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Controle Social do Orçamento Público - Polis

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<strong>Controle</strong> <strong>Social</strong> sobre o<strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong>


Agradecimentos:Esta publicação contou com a colaboração de muitas pessoas a quem agradecemos.Do Instituto Pólis a Daniel Renaud Ho, Jorge Kayano, Maria <strong>do</strong> Carmo Albuquerque,Paulo Romeiro, Pedro Pontual e Veronika Paulics.Da Associação Direito ao Direito a André Abbud, Daniel Ribeiro Silvestre, Frederico KlingFerraz de Carvalho, Gustavo Bambini de Assis, Ivo da Motta Azeve<strong>do</strong> Corrêa, LaureanaMartins, Marcelo Dayrell, Pedro Vieira Abramoway e Regis Anderson Dudena.Do Centro Luiz Freire à Ana Nery <strong>do</strong>s Santos; <strong>do</strong> CENTRAC à Ana Patrícia Sampaio deAlmeida, Laudicéia Araújo e Sonia Maria Pereira Marinho; da FASE a Evanil<strong>do</strong> B. Silva,Luiza de Marillac Melo e Orlan<strong>do</strong> Alves Júnior; <strong>do</strong> IBASE a Leonar<strong>do</strong> Mello e João Sucupira;<strong>do</strong> Centro Josué de Castro a Maria Betânia Tenório, <strong>do</strong> CEAP a Valdevir Both eVolmir José Brutsher, <strong>do</strong> Conselho Regional de Economistas <strong>do</strong> Rio de Janeiro a LuizMario Behnken e a Austregésilo Ferreira de Melo (Astral).Um agradecimento especial à Dra. Luiza Cristina Frischeisen, Dra. Mônica Nicida e Dr.Delson Fonseca <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> Federal.Essa publicação conta com oa apoio de:Companheiros das AméricasUSAIDRed Interamercana por la Democrácia (RID)Publicações PólisISSN - 0104-2335BALCÃO, Nilde; TEIXEIRA, Ana Claudia (Org.)<strong>Controle</strong> social <strong>do</strong> orçamento público. São Paulo, Instituto Pólis, 2003. 112p.(Publicações Pólis, 44)1. <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong>. 2. <strong>Controle</strong> <strong>Social</strong> <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong>. 3. <strong>Orçamento</strong>Participativo. 4. Participação Cidadã. 5. Instrumento de <strong>Controle</strong> <strong>Social</strong>.6. Direito à Informação. 7. Experiência Inova<strong>do</strong>ra.I. BALCÃO, Nilde. II. TEIXEIRA, Ana Claudia. III. Instituto Pólis. IV. Título. V. Série.Fonte: Vocabulário Instituto Pólis/CDIPólis 44Organiza<strong>do</strong>ras: Nilde Balcão e Ana Claudia TeixeiraCoordenação Editorial: Paula SantoroAssistente Editorial: Iara Rolnik XavierCopy Desk capítulo 1: Luci AyalaRevisão geral: Iara Rolnik XavierRevisão ortográfica: Nayara RigottiEditoração Eletrônica: Renato FabrigaCapa: Andrés San<strong>do</strong>valFotolitos: À JatoImpressão: Gráfica Peres


ApresentaçãoO objetivo desta publicação é contribuir para capacitar a sociedadecivil a intervir no planejamento e na alocação <strong>do</strong>s recursos para as políticaspúblicas e acompanhar a execução <strong>do</strong> orçamento. Essa contribuiçãotem em vista a vasta gama de experiências sociais de monitoramento dasverbas públicas e de iniciativas governamentais para dar maior visibilidadeà administração.As contas públicas têm si<strong>do</strong> objeto de debate em várias formas de organizaçãopopular. Dentre as mais conhecidas experiências, estão o<strong>Orçamento</strong> Participativo e os conselhos de gestão de políticas públicas. O<strong>Orçamento</strong> Participativo é o resulta<strong>do</strong> das iniciativas <strong>do</strong>s governos municipaisde convocar a população para o debate e a aprovação de suas demandas,uma fórmula que vem se disseminan<strong>do</strong> no País para dar espaçoà participação popular na gestão <strong>do</strong>s recursos públicos. Os conselhos gestores,por sua vez, são órgãos colegia<strong>do</strong>s previstos por legislação federalforma<strong>do</strong>s por representantes da sociedade civil e <strong>do</strong> governo, que têmpor objetivo traçar diretrizes para a elaboração e aprovação de planos deação para as políticas sociais nos três níveis de governo: municipal, estaduale federal. Os conselhos atuam junto ao poder Executivo na formulação<strong>do</strong> desenho das políticas nas áreas da saúde, educação, criança e a<strong>do</strong>lescente,da assistência social, entre outras, bem como na alocação derecursos para essas áreas.Em algumas localidades onde os governos municipais não implantaramo <strong>Orçamento</strong> Participativo, a sociedade civil tem se organiza<strong>do</strong> emfóruns de acompanhamento <strong>do</strong> orçamento público para apresentar suasreivindicações ao governo municipal e monitorar a utilização <strong>do</strong>s recursos.Em todas essas experiências – bastante díspares entre si – as organizaçõesda sociedade local estão gradualmente se capacitan<strong>do</strong> para suasintervenções no controle <strong>do</strong> orçamento municipal. Essa capacitação supõeum acúmulo de conhecimento <strong>do</strong>s marcos legais para a elaboração eexecução <strong>do</strong> orçamento que vem ocorren<strong>do</strong> graças à atuação de organizaçõesnão-governamentais, assessores, órgãos de governo, promotorese procura<strong>do</strong>res; para citar alguns <strong>do</strong>s atores sociais que se dispõem acapacitar cidadãos e grupos organiza<strong>do</strong>s para a compreensão das leis orçamentáriase a atuação na defesa <strong>do</strong>s direitos.Outro fator importante que configura esse cenário é a mobilização deuma opinião pública disposta a tratar a corrupção como uma questãopública efetivamente. A corrupção é cada vez mais percebida como um5


6“mal público” a ser combati<strong>do</strong> ou, dito de outro mo<strong>do</strong>, cresce a preocupaçãocom o “bem público” a ser preserva<strong>do</strong>. Os meios de comunicação têmti<strong>do</strong> um papel importante nessa direção. Eles são impulsiona<strong>do</strong>s pelasdenúncias de setores prejudica<strong>do</strong>s com a malversação das contas públicase pela reação popular aos grandes escândalos nacionais de corrupção,<strong>do</strong>s quais o impeachment <strong>do</strong> ex-presidente Fernan<strong>do</strong> Collor de Mello é omelhor exemplo.O papel <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> no controle <strong>do</strong> patrimônio público esocial e na defesa <strong>do</strong>s interesses difusos e coletivos, por sua vez, está setornan<strong>do</strong> cada vez mais conheci<strong>do</strong>. A crescente onda de denúncias e processoscontra prefeitos, em grande parte, deve-se à sua atuação.Ao mesmo tempo, da parte <strong>do</strong> governo federal, nos últimos anos, háuma série de iniciativas administrativas e legislativas que vêm exigin<strong>do</strong>um planejamento mais sistemático e uma maior transparência na elaboraçãoe destinação <strong>do</strong>s recursos públicos. A Lei de Responsabilidade Fiscal,de 2000; a instituição já citada <strong>do</strong>s conselhos de gestão de políticaspúblicas após a Constituição de 1988; e as iniciativas locais para o aperfeiçoamento<strong>do</strong>s mecanismos de gestão administrativa caminham no senti<strong>do</strong>de tornar mais visíveis a administração <strong>do</strong>s recursos públicos.Em to<strong>do</strong>s esses processos, a importância de democratizar o processoorçamentário tem si<strong>do</strong> destacada por diversos atores que identificam nasexperiências em curso, a possibilidade de ampliação da esfera pública e ocontrole <strong>do</strong> poder público pela sociedade. Além disso, o debate em torno<strong>do</strong> orçamento se articula à discussão <strong>do</strong> planejamento das cidades e ànecessidade de inverter as prioridades em termos <strong>do</strong>s gastos públicos,que historicamente têm beneficia<strong>do</strong> mais aos setores privilegia<strong>do</strong>s, geran<strong>do</strong>segregação e desigualdades sociais.Esta publicação pretende trazer uma contribuição qualificada para estedebate. Os artigos aqui reuni<strong>do</strong>s são o resulta<strong>do</strong> das pesquisas realizadaspelo Instituto Pólis que tiveram como objetivos: fazer um levantamentodas leis e normas que prescrevem aos governos o planejamento das açõese uma maior transparência na administração <strong>do</strong>s orçamentos públicos everificar como a sociedade civil vem utilizan<strong>do</strong> esses recursos legais paraexercer o controle sobre o orçamento público.O primeiro artigo sobre o controle social <strong>do</strong> orçamento público apresentaas instituições e normas para a elaboração orçamentária e para aprestação de contas <strong>do</strong>s governantes e <strong>do</strong>s mecanismos disponíveis parao monitoramento desse processo pela sociedade civil. Em sua últimaparte, apresenta o resulta<strong>do</strong> das pesquisas realizadas nos Tribunais deContas e Tribunais de Justiça em três Esta<strong>do</strong>s da federação: Paraíba, Riode Janeiro e Rio Grande <strong>do</strong> Sul. Com essa amostra pequena das diferençasregionais <strong>do</strong> País, procura-se iniciar um delineamento das questõesreferentes às relações da sociedade civil com esses órgãos, consideran-


<strong>do</strong> que, em meio às múltiplas experiências de controle social <strong>do</strong> orçamento,o debate sobre o Tribunal de Contas e o sistema judiciário éainda bastante incipiente.Seguem-se depois os relatos de três estu<strong>do</strong>s de caso realiza<strong>do</strong>s emmunicípios desses mesmos esta<strong>do</strong>s, de organizações da sociedade civilque, na sua experiência de monitoramento <strong>do</strong> orçamento municipal, utilizamuma ampla gama <strong>do</strong>s recursos legais disponíveis para isso. São elaso Fórum em Defesa da Cidadania de Lagoa Seca, na Paraíba; o FórumPopular de Acompanhamento <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro <strong>do</strong> município<strong>do</strong> Rio de Janeiro e o Conselho Municipal de Saúde de Passo Fun<strong>do</strong>no Rio Grande <strong>do</strong> Sul. O último artigo traz um levantamento de questõesrelevantes para o controle social <strong>do</strong> orçamento público.Com esse conjunto de abordagens pretendemos aprofundar o debatesobre o monitoramento das verbas públicas. Além disso, esse trabalho fornecepistas para o amadurecimento das experiências em curso e a motivaçãode novas iniciativas para o controle social <strong>do</strong> orçamento público.7


O controle social sobre oorçamento público9


O controle social sobre oorçamento públicoEsse texto foi elabora<strong>do</strong> originalmente pela Associação Direito ao Direitoe Paulo Romeiro.As instituições e instrumentos que podem ser usa<strong>do</strong>spara ampliar o controle da sociedade civil sobre aaplicação <strong>do</strong>s recursos públicosA participação da sociedade civil no planejamento, gestão e controle<strong>do</strong> orçamento público é um <strong>do</strong>s elementos centrais para garantir umaefetiva democratização da sociedade brasileira. Para que isso ocorra, éimportante conhecer como é feito o orçamento nos três níveis de governo– municipal, estadual e federal –, as determinações legais quedevem ser obedecidas para sua realização e, principalmente, osmecanismos e os órgãos que permitem a participação da sociedadecivil tanto em seu planejamento quanto no efetivo controle de suaaplicação.Muito mais <strong>do</strong> que uma peça financeira burocrática, o orçamento –seja <strong>do</strong> município, <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> ou da União – é o resulta<strong>do</strong> de uma articulaçãoessencialmente política. O orçamento da União é um instrumentode planejamento e de intervenção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> no conjunto da economia <strong>do</strong>País. O mesmo vale para os orçamentos <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s e <strong>do</strong>s municípiosnessas esferas político-administrativas.Ao mostrar onde e como o poder público pretende aplicar o dinheiropúblico, o orçamento espelha suas reais prioridades políticas. Uma análise<strong>do</strong> projeto orçamentário de qualquer <strong>do</strong>s níveis de governo indica quaissão os projetos e planos de desenvolvimento em andamento e os setoresou grupos sociais que serão beneficia<strong>do</strong>s.Como peça política que é, a proposta orçamentária e seu processo deaprovação refletem tanto os compromissos de quem está no poder quantoa relação de forças na sociedade civil, o poder de mobilização de seussetores organiza<strong>do</strong>s e a quem os parlamentares eleitos estão realmenterepresentan<strong>do</strong>.11


12Sempre que o movimento social reivindica verbas para determinadaação ou exige <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> investimentos em áreas, programas ou equipamentossociais está disputan<strong>do</strong> uma parcela <strong>do</strong>s recursos públicos quesão geri<strong>do</strong>s pelo poder público. O atendimento efetivo a essas reivindicaçõesimplica, primeiro, na destinação de recursos no orçamento para atendê-lase, depois, na aplicação real desses recursos.Um bom exemplo é o fato de a Constituição brasileira, promulgada em1988, determinar à União, aos Esta<strong>do</strong>s e aos municípios que destinem umpercentual fixo da receita obtida com a arrecadação de impostos para aeducação e a saúde – uma evidente conquista da sociedade civil organizada.Apesar dessa garantia constitucional para as receitas, a sociedadecivil tem trava<strong>do</strong> inúmeros embates tanto para que os orçamentos municipais,estaduais e federal de fato destinem esses recursos para a educaçãoe a saúde, quanto para que essas definições orçamentárias sejam postasem prática sem desvios.


Lei de Diretrizes OrçamentáriasEssa lei é renovada anualmente e compreende as normas que orientam aelaboração da lei orçamentária propriamente dita. A Lei de Diretrizes Orçamentárias(LDO) deve ser coerente com o PPA, expon<strong>do</strong> as metas e prioridadesda administração pública e, a partir delas, a política de aplicação dasagências financeiras oficiais de fomento. Deve apresentar dispositivos quegarantam o equilíbrio geral <strong>do</strong> orçamento, controle de custos e avaliação deresulta<strong>do</strong>s, critérios e formas de limitação de empenho – exigências da Lei deResponsabilidade Fiscal –, bem como eventuais alterações na legislação tributária.A LDO inclui um Anexo de Metas Fiscais, com a avaliação geral dasituação financeira, e um Anexo de Riscos Fiscais, com a avaliação <strong>do</strong>s passivoscontingentes e de outros riscos capazes de afetar as contas públicas.Lei Orçamentária AnualA Lei Orçamentária Anual (LOA) corresponde à peça orçamentária propriamentedita. No âmbito federal, define o orçamento fiscal referenteaos poderes da União – Executivo, Legislativo e Judiciário –, seus fun<strong>do</strong>s,órgãos e entidades da administração direta e indireta, inclusive fundaçõesinstituídas e mantidas pelo poder público. Abarca o orçamento dasempresas em que a União participa direta ou indiretamente, deten<strong>do</strong> amaioria <strong>do</strong> capital social com direito a voto, bem como o orçamento daseguridade social, abrangen<strong>do</strong> todas as entidades e órgãos a ela vincula<strong>do</strong>s,da administração direta ou indireta, além <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>.Lei de Responsabilidade FiscalA Lei de Responsabilidade Fiscal tem por objetivo impedir que os governantesgastem mais <strong>do</strong> que as suas administrações tenham condições depagar, deixan<strong>do</strong> dívidas para seus sucessores. Ela exige, por exemplo, que aLDO apresente os dispositivos que garantam o equilíbrio <strong>do</strong> orçamento eque a LOA inclua uma demonstração de que as despesas previstas sejamcompatíveis com os objetivos e metas <strong>do</strong> Anexo de Metas Fiscais da LDO.A relação entre o Executivo e oLegislativo na elaboração <strong>do</strong> orçamento14O orçamento elabora<strong>do</strong> pelo Executivo é negocia<strong>do</strong> com os diferentessetores sociais representa<strong>do</strong>s no Legislativo pelos parlamentares. Estesexpressam os interesses de seus representa<strong>do</strong>s, apresentan<strong>do</strong> emendas àpeça orçamentária que busquem atender suas demandas. Um <strong>do</strong>s palcos


privilegia<strong>do</strong>s para essa negociação é a Comissão <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong>, presentenos três níveis <strong>do</strong> poder Legislativo. No caso <strong>do</strong> Executivo Federal, as propostasorçamentárias são apreciadas pelas duas Casas <strong>do</strong> CongressoNacional – Sena<strong>do</strong> Federal e Câmara <strong>do</strong>s Deputa<strong>do</strong>s.Primeiramente a peça orçamentária é submetida à Comissão <strong>do</strong><strong>Orçamento</strong>, órgão permanente <strong>do</strong> Congresso Nacional, composto de deputa<strong>do</strong>se sena<strong>do</strong>res. A Comissão tem a tarefa de avaliar a proposta orçamentáriaenviada pelo Executivo e, principalmente, acolher ou não asemendas apresentadas pelos deputa<strong>do</strong>s e sena<strong>do</strong>res. Para serem aceitas,as emendas devem ser compatíveis com o PPA e a LDO e indicarem deonde devem vir os recursos para sua realização – de acor<strong>do</strong> com a Constituição,não são admitidas emendas que aumentem a despesa. (Veja Box:A Constituição e o uso <strong>do</strong>s recursos públicos).A Constituição e o uso <strong>do</strong>s recursos públicosCasos em que os recursos públicos não podem ser utiliza<strong>do</strong>s, segun<strong>do</strong> a Constituição:• Início de programas ou projetos não incluí<strong>do</strong>s na Lei Orçamentária Anual.• Realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditosorçamentários ou adicionais.• Realização de operações de crédito que excedam o montante das despesas de capital,ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidadeprecisa, aprovadas pelo poder Legislativo por maioria absoluta.• Vinculação de receita de impostos a órgão, fun<strong>do</strong> ou despesa, ressalvadas a repartição<strong>do</strong> produto da arrecadação <strong>do</strong>s impostos a que se referem os artigos 158 e 159; a destinaçãode recursos para as ações e serviços públicos de saúde e para manutenção e desenvolvimento<strong>do</strong> ensino, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipaçãode receita.• Abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização legislativa e semindicação <strong>do</strong>s recursos correspondentes.• Transposição, remanejamento ou transferência de recursos de uma categoria de programaçãopara outra ou de um órgão para outro, sem prévia autorização legislativa.• Concessão ou utilização de créditos ilimita<strong>do</strong>s.• Utilização, sem autorização legislativa específica, de recursos <strong>do</strong>s orçamentos fiscal eda seguridade social para suprir necessidade ou cobrir déficit de empresas, fundaçõese fun<strong>do</strong>s.• Instituição de fun<strong>do</strong>s de qualquer natureza, sem prévia autorização legislativa.• Transferência voluntária de recursos e concessão de empréstimos, inclusive por antecipaçãode receita, pelos governos Estaduais e Federal e suas instituições financeiras, parapagamento de despesas com pessoal ativo, inativo e pensionista, <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s, <strong>do</strong> DistritoFederal e <strong>do</strong>s municípios.• Utilização <strong>do</strong>s recursos provenientes das contribuições sociais para a realização de despesasdistintas <strong>do</strong> pagamento de benefícios <strong>do</strong> regime geral de previdência social.15


16Os parlamentares também podem decidir o destino <strong>do</strong>s chama<strong>do</strong>s créditosespeciais ou suplementares. São recursos que, em virtude <strong>do</strong> processode discussão no Legislativo, ficam sem as despesas correspondentes,seja em decorrência de veto, emenda ou rejeição <strong>do</strong> projeto de leiorçamentária e que poderão ser utiliza<strong>do</strong>s mediante autorização legislativaprévia e específica.Após aprovação <strong>do</strong> orçamento e sua publicação no Diário Oficial, opoder Executivo tem até trinta dias para estabelecer a programação financeirae o cronograma de execução mensal de desembolso. No âmbitoestadual e municipal, os procedimentos são semelhantes.


As instituições e osinstrumentos de controle <strong>do</strong>orçamento público – como usá-losPor ser instrumento de planejamento <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> para o atendimentodas necessidades da sociedade, o orçamento público não cria expectativasde direitos individuais, mas regras gerais de operacionalização de receitase despesas. Sen<strong>do</strong> assim, o controle orçamentário relaciona-se coma defesa de interesses de toda a sociedade e não com os direitos de umindivíduo toma<strong>do</strong> isoladamente. No entanto, em alguns casos, a ação emdefesa de direitos individuais exercida pelo cidadão pode assumir o caráterde uma defesa <strong>do</strong> interesse de to<strong>do</strong>s (é caso da ação popular), ou seusresulta<strong>do</strong>s beneficiarem toda a coletividade (como em uma representaçãoadministrativa ou um manda<strong>do</strong> de segurança).A Constituição brasileira estabelece mecanismos para controle interno eexterno das finanças e <strong>do</strong> orçamento público. (Veja Box: O que é controleorçamentário). O controle é interno quan<strong>do</strong> exerci<strong>do</strong> por um outro órgãoda mesma administração ou poder público, caracterizan<strong>do</strong>-se como umaautotutela permanente para a garantia da legitimidade das contas. O controleexterno é, por excelência, exerci<strong>do</strong> pelo Tribunal de Contas – da União, <strong>do</strong>Esta<strong>do</strong> e, em alguns casos, <strong>do</strong> município – cuja função é exatamente essa. OMinistério <strong>Público</strong> e o poder Legislativo também têm entre suas atribuiçõesa de controlar a probidade administrativa no manejo <strong>do</strong> dinheiro público. Opoder Judiciário dispõe de mecanismos para o controle orçamentário, masexerce esse controle apenas quan<strong>do</strong> aciona<strong>do</strong>.O que é o controle sobre o orçamentoSegun<strong>do</strong> a Lei 4320/64, o controle da execução orçamentária compreende:• A legalidade <strong>do</strong>s atos de que resultem a arrecadação da receita ou a realização da despesa,o nascimento ou a extinção de direitos e obrigações.• A fidelidade funcional <strong>do</strong>s agentes da administração, responsáveis por bens e valorespúblicos.• O cumprimento <strong>do</strong> programa de trabalho expresso em termos monetários e em termosde realização de obras e prestação de serviços.17


1 A Associação Direito aoDireito é uma associação deestu<strong>do</strong>s e promoção de alternativasde acesso à justiçaformada por advoga<strong>do</strong>se estudantes de Direito.To<strong>do</strong>s esses órgãos ou instituições têm canais apropria<strong>do</strong>s para a participação<strong>do</strong> cidadão ou das organizações da sociedade civil visan<strong>do</strong> ocontrole sobre o orçamento público. Para que esse controle seja viável, aConstituição também determina que os atos administrativos que envolvama gestão <strong>do</strong> dinheiro público tenham ampla divulgação, asseguran<strong>do</strong> aocidadão o direito à informação.Apesar da existência de canais para o controle da ação das autoridadesno tocante ao orçamento público, a pesquisa realizada pela AssociaçãoDireito ao Direito 1 em três Esta<strong>do</strong>s – Paraíba, Rio de Janeiro e RioGrande <strong>do</strong> Sul – junto aos Tribunais de Contas, Ministério <strong>Público</strong> epoder Judiciário mostra que sua procura ainda é relativamente pequena,varia de acor<strong>do</strong> com o grau de mobilização e organização <strong>do</strong>s setoresda sociedade civil e, também, com a organização interna e flexibilidadedesses organismos. (Veja Da<strong>do</strong>s de pesquisa – Atuação <strong>do</strong> Tribunal deContas, Ministério <strong>Público</strong> e poder Judiciário). Além disso, em muitoscasos, esses canais são aciona<strong>do</strong>s na defesa de direitos individuais enão por organizações da sociedade civil na defesa <strong>do</strong>s interesses coletivose direitos difusos.O direito e o acesso à informaçãoO acesso à informação é o mecanismo primário básico por meio <strong>do</strong>qual o cidadão pode exercer o controle sobre o poder público. Este tem odever, determina<strong>do</strong> pela Constituição, de agir com a maior transparênciapossível. Os cidadãos têm o direito de saber o que os administra<strong>do</strong>res dacoisa pública estão fazen<strong>do</strong>. (Box Dever e direito à informação).Dever e direito à informaçãoSegun<strong>do</strong> a Constituição Federal: “(...)to<strong>do</strong>s têm direito a receber <strong>do</strong>s órgãos públicos informaçõesde seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas noprazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível àsegurança da sociedade e <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.” Há limitação também no que se refere à inviolabilidadeda intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas.18Para que haja transparência na administração pública, o poder Executivodeve dar ampla publicidade para alguns instrumentos básicos degestão orçamentária. Isso significa publicá-los em meios que sejam defato acessíveis ao público. O que deve ser publica<strong>do</strong>:• Os planos, os orçamentos e a Lei de Diretrizes Orçamentárias.• As prestações de contas e o respectivo parecer prévio.


• O Relatório Resumi<strong>do</strong> da Execução Orçamentária e a sua versãosimplificada.• O Relatório de Gestão Fiscal e a sua versão simplificada.• As contas apresentadas pelos chefes <strong>do</strong>s poderes Executivo, Legislativoe Judiciário e <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>.O Relatório Resumi<strong>do</strong> da Execução Orçamentária é bimestral e deve serdivulga<strong>do</strong> até 30 dias após o encerramento de cada bimestre. O Relatóriode Gestão Fiscal, mais complexo, é quadrimestral e deve ser publica<strong>do</strong> até30 dias após o encerramento <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> correspondente. As prestações decontas <strong>do</strong>s chefes <strong>do</strong>s poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e <strong>do</strong>Ministério <strong>Público</strong> deverão ser divulgadas juntamente com o parecer prévioemiti<strong>do</strong> pelo Tribunal de Contas até 60 dias após o recebimento.Também devem ser publica<strong>do</strong>s os processos em andamento, os pareceres<strong>do</strong>s órgãos técnicos e jurídicos, os despachos intermediários e finais, asatas de julgamento das licitações e <strong>do</strong>s contratos com quaisquer interessa<strong>do</strong>s,os comprovantes de despesas e as prestações de contas. Em tese, to<strong>do</strong><strong>do</strong>cumento público pode ser examina<strong>do</strong> por qualquer pessoa interessada.Pela Constituição, as contas municipais anuais devem ficar disponíveis por60 dias para que qualquer cidadão possa examiná-las. A União, os Esta<strong>do</strong>s, oDistrito Federal e os municípios devem divulgar os montantes de cada um <strong>do</strong>stributos arrecada<strong>do</strong>s até o último dia <strong>do</strong> mês subseqüente ao da arrecadação,bem como declarar os recursos recebi<strong>do</strong>s de outras esferas de governo.<strong>Controle</strong> administrativoA Constituição determina que o poder público tenha mecanismos decontrole interno como forma de autotutelar seus atos e agentes. O controleé interno quan<strong>do</strong> exerci<strong>do</strong> por um outro órgão da mesma administração.Cada um <strong>do</strong>s poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário – deve manter emsua estrutura orgânica uma instância para o controle <strong>do</strong> exercício de atividadesde natureza administrativa, o que inclui a execução orçamentária. Aseventuais irregularidades ou ilegalidades devem ser comunicadas ao Tribunalde Contas, além de serem investigadas internamente. Os responsáveispelo controle interno que não procederem dessa forma são considera<strong>do</strong>s,pela Constituição, co-responsáveis pelos desvios cometi<strong>do</strong>s. (Veja Box: O<strong>Controle</strong> Interno no Legislativo, Executivo e Judiciário).Recursos administrativosO cidadão ou as organizações da sociedade civil podem acionar essasinstâncias internas de controle exercen<strong>do</strong> seu direito de petição aos poderespúblicos. Para isso, podem utilizar-se de alguns recursos adminis-19


O controle interno no Legislativo, Executivo e JudiciárioOs mecanismos de controle interno nos três poderes têm por finalidade:• Avaliar o cumprimento das metas previstas no Plano Plurianual, a execução <strong>do</strong>s programasde governo e <strong>do</strong>s orçamentos da União.• Comprovar a legalidade e avaliar os resulta<strong>do</strong>s, quanto à eficácia e eficiência, da gestãoorçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal,bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito priva<strong>do</strong>.• Exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como <strong>do</strong>s direitos ehaveres da União.• Apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.trativos – que são os meios de questionar a administração pública e pediro reexame de uma decisão em função de sua legalidade ou de seu mérito.Os recursos administrativos podem ser usa<strong>do</strong>s para controlar atos da administraçãoque versem sobre aspectos orçamentários, fundamentalmenteos da fase de execução.Tipos de recurso• Os recursos hierárquicos – são os recursos administrativos propriamenteditos, interpostos perante uma instância superior da própriaAdministração.• Os pedi<strong>do</strong>s de reconsideração – são apresenta<strong>do</strong>s à mesma autoridadeque expediu o ato, para que modifique sua decisão.• Reclamação – são apresenta<strong>do</strong>s contra atos da Administração queviolem os direitos <strong>do</strong> administra<strong>do</strong>.• Representação – são instrumentos de denúncia de irregularidadesao poder público.Representação administrativa20Qualquer cidadão, o que inclui servi<strong>do</strong>res e autoridades públicas, ou entidadeda sociedade civil regularmente constituída pode apresentar em quaisquercircunstâncias uma representação administrativa às autoridades, informan<strong>do</strong>-asde alguma ilegalidade, buscan<strong>do</strong> coibi-la e, ao mesmo tempo, responsabilizaro agente público. A representação ou a denúncia deve ser dirigidaà autoridade administrativa competente, conten<strong>do</strong> a qualificação <strong>do</strong> representante,a exposição circunstanciada <strong>do</strong>s fatos e a indicação de provas.A representação também pode ser usada como instrumento de denúnciaperante os Tribunais de Contas e, assim, servir como instrumento para fiscalizaras questões financeiras, contábeis e orçamentárias de mo<strong>do</strong> direto.


