</strong> breve poder<strong>em</strong>os ficar s<strong>em</strong> unidades deconservação". O verbo ponderar organiza o argumento dosambientalistas por um caminho que permite que eles façam suachamada contra a presença dos <strong>índio</strong>s nestas unidades de terra, s<strong>em</strong>,contudo, afirmar se a permanência de <strong>índio</strong>s pode ou não causar danosà <strong>na</strong>tureza, questão crucial a ser a<strong>na</strong>lisada, uma vez que, <strong>em</strong> geral, aforma de <strong>sobre</strong>vivência dos indíge<strong>na</strong>s é de subsistência, ou seja, nãoprejudica o meio ambiente e foi, inclusive, um argumento deindigenistas <strong>em</strong> favor da presença de <strong>índio</strong>s nestas áreas como formade garantir a preservação do meio ambiente no País. Além disso, háum não-dito carregado de ironia apresentado no texto: "...por esteartigo, todo o Brasil é terra indíge<strong>na</strong> e <strong>em</strong> breve poder<strong>em</strong>os ficar s<strong>em</strong>unidades de conservação". De fato, todo o País foi mesmo terraindíge<strong>na</strong>, mas a forma irônica como isso é tratado não é a<strong>na</strong>lisada <strong>na</strong>matéria. Em outro trecho, é ressaltada a onda de ocupação deunidades de conservação por <strong>índio</strong>s, mas não se fala no atrasohistórico da d<strong>em</strong>arcação das terras desti<strong>na</strong>das aos povos indíge<strong>na</strong>s noBrasil. A opinião dos <strong>índio</strong>s que receberam terras <strong>na</strong> Ilha do Ba<strong>na</strong><strong>na</strong>l151


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOnão é expressa <strong>na</strong> reportag<strong>em</strong>, enquanto o <strong>discurso</strong> dosambientalistas, único expresso <strong>na</strong> reportag<strong>em</strong>, ganha peso de fonteativa e reforça a ideologia da classe domi<strong>na</strong>nte, ou seja, reforça o<strong>discurso</strong> do poder (<strong>discurso</strong> para-oficial), de alguma forma trazendopara julgamento os direitos especiais das comunidades indíge<strong>na</strong>s eganhando peso sob a retórica da opressão. Os <strong>índio</strong>s são silenciados<strong>na</strong> reportag<strong>em</strong>, uma vez que seu <strong>discurso</strong> não é veiculado, assumindoa posição de fonte passiva.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 2)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE PARA-OFICIAL (AMBIENTALISTAS)DISCURSO DO PODER (RETÓRICA DAOPRESSÃO)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:QUERER, PONDERARNOMINALIZAÇÕES:A REVOGAÇÃO DA PORTARIA...ADJETIVOS:OS ÍNDIOS TÊM REIVINDICADO COMFREQÜÊNCIA ALARMANTE...IRONIA:POR ESTE ARTIGO, TODO O BRASILÉ TERRA INDÍGENA E EM BREVEPODEREMOS FICAR SEM UNIDADESDE CONSERVAÇÃOTIPO DE FONTEFONTE ATIVATERRA INDÍGENATIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DODISCURSO (SILENCIAMENTO DOSUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA3. Índio Xucuru assassi<strong>na</strong>do <strong>em</strong> Pesqueira (DP, 24.08.2001) –reportag<strong>em</strong>152


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOAqui, surge a questão que mais representatividade t<strong>em</strong> nesta análise:a violência contra os <strong>índio</strong>s. A violência, que é um t<strong>em</strong>a constitutivo do<strong>agenda</strong>-setting da <strong>mídia</strong>, surge com o assassi<strong>na</strong>to do líder indíge<strong>na</strong>Chico Quelé, tratando do conflito entre fazendeiros e <strong>índio</strong>s nomunicípio de Pesqueira. Mesmo sendo um crime contra uma liderançade um segmento social, ocupa o espaço de uma colu<strong>na</strong> de jor<strong>na</strong>l. Aorelatar as condições do assassi<strong>na</strong>to, o jor<strong>na</strong>lista coloca aresponsabilidade da <strong>na</strong>rração para o Conselho Indigenista Missionário,dando inclusive marg<strong>em</strong> à dúvida <strong>sobre</strong> o fato: "segundo a versãodivulgada pelo conselho Indigenista Missionário (Cimi), Chico Quelé,que não possuía registro de <strong>na</strong>scimento e t<strong>em</strong> a idade estimada <strong>em</strong> 50anos, seguia para uma reunião do Conselho de Lideranças... foiassassi<strong>na</strong>do". Mesmo tentando passar neutralidade, este recursopermite pensar que, se é uma versão, há espaço para outras, o queenfraquece a tese do assassi<strong>na</strong>to. O repórter sabe que é preciso umainvestigação para a conclusão de que foi um assassi<strong>na</strong>to, mas épraticamente impossível que alguém morra <strong>em</strong> decorrência de um tirode espingarda de calibre 12 que não seja assassi<strong>na</strong>do. A construçãoadverbial (“segundo a versão...”) foi um recurso usado para transferirpara o Cimi a responsabilidade da afirmação de que foi um homicídio.No decorrer do texto, há a expressão da opinião do <strong>índio</strong> MarcosLuidson, filho do cacique Xicão (morto <strong>em</strong> 1998 <strong>em</strong> decorrência dosconflitos <strong>em</strong> virtude da d<strong>em</strong>arcação das terras). As opiniões relatadassão seguidas dos verbos denunciar, afirmar, dizer. O primeiro aponta o<strong>discurso</strong> de oposição, do Cimi, e polêmico, do <strong>índio</strong>, mas a declaraçãodo indíge<strong>na</strong> é enfraquecida mais adiante, quando diz: "muitos deles(fazendeiros) não quer<strong>em</strong> sair (das terras d<strong>em</strong>arcadas) e promet<strong>em</strong>matar a mim e outras lideranças", afirmou Marcos Luidson". Isso éuma ameaça de morte, que t<strong>em</strong> um peso muito maior, mas o verbointrodutor de opinião não dá a isso o valor devido, ou seja, a posiçãoda fonte Marcos Luidson é fragilizada. A palavra “trégua” entre aspasr<strong>em</strong>ete o leitor a que possível sentido ela assume no texto, que irádepender da sua interpretação, mas retoma o senso comum <strong>sobre</strong> o<strong>índio</strong> como selvag<strong>em</strong> e guerreiro. A preocupação com a falta de153


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOregistro de <strong>na</strong>scimento, colocada no texto s<strong>em</strong> qualquer análise maisdetalhada, enfraquece a identidade indíge<strong>na</strong> do líder assassi<strong>na</strong>do. O<strong>índio</strong> assume o papel de fonte passiva e seu <strong>discurso</strong> é enquadradocomo <strong>discurso</strong> polêmico, porque há marcas de resistência, mas aapresentação no texto jor<strong>na</strong>lístico o reveste também como <strong>discurso</strong>popular. O Cimi aparece com um <strong>discurso</strong> de oposição.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 3)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE – DISCURSODE OPOSIÇÃO/POLÊMICO (CIMI)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:QUERER, PONDERARUSO DE ASPAS:APESAR DA “TRÉGUA”...CONSTRUÇÃO ADVERBIAL:SEGUNDO A VERSÃO DIVULGADAPELO CONSELHO INDIGENISTAMISSIONÁRIO (CIMI), CHICOQUELÉ.... FOI ASSASSINADOTIPO DE FONTEFONTE ATIVAVIOLÊNCIA CONTRA O ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POLÊMICO/POPULAR(RETÓRICA DO OPRIMIDO)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:DENUNCIAR, AFIRMAR, DIZERUSO DE ASPAS E METÁFORA:“ISSO AQUI É UM BARRIL DEPÓLVORA”TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA4. Assassi<strong>na</strong>do líder da tribo Xucuru (JC, 24.08.2001) –reportag<strong>em</strong>Novamente o t<strong>em</strong>a da violência é apresentado, mas, diferent<strong>em</strong>entedo Diario de Per<strong>na</strong>mbuco, o Jor<strong>na</strong>l do Commercio afirmou que o líderXucuru Chico Quelé foi assassi<strong>na</strong>do, s<strong>em</strong> neutralizar a informação damorte através de um recurso lingüístico, e associa o crime aosconflitos pela disputa pela terra. A reportag<strong>em</strong> é manchete de pági<strong>na</strong> er<strong>em</strong><strong>em</strong>ora os crimes anteriores relacio<strong>na</strong>dos aos conflitos e ainda154


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOressalta que todos “têm a marca da impunidade, uma vez que nenhumacusado foi a julgamento”. Entretanto, ao dar voz ao advogado doCimi, ele faz uma série de denúncias que são seguidas pelo verboexplicar, que assume um papel de indicador de provisoriedade doargumento, quando <strong>na</strong> verdade a afirmação traz uma acusação aosfazendeiros da região e poderia ser seguida de um verbo indicador deforça do argumento ou de afirmação positiva. A voz do <strong>índio</strong> não éouvida, ou seja, o Cimi fala por ele. Assim, os <strong>índio</strong>s assum<strong>em</strong> aposição de fonte passiva, <strong>em</strong>bora o <strong>discurso</strong> do texto jor<strong>na</strong>lístico sejapolêmico, ou seja, há as marcas da resistência <strong>na</strong>s relações de poder.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 4)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE – DISCURSODE OPOSIÇÃO/POLÊMICO (CIMI)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:EXPLICARTIPO DE FONTEFONTE ATIVAVIOLÊNCIA CONTRA O ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POLÊMICO (RETÓRICA DOOPRIMIDO)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:OBTERTIPO DE FONTEFONTE PASSIVA5. Chaci<strong>na</strong> (DP, 28.08.2001) – notaO texto afirma que “o deputado Paulo Rub<strong>em</strong> Santiago adverte quenovas mortes de <strong>índio</strong>s xucurus, <strong>em</strong> Pesqueira, pod<strong>em</strong> acontecer aqualquer momento”. O verbo traz o peso da interpretação daafirmação do deputado, mas ao fi<strong>na</strong>l coloca a <strong>na</strong>rração seguida daconstrução adverbial “segundo ele”, transferindo para o político o pesoda declaração, que é muito mais uma denúncia do que umaadvertência, já que afirma existir uma lista de “marcados paramorrer”. As aspas são usadas para marcar as expressões lista negra <strong>em</strong>arcados para morrer, indicando a heterogeneidade discursiva, o155


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO<strong>discurso</strong> relatado pelo deputado ao jor<strong>na</strong>lista. Além disso, o texto, aoafirmar que “nenhum dos crimes...foi elucidado”, constitui-se numaanálise crítica moderada da impunidade dos crimes já ocorridos <strong>na</strong>região. Novamente o <strong>índio</strong> figura como fonte passiva, pois o deputadofala por ele.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 5)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE OFICIAL(DEPUTADO)DISCURSO DE OPOSIÇÃO/POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:ADVERTIR, COMENTAR (NESTECASO, OMITINDO-SE O AGENTE DAINFORMAÇÃO NO COMENTÁRIO)CONSTRUÇÃO ADVERBIAL:NA REGIÃO COMENTA-SE QUEHAVERIA UMA “LISTA NEGRA” COMNOMES DE “MARCADOS PARAMORRER”, SEGUNDO ELE...TIPO DE FONTEFONTE ATIVAVIOLÊNCIA CONTRA O ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DODISCURSOTIPO DE FONTEFONTE PASSIVA6. Contra a intolerância (JC, 31.08.2001) – editorialO editorial enfatiza a realização da conferência de Durban e corroboraa participação brasileira no encontro, defendendo o <strong>discurso</strong> dogoverno. “O Brasil, País que padece de graves distorções de fundosocial e étnico, participa do evento com delegação de 50representantes e um programa que inclui propostas de políticaspúblicas para garantir...a aprovação do Estatuto do Índio que tramitano Congresso Nacio<strong>na</strong>l...reconhecimento oficial, pelo Estado brasileiro,de que a escravidão de negros e <strong>índio</strong>s e a margi<strong>na</strong>lização de seus156


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOdescendentes são violações aos direitos humanos...”. Mesmoadmitindo a fraqueza <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l diante das distorções sociais, o textojor<strong>na</strong>lístico mostra que o governo participa do encontro para garantir aaprovação do Estatuto do Índio, dando força à posição do governodiante do probl<strong>em</strong>a. Mais adiante, novamente se posicio<strong>na</strong>: “umprograma bonito, que merece apoio, <strong>em</strong>bora longe da realidadebrasileira...”; mas mais adiante, volta a reforçar o <strong>discurso</strong> oficialexpresso no programa: “pelo menos, o nosso País se mostra abertoaos probl<strong>em</strong>as e interessado <strong>em</strong> resolvê-los, enquanto os EUA estãopraticamente boicotando a conferência...”. E, defendendo previamenteo governo de possíveis ataques por atrasos <strong>na</strong> efetivação de açõesconcretas, afirma: “a conferência é importante, <strong>em</strong>bora seusresultados d<strong>em</strong>or<strong>em</strong> a aparecer”. No fim, mostra o posicio<strong>na</strong>mento daíndia Azelene Kaingang, representante das Organizações Indíge<strong>na</strong>s doBrasil, que “considera preconceituosa a legislação indigenistabrasileira, que ainda vê o <strong>índio</strong> como incapaz, 501 anos depois doDescobrimento”. Na forma de apresentação do <strong>discurso</strong> da índia, aoafirmar que ela considera preconceituosa a legislação, dá um caráterde provisoriedade ao seu argumento, não dando o devido valor eênfase à sua declaração. Aqui, novamente a posição do <strong>índio</strong> no<strong>discurso</strong> é de fonte passiva, dentro do <strong>discurso</strong> prevalente, que é o dogoverno, domi<strong>na</strong>nte.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 6)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE OFICIAL(GOVERNO)DISCURSO DO PODERA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:PARTICIPAR, GARANTIR, MERECER,MOSTRARNOMINALIZAÇÕES:O RECONHECIMENTO DE QUE ARACISMO/MINORIATIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:CONSIDERAR157


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOESCRAVIDÃO DE NEGROS E ÍNDIOSE A MARGINALIZAÇÃO...TIPO DE FONTEFONTE ATIVATIPO DE FONTEFONTE PASSIVA7. Índios disputam santuário de Cimbres (DP, 18.09.2001) –reportag<strong>em</strong>O texto, capa do caderno Vida Urba<strong>na</strong>, reproduz <strong>na</strong> primeira linha osenso comum <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> verbalizado pelo jor<strong>na</strong>l: "muito mais quesimplesmente uma briga de <strong>índio</strong>s...", ou seja, fala de uma disputaentre m<strong>em</strong>bros da comunidade Xucuru como uma briga de <strong>índio</strong>s, algoque seria de menor valia, reforçando o senso comum de que os <strong>índio</strong>ssão selvagens, guerreiros, <strong>em</strong> virtude de sua "maldade <strong>na</strong>tural". Maisadiante, afirma: "a disputa...envolve interesses pela exploração de umsantuário religioso. Em bom português, significa uma espécie deturismo que movimenta milhões de reais todos os anos no maior Paíscatólico do mundo...". Ao se referir aos interesses pela exploração dosantuário, é como se definisse algo que não seria lícito por partir de<strong>índio</strong>s, de qu<strong>em</strong> não se espera um sentido capitalista de administraçãode recursos. Quando prossegue afirmando <strong>em</strong> bom português, utiliza aironia ao definir uma espécie de turismo que movimenta milhões dereais... Para o autor do texto, o <strong>índio</strong>, mesmo depois do processo deetnogênese, deve ficar s<strong>em</strong>pre pobre e protegido pelo poder estatal.Ao <strong>índio</strong>, riqueza e poder seriam privilégios ilegítimos, pelo conceitodomi<strong>na</strong>nte. Ou seja, se é indíge<strong>na</strong>, não pode ingressar no mercadocapitalista e se ingressa é porque deixou de ser <strong>índio</strong>, não sendoquestio<strong>na</strong>do o fato da Igreja poder exercer o papel de exploraçãoturística da área. A disputa econômica é apontada <strong>na</strong> reportag<strong>em</strong>como a razão da divisão entre os Xucurus de Ororubá e os Xucurus deCimbres e a invasão pelos primeiros da região de Cimbres: "aconteceque os 300 hectares da Aldeia Guarda foram comprados por umainstituição religiosa...." Mais adiante, o cacique Marcos Luidson sepronuncia: "como a Igreja pode comprar um terreno que fica dentro da158


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOreserva indíge<strong>na</strong>?", questio<strong>na</strong> o cacique.... Ele mesmo responde: "éilegal". Aqui, os verbos questio<strong>na</strong>r e responder indicam o caráterconflituoso do <strong>discurso</strong>, além de r<strong>em</strong>eter a responsabilidade do<strong>discurso</strong> <strong>sobre</strong> a ilegalidade ao líder indíge<strong>na</strong>, ao citar sua opiniãoentre aspas. Quando o frei responsável pela compra das terras fala,seu <strong>discurso</strong>, entre aspas, é seguido dos verbos garantir e defender,dando a ele um caráter de força argumentativa, ou seja, característicodo <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte. Já o cacique t<strong>em</strong> seu <strong>discurso</strong> introduzido peloverbo dizer, adiantar, reclamar, o que retira a força de seusargumentos, caracterizando-o como um <strong>discurso</strong> submisso, popular.Numa retranca adiante, é relatada a fé dos <strong>índio</strong>s <strong>em</strong> Nossa Senhoradas Montanhas, mas ressalta-se o a afirmação deles <strong>em</strong> respeitarNossa Senhora das Graças, cujo santuário fica <strong>na</strong>s terras dos Xucuruse é administrado pela Igreja Católica (aqui, mais uma vez, o reforço ao<strong>discurso</strong> de poder, no caso, o da Igreja: "o cacique...faz questão dedizer que não pretende fechar o santuário de Nossa Senhora dasGraças à visitação pública..."). Para solucio<strong>na</strong>r o conflito,representantes do Ministério da Justiça e da Comissão de DireitosHumanos são esperados <strong>na</strong> comunidade. Novamente entre aspas, olíder indíge<strong>na</strong> afirma que a violência <strong>na</strong> região é gerada pela presençados brancos posseiros, mas os verbos retiram a força de suaargumentação: acreditar, dizer. Aqui, a marca da heterogeneidadediscursiva é de fácil percepção e o <strong>discurso</strong> ao qual o sujeito-autor dotexto se filia, o de poder, também está marcado no início dareportag<strong>em</strong> e pelo uso da ironia.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 7)TEMAVIOLÊNCIA DO ÍNDIOTIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSOA VOZ DO JORNALDISCURSO DOMINANTE(AUTOR)A VOZ DA AUTORIDADERELIGIOSADISCURSO DOMINANTE(RETÓRICA DAOPRESSÃO)159A VOZ DO ÍNDIODISCURSOPOLÊMICO/POPULAR(DISSIDENTE E NÃODISSIDENTE)


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:ENVOLVER(INTERESSE),ACONTECER,SIGNIFICARUSO DEMETÁFORA/IRONIA:MUITO MAIS QUESIMPLESMENTE UMABRIGA DE ÍNDIOS...EM BOM PORTUGUÊS,SIGNIFICA UMAESPÉCIE DE TURISMOQUE MOVIMENTAMILHÕES DE REAIS...A AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:GARANTIR, DEFENDER,CONFIRMARUSO DE ASPAS:“ESTOU TRABALHANDOA SERVIÇO DE UMPLANO DE DEUS...”,GARANTE“O PROJETO ERA CRIARUMA INFRA-ESTRUTURAMÍNIMA...OS PRÓPRIOSÍNDIOS SERIAMBENEFICIADOS...”,DEFENDEA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:QUESTIONAR,RESPONDER, PEDIR,RECLAMAR,ACREDITAR, DIZER,ADIANTAR, INFORMARCONSTRUÇÃOADVERBIAL:PARA O VICE-CACIQUEDA NAÇÃO XUCURU, ZÉDE SANTA, AVERDADEIRAPROTETORA DAQUELASTERRAS...TIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE PASSIVA8. A questão indíge<strong>na</strong> <strong>em</strong> Pesqueira (JC, 18.09.2001) – notacomentadaA nota mostra claramente o <strong>discurso</strong> do jor<strong>na</strong>lista diante da questãodo projeto turístico <strong>em</strong> Pesqueira, mesmo corroborando sua posiçãocom a opinião balizada de um pesquisador indigenista. O colunista dojor<strong>na</strong>l afirma, s<strong>em</strong> creditar a <strong>na</strong>rração a uma fonte – ou seja,assumindo o <strong>discurso</strong> como seu – que há “muitos interesses” por trásda falta de delimitação das terras dos xucurus e da construção dosantuário no território indíge<strong>na</strong>. É interessante que, pela primeira vez,um estudioso é ouvido <strong>sobre</strong> a questão dos <strong>índio</strong>s <strong>em</strong> Pesqueira. O160


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOpesquisador da história xucuru Edson Silva fala da impunidade doscrimes e afirma que, somente agora que o projeto turístico da regiãoparece estar ameaçado, é que órgãos públicos aparec<strong>em</strong> dizendodefender os <strong>índio</strong>s. É um <strong>discurso</strong> de poder oposicionista, polêmico.Entretanto, aparece numa nota, num perfil discursivo que não serepete <strong>em</strong> outros textos a<strong>na</strong>lisados.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 8)TEMAVIOLÊNCIA DO ÍNDIOTIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSOA VOZ DO JORNALDISCURSO DEOPOSIÇÃO/ POLÊMICO(AUTOR)A AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:ESTAR, COMEÇARA VOZ DA AUTORIDADEDE OPOSIÇÃODISCURSO POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:PERGUNTARA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃODO DISCURSOUSO DE ASPAS:“AGORA, VÁRIOSÓRGÃOS PÚBLICOS EPERSONALIDADESAPARECEM DIZENDODEFENDER OSÍNDIOS...”, PERGUNTATIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE PASSIVA9. Entidades manifestam apoio aos Xucuru (DP, 19.09.2001) –reportag<strong>em</strong>Mostra o apoio recebido pelos <strong>índio</strong>s contra a iniciativa de construçãode santuário <strong>na</strong> área indíge<strong>na</strong>. Foi preciso um reforço do <strong>discurso</strong> dopoder – Ministério Público Federal, OAB etc - mesmo que de oposiçãoao da Igreja, para que o <strong>discurso</strong> submisso dos <strong>índio</strong>s ganhasse força.Há, aliás, um <strong>discurso</strong> de confronto dentro da própria Igreja, entre161


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOCimi e Diocese de Pesqueira, que é mostrado <strong>na</strong> matéria. Um delegadoé desig<strong>na</strong>do pela PF para investigar os crimes <strong>na</strong> região. Entretanto,numa retranca, o título "Fu<strong>na</strong>i nega formação de nova tribo" mostraclaramente a falta de autonomia dos <strong>índio</strong>s <strong>em</strong> realizar movimentações<strong>na</strong>turais, que dev<strong>em</strong> ser melhor a<strong>na</strong>lisadas e respeitadas pelo poderpúblico. No texto, vê-se a submissão expressa da seguinte forma: "adeclaração é um duro golpe <strong>na</strong>s intenções de m<strong>em</strong>bros das aldeias deCimbres, Cajueiro e Guarda, que haviam decretado a autonomia..."Qu<strong>em</strong> t<strong>em</strong> poder para fazer a declaração é a Fu<strong>na</strong>i, reforçando o<strong>discurso</strong> oficial e retirando dos <strong>índio</strong>s o direito de se agrupar ereagrupar, afirmando que é preciso um laudo antropológico para sereconhecer uma comunidade indíge<strong>na</strong>. A negativa ao direito d<strong>em</strong>ovimentação da comunidade é um cerceamento que não é a<strong>na</strong>lisado<strong>na</strong> matéria, mais uma vez silenciando o <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong>(especificamente, dos Xucurus).QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 9)TEMATIPO DEDISCURSOA VOZ DAAUTORIDADEPARA-OFICIAL(MINISTÉRIOPÚBLICOFEDERAL,DEPUTADOS, OAB,MINISTÉRIO DAJUSTIÇA...)DISCURSO DOPODERA AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:MANIFESTAR,EMBARGAR,DIZERTIPO DEDISCURSOA VOZ DAAUTORIDADEPARA-OFICIAL(FUNAI)DISCURSO DOPODER (RETÓRICADA OPRESSÃO)A AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:NEGAR,EXPLICAR, DIZER.ALGUMASAUSÊNCIAS DEVERBOSINTRODUTORES162TIPO DEDISCURSOA VOZ DAAUTORIDADEPARA-OFICIAL(IGREJA E CIMI)DISCURSO DOPODER/POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:PATROCINAR,CONDENAR,DIZER. ALGUMASAUSÊNCIAS DEVERBOSINTRODUTORESVIOLÊNCIA DOÍNDIOTIPO DEDISCURSOA VOZ DO ÍNDIO(DISSIDENTE ENÃO DISSIDENTE)DISCURSOPOLÊMICO/POPULAR(RETÓRICA DOOPRIMIDO)A AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:ACUSAR, DIZER,ALFINETAR.ALGUMASAUSÊNCIAS DEVERBOSINTRODUTORES


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOUSO DE ASPAS:“DISCUTIMOS OSANTUÁRIO E DASAÍDA DOSPOSSEIROS...”,DISSEDE OPINIÃO DE OPINIÃO DE OPINIÃONOMINALIZAÇÕES"A DECLARAÇÃO ÉUM DURO GOLPENAS INTENÇÕESDE MEMBROS DASALDEIAS DECIMBRES,CAJUEIRO EGUARDA, QUEHAVIAMDECRETADO AAUTONOMIA..."NOMINALIZAÇÕES“A AÇÃO SECONTRAPÕE ÀINTENÇÃO DADIOCESE DEPESQUEIRA...”TIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE PASSIVA10. Bispo é jurado de morte no Agreste (DP, 27.09.2001) –reportag<strong>em</strong>O bispo de Pesqueira afirma estar sendo ameaçado de morte e os<strong>índio</strong>s Xucurus são citados pelo delegado do município como possíveisculpados. Novamente, a t<strong>em</strong>ática da violência e o envolvimento dos<strong>índio</strong>s, s<strong>em</strong> que a eles seja dado voz. Ao contrário, o <strong>discurso</strong> oficial daIgreja é reforçado <strong>na</strong> reportag<strong>em</strong>: "dom Ber<strong>na</strong>rdino esclareceu quenão há qualquer intenção da Diocese <strong>em</strong> construir megassantuário noSítio Guarda e que todas as terras localizadas <strong>na</strong> área estão àdisposição das lideranças indíge<strong>na</strong>s". Novamente, o senso comum<strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> é marcado, com a violência que é atribuída a eles s<strong>em</strong>qualquer questio<strong>na</strong>mento ou espaço para seu <strong>discurso</strong>. Assim,novamente ocupa espaço de fonte passiva, <strong>em</strong> contraponto ao bispo,que têm papel de fonte ativa no <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 10)TEMAVIOLÊNCIA DO ÍNDIO163


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE PARA-OFICIAL (IJGREJA)DISCURSO DO PODER (RETÓRICADA OPRESSÃO)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:ESCLARECER, SOLICITAR, DIZERTIPO DE FONTEFONTE ATIVATIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULAR (RETÓRICA DOOPRIMIDO)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DODISCURSO (SLENCIAMENTO DOSUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA11. PF desig<strong>na</strong> delegado para investigar ameaças a bispo (JC,29.09.2001) – reportag<strong>em</strong>A matéria mostra a ação rápida da Polícia Federal <strong>em</strong> desig<strong>na</strong>r umdelegado para investigar as ameaças contra o religioso, o que nãoocorreu com relação aos crimes contra os indíge<strong>na</strong>s E que não édestacado <strong>na</strong> reportag<strong>em</strong>: "a Polícia Federal designou o delegadoMarcos Coimbra para acompanhar as investigações das ameaças d<strong>em</strong>orte ao bispo...A informação foi dada ont<strong>em</strong> pelo secretário deDefesa Social, Gustavo Lima, durante reunião com o religioso...".Como m<strong>em</strong>bro do clero, ou seja, integrante do poder, o bispo teveresposta imediata às suas denúncias de estar sendo ameaçado. Omesmo não houve com os <strong>índio</strong>s, inclusive com o líder Marcos Luidson(que <strong>em</strong> outras reportagens também afirmou ser vítima de ameaças),mas isso não é abordado no texto jor<strong>na</strong>lístico, mais uma vezreforçando a condição de submissão do <strong>discurso</strong> das comunidadesindíge<strong>na</strong>s. O próprio secretário assume esta postura, <strong>na</strong> medida que sereúne com o bispo para tratar da questão e a força da argumentaçãodo <strong>discurso</strong> oficial aparece <strong>na</strong> nomi<strong>na</strong>lização presente <strong>na</strong> matéria (...ainformação foi dada ont<strong>em</strong> pelo secretário...). O secretário deixou asPolícias Civil, Militar e Federal à disposição do bispo para garantirsegurança. Novamente, uma postura vinculada à condição de poder doreligioso, pois não houve iniciativa s<strong>em</strong>elhante quando a ameaça foi164


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOfeita ao <strong>índio</strong>, o que não é observado pelo jor<strong>na</strong>lista. Mesmo falandodo projeto do megassantuário e apresentando a posição contrária doConselho Indigenista Missionário (Cimi) porque atingiria a cultura dos<strong>índio</strong>s, somente o bispo t<strong>em</strong> direito a voz: "eu, pessoalmente, nãoacho isso". A condição de líder religioso dá a ele o aval de afirmar queo projeto não agride a cultura indíge<strong>na</strong>. Não há verbalização do<strong>discurso</strong> dos <strong>índio</strong>s.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 11)TEMAVIOLÊNCIA DO ÍNDIOTIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSOA VOZ DOGOVERNO/AUTORIDADEOFICIAL (GOVERNO,POLÍCIA FEDERAL)DISCURSO DO PODERA VOZ DA AUTORIDADEPARA-OFICIAL (IGREJA)DISCURSO DO PODER(RETÓRICA DAOPRESSÃO)A VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULAR(RETÓRICA DOOPRIMIDO)A AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:DESIGNAR, GARANTIR,DIZERNOMINALIZAÇÕES:A INFORMAÇÃO FOIDADA ONTEM PELOSECRETÁRIO DEDEFESA SOCIAL...A AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:COMENTAR, DIZER,INFORMAR,ACRESCENTARUSO DE ASPAS:“O CIMI VÊ OSANTUÁRIO COMO UMAAGRESSÃO À CULTURAINDÍGENA. EU,PESSOALMENTE, NÃOACHO ISSO”, DISSEA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃODO DISCURSO(SILENCIAMENTO DOSUJEITO)USO DE ADVÉRBIOS:O SECRETÁRIO DEIXOUAS POLÍCIAS CIVIL,MILITAR E FEDERAL ÀDISPOSIÇÃO DOBISPO...TIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE PASSIVA165