Participação OrgânicaO controle administrativo também pode ser realiza<strong>do</strong> pela participaçãodireta <strong>do</strong> cidadão na atividade administrativa, integran<strong>do</strong>-se à estruturaorgânica de alguma instância ou órgão público. A participaçãopopular é expressamente prevista em alguns conselhos, como, dentreoutros:• De administração da seguridade social, mediante gestão quadripartite.• Do Sistema Único de Saúde.• De formulação das políticas e no controle das ações da assistênciasocial, mediante organizações representativas.• De gestão <strong>do</strong> ensino público.<strong>Controle</strong> pelo poder LegislativoO controle <strong>do</strong> poder Legislativo sobre os atos <strong>do</strong> Executivo é uma atribuiçãoconstitucional em todas as esferas de governo. O Legislativo reúnetodas as condições para fiscalizar as questões relativas ao orçamento público,desde seu planejamento e elaboração, passan<strong>do</strong> por sua execução,até a avaliação e aprovação da prestação de contas <strong>do</strong> Executivo. O Tribunalde Contas, instituição que tem por tarefa avaliar as contas públicas, éum órgão auxiliar <strong>do</strong> poder Legislativo.Atuação parlamentarEste controle será mais efetivo quanto mais próximas forem as relações<strong>do</strong> cidadão com seus representantes. As comissões de Fiscalização e<strong>Controle</strong>, existentes tanto no Sena<strong>do</strong> quanto na Câmara de Deputa<strong>do</strong>s,são canais que podem ser aciona<strong>do</strong>s pelos cidadãos ou por suas organizaçõespara apresentar denúncias sobre o comportamento <strong>do</strong>s governantesem relação às questões orçamentárias.Como já foi visto anteriormente, o Congresso Nacional mantém umacomissão mista permanente para tratar <strong>do</strong>s assuntos orçamentários. AComissão <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> é um fórum de negociação entre o Executivo e oLegislativo sobre o orçamento da União. Na fase de elaboração, ela recebee emite pareceres sobre o Plano Plurianual (PPA), o projeto de Lei de DiretrizesOrçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA); acolhen<strong>do</strong>as emendas propostas pelos parlamentares. (Veja: A relação entre o Exe-cutivo e o Legislativo na elaboração <strong>do</strong> orçamento). Depois de aprova<strong>do</strong> oorçamento, cabe a essa comissão acompanhar sua aplicação, avalian<strong>do</strong> ascontas apresentadas pelo Presidente da República, bem como os projetose planos nacionais, regionais e setoriais, exercen<strong>do</strong> sobre estes acompanhamentoe fiscalização orçamentária.21


O Sena<strong>do</strong> Federal ou a Câmara <strong>do</strong>s Deputa<strong>do</strong>s podem convocar ministrosde Esta<strong>do</strong> ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordina<strong>do</strong>sà Presidência da República para prestarem contas. As comissões deFiscalização e <strong>Controle</strong>, presentes nas duas Casas, articulam-se com aComissão <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> e têm o dever de realizar audiências públicascom entidades da sociedade civil. Elas também têm competência para receberpetições, reclamações, representações ou queixas de qualquer pessoasobre as questões relativas à legalidade e ao correto uso <strong>do</strong> dinheiropúblico. Pela Constituição brasileira, as assembléias legislativas e câmarasde verea<strong>do</strong>res devem manter instâncias semelhantes.Crimes de responsabilidadeQualquer cidadão pode recorrer ao poder Legislativo para denunciaruma autoridade por crimes de responsabilidade. A denúncia deve ser feitapor escrito, assinada pelo denunciante, com firma reconhecida, acompanhadade <strong>do</strong>cumentos que comprovem os fatos alega<strong>do</strong>s e pela relaçãode testemunhas. Na impossibilidade de apresentá-los, o denunciante deveindicar local ou as condições em que possam ser encontra<strong>do</strong>s.A competência para processar e julgar crimes de responsabilidade <strong>do</strong>Presidente da República é privativa <strong>do</strong> Sena<strong>do</strong> Federal. Se o denuncia<strong>do</strong>for governa<strong>do</strong>r de Esta<strong>do</strong>, a competência é da respectiva Assembléia Legislativa.Admitida a acusação e instaura<strong>do</strong> o processo, os chefes de governoficam suspensos de suas funções até julgamento final ou por umprazo de até 180 dias.No caso <strong>do</strong>s prefeitos municipais, a competência para julgamento <strong>do</strong>scrimes de responsabilidade é <strong>do</strong> Tribunal de Justiça <strong>do</strong> respectivo Esta<strong>do</strong>.Neste caso, a iniciativa deve ser <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>. Haven<strong>do</strong> condenação,o mandato <strong>do</strong> prefeito deve ser declara<strong>do</strong> extinto pelo presidente daCâmara <strong>do</strong>s Verea<strong>do</strong>res.O processo por crime de responsabilidade de prefeitos não pode ser confundi<strong>do</strong>com o de cassação <strong>do</strong> mandato, esse sim, da alçada da Câmara deVerea<strong>do</strong>res. (Veja Box: Crime de responsabilidade e cassação de mandato).O Tribunal de Contas22Os Tribunais de Contas são órgãos auxiliares <strong>do</strong> poder Legislativo daUnião, <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s e, em alguns casos, <strong>do</strong>s municípios. Têm a função decontrolar a execução financeiro-orçamentária junto às três esferas de poder,independentemente de serem demanda<strong>do</strong>s ou não. Exercem o controleexterno <strong>do</strong>s atos da gestão contábil, financeira, orçamentária, operacionale patrimonial <strong>do</strong> poder Executivo e das entidades da administraçãoindireta, tais como autarquias, fundações, sociedades de economia mista


Crime de responsabilidade e cassação de mandatoApesar de sutis, existem diferenças entre as causas que podem levar a uma condenação porcrime de responsabilidade e as infrações político-administrativas que são capazes de sustentarum processo de cassação de mandato. Confira:Crimes de responsabilidade• A apropriação ou desvio de bens ou renda pública.• A realização de despesas não autorizadas por lei ou em desacor<strong>do</strong> com as normas financeirasvigentes.• A não prestação de contas.• A concessão de empréstimos, auxílios ou subvenções sem autorização da Câmara.• A aquisição de bens ou a realização de serviços sem concorrência ou coleta de preços,quan<strong>do</strong> previstos.Processo de cassação de mandato• Deixar de apresentar à Câmara, no devi<strong>do</strong> tempo, e em forma regular, a proposta orçamentária.• Descumprir o orçamento aprova<strong>do</strong> para o exercício financeiro.• Omitir-se ou negligenciar a defesa de bens, rendas, direitos ou interesses <strong>do</strong> municípiosujeitos à administração da prefeitura.• Utilizar-se <strong>do</strong> mandato para a prática de atos de corrupção ou de improbidadeadministrativa.e empresas públicas. Fazem isso mediante análise das prestações de contasapresentadas pelo poder Executivo e também por inspeções e auditorias.Fiscalizam a aplicação e repasse de recursos públicos, bem como asprestações de contas de quaisquer pessoas físicas ou jurídicas, públicasou privadas, que recebam tais recursos.Os Tribunais de Contas aplicam sanções como multas; imputações dedébitos obrigan<strong>do</strong> a reparação <strong>do</strong> dano; obrigação de restituição <strong>do</strong> erário;suspensão ou sustação <strong>do</strong>s atos descabi<strong>do</strong>s, determinan<strong>do</strong> prazos paraque sejam tomadas as providências necessárias à legalidade. Podem tambémencaminhar as irregularidades à apuração das autoridades competentes.No entanto, suas atividades são administrativas e não jurisdicionais.Suas decisões e as sanções que aplicam devem ser cumpridas e exigidas,mas os interessa<strong>do</strong>s podem tentar revertê-las no poder Judiciário,que é a única esfera de poder capaz de proferir julgamentos definitivos.De acor<strong>do</strong> com a Lei de Responsabilidade Fiscal, o poder Executivo deveenviar ao Tribunal de Contas o Relatório Resumi<strong>do</strong> da Execução Orçamentáriae o Relatório de Gestão Fiscal. Estes relatórios recebem um parecertécnico-contábil <strong>do</strong>s auditores <strong>do</strong> Tribunal de Contas, segui<strong>do</strong> de um parecer<strong>do</strong>s Conselheiros <strong>do</strong> tribunal, que pode ser favorável ou não. Este pareceré envia<strong>do</strong> ao poder Legislativo. Nem sempre o parecer <strong>do</strong>s conselheirossegue a orientação <strong>do</strong> parecer técnico-contábil <strong>do</strong>s auditores.23


Um parecer favorável <strong>do</strong> Tribunal de Contas não significa necessariamentea completa lisura da gestão administrativa e financeira. Há casos emque as contas são aprovadas, com recomendações e mesmo aplicação desanções como multas e obrigações de ressarcimento. Também é comumque as irregularidades que foram objeto de recomendações em um ano, serepitam no seguinte ou mesmo que outras surjam, até mais graves. A tolerância,em certos casos, pode levar a uma certa sensação de impunidade. Areprovação da prestação de contas <strong>do</strong> Executivo costuma ocorrer apenasquan<strong>do</strong> fica prova<strong>do</strong> o prejuízo ao erário e o enriquecimento ilícito da pessoaresponsável pelos recursos públicos. (Veja Da<strong>do</strong>s da pesquisa: Atuação<strong>do</strong> Tribunal de Contas, Ministério <strong>Público</strong> e poder Judiciário).Em tese, o cidadão e as organizações da sociedade civil podem acompanhare controlar o processo de prestação de contas, pois to<strong>do</strong>s os <strong>do</strong>cumentosdevem ser públicos e acessíveis – na maioria <strong>do</strong>s casos por meioeletrônico. Quan<strong>do</strong> houver dúvida quanto ao parecer envia<strong>do</strong> pelo Tribunalde Contas ao poder Legislativo, deve ser possível acessar o parecertécnico elabora<strong>do</strong> pelos auditores <strong>do</strong> Tribunal, que contém uma análisedetalhada das contas. Observan<strong>do</strong>-se alguma irregularidade, pode-se,então, recorrer ao Ministério <strong>Público</strong>.A Constituição garante a to<strong>do</strong>s os cidadãos o direito de levar aos Tribunaisde Contas denúncias de irregularidades das quais tenham conhecimento.Recebida a denúncia, o Tribunal deverá obrigatoriamente realizartodas as diligências necessárias para sua apuração.A apresentação de denúncia não exige muita formalidade: apresentação<strong>do</strong> título de eleitor váli<strong>do</strong>, se for pessoa física, ou o registro jurídico, no casode pessoa jurídica; redação da denúncia em linguagem clara e objetiva, conten<strong>do</strong>os da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> denunciante e <strong>do</strong> denuncia<strong>do</strong>, além das provas ou indíciosque demonstrem a existência <strong>do</strong> fato, se possível com <strong>do</strong>cumentos.Apesar dessa relativa facilidade, a pesquisa realizada em Tribunais de Contasde três Esta<strong>do</strong>s – Paraíba, Rio de Janeiro e Rio Grande <strong>do</strong> Sul mostra que épequena a procura por esses canais. Em muitos casos, eles são aciona<strong>do</strong>s nadefesa de direitos individuais e não por organizações da sociedade civil nadefesa <strong>do</strong>s interesses coletivos e direitos difusos. (Veja Da<strong>do</strong>s da pesquisa:Atuação <strong>do</strong> Tribunal de Contas, Ministério <strong>Público</strong> e poder Judiciário).<strong>Controle</strong> pelo Ministério <strong>Público</strong>24A Constituição atribui ao Ministério <strong>Público</strong> (MP) o papel de defensorda lei e, principalmente, <strong>do</strong> patrimônio público e social, <strong>do</strong>s interessesdifusos e coletivos. Essas atribuições conferem ao órgão ampla legitimidadepara exercer o controle <strong>do</strong> orçamento. O MP tem autonomia funcional,administrativa e financeira, atributos que lhe garantem independênciafrente aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Qualquer cida-


dão poderá apresentar representação ao MP sobre irregularidades ou ilegalidadesem atos da administração pública da qual tenham ciência, asquais o órgão, obrigatoriamente, deverá apurar.O MP trabalha em estreita relação com o Tribunal de Contas. Os relatóriosde Gestão Fiscal, exigi<strong>do</strong>s pela Lei de Responsabilidade Fiscal, têm forneci<strong>do</strong>subsídios para a ação <strong>do</strong>s procura<strong>do</strong>res de Justiça em sua atividadede controle orçamentário e <strong>do</strong>s limites de gastos de prefeitos e chefes <strong>do</strong>poder Legislativo. Mesmo diante de um parecer favorável <strong>do</strong> Tribunal deContas, o promotor de Justiça, perceben<strong>do</strong> indícios de improbidade administrativa,pode instaurar inquérito ou propor alguma medida judicial.A ação <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> pode ser por via judicial, propon<strong>do</strong> açõesperante o poder Judiciário, ou extrajudicial. Esta ocorre principalmentedurante ou depois da execução orçamentária, com pouca atuação nasfases de planejamento e elaboração <strong>do</strong> orçamento. Concretiza-se, porexemplo, na realização de audiências públicas; na formulação de recomendaçõesao agente público; em acor<strong>do</strong>s em que o agente público secompromete a adequar sua conduta à lei, sob pena de multa, registra<strong>do</strong>snos denomina<strong>do</strong>s Termos de Ajustamento de Conduta (TAC).Em muitas promotorias, a atuação extrajudicial é mais intensa que ajudicial, a qual é utilizada apenas quan<strong>do</strong> esgotadas todas as possibilidadese tentativas de acor<strong>do</strong>. A maior dificuldade da atuação judicial é alentidão <strong>do</strong> Judiciário na apreciação de ações coletivas. Embora muitassejam propostas, poucas são julgadas. Os motivos aponta<strong>do</strong>s são a sobrecargade processos sob a responsabilidade de um único juiz; a quantidadede recursos processuais disponíveis, que atrasa demasiadamente o julgamento;falta de especialização <strong>do</strong>s órgãos julga<strong>do</strong>res para as causas coletivase de improbidade administrativa, complexas, volumosas e densas;menos interesse das escrivaninhas judiciais em atuarem com zelo nos processospropostos pelo MP, por serem de natureza gratuita e não importaremno pagamento de custas judiciais para os atos <strong>do</strong> processo.Apesar disso, o forte <strong>do</strong> MP é a atuação judicial, preparada por meio deinquéritos civis públicos, integran<strong>do</strong>-se assim às formas de controle <strong>do</strong>orçamento público por meio <strong>do</strong> poder Judiciário. (Veja Da<strong>do</strong>s da pesquisa:Atuação <strong>do</strong> Tribunal de Contas, Ministério <strong>Público</strong> e poder Judiciário).O Ministério <strong>Público</strong> divide-se em Ministério <strong>Público</strong> da União, <strong>do</strong> qualfaz parte o Ministério <strong>Público</strong> Federal, cuja estrutura é mantida pelo orçamentofederal, e em Ministério <strong>Público</strong> <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s, manti<strong>do</strong>s pelos Esta<strong>do</strong>s.<strong>Controle</strong> pelo Poder JudiciárioO poder Judiciário só pode exercer ação de controle da administraçãopública quan<strong>do</strong> for solicita<strong>do</strong> a isso, por meio de ações judiciais, pelo cidadão,organizações da sociedade civil, autoridades públicas ou pelo Ministério25


<strong>Público</strong>. O controle judicial implica em exame de legalidade <strong>do</strong>s atos daadministração pública e não um exame de seu mérito, oportunidade ouconveniência. Mesmo assim, cabe ao Judiciário avaliar os motivos que determinaramo ato, bem como a exata qualificação <strong>do</strong>s mesmos.Instrumentos para o controle <strong>do</strong> orçamento por meio<strong>do</strong>s Tribunais de JustiçaOs instrumentos mais apropria<strong>do</strong>s para esse controle são ações populares,ações civis públicas e ações de responsabilidade por ato de improbidadeadministrativa. Outras ações, como manda<strong>do</strong> de segurança, açãodireta de inconstitucionalidade e mesmo ações ordinárias podem surtirefeitos sobre o orçamento, mas não têm por principal objetivo a fiscalizaçãoda probidade da administração pública.Ação popularÉ uma ação civil em que o cidadão participa diretamente da defesa <strong>do</strong>interesse da coletividade contra atos lesivos ao patrimônio público e emprol da probidade administrativa. São considera<strong>do</strong>s atos lesivos os quesão pratica<strong>do</strong>s por agente que não possui atribuição legal (competência)para fazê-lo; os que não seguem todas as formalidades indispensáveispara sua realização; aqueles cujo resulta<strong>do</strong> implica violação de lei; os quenão têm motivos justificáveis e os pratica<strong>do</strong>s visan<strong>do</strong> fim diverso <strong>do</strong> previstona competência <strong>do</strong> agente.A Constituição garante a qualquer cidadão ingressar com ação popular,bastan<strong>do</strong> que esteja no gozo de seus direitos políticos, comprova<strong>do</strong>pelo título de eleitor váli<strong>do</strong>. A ação será gratuita, sem custas judiciaispara o cidadão, a não ser que seja comprovada sua má-fé.Apesar de o titular da ação popular ser sempre o cidadão, muitas vezes,em razão <strong>do</strong> interesse público envolvi<strong>do</strong>, a atuação <strong>do</strong> Ministério<strong>Público</strong> é importante, seja para garantir sua continuidade, seja auxilian<strong>do</strong>na produção de provas. O sucesso de uma ação popular depende de ointeresse público estar bem demonstra<strong>do</strong> no processo.Ação de responsabilidade por ato de improbidadeadministrativa26Este tipo de ação procura responsabilizar o administra<strong>do</strong>r público pelosseus atos considera<strong>do</strong>s desonestos. Os atos de improbidade administrativasão previstos na Lei nº 8.429/92 e podem ser de três tipos: enriquecimentoilícito; lesão aos cofres públicos e que atentem contra os princípios da administraçãopública. A má gestão e a aplicação inadequada <strong>do</strong>s recursos


também podem ser consideradas improbidades administrativas, assim comonão garantir os meios para a sociedade participar <strong>do</strong> processo de elaboração<strong>do</strong> orçamento, quan<strong>do</strong> esta participação é garantida por lei.Esse tipo de ação tem de ser proposta pelo Ministério <strong>Público</strong> ou pelapessoa jurídica interessada. O cidadão ou entidades da sociedade civilpodem fazer representação à autoridade competente, denuncian<strong>do</strong> as irregularidades,de mo<strong>do</strong> a provocar uma ação por improbidade, mas nãopodem propô-la diretamente.O objetivo desta ação é a reparação direta <strong>do</strong> dano, com a declaraçãoda existência de um ato de improbidade administrativa previsto na lei.Por isso, é um instrumento mais adequa<strong>do</strong> para exercer a fiscalização <strong>do</strong>sagentes públicos e, conseqüentemente, o controle orçamentário por parte<strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> e da sociedade. A pena é fixada pelo juiz e develevar em conta o tamanho <strong>do</strong> dano causa<strong>do</strong> ao erário e a vantagem patrimonialobtida pelo agente. Pode ser de ressarcimento integral <strong>do</strong> dano,perda de bens e valores obti<strong>do</strong>s ilicitamente, além de perda da funçãopública, suspensão <strong>do</strong>s direitos políticos, pagamento de multa, proibiçãode estabelecer contratos com o poder público, receber benefícios, incentivosfiscais ou creditícios.Ação civil públicaEste tipo de ação visa a defesa <strong>do</strong>s interesses difusos e coletivos. Comoisso inclui o patrimônio público e também pode ser usada para exercercontrole <strong>do</strong> orçamento. Pode ser proposta pelos poderes Executivos municipais,estaduais e federal, pelas entidades da administração indireta epor associações civis legalmente constituídas há mais de um ano, além <strong>do</strong>Ministério <strong>Público</strong>. No entanto, a lei que disciplina sua utilização (Lei nº7.347/85), determina que o dinheiro obti<strong>do</strong> com condenações por estetipo de ação deverá ser destina<strong>do</strong> ao Fun<strong>do</strong> de Direitos Difusos, ou seja,tem caráter de indenização à coletividade pela lesão a um interesse difusoou coletivo. Isso impossibilita o uso desse instrumento para recuperaçãode danos causa<strong>do</strong>s ao patrimônio público, pois não há ressarcimentoà pessoa jurídica lesada.A ação civil pública prevê a possibilidade de um acor<strong>do</strong> em que osagentes públicos e particulares se comprometam, perante o Ministério<strong>Público</strong>, a corrigirem os erros existentes e repararem a situação irregular,firman<strong>do</strong> um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Estipula-se tambémuma multa em caso de descumprimento <strong>do</strong> acor<strong>do</strong>, situação em queo Ministério <strong>Público</strong> pode exigir na Justiça o cumprimento das obrigaçõesacertadas no TAC. Na ação de responsabilidade por ato de improbidadeadministrativa, não existe essa possibilidade, caben<strong>do</strong> apenas ao juiz decidirsobre a extinção e o julgamento <strong>do</strong> processo.27


Da<strong>do</strong>s da pesquisa: Atuação <strong>do</strong>Tribunal de Contas, Ministério<strong>Público</strong> e poder JudiciárioOs da<strong>do</strong>s a seguir são resulta<strong>do</strong>s da pesquisa realizada pela AssociaçãoDireito ao Direito sobre instrumentos jurídicos de controle deorçamento público e a atuação <strong>do</strong> Tribunal de Contas, Ministério <strong>Público</strong>e poder Judiciário em três Esta<strong>do</strong>s – Paraíba, Rio de Janeiro e RioGrande <strong>do</strong> Sul.Agradecemos aos procura<strong>do</strong>res que responderam ao questionário envia<strong>do</strong>,aos presidentes e funcionários <strong>do</strong>s Tribunais de Contas <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>sda Paraíba, Rio de Janeiro e Rio Grande <strong>do</strong> Sul pelo atendimento da<strong>do</strong>aos pesquisa<strong>do</strong>res e aos promotores desses mesmos Esta<strong>do</strong>s pelas entrevistasconcedidas para essa pesquisa.Atuação <strong>do</strong> Tribunal de ContasAs informações aqui apresentadas são relativas aos pareceres prévioscontrários à aprovação de contas municipais anuais referentes a prestaçõesde contas <strong>do</strong>s exercícios financeiros de 1998 a 2001, aprecia<strong>do</strong>s pelosTribunais entre 1999 e 2002 (mês de agosto).Paraíba28Foram analisa<strong>do</strong>s 600 pareceres sobre prestações de contas de Executivosmunicipais e cerca de 25% recomendavam a não aprovação das contaspelas respectivas câmaras municipais – número expressivo, já que aParaíba tem 223 municípios (Censo Demográfico, 2000). Esse levantamentosó foi possível porque os pareceres <strong>do</strong> TCE da Paraíba são razoavelmentedetalha<strong>do</strong>s, tratam as questões de maneira minuciosa, identifican<strong>do</strong>os desvios de verbas públicas, a má gestão administrativa e financeiraou mesmo certas irregularidades que não causam prejuízo ao erário.Em sua maioria, os pareceres desfavoráveis apontavam para irregularidadesna destinação <strong>do</strong>s recursos (296 casos). Foram identifica<strong>do</strong>s, também,falta de controle <strong>do</strong> orçamento público e o não cumprimento deprocedimentos legais para a realização <strong>do</strong> gasto público (228 casos).


Rio de JaneiroDos 157 pareceres sobre contas municipais identifica<strong>do</strong>s, 23 versavam sobrecontas rejeitadas pelo Tribunal de Contas – o Esta<strong>do</strong> tem 91 municípios.A análise <strong>do</strong>s pareceres desfavoráveis mostra que, em muitos casos, omunicípio havia incorri<strong>do</strong> a mesma irregularidade em anos consecutivos,já apontadas pelo Tribunal de Contas, e que persistiam apesar das recomendações<strong>do</strong> órgão.Rio Grande <strong>do</strong> SulNeste Esta<strong>do</strong>, foi constata<strong>do</strong> que o Tribunal de Contas demora a emitir ospareceres sobre a prestação de contas <strong>do</strong>s Executivos municipais e o acessoda sociedade civil à íntegra <strong>do</strong> conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s seus pareceres é muito difícil.Os atrasos ocorrem porque o regimento interno <strong>do</strong> Tribunal de Contas<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> determina que o parecer prévio sobre as contas municipais deveser emiti<strong>do</strong> até 180 dias após os últimos relatórios de inspeção serem anexa<strong>do</strong>s.Porém, os procedimentos de inspeção demoram a ser realiza<strong>do</strong>s, retardan<strong>do</strong>to<strong>do</strong> o processo e reduzin<strong>do</strong> a eficácia <strong>do</strong>s mecanismos de controledas contas públicas. Como as Câmaras Municipais só podem julgar a prestaçãode contas <strong>do</strong>s Executivos após a análise prévia <strong>do</strong> Tribunal de Contase essa demora impede a ação preventiva de controle e prejudica a aplicaçãode sanções aos maus administra<strong>do</strong>res como obrigações de reparação, suspensão<strong>do</strong> exercício <strong>do</strong> cargo e mesmo sua inelegibilidade.Entre setembro de 1999 e 2002, o TCE gaúcho emitiu 1034 pareceres;desses, apenas 40 eram sobre os exercícios de 1998 e 1999, nenhum erasobre os exercícios de 2000 e 2001. A maioria, 994, era relativa a perío<strong>do</strong>santeriores a 1998. Entre esses 40 pareceres <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> 1998-1999, apenascinco recomendavam a não aprovação das contas por parte das câmarasmunicipais, mas não relatava os motivos.A participação da sociedade civil juntoao Tribunal de ContasA pesquisa foi realizada entre primeiro de janeiro de 1998 e 26 deagosto de 2002, nos três Esta<strong>do</strong>s.ParaíbaPelas regras desse Tribunal de Contas, as denúncias podem ter quatrotipos distintos de encaminhamentos quan<strong>do</strong> julgadas: improcedência,quan<strong>do</strong> não confirma<strong>do</strong> pelo Tribunal o seu teor; procedência, quan<strong>do</strong>29


confirmada a irregularidade; arquivamento nos casos de não prosseguimento<strong>do</strong> processo; remessa ao órgão competente para o julgamentoquan<strong>do</strong> não cabe o Tribunal de Contas analisar determinada denúncia.Das 31 denúncias realizadas por cidadãos individuais ou organizaçõesda sociedade civil julgadas <strong>do</strong> perío<strong>do</strong>, 16 foram consideradasimprocedentes, sete foram arquivadas, seis foram consideradas procedentese duas foram remetidas aos órgãos competentes para julgamentoposterior.A maioria, 27 denúncias, tinha por objetivo a defesa <strong>do</strong>s interessesindividuais e não os interesses difusos e coletivos: 11 eram relativas airregularidades em concursos públicos ou contratação de pessoal semconcurso; sete eram sobre irregularidade de pagamentos e contrataçõesde servi<strong>do</strong>res; duas eram relativas a demissões e uma à progressão funcionalna carreira; cinco questionavam licitações municipais. Apenas quatrorelacionavam-se diretamente a irregularidades no emprego <strong>do</strong> dinheiropúblico – compra de objetos, superfaturamento de obras e acusações denepotismo.Rio de Janeiro30Neste Tribunal de Contas, as denúncias podem ter cinco encaminhamentos:procedentes; improcedentes; verificação posterior, quan<strong>do</strong> anexadasà prestação de contas <strong>do</strong> município; verificação em procedimentode inspeção, quan<strong>do</strong> são determinadas diligências para apuração da denúncia;e arquivadas.Das 69 denúncias analisadas, oito foram julgadas procedentes, 16improcedentes, oito foram objeto de verificação posterior no processo deprestação de contas, 31 foram verificadas em procedimento de inspeção eapenas quatro foram arquivadas. Uma das denúncias foi encaminhada aoórgão competente para julgamento e a outra foi notificada ao prefeitopara que prestasse esclarecimentos.O Tribunal de Contas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro encaminha as denúnciasde mo<strong>do</strong> que possam ser analisadas em conjunto com o processode prestação de contas <strong>do</strong> município ou com as inspeções ordinárias. Adenúncia também pode ser julgada após a coleta de provas em inspeçõesespeciais ou extraordinárias. Com isso, as prestações de contas que envolvemdenúncias são analisadas com maiores cuida<strong>do</strong>s.Entre as denúncias analisadas 12 eram sobre irregularidades na destinaçãoou repasse de verbas; dez indicavam irregularidades relacionadas coma gestão administrativa e financeira <strong>do</strong> bem público e oito eram sobre irregularidadesrelativas ao pagamento de funcionários públicos. Foram encontra<strong>do</strong>sseis casos sobre irregularidades em licitações e outros seis emcontratações. Embora a defesa de interesses priva<strong>do</strong>s estivesse presente,


oa parte das denúncias teve por objeto a defesa <strong>do</strong> interesse público, buscan<strong>do</strong>assegurar a destinação legalmente prevista para os recursos ou denuncian<strong>do</strong>o favorecimento priva<strong>do</strong> em detrimento <strong>do</strong> interesse público.Rio Grande <strong>do</strong> SulApesar de solicitação formal mediante ofício ao Presidente <strong>do</strong> Tribunalde Contas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de acesso às denúncias já julgadas, o pedi<strong>do</strong> foinega<strong>do</strong>, em violação ao princípio da publicidade da administração pública.De acor<strong>do</strong> com os relatórios de atividades desse Tribunal, apenas umadenúncia foi a julgamento em 2001 e três no ano 2000. Não há registrosrelativos a 1999 e 1998.Atuação <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>Ministério <strong>Público</strong> FederalPara conhecer a atuação <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> Federal (MPF) nocontrole <strong>do</strong> orçamento público, bem como sua relação com a sociedadecivil foi realizada pesquisa por meio de um questionário, o qual foi respondi<strong>do</strong>por 14 de seus membros.O MPF tem procura<strong>do</strong> formar grupos especializa<strong>do</strong>s para as diferentesáreas de atuação. Os de controle <strong>do</strong> orçamento já existem em sete divisõesregionais. Onde esse grupo ainda não foi cria<strong>do</strong>, essa tarefa é realizadapelo grupo especializa<strong>do</strong> na defesa <strong>do</strong>s interesses difusos e coletivos,presente em todas as divisões <strong>do</strong> MPF.Um <strong>do</strong>s instrumentos judiciais mais utiliza<strong>do</strong>s pelos procura<strong>do</strong>res <strong>do</strong>Ministério <strong>Público</strong> é a ação de responsabilidade por ato de improbidadeadministrativa, considerada de maior eficácia no controle <strong>do</strong> orçamento,principalmente quan<strong>do</strong> se trata de restituição ao patrimônio público. Aação civil pública é outro instrumento judicial utiliza<strong>do</strong> freqüentemente.(Veja: <strong>Controle</strong> pelo poder Judiciário).Ministério <strong>Público</strong> nos Esta<strong>do</strong>sA estrutura <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> (MPE) nos três Esta<strong>do</strong>s pesquisa<strong>do</strong>s émuito semelhante. Os MPE contam com Centros de Apoio Operacional (CAO),organiza<strong>do</strong>s dividi<strong>do</strong>s por temas, como meio ambiente, infância e juventude,cidadania, patrimônio público etc., que geralmente se situam na capital<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, atuan<strong>do</strong> de mo<strong>do</strong> centraliza<strong>do</strong> em apoio aos promotores de Justiçadas Comarcas. Há também promotorias especializadas nessas áreas, comatuação regionalizada e que normalmente têm uma estrutura aquém <strong>do</strong>necessário, frente ao grande volume de trabalho existente.31


Em matéria de improbidade administrativa, os casos aponta<strong>do</strong>s comomais comuns nos três Esta<strong>do</strong>s foram de má aplicação <strong>do</strong>s recursos públicos,desvios de verbas, licitações (ausência, fraude ou superfaturamento), concursospúblicos, contratações temporárias, diárias e remunerações despropositadas;publicidade pessoal; repasse às câmaras municipais; aplicaçãodas percentagens mínimas em ensino; limites de gastos das verbas <strong>do</strong>FUNDEF; não respeito às leis financeiras na execução orçamentária. Foramaponta<strong>do</strong>s como muito comuns casos de fracionamento de licitação, quesão muito difíceis de detectar e provar o desvio de bens (e mensurar a vantagemobtida), ainda que, de qualquer forma, o ato seja ilegal.Como as informações chegam ao Ministério <strong>Público</strong>Cerca de 20% das ações <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> (MP) têm como ponto departida denúncias apresentadas por cidadãos ou organizações da sociedadecivil sobre irregularidades cometidas contra o patrimônio público em seu senti<strong>do</strong>amplo – patrimônio econômico-financeiro, ambiental, histórico, artístico,estético, turístico e cultural. As demais ações são motivadas, em igualproporção, por notícias veiculadas nos meios de comunicação; por representaçãoencaminhada por órgão da própria administração pública; e pelos relatórios<strong>do</strong>s Tribunais de Contas – o MP tem acesso a to<strong>do</strong>s os seus julga<strong>do</strong>s.Atuação <strong>do</strong> Tribunal de JustiçaA pesquisa realizada nos Tribunais de Justiça <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s da Paraíba,Rio de Janeiro e Rio Grande <strong>do</strong> Sul procurou averiguar como o poder Judiciáriovem sen<strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong> pela sociedade como instrumento de controle<strong>do</strong> orçamento. Os Tribunais de Justiça são órgãos máximos <strong>do</strong> poder Judiciárionos Esta<strong>do</strong>s, responsáveis por julgar processos em fase de recursos epor receber denúncias de crimes pratica<strong>do</strong>s por prefeitos municipais e demaisautoridades públicas. (Veja Box: Sobrecarga no Ministério <strong>Público</strong>).Foram analisadas as decisões <strong>do</strong>s Tribunais, identifican<strong>do</strong>-se os instrumentosjurídicos utiliza<strong>do</strong>s e os interesses que se buscava tutelar, quem eram osdemandantes e os demanda<strong>do</strong>s bem como os resulta<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s.Paraíba32Realizada por meio <strong>do</strong> site <strong>do</strong> Tribunal de Justiça da Paraíba, a pesquisaprocurou ações transitadas em julga<strong>do</strong>, ou seja, já decididas e não maispassíveis de recurso. Foram encontradas 45 ações referentes a questõesde orçamento público, todas propostas a partir de 1998. Desse total, 14eram ações civis públicas, dez eram ações de responsabilidade por ato deimprobidade administrativa e três eram ações populares.