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO12. Trukás derrubam torre de alta tensão (JC, 21.11.2001) –reportag<strong>em</strong>Aqui, o t<strong>em</strong>a referido é <strong>sobre</strong> os conflitos gerados entre <strong>índio</strong>s ebrancos. É dada voz aos indíge<strong>na</strong>s, que derrubaram uma torre de altatensão <strong>em</strong> Cabrobó, mas eles não justificam a ação e a matéria nãoconsegue mostrar isso. Fica claro que a atitude foi <strong>em</strong> protesto àprisão do <strong>índio</strong> Adenilson dos Santos Vieira, mas fica uma lacu<strong>na</strong> <strong>na</strong>informação: pela reportag<strong>em</strong>, o indíge<strong>na</strong> cometeu um crime e não v<strong>em</strong>pagando pensão alimentícia. No <strong>discurso</strong> dos <strong>índio</strong>s, porém, eles falam<strong>em</strong> “discrimi<strong>na</strong>ção” e <strong>em</strong> “conceitos” como se estivesse havendo algumdesrespeito à cultura indíge<strong>na</strong>, não mostrando ligação clara entre aprisão e o protesto e se a prisão foi legal ou não, já que eles se diz<strong>em</strong>discrimi<strong>na</strong>dos. Houve discrimi<strong>na</strong>ção quando foi decretada a prisão?Essa dúvida não é respondida pelo texto. Novamente, a dificuldade dojor<strong>na</strong>lista de apurar melhor e tecer mais detalhes <strong>sobre</strong> o fatoenvolvendo os indíge<strong>na</strong>s. Mesmo dando voz aos <strong>índio</strong>s, marcando aheterogeneidade discursiva, o jor<strong>na</strong>lista, ao deixar o texto com estalacu<strong>na</strong> – de modo intencio<strong>na</strong>l ou não – leva o leitor a discordar doprotesto dos <strong>índio</strong>s e a considerar a atitude vandalista, uma vez quenão fica clara a razão da manifestação e se a prisão é fundamentadaou não. O verbo introdutor de opinião usado no <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong>,argumentar, é indicador de um momento argumentativo dentro do<strong>discurso</strong>, o que <strong>em</strong> tese daria força à voz da comunidade, mas estevalor se perde pela falta de fundamento aprofundado entre as idéiasexpressas (“discrimi<strong>na</strong>ção”) e o episódio prisão. Assim, mesmorevestido inicialmente de características de <strong>discurso</strong> polêmico, a formade apresentação da reportag<strong>em</strong> retira a força do <strong>discurso</strong>, colocando-o<strong>na</strong> condição de <strong>discurso</strong> submisso, popular.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 12)TEMAPROTESTO/CONFLITO166


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADEOFICIAL (MINISTÉRIOPÚBLICO)DISCURSO DO PODERA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:ALERTAR, AUTORIZAR,PRENDERDISCURSO INDIRETO:O PROMOTOR DECABROBÓ,EPAMINONDASTAVARES, ALERTOUQUE... VAI AUTORIZARA ENTRADA DAPOLÍCIA... PARAPRENDER OSRESPONSÁVEIS...A VOZ DO ÍNDIODISCURSOPOLÊMICO/POPULARA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:DERRUBAR,PROTESTAR,ARGUMENTARUSO DE ASPAS:“A GENTE TEM QUECOMEÇAR A SE IMPORSENÃO ADISCRIMINAÇÃOCONTRA NOSSA GENTEVAI CONTINUAREXISTINDO. PEDIMOSÀS AUTORIDADES QUEANALISEM NOSSOSCONCEITOS, ATÉPORQUE NÃO SOMOSBANDIDOS”,ARGUMENTOUA VOZ DO BRANCO(AGRICULTORES)DISCURSO POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:COMPROMETERCONSTRUÇÃOADVERBIAL:SEGUNDO ELES, AFALTA DE ENERGIA EÁGUA JÁ COMPROMETEAS CULTURAS DEFRUTAS E LEGUMES...TIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE PASSIVA FONTE PASSIVA13. Metáfora do massacre dos <strong>índio</strong>s brasileiros (DP, 14.12.2001)– reportag<strong>em</strong>O caderno cultural do Diario de Per<strong>na</strong>mbuco abre espaço para divulgaruma peça teatral que vai além da idéia folclórica <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong>,mostrando o massacre indíge<strong>na</strong> ocorrido no Brasil com a chegada dosportugueses. Com um <strong>discurso</strong> que d<strong>em</strong>onstra conhecer um pouco dahistória do Brasil s<strong>em</strong> a máscara dos livros didáticos, o jor<strong>na</strong>lista iniciao texto afirmando que “as imagens do <strong>índio</strong> brasileiro idealizado peloRomantismo cederam lugar às notícias de genocídios de tribos, dadizimação dos primeiros habitantes deste País”. O interessante é que,mesmo entrando <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> de arte do jor<strong>na</strong>l – o que caracteriza otexto dentro de uma perspectiva lúdica – a notícia trata167


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOespecificamente da questão da violência, ao falar do extermínio dosindíge<strong>na</strong>s com a chegada dos colonizadores. A reportag<strong>em</strong> tambémtraz uma questão incomum nos textos jor<strong>na</strong>lísticos, que não foi tratada<strong>em</strong> nenhuma outra notícia a<strong>na</strong>lisada: a questão da identidade indíge<strong>na</strong>e da identidade brasileira no contexto de mistura racial pela qualpassou o Brasil. No texto, fala ainda o diretor da peça, o que marca aheterogeneidade do <strong>discurso</strong>, mas há uma convergência entre o<strong>discurso</strong> do jor<strong>na</strong>lista e do diretor teatral. Ape<strong>na</strong>s o <strong>índio</strong> – que é operso<strong>na</strong>g<strong>em</strong> focado <strong>na</strong> peça – não fala <strong>na</strong> matéria. Os verbostrabalhados adquir<strong>em</strong> o peso do <strong>discurso</strong> do seu autor, fortalecendo aintenção do jor<strong>na</strong>lista de tratar de aspectos conflituosos relacio<strong>na</strong>dos àquestão indíge<strong>na</strong>, no caso do jor<strong>na</strong>lista, e de um momentoargumentativo no conjunto do <strong>discurso</strong> expresso, no caso do diretorteatral.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 13)TEMAARTETIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSOA VOZ DO JORNALDISCURSO DEOPOSIÇÃO/POLÊMICO(AUTOR)A AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:CEDER, INVESTIGARDISCURSO INDIRETO:“A COMPANHIA DETEATRO SERAPHIMUTILIZA A METÁFORADO MASSACRE PARAINVESTIGAR SOBRE AQUESTÃO DASIDENTIDADESCOLETIVAS EINDIVIDUAIS, NESSESTEMPOS DEA VOZ DO BRANCODISCURSOLÚDICO/POLÊMICO(DIRETOR TEATRAL)A AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:EXPLICAR, REFORÇAR,REFLETIRA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃODO DISCURSO(SILENCIAMENTO DOSUJEITO)168


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOGLOBALIZAÇÃO”.“A PEÇA BUSCADIALOGAR SOBRESITUAÇÃO DOINDIVÍDUO NO MUNDO,O QUE ISSOSIGNIFICA. É UMAMETÁFORA DE UMÍNDIO QUE NASCE ENÃO CONHECE A SUAORIGEM... É SAUDADEDE UMA INSTÂNCIAQUE NÃO SABEMOS DEFATO SE TIVEMOS UMDIA”, EXPLICA“... CHURCHI ÉEMBLEMÁTICO DODRAMA DE CADACIDADÃO DESTE PAÍSCOLOCADO ANTE AIMPOSSIBILIDADE DEENCONTRAR SUASIDENTIDADESENQUANTOBRASILEIRO”, REFLETETIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE PASSIVA14. Índios não têm ensino médio <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco (JC,20.12.2001) – reportag<strong>em</strong>Contrariamente a uma outra notícia veiculada <strong>na</strong> mesma s<strong>em</strong>a<strong>na</strong>, estamatéria do Jor<strong>na</strong>l do Commercio traz números que comprovam a faltade escolas para os <strong>índio</strong>s. O jor<strong>na</strong>lista, entretanto, não aprofunda aquestão da educação indíge<strong>na</strong>, ape<strong>na</strong>s a<strong>na</strong>lisa os números doMinistério da Educação <strong>em</strong> comparação com os da Secretaria deEducação do Estado e não questio<strong>na</strong> o <strong>discurso</strong> da Secretaria,acabando por assumir a mesma posição discursiva. A representante daSecretaria se justifica pela ausência de ensino médio para os <strong>índio</strong>s enão há qualquer crítica a este fato. Até mesmo para confirmar que asescolas indíge<strong>na</strong>s de Per<strong>na</strong>mbuco estão <strong>em</strong> estado precário, o169


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOjor<strong>na</strong>lista cita o <strong>discurso</strong> da representante da Secretaria. A únicaquestão que é levantada com um certo tom polêmico é com relação aonúmero as comunidades existentes atualmente: enquanto para o MEC,só exist<strong>em</strong> seis etnias <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco, para a Secretaria de Educaçãodo Estado são nove, todas elas inclusive catalogadas nestadissertação. O número é citado, mas <strong>na</strong>da mais é acrescido <strong>sobre</strong> estacontrovérsia, que rebate <strong>sobre</strong> a questão da identidade ereconhecimento dos grupos indíge<strong>na</strong>s ressurgidos. Embora o título dareportag<strong>em</strong> trate de uma probl<strong>em</strong>ática dos <strong>índio</strong>s, o texto fortalece o<strong>discurso</strong> oficial.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 14)TEMAEDUCAÇÃO INDÍGENATIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSO TIPO DE DISCURSOA VOZ DO JORNAL(AUTOR)DISCURSO DO PODERA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:TER, DISPORUSO DE ASPAS:“ LAIR BUARQUEACREDITA QUE SERÁPOSSÍVEL MELHORAR AINFRA-ESTRUTURA DASESCOLAS EXISTENTESA VOZ DO PODEROFICIALDISCURSO DO PODER(MINISTÉRIO ESECRETARIA DEEDUCAÇÃO)A AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:EXPLICAR, ACREDITAR,INVESTIR, EXPANDIRCONSTRUÇÃOADVERBIAL:“CONFORME ADIRETORA EXECUTIVADE EDUCAÇÃO...LAIRBUARQUE, AS ESCOLASINDÍGENAS SÃO DERESPONSABILIDADEDO MUNICÍPIOUSO DE ASPAS:“CABE AOSMUNICÍPIOS OFERECEREDUCAÇÃOFUNDAMENTAL. SÃO ASCIDADES TAMBÉM, DEA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO –VERBOS EMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃODO DISCURSO(SILENCIAMENTO DOSUJEITO)170


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCONO ESTADO, ‘QUEESTÃO MUITOPRECÁRIAS’,INVESTIR...ACORDO COM OCONSELHO NACIONALDE EDUCAÇÃO, QUERESPONDEM PELAEDUCAÇÃO INDÍGENA”,EXPLICATIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE PASSIVA15. CNBB prega respeito aos <strong>índio</strong>s (DP, 09.01.2002) –reportag<strong>em</strong>A campanha da fraternidade é o t<strong>em</strong>ário da reportag<strong>em</strong>. Embora tenteexplorar o t<strong>em</strong>a da campanha, Fraternidade e Povos Indíge<strong>na</strong>s, ojor<strong>na</strong>lista não acrescenta fatos novos, reproduzindo informações jáamplamente divulgadas <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> com relação aos <strong>índio</strong>sper<strong>na</strong>mbucanos: diz existir<strong>em</strong> sete etnias (novamente, a questão daquantidade de comunidades gera dúvidas <strong>sobre</strong> a questão daidentidade dos povos indíge<strong>na</strong>s de Per<strong>na</strong>mbuco) e fala da campanhacomo uma forma de mostrar a “importância do respeito à culturadesses povos”. O interessante, porém, é que, ao citar o <strong>discurso</strong> dovice-presidente do Cimi, Saulo Feitosa, alerta que este é o primeirocompromisso da Igreja Católica com as comunidades indíge<strong>na</strong>s quenão passa pela catequese, assunto que também não é explorado <strong>na</strong>reportag<strong>em</strong>, pois foi exatamente pela tentativa de conversão que ospovos indíge<strong>na</strong>s sofreram a escravidão e o extermínio desde a chegadados colonizadores portugueses. Este assunto poderia ter sidoexplorado pelo repórter <strong>em</strong> virtude da mudança de posicio<strong>na</strong>mento daIgreja <strong>em</strong> relação aos <strong>índio</strong>s. Assim, o <strong>discurso</strong> predomi<strong>na</strong>nte é o dopoder (Igreja), que fala pelo <strong>índio</strong>, novamente apagando o <strong>discurso</strong>indíge<strong>na</strong>, silenciado no texto jor<strong>na</strong>lístico.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 15)TEMACAMPANHA DA FRATERNIDADE171


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTIPO DE DISCURSOA VOZ DA AUTORIDADE OFICIAL(IGREJA)DISCURSO DO PODERA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:EXPLICAR, EXPOR, ACREDITAR,ADIANTAR, RESSALTAR, ENFATIZARUSO DE ASPAS:“NAS CIDADES ONDE HÁ APRESENÇA DE POPULAÇÃOINDÍGENA SERÁ FEITO UMTRABALHO DIFERENCIADO, PARAOBJETIVAR NÃO SÓ A REFLEXÃO DASOCIEDADE SOBRE A REALIDADEINDÍGENA, MAS TAMBÉM ACONSCIENTIZAÇÃO DOS ÍNDIOSSOBRE OS PRÓPRIOS DIREITOS”,EXPÕETIPO DE FONTEFONTE ATIVATIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DODISCURSO (SILENCIAMENTO DOSUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA16. s<strong>em</strong> título (JC, 16.01.2002) – foto-legendaA foto-legenda t<strong>em</strong> como t<strong>em</strong>a arte, falando do car<strong>na</strong>val no Brasil e davinda da modelo Naomi Campbell para desfilar <strong>na</strong> escola de sambaPortela. É interessante o fato da notícia tratar da participação daamerica<strong>na</strong> como índia no car<strong>na</strong>val. Ela é negra de olhos claros, fugindodo perfil dos indíge<strong>na</strong>s brasileiros. O <strong>discurso</strong>, aqui, reproduz ape<strong>na</strong>s adivulgação que está sendo feita pela escola de samba, ou seja, aimprensa homogeneiza seu <strong>discurso</strong> com o <strong>discurso</strong> da fonte, nãohavendo marcas de heterogeneidade, mas por se tratar de um t<strong>em</strong>aconsiderado leve para a imprensa, circula entre o <strong>discurso</strong> lúdico e ode poder.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 16)172


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA INSTITUIÇÃO PARA-OFICIALDISCURSO LÚDICO/ DO PODER(ESCOLA DE SAMBA)A AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:SAIR, EXIGIRTIPO DE FONTEFONTE ATIVAARTETIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DODISCURSO (SILENCIAMENTO DOSUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA17. Pajés se armam para proteger sua ciência (JC, 20.01.2002) –reportag<strong>em</strong>A t<strong>em</strong>ática desta notícia é a ciência indíge<strong>na</strong>, explorada uma única vez<strong>em</strong> todo o período pesquisado, apesar do conhecimento científico dos<strong>índio</strong>s vir sendo vítima da biopirataria realizada pelos paísesestrangeiros que tentam copiar as práticas indíge<strong>na</strong>s para as grandesindústrias farmacêuticas. O assunto é b<strong>em</strong> a<strong>na</strong>lisado no texto, masnão recebe continuidade <strong>na</strong>s edições seguintes do jor<strong>na</strong>l. Além disso,mesmo assumindo um <strong>discurso</strong> polêmico <strong>sobre</strong> a questão, ao relatar o<strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong>, os verbos introdutores de opinião são oscaracterísticos do <strong>discurso</strong> popular: dizer, afirmar, contar. Em algunstrechos, o <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong> não v<strong>em</strong> acompanhado de verbointrodutor de opinião. Outros verbos parec<strong>em</strong> fortalecer o <strong>discurso</strong> dos<strong>índio</strong>s, como frisar, mas ele é justamente usado para relatar o <strong>discurso</strong>do <strong>índio</strong> Marcos Tere<strong>na</strong>, que já ocupou um cargo eletivo <strong>na</strong> Câmarados Deputados, ou seja, conta <strong>em</strong> seu favor o poder da posição socialque ocupa como político. É interessante ainda que, <strong>na</strong> segundaretranca da matéria, é relatado o caso de um cacique e um pajépankararus que foram home<strong>na</strong>geados pela Universidade Federal dePer<strong>na</strong>mbuco. Ao falar de ambos, o jor<strong>na</strong>lista fala <strong>em</strong> “t<strong>em</strong>po médio de173