Sobrecarga <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>Até o final de 2002, apenas os prefeitos eram processa<strong>do</strong>s diretamente perante os Tribunaisde Justiça, e não nos juízos singulares de primeira instância, das Comarcas. Com a Lei nº 10.628,de 24 de dezembro de 2002, esse “benefício”, que estabelece a competência por prerrogativa defunção, foi estendi<strong>do</strong> a ex-prefeitos, funcionários e autoridades públicas, bem como ex-funcionáriose ex-autoridades.Com essa lei, to<strong>do</strong>s os processos sobre improbidade administrativa em curso e os que venhama ser instaura<strong>do</strong>s sobre servi<strong>do</strong>res públicos municipais, serão julga<strong>do</strong>s pelos Tribunais.Serão tarefas <strong>do</strong>s procura<strong>do</strong>res de Justiça que atuam nos Tribunais e não mais <strong>do</strong>s promotoresde primeira instância, sobrecarregan<strong>do</strong> o Ministério <strong>Público</strong> a ponto de dificultar sua atuaçãocontra a corrupção e improbidade administrativa. A Lei nº 10.628/02, atualmente, é objeto deduas Ações Diretas de Inconstitucionalidade que aguardam julgamento no Supremo TribunalFederal. Uma delas foi proposta pela Associação Nacional <strong>do</strong>s Membros <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> –CONAMP. A outra, associada à primeira para serem julgadas em conjunto, foi proposta pelaAssociação <strong>do</strong>s Magistra<strong>do</strong>s Brasileiros. Seu relator é o ministro Sepúlveda Pertence.Treze das 14 ações civis públicas haviam si<strong>do</strong> propostas pelo Ministério<strong>Público</strong> e uma por município, na tentativa de ressarcimento <strong>do</strong> patrimôniopúblico. Dez delas foram utilizadas para a execução de decisão <strong>do</strong> Tribunalde Contas e apenas três obtiveram sucesso – as demais foram consideradasum meio inadequa<strong>do</strong> para ressarcimento <strong>do</strong> erário, embora tal interpretaçãonão tenha si<strong>do</strong> unânime. Das quatro ações civis públicas restantes, duasforam julgadas procedentes, ou seja, o pedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>, autorda ação, foi acolhi<strong>do</strong>. Em suma, pedia-se que fosse respeita<strong>do</strong> o investimentomínimo em Educação exigi<strong>do</strong> pela Constituição; na outra, pedia-sea condenação de agente público por ter desvia<strong>do</strong> recursos públicos.Não foi encontrada no Tribunal de Justiça da Paraíba qualquer açãocivil pública proposta por associações civis na defesa de interesses difusose coletivos relaciona<strong>do</strong>s ao orçamento público – um indicativo <strong>do</strong>distanciamento <strong>do</strong> Judiciário em relação à sociedade. Ações popularescom esse objetivo também eram raras – apenas três foram encontradas.Uma delas, julgada procedente, representa um exemplo bem-sucedi<strong>do</strong> daatuação de um cidadão no controle <strong>do</strong> orçamento público, obten<strong>do</strong> umadecisão que anulava o ato, considera<strong>do</strong> ilegal, pratica<strong>do</strong> pelo agente público,impedin<strong>do</strong> assim lesão ao patrimônio público.As ações de responsabilidade por ato de improbidade administrativa,por meio das quais se busca proteger o erário de danos provoca<strong>do</strong> poragentes públicos, em sua maioria foram propostas por municípios contraex-prefeitos – em geral, o prefeito eleito buscan<strong>do</strong> a condenação <strong>do</strong> antecessorpor falhas em sua gestão. Seis em dez ações obtiveram os resulta<strong>do</strong>sespera<strong>do</strong>s.33


Rio de JaneiroNeste Tribunal de Justiça, a sociedade civil tem si<strong>do</strong> mais presente. Das51 ações encontradas, 26 são ações populares, oito são ações civis públicase duas são manda<strong>do</strong>s de segurança.Entre os motivos das ações populares destacam-se as licitações, términode obras, cassação de alvará, irregularidades na publicidade, na comprade materiais e na remuneração de pessoal. No entanto, das 26 açõespopulares, apenas sete foram julgadas procedentes. A maior parte foi rejeitadapor defenderem interesses particulares, e não o patrimônio públicoou à moralidade administrativa, que deve ser o objetivo de uma açãopopular. Outras tiveram insucesso por pretender obrigar o administra<strong>do</strong>ra fazer algo, como terminar uma obra iniciada, quan<strong>do</strong> seu objetivo deveriaser o de anular ato lesivo ao patrimônio publico em senti<strong>do</strong> amplo.Das que tiveram sucesso, uma obteve a anulação de licitação para a comprade produto de uma empresa que não existia legalmente e pertencia aum verea<strong>do</strong>r; outra foi contra o uso da máquina e <strong>do</strong> patrimônio públicopara promoção pessoal.As quatro ações civis públicas encontradas foram postuladas peloMinistério Publico e apenas uma foi julgada improcedente. As procedentesversavam sobre uso irregular de material público destina<strong>do</strong> à educação;licitação feita de mo<strong>do</strong> irregular; concessão de pensão vitalícia aviúva <strong>do</strong> ex-prefeito e ilegalidade de lei municipal. Apenas o caso de investimentoaquém <strong>do</strong> mínimo constitucional em educação foi considera<strong>do</strong>improcedente, porque houve compensação relativa ao quadriênio anteriorem exercício seguinte, quan<strong>do</strong> o Município atingiu e ultrapassou olimite constitucional, conforme informação <strong>do</strong> Tribunal de ContasRio Grande <strong>do</strong> Sul34A pesquisa realizada no Tribunal de Justiça deste Esta<strong>do</strong> apontou em 31ações de responsabilidade por ato de improbidade administrativa, nove açõespopulares, oito ações civis públicas e qautro manda<strong>do</strong>s de segurança.Das ações de responsabilidade por ato de improbidade administrativajulgadas procedentes contra prefeitos municipais, destacam-se casos como:promoção pessoal; desvio ou emprego irregular de recursos; irregularidadesem licitação; <strong>do</strong>ação irregular de bens públicos; concessão ilegal debenefício fiscal; não prestação de contas; irregularidades nos pagamentode servi<strong>do</strong>res.As ações de responsabilidade propostas pelo Ministério <strong>Público</strong> contraprefeitos acusa<strong>do</strong>s de usar recursos públicos para contratar advoga<strong>do</strong>spara sua defesa em processos de improbidade administrativa foramjulgadas improcedentes, com o argumento de que não haveria enrique-


cimento ilícito, vantagem patrimonial <strong>do</strong> prefeito, nem lesão ao erário,mas sim a preservação <strong>do</strong> mandato público, o que seria de interesse <strong>do</strong>município.Neste Tribunal de Justiça, as ações populares têm si<strong>do</strong> usadas pelasociedade para exercer o controle <strong>do</strong> orçamento público, até mesmo emsua fase de elaboração. Entre as questões tratadas estão irregularidadeem pagamentos e autoridades públicas e em contratações de servi<strong>do</strong>res;irregularidades em licitações; e atos lesivos ao patrimônio público. Ilustran<strong>do</strong>a tentativa de se controlar o orçamento desde sua elaboração, foiencontrada ação popular que procurava implantar em nível estadual o<strong>Orçamento</strong> Participativo, que embora não trate de questão municipal éinteressante ser citada pelo seu objeto.As ações civis públicas também vêm sen<strong>do</strong> utilizadas para o controle<strong>do</strong> orçamento público no Esta<strong>do</strong>. Das oito encontradas, sete foram julgadasprocedentes quanto aos seguintes objetos: uso de dinheiro públicopara fins particulares; controle da aplicação de recursos; licitação; remuneraçãode servi<strong>do</strong>res.Entre os manda<strong>do</strong>s de segurança, há um caso bem-sucedi<strong>do</strong> de carátercoletivo, impetra<strong>do</strong> por uma associação de funcionários municipaisem defesa <strong>do</strong> direito de seus membros (pagamento de vencimentos noprazo da Lei Orgânica) contra a omissão da autoridade municipal.35


Três experiências decontrole social <strong>do</strong>orçamento público37


IntroduçãoAgradecemos à colaboração das organizações <strong>do</strong> Fórum Nacionalde Participação Popular que muito contribuiu para a escolha dessasexperiências.O orçamento público é a concretização <strong>do</strong>s programas políticos de umgoverno e <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s cidadãos. Quan<strong>do</strong> se fala <strong>do</strong> controle social <strong>do</strong>orçamento público, trata-se de ampliar a esfera <strong>do</strong>s que têm poder para decidir,tornan<strong>do</strong> pública a arena <strong>do</strong> debate sobre as prioridades, para que nela,as múltiplas reivindicações sociais possam se expressar. É por meio deste debateque tais setores podem conquistar o reconhecimento público de quesuas reivindicações são justas e inseri-las entre as prioridades <strong>do</strong> governo.São vários os espaços que vêm sen<strong>do</strong> construí<strong>do</strong>s nas últimas décadaspara o controle social <strong>do</strong> orçamento, entre eles, os conselhos de gestão depolíticas públicas e os fóruns populares de acompanhamento <strong>do</strong> orçamento.Os conselhos de políticas públicas são responsáveis legalmentepelo monitoramento <strong>do</strong>s recursos públicos e os fóruns são organizaçõesespontâneas da sociedade civil para a defesa de suas propostas para oorçamento e o acompanhamento da execução orçamentária.Diferencia<strong>do</strong>s entre si quanto à sua organização e às normas legais para oseu funcionamento, são espaços de participação popular no planejamento,na alocação <strong>do</strong>s recursos e no monitoramento da execução orçamentária.Os três estu<strong>do</strong>s de caso apresenta<strong>do</strong>s a seguir representam parte dadiversidade das formas de organização popular: o Conselho Municipal deSaúde em Passo Fun<strong>do</strong>, o Fórum em Defesa da Cidadania de Lagoa Seca eo Fórum Popular de Acompanhamento <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> Municipal <strong>do</strong> Riode Janeiro. Foram escolhi<strong>do</strong>s pela sua competência na utilização <strong>do</strong>s instrumentoslegais para o controle social <strong>do</strong> orçamento público municipal epor se situarem em Esta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> país bastante díspares entre si.Lagoa Seca, na região Nordeste <strong>do</strong> País, é um pequeno municípiorural, com cerca de 24 mil habitantes, pobres, em sua maioria, pois arenda é insuficiente em cerca de 83% <strong>do</strong>s <strong>do</strong>micílios 1 . A previsão <strong>do</strong>orçamento municipal para o ano de 2002 era de R$ 7,0 milhões, ou seja,cerca de R$ 290,00 por habitante, por ano.1 IBGE, Censo 2000. Índicesde Condições de Vida.39


2 Idem.3 Idem.Passo Fun<strong>do</strong> é um município da região Sul, de porte médio, pre<strong>do</strong>minantementeurbano, com 168.458 habitantes. Dentre os <strong>do</strong>micílios, cercade 38% têm renda insuficiente 2 , bem aquém <strong>do</strong> índice de Lagoa Seca e,mais próximo <strong>do</strong> índice <strong>do</strong> Rio de Janeiro. O orçamento municipal previstopara 2002 era aproximadamente de R$ 84 milhões, quase R$ 500,00por habitante, por ano.O Rio de Janeiro, na região Sudeste, é a segunda maior cidade <strong>do</strong>País, com 5.857.904 habitantes e um orçamento estima<strong>do</strong> próximo deR$ 6,5 bilhões para 2002, o que equivale a quase R$ 1.110,00 por habitante,por ano, portanto, uma capacidade de investimento da administraçãomunicipal bastante superior aos <strong>do</strong>s outros <strong>do</strong>is municípios. Poroutro la<strong>do</strong>, o índice de <strong>do</strong>micílios com renda insuficiente nesse municípioé de 31,2% 3 . O Rio é a cidade mais desenvolvida <strong>do</strong> ponto de vistaeconômico entre as três, o que não isenta a sua população de viver gravesproblemas sociais.Em municípios tão díspares entre si <strong>do</strong> ponto de vista <strong>do</strong> tamanho dapopulação e <strong>do</strong> desenvolvimento econômico local e regional, as experiênciastambém são diferenciadas entre si, apesar de se utilizarem <strong>do</strong>s mesmosmecanismos legais para o controle social <strong>do</strong> orçamento público.Os estu<strong>do</strong>s revelam uma multiplicidade de méto<strong>do</strong>s construí<strong>do</strong>s parao acompanhamento <strong>do</strong> orçamento público. Revelam também como aindasão muitas as dificuldades para a fiscalização da alocação <strong>do</strong>s recursos epara que as demandas populares sejam incorporadas ao orçamento público,em qualquer um <strong>do</strong>s casos. São experiências, porém, que apontampara a potencialidade <strong>do</strong> controle social <strong>do</strong> orçamento público como formade tornar pública a arena de debate sobre as prioridades sociais.Os artigos estão organiza<strong>do</strong>s nos seguintes itens: (I) Cenário social epolítico da cidade com uma breve descrição <strong>do</strong>s problemas mais relevantesda cidade; (II) A história e a organização <strong>do</strong> ator social estuda<strong>do</strong> traçan<strong>do</strong>a trajetória que o levou a decidir exercer o controle social <strong>do</strong>orçamento público; (III) o processo de monitoramento <strong>do</strong> orçamento, destacan<strong>do</strong>a relação desse ator social com a Prefeitura, a Câmara de Verea<strong>do</strong>rese o Ministério <strong>Público</strong>; e (IV) um balanço da experiência com suasconquistas e dificuldades.Soma<strong>do</strong>s, eles apontam as muitas possibilidades de fazer <strong>do</strong> debatepúblico sobre o orçamento um caminho para a efetivação <strong>do</strong>s direitos.40


Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong><strong>do</strong> Rio de JaneiroEsse texto foi elabora<strong>do</strong> por Junia da Cunha Lyrio a partir das pesquisasrealizadas por Marjorie de Almeida Botelho, Renato Elman e Vera MariaGalvão <strong>do</strong> Rio Apa. Agradecemos as entrevistas concedidas pelos coordena<strong>do</strong>res<strong>do</strong> Fórum Popular <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro, por participantesda Companhia <strong>do</strong> Teatro <strong>do</strong> Oprimi<strong>do</strong>, da Associação de Mora<strong>do</strong>res<strong>do</strong> Leme, <strong>do</strong> Grupo pela Vida e pelos verea<strong>do</strong>res. Agradecemos tambémos membros <strong>do</strong> Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro queforam entrevista<strong>do</strong>s e que possibilitaram a realização deste trabalho, bemcomo as contribuições de Orlan<strong>do</strong> Alves <strong>do</strong>s Santos Junior, na leitura críticae sugestões ao texto.ResumoRetrata-se a experiência <strong>do</strong> Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro,buscan<strong>do</strong> identificar seus avanços no que concerne à maior transparência nautilização <strong>do</strong>s recursos públicos, à ampliação da participação popular e àinversão de prioridades na definição <strong>do</strong>s investimentos sociais. A partir datrajetória <strong>do</strong> Fórum, busca-se discutir os avanços e desafios para a ampliaçãoda participação social na elaboração e na execução <strong>do</strong> orçamento <strong>do</strong> município<strong>do</strong> Rio de Janeiro. Constata-se que a organização e a dinâmica implementadapelo Fórum possibilitaram a constituição de um embrião de esferapública, amplian<strong>do</strong> o espaço de controle social sobre o orçamento público. OFórum é um novo ator social, que possibilita alterar a agenda de prioridadesem disputa na cena política <strong>do</strong> Rio de Janeiro, na perspectiva <strong>do</strong> enfrentamentodas desigualdades sociais e <strong>do</strong> fortalecimento da dinâmica democrática.IntroduçãoNeste artigo busca-se identificar, no processo de monitoramento dasfinanças públicas, os instrumentos jurídicos utiliza<strong>do</strong>s, os atores envolvi<strong>do</strong>s,os objetivos <strong>do</strong> controle exerci<strong>do</strong>, os resulta<strong>do</strong>s obti<strong>do</strong>s e as dificuldadesencontradas no processo.41


Neste trabalho, apresentamos o estu<strong>do</strong> de caso <strong>do</strong> Fórum Popular de<strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro. O Fórum é organiza<strong>do</strong> como uma rede, constituí<strong>do</strong>por organizações sociais com diferentes perfis em termos de objetivose da participação de segmentos sociais organiza<strong>do</strong>s. O estu<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong>foi resulta<strong>do</strong> de uma análise <strong>do</strong>cumental e entrevistas com integrantes <strong>do</strong>Fórum, com verea<strong>do</strong>res e membros <strong>do</strong> poder Executivo municipal.Cenário social e político da cidade <strong>do</strong>Rio de Janeiro42Segun<strong>do</strong> o Censo <strong>do</strong> IBGE, no ano de 2000 o município <strong>do</strong> Rio deJaneiro possuía 5.857.904 habitantes, sen<strong>do</strong> a 2.ª maior cidade brasileirae a 3.ª maior da América <strong>do</strong> Sul (após São Paulo e Buenos Aires). Emtermos gerais, a cidade <strong>do</strong> Rio de Janeiro ostenta eleva<strong>do</strong>s índices sociais,principalmente comparan<strong>do</strong>-se com os indica<strong>do</strong>res brasileiros, <strong>do</strong> qual aeducação é um bom exemplo. Cerca de 95,8% da sua população é alfabetizadae existe uma boa rede escolar na cidade, com cerca de 1.696 estabelecimentosde ensino pré-escolar, 2.204 <strong>do</strong> ensino fundamental e 598<strong>do</strong> ensino médio. A cidade é conhecida como capital <strong>do</strong> turismo no Brasil,posição que vem progressivamente perden<strong>do</strong>, sobretu<strong>do</strong> em razão <strong>do</strong> agravamentoda violência urbana e da deterioração <strong>do</strong> seu meio ambiente.Neste ponto, é impossível não lembrar que a cidade possui alguns <strong>do</strong>scartões postais mais conheci<strong>do</strong>s <strong>do</strong> País: o Pão de Açúcar, o Corcova<strong>do</strong> eo Maracanã, além da festa mais popular <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, o Carnaval. O município<strong>do</strong> Rio de Janeiro possui, ainda, um <strong>do</strong>s portos mais movimenta<strong>do</strong>s daAmérica Latina e o segun<strong>do</strong> maior movimento de aeronaves em seus <strong>do</strong>isaeroportos (Santos Dumont e Galeão - Antônio Carlos Jobim).Olhan<strong>do</strong> a Cidade Maravilhosa com mais profundidade, é possível concluirque não é tão maravilhosa assim, pelo menos para to<strong>do</strong>s que nela vivem.A imagem de uma cidade desigual talvez seja a imagem que melhor sintetizesua dinâmica social, política e econômica. Assim, embora o Rio de Janeiropossa ser considera<strong>do</strong> uma das cidades brasileiras com melhor qualidade devida, o fato é que essa qualidade de vida é desigual nas suas diferentes áreas,revelan<strong>do</strong> um alto grau de heterogeneidade no seu interior. A própria prefeiturada cidade, no relatório sobre Desenvolvimento humano e condições devida na cidade <strong>do</strong> Rio de Janeiro e seus bairros, afirma que há fortes indíciospara crer que “em algumas áreas, as condições de vida sejam similares às dasgrandes cidades brasileiras com piores condições de vida como Belém, Recifee Salva<strong>do</strong>r” (prefeitura <strong>do</strong> Rio de Janeiro, março de 2001:14).Não obstante a desigualdade entre as áreas, encontramos também umagrande heterogeneidade e fortes desigualdades no interior de cada área.Essa heterogeneidade interna revela a existência de bairros com acesso


precário a saúde, educação, saneamento, equipamentos de cultura, lazere comunicação. São bairros com ruas sem pavimentação, esburacadas esem iluminação, que nada lembram a Cidade Maravilhosa. O Rio de Janeiroaparece com a imagem de uma cidade fragmentada, desigual, com fortesclivagens sociais.A outra face das desigualdades no interior da cidade é, sem dúvidaalguma, a favela carioca. Ainda segun<strong>do</strong> o Censo de 2000, 18,7% da populaçãocarioca reside em favelas 1 , o que corresponde a 1.092.783 pessoas.Diversos estu<strong>do</strong>s sobre o padrão de segregação na cidade têm mostra<strong>do</strong>que a favela permite aos seus mora<strong>do</strong>res “acessibilidade aos recursosurbanos concentra<strong>do</strong>s nas áreas superiores da cidade” ao mesmo tempoque, “essa proximidade física facilita o acesso a fontes de emprego e renda,o que também representa uma outra frente de sociabilidade entre o‘morro’ e o ‘asfalto’” (Prefeitura <strong>do</strong> Rio de Janeiro, maio de 2001).Muito associa<strong>do</strong> à problemática das favelas se encontra a questão daviolência. Mesmo não sen<strong>do</strong> um fenômeno restrito à cidade <strong>do</strong> Rio deJaneiro, mas liga<strong>do</strong> a todas as grandes metrópoles, tem se constituí<strong>do</strong> emuma das questões sociais de maior relevância desde o fim da década de80, quan<strong>do</strong> assistimos à associação <strong>do</strong> tráfico de drogas com o tráfico dearmas, transforman<strong>do</strong> as favelas em cenário de grande conflito arma<strong>do</strong>,violência e assassinatos. A gravidade desses conflitos tem leva<strong>do</strong> muitosanalistas, e sobretu<strong>do</strong> os meios de comunicação, ao extremo de comparara cena cotidiana da cidade a uma situação de guerra civil e as facçõescriminosas a um verdadeiro poder paralelo.A incidência <strong>do</strong>s diversos crimes sofre variação segun<strong>do</strong> os bairros eas regiões <strong>do</strong> município. Dividi<strong>do</strong> em grandes áreas, pode-se observar que“o Rio de Janeiro, em matéria de taxas de homicídio, é comparável à cidadede Miami num extremo e, no outro, à África <strong>do</strong> Sul. O índice verifica<strong>do</strong>na área mais rica (Zona Sul/Barra da Tijuca) não chega a ser propriamentebaixo (16,4 vítimas por 100 mil habitantes), mas é muito inferior ao registra<strong>do</strong>na Zona Oeste e nas regiões denominadas ‘Subúrbios I’ e ‘SubúrbiosII’” (Musumeci, 2001:10). Não restam dúvidas, a violência aumenta a distânciaentre classes, fragmentan<strong>do</strong> e dividin<strong>do</strong> a cidade nos espaços <strong>do</strong>sricos e <strong>do</strong>s pobres, cada vez mais encara<strong>do</strong>s como classes perigosas.Como alguns estu<strong>do</strong>s têm mostra<strong>do</strong>, os níveis de rendimento e educaçãotêm uma forte relação com o padrão de estruturação socioespacialda metrópole fluminense. Santos Junior (2001), analisan<strong>do</strong> o diagramada participação em organizações associativas na cidade, constata “queesse quadro se reproduz na constituição de um padrão espacial <strong>do</strong> associativismo,onde as áreas habitadas por segmentos de mais alta renda enível educacional tenderiam também a ser as áreas com maior grau deassociativismo, principalmente de tipo sindical, esportivo e cultural” (ibid.p.159). De forma inversa, as áreas habitadas pelos segmentos de mais1 Para o IBGE, aglomera<strong>do</strong>ssubnormais são gruposde mais de 50 unidadeshabitacionais dispostas demo<strong>do</strong> desordena<strong>do</strong> e denso,sobre terreno urbanoque pertence a terceiros, ecarente de serviços públicosessenciais. Os aglomera<strong>do</strong>ssubnormais, que noRio de Janeiro são identifica<strong>do</strong>sàs favelas, seopõem aos setores especiaisque constituiriam a cidadeformal.43


442 Cesar Maia foi prefeito,pela primeira vez, nagestão 1993-1996 peloPFL. Na gestão 1997-2000,foi sucedi<strong>do</strong> por Luis PauloConde, na época também<strong>do</strong> PFL e alia<strong>do</strong> de CesarMaia, que, desde 2001,exerce seu segun<strong>do</strong> mandato.Atualmente, ambossão adversários políticos eConde é o vice-governa<strong>do</strong>r,agora filia<strong>do</strong> ao PSB.baixos níveis de renda e educação, tenderiam a ter menor grau de associativismoe nestes, tenderia a pre<strong>do</strong>minar o tipo religioso.Não obstante essas diferenças, constata-se um rico e diversifica<strong>do</strong> teci<strong>do</strong>associativo no Rio de Janeiro, composto por sindicatos, associações profissionais,associações de mora<strong>do</strong>res, associações religiosas, associaçõesculturais e esportivas, organizações não-governamentais e instituições filantrópicas(Ribeiro e Santos Junior, 1996). Essas organizações sociais sãoresponsáveis pela publicização de demandas e reivindicações. Podemos citaros processos de articulação, envolven<strong>do</strong> esse múltiplo teci<strong>do</strong> social, quetornaram os temas da Aids, da epidemia da dengue e da despoluição daBaía de Guanabara, preocupações comuns de uma diversidade de organizaçõesda sociedade civil, questões da agenda <strong>do</strong> poder público.Apesar <strong>do</strong> reconheci<strong>do</strong> perfil oposicionista, a cidade <strong>do</strong> Rio de Janeirovem sen<strong>do</strong> governada pelo Parti<strong>do</strong> da Frente Liberal (PFL), há três gestõesconsecutivas, ten<strong>do</strong> à frente o prefeito Cesar Maia 2 . As últimas administraçõestêm se caracteriza<strong>do</strong> por um perfil político conserva<strong>do</strong>r, com baixaparticipação política, apesar da implementação de diversos projetosurbanísticos de revitalização da cidade, dentre os quais destaca-se o RioCidade. Deve-se ressaltar, todavia, que essas administrações vêm desenvolven<strong>do</strong>um importante projeto social, o Favela Bairro, que tem si<strong>do</strong> objetode grande reconhecimento social no País e fora dele. O perfil político<strong>do</strong> poder Legislativo reflete o <strong>do</strong> Executivo, composto majoritariamentepor parti<strong>do</strong>s de centro-direita, apesar da expressiva bancada de oposição,sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong> Parti<strong>do</strong> <strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>res (PT).A cultura política <strong>do</strong> Rio de Janeiro é resulta<strong>do</strong> da sua história, marcadade um la<strong>do</strong> pela ausência de participação política e, de outro, por umaintensa participação comunitária em outras esferas da vida social, sobretu<strong>do</strong>ligadas às dinâmicas das manifestações culturais populares. ParaJosé Murilo de Carvalho (1987:163), “foi o futebol, o samba e o carnavalque deram ao Rio de Janeiro uma comunidade de sentimentos, por cima ealém das grandes diferenças sociais que sobreviveram e ainda sobrevivem”.A conclusão <strong>do</strong> autor é que, na esteira desta história, forja-se umacultura que se expressa na dificuldade da cidade em “transformar suaparticipação comunitária em capacidade de participação cívica” (ibid. p.164), onde a dissociação entre “a cidade, a República e a cidadania” seexpressam em sentimento de rejeição à política oficial e em entraves àsua dinâmica democrática.É neste contexto que podemos ver na questão orçamentária um fortepotencial de expressão <strong>do</strong>s grandes contrastes e conflitos distributivosque marcam a cidade <strong>do</strong> Rio de Janeiro.A organização <strong>do</strong> Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro representaexatamente a possibilidade de dar mais transparência e politizar osconflitos distributivos nesta cidade. Ela que possui um <strong>do</strong>s maiores orça-


mentos <strong>do</strong> País com uma receita prevista para 2002 de R$ 6.216.685.559,00e investimentos de quase R$ 1 bilhão. A importância <strong>do</strong> Fórum pode serainda compreendida se levarmos em consideração a cultura política brasileira,na qual a relação entre Esta<strong>do</strong> e merca<strong>do</strong> sempre foi marcada pelacorrupção e pelas chamadas “práticas clientelistas”. Como afirma Franciscode Oliveira, “não há remédios ‘econômicos’ contra a corrupção. Então, apublicização da corrupção, <strong>do</strong>s corrompi<strong>do</strong>s e corruptores é o primeiro recurso,que deve ser usa<strong>do</strong> amplificadamente para construir uma esferapública...” (Oliveira, 2002:104). Ao nosso ver, a constituição de um embriãode esfera pública em torno da questão orçamentária é um <strong>do</strong>s aspectosmais importantes da história <strong>do</strong> Fórum.O Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong>: suahistória e seus objetivosEm 6 de dezembro de 1995, o seminário intitula<strong>do</strong> “<strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rioem debate” dava origem a uma articulação de entidades e cidadãos, denominada“Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro”. A iniciativa<strong>do</strong> Ibase, ten<strong>do</strong> à frente a figura proeminente <strong>do</strong> sociólogo Betinho, apontavapara a necessidade de que fossem trazi<strong>do</strong>s para o âmbito local emunicipal, os trabalhos de acompanhamento <strong>do</strong> orçamento que o Ibasejá vinha desenvolven<strong>do</strong> desde 1991 no âmbito federal.A idéia inicial era reunir as entidades <strong>do</strong> Rio de Janeiro em torno de umaproposta orçamentária para o ano de 1996 a ser apresentada ao então prefeitoCésar Maia. Ten<strong>do</strong> como interesse comum uma ampla participaçãosocial no processo orçamentário que criasse condições para intervir nasdefinições de prioridades <strong>do</strong> governo, “o Fórum foi cria<strong>do</strong> pelo sentimentodas entidades de que deveriam fazer um controle mais efetivo sobre oorçamento municipal(...).Eram entre 18 a 24 entidades em seu início, hoje jásomam mais de 40”, como relata um <strong>do</strong>s coordena<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Fórum.Na busca constante pela democratização <strong>do</strong> orçamento, e sen<strong>do</strong> instrumentolegítimo de acesso às informações governamentais, o Fórum pretendereunir pessoas e entidades cariocas, através da mobilização, disponibilizaçãode informações e capacitação, com o objetivo de promover a participação,a transparência e a inversão nas prioridades sociais <strong>do</strong> orçamento.De uma forma geral, pode-se dizer que a articulação <strong>do</strong> Fórum tem comoperspectiva a luta pelo orçamento participativo, acreditan<strong>do</strong>-se que este émais democrático, transparente e capaz de incorporar as demandas e reivindicaçõespopulares e, portanto, combater as desigualdades sociais.Participação, transparência e inversão de prioridades sociais são trêsobjetivos/valores que fundam o Fórum. Se por um la<strong>do</strong>, cada um delesencerra em si um desafio e uma possibilidade, soma<strong>do</strong>s e integra<strong>do</strong>s cons-45


463 Pacs. Projeto de Pesquisa:Estu<strong>do</strong> e Acompanhamento<strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong>.Rio <strong>do</strong> Janeiro: Semdata, (mimeo).4 Dentre as organizaçõesque fundaram o FórumPopular de <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong>Rio de Janeiro destacamos:Ibase (Instituto Brasileirode Análises Sociais e Econômicas),Pacs (PolíticasAlternativas para o ConeSul), Corecon (ConselhoRegional de Economia <strong>do</strong>Rio de Janeiro), Amaleme(Associação de Mora<strong>do</strong>res<strong>do</strong> Leme), CTO (Centro deTeatro <strong>do</strong> Oprimi<strong>do</strong>).5 Este é o caso de diversasinstituições que hoje compõemo Fórum entre asquais destacamos o GrupoPela Vida (GPV) e o Institutode Desenvolvimentode Estu<strong>do</strong>s Políticos e Sociais(Ideps).tituem a democratização na questão <strong>do</strong> orçamento propriamente dita.Conforme expresso em <strong>do</strong>cumento de uma das organizações da sua coordenação,Pacs (Políticas Alternativas para o Cone Sul), está claro para oFórum “a interdependência entre esses três objetivos: quanto maior for atransparência, maior a possibilidade de participação e, por conseguinte,de identificação e promoção de prioridades sociais” 3 . Segun<strong>do</strong> uma liderança<strong>do</strong> Fórum ligada a essa mesma organização, a preocupação “é permitiro entendimento <strong>do</strong> orçamento, impedir seu uso eleitoreiro, desmistificá-loe democratizá-lo, tanto a partir da busca <strong>do</strong> que a maioria dapopulação realmente quer e deseja, principalmente aquela maioria que jáé desprovida há muito tempo, quanto fazen<strong>do</strong> com que os recursos sejamdireciona<strong>do</strong>s para estes que realmente precisam”.A decisão de participação das diferentes organizações envolve processosdiferencia<strong>do</strong>s. Há situações em que esta se liga a própria história <strong>do</strong>Fórum, uma vez que foi a partir da articulação dessas várias entidadesque emergiu a questão <strong>do</strong> orçamento como problemática comum. 4 Emoutras, esta decisão foi resulta<strong>do</strong> de um processo de envolvimento dainstituição com seus temas de interesse específico e a questão orçamentária.5 Desde o início, porém, a participação de muitas das organizações éirregular, varian<strong>do</strong> em função das suas demandas concretas.Não existe restrição à participação e ela é aberta a pessoas e instituições.Como afirma uma das lideranças <strong>do</strong> Fórum, liga<strong>do</strong> ao Ibase, “qualquerpessoa, qualquer entidade, sem restrição alguma, está livre para participar”.A participação não precisa ser formalizada por um <strong>do</strong>cumento,mas é, quase sempre, a expressão <strong>do</strong> vínculo institucional de cada participante.De qualquer forma, tu<strong>do</strong> indica que a decisão de participar estáfortemente relacionada à discussão <strong>do</strong>s temas de interesse de cada instituição,seja educação, saúde, moradia, saneamento e outros. A dinâmica<strong>do</strong> Fórum parece possibilitar a ampliação <strong>do</strong> envolvimento <strong>do</strong>s participantesnas discussões mais gerais <strong>do</strong> orçamento público. Nessa direção, éemblemática a opinião de uma integrante <strong>do</strong> Fórum, para quem este tempor característica exatamente fazer a ligação, para os participantes, dasrelações entre orçamento, política pública e sua implementação.Quan<strong>do</strong> foi forma<strong>do</strong>, o Fórum funcionava sob a direção de um coordena<strong>do</strong>rindica<strong>do</strong> pelos demais integrantes. Essa estrutura mu<strong>do</strong>u e, a partir de2002, o Fórum passou a ter uma coordenação composta por quatro instituições:Ibase, Corecon, Pacs e Ideps. A freqüência das reuniões também sofreugrandes variações desde sua criação. No início elas eram mensais, depois passarampara semanais e, desde o segun<strong>do</strong> semestre de 2002, o Fórum combinareuniões da coordenação com plenárias. As reuniões da coordenação sãomensais, e as plenárias são convocadas por essa instância, sempre que avaliarnecessário. Além disso, o Fórum criou o “Plantão <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong>” para responderàs dúvidas sobre questões em torno <strong>do</strong> orçamento público. O plantão


funciona todas as quintas-feiras na sede <strong>do</strong> Fórum, em uma sala cedida peloConselho Regional de Economistas (Corecon).Dentre as atividades desenvolvidas pelo Fórum, a que demanda maistempo é relacionada ao acompanhamento da Lei Orçamentária Anual (LOA),o que significa monitorar o andamento das receitas e das despesas bemcomo os remanejamentos efetua<strong>do</strong>s. Este é um <strong>do</strong>s procedimentos maistrabalhosos, ten<strong>do</strong> em vista os percentuais de alteração <strong>do</strong> orçamento,autoriza<strong>do</strong>s pela Câmara de Verea<strong>do</strong>res na Lei Orçamentária Anual.Há no Rio de Janeiro um sistema municipal de da<strong>do</strong>s sobre o orçamento,denomina<strong>do</strong> Fincon, que disponibiliza on line o acesso à execução orçamentária.Cria<strong>do</strong> em 1995, foi uma iniciativa da Controla<strong>do</strong>ria Geral <strong>do</strong> Municípioque visava dar ao setor público um instrumento moderno de gestão orçamentáriae financeira que permitisse aos gestores ter segurança na prestaçãode contas. O acesso <strong>do</strong> Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> ao sistema Fincon foifundamental para suas atividades de monitoramento. Antes de ter acesso aosistema, o Fórum tinha de acompanhar o orçamento por meio de terminaisinstala<strong>do</strong>s na Câmara Municipal. Depois de negociações com os diversos governos(nas últimas três gestões), o Fórum conquistou o acesso ao sistema,com a instalação de um terminal na sua sede, possibilitan<strong>do</strong> à sua equipe acoleta de informações e produção sistemática de análises sobre a execuçãoorçamentária. Certamente, o acesso <strong>do</strong> Fórum ao sistema Fincon pode serconsidera<strong>do</strong> um reconhecimento político muito importante.Para se ter uma idéia das possibilidades de análise e monitoramento, oacesso ao sistema permite que sejam coleta<strong>do</strong>s diversos tipos de da<strong>do</strong>s einformações sobre a execução orçamentária em tempo real, tais como osvalores liquida<strong>do</strong>s pagos, empenha<strong>do</strong>s, contigencia<strong>do</strong>s e remaneja<strong>do</strong>s porprograma de trabalho, secretarias, natureza de despesa e fonte de despesa.O principal acompanhamento realiza<strong>do</strong> pelo Fórum é sobre a execuçãoorçamentária <strong>do</strong>s Programas de Trabalho, das secretarias e das autarquias.Para este trabalho, o Fórum conta com <strong>do</strong>is estagiários que fazemo acompanhamento sistemático <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s e os repassam nas reuniões epara a mídia, que, como é habitual, só torna o fato notícia quan<strong>do</strong> estepode gerar repercussão.A análise da execução orçamentária é o principal instrumento utiliza<strong>do</strong>pelo Fórum para o monitoramento e a avaliação <strong>do</strong> governo municipal.Isso permite que se identifiquem quais foram os projetos realiza<strong>do</strong>s,quanto foi previsto e quanto foi efetivamente gasto. Nessa tarefa, sãosempre utiliza<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s oficiais forneci<strong>do</strong>s pelo próprio poder público,por meio <strong>do</strong> sistema Fincon.Além <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s acessa<strong>do</strong>s sistematicamente no sistema, o Fórum utilizacomo fonte de análise a Prestação de Contas Anual <strong>do</strong> Município, impressocomo <strong>do</strong>cumento pela Prefeitura, onde as atividades executadas aparecemcom maior detalhamento, inclusive na forma de quadros exigi<strong>do</strong>s pela Lei47


6 Segun<strong>do</strong> o Fincon, o Projetode Erradicação <strong>do</strong> AedesAegypti, sob a responsabilidadeda CompanhiaMunicipal de Limpeza Urbana(Comlurb), tinhacomo <strong>do</strong>tação inicial R$7.896.000,00, mas liqui<strong>do</strong>uapenas R$ 5.957.264,36,representan<strong>do</strong> 75,4%.de Responsabilidade Fiscal. Neste ponto, cabe destacar que a Prefeitura <strong>do</strong>Rio de Janeiro faz uma prestação de contas bastante completa, permitin<strong>do</strong>uma diversidade de análises com as informações disponibilizadas. Para seter uma idéia, a versão da Prestação de Contas de 2001, publicada no DiárioOficial da Câmara de Verea<strong>do</strong>res, continha 275 páginas.Um bom e recente exemplo <strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong> Fórum no controle orçamentáriodiz respeito ao perío<strong>do</strong> da epidemia de dengue no Brasil noverão de 2001 que atingiu, em especial, o Rio de Janeiro. Pesquisan<strong>do</strong> aexecução <strong>do</strong>s programas de combate à <strong>do</strong>ença, o Fórum identificou a existênciade um, denomina<strong>do</strong> Programa de Erradicação <strong>do</strong> Aedes Aegypti.Nele, constavam valores liquida<strong>do</strong>s e pagos inferiores ao espera<strong>do</strong>, levan<strong>do</strong>a terminar o ano com a utilização de apenas 75% da sua <strong>do</strong>tação 6 . Oque impressiona é que o município tinha disponibilidade de caixa, explicitan<strong>do</strong>uma política de contenção de recursos por parte <strong>do</strong> prefeito. Ocaso foi leva<strong>do</strong> a público através <strong>do</strong>s meios de comunicação, obten<strong>do</strong>grande repercussão e causan<strong>do</strong> um escândalo na cidade. Comportamentossimilares de contenção de recursos já tinham si<strong>do</strong> identifica<strong>do</strong>s anteriormentepelo Fórum em outras situações.Mas o trabalho <strong>do</strong> Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> envolve, além <strong>do</strong> monitoramentoda execução orçamentária, atividades de sensibilização, capacitação,mobilização de atores e apresentação de demandas e propostasno plano orçamentário para a Prefeitura Municipal. De forma a ilustraresse conjunto diversifica<strong>do</strong> de atividades, é interessante o registro dealguns depoimentos de integrantes <strong>do</strong> Fórum, sistematizadas segun<strong>do</strong> anatureza das atividades:48a) <strong>Social</strong>ização de informações. Os integrantes <strong>do</strong> Fórum destacam opapel <strong>do</strong> Fórum tanto na socialização de informações, como na traduçãoda linguagem orçamentária em linguagem acessível às instituiçõese aos cidadãos. Neste ponto, vale destacar o depoimento daintegrante <strong>do</strong> Pacs: “To<strong>do</strong>s os da<strong>do</strong>s coleta<strong>do</strong>s e as análises feitasestão disponíveis para qualquer pessoa ou entidade. Durante o ano,ocorrem várias solicitações de da<strong>do</strong>s que o Fórum procura atenderdentro de suas possibilidades. Esses da<strong>do</strong>s e todas as outras análisessão divulgadas através da mala-direta <strong>do</strong> Fórum onde constam oscorreios eletrônicos das entidades componentes, <strong>do</strong> prefeito, <strong>do</strong>sverea<strong>do</strong>res, e de outros cidadãos interessa<strong>do</strong>s e que solicitaram ocadastramento. Além de divulgar suas análises através da mala-direta,o Fórum redige uma coluna mensal que é publicada no Jornal <strong>do</strong>sEconomistas-RJ, com ampla abordagem sobre o orçamento municipal.Essa coluna também é um excelente meio de divulgação <strong>do</strong> Fórume de suas análises. Atualmente, o Fórum possui uma página nainternet (www.corecon-rj.org.br), onde estão disponíveis diversos tex-


tos sobre o orçamento municipal, cartilhas educativas sobre orçamentopúblico e outras informações sobre o Fórum”.A opinião da integrante <strong>do</strong> Grupo Pela Vida (GPV) reforça a importânciaque as instituições conferem a esse papel cumpri<strong>do</strong> peloFórum: “Acompanhar a execução orçamentária pra gente que estáde fora, que não compreende esta linguagem ainda, é muito difícil.Primeiro, porque você não sabe quais são os canais, você não temacesso a esta informação e o Fórum te possibilita isso. A equipe <strong>do</strong>Fórum tem muito este papel de traduzir esta informação, <strong>do</strong> economês,<strong>do</strong> orçamentês, para uma linguagem da gente, e isto tambéminstrumentaliza as instituições nas suas ações”. E a mesmaintegrante complementa: “Os meninos já são ‘superescola<strong>do</strong>s’ naquelamontoeira de números de orçamento, de saber o que significa,de localizar os programas para saber o quanto de verba eraprevisto, o quanto de fato tem, o que está sen<strong>do</strong> gasto, o que nãoestá sen<strong>do</strong> (...)”.b) Sensibilização e capacitação. Desde sua origem, o Fórum tem promovi<strong>do</strong>diversas atividades de sensibilização e capacitação, sobretu<strong>do</strong>voltadas para as organizações sociais. Como destaca o representanteda Associação de Mora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Leme, “quan<strong>do</strong> o Fórum decidedar aulas de cidadania, sobre como o cidadão pode participar nasdecisões sobre o orçamento municipal, aí sim, você entra em contatocom organizações para recrutar pessoas que estão nestes cursos. Foiuma das coisas que eu fiz (...) dar um curso de como chegar a participarnas decisões <strong>do</strong> orçamento municipal <strong>do</strong> Rio de Janeiro. E istofunciona muito bem. Eu acho, que na parte de educação política,funciona bem!”. Sem dúvida alguma, uma das atividades mais interessantes<strong>do</strong> Fórum está ligada ao trabalho de sensibilização da opiniãopública, por meio <strong>do</strong> Teatro <strong>do</strong> Oprimi<strong>do</strong>. Como registra a integrante<strong>do</strong> Centro <strong>do</strong> Teatro <strong>do</strong> Oprimi<strong>do</strong>: “A gente tem o teatro derua (...) ou então a gente faz alguma esquete na rua e fala: oh , olhalá os verea<strong>do</strong>res votan<strong>do</strong> o seu dinheiro, vamos lá, entra aí (...)”.c) Espaço de discussão e formulação de demandas para o poder pú-blico. O Fórum se constitui em espaço de encontro das instituições,de processamento de suas demandas e formulação de propostaspara o poder público. Como destaca a integrante <strong>do</strong> GPV, “o Fórumserve como espaço de discussão, espaço de fomento, de maturação<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s, das informações que alimentam a ação de cada instituição(...)”. E o representante <strong>do</strong> Ibase afirma ainda que o Fórum seconstitui em “um canal para que as entidades elaborem emendas”a serem apresentadas ao poder público. E é nesse processo que oFórum se constitui em ator político, já que as intervenções das diversasinstituições se tornam propostas coletivas: “Ao invés de ha-49


ver várias entidades, cada uma com sua articulação, elas estão reunidasno Fórum”, acrescenta a integrante.d) O Fórum como ator na esfera pública. Por fim, é importante destacaras atividades de representação política que o Fórum exerce junto aopoder Executivo e ao poder Legislativo, que, ao nosso ver, têm resulta<strong>do</strong>na constituição de um embrião de esfera pública em torno daquestão orçamentária. Neste ponto, é bastante significativo o depoimentode uma das lideranças <strong>do</strong> Fórum ligada ao Corecon: “O Fórumparticipa das audiências públicas sobre orçamento, realiza reuniõescom os verea<strong>do</strong>res, elabora questionários para levantamentode prioridades para a cidade e faz até mesmo manifestações públicas(...)”. Ele destaca que “o principal caminho utiliza<strong>do</strong> pelo Fórum é ode apresentar propostas a to<strong>do</strong>s os verea<strong>do</strong>res e negociar com alguns,sempre com o cuida<strong>do</strong> de trabalhar com um amplo leque partidário,para que a<strong>do</strong>tem as emendas para tramitação na Casa”.50No que concerne à dinâmica de funcionamento <strong>do</strong> Fórum, é possível inferirduas questões. A primeira, relativa à participação das instituições no Fórum:A pesquisa revela que essa participação tem como referência o interesseespecífico de cada instituição, que obtêm informações orçamentárias disponibilizadaspelo Fórum e podem apresentar suas demandas nos plantões enas reuniões que são promovi<strong>do</strong>s. Aqui, o papel exerci<strong>do</strong> pelo Fórum temduas dimensões, o de traduzir a informação, “<strong>do</strong> economês, orçamentês”, parauma linguagem simples, instrumentalizan<strong>do</strong> “as instituições nas suas ações”,e o de processar as demandas específicas de cada organização na forma deuma demanda coletiva. Entre as demandas trazidas ao Fórum, podemos destacaralgumas que surgiram na pesquisa: no caso <strong>do</strong> Grupo Pela Vida, questõesrelacionadas diretamente à saúde, sobretu<strong>do</strong> ligadas a distribuição demedicamentos de prevenção à Aids; no Projeto Legal, educação, moradia esegurança. Além disso, apareceu a necessidade de esclarecimentos sobre oque é da esfera <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e o que é atribuição <strong>do</strong> município.A segunda questão diz respeito à natureza da representação <strong>do</strong>s participantesno Fórum. Neste ponto, a pesquisa mostra processos diferencia<strong>do</strong>sde maior ou menor envolvimento institucional, o que tem implicaçõesna freqüência e regularidade da participação. As instituições quecompõem a coordenação têm mostra<strong>do</strong> grande comprometimento ao longoda história <strong>do</strong> Fórum, legitiman<strong>do</strong> o papel de liderança que seus integrantestêm exerci<strong>do</strong>. Mas, além disso, é importante destacar dinâmicasdesenvolvidas por outras organizações. Nas discussões semanais <strong>do</strong> GPV,o Fórum é freqüentemente tema de debates; com o Centro de Teatro <strong>do</strong>Oprimi<strong>do</strong> são realizadas reuniões, em uma dinâmica reconhecida comode reciprocidade, que permite a construção de seus textos e a montagemdas peças com os temas de discussão sobre o orçamento.


Propostas para o <strong>Controle</strong> <strong>Social</strong> <strong>do</strong><strong>Orçamento</strong>O Fórum Popular <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> tem discuti<strong>do</strong> muito acerca <strong>do</strong> formato<strong>do</strong> orçamento público e elabora<strong>do</strong> algumas propostas de fiscalização econtrole social.Uma primeira questão, objeto de debate, se relaciona à natureza e aocaráter <strong>do</strong> orçamento. De fato, o orçamento é uma estimativa de receita euma previsão de despesas. Além disso, na legislação brasileira, o orçamentoé uma lei elaborada pelo poder Executivo e aprovada pelo Legislativo, quesó pode alterá-la por meio de emendas, sem que haja aumento de despesas.No entanto, a aprovação <strong>do</strong> orçamento é, de fato, autorizativa, poisnão gera direitos nem obriga o poder Executivo a realizar os planos eprogramas de trabalho com os recursos que foram planeja<strong>do</strong>s. Desta forma,a execução <strong>do</strong> plano expresso no orçamento depende sempre <strong>do</strong> compromissoe da vontade política <strong>do</strong> governo municipal.Na opinião <strong>do</strong>s integrantes <strong>do</strong> Fórum, essas características <strong>do</strong> orçamentogeram alguns problemas. É muito comum, por parte das organizações sociaise <strong>do</strong>s cidadãos em geral, a idéia de que o orçamento representa recursosgaranti<strong>do</strong>s para as obras e programas descritos na Lei Orçamentária Anual,sem contar que ele também contém valores apenas estima<strong>do</strong>s. Afinal, énecessário que a receita prevista seja realizada para a efetivação daquiloque está planeja<strong>do</strong>. Além disso, o Fórum considera uma falha o fato de a leiorçamentária ser apenas autorizativa. Para seus integrantes, ela corre o riscode se tornar uma peça de ficção ou mesmo um instrumento para finsobscuros. Por exemplo, observa-se uma prática muito comum <strong>do</strong>s governantesde economizar recursos no início da gestão, tradicionalmente conhecidacomo fazer caixa, para gastar no perío<strong>do</strong> eleitoral em obras, deforma a ganhar mais visibilidade e popularidade. Assim, os integrantes <strong>do</strong>Fórum argumentam que a lei deveria, pelo menos parcialmente, obrigar opoder Executivo a cumprir os planos e projetos previstos.Uma segunda questão abordada pelos coordena<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Fórum refereseao dispositivo aprova<strong>do</strong> na Lei Orçamentária Anual que autoriza previamenteo poder Executivo a remanejar as <strong>do</strong>tações orçamentárias dentro deum certo percentual <strong>do</strong> valor total <strong>do</strong> orçamento. Ao longo <strong>do</strong>s últimosanos, esse percentual, tem fica<strong>do</strong> em torno de 20%. Levan<strong>do</strong>-se em contaque a maior parte <strong>do</strong>s recursos da Prefeitura Municipal está comprometidacom gastos em pessoal, custeio (despesas com a manutenção e funcionamento<strong>do</strong>s serviços municipais) e em pagamento de dívidas, esse percentualpermite que o poder Executivo remaneje valores superiores àqueles destina<strong>do</strong>saos investimentos para a realização de obras e aquisição de equipamentos.Com o remanejamento em torno de 20%, não é necessário con-51


527 Excluin<strong>do</strong> desse percentualalguns tipos de remanejamentos,chama<strong>do</strong>s deextralimite, que tambémforam aprova<strong>do</strong>s.sultar o poder Legislativo, o que pode resultar em uma total desconfiguração<strong>do</strong> orçamento aprova<strong>do</strong>. É como se o poder Legislativo abrisse mão deseu poder no processo orçamentário, já que normalmente os remanejamentosorçamentários poderiam ser realiza<strong>do</strong>s sempre que fossem necessários,desde que autoriza<strong>do</strong>s pela Câmara de Verea<strong>do</strong>res.O que a equipe <strong>do</strong> Fórum argumenta é que o processo de remanejamentopode desconfigurar o orçamento, alteran<strong>do</strong> o perfil das prioridadesanteriormente aprovadas. Assim, por exemplo, se a LOA aprovada esancionada destina prioritariamente recursos para as áreas sociais, durantea execução <strong>do</strong> orçamento, o poder Executivo pode terminar priorizan<strong>do</strong>grandes obras viárias, utilizan<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> remanejamento de parte<strong>do</strong>s recursos anteriormente previstos para as áreas de educação e saúde,o que resultaria, ao fim <strong>do</strong> ano, em outras prioridades não previstas.Vejamos um caso concreto. Em 2002, as despesas com pessoal, custeioe pagamento da dívida chegavam a quase 90% <strong>do</strong> total <strong>do</strong> orçamento <strong>do</strong>município <strong>do</strong> Rio de Janeiro. No projeto de Lei Orçamentária Anual, opoder Executivo solicitava a autorização para remanejar até 30% <strong>do</strong> total<strong>do</strong> orçamento, o que significava remanejar mais <strong>do</strong> que o total <strong>do</strong>s recursosprevistos para investimentos. A Lei Orçamentária Anual acabou sen<strong>do</strong> aprovadapelo poder Legislativo com esse percentual reduzi<strong>do</strong> para 20% 7 , oque ainda é bastante eleva<strong>do</strong> e suficiente para desconfigurar o orçamento.Os remanejamentos e os seus impactos sobre as prioridades definidasna Lei Orçamentária Anual são desnuda<strong>do</strong>s no trabalho de acompanhamentoexecuta<strong>do</strong> pelo Fórum. No monitoramento da execução orçamentária,o Fórum freqüentemente constata na LOA a existência de programasde trabalho de pouca transparência e interesses duvi<strong>do</strong>sos, com <strong>do</strong>taçõesorçamentárias insignificantes face aos seus objetivos. De fato, essesprogramas têm pequena destinação de recursos para não chamar aatenção quanto aos seus fins e serem aprova<strong>do</strong>s sem maiores polêmicas.A prática de remanejamento pode, no entanto, ao sabor da vontade <strong>do</strong>prefeito, valer-se <strong>do</strong>s recursos arrecada<strong>do</strong>s ao longo <strong>do</strong> ano para incrementaros recursos disponíveis para tais programas de trabalho.Esses programas com pequenas <strong>do</strong>tações são chama<strong>do</strong>s de janelas orçamentáriase representam os maiores riscos de tornar pouco transparenteo orçamento, já que este deixa de ter correspondência com o planejamentoaprova<strong>do</strong> e com as reais intenções de investimento <strong>do</strong> governo municipal.Em geral, as possibilidades de remanejamento residem em três processos:a) o excesso de arrecadação, que torna o volume de receita superiorao que foi efetivamente planeja<strong>do</strong>; b) superávits orçamentários <strong>do</strong> anoanterior, não previstos na lei orçamentária e, portanto, não planeja<strong>do</strong>s; c)alterações das <strong>do</strong>tações orçamentárias <strong>do</strong>s programas de trabalho descritosna LOA. Se um remanejamento ocorrer dentro de um mesmo programade trabalho, essa alteração deriva de despesa, por exemplo, quan<strong>do</strong> se


transfere gasto com material de consumo para pagamento de terceiros.No entanto, essas transferências são consideradas extralimites na LeiOrçamentária Anual <strong>do</strong> Rio de Janeiro, pois não estão dentro <strong>do</strong> limite deremanejamento autoriza<strong>do</strong> pela Câmara de Verea<strong>do</strong>res.Frente a esses problemas, o Fórum tem afirma<strong>do</strong> como propostas: o fortalecimentoda participação popular na elaboração <strong>do</strong> orçamento; o fortalecimento<strong>do</strong> papel <strong>do</strong> poder Legislativo; a redução <strong>do</strong> limite de remanejamentopelo poder Executivo; o maior controle social na execução <strong>do</strong> orçamento.Para avançar nesses objetivos, o Fórum tem combina<strong>do</strong> ações político-institucionaiscom a mobilização da opinião pública. Nesta perspectiva,um <strong>do</strong>s principais resulta<strong>do</strong>s da ação <strong>do</strong> Fórum tem si<strong>do</strong> o de instrumentalizaras organizações que o compõem, nas suas demandas e reivindicaçõesjunto ao poder público. Um <strong>do</strong>s casos mais ilustrativos se refereao GPV e suas demandas na área da saúde.O Grupo foi protagonista de uma iniciativa interessante de discussão,sobre a questão <strong>do</strong>s medicamentos para a Aids envolven<strong>do</strong> o Ministério<strong>Público</strong>. A fim de intervir nessa discussão, o Grupo Pela Vida pôde se beneficiar<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s forneci<strong>do</strong>s pelo Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong>. A iniciativatinha a intenção de fazer com que o Ministério <strong>Público</strong> tomassealguma providência contra procedimentos inadequa<strong>do</strong>s, buscan<strong>do</strong> umTermo de Ajustamento de Conduta 8 da Secretaria Estadual de Saúde naquestão da compra e distribuição <strong>do</strong>s medicamentos. Conforme a representante<strong>do</strong> GPV assinalou, a intenção era protocolar uma representação,não só <strong>do</strong> Grupo, mas de outras instituições, contra o procedimento daSecretaria Municipal de Saúde. Assim “foi formada uma comissão de assessoriasjurídicas de ONGs-Aids para discutir a questão <strong>do</strong>s medicamentos,levantan<strong>do</strong> as principais deficiências existentes e também fazer umlevantamento sobre a legislação”.A importância <strong>do</strong> Fórum tem si<strong>do</strong> relevante nesse processo. No caso daAids, a opinião da representante <strong>do</strong> Grupo Pela Vida é que existe uma questãorecorrente ligada ao “argumento de que não existe previsão orçamentária,o que não é verdade”. O acesso à informação proporciona<strong>do</strong> pelo Fórumpermitiu ao GPV constatar a existência de recursos, e, pior, verificar quea verba existente não estava sen<strong>do</strong> usada. Isso possibilitou ainda, segun<strong>do</strong> amesma representante, questionar por que ela não estava sen<strong>do</strong> usada.Uma outra dimensão da atuação <strong>do</strong> Fórum se refere à mobilização daopinião pública. Neste ponto, é possível destacar um conjunto de açõesque têm si<strong>do</strong> desenvolvidas. Os grupos liga<strong>do</strong>s ao Centro de Teatro <strong>do</strong>Oprimi<strong>do</strong> fazem apresentações em escolas, hospitais, presídios, praças públicas,teatros etc., em torno das questões de educação, saúde, obras, ondesempre são aborda<strong>do</strong>s os temas relativos ao <strong>Orçamento</strong>; o Grupo PelaVida constituiu uma assessoria de imprensa para mobilizar a opiniãopública, além de participar de outros espaços de discussão, como o Fórum8 O Termo de Ajustamentode Conduta (TAC) é umacor<strong>do</strong> celebra<strong>do</strong> no inquéritocivil, pelo qual oMinistério <strong>Público</strong> impõeobrigações a um infratorpor danos potenciais ouefetivos causa<strong>do</strong>s aos interessesda coletividade.Pelo TAC, fixam-se o reconhecimentoda culpa <strong>do</strong>investiga<strong>do</strong>, um plano deprevenção ou reparação<strong>do</strong>s danos e as sançõespelo descumprimento dasobrigações (geralmentemultas).53


54ONGs-Aids e o Conselho de Saúde; o Pacs já fez um programa para TVComunitária, onde tem aborda<strong>do</strong> questões orçamentárias; e o próprioFórum tem publica<strong>do</strong> cartilhas sobre a questão orçamentária.Nas relações político-institucionais estabelecidas pelo Fórum ao longoda sua trajetória, o poder Legislativo merece destaque. De alguma forma,to<strong>do</strong>s os seus integrantes reconhecem a importância <strong>do</strong> Legislativo e<strong>do</strong> seu papel em torno da aprovação e fiscalização <strong>do</strong> orçamento público.Apesar deste reconhecimento, a opinião sobre a Câmara de Verea<strong>do</strong>res ébastante crítica. Como afirma o representante da Amaleme, “no fim dascontas, eles [verea<strong>do</strong>res] simplesmente fazem o que os prefeitos queremfazer, através <strong>do</strong>s clientelismos, e favoritismos que acontecem dentro dessaestranha coalizão de parti<strong>do</strong>s que vão de um lugar para outro, e indivíduosque vão de um parti<strong>do</strong> para outro...”.No entanto, apesar das dificuldades, os entrevista<strong>do</strong>s também reconhecemavanços. Na sua história, o Fórum constituiu alianças pontuais com algunsverea<strong>do</strong>res que foram fundamentais para sua organização. Entre esteso verea<strong>do</strong>r e presidente da comissão de finanças da Câmara Municipal (1995-1996) que mantinha uma estreita relação com o Fórum, fornecen<strong>do</strong> informaçõesrelevantes para o trabalho de monitoramento <strong>do</strong> orçamento, além decomunicar as datas das reuniões da comissão, que se constituíam em importanteespaço de negociação <strong>do</strong> Fórum com os verea<strong>do</strong>res. Na atual legislatura(2001-2004), alguns verea<strong>do</strong>res se destacam no diálogo com o Fórum,entre os quais: três <strong>do</strong> PT, um <strong>do</strong> PSDB, <strong>do</strong>is <strong>do</strong> PFL, um <strong>do</strong> PC <strong>do</strong> B e um <strong>do</strong>PDT, presidente da Casa. É preciso levar em consideração que estamos falan<strong>do</strong>de uma Câmara Municipal composta majoritariamente por verea<strong>do</strong>res comperfil partidário de centro-direita, apesar da significativa presença de verea<strong>do</strong>resde esquerda. Dos 42 verea<strong>do</strong>res eleitos em 2000, 15 são <strong>do</strong> PFL, quatro<strong>do</strong> PMDB, <strong>do</strong>is <strong>do</strong> PSDB, cinco <strong>do</strong> PT, três <strong>do</strong> PSB, um <strong>do</strong> PC <strong>do</strong> B, <strong>do</strong>is <strong>do</strong> PL,<strong>do</strong>is <strong>do</strong> PDT, um <strong>do</strong> PSC, um <strong>do</strong> PV, três <strong>do</strong> PT <strong>do</strong> B, <strong>do</strong>is <strong>do</strong> PPB e um semparti<strong>do</strong>. O perfil da composição da Comissão de Finanças não se mostra diferente:o presidente é <strong>do</strong> PFL, o vice-presidente é <strong>do</strong> PMDB e o vogal, <strong>do</strong> PT.Em geral, as lideranças <strong>do</strong> Fórum reconhecem um bom diálogo com osverea<strong>do</strong>res. No entanto, esse diálogo é marca<strong>do</strong> por baixa efetividade noque se refere à incorporação das propostas <strong>do</strong> Fórum e, muitas vezes, porconflitos em relação à postura de alguns verea<strong>do</strong>res. O que a experiênciarevela é que essa relação depende diretamente <strong>do</strong> perfil <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>rescom os quais o Fórum mantém diálogo, sobretu<strong>do</strong> os que integram aComissão de Finanças e <strong>Orçamento</strong>.De fato, pode-se dizer que os verea<strong>do</strong>res, apesar <strong>do</strong>s conflitos, reconhecema atuação <strong>do</strong> Fórum. Como afirma a representante <strong>do</strong> Pacs noFórum, “os verea<strong>do</strong>res conhecem a gente (...) a gente consegue comunicar,a gente tem o correio eletrônico de to<strong>do</strong>s, sabe onde é o gabinete deto<strong>do</strong>s, entra, mostra, manda correio, têm jornais que divulgam. Eles ficam


saben<strong>do</strong>. A gente sabe, porque volta e meia eles usam números que só agente tem. Mesmo que não citem as fontes, mas a gente sabe que eleslêem os nossos informes sobre o orçamento, execução orçamentária (...)”.Uma das estratégias utilizadas pelo Fórum tem si<strong>do</strong> a de discutir sugestõesde emenda à Lei Orçamentária, que são negociadas com algunsverea<strong>do</strong>res para serem apresentadas como emendas de sua própria autoria.Como descreve o representante <strong>do</strong> Corecon:“Esse é o caminho, a a<strong>do</strong>ção por parte <strong>do</strong>s parlamentares dasnossas sugestões de emendas. Fazemos a negociação, sempre como cuida<strong>do</strong> de não deixar [as emendas] com um parti<strong>do</strong> só, para tersempre uma gama ampla de parlamentares que a<strong>do</strong>tam as nossassugestões de emenda. E, graças a Deus, a gente tem consegui<strong>do</strong>também o respeito de vários parti<strong>do</strong>s, de vários parlamentares, oque facilita hoje o nosso trabalho. No início, antes de ser reconheci<strong>do</strong>,era mais difícil, mas hoje a gente já é reconheci<strong>do</strong> por váriosparlamentares, de vários parti<strong>do</strong>s, como interlocutores na questãoorçamentária. Inclusive pelo próprio governo”.Como resulta<strong>do</strong> dessa estratégia, o Fórum conseguiu aprovar diversasemendas. Na opinião da representante <strong>do</strong> Ideps, “atualmente, o orçamentoé bem mais transparente”. O Fórum conseguiu “ganhos muito grandes”,dentre os quais destaca-se o próprio interesse <strong>do</strong> poder Legislativo, jáque “os próprios verea<strong>do</strong>res não acompanhavam a execução orçamentáriae legislavam sem elementos...”. Não obstante os avanços, o representante<strong>do</strong> Corecon chama a atenção para as dificuldades:“O diálogo tornou-se mais fácil, porém nem sempre com resulta<strong>do</strong>s.Durante a discussão <strong>do</strong> orçamento deste ano [2002], por exemplo,muita tranqüilidade, muito diálogo com secretários e assessores,mas nenhuma sugestão <strong>do</strong> Fórum foi aceita. Em outras ocasiões foipossível negociar avanços, e até mesmo quan<strong>do</strong> foi alto o tom dacrítica a alguma questão da apresentação <strong>do</strong> orçamento, o diálogonão aconteceu naquele ano, mas no ano seguinte aquela sugestãofoi incorporada pelo poder Executivo porque também foram aponta<strong>do</strong>serros técnicos na própria elaboração”.Apesar das dificuldades, a legitimidade <strong>do</strong> Fórum junto a alguns verea<strong>do</strong>resé bastante significativa. Alguns deles revelam muita confiança no Fórum,como por exemplo, o verea<strong>do</strong>r Eliomar Coelho, <strong>do</strong> PT: “As minhas emendas,elas passam pelo crivo <strong>do</strong> Fórum. E o Fórum manda emendas pra cá. Porqueaí a gente já tem certeza da justeza das emendas, da legitimidade dessasemendas. Então, essas emendas chegam aqui e são muito bem-recebidas (...)”.55


56Se com a Câmara de Verea<strong>do</strong>res a relação <strong>do</strong> Fórum tem si<strong>do</strong> marcada pordiálogo e alianças pontuais, com o governo municipal a relação teve, atémuito recentemente, poucos avanços. As lideranças <strong>do</strong> Fórum pontuam osmomentos de diálogo, nos quais foram recebi<strong>do</strong>s pelo prefeito, mas mostram-semuito críticos quanto aos resulta<strong>do</strong>s desse processo. Na audiênciacom o Prefeito Luis Paulo Conde (prefeito entre 1997-2000), por exemplo, oFórum apresentou a proposta <strong>do</strong> orçamento participativo para o Rio, mas, defato, tal proposta nunca foi implementada. Como avalia o representante <strong>do</strong>Ibase, “a prefeitura tem uma postura muito parecida com todas que não fazemo orçamento participativo, que acham que orçamento é uma coisa só daprefeitura”, e não da sociedade. Na verdade, a relação com a prefeitura é maisou menos conflituosa segun<strong>do</strong> a postura <strong>do</strong> governante. E, segun<strong>do</strong> essaliderança <strong>do</strong> Fórum, o Prefeito César Maia, pelo menos até aquele momento,não mostrava “nenhum interesse em sentar pra conversar (...)”. Então, restavaao Fórum, ter “uma atuação de acompanhamento, de crítica, de controle (...)”.O fato é que a atuação <strong>do</strong> Fórum tem pressiona<strong>do</strong> o poder público pormudanças na forma como o orçamento tem si<strong>do</strong> elabora<strong>do</strong>. Como resulta<strong>do</strong>,em março de 2001, a Câmara de Verea<strong>do</strong>res aprovou o projeto de leide autoria <strong>do</strong> verea<strong>do</strong>r Eliomar Coelho, que dispõe sobre a participaçãoda comunidade no processo de elaboração, definição e acompanhamentoda execução <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> Plurianual de Investimentos (PPA), das DiretrizesOrçamentárias (LDO) e <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> Anual (LOA). A lei determinaque o poder Executivo desenvolva discussões com a comunidade sobre aspropostas orçamentárias, particularmente a aplicação <strong>do</strong>s recursos destina<strong>do</strong>saos investimentos, deven<strong>do</strong> cumprir algumas etapas, entre as quaisa realização de rodadas de discussões com as comunidades por regiãopara eleger seus representantes no Conselho e nos Fóruns Populares de<strong>Orçamento</strong>, instituí<strong>do</strong>s pela mesma lei. O calendário das discussões e atividadestambém deve ser fixa<strong>do</strong>, de comum acor<strong>do</strong>, pelo poder Executivoe o Conselho Popular <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong>, levan<strong>do</strong>-se em conta os prazos legaispara entrega <strong>do</strong>s projetos e aprovação das leis orçamentárias.Apesar de ter si<strong>do</strong> cria<strong>do</strong> pela mesma lei, o Conselho Popular <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong>ainda não está instala<strong>do</strong>. Ele deve ser composto por um mínimo de<strong>do</strong>is representantes da comunidade de cada região ou setor (que deverãoser eleitos anualmente na segunda rodada das discussões), por seis representantes<strong>do</strong> poder Executivo da área de planejamento, orçamento e finanças(sem direito a voto) e por um representante das seguintes entidades:Federação das Associações de Mora<strong>do</strong>res; Federação das Associaçõesde Favelas; Associação Comercial; Federação das Indústrias; Federação dasEmpresas de Transportes Coletivos; Movimentos de Cidadania e Defesa <strong>do</strong>Rio; Sindicato <strong>do</strong>s Médicos; Sindicato <strong>do</strong>s Professores; Sindicato <strong>do</strong>s Engenheiros;Sindicato <strong>do</strong>s Arquitetos; Sindicato <strong>do</strong>s Urbanitários; ConselhoRegional <strong>do</strong>s Economistas.