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOcarreira”, ou seja, deixa ao leitor a interpretação do fato de, sendo<strong>índio</strong>s, não poder<strong>em</strong> possuir uma carreira. No caso deles, oconhecimento da sua própria ciência <strong>em</strong> relação à manipulação da<strong>na</strong>tureza não é uma carreira no sentido que o jor<strong>na</strong>lista pré-determi<strong>na</strong>.A reportag<strong>em</strong>, porém, assume um tom polêmico quando questio<strong>na</strong> aformação do conselho responsável pela gestão do patrimônio genéticodo País, que não inclui a participação dos <strong>índio</strong>s, apesar dos seusconhecimentos tradicio<strong>na</strong>is.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 17)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA INSTITUIÇÃO PARA-OFICIAL (PROFESSORESUNIVERSITÁRIOS/PESQUISADORES)DISCURSO POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:DIZER, RECONHECER, AFIRMAR,DESTACAR, ESTUDARTIPO DE FONTEFONTE ATIVACIÊNCIA INDÍGENATIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULAR/POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:DIZER, CONTAR, AFIRMARTIPO DE FONTEFONTE PASSIVA18. s<strong>em</strong> título (DP, 15.02.2002) – carta à redaçãoA carta à redação fala do lançamento da campanha da fraternidade. Naverdade, foi pinçada uma frase do leitor, que foi reproduzidajuntamente com o desenho do rosto de um <strong>índio</strong>. A frase destaca quea campanha foi “muito oportu<strong>na</strong>”, não ressaltando qualquer outraanálise possivelmente feita pelo leitor <strong>sobre</strong> o fato. Por sercaracteristicamente um texto de cunho não jor<strong>na</strong>lístico, não t<strong>em</strong> comoprincípio apresentar as fontes do texto relatado, não podendo, nestecaso, falar-se <strong>em</strong> silenciamento do sujeito.174


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOQUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 18)TEMACAMPANHA DA FRATERNIDADETIPO DE DISCURSOA VOZ DO BRANCO (LEITOR)DISCURSO DO PODERTIPO DE FONTEFONTE ATIVA19. Por uma terra s<strong>em</strong> males ( DP, 03.03.2002) - artigoO artigo, escrito pelo economista e pesquisador social da FundaçãoJoaquim Nabuco (Fundaj), Clóvis Cavalcanti, traz algumas questõespolêmicas <strong>sobre</strong> a relação do indíge<strong>na</strong> com a <strong>na</strong>tureza. Algunscientistas começam a colocar dúvidas <strong>sobre</strong> esta convivência,defendendo que os <strong>índio</strong>s não viv<strong>em</strong> uma relação sustentável com omeio ambiente. Discordando desta tese recente, o pesquisador entrano t<strong>em</strong>a da campanha da fraternidade, que considera uma “atitudeque já v<strong>em</strong> um pouco tarde, haja vista que a própria instituiçãoeclesial agiu muitas vezes como se os <strong>índio</strong>s foss<strong>em</strong> seres inferiores echegou mesmo a considerar que eles não tinham alma”. É o únicotexto durante o período de divulgação da campanha – abarcado <strong>em</strong>nossa pesquisa – <strong>em</strong> que é salientado o papel domi<strong>na</strong>nte da IgrejaCatólica como catequizador e at<strong>em</strong>orizador dos <strong>índio</strong>s contra seuspróprios costumes e práticas religiosas e de cura ao longo da históriado Brasil. Curiosamente, não foi escrito por um jor<strong>na</strong>lista. Parareferendar o conhecimento e a capacidade indíge<strong>na</strong> de conviver com a<strong>na</strong>tureza, o autor do artigo cita vários etnólogos que evidenciam asabedoria dos <strong>índio</strong>s. Cavalcanti acusa os brancos de usurpação doterritório indíge<strong>na</strong>, especialmente pela Igreja Católica. Tratando ot<strong>em</strong>a da campanha da fraternidade com um <strong>discurso</strong> polêmico, oeconomista coloca a Igreja numa outra posição social, que não éassumida por ela: a da busca da redenção a partir do movimento que175


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOinstituiu para defender e cooperar com as comunidades indíge<strong>na</strong>s. Éum <strong>discurso</strong> de autoridade para-oficial, polêmico, no qual aheterogeneidade é marcada para reforçar o próprio <strong>discurso</strong> dopesquisador social. Os verbos usados são indicadores de uma posiçãooficial, afirmativa, de seu <strong>discurso</strong> (querer falar, declarar, expressar).O silenciamento dos <strong>índio</strong>s, neste caso, é <strong>na</strong>tural, por se tratar de umartigo, que t<strong>em</strong> como característica ser um texto tipicamente autoral.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 19)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA INSTITUIÇÃO PARA-OFICIAL (PESQUISADOR SÓCIA DAFUNDAJ)DISCURSO DO PODER/POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:FALAR, DECLARAR, QUERER FALAR,RELER, EXPRESSAR, SER, MERECERNOMINALIZAÇÕES:“A ESCOLHA, NESTE MOMENTO,DOS NATIVOS BRASILEIROS – OSVERDADEIROS DONOS DE NOSSATERRA, DE NOSSOS RECURSOSNATURAIS, QUE A ELES USURPAMOSPERFIDAMENTE – COMO FOCO DACAMPANHA DA FRATERNIDADESERVE DE MOMENTO DEREFLEXÃO...”TIPO DE FONTEFONTE ATIVACAMPANHA DA FRATERNIDADETIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DODISCURSO (SILENCIAMENTO DOSUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA20. Cacique terá cela exclusiva (DP, 07.03.2002) – reportag<strong>em</strong>Aqui, t<strong>em</strong>os um caso conhecido <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lmente de violência praticadapor um <strong>índio</strong>. Mesmo conde<strong>na</strong>do a seis de prisão por estupro (crimepraticado <strong>em</strong> junho de 1992 contra a estudante Sílvia Letícia), o176


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOcacique Paulinho Paiakan ainda não cumpre pe<strong>na</strong>. O texto jor<strong>na</strong>lístico,porém, não traz informações que implicam no caso: como uma daspartes envolvidas no caso, a vítima, t<strong>em</strong> lugar de privilégio por sernão-índia, o que acionou desde as primeiras reportagens <strong>sobre</strong> o casorepresentações <strong>sobre</strong> os indíge<strong>na</strong>s ligadas ao senso comum -primitivismo, canibalismo – e colocou a conquista de riqueza e poderpelos <strong>índio</strong>s como algo ilegítimo, <strong>na</strong> perspectiva do conceitodomi<strong>na</strong>nte. Nesta matéria, especificamente, <strong>em</strong>bora não haja relatoexplícito de <strong>discurso</strong>s que r<strong>em</strong>ont<strong>em</strong> a estas significações, é mostradotodo o aparato e cuidado do poder constituído para recebê-lo comopreso. Entretanto, salienta que “Paiakan já avisou: não se entrega”.Também o líder indíge<strong>na</strong> ouvido <strong>na</strong> reportag<strong>em</strong> afirma que não irápermitir a retirada do cacique da aldeia Aukre, somente se ocorrer pelaforça. Fica, assim, sustentado o senso comum do primitivismo que nãoconhece leis, do <strong>índio</strong> guerreiro que luta pela conquista do poder. Ojor<strong>na</strong>lista não investiga o porque da transgressão da lei: eles não aentend<strong>em</strong> dentro de seu universo cultural? Ou, mesmo entendendo aextensão do ato praticado por Paulinho Paiakan, ainda assim nãoquer<strong>em</strong> a sua prisão?É dada voz ao cacique da aldeia onde Paiakan está vivendo, mas nãoforam usados verbos introdutores de opinião, uma característica dorelato do <strong>discurso</strong> popular. Já o <strong>discurso</strong> do poder domi<strong>na</strong>nte, exercidopela Superintendência do Sist<strong>em</strong>a Pe<strong>na</strong>l do Pará, pela Justiça Federal epela Polícia Federal, alinha-se no sentido de estar<strong>em</strong> dando condiçõesfavoráveis para que Paiakan se entregue.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 20)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA INSTITUIÇÃO PARA-OFICIAL (SUPERINTENDÊNCIA DOSISTEMA PENAL, JUSTIÇA FEDERAL,POLÍCIA FEDERAL)DISCURSO DO PODERVIOLÊNCIA DO ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULAR/POLÊMICO177


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:PREPARAR, RECEBER, CHEGAR, TER,ORDENAR, DEPENDERTIPO DE FONTEFONTE ATIVAA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:AVISAR, SE ENTREGAR, SERUSO DE ASPAS:“EU JÁ DISSE, VOU REPETIR E VOCÊPODE ESCREVE AÍ... PAIAKAN NÃOSERÁ PRESO POR NINGUÉM DAPOLÍCIA. E QUEM TENTAR ENTRARARMADO...TERÁ DE ENFRENTARNOSSO POVO NUMA GUERRA”TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA21. Índio fulni-ô fere servidor da Fu<strong>na</strong>i (DP, 06.04.2002) –reportag<strong>em</strong>O t<strong>em</strong>a violência do <strong>índio</strong> é retomado, mas esta reportag<strong>em</strong> trazclaramente a linearidade com o <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte. É relatada umasituação <strong>em</strong> que um <strong>índio</strong> agrediu um funcionário da Fu<strong>na</strong>i e depoisfugiu. Um outro <strong>índio</strong> afirma que o agressor “perdeu a paciênciaporque estava desde segunda-feira no Recife para tentar conversarcom o superintendente...”. A alegação da Polícia Federal para manteras investigações e levar o <strong>índio</strong> a julgamento pela legislação dosbrancos é de que ele já está “integrado à civilização há muito t<strong>em</strong>po esofrido um processo de aculturação, o acusado deverá responder aocrime como um civil comum”. Mais adiante, o jor<strong>na</strong>lista assume o<strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte como seu, reproduzindo a expressãor<strong>em</strong>anescentes para se referir ao <strong>índio</strong>s. O <strong>discurso</strong> do indíge<strong>na</strong> ouvidonesta matéria é enfraquecido pelo verbo introdutor de opinião contar,acreditar. Já no caso do superintendente da Polícia Federal, o verbointrodutor de opinião é comentar, que assume o papel de reforçar oargumento discursivo. O <strong>índio</strong> não é silenciado, mas seu <strong>discurso</strong> ficafragilizado pelos verbos usados e pela forma de apresentação do fato.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 21)178


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOTEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA INSTITUIÇÃO PARA-OFICIAL (FUNAI, POLÍCIA FEDERAL)DISCURSO DO PODERA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:COMENTAR, CONVOCARUSO DE ASPAS:“POR JÁ ESTAR INTEGRADO ÀCIVILIZAÇÃO HÁ MUITO TEMPO...OACUSADO DEVERÁ RESONDER AOCRIME COMO UM CIVIL COMUM...”,COMENTOUTIPO DE FONTEFONTE ATIVAVIOLÊNCIA DO ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULAR/POLÊMICOA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:CONTAR, ACREDITARUSO DE ASPAS:“ELE PERDEU A PACIÊNCIA PORQUEESTAVA DESDE SEGUNDA-FEIRA NORECIFE, PARA TENTAR CONVERSARCOM O SUPERINTENDENTE DAFUNAI...”, CONTATIPO DE FONTEFONTE PASSIVA22. Mandante do assassi<strong>na</strong>to de Chicão t<strong>em</strong> a prisão adiada (DP,09.04.2002) – reportag<strong>em</strong>A reportag<strong>em</strong> – que trata do t<strong>em</strong>a <strong>sobre</strong> a violência contra o <strong>índio</strong> - dizliteralmente que o adiamento da prisão do mandante do assassi<strong>na</strong>todo cacique xucuru ocorreu por se tratar de “um fazendeiro rico einfluente”. O interessante é que esta informação, que deveria abrir amatéria que noticia o adiamento, uma vez que o fato da Polícia Federaladmitir que precisa de provas contundentes <strong>em</strong> virtude do perfil doacusado, mostra claramente sua forma sectária de atuar. Este dado,porém, só aparece no quinto parágrafo da matéria. Em nenhummomento, o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico ganha um tom de crítica <strong>em</strong> relação aesta decisão da PF, ou seja, de certa forma se alia ao <strong>discurso</strong> depoder da instituição para-oficial. Ao falar do adiamento, o jor<strong>na</strong>listaafirma que a revelação do nome do mandante feita pelo executor docrime não é suficiente para a determi<strong>na</strong>ção da prisão. Mesmorelatando os casos de assassi<strong>na</strong>to contra <strong>índio</strong>s, o jor<strong>na</strong>lista não ouviunenhuma liderança indíge<strong>na</strong> para comentar a decisão da polícia. Osverbos usados para relatar o <strong>discurso</strong> da Polícia Federal são reavaliar,179


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOquerer, revelar, determi<strong>na</strong>r. O <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong> é silenciado e,<strong>em</strong>bora haja uma retrospectiva dos casos de homicídio de <strong>índio</strong>s, amatéria foca de modo superficial o fato de nenhum deles ter sidoelucidado pela PF, afirmando que “acredita-se que tenham sidoencomendadas por posseiros inconformados...”. A colocação do verbo<strong>na</strong> condicio<strong>na</strong>l é um recurso que permite omitir o agente da oração,tendo, segundo Fairclough, um aspecto “ideologicamente significativo”(FAIRCLOUGH, 2001: 227), <strong>na</strong> medida <strong>em</strong> que, neste caso, enfraquecea fonte da informação.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 22)TEMATIPO DE DISCURSOA VOZ DA INSTITUIÇÃO PARA-OFICIAL (POLÍCIA FEDERAL)DISCURSO DO PODERA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:REAVALIAR, QUERER, REVELAR,DETERMINARUSO DE ASPAS:“CONTUDO, ISSO NÃO ÉSUFICIENTE PARA PEDIRMOS A UMJUIZ A EXPEDIÇÃO DE UMMANDADO DE PRISÃO. PRECISAMOSDE MAIS PROVAS”, REVELOUTIPO DE FONTEFONTE ATIVAVIOLÊNCIA CONTRA O ÍNDIOTIPO DE DISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSO POPULARA AÇÃO DO TEXTO – VERBOSEMPREGADOS:NÃO HÁ VERBALIZAÇÃO DODISCURSO (SILENCIAMENTO DOSUJEITO)TIPO DE FONTEFONTE PASSIVA23. Índios não têm vez <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco (JC, 14.04.2003) –reportag<strong>em</strong>Esta reportag<strong>em</strong> de uma edição de domingo ocupa três pági<strong>na</strong>s doCaderno de Cidades e, fechando o período escolhido para a pesquisa,faz um levantamento da situação do indíge<strong>na</strong> <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco, tendo180


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOcomo t<strong>em</strong>a a S<strong>em</strong>a<strong>na</strong> do Índio. Como matéria especial (que t<strong>em</strong> maisespaço <strong>na</strong> edição <strong>em</strong> virtude do trabalho de pesquisa da equipejor<strong>na</strong>lística), a reportag<strong>em</strong> fala da falta de apoio à educação indíge<strong>na</strong>,da mistura étnica, da d<strong>em</strong>ora <strong>na</strong> d<strong>em</strong>arcação de terras e da motivaçãoda Igreja Católica através da Campanha da Fraternidade. Na questãoeducacio<strong>na</strong>l, o jor<strong>na</strong>l afirma que o Governo Federal delegou ao Estado,desde 1999, a responsabilidade pela educação dos <strong>índio</strong>s. Entretanto,o Governo Estadual não assumiu o trabalho, mas <strong>na</strong> reportag<strong>em</strong>afirma que o secretário de educação garante que <strong>em</strong> 60 dias o Estadoirá assumir as escolas indíge<strong>na</strong>s. Sobre a questão das terras, o jor<strong>na</strong>lassocia os conflitos à lentidão <strong>na</strong> d<strong>em</strong>arcação e, mesmo criticando ad<strong>em</strong>ora do trabalho da Fu<strong>na</strong>i, a matéria não aprofunda o probl<strong>em</strong>ahistórico do atraso, aceitando a explicação da instituição para o fatode, desde a sua fundação, não ter conseguido cumprir esta tarefa. Umquadro apresenta a relação de nove etnias <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco –novamente, o conflito de números de comunidades indíge<strong>na</strong>sexistentes no Estado. O jor<strong>na</strong>l aportuguesou os nomes dos gruposAtikum, Kambiwá, Kapi<strong>na</strong>wá, Fulni-ô e Truká, um erro que enfraquecea força dessas comunidades, que lutam pela manutenção da grafia deseus nomes conforme a sua orig<strong>em</strong> lingüística. Uma retranca damatéria fala da Campanha da Fraternidade, fazendo um histórico dotrabalho da Igreja neste sentido, mas s<strong>em</strong> falar do papel da instituiçãono domínio e escravidão dos <strong>índio</strong>s. Uma última retranca fala dasatividades culturais da S<strong>em</strong>a<strong>na</strong> do Índio.Na primeira retranca, <strong>sobre</strong> educação indíge<strong>na</strong>, são ouvidos umrepresentante do Cimi e professoras índias. No <strong>discurso</strong> relatado dorepresentante do Cimi, o verbo introdutor de opinião usado éargumentar. Nos <strong>discurso</strong>s relatados das professoras, os verbos sãoafirmar, dizer e desabafar. Além de indicadores do <strong>discurso</strong> popular, oterceiro verbo mostra a <strong>em</strong>ocio<strong>na</strong>lidade circunstancial, mas não dáforça à fonte jor<strong>na</strong>lística, tratando-a como fonte passiva. Na segundaretranca, quando o secretário de Educação se posicio<strong>na</strong> para informar<strong>sobre</strong> o atraso do Governo do Estado para assumir a educaçãoindíge<strong>na</strong>, os verbos usados para introduzir a opinião oficial são181