O Prefeito César Maia, em decreto publica<strong>do</strong> em abril <strong>do</strong> mesmo ano[2002], responsabilizou a Secretaria Municipal de Fazenda, por meio daSuperintendência de <strong>Orçamento</strong>, por se articular à Comissão de <strong>Orçamento</strong>e Finanças da Câmara de Verea<strong>do</strong>res com o objetivo de definir os procedimentosnecessários à implementação <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> Participativo, determinan<strong>do</strong>também que as secretarias, órgãos e empresas <strong>do</strong> município devamse articular com sistema <strong>do</strong> OP defini<strong>do</strong> na mesma lei.Em novembro de 2002, o Jornal O Globo Zona Sul noticiava o processoem andamento. Nele, constava que a prefeitura teria destina<strong>do</strong>R$ 91.489.605 para o orçamento participativo, envolven<strong>do</strong>, em média,entre 80 a 120 pessoas por região administrativa da cidade.Apesar das limitações <strong>do</strong> processo, as lideranças <strong>do</strong> Fórum reconhecemos avanços como conquistas dessa trajetória. O balanço <strong>do</strong> representante<strong>do</strong> Corecon é bastante ilustrativo e merece registro:“Na busca pela transparência orçamentária, pela clareza <strong>do</strong>sda<strong>do</strong>s orçamentários, nisso daí a gente tem avança<strong>do</strong>, não tantoquanto a gente desejaria, mas certamente mais <strong>do</strong> que a genteestava inicialmente supon<strong>do</strong>. Antes <strong>do</strong> Fórum não havia uma leide orçamento participativo, hoje existe. Não por iniciativa nossa,mas em função da nossa existência, verea<strong>do</strong>res se motivaram aelaborar uma lei sobre orçamento participativo. Então, de certaforma, obriga o poder Executivo hoje a tentar dialogar algumacoisa com a sociedade. A participação na questão orçamentária(...) certamente aumentou o grau de participação em termos dadiscussão orçamentária. Não na sua definição, não na sua elaboração,não na sua escolha de prioridades, mas certamente aumentouo nível de informação. Primeiro a gente conseguiu transformara informação em uma forma mais fácil. Em decorrênciadisso, em segun<strong>do</strong> lugar, avançamos em algumas coisas na questãoda transparência, na questão da participação. No entanto, naterceira e última prioridade, inverter prioridades, aí eu avalio quea gente não conseguiu avançar. Essa é nossa batalha final(...)”.Avanços e desafios para o controle socialO Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro, em sua atuação,parte de uma concepção de que o orçamento público só pode ser considera<strong>do</strong>um bem público se os critérios para a definição da arrecadação eda repartição <strong>do</strong>s recursos forem construí<strong>do</strong>s coletivamente pelo Esta<strong>do</strong>em permanente debate com a sociedade civil. Seus próprios integrantesproduziram um diagnóstico <strong>do</strong>s principais avanços conquista<strong>do</strong>s e desafiosa serem enfrenta<strong>do</strong>s para o aprofundamento de sua experiência.57


Dentre os principais avanços, poderíamos destacar:a) No campo da percepção social, o fortalecimento de valores demo-cráticos. Como exemplo desse resulta<strong>do</strong>, pode-se identificar a produçãode boletins, debates e seminários que abrem espaço parauma percepção social em torno da participação cidadã, da afirmaçãode direitos e da democracia, em torno da idéia de que a corrupçãoe o clientelismo estariam dentro <strong>do</strong> que tem si<strong>do</strong> chama<strong>do</strong>de “mal público”. Um mal coletivo pratica<strong>do</strong> predatoriamente pelossetores sociais <strong>do</strong>minantes na sociedade, visan<strong>do</strong> à obtenção devantagens privadas, em detrimento de to<strong>do</strong>s os outros setores. Poroutro la<strong>do</strong>, podemos considerar como bens públicos os valores necessáriosà dinâmica democrática, tais como a transparência, a participação,a ética e a responsabilidade cívica.No nosso entendimento, o Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> <strong>do</strong> Rio deJaneiro é responsável pela politização da questão orçamentária, possibilitan<strong>do</strong>ampliar o espaço de participação e os atores envolvi<strong>do</strong>s,bem como fortalecer práticas na perspectiva da democracia deliberativa,em que sejam combina<strong>do</strong>s processos de democracia representativacom a democracia participativa. Ao mesmo tempo, podemosver nesse processo uma ação de controle social sobre oorçamento, o que implica um combate preventivo às práticas predatórias<strong>do</strong> clientelismo e da corrupção. O Fórum tem na implantação<strong>do</strong> orçamento participativo no município <strong>do</strong> Rio de Janeiro um<strong>do</strong>s seus objetivos centrais. O orçamento participativo pode ser considera<strong>do</strong>um elemento fundamental para a renovação da democracia,em que “a participação <strong>do</strong>s cidadãos provê informações e diagnósticossobre os problemas públicos, geran<strong>do</strong> conhecimentos esubsídios à elaboração de estratégias para a resolução <strong>do</strong>s problemase conflitos envolvi<strong>do</strong>s” (Gohn, 2001:43).58b) No campo das articulações societárias, o fortalecimento da articu-lação da sociedade civil na forma de uma rede, conforman<strong>do</strong> umnovo campo em torno <strong>do</strong> controle social sobre o orçamento. Ossujeitos articula<strong>do</strong>s em torno <strong>do</strong> Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> sãomuito diversos no que concerne ao tipo de organização (associaçõesde bairro, associações de classe, organizações de cultura, ONGsetc.) e à base social representada (profissionais liberais, mora<strong>do</strong>resetc.). Para o representante <strong>do</strong> Corecon, “o grande avanço [<strong>do</strong> trabalho<strong>do</strong> Fórum] foi essa disseminação da questão orçamentárianas lutas sociais”, o que possibilita exatamente a constituição dessarede que articula uma pluralidade de interesses.Sobre esse espaço de articulação plural, no entanto, é preciso re-


conhecer também que existem diferenças em torno de expectativase demandas que correspondem, de certa forma, às especificidadese às dinâmicas das instituições que compõem o Fórum. Organiza<strong>do</strong>como na forma de rede, o Fórum tanto é um espaço demobilização popular, como possibilita um suporte instrumentalpara as organizações nas suas lutas por direitos; atua tanto nacapacitação de seus quadros, como na interlocução com o poderpúblico. O Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong> se constitui em um novoator social na cena política <strong>do</strong> Rio de Janeiro. No campo da formulaçãode políticas, atua na qualificação das organizações sociaise de suas redes. Aqui, podemos identificar processos nos quaisas organizações sociais e suas redes têm se capacita<strong>do</strong> para aformulação de propostas e programas de políticas sociais que respondemaos problemas vivencia<strong>do</strong>s no espaço da sua atuação.Um aspecto importante dessa qualificação é a articulação dasdemandas dessas organizações com a questão <strong>do</strong> orçamento, amplian<strong>do</strong>o campo de disputa na qual elas estão inseridas, <strong>do</strong> campoda reivindicação para o campo da alocação <strong>do</strong>s recursos públicos.É esse trabalho que legitima o Fórum em sua atuação nasesferas de poder. Como afirma o representante <strong>do</strong> Corecon, “essereconhecimento político foi algo, de certa forma, surpreendente.Hoje a gente fala com o prefeito, fala com a governa<strong>do</strong>ra e somosconheci<strong>do</strong>s de forma institucional(...)”.Além disso, é preciso levar em consideração que a atuação <strong>do</strong>satores sociais nas esferas públicas depende da sua capacidade deavaliar, discutir e formular propostas em termos de políticas públicas.Ten<strong>do</strong> em vista que “a qualidade da participação pode sermensurada pelo grau de informação (ou desinformação), contidasnas opiniões <strong>do</strong>s participantes” (Gohn, 2001:43), o Fórum temdesenvolvi<strong>do</strong> um importante trabalho de disseminação de informações,promoção de oficinas e cursos e produção de subsídiospedagógicos.c) No campo da exigibilidade de direitos, o fortalecimento das orga-nizações e de suas lutas. De uma forma geral, pode-se dizer que asdemandas <strong>do</strong>s sujeitos articula<strong>do</strong>s no Fórum, em que pese as diferençasentre si, são demandas por direitos (econômicos, sociais,políticos, culturais etc.), que expressam a exigência pela ampliaçãoda participação social e suas reivindicações contra as desigualdadessociais. Nesse ideário de luta por direitos, o que articula esse conjuntode sujeitos, é uma certa expectativa comum em torno <strong>do</strong> Fórum:o orçamento é um instrumento importante para suas lutas,para garantir direitos, para garantir que as demandas popularessejam incorporadas na ação <strong>do</strong> poder público.59


As questões suscitadas no embate pelo controle social <strong>do</strong> orçamentopúblico implicam mediações para que sejam efetivamenteapropriadas pelos atores sociais em conflito. Isso não significa negar,no entanto, que a disputa pelo orçamento não se traduza emdisputas efetivas pela alteração das condições imediatas de reprodução<strong>do</strong> mo<strong>do</strong> de vida – afinal, os recursos públicos sempre setransformam em serviços ou bens públicos. O que a experiência <strong>do</strong>Fórum indica é que essa possibilidade de apropriação das questõesé maior quan<strong>do</strong> o controle social <strong>do</strong> orçamento se torna um instrumento,uma ferramenta, na luta das próprias organizações emtorno da exigibilidade de direitos (como no exemplo da experiência<strong>do</strong> Grupo Pela Vida, na questão <strong>do</strong>s recursos destina<strong>do</strong>s à distribuição<strong>do</strong>s medicamentos para Aids).O trabalho <strong>do</strong> Fórum busca tornar o orçamento um recurso de méto<strong>do</strong>ao alcance das organizações que o compõem, fortalecen<strong>do</strong> acapacidade dessas organizações de articular as questões surgidas<strong>do</strong> debate sobre o orçamento com suas lutas pela exigibilidade dedireitos, acionan<strong>do</strong>, para isso, esferas jurídicas e políticas. É essaarticulação que possibilita romper o cerco de dependência das classespopulares das relações clientelistas e da <strong>do</strong>minação política àqual estão submetidas.A trajetória <strong>do</strong> Fórum, como a de toda organização social, também émarcada por dificuldades e desafios, sobretu<strong>do</strong> agora, com a introduçãode um programa de orçamento participativo pela Prefeitura <strong>do</strong> Rio deJaneiro. Com base na pesquisa realizada, gostaríamos de pontuar três dessesdesafios.60a) A ampliação da participação social. Inicialmente é preciso considerarque o orçamento continua a ser de grande complexidadepara a maior parte das pessoas. Como registra o representante<strong>do</strong> Corecon, “a forma como ele é apresenta<strong>do</strong> dificulta oacesso à informação, então, ele é também feito para as pessoasnão participarem”, já que a participação no processo orçamentáriopressupõe a disposição <strong>do</strong> poder público em compartilharo poder. Nessa questão da participação, podemos identificar diversasexpectativas levantadas pelos próprios participantes <strong>do</strong>Fórum, entre as quais destacamos: i) investir para tornar ocontrole sobre o orçamento um tema da agenda das associaçõesde mora<strong>do</strong>res e da sociedade organizada; ii) desenvolvernovas linguagens, como por exemplo o teatro, para discutir aquestão <strong>do</strong> orçamento da forma mais ampla possível com asociedade; (iii) constituir novas lideranças e atrair novas insti-


tuições; (iv) investir na divulgação para a opinião pública, atravésde uma política junto aos meios de comunicação de massa e aosforma<strong>do</strong>res de opinião.Do nosso ponto de vista, a legitimidade social <strong>do</strong> Fórum dependeexatamente da sua capacidade em constituir-se num espaço de articulaçãodas organizações da sociedade. Portanto, sua dinâmicade funcionamento pode ser decisiva e determinar as respostas possíveisàs expectativas <strong>do</strong>s seus integrantes. Desse mo<strong>do</strong>, o aban<strong>do</strong>norecente da prática de plenárias regulares deve ser objeto de reflexão,a fim de discutir se a atual configuração não deixaria umvácuo na dinâmica de funcionamento <strong>do</strong> Fórum como rede, na quala discussão permanente e sistemática com a mais ampla presençaem termos de representação social é um elemento central. Ao mesmotempo, também é preciso perceber se a atual dinâmica é capazde responder aos novos desafios coloca<strong>do</strong>s na cena política da cidade,de forma a preservar a legitimidade <strong>do</strong> Fórum na representação<strong>do</strong>s interesses populares.b) O monitoramento <strong>do</strong>s Fun<strong>do</strong>s <strong>Público</strong>s e <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> Federal.Grande parte das questões orçamentárias locais se articula com oâmbito estadual e federal, sobretu<strong>do</strong> por meio <strong>do</strong>s fun<strong>do</strong>s públicossetoriais, tais como o Fundef na área de educação. Essa articulaçãoaparece cada vez mais como uma questão importante, naperspectiva de fortalecer as organizações sociais nas suas lutaspor direitos.Esse desafio faz parte das preocupações das lideranças <strong>do</strong>Fórum, como registra o representante <strong>do</strong> Corecon, que afirmaque o Fórum já está acessan<strong>do</strong> da<strong>do</strong>s da execução orçamentária<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. Da mesma forma, no âmbito nacional, o crescentereconhecimento <strong>do</strong> Fórum tem permiti<strong>do</strong> a ampliaçãodessa experiência para outras capitais, como São Paulo, Curitibae João Pessoa e, como sublinha a mesma liderança, isso já estágeran<strong>do</strong> “uma articulação nacional, em torno de um Fórum àsemelhança <strong>do</strong> Rio, o Fórum Brasil de <strong>Orçamento</strong> 9 , para discutiro orçamento da União, com a participação direta <strong>do</strong>Conselho Federal <strong>do</strong>s Economistas”.c) A ampliação <strong>do</strong>s espaços institucionais de ação democrática. Aaprovação da lei que institui o orçamento participativo no municípioe o início de sua implementação pela prefeitura, coloca novosdesafios para o Fórum Popular de <strong>Orçamento</strong>. As possibilidades demobilização de novos atores são maiores ten<strong>do</strong> em vista esse espaço.O Fórum pode se beneficiar da sua experiência e da sua legitimidadepara fortalecer seu papel protagonista na cidade. Nesta direção,o Fórum pode ocupar o espaço de diálogo aberto pelo poder9 O Fórum Brasil <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong>foi constituí<strong>do</strong> em31 de agosto de 2002, coma participação de 28 entidades(organizações nãogovernamentais,movimentossociais, sindicatose conselhos profissionais).61


público, por menor que este seja, para aumentar o grau de participaçãoe enfrentar a questão da inversão de prioridades nos investimentossociais.Nesta direção, não há como deixar de tocar em <strong>do</strong>is pontos fundamentaispara pensar os desafios <strong>do</strong> Fórum. Em primeiro lugar, a relaçãoentre a dimensão técnica e a dimensão política. Para desmistificaro orçamento, é necessário trazer para a esfera de debates os aspectostécnicos e traduzí-los em uma linguagem popular. Dessa forma,como afirma o representante <strong>do</strong> Ibase, o Fórum pode “servir comoinstrumento para que as entidades e populações vejam a importância<strong>do</strong> orçamento, vejam ali suas reivindicações e estejam com o Fórumatuan<strong>do</strong> sobre elas”. Em segun<strong>do</strong> lugar, é preciso não perder de vistaque a constituição de uma esfera pública em torno da questão orçamentáriadeve incorporar os diversos interesses existentes nasociedade, incluin<strong>do</strong> aí os interesses priva<strong>do</strong>s.Só assim é possível visibilizar os diferentes interesses e publicizaros conflitos, geran<strong>do</strong> também novas possibilidades de construçãode consensos e alianças entre os atores sociais. Como atornessa esfera pública, cabe ao Fórum articular e representar os interessespopulares, fortalecen<strong>do</strong> sua expressão política. A construçãoe a consolidação dessa esfera pública possibilitariam, segun<strong>do</strong>Francisco Oliveira (2002): (i) ampliar os espaços de intervençãopopular nas relações entre Esta<strong>do</strong> e merca<strong>do</strong>; (ii) a construçãode uma outra racionalidade política no lugar da racionalidadeeconômica, desqualifican<strong>do</strong> “teórica e meto<strong>do</strong>logicamentea sagrada inviolabilidade e a autonomia da regra mercantil”; e(iii) fortalecer o senti<strong>do</strong> republicano <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, enquanto esferade defesa <strong>do</strong> interesse coletivo.62Enfim, esperamos que o Fórum prossiga na sua trajetória e que possatransformar sua experiência de luta pela democratização <strong>do</strong> orçamento<strong>do</strong> Rio de Janeiro em um vigoroso processo de orçamento participativo,alteran<strong>do</strong> as relações entre sociedade, poder Executivo e poder Legislativo,“intervin<strong>do</strong> no papel <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> na regulação da economia pelo social,moldan<strong>do</strong> a política social pública pela ativa intervenção cidadã nas prioridades,integran<strong>do</strong> a vontade cidadã com as decisões legislativas e executivas”(Francisco de Oliveira, apud Sánchez, 2002:58).Dessa forma, acreditamos que esse processo pode se constituir em singularexperiência de democratização <strong>do</strong> poder na cidade <strong>do</strong> Rio de Janeiro,diminuin<strong>do</strong> as distâncias entre governantes e governa<strong>do</strong>s. Como lembraFrancisco de Oliveira, “uma extraordinária invenção política vem se firman<strong>do</strong>no Brasil. O que a tradição, curta é verdade, está chaman<strong>do</strong> deorçamento participativo”.


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Fórum em Defesa da Cidadania deLagoa Seca-PBEsse texto foi elabora<strong>do</strong> por Adriano Homero Vital Pereira, José Césarde Magalhães Jr. e Tatiana de Amorim Maranhão. Agradecemos aos participantes<strong>do</strong> Fórum em Defesa da Cidadania de Lagoa Seca e aos assessores<strong>do</strong> Centro de Ação Cultural pelas entrevistas e o material forneci<strong>do</strong>para a pesquisa.ResumoVamos relatar aqui a experiência <strong>do</strong> Fórum em Defesa da Cidadania deLagoa Seca, município localiza<strong>do</strong> no interior <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> da Paraíba, nonordeste brasileiro. Este artigo busca identificar os avanços <strong>do</strong> Fórum nacapacidade de dar maior visibilidade à utilização <strong>do</strong>s recursos públicos,de ampliar a participação popular na definição das políticas públicas, deutilizar os instrumentos jurídicos e recorrer ao Ministério <strong>Público</strong> e aoTribunal de Contas para realizar o controle social <strong>do</strong> orçamento. Atravésda análise da experiência <strong>do</strong> Fórum, no contexto da realidade orçamentáriade um município pequeno e pobre <strong>do</strong> interior <strong>do</strong> País, procura-se tambémdiscutir os desafios para a ampliação da participação popular narelação com os poderes públicos, na utilização <strong>do</strong>s dispositivos legais queconferem uma maior transparência ao orçamento e no acesso aos da<strong>do</strong>ssobre o destino <strong>do</strong>s recursos.Introdução64Este artigo tem o objetivo de discutir a importância <strong>do</strong> controle socialsobre o orçamento público através <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> de caso <strong>do</strong> Fórum em Defesada Cidadania <strong>do</strong> município de Lagoa Seca. Ao resgatar a história deconstituição <strong>do</strong> Fórum através de entrevistas realizadas com seus integrantese da leitura <strong>do</strong> material produzi<strong>do</strong> por eles, procura-se identificaros principais desafios e avanços no monitoramento <strong>do</strong>s gastos públicose na relação com o poder público em uma cidade pequena <strong>do</strong>agreste nordestino.


O Fórum consoli<strong>do</strong>u-se efetivamente em 1998. Ele é composto por entidadesque atuam na defesa <strong>do</strong>s interesses <strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res de Lagoa Seca. Comoeste é um município rural, a área de atuação <strong>do</strong> Fórum está centrada nos interesses<strong>do</strong>s pequenos agricultores e parte <strong>do</strong> ponto de vista de que a agriculturaé a atividade econômica capaz de alavancar o desenvolvimento local.Ao longo <strong>do</strong> processo de constituição deste Fórum, o acúmulo decorrenteda capacitação para leitura e compreensão <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos orçamentários,estimulou a percepção de que a reivindicação de uma políticaeconômica local demanda a luta mais ampla por uma forma de distribuiros recursos que atenda aos direitos básicos de to<strong>do</strong> cidadão. Faz partedessa percepção mais abrangente a iniciativa de se solicitar que os órgãosresponsáveis pelo controle externo das contas públicas, no cumprimentode suas atribuições constitucionais, auxiliem a sociedade civil.Cenário social e político <strong>do</strong> Município deLagoa SecaLagoa Seca é um município localiza<strong>do</strong> no agreste <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> da Paraíba,região nordeste <strong>do</strong> Brasil, a 129 quilômetros da capital João Pessoa. Pequeno,com pouco mais de 24 mil habitantes e eminentemente rural, o municípiotem 94,7% <strong>do</strong>s seus 109 quilômetros quadra<strong>do</strong>s de extensão ocupa<strong>do</strong>spor pequenas propriedades de até 10 hectares. Segun<strong>do</strong> da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Sindicato<strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>res Rurais de Lagoa Seca (STR), nem todas estas propriedadessão de agricultores locais, 30% são granjas de famílias mais ricas,residentes em municípios vizinhos. Lagoa Seca é um município rural, comum pequeno centro urbano onde vivem cerca de 7.900 habitantes.Sua principal atividade econômica é a produção de hortifrutigranjeiros,cultura afeita a regiões com maior ocorrência de chuvas, o que é uma particularidadeda região que situa-se na Serra da Borborema. Há também atividadesde agropecuária complementares e uma incipiente produção industrialproveniente de uma única fábrica de farinha instalada no município. Os principaisprodutos <strong>do</strong> comércio local são, portanto, a farinha de mandioca, abatata, o frango, as frutas e as verduras. Esses produtos são vendi<strong>do</strong>s em umafeira semanal e atendem parte <strong>do</strong> consumo local e das cidades vizinhas.Uma tendência cada vez mais forte no município é a da venda das pequenaspropriedades rurais para mora<strong>do</strong>res das cidades vizinhas, principalmentede Campina Grande. Lagoa Seca tem se torna<strong>do</strong>, nos últimos anos,uma cidade muito procurada para a construção de casas de campo <strong>do</strong>shabitantes de outras cidades paraibanas da região, o que tem promovi<strong>do</strong> avalorização das pequenas propriedades rurais no merca<strong>do</strong> imobiliário local.Neste contexto, os antigos sítios <strong>do</strong>s produtores locais estão sen<strong>do</strong> vendi<strong>do</strong>saos habitantes das cidades vizinhas e a população urbana de Lagoa65


661 Balanço Geral <strong>do</strong> Municípiode Lagoa Seca, 1999.2 Por meio da realização deestu<strong>do</strong>s permanentes sobreo funcionamento dalegislação orçamentária,análises <strong>do</strong>s relatórios deprestação de contas, estu<strong>do</strong>ssobre a conjunturapolítica local e a produçãode boletins informativos.Seca está crescen<strong>do</strong> desordenadamente. Esse crescimento traz para o cotidiano<strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res locais, típicos problemas normalmente identifica<strong>do</strong>scom os grandes centros urbanos: a periferização da cidade, o desemprego,os casos de alcoolismo, o tráfico de drogas, uma rede de prostituição dejovens e outros problemas de segurança pública.Segun<strong>do</strong> os entrevista<strong>do</strong>s, várias são as razões da situação de extremavulnerabilidade em que vivem os pequenos agricultores. Por um la<strong>do</strong>, adificuldade <strong>do</strong> plantio em uma região com perío<strong>do</strong>s de seca, o baixo preço<strong>do</strong>s produtos agrícolas no merca<strong>do</strong> local, soma<strong>do</strong>s à expectativa deobtenção de rendimentos bancários com o resulta<strong>do</strong> da venda de suaspropriedades, levam muitas famílias de pequenos produtores a vendersuas terras e ir viver na área urbana de Lagoa Seca, com cerca de 7.900habitantes. Por outro la<strong>do</strong>, entretanto, as mínimas perspectivas de empregona cidade – a maior parte deles no serviço público – adensam apobreza e a falta de perspectiva dessas famílias, ao invés de reduzi-las.A política local é fortemente marcada por relações de fidelidade, constrangimentoe intimidações, remeten<strong>do</strong> à sociabilidade tradicionalmentefundada no man<strong>do</strong>nismo pessoal. Nas eleições, a compra de votos e asameaças aos funcionários públicos, servem de garantia a sucessão na Prefeitura<strong>do</strong>s políticos tradicionais da cidade. A ameaça ao funcionário públicoé extremamente eficaz em um município, no qual boa parte das famíliaslocais procura emprego no setor público. Os opositores da políticalocal, quan<strong>do</strong> se manifestam, são ameaça<strong>do</strong>s por “capangas <strong>do</strong>s homens<strong>do</strong> poder”, contribuin<strong>do</strong> para a crença <strong>do</strong>s pequenos proprietários de quenão há alternativas além <strong>do</strong> voto nos mesmos de sempre.Lagoa Seca é um município marca<strong>do</strong> por uma prática política na qual odinheiro público é abertamente utiliza<strong>do</strong> para fins priva<strong>do</strong>s, inclusive com ofavorecimento de empresas de familiares <strong>do</strong> prefeito. Os recursos públicosnos últimos anos têm si<strong>do</strong> abertamente desvia<strong>do</strong>s <strong>do</strong> atendimento às demandascomprometidas com o desenvolvimento local para a manutenção damáquina administrativa da Prefeitura. O Balanço Geral <strong>do</strong> Município, de 1999,constata que o remanejamento de recursos privilegiou o Gabinete <strong>do</strong> prefeitoe a Secretaria de Administração, em detrimento das secretarias que desenvolvemações que atingem diretamente as condições de vida da população,como é o caso das Secretarias de Saúde, Ação <strong>Social</strong> e Agricultura 1 .O Fórum em Defesa da Cidadania deLagoa Seca: história e objetivosAs primeiras articulações em torno da constituição <strong>do</strong> Fórum em Defesada Cidadania de Lagoa Seca datam da década de 1980, quan<strong>do</strong> oCentro de Ação <strong>Social</strong> – Centrac – já prestava assessoria 2 a organizações


urais que faziam oposição ao Sindicato <strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>res Rurais (STR)<strong>do</strong> município. A avaliação dessas organizações de oposição era de que osdiretores <strong>do</strong> Sindicato, à época, não estavam comprometi<strong>do</strong>s com umapolítica de estímulo à pequena produção. Em 1992, esse grupo da oposiçãoconsegue se eleger para a diretoria <strong>do</strong> Sindicato e, a partir <strong>do</strong> anoseguinte, começa a realizar encontros e seminários para formular e encaminharas propostas <strong>do</strong>s agricultores ao orçamento público. Iniciava-seuma primeira tentativa de controle social <strong>do</strong> orçamento municipal. O Sindicatopretendia intervir no processo orçamentário daquele ano com aconcepção de que o orçamento está relaciona<strong>do</strong> com a definição e a implantaçãodas políticas públicas e, portanto, é um instrumento políticopor meio <strong>do</strong> qual a sociedade civil pode, não só fiscalizar a aplicação <strong>do</strong>srecursos, mas também discutir com o governo os objetivos e as metasdessas políticas.No contexto das relações que constituem o poder político na cidade, ocontrole social <strong>do</strong> orçamento era também fundamental para lançar luzsobre as práticas privatistas de apropriação <strong>do</strong>s bens e recursos públicospor parte <strong>do</strong>s grupos políticos <strong>do</strong>minantes sobre os quais recaíam fortessuspeitas. A proposta de acompanhamento <strong>do</strong> orçamento municipal surge,portanto, em 1993, com a intenção de fazer frente à falta de transparênciada administração pública e às suspeitas de desvios <strong>do</strong>s recursosmunicipais.No entanto, a atuação <strong>do</strong> Sindicato na tentativa de incluir as demandas<strong>do</strong>s pequenos agricultores nas leis orçamentárias não obtevemuito sucesso, uma vez que não encontrava eco na administraçãomunicipal.Entre 1996 e 1997, o Sindicato começou a elaborar um diagnósticoda realidade local a fim de subsidiar a construção de políticas públicaspara o desenvolvimento rural. Em pouco mais de um ano, um grupo deoito agricultores 3 conduziu o levantamento da situação <strong>do</strong> município,envolven<strong>do</strong> cerca de 100 agricultores e agricultoras das diversas regiões.Realizaram uma “travessia” pelo município e, pelo contato diretocom os mora<strong>do</strong>res e sua realidade, constataram as diversas situaçõessociais e econômicas regionais, sintetizan<strong>do</strong> propostas para os problemasencontra<strong>do</strong>s.Com o diagnóstico <strong>do</strong>s problemas e o apontamento de algumas soluções,iniciou-se um processo de capacitação <strong>do</strong>s agricultores para a implementaçãode uma política de convivência com a seca. Dentre as experiênciasde maior expressão decorrentes da implantação dessa nova políticadestacam-se a constituição de um Banco de Sementes Comunitário, a instalaçãode cisternas de placas para a captação de água das chuvas nascasas <strong>do</strong>s pequenos proprietários e a construção de barragens subterrânease de barreiros de pedras.3 Juntamente a AS-PTA(Assessoria e Serviços aProjetos em AgriculturaAlternativa) e ao Centrac(Centro de Ação Cultural).67


O Fórum e o <strong>Controle</strong> <strong>Social</strong> <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong>4 Atualmente, as associaçõesque compõem o Fórumsão: Associação <strong>do</strong>sPequenos Produtores Ruraisde Tabuleiro e Quicé,Associação <strong>do</strong>s PequenosProdutores Rurais <strong>do</strong> SítioRetiro e Manguape I, Associação<strong>do</strong>s PequenosProdutores Rurais de Gravatá,Associação <strong>do</strong>s PequenosProdutores Ruraisde Manguape de Cima, Associação<strong>do</strong>s PequenosProdutores Rurais <strong>do</strong> SítioCovão, Pastoral da Criança,Representantes <strong>do</strong>Conselho Municipal daAgricultura, Representantes<strong>do</strong> Conselho Municipalda Ação <strong>Social</strong>, Representantes<strong>do</strong> Conselho Municipalde Saúde, Representantes<strong>do</strong> Conselho Municipal<strong>do</strong> Agreste da Borborema,Sindicato <strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>resRurais de LagoaSeca e Sociedade Amigosda Cidade.Apenas em 1998, a mobilização de outras associações comunitáriasrurais e urbanas e algumas pastorais, juntamente ao já ativo STR, agregouforças na constituição <strong>do</strong> Fórum em Defesa da Cidadania de Lagoa Seca 4 .A partir de então, o Fórum passou a elaborar alternativas para os problemassociais locais e a denunciar irregularidades na gestão <strong>do</strong> orçamentopúblico <strong>do</strong> município.Neste senti<strong>do</strong>, <strong>do</strong>is integrantes <strong>do</strong> Fórum comentam: “(...) ele [o Fórum]existiu a partir dessa necessidade de você trabalhar junto (...) não dápra gente fazer um trabalho no campo e as organizações da cidade fazeremas suas atividades, as suas reivindicações, as suas lutas isoladas e aIgreja ficar <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> também com o trabalha<strong>do</strong>r das comunidades, aidéia <strong>do</strong> Fórum exatamente para a gente fortalecer é nas ações gerais, porexemplo, tem atividades no cotidiano que o Sindicato está lá, está fazen<strong>do</strong>um trabalho nas comunidades, fazen<strong>do</strong> um trabalho na zona rural,nas associações, mas tem coisas que é de interesse da população comoum to<strong>do</strong> e aí é preciso que as organizações se juntem (...)”.“Ele [Fórum] surgiu na necessidade de se juntar às associaçõesrurais junto com o sindicato, mas também as associações aqui dacidade, no caso da SAC [Sociedade Amigos da Cidade], no caso daassociação aqui <strong>do</strong>s Anacletos. Isso foi muito importante, que pessoas,organizações aqui <strong>do</strong> nosso município pudessem se integrarnuma luta que unisse campo e cidade e principalmente das questõessociais <strong>do</strong> município que é de interesse da cidade (...)”.68Ten<strong>do</strong> em vista o caráter pre<strong>do</strong>minantemente rural da economia local,o trabalho <strong>do</strong> Fórum ampliou-se e dá seguimento às iniciativas originais<strong>do</strong> Sindicato, além de estar centra<strong>do</strong> no fortalecimento da agriculturafamiliar. Para tanto, tem desenvolvi<strong>do</strong> trabalhos na ênfase <strong>do</strong> cultivo ecológicopor meio <strong>do</strong> uso de biofertilizantes produzi<strong>do</strong>s pelos próprios agricultoreslocais, na recuperação <strong>do</strong> solo por meio <strong>do</strong>s fun<strong>do</strong>s rotativos deestrume, na adubação verde e na produção e distribuição de mudas eplantas cultivadas pelo Banco de Sementes. É por meio da organização deuma Feira Orgânica semanal (sem o apoio da Prefeitura), que procura escoara produção local, garantin<strong>do</strong> o sustento <strong>do</strong>s produtores.Neste contexto, o objetivo fundamental <strong>do</strong> Fórum é exercer o controlesocial <strong>do</strong> orçamento para otimizar a aplicação <strong>do</strong>s recursos, propor políticaspúblicas voltadas ao desenvolvimento local e fiscalizar sua execução, a fim degarantir transparência e democratização na administração da coisa pública.Em 1998, o Fórum articulou uma representação junto ao Tribunal de Contas<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e ao Ministério <strong>Público</strong> Estadual, reivindican<strong>do</strong> a investigação


de denúncias de mau uso <strong>do</strong>s recursos públicos pelo prefeito, na época <strong>do</strong>PSDB. No ano seguinte, iniciou o acompanhamento mais efetivo <strong>do</strong> orçamentopúblico municipal. A prática recorrente <strong>do</strong> governo municipal em descumpriros prazos de envio <strong>do</strong>s Projetos de Lei <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> (o Plano Plurianual, aLei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual) à Câmara <strong>do</strong>sVerea<strong>do</strong>res, impossibilitan<strong>do</strong> a participação popular nas suas fases de discussãoe elaboração, impulsionou a elaboração de estratégias de ação pelo Fórumcom a intenção de fiscalizar o comportamento <strong>do</strong> Executivo no que dizrespeito aos gastos públicos. Oficinas e seminários de estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s BalancetesMensais e da Lei Orçamentária foram desenvolvi<strong>do</strong>s com o objetivo de facilitaro acompanhamento da execução orçamentária. Buscou-se assessoria econômicae jurídica para analisar os <strong>do</strong>cumentos e discutir os caminhos legaispara a fiscalização de to<strong>do</strong> o processo.Com a intenção de sensibilizar a opinião pública local para a necessidadede se monitorar o orçamento, o Fórum produziu (com assessoria <strong>do</strong>Centrac) o “Boletim Informativo – <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong> e Cidadania”. EsseBoletim divulgou irregularidades cometidas pela administração municipal,a comprovação dessas irregularidades da Prefeitura pelo Tribunal deContas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> da Paraíba (TCE/PB), a reação <strong>do</strong> Fórum e as recomendaçõesda Câmara <strong>do</strong>s Verea<strong>do</strong>res. Foi a sua primeira ação efetiva na tradução,avaliação e divulgação <strong>do</strong>s gastos públicos para a comunidade,enfatizan<strong>do</strong> a extrema importância de manter a população continuamenteinformada. Sua ampla repercussão contribuiu bastante para despertar napopulação a necessidade de se fiscalizar o uso <strong>do</strong>s recursos públicos.O Boletim, além de informar a população sobre a maneira como osrecursos públicos são utiliza<strong>do</strong>s pela Prefeitura, busca traduzir em linguagemmais acessível os termos <strong>do</strong> “orçamentês”. Ao longo de toda apublicação, são explica<strong>do</strong>s quais são os impostos pagos e o significa<strong>do</strong> <strong>do</strong>orçamento para os mora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> município.Em 2000, o trabalho de acompanhamento <strong>do</strong>s gastos públicos foi intensifica<strong>do</strong>com o aumento no número de lideranças envolvidas no estu<strong>do</strong><strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos de planejamento e na comparação destes com as obrase os serviços executa<strong>do</strong>s. Irregularidades se mantinham e o Fórum desempenhouo papel de difundir informações e denúncias junto às comunidadesrurais e urbanas.Em setembro deste mesmo ano, foi veicula<strong>do</strong> um Boletim apresentan<strong>do</strong>a análise das contas públicas <strong>do</strong> município no ano de 1999. A análisefoi desenvolvida a partir das informações <strong>do</strong>s Balancetes Mensais e <strong>do</strong>Balanço Geral <strong>do</strong> Município. Pela análise das principais ações da Prefeituracom os recursos <strong>do</strong> ano de 1999, o Boletim denunciava a distorção napriorização <strong>do</strong> uso <strong>do</strong>s recursos pela administração, evidenciada pela concentraçãodas despesas em eleva<strong>do</strong>s gastos na área administrativa emdetrimento <strong>do</strong> investimento nas áreas de maior carência da população.69


705 CENTRAC. CampinaGrande, <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong>e Cidadania. nº. 06, set.2002.6 Fican<strong>do</strong> em terceiro lugarcom 18% <strong>do</strong>s votosapura<strong>do</strong>s (TSE).Altos custos com diárias, com consertos de peças de automóveis, aluguéisde carros, telefones celulares, combustíveis, pagamento de advoga<strong>do</strong>s e alimentação(nos restaurantes mais caros de João Pessoa e Campina Grande) serepetiam em todas as secretarias. As ações da Secretaria de Ação <strong>Social</strong> – quedeveriam ser voltadas à garantia de direitos da população – restringiam-se àcompra de óculos, ataúdes, remédios, consultas oftalmológicas e cirurgias. OBoletim acusava a Prefeitura de desenvolver ações puramente assistencialistas,em vez de implementar programas que garantissem a efetiva melhoradas condições de vida da população. As ações da Secretaria acentuariam,assim, o caráter paternalista <strong>do</strong> governo municipal, que realizava atividadesbeneficentes como moeda de troca para sua manutenção no poder.Em 1999, os gastos com serviços somaram R$ 550.602,14, valor superiora todas as <strong>do</strong>tações orçamentárias de todas as secretarias, com exceçãoda Secretaria de Educação e Cultura e da Secretaria de Infra-Estrutura,R$ 1.589.700,00 e R$ 603.000,00, respectivamente. Os gastos com serviçossomam 11,25% de toda a despesa orçamentária <strong>do</strong> município. Outrosda<strong>do</strong>s apresenta<strong>do</strong>s pelo Boletim 5 , com base na comparação <strong>do</strong>s balancetescom o Balanço Geral <strong>do</strong> Município, demonstram os estron<strong>do</strong>sos gastos comautomóveis, superiores aos gastos com a Secretaria de Ação <strong>Social</strong>. Os serviçoscom consertos de carros foram de R$ 75.211,53, que, soma<strong>do</strong>s aos R$ 117.362,84da compra de peças de carros, totalizam R$ 192.574,37, valor superior à <strong>do</strong>taçãoorçamentária da Secretaria de Ação <strong>Social</strong>, que foi de R$114.600,00.A ampla divulgação desses resulta<strong>do</strong>s favoreceu a derrota <strong>do</strong> entãoprefeito à reeleição no pleito municipal de outubro de 2000 6 . Além disso,impulsionou o processo judicial que decidiu, em primeira instância, pelaindisponibilidade de seus bens e a quebra <strong>do</strong> sigilo bancário, numa respostaà ação movida pela Cura<strong>do</strong>ria <strong>do</strong> Patrimônio de Campina Grande, apartir das denúncias <strong>do</strong> Fórum.Em 2001, o Fórum persistiu intervin<strong>do</strong> no processo orçamentário pelafiscalização, leitura e análise <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentos públicos. Os membros <strong>do</strong> Fórum,neste perío<strong>do</strong>, participaram de oficinas para formulação de emendas àLei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e acompanharam o processo de votaçãoe aprovação pela Câmara <strong>do</strong>s Verea<strong>do</strong>res. No primeiro semestre de 2001,foi publica<strong>do</strong> mais um Boletim Informativo analisan<strong>do</strong> os gastos municipaisde 2000 e as previsões orçamentárias para 2001. Uma vez mais, notaseo mesmo comportamento <strong>do</strong>s gastos: excessivos dispêndios com automóveis,despesas com funcionários fantasmas e grandes festas com osrecursos da Secretaria da Agricultura que deveriam estar sen<strong>do</strong> efetivamentedestina<strong>do</strong>s aos 66% da população, residente na área rural <strong>do</strong> município.Eram os mesmos problemas identifica<strong>do</strong>s na gestão <strong>do</strong> prefeito em1999, quan<strong>do</strong> se constatou o enorme gasto com a manutenção das Secretariasem detrimento <strong>do</strong>s investimentos. O Boletim denunciava ainda a ocorrênciade gastos em benefício de familiares <strong>do</strong> prefeito: 4.500 reais no pa-


gamento de café da manhã para 250 pessoas e almoço para 300 em umPlanejamento Didático e Pedagógico <strong>do</strong>s professores <strong>do</strong> município, para oqual fora contratada a empresa Blu´Nelle, pertencente à irmã <strong>do</strong> prefeito eadministrada por seu sobrinho.O mesmo Boletim divulgou, por outro la<strong>do</strong>, as iniciativas <strong>do</strong>s agricultoreslocais em parceria com a organização não-governamental AS-PTA(Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa) e outras quecompõem a Articulação <strong>do</strong> Semi-Ári<strong>do</strong> Paraibano no fortalecimento daagricultura familiar e o início de uma resposta – ainda que tímida – <strong>do</strong>spoderes constituí<strong>do</strong>s ao trabalho de fiscalização da aplicação <strong>do</strong>s recursospúblicos. Tanto a Câmara <strong>do</strong>s Verea<strong>do</strong>res quanto a Prefeitura demonstrarama disposição de rever algumas práticas. Os verea<strong>do</strong>res passaram acumprir a determinação legal de encaminhar <strong>do</strong>cumentos quan<strong>do</strong> solicita<strong>do</strong>spelas organizações locais. A Prefeitura passou a privilegiar o comérciolocal na compra de combustíveis, gás de cozinha e alimentos.Um indicativo <strong>do</strong> peso político que este trabalho vem adquirin<strong>do</strong> na cenapública de Lagoa Seca é o incômo<strong>do</strong> causa<strong>do</strong> por um programa na rádio localcomanda<strong>do</strong> pelo Fórum. De acor<strong>do</strong> com o relato <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s, um secretáriomunicipal teria liga<strong>do</strong> para a rádio, queixan<strong>do</strong>-se de uma entrevista com umintegrante <strong>do</strong> Fórum na qual ele denunciava os desvios <strong>do</strong>s recursos públicos.No início de suas atividades, o Fórum se reunia periodicamente, umavez por mês. No entanto, atualmente, os encontros variam de acor<strong>do</strong> comas demandas existentes. Há perío<strong>do</strong>s em que as reuniões acontecem comcerta freqüência e há perío<strong>do</strong>s em que o espaçamento entre elas é maior.Em geral, os encontros reúnem entre 10 e 15 pessoas, representantes decerca de 14 entidades.A partir da atual gestão municipal, houve um certo esvaziamento <strong>do</strong>Fórum. O atual prefeito é de um grupo político diferente <strong>do</strong> anterior e,portanto, muitas pessoas que, durante a outra gestão, estavam na “oposição”e atuavam no Fórum, agora, foram convidadas a trabalhar na Prefeiturae aceitaram. Com isso, o Fórum perdeu quadros, pois se o funcionáriopúblico municipal insistir em permanecer na “oposição”, ele sofre ameaçase punições, como sua transferência para um posto distante. Aceitarou não um emprego na Prefeitura é, inclusive, uma das questões que algunsentrevista<strong>do</strong>s consideram uma decisão pessoal difícil.O processo de monitoramento <strong>do</strong><strong>Orçamento</strong> Municipal de Lagoa SecaA composição orçamentária de Lagoa Seca, a exemplo da grandemaioria <strong>do</strong>s municípios brasileiros, depende quase que exclusivamentedas receitas transferidas pelos governos estadual e federal. No exercício71


7 Durante este processo, oFórum conta com a assessoriatécnica <strong>do</strong> Centrac.de 2002, as receitas próprias <strong>do</strong> município somavam apenas 2,35% <strong>do</strong>total de sua composição, enquanto as receitas transferidas representavamcerca de 90% <strong>do</strong> total da receita <strong>do</strong> município. Desta forma, LagoaSeca é sustentada pelos recursos transferi<strong>do</strong>s, produzin<strong>do</strong> poucosrecursos internamente.De acor<strong>do</strong> com os integrantes <strong>do</strong> Fórum, há a perspectiva de que aparticipação no processo orçamentário deva se dar nas três etapas previstaspela Constituição: no Plano Plurianual (PPA), na Lei de DiretrizesOrçamentárias (LDO) e na Lei Orçamentária Anual (LOA), embora os esforçosainda tenham se concentra<strong>do</strong> principalmente nos momentos de elaboraçãoda LDO e da LOA.Em Lagoa Seca, as audiências públicas – momentos específicos, previstospela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), em que a população podeacompanhar e influir no planejamento <strong>do</strong> orçamento público – são meiospara que o Fórum apresente suas propostas, sem a garantia de que serãoincluídas na Lei Orçamentária Anual.Segun<strong>do</strong> os entrevista<strong>do</strong>s, antes da apresentação das propostas, oFórum reúne as lideranças comunitárias e elege uma lista de prioridadespara cada uma das secretarias municipais. Essa lista é elaboradaconforme os diagnósticos prévios realiza<strong>do</strong>s junto à comunidade. Portanto,as proposições <strong>do</strong> Fórum são, em geral, apresentadas por secretaria,com destaque para os programas encaminha<strong>do</strong>s ao setor da agricultura7 . Embora seus integrantes saibam que os problemas de LagoaSeca envolvem outras questões para além da agricultura, o Fórum écomposto, em sua maioria, por agricultores que, portanto, têm maiorconhecimento nesta área.A dinâmica da fiscalização realizada pelo Fórum se dá pela divisão deseus membros em grupos e subgrupos, nos quais cada integrante ficaresponsável por um determina<strong>do</strong> aspecto. De posse de balancetes completos,com notas de empenho e notas fiscais, os membros <strong>do</strong> Fórum fazemo trabalho de comparação entre o que está previsto e a execução <strong>do</strong>sgastos. Esse trabalho é realiza<strong>do</strong> com idas a campo para o acompanhamentoefetivo da realização de uma obra ou da prestação de um benefícioque constam no balancete. Para isto, os membros <strong>do</strong> Fórum chegam a sevaler de fotografias (material forneci<strong>do</strong> pelo Centrac). Dessa forma, checamas possíveis disparidades e irregularidades existentes.72“(...) porque geralmente o que tem aconteci<strong>do</strong> é que eles fazemorçamento pra fazer um investimento de, por exemplo, duassalas de aula. Aí, chega num determina<strong>do</strong> colégio, divide a salano meio e: ‘gastou tanto’. Coisa que é totalmente errada porquenão gastou aquele recurso. E para onde tá in<strong>do</strong> aquela sobra daqueledinheiro?”


Os membros <strong>do</strong> Fórum alegam maior facilidade na fiscalização dasobras, uma vez que, quan<strong>do</strong> os gastos envolvem a distribuição de produtoscomo o leite ou o óleo é difícil comprovar os valores e compará-los aoque foi registra<strong>do</strong> nos balancetes analisa<strong>do</strong>s.“(...) às vezes, a gente vê a nossa Prefeitura dar muito auxílio,muitas ajudas financeiras e a gente vê os <strong>do</strong>cumentos assina<strong>do</strong>s láe a gente, às vezes, não tem como comprovar se, de fato, aquelapessoa recebeu a quantia ‘xis’, que tá ali no papel e isso é umadificuldade. A facilidade é a parte das obras, é fácil, enquanto essaoutra parte é mais difícil.”Um exemplo desse trabalho foi a comparação <strong>do</strong>s valores da obra realizadano grupo de escolas Manoel Pereira da Silva e Alzira Coutinho,valores que constavam <strong>do</strong> Balancete Mensal de 2001 da Prefeitura, com oesta<strong>do</strong> real da construção. De acor<strong>do</strong> com o balancete, a obra teria custa<strong>do</strong>R$ 21.242,77; no entanto, com a ida as escolas, constatou-se que osprédios continuavam deteriora<strong>do</strong>s. Essa situação, assim como outras similares,foi denunciada à população por meio da divulgação <strong>do</strong> BoletimInformativo.Outro caso menciona<strong>do</strong> por uma das integrantes <strong>do</strong> Fórum foi o <strong>do</strong>aterramento de um lixão existente no município. Segun<strong>do</strong> ela, a Prefeituradivulgou um grande gasto com esse aterramento, mas a ida ao local e conversascom os mora<strong>do</strong>res mostraram que a ação não havia si<strong>do</strong> realizada.“A questão <strong>do</strong> lixão, a gente foi lá encaminhar. O prefeito disseque aterrou, que gastou muito. A gente foi lá, a gente constatouque nada disso foi feito, inclusive não só com nosso visual, masatravés das comissões que moram lá perto <strong>do</strong> lixão, eles disseram:‘o pessoal, aqui, não vieram’.”Nas reuniões <strong>do</strong> Fórum, as discussões sobre as propostas a serem incluídasno orçamento são realizadas a partir da divisão de seus membros deacor<strong>do</strong> com as suas áreas de atuação. Posteriormente, são realizadas discussõescom as secretarias afins. Essas discussões são encaminhadas às audiênciaspúblicas requisitadas à Câmara <strong>do</strong>s Verea<strong>do</strong>res por ofícios formais <strong>do</strong>Fórum, embora se saiba que elas são uma obrigação legal <strong>do</strong> poder público.Segun<strong>do</strong> os membros <strong>do</strong> Fórum, não existe um espaço de atuação conjuntacom os poderes constituí<strong>do</strong>s no que diz respeito à elaboração <strong>do</strong>orçamento. De acor<strong>do</strong> com uma entrevistada, a relação com os verea<strong>do</strong>resé pautada por brigas e discussões que não visam ao entendimentopúblico daquilo que poderia ser um bem coletivo. É uma relação baseadaem represálias e perseguições, nas quais o prefeito e os verea<strong>do</strong>res acu-73


sam o Fórum de ser um grupo de persegui<strong>do</strong>res e arruaceiros. O papel quepretende desempenhar como espaço plural que busca estimular o exercícioda cidadania pela intervenção <strong>do</strong>s cidadãos nas decisões <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>,na defesa de uma política social para a região e na fiscalização <strong>do</strong>s gastos<strong>do</strong> dinheiro público, é deturpa<strong>do</strong>. O poder público descaracteriza as denúncias<strong>do</strong> Fórum sobre o mau uso <strong>do</strong>s recursos, declaran<strong>do</strong> que são ações<strong>do</strong> Sindicato <strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>res Rurais, composto em sua maioria por militantes<strong>do</strong> Parti<strong>do</strong> <strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>res, e que, portanto, são denúncias inverídicas,de fun<strong>do</strong> político-partidário.“[Os verea<strong>do</strong>res] não se abrem não, eles permanecem fecha<strong>do</strong>sachan<strong>do</strong> que a gente tem que ficar num canto e que eles são <strong>do</strong>nosda verdade e têm que ficar em outro lugar. É essa a ideologia, eesse pensamento permanece. Para você ver: eles não vêem a gentecomo pessoas que estão propon<strong>do</strong>, que quer contribuir, que nãoquer lugar de ninguém, mas que está propon<strong>do</strong>. Eles não conseguemver isso não. Achavam que é muito mais o grupinho <strong>do</strong> PT(...). Não conseguem visualizar essa questão, infelizmente.”74Quan<strong>do</strong> as demandas <strong>do</strong> Fórum são apresentadas em forma de propostasa serem incorporadas ao orçamento, a reação por parte <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>resé, em geral, de hostilidade, embora, segun<strong>do</strong> os entrevista<strong>do</strong>s,este não seja um motivo para desmobilizar o trabalho que vem sen<strong>do</strong>desenvolvi<strong>do</strong>.Em 2001, um integrante <strong>do</strong> Fórum relatou que a estratégia <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>respara a não incorporação dessas propostas na Lei Orçamentária Anualfoi “enganá-los”, mentin<strong>do</strong> sobre a data da audiência pública. A data informadajá era um dia depois da aprovação da Lei. Outro membro <strong>do</strong>Fórum citou a aprovação da última Lei Orçamentária, no dia 30 de julhode 2002. Embora to<strong>do</strong>s os verea<strong>do</strong>res estivessem de posse <strong>do</strong>s <strong>do</strong>cumentosencaminha<strong>do</strong>s pelo Fórum, não receberam nenhum <strong>do</strong>cumento quecomprovasse a incorporação de suas propostas.É possível perceber uma mudança, ainda que pequena, na postura <strong>do</strong>sverea<strong>do</strong>res em relação às propostas apresentadas pelo Fórum. Em relaçãoàs gestões anteriores, os entrevista<strong>do</strong>s relatam que foram engana<strong>do</strong>s pelosverea<strong>do</strong>res. No entanto, nesta gestão, algumas propostas encaminhadasparecem ter si<strong>do</strong> incluídas na LDO.A Câmara <strong>do</strong>s Verea<strong>do</strong>res de Lagoa Seca tem uma atuação muito aquém<strong>do</strong> que se espera da atividade parlamentar. Seu trabalho consiste principalmentena aprovação <strong>do</strong>s projetos requisita<strong>do</strong>s pelo prefeito. Segun<strong>do</strong>um <strong>do</strong>s integrantes <strong>do</strong> Fórum, o orçamento aprova<strong>do</strong> no município é copia<strong>do</strong><strong>do</strong> orçamento de cidades vizinhas, desconsideran<strong>do</strong>, portanto, asparticularidades <strong>do</strong> município.


“Ele pega mais ou menos um modelo <strong>do</strong> orçamento de uma cidadevizinha, reforma ele todinho, digita. Ele, então, traz para aCâmara e simplesmente vota, aprova, sem nenhuma discussão, querdizer, o que o Fórum da cidade de Lagoa Seca está trabalhan<strong>do</strong> éexatamente mostran<strong>do</strong> a importância que tem, hoje, a populaçãotambém participar, decidir esses momentos, de orçamento. Então,não se permite que uma população, hoje, em torno de 24 mil habitantesda cidade de Lagoa Seca, e que apenas um prefeito e maisonze verea<strong>do</strong>res digam o que a população precisa(...)”.A função constitucional <strong>do</strong> Legislativo, além da construção e aprovaçãodas leis que regem a vida <strong>do</strong> município, é a fiscalização <strong>do</strong> Executivo. Noentanto, em Lagoa Seca, essa prerrogativa não está sen<strong>do</strong> satisfatoriamenteexercida. Segun<strong>do</strong> um entrevista<strong>do</strong>, a única preocupação <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>resé a de se posicionarem contra ou favoravelmente em relação aoprefeito. Nesse senti<strong>do</strong>, um integrante <strong>do</strong> Fórum comenta: “Os verea<strong>do</strong>res,nós consideramos eles como lagartixa, só faz balançar a cabeça <strong>do</strong>que o prefeito diz (...)”.O mal-estar na relação com o Legislativo vem sen<strong>do</strong> enfrenta<strong>do</strong> peloFórum com a divulgação de suas atividades para a população. Os boletinspublica<strong>do</strong>s com o auxílio <strong>do</strong> Centrac e a Feira Orgânica realizada aos sába<strong>do</strong>spor iniciativa <strong>do</strong> Sindicato, incentivan<strong>do</strong> os agricultores locais, sãoexemplos <strong>do</strong> esforço de mobilização <strong>do</strong> Fórum na tentativa de sensibilizara população para a importância da fiscalização <strong>do</strong>s recursos públicos.Assim como os verea<strong>do</strong>res não reconhecem o trabalho realiza<strong>do</strong> peloFórum, o prefeito e seus secretários também estabelecem uma relação deoposição com esse espaço. As propostas encaminhadas pelo Fórum sãorebatidas com argumentos de que as obras reivindicadas já foram realizadas.Segun<strong>do</strong> uma entrevistada, os gestores municipais tentam desmobilizaras ações <strong>do</strong> Fórum, afirman<strong>do</strong> que seus integrantes não conhecem arealidade <strong>do</strong> município.“(...) eles nunca assumem e nem nunca se interessam pelo interesseda comunidade (...) quan<strong>do</strong> ele [o administra<strong>do</strong>r geral da Prefeitura]pegou o <strong>do</strong>cumento, fez algumas colocações, riu e disseassim: ´- Isso é brincadeira, se os verea<strong>do</strong>res fossem fazer isso, nãovai ficar mais o que fazer´. Isso foi motivo para nos aborrecer. Desdeo início, a gente começa a brigar por conta disso, porque a Secretáriada Educação (...) chega assim, de forma desrespeitosa, ediz: ‘vocês não conhecem o município, nós já estamos fazen<strong>do</strong> isso,nós já recuperamos não sei quantos grupos’, como que seja a maiorvitória em estar recuperan<strong>do</strong> escolas, como que não fosse obrigaçãoe dever deles”.75


Embora a relação com os poderes locais não seja muito amistosa, oFórum usualmente recebe os <strong>do</strong>cumentos solicita<strong>do</strong>s pelo encaminhamentode ofícios formais. O caminho percorri<strong>do</strong> até o acesso aos balancetespassa pela autorização da Câmara <strong>do</strong>s Verea<strong>do</strong>res, que indica um funcionáriopara acompanhar o membro <strong>do</strong> Fórum para copiar o materialrequisita<strong>do</strong>. Se ocorrem dificuldades nesse processo, os membros <strong>do</strong> Fórumpedem ao Tribunal de Contas que disponibilize os <strong>do</strong>cumentos (oBalanço Geral <strong>do</strong> Município, os balancetes mensais com as notas fiscais eas notas de empenho). Segun<strong>do</strong> os entrevista<strong>do</strong>s, embora o acesso aosbalancetes, notas fiscais e ao Balanço Geral <strong>do</strong> Município não tenha impedimentosdeclara<strong>do</strong>s, já houve situações em que estes estavam incompletosou continham pequenos erros. Entretanto, os integrantes <strong>do</strong> Fórumse mostram cautelosos em apontar esses erros como algo intencionalpor parte <strong>do</strong> Legislativo ou <strong>do</strong> Executivo municipais, visto o despreparodestes em relação às questões da elaboração da peça orçamentária e aprática de reproduzir ipsis literis leis de cidades vizinhas.A despeito da relação de oposição com os poderes Executivo e Legislativo,o Fórum tem consegui<strong>do</strong> influenciar a vida política <strong>do</strong> município.Como as ações <strong>do</strong> Fórum têm ganha<strong>do</strong> certa repercussão, os gestoresmunicipais começaram a ter mais cuida<strong>do</strong> com a forma como utilizam osrecursos. Essa maior preocupação tem si<strong>do</strong> percebida, segun<strong>do</strong> uma entrevistada,por meio da análise <strong>do</strong>s balancetes, mas ela enfatiza ainda aconstatação de aberrações nos gastos.768 As irregularidades apuradassão: a) confecção decalendário com promoçãopessoal <strong>do</strong> agente público;b) pagamento irregular degratificação a servi<strong>do</strong>res;c) despesas pagas em valorsuperior ao declara<strong>do</strong>e supostas <strong>do</strong>ações a pessoascarentes; d) excessode custos em obras; e) dispensaindevida e irregularidadesem processos licitatórios;f) despesas gritantescom compra de peçasde automóveis da Prefeiturae locação de outrospara uso da máquinaadministrativa; g) contrataçãoirregular de presta<strong>do</strong>resde serviços; e h) despesassimuladas com serviçospresta<strong>do</strong>s.“(...) acho que a gente tem consegui<strong>do</strong> impor respeito, trabalho,isso aí tem. De certa forma eles têm um pouco de cuida<strong>do</strong>. A gentejá percebe, hoje, a preocupação de utilizar, não sei como um to<strong>do</strong>,mas há uma preocupação de utilizar os recursos de forma mais (...)é claro que a gente percebe, assim, a partir <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s balancetes,a gente percebe as aberrações mesmo (...)”.Em termos de resulta<strong>do</strong>s imediatos, a grande vitória <strong>do</strong> Fórum aconteceuem 30 de agosto de 2002, quan<strong>do</strong> o prefeito <strong>do</strong> PSDB, no perío<strong>do</strong>1997 – 2000, foi condena<strong>do</strong> em primeira instância pela prática de improbidadeadministrativa (uso irregular <strong>do</strong> dinheiro público) pelo juizda 1. a Vara da Fazenda Pública da Comarca de Campina Grande. O processofoi promovi<strong>do</strong> pela Cura<strong>do</strong>ria <strong>do</strong> Patrimônio <strong>Público</strong> de CampinaGrande, com base nas denúncias de desvio <strong>do</strong>s recursos públicos, na suagestão, formuladas pelo Fórum em Defesa da Cidadania de Lagoa Seca 8 .Se o julgamento for o mesmo nas instâncias superiores de Justiça, o exprefeitoterá seus direitos políticos cassa<strong>do</strong>s e será obriga<strong>do</strong> a devolverR$ 230.659,62 aos cofres públicos, de acor<strong>do</strong> com a Lei de ImprobidadeAdministrativa.