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOinformar e observar. Além disso, a retranca é aberta com umainformação do secretário de que <strong>em</strong> 60 dias as escolas seriamassumidas pelo Estado, seguida da declaração do jor<strong>na</strong>l: “qu<strong>em</strong>garante é o secretário de Educação de Per<strong>na</strong>mbuco, Francisco deAssis”. Esta forma de apresentação dá força argumentativa ao agenteda informação, ou seja, reforça o <strong>discurso</strong> da fonte jor<strong>na</strong>lística ativa.Na terceira retranca, a Fu<strong>na</strong>i se justifica pelo atraso <strong>na</strong> d<strong>em</strong>arcação deterras e o verbo usado para introduzir a opinião da representante daFu<strong>na</strong>i é explicar. Na apresentação do <strong>discurso</strong> dos <strong>índio</strong>s, os verbossão contar e lamentar, mais uma vez retirando a força argumentativado <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong> e fortalecendo o <strong>discurso</strong> para-oficial da Fu<strong>na</strong>i,mesmo dentro de uma matéria onde há crítica ao atraso dasd<strong>em</strong>arcações das terras. Na quarta retranca, o <strong>discurso</strong> religioso <strong>sobre</strong>a Campanha da Fraternidade é reproduzido pelo jor<strong>na</strong>l s<strong>em</strong> referênciasao papel da Igreja <strong>na</strong> chegada dos colonizadores e o <strong>discurso</strong> érelatado através dos verbos explicar, afirmar e ressaltar, indicadoresde posição oficial e positiva da fonte jor<strong>na</strong>lística, no caso, a Igreja. Aúltima retranca da reportag<strong>em</strong> enumera as atividades culturais comrelação à S<strong>em</strong>a<strong>na</strong> do Índio.QUADRO ANALÍTICO DE INDICADORES DO DISCURSO(MATÉRIA 23)TEMATIPO DEDISCURSOA VOZ DAAUTORIDADEOFICIAL(SECRETARIA DAEDUCAÇÃO DOESTADO)DISCURSO DOPODERA AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:INFORMAR,OBSERVARTIPO DEDISCURSOA VOZ DAAUTORIDADEPARA-OFICIAL(FUNAI)DISCURSO DOPODERA AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:EXPLICARTIPO DEDISCURSOA VOZ DAAUTORIDADEPARA-OFICIAL(IGREJA E CIMI)DISCURSO DOPODERA AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:ARGUMENTAR,EXPLICAR,RESSALTAR,SEMANA DOÍNDIOTIPO DEDISCURSOA VOZ DO ÍNDIODISCURSOPOPULARA AÇÃO DO TEXTO– VERBOSEMPREGADOS:AFIRMAR, DIZER,DESABAFAR,CONTAR,182


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOUSO DE ASPAS:“A COMISSÃOSERÁ FORMADAPORREPRESENTANTESDE VÁRIASDIRETORIAS DASECRETARIA DEEDUCAÇÃO.VAMOS CHAMARTAMBÉM TRÊSREPRESENTANTESDOSPROFESSORESPARA NOSAJUDAR...”,INFORMACONSTRUÇÃOADVERBIAL:“SEGUNDOLEVANTAMENTODA SECRETARIADE EDUCAÇÃO...”USO DE ASPAS:“A DEMANDA ÉMUITO GRANDEPARA AQUANTIDADE DETÉCNICOS QUEDISPOMOS...”,EXPLICAAFIRMARUSO DE ASPAS:“NOSSOOBJETIVO ÉTRAZER O DEBATEÀ PROBLEMÁTICAINDÍGENA.DESMISTIFICAROS CONCEITOSQUE AINDAEXISTEM EMRELAÇÃO AOSÍNDIOS...”,EXPLICA“A CAMPANHA ÉFUNDAMENTALTAMBÉM PARAQUE SE FAÇA UMAAVALIAÇÃO DOMOVIMENTOINDIGENISTA NOBRASIL”,RESSALTALAMENTARHÁ AUSÊNCIASDE VERBOSINTRODUTORESDE OPINIÃOUSO DE ASPAS:“O GOVERNOFEDERAL NÃOINVESTE EMTERRA INDÍGENA.A SOLUÇÃO ÉTRABALHAR COMORGANIZAÇÕESNÃO-GOVERNAMEN-TAIS...”, AFIRMA“FALTA SEMENTEPARA A GENTEPLANTAR. OSÍNDIOS CAÍRAMNOESQUECIMENTO.NA SAÚDE...,LAMENTATIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTE TIPO DE FONTEFONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE ATIVA FONTE PASSIVA183


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOConclusãoA expectativa é de que a leitura deste trabalho venha a trazer um novoreferencial <strong>na</strong> análise do <strong>discurso</strong> midiático. Esta pesquisa partiu doentrecruzamento de conceitos fundadores da Análise do DiscursoFrancesa e dos Estudos do Jor<strong>na</strong>lismo – conexão antes não vista – eque explica o lugar que o sujeito ocupa <strong>na</strong> condição de fontejor<strong>na</strong>lística. A análise dos textos jor<strong>na</strong>lísticos permitiu visualizarel<strong>em</strong>entos indicadores do <strong>discurso</strong> que nos leva a afirmar que osgrupos excluídos – no caso específico desta dissertação, os indíge<strong>na</strong>s –ocupam a posição de fonte passiva do <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico. Toda fontejor<strong>na</strong>lística ocupa uma posição <strong>na</strong> ord<strong>em</strong> da fala: falando deste lugar,não consegue se afastar do segmento ou campo social no qual estáinserido ou circula. O sujeito t<strong>em</strong> seu <strong>discurso</strong> impreg<strong>na</strong>do pelaideologia, seja ele integrante de um grupo social domi<strong>na</strong>nte ouexcluído.A visão de mundo do sujeito é revelada a partir de seu <strong>discurso</strong> e é apartir de sua verbalização que seu enunciado ganha visibilidade. Emtese, qualquer <strong>discurso</strong> cria efeitos de sentido no imaginário social,causa reações e interesses e <strong>agenda</strong> o cotidiano. Os vários segmentossociais usam a linguag<strong>em</strong> para transmitir suas representaçõesideológicas, representações que não são aleatórias n<strong>em</strong> feitas <strong>sobre</strong>qualquer assunto, mas <strong>sobre</strong> t<strong>em</strong>as que estão <strong>na</strong> <strong>agenda</strong> pública.Nesta pesquisa, observamos que a definição desta <strong>agenda</strong> é feita pelossegmentos sociais que têm maior poder social e econômico num dadomomento histórico. Ao contrário do que imaginou inicialmenteHarbermas (1998), o sujeito não se despe de sua condição social paraingressar <strong>na</strong> esfera pública. Ele fala a partir deste lugar – com todoônus ou vantag<strong>em</strong> que possa acarretar ao seu <strong>discurso</strong>. No caso do<strong>índio</strong>, seu lugar de fala é subalterno e, nesta condição, seu <strong>discurso</strong> épopular.184


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCORecontextualizando e descontextualizando a fala de suas fontes, ojor<strong>na</strong>lista tenta dar linearidade e síntese ao seu texto, cumprindo sua“função citativa”. Mesmo heterogêneo, o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico delineia o<strong>discurso</strong> de suas fontes de modo constitutivo, subjacente, ou de modomarcado, indicando claramente quando a fala é do outro. Nosso estudomostra que esta marca pode se dar através de verbos introdutores deopinião, do <strong>discurso</strong> indireto, do uso de aspas e mesmo dosilenciamento da fonte jor<strong>na</strong>lística. Para se distanciar de suas fontes, ojor<strong>na</strong>lista usa predomi<strong>na</strong>nt<strong>em</strong>ente a terceira pessoa verbal, numaestratégia para garantir credibilidade aos fatos <strong>na</strong>rrados, e tambémprocura se distanciar de suas fontes ao citá-las, muitas vezes, d<strong>em</strong>odo marcado dentro da enunciação, mas a escolha de um trecho enão de outro do <strong>discurso</strong> relatado, <strong>em</strong> si, já se constitui numa tomadade posição e acaba por aproximar o jor<strong>na</strong>lista de fontes de autoridade.Nestas escolhas, também há uma seleção a partir da fonte que fala:ativa ou passiva.No caso do indíge<strong>na</strong>, verificamos a freqüente ausência da verbalizaçãodo <strong>discurso</strong>, quando outros segmentos mais fortes política eeconomicamente falam por e <strong>sobre</strong> ele, promovendo o seusilenciamento. Igreja, Governo, Fu<strong>na</strong>i, Ministério Público Federal ePolícia Federal ocupam o lugar de fonte ativa, assum<strong>em</strong> o <strong>discurso</strong> deautoridade e favorec<strong>em</strong> este silêncio, numa forma de se exercercontrole e poder. Quando relata o <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong>, a <strong>mídia</strong> muitasvezes suprime os verbos introdutores de opinião ou usa verbos eelabora nomi<strong>na</strong>lizações e construções adverbiais que levam o <strong>discurso</strong>do <strong>índio</strong> à condição subalter<strong>na</strong>, como <strong>discurso</strong> popular. Na citação do<strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong>, verificamos a predominância dos seguintes verbos:• Dizer, contar, desabafar, lamentar, afirmar, acreditar, avisar,pedir, informar, reclamar, falar.Estes verbos são característicos do <strong>discurso</strong> popular, não possu<strong>em</strong>força argumentativa no <strong>discurso</strong>, o que confere ao <strong>índio</strong> como fonte185


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOjor<strong>na</strong>lística – assim como a outros segmentos sociais excluídos – aposição passiva no <strong>discurso</strong> midiático, reproduzindo, assim, a retóricado oprimido. Já o <strong>discurso</strong> de autoridade, ao ser relatado <strong>na</strong> <strong>mídia</strong>, éintroduzido por outro grupo de verbos:• Advertir, desig<strong>na</strong>r, autorizar, garantir, esclarecer, solicitar,enfatizar, declarar, alertar, desig<strong>na</strong>r.Estes verbos confer<strong>em</strong> ao <strong>discurso</strong> de autoridade força argumentativae reforçam sua posição oficial, representando a retórica da opressão. O<strong>discurso</strong> de poder é citado de modo diverso do <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong>,fortalecido não só pelos verbos introdutores de opinião como tambémpelas nomi<strong>na</strong>lizações e ironias presentes ape<strong>na</strong>s quando qu<strong>em</strong> fala sãoas fontes oficiais ou para-oficiais, que assum<strong>em</strong> claramente a condiçãode fonte ativa do <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico.No <strong>agenda</strong>mento da <strong>mídia</strong>, porém, assuntos excluídos pod<strong>em</strong> entrar<strong>na</strong> pauta <strong>em</strong> momentos <strong>em</strong> que a supressão da voz de uma fonte “diz”alguma coisa, mesmo que a intenção seja exatamente o contrário: é a“significação do silêncio”, como define Eni Orlandi (2002b). Daíconstatarmos que o <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong> consegue, raras vezes,constituir-se <strong>em</strong> <strong>discurso</strong> polêmico, ou mesmo obter junto aossegmentos que falam por ele uma atitude polêmica diante do <strong>discurso</strong>domi<strong>na</strong>nte. Nestes momentos, o sujeito assume um papel ativo e,aproveitando-se dos lapsos discursivos, <strong>em</strong> lugares de escape,consegue se infiltrar no <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico e apresentar, de modosutil, o seu próprio <strong>discurso</strong> ou a parte do <strong>discurso</strong> que quer assumircomo seu. O suficiente para dizer que os grupos que são a forçamaterial e intelectual de uma sociedade não estão sós, <strong>em</strong>bora possamregular e distribuir as idéias domi<strong>na</strong>ntes.A imprensa é um dos grandes impulsio<strong>na</strong>dores do conhecimento, masa compreensão t<strong>em</strong>atizada do cotidiano promovido pela <strong>mídia</strong> tambémé atravessada pela força do <strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte: a seleção do que é do186


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOque não é notícia passa por uma classificação que é influenciada pelosgrupos domi<strong>na</strong>ntes. O t<strong>em</strong>a <strong>índio</strong> entra no <strong>agenda</strong>-setting dos meiosde comunicação dentro de uma t<strong>em</strong>ática maior, a violência, que hojedomi<strong>na</strong> a imprensa. Estabelecendo a conexão entre <strong>índio</strong> e violência, aimprensa reproduz, <strong>em</strong> seu <strong>discurso</strong>, o senso comum reconhecidosocialmente <strong>sobre</strong> o indíge<strong>na</strong>. Como o t<strong>em</strong>a não é o <strong>índio</strong>, mas aviolência, o indíge<strong>na</strong> aparece como el<strong>em</strong>ento pitoresco da notícia. Aorecontextualizar o <strong>discurso</strong> indíge<strong>na</strong> dentro da cultura domi<strong>na</strong>nte, ojor<strong>na</strong>lista faz a fala do <strong>índio</strong> perder o sentido esperado, levando o leitora perceber uma representação social do <strong>índio</strong> próxima do perfil que seestabeleceu desde a chegada dos portugueses ao Brasil: aquele“outro” que forma o ser brasileiro, mas que rejeitamos como serinferior e de qu<strong>em</strong> não reconhec<strong>em</strong>os a identidade.A partir deste estudo, ficou claro que o <strong>índio</strong> só entrapredomi<strong>na</strong>nt<strong>em</strong>ente <strong>na</strong> pauta midiática <strong>em</strong> dois instantes: quando évítima ou autor de violência. Mesmo deixando de ser o “ator exótico”,definido por Maria Hele<strong>na</strong> Ortolan Matos (2001), e passando a ocuparum papel mais político, a posição social do indíge<strong>na</strong> <strong>na</strong> esfera pública éde submisso, subalterno, silenciado. Um líder indíge<strong>na</strong>, um cacique –mesmo ocupando uma função de poder dentro da estrutura de suacomunidade – t<strong>em</strong> papel periférico <strong>em</strong> suas relações com a sociedadebranca. Ele não é ouvido adequadamente e o jor<strong>na</strong>lista constrói seustextos a partir do <strong>discurso</strong> de fontes oficiais e para-oficiais.Questões como saúde, educação, ciência e cultura indíge<strong>na</strong>s entramesporadicamente <strong>na</strong> pauta midiática. Não há espaço para as diferençasculturais entre os vários grupos, as dificuldades de <strong>sobre</strong>vivênciaeconômica, as questões inter<strong>na</strong>s de cada comunidade, as relações como branco, os direitos e a ligação cultural à terra. Ou o <strong>índio</strong> ingressa <strong>na</strong>pauta jor<strong>na</strong>lística dentro do t<strong>em</strong>a violência ou fica no silêncio. Aimprensa está deixando de contar muitas histórias que permeiamnosso dia-a-dia e que envolv<strong>em</strong> estes segmentos sociais com menorautonomia. Segmentos como o indíge<strong>na</strong> – assim como o do187


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOmovimento dos s<strong>em</strong>-terra, dos negros, dos homossexuais – aparec<strong>em</strong><strong>na</strong> <strong>mídia</strong> a partir de um senso comum que os mantêm à marg<strong>em</strong> do<strong>discurso</strong> domi<strong>na</strong>nte ou reforça a condição de subalternidade destessetores:“Da mesma forma que outros setores da população,os povos indíge<strong>na</strong>s estão ameaçados e são vítimasde baixos níveis de vida, de pobreza extr<strong>em</strong>a, dedoenças, de altos índices de a<strong>na</strong>lfabetismo,desnutrição e alcoolismo, de deslocamentoscompulsórios, de atos de violência. Estãosubmetidos a diversas práticas de discrimi<strong>na</strong>ção esegregação social, cultural e étnica” (TEXTO-BASEDA CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2002: 38).Como a ideologia interpela o sujeito, interpela obviamente o jor<strong>na</strong>listaautor de um enunciado. Por isso, não se pode desideologizar o <strong>discurso</strong>jor<strong>na</strong>lístico: seria como retirar dele a sua alma, instituída e alimentadaao longo da formação discursiva do seu autor. Assim, reproduzindo osenso comum, a imprensa está <strong>na</strong> verdade veiculando o sentidoheg<strong>em</strong>ônico esperado pela ideologia domi<strong>na</strong>nte. Ou seja, é o <strong>discurso</strong>domi<strong>na</strong>nte – fruto da ideologia da classe domi<strong>na</strong>nte – que prevalece<strong>na</strong> <strong>mídia</strong>. Com isso, apesar da atividade jor<strong>na</strong>lística ser exercida pordelegação conferida pela sociedade, o poder econômico e políticopromovido por certos grupos sociais <strong>sobre</strong> os veículos de comunicaçãodificulta a verbalização ou reduz a força argumentativa do <strong>discurso</strong> devários segmentos minoritários <strong>na</strong> imprensa.Há uma coincidência entre o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico com o <strong>discurso</strong> dopoder, pela proximidade entre o jor<strong>na</strong>lista e as fontes oficiais. Nãopod<strong>em</strong>os afirmar que o <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico esteja a serviço dossegmentos sociais domi<strong>na</strong>ntes, no entanto, os índices a<strong>na</strong>lisados nestetrabalho d<strong>em</strong>onstram que o jor<strong>na</strong>lista e os meios de comunicaçãosocial reproduz<strong>em</strong> – por sua condição de assujeitamento – as relações188


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOde poder. O silêncio ao qual o <strong>índio</strong> é levado é da ord<strong>em</strong> da ideologia,ocorrendo de modo a não se perceber claramente como tal. Extermi<strong>na</strong>ro <strong>discurso</strong> de um grupo é o primeiro passo para favorecer adescaracterização de sua identidade. Por isso, o desafio dascomunidades indíge<strong>na</strong>s não é ape<strong>na</strong>s conseguir restabelecer o direitoaos seus territórios, mas marcar seu <strong>discurso</strong> <strong>na</strong> imprensa de modo agarantir o seu direito à palavra <strong>na</strong> condição de fonte ativa do <strong>discurso</strong>jor<strong>na</strong>lístico, deixando de ocupar o lugar de sujeitos s<strong>em</strong> voz.189


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOANEXO I190


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOÍNDICE TEMATIZADO DE NOTÍCIAS:DIARIO DE PERNAMBUCO E JORNAL DOCOMMERCIODE JULHO DE 2001 A ABRIL DE 2002Julho/20011. DP - 25.07.01 – A<strong>na</strong> Veloso expõe cabaças indíge<strong>na</strong>sCaderno Viver – reportag<strong>em</strong>Arte - artista branca faz pintura indíge<strong>na</strong>. Cita Fulni-ôs (Pesqueira/PE)e Guaranis (Paraíba)2. JC - 30.07.01 – Índios tere<strong>na</strong> libertam refénsCaderno Brasil - notaViolëncia indíge<strong>na</strong>/terra/assentamento - <strong>índio</strong>s Tere<strong>na</strong> libertam refénsno Mato GrossoAgosto/20011. DP - 04.08.01 – Espetáculo destaca influência indíge<strong>na</strong> nosfolguedosCaderno Viver - reportag<strong>em</strong>Arte - influência da dança indíge<strong>na</strong> nos folguedos2. JC - 04.08.01 – Ambientalistas quer<strong>em</strong> de volta terras doadas paraos <strong>índio</strong>sCaderno Brasil - reportag<strong>em</strong>Terra indíge<strong>na</strong> - conflito com ambientalistas - <strong>índio</strong>s Javaés e Carajás,no Tocantins3. DP - 17.08.01 – Índios quer<strong>em</strong> respeitoColu<strong>na</strong> Diário Urbano - nota comentadaEducação indíge<strong>na</strong> - conflito com modelo formal de educação - <strong>índio</strong>sTruká (PE) e Atikum (PE)4. DP - 24.08.01 – Índio xucuru assassi<strong>na</strong>do <strong>em</strong> PesqueiraCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong>/d<strong>em</strong>arcação de terras - assassi<strong>na</strong>to do <strong>índio</strong>Xucuru Chicão Quelé - luta por d<strong>em</strong>arcação de terras região(Pesqueira/PE)5. JC - 24.08.01 – Assassi<strong>na</strong>do líder da tribo XucuruCaderno Cidades - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - id<strong>em</strong> DP6. JC - 25.08.01 – Ato público <strong>em</strong> aldeia xucuru marca enterro de líderindíge<strong>na</strong>Caderno Cidades - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - enterro de Chico Quelé (Xucuru -Pesqueira/PE)191


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO7. DP - 28.08.01 – Chaci<strong>na</strong>Caderno Política - notaViolência contra o <strong>índio</strong> - crimes contra os Xucurus (Pesqueira/PE)8. JC - 28.08.01 – Brasil t<strong>em</strong> pronto o documento que levará a DurbanCaderno Brasil - reportag<strong>em</strong>Elimi<strong>na</strong>ção do racismo - cita <strong>índio</strong>s de modo geral9. DP - 28.08.01 – Violência leva <strong>índio</strong>s a apelar para ministroCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso dos Xucurus (Pesqueira/PE)10. DP - 29.08.01 – Medo ronda aldeia xucuruCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - medo sob o qual viv<strong>em</strong> os Xucurus(Pesqueira/PE)11. JC - 31.08.01 – Encontro <strong>sobre</strong> racismo é alvo de controvérsiaCaderno Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l - reportag<strong>em</strong>Racismo - cita minorias étnicas12. DP - 31.08.01 – Um olhar <strong>sobre</strong> as diferençasPági<strong>na</strong> de Opinião - artigoRacismo/preconceito/tolerância13. DP - 31.08.01 – Conferência discute racismoCaderno Mundo - reportag<strong>em</strong>Racismo - minorias étnicas. Cita <strong>índio</strong>s de modo geral14. JC - 31.08.01 – Contra a intolerânciaPági<strong>na</strong> de Opinião - editorialRacismo - cita violação dos direitos humanos contra <strong>índio</strong>s e outrasminoriasSet<strong>em</strong>bro/20011. DP - 02.09.01 – Brasil defende direitos das minoriasCaderno Mundo - reportag<strong>em</strong>Racismo - minorias étnicas. Cita <strong>índio</strong>s de modo geral2. JC - 04.09.01 – EUA e Israel abando<strong>na</strong>m conferênciaCaderno Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l - reportag<strong>em</strong>Racismo - cita minorias192


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO3. DP - 05.09.01 – Clima tenso <strong>em</strong> PesqueiraCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - Xucurus (Pesqueira/PE)4. JC - 05.09.01 – Deputado cobra agilidade da PFCaderno Cidades - notaViolência contra o <strong>índio</strong> - caso Chico Quelé - Xucurus (Pesqueira/PE)5. JC - 09.09.01 – Europeus reconhec<strong>em</strong> que escravidão é crimePági<strong>na</strong> Segunda Edição - reportag<strong>em</strong>Racismo - cita minorias6/7. JC - 14.09.01 – Impunidade 1/Impunidade2Colu<strong>na</strong> JC <strong>na</strong>s Ruas - notas (2)Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Chicão e Chico Quelé - Xucurus(Pesqueira/PE)8. JC - 17.09.01 – Clima fica tenso entre <strong>índio</strong>s após invasão desantuárioPági<strong>na</strong> Segunda Capa - notaViolência entre <strong>índio</strong>s - Xucurus de Cimbres e de Ororubá9. DP - 17.09.01 – Cacique manda invadir aldeia dissidenteCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência entre <strong>índio</strong>s - Xucurus (Pesqueira/PE)10. DP - 18.09.01 – Índios disputam santuário de CimbresCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência entre <strong>índio</strong>s - Xucurus (Pesqueira/PE)11. JC - 18.09.01 – Violência <strong>em</strong> aldeia de xucurus é t<strong>em</strong>a de debateCaderno Cidades - reportag<strong>em</strong>Violência entre <strong>índio</strong>s - Xucurus (Pesqueira/PE)12. JC - 18.09.01 – A questão indíge<strong>na</strong> <strong>em</strong> PesqueiraPági<strong>na</strong> de Opinião – Colu<strong>na</strong> Repórter JC – nota comentadaViolência contra o <strong>índio</strong> - Xucurus (Pesqueira/PE)13. JC - 18.09.01 – PesquisaCaderno C - Alex – foto-legendaArte - Fulni-ôs (Águas Belas/PE)14. DP - 19.09.01 – Entidades manifestam apoio ao XucuruCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência/conflito contra religiosos - Xucurus (Pesqueira/PE)15. JC - 23.09.01 – Índios têm hospital só para elesCaderno Brasil - reportag<strong>em</strong>Saúde indíge<strong>na</strong> - <strong>índio</strong>s de São Paulo16. DP - 27.09.01 – Bispo é jurado de morte no Agreste193


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOPági<strong>na</strong> Últimas - reportag<strong>em</strong>Violência dos <strong>índio</strong>s contra religiosos - Xucurus (Pesqueira/PE)17. JC - 29.09.01 – PF desig<strong>na</strong> delegado para investigar ameaças abispoCaderno Cidades - reportag<strong>em</strong>Violência dos <strong>índio</strong>s - Xucurus (Pesqueira/PE)Outubro/20011. DP - 06.10.01 – Índios aprisio<strong>na</strong>m policiais <strong>na</strong> PBPági<strong>na</strong> Últimas - notaViolência dos <strong>índio</strong>s - <strong>índio</strong>s Potiguara (PB)2. DP - 06.10.01 – Justiça decide por liberdade de <strong>índio</strong>sCaderno Vida Urba<strong>na</strong> - reportag<strong>em</strong>Violência dos <strong>índio</strong>s - <strong>índio</strong>s Pankararu (Tacaratu/PE)Nov<strong>em</strong>bro/20011. JC - 01.11.01 – Promotora deixa caso do PataxóCaderno Brasil - notaViolência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)2. JC - 02.11.01 – Caso Pataxó vai a segundo júri <strong>na</strong> segundaCaderno Brasil - notaViolência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)3. JC - 06.11.01 – MP recusa juíza suspeita de favorecer acusadosEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)4. DP - 06.11.01 – Promotor quer afastar juízaEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)5. DP - 07.11.01 – Julgamento dos matadores de Galdino dura trêsdiasEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)6. JC - 07.11.01 – Acusados confessam o crimeEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)7. JC - 08.11.01 – Defesa de acusados está pessimistaEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)8. DP - 08.11.01 – Acusação: fogo foi intencio<strong>na</strong>l194


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)9. DP - 09.11.01 – Médica afirma que <strong>índio</strong> foi assassi<strong>na</strong>doPági<strong>na</strong> Últimas - notaViolência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)10. DP – 09.11.01 – Julgamento do caso Galdino será retomadopági<strong>na</strong> Últimas – notaviolência contra o <strong>índio</strong> – caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)11. JC - 09.11.01 – Test<strong>em</strong>unha muda rumo no julgamento do casoPataxóEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)12. JC - 10.11.01 – Prova some e o júri é interrompidoEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)13. DP - 11.11.01 – Matadores de <strong>índio</strong> pegam 14 anosPági<strong>na</strong> Últimas - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)14. JC - 11.11.01 – Assassinos conde<strong>na</strong>dos a 14 anosSegunda Edição - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)15. JC - 12.11.01 – Índios pataxó cobram, agora, solução para brigapor terrasEditoria Brasil - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong>/briga por terras - Caso Pataxó e lutas porterras16. DP - 13.11.01 – Novo júri para caso pataxóPági<strong>na</strong> Últimas - reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> - caso Pataxó (ocorrido <strong>em</strong> Brasília/DF)17. JC - 14.11.01 – Ibama e Fu<strong>na</strong>i <strong>em</strong> garimpo ilegalEditoria Brasil - notaGarimpo ilegal <strong>em</strong> área indíge<strong>na</strong> - reserva indíge<strong>na</strong> <strong>em</strong> Rondônia(Roosevelt)18. JC - 18.11.01 – Aqui, <strong>índio</strong> não casa com negroCaderno Família - reportag<strong>em</strong>Racismo - <strong>índio</strong>s Atikum (Sítio Rodeador, PE) não casam com negrosde comunidade próxima19. JC - 21.11.01 – Trukás derrubam torre de alta tensãoEditoria Cidades - reportag<strong>em</strong>Violência dos <strong>índio</strong>s/protesto - <strong>índio</strong>s Truká (Cabrobó/PE)195


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO20. DP - 28.11.01 - Graduação para estudante pobrePági<strong>na</strong> Últimas - notaEducação para excluídos - cita <strong>índio</strong>s de modo geralDez<strong>em</strong>bro/20011. DP – 14.12.01 – Metáfora do massacre dos <strong>índio</strong>s brasileirosCaderno Viver – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – peça de teatro trata do massacre de <strong>índio</strong>sbrasileiros2. JC – 19.12.01 – Mais de 90 mil <strong>índio</strong>s estão <strong>na</strong> escolaCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Educação indíge<strong>na</strong> – censo <strong>sobre</strong> <strong>índio</strong>s <strong>na</strong> escola, citando a existênciade 169 etnias. Avaliação positiva <strong>sobre</strong> o t<strong>em</strong>a3. JC – 20.12.01 – Índios não têm ensino médio <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbucoSegunda Capa – reportag<strong>em</strong>Educação indíge<strong>na</strong> – <strong>índio</strong>s não têm ensino médio <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco.Avaliação negativa <strong>sobre</strong> o t<strong>em</strong>a, contradição com reportag<strong>em</strong> anteriorJaneiro/20021.JC – 04.01.02 – Crime abala tribo PataxóCaderno Brasil – notaViolência contra o <strong>índio</strong> – Pataxós/briga por terras – Bahia2. DP – 09.01.02 – CNBB prega respeito aos <strong>índio</strong>sCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Religião – campanha da fraternidade/CNBB3. JC – 11.01.02 – Pataxós faz<strong>em</strong> funcionário da Fu<strong>na</strong>i refém <strong>na</strong> BahiaCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – Pataxós/briga por terras. Fu<strong>na</strong>i – Bahia4. JC – 12.01.02 – Pataxós libertam agentes da Fu<strong>na</strong>iCaderno Brasil – notaViolência contra o <strong>índio</strong> – Pataxós/briga por terras. Fu<strong>na</strong>i – Bahia5. JC – 16.01.02 – S<strong>em</strong> títuloCaderno C – foto-legendaArte – modelo america<strong>na</strong> desfila caracterizada de índia6. DP – 17.01.02 – Brasil é denunciado por quebra de acordoÚltimas – notaD<strong>em</strong>arcação de terras – denúncia contra atitude brasileira dedesrespeito à d<strong>em</strong>arcação das terras dos <strong>índio</strong>s Avá – Maranhão7. JC – 17.01.02 – OEA culpa Brasil pela morte de líder s<strong>em</strong>-terraCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>196