No entanto, mesmo que a primeira batalha tenha si<strong>do</strong> ganha, a distânciaentre a entrada <strong>do</strong> processo, 1998, e a vitória da decisão em primeirainstância, sinaliza os problemas enfrenta<strong>do</strong>s pela sociedade frenteà morosidade <strong>do</strong> Poder Judiciário em processos dessa natureza. Embora arelação com o Poder Judiciário seja melhor <strong>do</strong> que as relações com oExecutivo e com o Legislativo municipais, a lentidão da Justiça é um elementodesestimula<strong>do</strong>r <strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong> Fórum. É certo que recorrer à Justiça,na luta pela garantia de seus direitos, é uma prática cidadã da sociedade,mas a resposta <strong>do</strong> Sistema Judiciário – o ritmo <strong>do</strong>s processos em que sãoapreciadas as irregularidades – se dá em um tempo distinto <strong>do</strong> tempo dapolítica e <strong>do</strong>s desvios constata<strong>do</strong>s.Segun<strong>do</strong> a representante <strong>do</strong> Centrac no Fórum, existem dificuldadestambém na relação com o Tribunal de Contas, uma vez que, como emqualquer instituição, há ali também pessoas que não estão interessadasem ajudar. Uma integrante <strong>do</strong> Fórum avalia que é preciso avançar na relaçãocom o Tribunal de Contas, pois ainda não há um bom entendimentosobre os recursos a serem mobiliza<strong>do</strong>s no encaminhamento das denúnciasaos órgãos da justiça: o que vai para o Ministério <strong>Público</strong>, para o Tribunalde Contas, ou se há outras instâncias.Desafios e avanços na trajetória <strong>do</strong> FórumEmbora o trabalho desenvolvi<strong>do</strong> pelo Fórum esteja ganhan<strong>do</strong> repercussãonaquela região <strong>do</strong> País, uma vez que os próprios políticos deLagoa Seca parecem estar fican<strong>do</strong> apreensivos quanto à publicizaçãodas irregularidades cometidas com o dinheiro público, as dificuldadesenfrentadas pelo Fórum na tentativa de participar da elaboração <strong>do</strong>orçamento municipal são muitas. De acor<strong>do</strong> com os entrevista<strong>do</strong>s, osmaiores avanços ainda estão circunscritos a mobilização da comunidade,que, aos poucos, vai compreenden<strong>do</strong> a importância <strong>do</strong> controle social<strong>do</strong>s gastos públicos.A incorporação no orçamento das propostas encaminhadas pelo Fórumnem sempre tem ocorri<strong>do</strong>. Na maioria das vezes, no momento dassessões para a apresentação das sugestões, os verea<strong>do</strong>res assumem publicamenteo compromisso de incluir tais propostas. Porém, eles as descartamdurante a elaboração das emendas.Alguns problemas apresenta<strong>do</strong>s pelos membros <strong>do</strong> Fórum no processode monitoramento <strong>do</strong> orçamento público são as omissões de <strong>do</strong>cumentos– como foi o caso da indisponibilidade da folha de pagamento <strong>do</strong>s funcionáriospúblicos – e o maquiamento das ações pelo executivo com a intençãode dificultar o processo de fiscalização. Apesar da aprendizagemacumulada ao longo <strong>do</strong>s anos, sobretu<strong>do</strong> em função da parceria com oCentrac, os entrevista<strong>do</strong>s mencionam a ausência de um conhecimento77


técnico mais aprofunda<strong>do</strong> para a leitura da peça orçamentária. Apontamas dificuldades enfrentadas com a escassez de pessoas no monitoramento<strong>do</strong>s gastos públicos, sobretu<strong>do</strong> na comparação em campo <strong>do</strong>s númerosque constam <strong>do</strong>s balancetes com as obras realizadas.Outra importante dificuldade mencionada é a falta de compromisso<strong>do</strong>s políticos locais com a implementação de políticas públicas universais,evidencia<strong>do</strong> pela falta de diálogo com a sociedade civil, embora haja também,por outro la<strong>do</strong>, um desinteresse da população em geral na fiscalização<strong>do</strong>s recursos municipais, configuran<strong>do</strong> um certo alheamento dasquestões tratadas pelo Fórum. O alheamento menciona<strong>do</strong> pelos integrantes<strong>do</strong> Fórum é reflexo daquilo que se convencionou chamar ‘práticasclientelistas’, muito comuns em municípios pequenos como Lagoa Seca,por meio das quais os agentes públicos dão proteção e prestam favores apessoas ou grupos em troca de apoio político. Apesar da explicitação <strong>do</strong>sdesvios, a capacidade da sociedade civil de cobrar e exigir a apuração dasresponsabilidades é limitada em função da relação estabelecida pelo prefeito,pautada pela concessão de privilégios e por ameaças.Os entrevista<strong>do</strong>s reconhecem que o poder público encontra brechaspara driblar as leis e desviar recursos. Segun<strong>do</strong> eles, por exemplo, pelosbalancetes de 2001, sabe-se das irregularidades, no entanto, não há comoprová-las. Em muitos casos de superfaturamento de obras, não existemprovas suficientes para que o Fórum possa recorrer aos dispositivos legaisdisponíveis, dificultan<strong>do</strong> a atribuição de responsabilidades.“Por exemplo, outra coisa que não está (...) talvez esteja no balancetedeste ano, mas a conversa que a gente escuta, é que foramcompra<strong>do</strong>s postes para a rede elétrica. Estes postes foram desvia<strong>do</strong>spara Pocinhos [cidade vizinha].”78Durante o trabalho realiza<strong>do</strong> no ano de 2002, uma grande dificuldademencionada por to<strong>do</strong>s os entrevista<strong>do</strong>s foi a recusa pelo poder públicoem entregar uma lista com os nomes <strong>do</strong>s funcionários da prefeitura a fimde constatar irregularidades nas contratações. Em uma reunião, os sindicalistascontaram a história de uma trabalha<strong>do</strong>ra rural analfabeta que,como é de praxe na região, foi ao Sindicato pedir que ele organizasse elhe enviasse os <strong>do</strong>cumentos necessários a sua aposenta<strong>do</strong>ria. O INSS, noentanto, alegou que ela não poderia se aposentar como trabalha<strong>do</strong>ra rural,pois constava da lista <strong>do</strong>s funcionários públicos da prefeitura. Casoscomo este fizeram com que o Fórum solicitasse, em 2002, uma cópia dafolha de pagamentos da Secretaria da Agricultura, a fim de controlar aexistência de funcionários, mas o <strong>do</strong>cumento lhe foi nega<strong>do</strong>. Segun<strong>do</strong> arepresentante <strong>do</strong> Centrac, tal <strong>do</strong>cumento foi consegui<strong>do</strong> por meio <strong>do</strong> Tribunalde Contas.


Por fim, a responsabilização <strong>do</strong>s acusa<strong>do</strong>s é um grande problema enfrenta<strong>do</strong>,visto que, se por um la<strong>do</strong> há dificuldade de comprovar as práticasilícitas percebidas, por outro, quan<strong>do</strong> comprovadas, o sistema judiciárioé bastante lento na apuração e no julgamento.De acor<strong>do</strong> com o Centrac, o grande desafio ao trabalho <strong>do</strong> Fórum évencer a falta de disposição <strong>do</strong> poder público em incorporar as propostasformuladas, manten<strong>do</strong> o caráter assistencialista de suas políticas. Sãoapontadas também a instabilidade e a falta de continuidade na participaçãoindividual. O Sindicato é a organização mais forte no Fórum, sen<strong>do</strong>responsável por praticamente to<strong>do</strong> o trabalho desenvolvi<strong>do</strong>. Segun<strong>do</strong> arepresentante <strong>do</strong> Centrac, essa pre<strong>do</strong>minância acaba sen<strong>do</strong> negativa, umavez que os sindicalistas, desenvolven<strong>do</strong> muitos trabalhos independentes<strong>do</strong> Fórum, acabam muito sobrecarrega<strong>do</strong>s e, se não estão presentes, oacompanhamento <strong>do</strong> orçamento torna-se mais lento.Em municípios pequenos como Lagoa Seca, a distinção entre o que épúblico e o que é priva<strong>do</strong> é ainda mais nebulosa. As práticas clientelistassão a marca das relações locais. A escolha <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res <strong>do</strong> municípioobedece a critérios priva<strong>do</strong>s <strong>do</strong> gestor, e a população negocia com ele oacesso aos bens e serviços que lhes são de direito, por meio de uma relaçãohierárquica, pautada por critérios de força.A despeito dessas dificuldades, o Fórum conquistou grandes avanços.Um deles foi o monitoramento de uma Secretaria Municipal pela qual osintegrantes <strong>do</strong> Fórum tinham maior interesse. Nesse monitoramento, descobriramque podiam obter as notas de empenho e as notas fiscais a fimde subsidiar a comparação entre os números da execução orçamentáriacom a realização efetiva de bens e serviços. Além disso, conseguiram compararos preços pagos pela prefeitura com os preços <strong>do</strong>s fornece<strong>do</strong>res.Dessa maneira, avançaram na percepção de que os escândalos de malversaçãodas verbas públicas poderiam ser comprova<strong>do</strong>s, ainda que com algumasdificuldades.Ao se questionar as formas tradicionais de relação <strong>do</strong>s políticos com odinheiro público, percebeu-se o atrelamento da falta de investimento auma política de desenvolvimento local baseada na agricultura familiarcom as carências brutais <strong>do</strong> município. Com acompanhamento sistemático<strong>do</strong> orçamento, o apoio freqüente <strong>do</strong> Centrac e ocasional <strong>do</strong> Tribunalde Contas, o Fórum vem amplian<strong>do</strong> o escopo das propostas e da formulaçãode políticas públicas. As propostas encaminhadas para a Câmara <strong>do</strong>sVerea<strong>do</strong>res para o exercício de 2003 envolvem tanto a Secretaria Municipalde Agricultura e Abastecimento quanto questões relacionadas à Ação<strong>Social</strong>, Educação e Cultura, Saúde e Infra-Estrutura.Tais propostas totalizam 84 emendas a serem incorporadas ao Projetode Lei de Diretrizes Orçamentárias <strong>do</strong> exercício de 2003. Dentre elas, hádesde questões pontuais como demandas para a construção de um Cen-79


tro <strong>Social</strong> e um Espaço Cultural, para a ampliação <strong>do</strong> atendimento médico-hospitalar,para a construção de escolas e distribuição de merendaescolar, até exigências para o cumprimento da lei que garante o passelivre aos i<strong>do</strong>sos com mais de 65 anos de idade. Há propostas para garantirassistência aos deficientes físicos e mentais, como a da criação de umaAPAE (Associação de Pais de Crianças Excepcionais) e o estabelecimentode convênios que garantam a compra de órteses, próteses, cadeiras derodas, pernas mecânicas, próteses oculares e aparelhos auditivos. Ademais,consta a observação de que to<strong>do</strong>s os itens relativos a Secretaria deAgricultura e Abastecimento devem ser executa<strong>do</strong>s em parceria com oSTR, a AS-PTA e as Associações de Pequenos Produtores <strong>do</strong> município deLagoa Seca.A experiência <strong>do</strong> Fórum em Defesa da Cidadania de Lagoa Seca tendea se ampliar na região, dadas as articulações em torno de uma políticaregional para a agricultura e o convívio com a seca. Com a competênciaacumulada para a leitura <strong>do</strong> orçamento e com o conhecimento adquiri<strong>do</strong>na relação com o Tribunal de Contas, o Fórum tem condições, hoje, desofisticar e aprofundar o trabalho desenvolvi<strong>do</strong> até agora. Essas conquistasmostram um <strong>do</strong>s mo<strong>do</strong>s possíveis da participação popular, capaz dearticular a luta pela transparência na utilização <strong>do</strong>s recursos públicos coma demanda pela construção de políticas universais em um espaço públicodemocrático.Bibliografia“Tribunal reprova contas <strong>do</strong> ex-prefeito de Lagoa Seca”. Jornal Diárioda Borborema. 18 abr 1999.“Tribunal reprova contas de prefeito”. Jornal Diário da Borborema. 15out 1999.“MP requer investigação de desvio de 90 mil <strong>do</strong> PNAE”. Jornal Diárioda Borborema. 13 jul 2002.Boletim <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong> e Cidadania nº 6. Campina Grande:CENTRAC, set 2000.Boletim <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong> e Cidadania nº 10. Campina Grande:CENTRAC, ago 2002.Boletim <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong> e Cidadania nº 11. Campina Grande:CENTRAC, set 2002.Sindicato de Trabalha<strong>do</strong>res Rurais de Lagoa Seca. Agricultura Familiarde Lagoa Seca: conhecen<strong>do</strong> sua realidade (cartilha). Lagoa Seca: 2000.80


O Conselho Municipal de Saúde dePasso Fun<strong>do</strong>Esse texto foi elabora<strong>do</strong> por Marcus Vinicius Spolle e Nilde Balcão.Agradecemos as entrevistas concedidas pelos representantes <strong>do</strong>s usuáriose <strong>do</strong>s servi<strong>do</strong>res públicos no Conselho Municipal de Saúde, <strong>do</strong>sverea<strong>do</strong>res e <strong>do</strong>s técnicos <strong>do</strong> Centro de Educação e AssessoramentoPopular, to<strong>do</strong>s de Passo Fun<strong>do</strong>, e pelos promotores e procura<strong>do</strong>res dePorto Alegre.ResumoRelatamos aqui a experiência <strong>do</strong> Conselho Municipal de Saúde de PassoFun<strong>do</strong>, município <strong>do</strong> interior <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul. Este artigomostra a capacidade <strong>do</strong>s representantes <strong>do</strong>s usuários no Conselho de contribuirpara a melhoria das condições de saúde no município com o monitoramento<strong>do</strong>s recursos da Secretaria Municipal de Saúde. Através <strong>do</strong> relatosobre a forma de organização e as atividades <strong>do</strong>s representantes noConselho buscamos apresentar suas conquistas e dificuldades na luta pelauniversalidade <strong>do</strong> acesso e pela integralidade da atenção à saúde, princípiospreconiza<strong>do</strong>s pelo Sistema Único de Saúde, o SUS, face ao modelo deatendimento que privilegia as empresas privadas de atendimento médico.No decorrer de sua trajetória, vamos verificar como os conselheiros aprenderama fiscalizar o orçamento municipal e procurar a colaboração <strong>do</strong>Ministério <strong>Público</strong> para efetivar o direito social à saúde.IntroduçãoEste artigo tem o objetivo de apresentar o monitoramento peloConselho Municipal de Saúde de Passo Fun<strong>do</strong> (CMS) da política públicamunicipal nesta área. Passo Fun<strong>do</strong> concentra uma rede de atenção à saúdebastante diversificada e conta, há mais de uma década, com um movimentosocial organiza<strong>do</strong> em defesa <strong>do</strong> direito à saúde.O principal conflito <strong>do</strong> CMS com o governo municipal vai ocorrer pelaexigência <strong>do</strong> CMS de que se cumpra o preceito constitucional <strong>do</strong> acesso81


universal ao sistema de saúde, o que implica no oferecimento, pela redepública, de todas as modalidades de atendimento, qualquer que seja asua complexidade.Nos conflitos em torno da gratuidade <strong>do</strong> atendimento à população, oCMS, no cumprimento de seu papel legal, vai exigir da Prefeitura a ampliaçãodas modalidades de atendimento, a renovação <strong>do</strong>s equipamentospara exames e uma melhor acolhida à população.No decorrer <strong>do</strong>s últimos anos, a experiência adquirida na elaboraçãoe no monitoramento <strong>do</strong> orçamento da Secretaria Municipal deSaúde vai incidir em melhorias na rede pública municipal e ampliar odebate sobre as relações entre as contas da Prefeitura e a atençãodespendida à saúde da população. A capacitação <strong>do</strong>s representantes<strong>do</strong>s usuários no CMS para a compreensão da legislação e das normas<strong>do</strong> SUS, por outro la<strong>do</strong>, facilitou a aproximação entre o CMS e ospromotores e procura<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> e estimulou a práticade se protocolar representações contra a Prefeitura. A atuação<strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>, por sua vez, garantiu, em vários momentos, aampliação <strong>do</strong> atendimento, reverten<strong>do</strong> na Justiça as restrições impostaspela administração municipal.O cenário social e político <strong>do</strong> Municípiode Passo Fun<strong>do</strong>821 Ministério da Saúde,Departamento de Informática<strong>do</strong> Sistema Únicode Saúde - DATASUS,1998-2000.Passo Fun<strong>do</strong> é um município pre<strong>do</strong>minantemente urbano <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul. De seus 168.458 habitantes, apenas 2,8% vivem naárea rural.Nas atividades industriais <strong>do</strong> município, destacam-se a produção demáquinas agrícolas e o setor de transformação; na agropecuária, a produçãode erva-mate, soja, cana-de-açúcar e a criação de ga<strong>do</strong> bovino.As atividades econômicas mais importantes, no entanto, estão no setorterciário: no comércio, nos bancos e serviços, com destaque para o setorda saúde.A cidade é pólo na área da saúde, sen<strong>do</strong> uma referência não apenaspara o Rio Grande <strong>do</strong> Sul, mas também para os Esta<strong>do</strong>s vizinhos de SantaCatarina e Paraná. Destaca-se por ser o terceiro centro médico <strong>do</strong> sul <strong>do</strong>Brasil. Lá estão localiza<strong>do</strong>s o Hospital de Ensino São Vicente de Paulo,vincula<strong>do</strong> à Universidade de Passo Fun<strong>do</strong>; o Hospital da Cidade de PassoFun<strong>do</strong>; o Hospital Municipal Beneficente Dr. César Santos, que é uma entidadefilantrópica; e o Pronto-Clínicas, particular. Na rede ainda há mais131 unidades ambulatoriais, três centros de saúde e três ambulatórios deunidade hospitalar geral. Mais de 90 por cento <strong>do</strong>s 970 leitos hospitalaresno município estão em empresas privadas e entidades filantrópicas. 1


Segun<strong>do</strong> os entrevista<strong>do</strong>s, a cidade possui mais de 700 médicos especialistas.A grande extensão desta rede atrai a demanda por atendimentos devários municípios da região Sul <strong>do</strong> País.Por outro la<strong>do</strong>, com a alta demanda por serviços médicos no município,muitos especialistas forma<strong>do</strong>s pela Faculdade de Medicina de PassoFun<strong>do</strong> têm instala<strong>do</strong> seus consultórios na cidade, forman<strong>do</strong> uma redeprivada de policlínicas paralela ao Hospital Escola que, por sua vez, atraigrandes laboratórios clínicos e convênios de saúde privada.Essa situação implica, segun<strong>do</strong> os depoimentos de vários membros <strong>do</strong>Conselho Municipal de Saúde, conflitos em torno da atenção à saúde,pois, se por um la<strong>do</strong>, a cidade é uma referência quanto ao atendimentopúblico e gratuito pelo SUS, por outro, é também o lugar privilegia<strong>do</strong> deuma rede privada lucrativa.A defesa <strong>do</strong> Sistema Único de Saúde (SUS) tem si<strong>do</strong> a tônica da luta<strong>do</strong> Conselho Municipal de Saúde de Passo Fun<strong>do</strong> (CMS) desde sua criaçãopela lei orgânica municipal em 1992.A criação <strong>do</strong>s conselhos municipais de saúde é uma orientação daLei nº 8.080 de 19/09/90 e Lei nº 8.142 de 28/12/90, as chamadas LeisOrgânicas da Saúde. De acor<strong>do</strong> com essas leis, os conselhos são instânciascolegiadas de caráter permanente e deliberativo com os seguintesobjetivos:• traçar diretrizes de elaboração e aprovar os planos de saúde, adequan<strong>do</strong>-osàs diversas realidades epidemiológicas e à capacidadeorganizacional <strong>do</strong>s serviços;• propor a a<strong>do</strong>ção de critérios que definam qualidade e melhor resolutividade,verifican<strong>do</strong> o processo de incorporação <strong>do</strong>s avançoscientíficos e tecnológicos na área;• examinar propostas e denúncias, responder a consultas sobre assuntospertinentes a ações e serviços de saúde, bem como apreciarrecursos a respeito de deliberações <strong>do</strong> Colegia<strong>do</strong>;• fiscalizar e acompanhar o desenvolvimento das ações e serviços desaúde;• fiscalizar a movimentação de recursos repassa<strong>do</strong>s à Secretaria deSaúde e/ou ao Fun<strong>do</strong> de Saúde;• estimular a participação comunitária no controle da administração<strong>do</strong> Sistema de Saúde;• propor critérios para a programação e para as execuções financeirae orçamentária <strong>do</strong>s Fun<strong>do</strong>s de Saúde, acompanhan<strong>do</strong> a movimentaçãoe destinação de recursos;• estabelecer critérios e diretrizes quanto à localização e ao tipo deunidades presta<strong>do</strong>ras de serviços de saúde públicos e priva<strong>do</strong>s, noâmbito <strong>do</strong> SUS. 22 Resolução nº 33 <strong>do</strong>Conselho Nacional deSaúde, de 23 de dezembrode 1992.83


843 JUNQUEIRA, Virgínia.Observatório <strong>do</strong>s Direitos<strong>do</strong> Cidadão: acompanhamentoe análise das políticaspúblicas da cidade deSão Paulo. Saúde na cidadede São Paulo (1989 a2000). São Paulo, InstitutoPólis / PUC – SP, jan.2002. p. 10.4 A respeito <strong>do</strong>s princípiose aspectos defendi<strong>do</strong>s pelosmilitantes <strong>do</strong>s movimentosde saúde ver as resoluçõesda 11ª ConferênciaNacional de Saúde,2000, mimeo, 187 pp.5 JUNQUEIRA, Virgínia.Observatório <strong>do</strong>s Direitos<strong>do</strong> Cidadão: acompanhamentoe análise das políticaspúblicas da cidade deSão Paulo. Saúde na cidadede São Paulo (1989-2000). São Paulo, InstitutoPólis / PUC – SP, jan.2002. p. 22.O SUS responde pelo direito à saúde inscrito na Constituição Federal,no artigo 196. “A saúde é direito de to<strong>do</strong>s e dever <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, garanti<strong>do</strong>mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução <strong>do</strong> risco de<strong>do</strong>ença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações eserviços para sua promoção, proteção e recuperação”.Para atender a esse direito, o SUS deve ser um sistema único, masdescentraliza<strong>do</strong>, no qual o poder público municipal é o executor das açõese serviços de atenção à saúde, enquanto os governos federal e estadualtêm um papel de promoção e sustentação <strong>do</strong> sistema por meio <strong>do</strong> financiamento,da capacitação administrativa e técnica, e <strong>do</strong> fornecimento demateriais 3 . À municipalização da execução, segue-se a regionalização, comuma hierarquia de ações e serviços e de controle público.Os princípios que orientam esse sistema único são a universalidade, ouseja, a saúde é direito de to<strong>do</strong>s; a eqüidade, a atenção à saúde deve consideraras situações diferenciadas decorrentes das grandes desigualdadessociais; e a integralidade da atenção, o sistema deve dar atenção integral àsaúde, o que inclui ações e serviços articula<strong>do</strong>s e contínuos, de prevençãode <strong>do</strong>enças e de cura, em to<strong>do</strong>s os níveis de complexidade, evitan<strong>do</strong> a concentraçãodas ações tão somente no campo da atenção básica.Um aspecto <strong>do</strong> sistema também defendi<strong>do</strong> por vários membros <strong>do</strong>CMS – e pauta<strong>do</strong> pelas Conferências Nacionais de Saúde – é o da humanização,ou seja, a melhoria <strong>do</strong> acolhimento <strong>do</strong>s usuários e da capacidaderesolutiva de cada tratamento 4 . Para esses conselheiros, essesprincípios são confronta<strong>do</strong>s pelos interesses da rede privada de serviçosna área da saúde.Segun<strong>do</strong> a legislação federal, os estabelecimentos priva<strong>do</strong>s podemcompor o SUS de mo<strong>do</strong> complementar, por meio de convênios ou contratoscom o poder público. Nesse caso, os estabelecimentos priva<strong>do</strong>sfilantrópicos têm prioridade sobre os demais. O que tem ocorri<strong>do</strong> noBrasil é que a rede pública pre<strong>do</strong>mina nos serviços de atendimento básico,enquanto nos serviços hospitalares, pre<strong>do</strong>mina a iniciativa privada.Na região Sul <strong>do</strong> país, boa parte das clínicas privadas são contratadas<strong>do</strong> SUS 5 .Para a defesa desses princípios e a elaboração de propostas para aefetiva implantação <strong>do</strong> SUS no município, várias organizações da sociedadecivil, como associações de mora<strong>do</strong>res, organizações ligadas às igrejas esindicatos constituíram o Fórum Municipal da Luta pela Saúde, em 1993.Na realização da 2ª Conferência Municipal de Saúde, em 1994, as organizaçõespertencentes a esse Fórum convocaram reuniões nos bairros paradiscutir uma política de saúde municipal e mobilizar a comunidade paraparticipar <strong>do</strong> evento. A proposta, aprovada nessa Conferência, constituiusenuma referência para a atuação da maioria <strong>do</strong>s membros <strong>do</strong> CMS, representantes<strong>do</strong>s usuários e <strong>do</strong>s funcionários públicos.


Boa parte da política municipal de saúde tem si<strong>do</strong> elaborada no FórumMunicipal da Luta pela Saúde e aprova<strong>do</strong>s no CMS, uma vez que os membrosdas entidades que pertencem ao Fórum têm si<strong>do</strong> eleitos para oConselho e constituí<strong>do</strong> a maioria <strong>do</strong>s conselheiros.Uma das questões que esses conselheiros levantam, é que em Passo Fun<strong>do</strong>,o “lobby da medicina privada” busca favorecer “os grupos médicos particularesda região, por meio de convênios com o setor público”, em detrimento <strong>do</strong>atendimento gratuito na rede pública. O resulta<strong>do</strong> é que certos tipos de procedimentoscirúrgicos e vários exames são cobra<strong>do</strong>s no interior <strong>do</strong>s hospitaispúblicos por grupos priva<strong>do</strong>s. Um exemplo dessa situação é a realização deradiografias: se o equipamento é <strong>do</strong> SUS, o exame é gratuito, se for de umaempresa conveniada, deve-se pagar. São vários os problemas que surgemdessa duplicidade <strong>do</strong> sistema. O lobby atua nos hospitais para não utilizar osequipamentos públicos, mesmo que eles estejam disponíveis. Voltan<strong>do</strong> aoexemplo da radiografia. Os profissionais podem dizer que não há um equipamentoespecífico para aquele exame, ou que está quebra<strong>do</strong>, forçan<strong>do</strong> o usuárioa utilizar o equipamento <strong>do</strong> grupo convenia<strong>do</strong>.De acor<strong>do</strong> com um <strong>do</strong>s conselheiros: “Isso faz com que crie uma corporaçãomédica... evidentemente são profissionais com capacidade, masque também possibilita a cobrança indevida... Quan<strong>do</strong> as pessoas não têminformações necessárias, são cobradas. Então isso tu<strong>do</strong> vem colocan<strong>do</strong> oConselho cada vez mais na obrigação de estar se especializan<strong>do</strong>, de entendertoda a legislação (...). Eu me lembro que tem uma frase <strong>do</strong> antigoministro Jamil Haddad: ´implementar o SUS no Brasil já é um desafio´”.Conhece<strong>do</strong>res da legislação <strong>do</strong> SUS, os representantes <strong>do</strong>s usuáriosmonitoram os procedimentos cobra<strong>do</strong>s para confirmar se não há realmenteo equipamento público disponível. Além disso, verificam a falta dematerial, medicamentos e equipamentos para incluí-los no orçamento parao ano seguinte.Parte das suas ações nasce <strong>do</strong> conflito entre a demanda pela gratuidade,humanização e eqüidade <strong>do</strong> sistema público e o interesse da rede privadade saúde na cobrança <strong>do</strong>s honorários médicos e exames. As ações parachamar a atenção sobre a questão foram desde a recusa em pagar pelosserviços no interior <strong>do</strong>s hospitais até a retirada de pacientes pela janela.O Ministério <strong>Público</strong> Estadual, em defesa <strong>do</strong> direito à saúde para to<strong>do</strong>s,tem entra<strong>do</strong> com ações na Justiça contra a cobrança indevida dehonorários pelos médicos. De acor<strong>do</strong> com um <strong>do</strong>s promotores, “há médicosque já foram condena<strong>do</strong>s, aqui na região, por cobranças ilegais noSUS”. Ele explica que se uma pessoa é cobrada de forma indevida no SUS,o Ministério <strong>Público</strong> pode entrar com uma ação no Judiciário. O resulta<strong>do</strong>seria a devolução <strong>do</strong> dinheiro cobra<strong>do</strong> indevidamente e, no âmbito administrativo,a punição <strong>do</strong> presta<strong>do</strong>r de serviços pelos gestores <strong>do</strong> sistema, oque pode significar, por exemplo, o seu descredenciamento.85


866 O CEAP tem como objetivofortalecer os movimentospopulares atravésda educação popular. Eleorganiza cursos para osconselheiros sobre a históriadas políticas públicas desaúde no país, as normas<strong>do</strong> SUS e o papel <strong>do</strong>s conselhosgestores.Um outro problema aponta<strong>do</strong> pelos representantes <strong>do</strong>s usuários noConselho é a contratação pela Prefeitura de cooperativas médicas para arede pública municipal de saúde em detrimento da contratação de médicospor meio de concurso público e à disposição para o atendimento duranteas horas contratadas.Os conselheiros de Saúde têm aprendi<strong>do</strong> sobre a complexa legislação<strong>do</strong> SUS nos cursos <strong>do</strong> Centro de Educação e Assessoramento Popular, oCEAP, uma organização não-governamental fundada na década de 80 emPasso Fun<strong>do</strong> 6 .Com o conhecimento <strong>do</strong>s princípios e normas <strong>do</strong> SUS, o CMS procurouo Ministério <strong>Público</strong> para denunciar os problemas encontra<strong>do</strong>s. Promotores,procura<strong>do</strong>res e assessores <strong>do</strong> Conselho Estadual de Saúde <strong>do</strong>Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul lhes forneceram também orientações de comoprotocolar as representações no Ministério <strong>Público</strong>.De acor<strong>do</strong> com os conselheiros, no entanto, eles só procuraram oMinistério <strong>Público</strong> quan<strong>do</strong> o poder Executivo fechou todas as possibilidadesde diálogo. “A questão da Justiça, é bom que se deixe claro, sempre éusada em última instância. Nós tentamos, a to<strong>do</strong>s os momentos, fazer umacerto com o gestor municipal, com várias reuniões”, diz um deles.Por sua vez, alguns poucos verea<strong>do</strong>res da oposição acompanharam ostrabalhos <strong>do</strong> Conselho na fiscalização <strong>do</strong> orçamento, embora isso nãochegasse a gerar nenhum fato na Câmara de Verea<strong>do</strong>res, da<strong>do</strong> que a maioriadeles fazia parte da base de sustentação <strong>do</strong> prefeito e não questionavaas contas públicas.O prefeito eleito em 2000 é <strong>do</strong> PFL. A Câmara Municipal é compostapor 21 verea<strong>do</strong>res: quatro <strong>do</strong> PMDB, quatro <strong>do</strong> PTB, três <strong>do</strong> PDT, três <strong>do</strong>PFL, três <strong>do</strong> PSDB, um <strong>do</strong> PSB, um <strong>do</strong> PC <strong>do</strong> B, um <strong>do</strong> PT e um <strong>do</strong> PPS.Segun<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s conselheiros, entre os verea<strong>do</strong>res há diferentes concepçõessobre a importância <strong>do</strong>s conselhos. Há aqueles que não admitema intervenção <strong>do</strong>s conselheiros na área da saúde e no orçamento públicoe não dão importância ao Conselho. Há outros, porém, que consideram oCMS um ator importante para o controle da atenção à saúde e estão maisdispostos ao diálogo.A relação com os <strong>do</strong>is últimos prefeitos foi muito tensa, pois o CMSinterpelou constantemente os gestores municipais sobre as contas públicasmunicipais. Esse foi um <strong>do</strong>s problemas que pautaram os debates naimprensa e nas rádios locais sobre a situação da saúde no município. Nalinha de frente, estavam representantes da Prefeitura e <strong>do</strong>s usuários.Esse debate público, muito provavelmente, colaborou para divulgar aspropostas e as ações <strong>do</strong> Conselho Municipal de Saúde. As reuniões <strong>do</strong>Conselho, que são abertas, contam com a participação da população nosbairros e os usuários <strong>do</strong> SUS procuram freqüentemente os conselheirospara apresentarem suas reclamações e pedirem providências.