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOD<strong>em</strong>arcação de terras – denúncia contra atitude brasileira dedesrespeito à d<strong>em</strong>arcação das terras dos <strong>índio</strong>s Avá – Maranhão8. DP – 20.01.02 – Programa vai beneficiar negros e <strong>índio</strong>sÚltimas – notaEducação para excluídos – cita <strong>índio</strong>s de modo geral9. JC – 20.01.02 – Pajés se armam para proteger sua ciênciaCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong> especialCiência indíge<strong>na</strong> – biopirataria – geral10. JC – 24.01.02 – Índios são presos dentro da Fu<strong>na</strong>iSegunda Capa – notaViolência do <strong>índio</strong> – prisão pela Polícia Federal de <strong>índio</strong>s por porte dearma/Fu<strong>na</strong>i Brasília – <strong>índio</strong>s Xavante (Nova Xavanti<strong>na</strong>/MT)11. JC – 25.01.02 – Índios acusados de desacatoCaderno Brasil – notaViolência do <strong>índio</strong> – <strong>índio</strong>s presos pela Polícia Federal por porte dearma vão responder a processo – <strong>índio</strong>s Xavante (Nova Xavanti<strong>na</strong>/MT)12. JC – 29.01.02 – Cia. Teatro de Seraphim de malas prontas paraCuritibaCaderno C - reportag<strong>em</strong>Arte – fala do <strong>índio</strong> no BrasilFevereiro/20021. DP – 03.02.02 – Tribos usam 164 plantas medici<strong>na</strong>isCaderno Brasil – notaCiência indíge<strong>na</strong> – uso de plantas medici<strong>na</strong>is por <strong>índio</strong>s – <strong>índio</strong>s Krahô– Tocantins2. JC – 13.02.02 – CNBB lança Campanha da Fraternidade hojeCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong> com retrancaCampanha da fraternidade – lançamento e justificativa da campanha,com nota de 1ª pági<strong>na</strong>.3. DP – 13.02.02 – Igreja abre Campanha da FraternidadeÚltimas – notaCampanha da fraternidade – lançamento e justificativa da campanha4. JC – 14.02.02 – Missa de Cinzas abre a quaresmaCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong> com retrancaCampanha da fraternidade5. JC – 14.02.02 – Igreja reforça defesa dos indíge<strong>na</strong>sCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Campanha da fraternidade – r<strong>em</strong>ete à matéria do Caderno de Cidades6. DP – 14.02.02 – Arquidiocese abre campanha197


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Campanha da fraternidade7. DP – 14.02.02 – Uma razão além da ocidentalCaderno Viver – reportag<strong>em</strong> de capaArte – exposição <strong>em</strong> Paris e Londres <strong>sobre</strong> <strong>índio</strong>s brasileiros,mostrando objetos arqueológicos indíge<strong>na</strong>s, mostrando o “universocolorido dos <strong>índio</strong>s”, o exótico8. DP – 15.02.02 – Católicos lançam campanha 2002Caderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Campanha da fraternidade – <strong>índio</strong>s Xucurus/situação <strong>em</strong> Pesqueira(PE)9. JC – 15.02.02 – Igreja quer aprovar Estatuto do ÍndioSegunda Capa – reportag<strong>em</strong>Campanha da fraternidade/estatuto do <strong>índio</strong> – enumera todas as tribos10. DP – 15.02.02 – S<strong>em</strong> títuloSeção de Cartas à Redação – fraseCampanha da fraternidade11. JC – 17.02.02 – Dia de <strong>índio</strong>Colu<strong>na</strong> JC <strong>na</strong>s Ruas – notaSaúde indíge<strong>na</strong> – fala <strong>sobre</strong> conferência <strong>sobre</strong> o t<strong>em</strong>a12. JC – 20.02.02 – Índios invad<strong>em</strong> sede da Fu<strong>na</strong>i no RecifeÚltimas – notaProtesto de <strong>índio</strong>s – protesto contra a Fu<strong>na</strong>i13. DP – 21.02.02 – Índios acampam <strong>na</strong> Fu<strong>na</strong>i e exig<strong>em</strong> indenizaçõesCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Protesto de <strong>índio</strong>s – protesto contra a Fu<strong>na</strong>i14. JC – 23.02.02 – Padre <strong>índio</strong>JC <strong>na</strong>s Ruas – notaCampanha da fraternidade – Padre <strong>índio</strong> (inusitado)15. JC – 24.02.02 – Polícia e Fu<strong>na</strong>i negociam apresentação do caciqueSegunda Edição – reportag<strong>em</strong>Violência do <strong>índio</strong> – caso Paulinho Paiakan16. JC – 25.02.02 – Missa é acompanhada por indíge<strong>na</strong>sCaderno Brasil – notaCampanha da fraternidade17. JC – 27.02.02 – Mais oito serão canonizados, entre eles um <strong>índio</strong>mexicanoCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Religião – canonização de <strong>índio</strong> mexicano (exótico)18. DP – 27.02.02 – Outros dois latinos serão santificados198


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Religião – canonização de <strong>índio</strong> mexicano (exótico)19. JC – 27.02.02 – Paiakan deve se entregar à Justiça <strong>na</strong> próximasextaCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Violência do <strong>índio</strong> – caso Paulinho PaiakanMarço/20021. JC – 01.03.02 – Paiakan deve ficar <strong>em</strong> regime fechadoCaderno Brasil – notaViolência do <strong>índio</strong> – caso Paulinho Paiakan2. DP – 03.03.02 – Por uma terra s<strong>em</strong> malesOpinião – artigoCampanha da fraternidade3.DP – 05.03.02 – Juiz mantém conde<strong>na</strong>çãoÚltimas – notaViolência do <strong>índio</strong> – caso Paulinho Paiakan4.DP – 07.03.02 – Cacique terá cela exclusivaCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Violência do <strong>índio</strong> – caso Paulinho Paiakan5. JC – 13.03.02 – Índios caiapós ped<strong>em</strong> ao Ibama que libere mognoextraído no ParáCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Meio ambiente – extração de madeira – <strong>índio</strong>s Caiapós (sul do Pará)6. DP – 23.03.02 – Ação contra roubo de diamanteCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Meio ambiente – garimpo clandestino <strong>em</strong> terra indíge<strong>na</strong> – <strong>índio</strong>s CintaLarga (Cacoal, Suruís, Zorós e Gaviões) – Rondônia7. JC – 23.03.02 – Tensão <strong>em</strong> área indíge<strong>na</strong> de RondôniaCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Meio ambiente – garimpo clandestino <strong>em</strong> terra indíge<strong>na</strong> – <strong>índio</strong>s CintaLarga (Cacoal, Suruís, Zorós e Gaviões) – Rondônia8. JC – 27.03.02 – Índios faz<strong>em</strong> refém <strong>na</strong> Fu<strong>na</strong>saCaderno de Brasil – notaViolência do <strong>índio</strong> – Xavantes (Goiás)9. DP – 31.03.02 – Doações ajudam a diminuir a fomeCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong> com retrancaPáscoa – não cita a campanha da fraternidade e n<strong>em</strong> os <strong>índio</strong>s, t<strong>em</strong>ada campanha199


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCO10. JC – 31.03.02 – Ressurreição de Cristo l<strong>em</strong>brada <strong>na</strong>s 97 paróquiasda ArquidioceseCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong>Páscoa – não cita a campanha da fraternidade e n<strong>em</strong> os <strong>índio</strong>s, t<strong>em</strong>ada campanha11. JC – 31.03.02 – Construção de c<strong>em</strong>itério ameaça sítio arqueológicoCaderno Cidades/Ciência e Meio Ambiente - reportag<strong>em</strong>Ciência – cita a localização de vestígios de uma aldeia indíge<strong>na</strong> porpesquisadores da UFPEAbril/20021. JC – 01.04.02 – Celebrações marcam o Domingo de PáscoaCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Páscoa – atores vestidos de <strong>índio</strong>s participam de celebração religiosa(<strong>índio</strong>s verdadeiros não foram convidados)2. JC – 06.04.02 – Polícia Federal prende acusado de assassi<strong>na</strong>r ocacique ChicãoCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)3. JC – 06.04.02 – Índio fulni-ô fere servidor da Fu<strong>na</strong>iCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong>Violência do <strong>índio</strong> – agressão contra funcionários da Fu<strong>na</strong>i4. DP – 06.04.02 – Confusão e correria <strong>na</strong> Fu<strong>na</strong>iCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Violência do <strong>índio</strong> – agressão contra funcionários da Fu<strong>na</strong>i5. DP – 06.04.02 – Projeto apóia <strong>índio</strong>s e pescadoresCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Outros - Projeto Rondon – apoio a comunidades indíge<strong>na</strong>s, citandoFulni-ôs (Águas Belas), Kapiwá (Ibimirim), Kapi<strong>na</strong>wá (Buíque) e Pipipã(Floresta)6. DP – 06.04.02 – PF prende acusado de assassi<strong>na</strong>r cacique XicãoCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)7. DP – 08.04.02 – Polícia Federal fala <strong>sobre</strong> prisão de acusadoCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)8. DP – 09.04.02 – Mandante do assassi<strong>na</strong>to de Chicão t<strong>em</strong> prisãoadiadaCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)9. JC – 09.04.02 – Índios xucurus estão <strong>em</strong> estado de alertaCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong>200


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOViolência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)10. JC – 10.04.02 – Índio xavante t<strong>em</strong> corpo queimadoCaderno Brasil – notaViolência contra o <strong>índio</strong> – <strong>índio</strong> queimado – Xavante (Paraná)11. DP – 11.04.02 – CNBB abre encontro anual <strong>em</strong> São PauloCaderno Brasil – reportag<strong>em</strong>Campanha da Fraternidade12. DP – 12.04.02 – S<strong>em</strong> títuloCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – notaS<strong>em</strong>inário <strong>sobre</strong> <strong>índio</strong>13. JC – 14.04.02 – Concurso pr<strong>em</strong>ia docente que promova igualdaderacialCaderno Cidades – notaDiscrimi<strong>na</strong>ção – discrimi<strong>na</strong>ção racial/busca de igualdade – cita <strong>índio</strong>s<strong>em</strong> geral14. DP – 14.04.02 – Vereador presta home<strong>na</strong>g<strong>em</strong> a ChicãoCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)15. JC – 14.04.02 – Índios não têm vez <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbucoCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong> especialS<strong>em</strong>a<strong>na</strong> do <strong>índio</strong> – fala da situação do <strong>índio</strong> <strong>em</strong> Per<strong>na</strong>mbuco. Afirmaque t<strong>em</strong> pouco a com<strong>em</strong>orar: fala de educação, d<strong>em</strong>arcação de terras,campanha da fraternidade. Fala especialmente <strong>em</strong> três povos (Fulni-ôs– Águas Belas, Kambiwás – Ibimirim, Xucurus – Pesqueira). Cita asnove etnias de Per<strong>na</strong>mbuco16. DP – 16.04.02 – Eventos marcam S<strong>em</strong>a<strong>na</strong> do ÍndioCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>S<strong>em</strong>a<strong>na</strong> do <strong>índio</strong> – não faz análise crítica. Cita as nove etnias dePer<strong>na</strong>mbuco17. DP – 16.04.02 – Conflitos indíge<strong>na</strong>s são t<strong>em</strong>a para Idali<strong>na</strong>Caderno Viver – notaViolência/conflitos – livro <strong>sobre</strong> conflitos indíge<strong>na</strong>s – Tapuia (sertão donordeste, não cita o Estado)18. DP – 16.04.02 – ÍndiosCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – notaCultura indíge<strong>na</strong> – fala da dança dos <strong>índio</strong>s fulni-ôs (Águas Belas/PE)19. DP – 17.04.02 – Home<strong>na</strong>g<strong>em</strong>Caderno Vida Urba<strong>na</strong> – notaViolência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)20. JC – 17.04.02 – Programa de <strong>índio</strong>201


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOCaderno C – notaS<strong>em</strong>a<strong>na</strong> do <strong>índio</strong> – título pejorativo: “programa de <strong>índio</strong>”. Cita casoChicão21. JC – 17.04.02 – Dia do ÍndioColu<strong>na</strong> Repórter JC – notaDia do <strong>índio</strong>22. DP – 18.04.02 – Programa trei<strong>na</strong>rá professor indíge<strong>na</strong>Últimas – notaEducação indíge<strong>na</strong>23. DP – 18.04.02 – Caso Chicão pode sofrer reviravoltaCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Violência contra o <strong>índio</strong> – caso Chicão – Xucurus (Pesqueira/PE)24. JC – 19.04.02 – Índios cobram ações para educaçãoCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong>Educação indíge<strong>na</strong> - protesto indíge<strong>na</strong> por direito à educação. Morreum <strong>índio</strong> do coração. Fala das nove etnias de Per<strong>na</strong>mbuco25. DP – 19.04.02 – Índio Atikum morre <strong>na</strong> calçada do palácioCaderno Vida Urba<strong>na</strong> – reportag<strong>em</strong>Educação indíge<strong>na</strong> – protesto indíge<strong>na</strong> por direito à educação. Morreum <strong>índio</strong> do coração. Enfoque maior é <strong>sobre</strong> a morte do <strong>índio</strong> duranteo protesto26. JC – 20.04.02 – Índios receb<strong>em</strong> home<strong>na</strong>gensCaderno Cidades – reportag<strong>em</strong>Dia do <strong>índio</strong> – home<strong>na</strong>g<strong>em</strong>. Cita campanha da fraternidade. Fala dosFulni-ôs e Pankararus27. JC – 21.04.02 – Ato l<strong>em</strong>bra morte do pataxóSegunda Edição – notaViolência contra o <strong>índio</strong> – caso Galdino (<strong>índio</strong> queimado <strong>em</strong>Brasília/DF)202


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOANEXO IIOrigi<strong>na</strong>is das notícias veiculadas e a<strong>na</strong>lisadas nesta dissertação, somentedisponível <strong>na</strong> cópia impressa, existente <strong>na</strong> Biblioteca Central.203


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOBibliografiaADAS, Melh<strong>em</strong> & ADAS, Sérgio (colab.) (1998). Panorama Geográficodo Brasil: contradições, impasses e desafios socioespaciais. São Paulo,Moder<strong>na</strong>.ALMEIDA, Sônia Maria Ramires (1985). A imag<strong>em</strong> do <strong>índio</strong> no cin<strong>em</strong>abrasileiro in FILHO, Ciro Marcondes (org.). Política e imaginário nosmeios de comunicação para massas no Brasil. São Paulo, Summus. pp.51-70.ALSINA, Miquel Rodrigo (1989). La construcción de la noticia.Barcelo<strong>na</strong>, Paidós Comunicación.ALTHUSSER, Louis (1970). Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado(Notas para uma investigação) in ZIZEK, Slavoj (1996). Um Mapa daIdeologia. Rio de Janeiro, Contraponto.ARAÚJO, Gilda Maria Lins de & CARENO, Mary Francisca do (2000). Aquestão indíge<strong>na</strong> e africa<strong>na</strong> no texto didático in BRANDÃO, Sylva<strong>na</strong>(org.). Brasil 500 anos: reflexões. Recife, Editora Universitária. pp.167-185.ARRUTI, José Maurício Andion (1999). A árvore Pankararu: fluxos <strong>em</strong>etáforas da <strong>em</strong>ergência étnica no sertão do São Francisco inOLIVEIRA, João Pacheco de (org). A viag<strong>em</strong> da volta: Etnicidade,Política e Reelaboração Cultural no Nordeste Indíge<strong>na</strong>. Rio de Janeiro,Contracapa. pp. 229-277.AUTHIER-REVUZ, Jacqueline (1990). Heterogeneidades enunciativas.Caderno de Estudos Lingüísticos, nº 19, Campi<strong>na</strong>s. pp. 25-42.204


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOBAKHTIN, Mikhail (1992a). Marxismo e Filosofia da Linguag<strong>em</strong>. SãoPaulo, Hucitec.BAKHTIN, Mikhail (1992b). Estética da Criação Verbal. São Paulo,Martins Fontes.BARRETT, Michèle (1996) Ideologia, política e heg<strong>em</strong>onia: de Gramscia Laclau e Mouffe in ZIZEK, Slavoj (1996). Um Mapa da Ideologia. Riode Janeiro, Contraponto.BECHARA, Evanildo (1980). Moder<strong>na</strong> Gramática Portuguesa. SãoPaulo, Nacio<strong>na</strong>l.BORDIEU, Pierre & EAGLETON, Terry (1991). A doxa e a vidacotidia<strong>na</strong>: uma entrevista in ZIZEK, Slavoj (1996). Um Mapa daIdeologia. Rio de Janeiro, Contraponto.BORDIEU, Pierre (1999). A Economia das Trocas Simbólicas. SãoPaulo, Perspectiva.BOSI, Alfredo (1992). Dialética da Colonização. São Paul, Companhiadas Letras.BRAIT, Beth (1997) (org.). Bakhtin, Dialogismo e Construção doSentido. Campi<strong>na</strong>s, Unicamp.CHAUÍ, Marile<strong>na</strong> (1980). O que é Ideologia. São Paulo, Brasiliense.CONSELHO INDIGENISTA MISSIONÁRIO (2001). Outros 500:construindo uma nova história. São Paulo, Salesia<strong>na</strong>.CONSELHO NACIONAL DE IGREJAS CRISTÃS DO BRASIL (2000).Dignidade huma<strong>na</strong> e paz: Novo milênio s<strong>em</strong> exclusões. São Paulo,Salesia<strong>na</strong> Dom Bosco.205


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOCORREIA, João Carlos (2002). O Poder do Jor<strong>na</strong>lismo e a Mediação doEspaço Público. Universidade da Beira Interior, Lisboa. Mimeo.DIJK, Teun A. van (1990). La noticia como <strong>discurso</strong>. Barcelo<strong>na</strong>, PaidósComunicación.FAIRCLOUGH, Norman (2001). Discurso e Mudança Social. Brasília,Editora UnB.FARIA, Gustavo de (ed.)(1981). A verdade <strong>sobre</strong> o <strong>índio</strong> brasileiro.Fu<strong>na</strong>i, Rio de Janeiro, Guavira Editores.FAUSTO NETO, Antônio (2003). Fragmentos de uma enunciaçãodesmesurada (“Eu quero resposta a minha pergunta”) in FAUSTONETO, Antônio, VERÓN, Eliseo (orgs) & RUBIM, Antonio AlbinoCanelas. Lula Presidente: Televisão e Política <strong>na</strong> Campanha Eleitoral.São Paulo, Hacker; São Leopoldo, Unisinos.FELIPPI, Ângela Cristi<strong>na</strong> Trevisan (1999). Vozes e sentidos no <strong>discurso</strong>jor<strong>na</strong>lístico. Os processos de construção discursiva do telejor<strong>na</strong>l“Notícias”, do Ca<strong>na</strong>l Rural in Vozes e sentidos no <strong>discurso</strong> jor<strong>na</strong>lístico.Os processos de construção discursiva do telejor<strong>na</strong>l “Notícias”, doCa<strong>na</strong>l Rural. Recorte da dissertação defendida no Programa de Pósgraduação<strong>em</strong> Comunicação e Informação da UFRGS. Mimeo.FIORIN, José Luiz (1994). Polifonia textual e discursiva in BARROS,Dia<strong>na</strong> Pessoa de & FIORIN, José Luiz (orgs). Dialogismo, Polifonia,Intertextualidade. Em torno de Mikhail Bakhtin. São Paulo, Edusp. pp.29-36.FIORIN, José Luiz (2002). Linguag<strong>em</strong> e Ideologia. São Paulo, Ática.FONTCUBERTA, Mar de (1993). La noticia: pistas para percibir elmundo. Barcelo<strong>na</strong>, Paidós Papeles de Comunicación 1.206


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOFREIRE, Maria José Alfaro (2000). A representação do <strong>índio</strong> <strong>na</strong>imprensa brasileira – o caso Payakã. In: XXIII CONGRESSOBRASILEIRO DE CIÊNCIA DA COMUNICAÇÃO. Mimeo.FOUCAULT, Michel (1996). A ord<strong>em</strong> do <strong>discurso</strong>. São Paulo, Loyola.GADINI, Sérgio Luiz (1999). A produção da cultura no jor<strong>na</strong>lismocont<strong>em</strong>porâneo: considerações <strong>sobre</strong> o <strong>discurso</strong> da informação <strong>na</strong>construção da identidade. In: XXII CONGRESSO BRASILEIRO ECIÊNCIA DA COMUNICAÇÃO. Mimeo.GOMES, Wilson (1998). Esfera pública política e media: comHabermas, contra Habermas in RUBIM, Antonio Albino Canelas;BENTZ, Ione Maria Ghislene & PINTO, Milton José (orgs.). Produção eRecepção dos Sentidos Midiáticos. Petrópolis, Vozes.GOMES, Isalti<strong>na</strong> Mello; MELO, Cristi<strong>na</strong> Teixeira & MORAIS, Wilma(1999). O movimento de sentidos <strong>na</strong> <strong>mídia</strong> televisiva. Revista Lumi<strong>na</strong>,vol. 2, nº 3, UFJF, Juiz de Fora, Editora Universitária. pp. 17-28.GOMES, Isalti<strong>na</strong> Mello; MELO, Cristi<strong>na</strong> Teixeira & MORAIS, Wilma(2000). O real e o ficcio<strong>na</strong>l no telejor<strong>na</strong>lismo - estudo de caso. Mimeo.GOMIS, Lorenzo (1991). Teoría del Periodismo, cómo se forma elpresente. Barcelo<strong>na</strong>, Paidós Comunicación.GRAMSCI, Antonio (1978). Introdução ao estudo da filosofia e domaterialismo histórico. Obras Escolhidas. Martins Fontes. pp. 21-66.GRÜNEWALD, Rodrigo de Azeredo (1999). Etnogênese e "regime de<strong>índio</strong>" <strong>na</strong> Serra do Umã in OLIVEIRA, João Pacheco de (org). A viag<strong>em</strong>da volta: Etnicidade, Política e Reelaboração Cultural no NordesteIndíge<strong>na</strong>. Rio de Janeiro, Contracapa. pp. 137-172.207


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOJODELET, Denise (s/d). La representación social: fenómenos, conceptoy teoria. Pensamento e Vida Social. pp. 469-493.JOVCHELOVITCH, Sandra (2000a). Vivendo a vida com os outros:intersubjetividade, espaço público e representações sociais in Textos<strong>em</strong> representações sociais. Petrópolis, Vozes, 6ª edição. pp. 63-85.JOVCHELOVITCH, Sandra (2000b). A cobertura da vida pública:representações sociais da esfera pública <strong>na</strong> imprensa inRepresentações sociais e esfera pública: a construção simbólica dosespaços públicos no Brasil. Petrópolis, Vozes. pp. 89-110.JUNQUEIRA, Lília (1999). Identidade, representações e mudança socialin CUNHA, Paulo (org.). Identidade(s). Recife, Editora Universitária.KOSÍK, Karel (1963). O mundo da pseudoconcreticidade e suadestruição; Reprodução espiritual da realidade; A totalidade concreta;A praxis. Dialética do Concreto. São Paulo, Paz e Terra.KUNCZIK, Michael (1997). Conceitos de Jor<strong>na</strong>lismo: Norte e Sul. SãoPaulo, Edusp.LACERDA, Rosely de Souza (2000). Índios de Per<strong>na</strong>mbuco...por elesmesmos in BRANDÃO, Sylva<strong>na</strong> (org.). Brasil 500 anos: reflexões.Recife, Editora Universitária. pp. 131-165.MAINGUENEAU, Dominique (2002). Análise de Textos de Comunicação.São Paulo, Cortez.MANUAL DA REDAÇÃO DA FOLHA DE S. PAULO (2001). São Paulo,Publifolha.MANUAL DE REDAÇÃO E ESTILO DE O GLOBO (1998). São Paulo,Globo.208


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOMARCUSCHI, Luiz Antônio (1991). A ação dos verbos introdutores deopinião in INTERCOM (Revista Brasileira de Comunicação), nº 64. SãoPaulo, ano XIV, pp. 74-92.MATOS, Maria Hele<strong>na</strong> Ortolan (2001). O <strong>índio</strong> <strong>na</strong> imprensa: de outroexótico a outro ator político in BARROS, Antonio Teixeira, DUARTE,Jorge Antonio, MARTINEZ, Regi<strong>na</strong> Esteves (orgs). Comunicação:<strong>discurso</strong>s, práticas e tendências. Brasília, UniCEUB.MEDINA, Cr<strong>em</strong>ilda (1978). Notícia: um produto à venda. Jor<strong>na</strong>lismo <strong>na</strong>Sociedade Urba<strong>na</strong> e Industrial. São Paulo, Summus Editorial.MELO, Cristi<strong>na</strong> Teixeira de. Atos Ilocucionários <strong>na</strong>s Cartas à Redação.Universidade Federal de Per<strong>na</strong>mbuco, mimeo.MELO, José Marques de (1994). A Opinião no Jor<strong>na</strong>lismo Brasileiro.Petrópolis, Vozes.MICELI, Sérgio (1999). Introdução: A Força do Sentido in BORDIEU,Pierre (1999). A Economia das Trocas Simbólicas. São Paulo,Perspectiva.MORAIS, Wilma (1997). El periodismo y el arte de contar historias: umestudio acerca de la construcción de la noticia cientifica. TesisDoctoral, UAB, Barcelo<strong>na</strong>. Mimeo.MOUILLAUD, Maurice & PORTO, Sérgio Dayrell (org.) (2002). Jor<strong>na</strong>l,da forma ao sentido. Brasília, Editora UnB.MUSSALIM, Fer<strong>na</strong>nda (2001). Análise de Discurso in MUSSALIM,Fer<strong>na</strong>nda & BENTES, An<strong>na</strong> Christi<strong>na</strong> (orgs.) (2001). Introdução àLingüística: Domínios e Fronteiras. São Paulo, Cortez.209


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCONÓBREGA, Sheva Maia da (1990). O que é representação social. UFPE,Recife. Mimeo.OLIVEIRA, João Pacheco de (1999). Uma etnologia dos "<strong>índio</strong>smisturados"? situação colonial, territorialização e fluxos culturais inOLIVEIRA, João Pacheco de (org). A viag<strong>em</strong> da volta: Etnicidade,Política e Reelaboração Cultural no Nordeste Indíge<strong>na</strong>. Rio de Janeiro,Contracapa. pp. 11-39.ORLANDI, Eni P. (1990). Terra à vista! Discurso do confronto: velho enovo mundo. São Paulo, Cortez.ORLANDI, Eni P. (1996). A linguag<strong>em</strong> e seu funcio<strong>na</strong>mento: as formasdo <strong>discurso</strong>. Campi<strong>na</strong>s, Pontes.ORLANDI, Eni P. (2002a). Análise de Discurso. Campi<strong>na</strong>s, Pontes.ORLANDI, Eni P. (2002b). As formas do silêncio: no movimento dossentidos. Campi<strong>na</strong>s, Unicamp.PARRATT, Sonia Fernández (s/d). El debate en torno a los géneros.Mimeo.PÊCHEUX, Michel (1990). O <strong>discurso</strong>: estrutura ou acontecimento. SãoPaulo, Pontes.PENNA, Maura (1992). O que faz ser nordestino: identidades sociais,interesses e o “escândalo” Erundi<strong>na</strong>. São Paulo, Cortez.PESAVENTO, Sandra Jatahy (1995). Em busca de uma outra história:imagi<strong>na</strong>ndo o imaginário in Revista Brasileira de História, nº29, vol.15, São Paulo, Contexto. pp. 09-27.210


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOPORTELLI, Hughes (1977). Gramsci e o Bloco Histórico. Rio de Janeiro,Paz e Terra.POSSENTI, Sírio (1993). Concepções de sujeito <strong>na</strong> linguag<strong>em</strong> inBoletim ABRALIN, nº 13, USP, São Paulo. pp. 13-30.POSSENTI, Sírio (2002). Os Limites do Discurso. Curitiba, CriarEdições.POVOS INDÍGENAS NO BRASIL. Disponível <strong>em</strong> http://www.socioambiental.org. Acesso <strong>em</strong>: 23 jul 2003.RICARDO, Carlos Alberto (ed.)(1996/2000). Povos Indíge<strong>na</strong>s no Brasil.São Paulo, Instituto Socioambiental.RODRIGUES, Adriano Duarte (1990). Campo dos Media e InstituiçõesSociais in Estratégias da Comunicação. Lisboa, Presença. pp. 141-196.RODRIGUES, Adriano Duarte (2002). Delimitação, <strong>na</strong>tureza e funçõesdo <strong>discurso</strong> midiático in MOUILLAUD, Maurice & PORTO, Sérgio Dayrell(orgs). O jor<strong>na</strong>l: da forma ao sentido. Brasília, Editora UnB.RODRIGUES, Male<strong>na</strong> Rehbein (1997). Do <strong>agenda</strong>-setting ao CongressoNacio<strong>na</strong>l: um processo de muitas vias in Imprensa, Congresso eD<strong>em</strong>ocracia. Tese de Mestrado, UnB, Brasília. Mimeo.SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DE PERNAMBUCO (1998). PovosIndíge<strong>na</strong>s de Per<strong>na</strong>mbuco. Recife, Diretoria de Educação Escolar.SAWAIA, Bader Burihan (1993). Representação e ideologia – oencontro desfetichizador in SPINK, Mary Jane Paris (org). OConhecimento no Cotidiano – As representações sociais <strong>na</strong> perspectivada psicologia social. São Paulo, Brasiliense.211


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOSILVA, Edson (2000). Resistência indíge<strong>na</strong> nos 500 anos decolonização in BRANDÃO, Sylva<strong>na</strong> (org.). Brasil 500 anos: reflexões.Recife, Editora Universitária. pp. 99-129.SOUSA, Jorge Pedro de (1999). As notícias e seusUniversidade Fer<strong>na</strong>ndo Pessoa, Lisboa. Mimeo.efeitos.SOUZA, Vânia R. F. de P. e (1998). As Fronteiras do Ser Xukuru.Recife, Massanga<strong>na</strong>.SPINK, Mary Jane Paris (2000). Desvendando as teorias implícitas:uma metodologia de análise das representações sociais in Textos <strong>em</strong>representações sociais. Petrópolis, Vozes. pp. 117-145.STRIEDER, Inácio Rei<strong>na</strong>ldo (2000). O mundo cultural de "Casa Grande& Senzala" in BRANDÃO, Sylva<strong>na</strong> (org.). Brasil 500 anos: reflexões.Recife, Editora Universitária. pp. 69-86.TEXTO-BASE DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2002. Disponível <strong>em</strong>http://www.cnbb.org.br. Acesso <strong>em</strong>: 20 jul. 2003.TRAQUINA, Nelson (1999). A redescoberta do Poder do Jor<strong>na</strong>lismo:Um Estudo da Evolução Histórica do Paradigma do Agenda-Setting.CAMBIASSU (Estudos <strong>em</strong> Comunicação), nº 1, vol VIII, São Luís. pp.14-37.VIEIRA, Regi<strong>na</strong> da L. (2000). O jor<strong>na</strong>l Porantim e o indíge<strong>na</strong>. SãoPaulo, An<strong>na</strong>blume.VIVALDI, G. Martín (1993). Géneros Periodísticos. Madrid, Paraninfo.WOLF, Mauro (2001). Teorias da Comunicação. Lisboa, Presença.212


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃOSUJEITOS SEM VOZ:AGENDA E DISCURSO SOBRE O ÍNDIO NA MÍDIA EM PERNAMBUCOZIZEK, Slavoj (1996). O espectro da ideologia in ZIZEK, Slavoj. UmMapa da Ideologia. Rio de Janeiro, Contraponto.213

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