O Conselho Municipal de Saúde em PassoFun<strong>do</strong>: sua história e seus objetivosA saúde pública é um tema presente na política local mesmo antes dacriação <strong>do</strong> Conselho Municipal de Saúde em 1992, pois, já na década de1980, havia um movimento de saúde na cidade, com a participação demilitantes nos bairros, nas igrejas e nos sindicatos.Alguns representantes <strong>do</strong>s usuários no Conselho Municipal atual participaramdas discussões no final da década de 80 e da preparação das8ª e 9ª Conferências Nacionais de Saúde porque integravam a ComissãoInter-institucional de Saúde, a CINIS. De acor<strong>do</strong> com um deles, na épocada CINIS, os médicos e presta<strong>do</strong>res de serviços determinavam como,quan<strong>do</strong> e de que forma seriam feitos os investimentos. Pre<strong>do</strong>minava acobrança indevida de internações nos hospitais públicos. As lutas pelocontrole social das políticas públicas de saúde datam desse perío<strong>do</strong>.Quan<strong>do</strong> os trabalhos para a aprovação da lei municipal que regulamentariao CMS tiveram início, esses militantes acompanharam ativamenteos debates, oferecen<strong>do</strong> sugestões que foram aceitas pelos verea<strong>do</strong>res. Em1993, como foi dito, constituíram o Fórum Municipal da Luta pela Saúdecom a participação de várias organizações da sociedade civil.De acor<strong>do</strong> com a legislação, o Conselho municipal de saúde é compostopor representantes <strong>do</strong> governo, <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res da saúde, <strong>do</strong>s presta<strong>do</strong>resde serviços e da população usuária. A representação total <strong>do</strong>sconselhos deve ser distribuída entre 50% de usuários, 25% de trabalha<strong>do</strong>resda saúde e 25% de presta<strong>do</strong>res de serviços (público e priva<strong>do</strong>). Osrepresentantes <strong>do</strong>s usuários deverão ser indica<strong>do</strong>s impreterivelmente pelassuas entidades 7 .De acor<strong>do</strong> com a Lei Orgânica Municipal em Passo Fun<strong>do</strong>, o conselho éforma<strong>do</strong> por quatro representantes <strong>do</strong> poder público, quatro <strong>do</strong>s profissionaise trabalha<strong>do</strong>res da saúde, oito <strong>do</strong>s presta<strong>do</strong>res de serviços em saúdee 16 da população usuária <strong>do</strong>s serviços. Os representantes <strong>do</strong>s usuáriossão eleitos em assembléias populares convocadas para esse fim. Na últimaeleição, estiveram representadas 98 entidades, dentre as quais forameleitas 16. Os representantes <strong>do</strong>s profissionais e trabalha<strong>do</strong>res da saúde e<strong>do</strong>s presta<strong>do</strong>res de serviço são eleitos entre seus pares. Por sua vez, osrepresentantes <strong>do</strong> poder público são escolhi<strong>do</strong>s pelos órgãos públicos daárea de saúde na cidade 8 .Diferente de boa parte <strong>do</strong>s conselhos municipais de saúde, em PassoFun<strong>do</strong>, o presidente <strong>do</strong> Conselho não é o secretário municipal de saúde(membro nato), mas é escolhi<strong>do</strong> em uma eleição aberta de to<strong>do</strong>s os conselheiros,o que é uma das orientações da 11.ª Conferência Nacional de Saúdepara as ações <strong>do</strong>s conselhos que foi contemplada na legislação municipal.7 Plenário <strong>do</strong> ConselhoNacional de Saúde, Resoluçãonº 33 de 23 de dezembrode 1992.8 Em 2002, os quatro organismos<strong>do</strong> poder públicorepresenta<strong>do</strong>s no Conselhoforam: a 6.ª Coordena<strong>do</strong>riaRegional de Saúde, a 7.ªCoordena<strong>do</strong>ria Regional deSaúde, a CompanhiaRiograndense de Saneamento(Corsan) e aSecretaria Municipal deSaúde. As quatro organizaçõesde representantes <strong>do</strong>sprofissionais e trabalha<strong>do</strong>resda saúde foram: a Associação<strong>do</strong>s Funcionários eDocentes da Universidadede Passo Fun<strong>do</strong>, a AssociaçãoMédica <strong>do</strong> Planalto, aAssociação <strong>do</strong>s Funcionários<strong>do</strong> Hospital da Cidade dePasso Fun<strong>do</strong> e o Sindicato<strong>do</strong>s Emprega<strong>do</strong>s em Estabelecimentose Serviços deSaúde. As oito organizaçõesque representaram aspresta<strong>do</strong>ras de serviços foram:o Hospital da Cidadede Passo Fun<strong>do</strong>, aSociedade Hospitalar SãoVicente de Paulo, a Universidadede Passo Fun<strong>do</strong>, aAssistência <strong>Social</strong> Leão XIII,o Centro de Estu<strong>do</strong>s Ortopédicosem Passo Fun<strong>do</strong>,Serviços de Análises Especializadase o Hospital PsiquiátricoBezerra deMenezes. Das 16 organizaçõesque representavam osusuários, 04 são associaçõesde mora<strong>do</strong>res: Associaçãode Mora<strong>do</strong>res da VilaSanta Maria, da Vila Operária,Leonar<strong>do</strong> Ilha e LuizSecchi; quatro eram entidadessindicais: sindicatode metalúrgicos, <strong>do</strong>s bancários,<strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>resrurais e a CUT Regional Planalto;seis organizações ligadasàs igrejas: a AssociaçãoCristã de Deficientes dePasso Fun<strong>do</strong>, a ParóquiaSão José Operária, a MitraDiocesana de Passo Fun<strong>do</strong>,a Capela Nossa Senhora <strong>do</strong>Rosário e a Pastoral da Criança;e duas organizaçõesde defesa de direitos: aComissão de Direitos Humanosde Passo Fun<strong>do</strong> e oServiço de Orientação e SolidariedadeAIDS.87


88Como os representantes <strong>do</strong>s usuários votaram em bloco, o CMS tevecomo presidente, desde a sua criação, um <strong>do</strong>s representantes <strong>do</strong>s usuários.Conseqüentemente, com a mesa diretora, eles controlaram apauta e a distribuição de tarefas para as comissões <strong>do</strong> Conselho. Ascomissões balizaram a tomada de decisão <strong>do</strong>s representantes <strong>do</strong>s usuáriosnas reuniões.As reuniões ordinárias ocorreram uma vez por mês e, quan<strong>do</strong> necessário,foram realizadas reuniões extraordinárias. O local das reuniões até 2001era na sede <strong>do</strong> Conselho Municipal, localizada na Secretaria Municipal deSaúde. A partir de 2002, passaram a ser realizadas nas sedes das entidades<strong>do</strong>s representantes <strong>do</strong>s usuários, a cada mês em um bairro da cidade.As reuniões foram abertas à população local, que podia participar comdireito a voz, mas não a voto. Os verea<strong>do</strong>res também foram convida<strong>do</strong>s aparticipar, mas poucos compareceram.Para realizar suas atribuições, o CMS subdivide-se em uma mesa coordena<strong>do</strong>rae em quatro comissões de apoio: finanças, técnica, fiscalizaçãoe saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r, cada uma delas formada por quatro conselheiros.A mesa coordena<strong>do</strong>ra é composta pelo presidente <strong>do</strong> Conselho, o vice,o primeiro e segun<strong>do</strong> secretários e tem como função preparar e organizara pauta, dirigir as reuniões ordinárias e extraordinárias e encaminhar paraas comissões o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s projetos ou leis orçamentárias envia<strong>do</strong>s peloExecutivo.A comissão técnica é formada por <strong>do</strong>is representantes <strong>do</strong>s usuários e<strong>do</strong>is representantes <strong>do</strong>s profissionais da área da saúde. Essa comissãoanalisa se o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a LeiOrgânica Anual estão de acor<strong>do</strong> com as orientações <strong>do</strong> Sistema Únicode Saúde (SUS) e da Conferência Estadual de Saúde. Além disso, verificaa viabilidade técnica <strong>do</strong>s projetos <strong>do</strong> Executivo que chegam até o CMS ea ocorrência de duplicidade no uso das verbas, ou seja, se elas não estãodestinadas à compra de um equipamento ou à realização de uma atividadealocada simultaneamente em <strong>do</strong>is projetos diferentes, o que não édifícil de acontecer, dada a falta de coordenação entre os programas eos projetos.A comissão de finanças verifica as receitas e despesas contidas no RelatórioResumi<strong>do</strong> da Execução Orçamentária (balancetes bimestrais) e noRelatório de Gestão Fiscal (balancete quadrimestral).A comissão de fiscalização verifica in loco o atendimento presta<strong>do</strong>pelos profissionais, as condições das instalações <strong>do</strong>s ambulatórios e hospitaisda região, os tipos de equipamentos que estão sen<strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong>s, osmateriais disponíveis, os serviços que estão sen<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong>s e o pessoalcontrata<strong>do</strong>. Essa verificação não segue um roteiro preestabeleci<strong>do</strong>, é realizadaseguin<strong>do</strong> o fluxo das denúncias <strong>do</strong>s usuários ou as discrepânciasencontradas na peça orçamentária.


A comissão de saúde <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r é a que tem maior dificuldadepara funcionar, pois depende da participação <strong>do</strong>s sindicalistas, quenão têm da<strong>do</strong> muita atenção aos problemas de saúde nos locais detrabalho. Faltam, portanto, conselheiros para se dedicar ao trabalhodessa comissão.To<strong>do</strong>s os pareceres das comissões são expostos nas reuniões ordinárias<strong>do</strong> CMS e fundamentam as decisões <strong>do</strong>s conselheiros para aprovarqualquer um <strong>do</strong>s relatórios orçamentários <strong>do</strong> município. Caso não sejamaprova<strong>do</strong>s, as comissões apontam os problemas encontra<strong>do</strong>s para que asmedidas de correção <strong>do</strong> relatório, quan<strong>do</strong> possível, sejam feitas.A diferença entre as deliberações <strong>do</strong> Conselho e as iniciativas da Prefeiturana área da saúde foram o foco <strong>do</strong>s conflitos entre o Secretáriomunicipal de saúde e a maioria <strong>do</strong>s conselheiros no decorrer das últimasduas gestões. O que os conselheiros relatam é que a Prefeitura não aceitaas decisões <strong>do</strong> Conselho, não cumpre as deliberações ou as cumpre de talmo<strong>do</strong> que acaba por desvirtuá-las.O processo de elaboração de propostas emonitoramento <strong>do</strong> orçamento municipalrealiza<strong>do</strong> pelo CMSOs representantes <strong>do</strong>s usuários apresentam suas demandas e propostasao CMS e procuram convencer os demais para que sejam aprova<strong>do</strong>s ealoca<strong>do</strong>s no orçamento.Toda vez que algum projeto chega à mesa coordena<strong>do</strong>ra, ele é envia<strong>do</strong>à comissão técnica para analisar a sua viabilidade e compará-lo com osdemais projetos. Ela verifica a pertinência <strong>do</strong> projeto e se não há duplicidadena solicitação. Se necessário, a comissão técnica encaminha o projetopara as comissões de finanças e fiscalização.Segun<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s participantes da comissão técnica, representante <strong>do</strong>spresta<strong>do</strong>res de serviços, na falta de um plano que oriente o destino <strong>do</strong>srecursos, há risco de descontrole orçamentário com a duplicidade de gastos.Um exemplo disso foi o pedi<strong>do</strong> de computa<strong>do</strong>res para o programa devacinação de um posto de atendimento médico. Em outro projeto – reforma<strong>do</strong>s postos de atendimento – novamente os computa<strong>do</strong>res foram coloca<strong>do</strong>sno orçamento. Por isso, o CMS tem acompanha<strong>do</strong> a <strong>do</strong>taçãoorçamentária e fiscaliza<strong>do</strong> o emprego <strong>do</strong>s recursos, atento ao destino eaos cruzamentos das verbas de cada projeto.A comissão de finanças verifica a viabilidade <strong>do</strong> projeto frente aosrecursos disponíveis, acompanha a execução orçamentária comparan<strong>do</strong>os recursos previstos pelo orçamento anual e analisa as notas fiscais enotas de empenho, comparan<strong>do</strong>-as. Segun<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s, há89


90notas de empenho e notas fiscais que são usadas para a mesma despesa,em <strong>do</strong>is perío<strong>do</strong>s: “Eu pego os relatórios, examino um, examino o outro evejo os gastos, os valores e os números <strong>do</strong>s empenhos. Se confere, tu<strong>do</strong>bem, (mas) de vez em quan<strong>do</strong>, num ano pro outro, num trimestre prooutro, (aparece) o mesmo empenho, a mesma despesa, a mesma nota fiscal,tu<strong>do</strong> a mesma coisa...”.Quan<strong>do</strong> isso ocorre, o secretário municipal de Saúde é solicita<strong>do</strong> a darexplicações. Segun<strong>do</strong> os conselheiros, um <strong>do</strong>s principais problemas naprestação de contas da Prefeitura é a questão <strong>do</strong>s preços unitários. Naapresentação <strong>do</strong>s relatórios, a administração municipal não anexa a tomadade preços, o que dificulta o trabalho da comissão de finanças paraverificar se houve lisura da concorrência. De acor<strong>do</strong> com um deles, todasas vezes que os <strong>do</strong>cumentos foram solicita<strong>do</strong>s, a Prefeitura comprometeu-sea mostrá-los, mas não o fez.Sem o comprovante de tomada de preços, a comissão de finançassolicita à comissão de fiscalização que faça uma pesquisa sobre os preçosdas faturas investigadas no local onde foram realizadas as compras.Uma das participantes da comissão de fiscalização tomou as notas deempenho, as notas fiscais e foi ao supermerca<strong>do</strong> verificar os preços. Ospreços das notas fiscais não conferiam com os preços das merca<strong>do</strong>rias.De acor<strong>do</strong> com ela: “Onde se encontrava, por exemplo, compra<strong>do</strong>, emjaneiro de 2000, uma lata de azeite, custan<strong>do</strong> 1,19 reais, hoje, <strong>do</strong>is anosdepois, ela custa 0,98 centavos. Dizer que baixou o preço? (...) nessesvinte (itens), eu achei dezoito superfatura<strong>do</strong>s, os outros <strong>do</strong>is estavammais ou menos”.A comissão de fiscalização, além de levantar os preços para a comissãode finanças, verifica também in loco as denúncias <strong>do</strong>s usuários. Antes desair para a rua, ela se reúne, discute os problemas levanta<strong>do</strong>s nas visitasaos ambulatórios ou encaminha<strong>do</strong>s por outra comissão e define as tarefase as atitudes que deverão ser tomadas na fiscalização.O trabalho desses conselheiros é sair para a rua e aferir a veracidadedas compras, os preços cobra<strong>do</strong>s, quem fez o serviço e se foi feito realmente,se o local da compra existe mesmo, comparar a quantidade requisitadacom a quantidade entregue pelo fornece<strong>do</strong>r e verificar se o fornece<strong>do</strong>rtem capacidade para produzir. De acor<strong>do</strong> com os depoimentos <strong>do</strong>smembros dessa comissão, a habilidade de questionar os fornece<strong>do</strong>res daPrefeitura veio com a experiência.Após a apuração e constatação <strong>do</strong>s problemas, a comissão de fiscalizaçãoencaminha o relatório para a comissão que solicitou a consulta oupara a mesa coordena<strong>do</strong>ra.Além de verificar as contas, o Conselho procura cuidar da melhoria <strong>do</strong>atendimento no sistema através <strong>do</strong> diálogo com a administração municipale, na impossibilidade deste, procuran<strong>do</strong> o Ministério <strong>Público</strong>.


Um <strong>do</strong>s bons acor<strong>do</strong>s realiza<strong>do</strong>s foi entre o CMS, incluin<strong>do</strong> os representantesda administração municipal, e a direção <strong>do</strong> Hospital São Vicentede Paulo, que estava superlota<strong>do</strong>. Em uma reunião conjunta, chegouseà conclusão de que 50% das internações <strong>do</strong>s pacientes de Passo Fun<strong>do</strong>eram desnecessárias, pois decorriam da falta de atendimento na redeambulatorial. Por sua vez, o problema da falta de atendimento nos ambulatóriosdecorria <strong>do</strong> fato de os profissionais atenderem uma quantidadefixa de pacientes por hora e não ter medicamentos para fazer o tratamentoadequa<strong>do</strong> que, caso fosse realiza<strong>do</strong>, reduziria os custos com ospacientes, além, é óbvio, de aliviar seu sofrimento.Esses problemas foram resolvi<strong>do</strong>s com a proposta de realização de umterceiro turno, de segunda a sexta-feira, durante toda a noite, nos ambulatórios,com um clínico-geral e um pediatra. Essa medida reduziu as internaçõeshospitalares em mais de 30% no inverno rigoroso da região,quan<strong>do</strong> os casos de gripes e pneumonias são recorrentes.O hospital, por sua vez, se dispôs a realizar os exames com raio-X eultra-som no horário noturno. Enquanto a administração municipal ficouresponsável pela contratação <strong>do</strong> pessoal para trabalhar nesse turno e pelacompra <strong>do</strong>s medicamentos necessários.A ênfase no controle <strong>do</strong> orçamento decorreu de um problema com acompra de equipamentos usa<strong>do</strong>s no lugar de novos, que foram instala<strong>do</strong>sno Hospital Municipal ao invés de serem instala<strong>do</strong>s em um Centro deDiagnósticos a ser cria<strong>do</strong>.O problema da instalação <strong>do</strong>s equipamentos no hospital, de acor<strong>do</strong>com os conselheiros e um <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>res que intercedeu nesse caso, éque, no Hospital Municipal, há equipamentos terceiriza<strong>do</strong>s e os médicostrabalham com esses equipamentos. Quan<strong>do</strong> os exames são cobra<strong>do</strong>s, semprepaira a dúvida: foi usa<strong>do</strong> um equipamento terceiriza<strong>do</strong> ou o equipamento<strong>do</strong> SUS e cobra<strong>do</strong> indevidamente?Os equipamentos a serem compra<strong>do</strong>s, por decisão <strong>do</strong> CMS com a anuência<strong>do</strong> secretário de Saúde, foram um mamógrafo, um aparelho de ultra-som, umaparelho de en<strong>do</strong>scopia, o eletrocardiograma e um aparelho de eletro-encefalograma,no valor de 518 mil reais, de acor<strong>do</strong> com os cálculos da Prefeitura.A Prefeitura encaminhou o processo de licitação separa<strong>do</strong> em <strong>do</strong>isblocos e comprou equipamentos recondiciona<strong>do</strong>s. Essa decisão gerou polêmicasporque o orçamento contemplava a compra de equipamentosnovos, no entanto, o aparelho de en<strong>do</strong>scopia tinha mais de 10 anos, oultra-som aproximadamente oito anos, o mamógrafo era novo, mas precisavade um revela<strong>do</strong>r. Segun<strong>do</strong> o depoimento de um verea<strong>do</strong>r que intercedeuno caso: “O eletrocardiograma e o eletro-encefalograma nuncaforam usa<strong>do</strong>s. O eletro-encefalograma, diziam que estavam faltan<strong>do</strong> peças,outros diziam que não. Encurtan<strong>do</strong> a história: os outros equipamentosforam instala<strong>do</strong>s dentro <strong>do</strong> Hospital Municipal”.91


92Esse fato desencadeou os conflitos em torno das contas públicas. Amaioria <strong>do</strong>s conselheiros não aprovou as contas e exigiu que a Prefeituracomprasse equipamentos novos. O prefeito não atendeu à solicitação e osconselheiros responderam entran<strong>do</strong> com uma representação junto aoMinistério <strong>Público</strong>.Face à denúncia, o prefeito reagiu abrin<strong>do</strong> uma sindicância contra oCMS e demitiu o secretário de Saúde, basea<strong>do</strong> na norma legal de que osconselheiros são responsáveis pela apreciação <strong>do</strong>s projetos.A maioria <strong>do</strong> Conselho alegou que, na ata de aprovação <strong>do</strong> orçamento,embora não constasse que eles deveriam ser novos, isso estava implícito,pois, segun<strong>do</strong> a assessoria jurídica da Secretaria <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> da Saúde <strong>do</strong>Rio Grande <strong>do</strong> Sul, quan<strong>do</strong> há uma solicitação de equipamentos de saúde,estes só podem ser novos. Sen<strong>do</strong> assim, teria havi<strong>do</strong> uma má intencionalidade<strong>do</strong> poder público na licitação <strong>do</strong>s equipamentos a qual não poderiaincluir equipamentos de segunda mão ao verificar os preços. Uma outraquestão era saber o que havia si<strong>do</strong> feito com o restante <strong>do</strong>s recursosprevistos para os equipamentos que não haviam si<strong>do</strong> gastos com eles.Depois dessa ocorrência, o Conselho Municipal passou a dar atenção àredação das atas para que expressem com fidedignidade as deliberações<strong>do</strong> Conselho e implantou a norma de que to<strong>do</strong>s os projetos <strong>do</strong> governodeveriam ser aprecia<strong>do</strong>s num prazo mínimo de 30 dias de antecedência e,nos casos de urgência, num prazo de 10 dias.Em 2001, no processo de verificação <strong>do</strong> relatório de gestão <strong>do</strong> orçamentode 2000, a comissão de finanças <strong>do</strong> CMS descobriu problemascom algumas notas de empenho e cópias de cheques da ordem de 500mil reais. O Conselho decidiu não aprovar o relatório de gestão desseano, inclusive, para depois não ser responsabiliza<strong>do</strong> por irregularidades,a exemplo <strong>do</strong> que havia ocorri<strong>do</strong> em 2000 com a compra <strong>do</strong>s equipamentos.A não aprovação das contas implicou a inclusão da Prefeiturano Cadin (Cadastro de Inadimplentes <strong>do</strong> poder público), fato que impediaa administração municipal de receber o repasse <strong>do</strong>s programas desaúde <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.O Prefeito recém-eleito acusou o CMS de ter inviabiliza<strong>do</strong> a gestão eprejudica<strong>do</strong> a população ao não aprovar o relatório de seu antecessor eimpedir o repasse das verbas estaduais. A opinião pública foi mobilizadapelo fato com o debate entre prefeito e conselheiros na imprensa e narádio locais. Segun<strong>do</strong> os conselheiros, a situação expôs as dificuldades afim de esclarecer a opinião pública, mostran<strong>do</strong> que se assinassem os <strong>do</strong>cumentos,não poderiam cobrar a diferença da Prefeitura, caso contrário,seriam responsabiliza<strong>do</strong>s pela falta <strong>do</strong>s recursos estaduais.Diante <strong>do</strong> problema, eles consultaram a assessoria jurídica <strong>do</strong> ConselhoEstadual de Saúde para encontrar uma saída que não prejudicasse o município,mas que também não deixasse de apurar as irregularidades cons-


tatadas. A orientação foi para que o Conselho elaborasse um Termo deCompromisso com a Prefeitura, no qual, a aprovação <strong>do</strong> relatório de gestãode 2000 deveria estar condicionada a uma auditoria das contas pelo Tribunalde Contas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> e pelo Fun<strong>do</strong> Estadual de Saúde. Caso fosseconstatada alguma irregularidade, a denúncia seria encaminhada aoMinistério <strong>Público</strong>.O prefeito não aceitou a proposta <strong>do</strong> Termo de Compromisso, alegan<strong>do</strong>que a responsabilidade desse orçamento era da gestão anterior e nãoda sua. Os assessores sugeriram encaminhar a aprovação <strong>do</strong> relatório degestão, lançan<strong>do</strong> mão de outro dispositivo legal, uma Resolução, com omesmo conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong> termo de compromisso. Os conselheiros aceitaram asugestão que foi homologada pelo prefeito, que não pode se recusar aassinar esse <strong>do</strong>cumento.Em fevereiro de 2002, o primeiro relatório da nova gestão municipal,de 2001, não foi aprova<strong>do</strong> pelo CMS, pois a comissão de finanças verificouirregularidades na soma <strong>do</strong> valor total <strong>do</strong>s gastos apresenta<strong>do</strong>s (cercade R$ 11,8 milhões de reais) que não correspondiam à soma <strong>do</strong>s empenhos,notas e cópias <strong>do</strong>s cheques apresenta<strong>do</strong>s, geran<strong>do</strong> um déficit deaproximadamente 2 milhões de reais.Nas reuniões <strong>do</strong> CMS, o Secretário municipal da Saúde admitiu que orelatório continha erros, solicitou o relatório original e prometeu corrigiros problemas apresenta<strong>do</strong>s. Dois meses depois, em abril, ele apresentouum novo relatório com outros valores, porém, a soma total perfazia umvalor menor <strong>do</strong> que aquele que o orçamento previra.Os conselheiros alegaram que os novos valores correspondiam a gastosda ordem de 7% <strong>do</strong> orçamento municipal, e a Prefeitura, por lei, deveriagastar 11%. Além disso, no relatório anterior havia si<strong>do</strong> aponta<strong>do</strong> umgasto superior ao apresenta<strong>do</strong> pelo segun<strong>do</strong> relatório, e o Conselho queriaexplicações sobre os <strong>do</strong>is milhões de reais da diferença.Eles fizeram um requerimento para comparar o primeiro relatório como segun<strong>do</strong>, mas o secretário de Saúde afirmou que, como o primeiro continhaerros de lançamento, o <strong>do</strong>cumento serviu de papel de rascunho e seperdeu. A aprovação <strong>do</strong> relatório, mais uma vez, foi feita com uma “Resolução”sobre a necessidade de uma auditoria. Além da “Resolução”, oConselho decidiu encaminhar um <strong>do</strong>ssiê ao Ministério <strong>Público</strong> conten<strong>do</strong>as irregularidades <strong>do</strong> orçamento.O confronto entre o CMS e o Secretário municipal de saúde foi intensoe rendeu a demissão de três secretários em 18 meses. O primeiroestava envolvi<strong>do</strong> na questão da compra <strong>do</strong>s equipamentos para o hospital.O segun<strong>do</strong>, com o desaparecimento <strong>do</strong>s automóveis orça<strong>do</strong>s paraa Secretaria de Saúde e o último perdeu o cargo após o episódio <strong>do</strong>desaparecimento <strong>do</strong> relatório <strong>do</strong> orçamento que apresentava um déficitentre o orça<strong>do</strong> e o aplica<strong>do</strong>.93


A relação com a Câmara de Verea<strong>do</strong>res eo Ministério <strong>Público</strong>A relação <strong>do</strong>s conselheiros com os verea<strong>do</strong>res depende da postura <strong>do</strong>verea<strong>do</strong>r. Apesar <strong>do</strong> esforço <strong>do</strong> CMS em convidar to<strong>do</strong>s os verea<strong>do</strong>res,dificilmente algum participa das reuniões. Por sua vez, os verea<strong>do</strong>res nãoconvidam o Conselho para as audiências públicas e não levam em consideraçãoo papel <strong>do</strong>s conselheiros.Segun<strong>do</strong> um verea<strong>do</strong>r, o Legislativo é um “poder plural”, pois os verea<strong>do</strong>restêm diferentes “concepções” e muitos deles acham que as pessoasque não têm uma formação específica na área da saúde não deviam fazerparte <strong>do</strong> Conselho, são “um peso”.Um <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>res avalia que se o poder Executivo não reconhecer aimportância <strong>do</strong> Conselho, vai haver um conflito permanente que faz parte<strong>do</strong> papel de fiscalização e cobrança exerci<strong>do</strong> pelo Conselho.“Eu acho que (o Conselho) está concebi<strong>do</strong> de uma forma correta”(mas) se não tiver lá dentro <strong>do</strong> poder Executivo, o seu devi<strong>do</strong>reconhecimento, ele vai estar em uma guerra constante. E é issoque está acontecen<strong>do</strong>. (...) ele age normalmente para cobrar ou parapedir providências ou para fiscalizar ou para questionar umaaplicação (...) É <strong>do</strong> processo.”.94Por outro la<strong>do</strong>, ele lembra que o Conselho está “aberto” à participação:“É um Conselho muito atuante (...), é um Conselho aberto, onde aqueleque não faz parte, que não é conselheiro eleito, pode participar, tem direitoa voz, não a voto.”A avaliação da relação com a Câmara Municipal não alcança unanimidadeentre os conselheiros. Um deles acha que existe uma boarelação, pois a Câmara sempre abre espaço para os membros <strong>do</strong>Conselho, porém, essa cordialidade não representa apoio político aosatos <strong>do</strong> Conselho: “Nós temos uma boa relação com a Câmara de Verea<strong>do</strong>res!Nós conversamos segui<strong>do</strong>. Quan<strong>do</strong> o Conselho necessita deum espaço, a Câmara abre possibilidade e dá. Nós tivemos três vezes,por 15 minutos, cada vez, na tribuna da Câmara, num ano e pouco,prestan<strong>do</strong> conta <strong>do</strong> serviço, e pedin<strong>do</strong> uma ação mais concreta daCâmara frente a questões específicas, dentro da área da saúde. Existeuma boa relação”.Um exemplo da ocupação desse espaço foi a apresentação na CâmaraMunicipal <strong>do</strong> último <strong>do</strong>ssiê encaminha<strong>do</strong> ao Ministério <strong>Público</strong>. Os verea<strong>do</strong>resconcordaram que o Conselho está cumprin<strong>do</strong> sua função de fiscalização,mas não se posicionaram a respeito <strong>do</strong>s problemas aponta<strong>do</strong>s.


Um outro conselheiro afirma que a Câmara não é nada receptiva e quea maioria <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>res acha que o Conselho é uma instância <strong>do</strong> Parti<strong>do</strong><strong>do</strong>s Trabalha<strong>do</strong>res. “Os verea<strong>do</strong>res, alguns nos prometem, que vão trabalhar<strong>do</strong> nosso la<strong>do</strong>, mas, muito poucos, uns cinco ou seis. O restante achaque o Conselho... Eu vou ser bem claro, em declarar isto aqui, e se comprova,eles chamam a petezada <strong>do</strong> Conselho! (...) eles falaram que oConselho é partidário e eu apresentei o distintivo <strong>do</strong> SUS, que, dentro <strong>do</strong>Conselho, o nosso parti<strong>do</strong> é o SUS”, contou ele.Outro conselheiro também avalia como difícil a relação <strong>do</strong> Conselhocom o Legislativo, porém, explica que isso acontece porque a Câmara nãocompreende o papel <strong>do</strong> Conselho: “A Câmara de Verea<strong>do</strong>res, ela ainda vêo Conselho como um grupo de pessoas que está tiran<strong>do</strong> o seu espaço e oseu papel. E desconhece de fato o papel <strong>do</strong> Conselho”.Esse conselheiro também cita a possibilidade <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>res participaremda reunião <strong>do</strong> Conselho ao menos quan<strong>do</strong> o assunto em discussãoé a Lei Orçamentária Anual: “Eles não participam de reuniões <strong>do</strong> Conselho(...) porque eles são representantes da comunidade, embora eles não tenhamrepresentação dentro <strong>do</strong> Conselho, mas poderiam ter essa disponibilidade,mas não têm”.A procura <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> para a defesa <strong>do</strong> direito à saúde temsi<strong>do</strong> bastante freqüente nos últimos anos. Os conselheiros têm uma boarelação com os promotores e procura<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> quemuitas vezes são procura<strong>do</strong>s como assessores. Por outro la<strong>do</strong>, um <strong>do</strong>spromotores entrevista<strong>do</strong>s citou a relação com os conselheiros de PassoFun<strong>do</strong> como um bom exemplo <strong>do</strong> seu trabalho, pelo aumento da capacidade<strong>do</strong> atendimento à população.“Nós ampliamos bastante o número de atendimentos ou de pessoasque recebem medicamentos na farmácia <strong>do</strong> PAM (Posto deAssistência Médica) em Passo Fun<strong>do</strong>.”Nessa última gestão, os conselheiros averiguaram vários problemasnas contas públicas e recorreram periodicamente ao Ministério <strong>Público</strong>.Em maio de 2001, houve um desentendimento entre os conselheiros ea Prefeitura quanto à compra de medicamentos pelo SUS e a contrataçãode profissionais.Os medicamentos eram de uso contínuo, de controle de algumas <strong>do</strong>ençase imprescindíveis à população. A Prefeitura havia suspendi<strong>do</strong> a compraalegan<strong>do</strong> falta de verbas, uma vez que a população <strong>do</strong>s municípiosvizinhos vinha retirar esses medicamentos na cidade. O CMS questionou aalegação da Prefeitura, pois os recursos repassa<strong>do</strong>s pelo SUS supunham oatendimento regional, seguin<strong>do</strong> a organização prevista pelo SUS. Logo, afalta de verbas estava relacionada à má gestão <strong>do</strong>s recursos.95


96A contratação de profissionais para o funcionamento da rede ambulatorialbásica vinha sen<strong>do</strong> realizada sem concurso, por meio de convênioscom cooperativas médicas, que faziam o atendimento da população, estipulan<strong>do</strong>um número muito pequeno de pacientes por dia, o que geravaociosidade da rede e um gasto exorbitante em recursos humanos.O Conselho protocolou uma representação ao Ministério <strong>Público</strong> paraque os profissionais fossem contrata<strong>do</strong>s pela Prefeitura e os postos dispusessem<strong>do</strong>s medicamentos.Os promotores iniciaram uma ação extrajudicial e, em maio, houve umacor<strong>do</strong> que resultou na obrigação da Prefeitura de garantir os medicamentos.Quanto à contratação direta, ficou a indicação para que a administraçãoreordenasse os gastos a fim de contratar os funcionários.Em novembro de 2001, o CMS protocolou outra denúncia no Ministério<strong>Público</strong>, pois com a obrigatoriedade de prover os medicamentos, a Prefeiturapassou a exigir comprovante de renda e de residência na cidade dePasso Fun<strong>do</strong> para atender aos usuários nos hospitais convenia<strong>do</strong>s com oSUS e nos postos médicos e ambulatoriais <strong>do</strong> município.Os conselheiros entenderam que o direito de atendimento deveria serestendi<strong>do</strong> a qualquer pessoa que não tivesse condições de pagar aassistência médica privada, mesmo que não morasse na cidade. Por ordemjudicial, a Prefeitura foi obrigada a atender a to<strong>do</strong>s os usuários <strong>do</strong>SUS, independentemente <strong>do</strong> seu local de residência. Por outro la<strong>do</strong>, aJustiça, escandalosamente, deu ganho de causa, em primeira instância, àPrefeitura, em sua exigência de comprovação de renda para o atendimento.Como a decisão contrariava o princípio constitucional da universalidade<strong>do</strong>s serviços de saúde, eles encaminharam a ação judicial para asegunda instância e ganharam o processo.Também durante o mês de março de 2001, o CMS reuniu-se com adireção <strong>do</strong> Hospital Municipal para resolver o problema <strong>do</strong>s equipamentosde esterilização e decidiram recorrer ao Ministério <strong>Público</strong> para que asala de cirurgia <strong>do</strong> hospital não fosse fechada por falta desses equipamentos,as autoclaves, que estavam com 22 anos de uso. Enquanto a esterilizaçãocom equipamentos novos dura 15 minutos, elas demoravam20 horas, reduzin<strong>do</strong> o número de pacientes que podiam ser atendi<strong>do</strong>spara cirurgia.O Ministério <strong>Público</strong> entrou com uma ação judicial, e o juiz determinoua compra de duas autoclaves pela Prefeitura, uma a mais <strong>do</strong> que opedi<strong>do</strong> <strong>do</strong> Conselho. “O juiz man<strong>do</strong>u comprar duas. Nós pedimos uma e ojuiz man<strong>do</strong>u comprar duas. Essa foi boa!”, foi o que disse um <strong>do</strong>s promotoressobre o resulta<strong>do</strong> da ação. “Entrei com uma ação civil pública paraequipar um hospital público daqui para a compra de esteriliza<strong>do</strong>res (autoclaves)(...) fora aquele trabalho que nós fazemos diariamente de buscar,por telefone, atendimento, alguns exames, como a tomografia, que o


município ainda não oferece, e geralmente os pacientes não têm dinheiropara pagar”, explicou o promotor.A cobrança de exames e atendimento médico nos hospitais públicosnão é mencionada apenas pelos conselheiros, mas também por um <strong>do</strong>spromotores <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong> <strong>do</strong> Rio Grande <strong>do</strong> Sul que atua na áreade controle social e fiscalização <strong>do</strong> Sistema Único de Saúde. Para ele, suaatuação no Ministério <strong>Público</strong> deriva da defesa <strong>do</strong> direito à vida e à saúdediante de um sistema que não garante esse direito. Ele exemplifica: “Osujeito precisa de uma cirurgia para salvar a vida. Ele recorre ao SUS, e omédico lhe diz: ‘eu quero R$ 1.500,00 para fazer essa tua cirurgia’, é omínimo que se pede. Aí o cidadão (...) não tem condições de pagar. (...) Vaideixar morrer? (...) Os médicos-cirurgiões, em geral, não fazem a cirurgiapelo SUS, cobran<strong>do</strong> só aquele valor que o sistema paga, 30, 40, 70 reaisdependen<strong>do</strong> <strong>do</strong> tipo de cirurgia”.Citan<strong>do</strong> exemplos de vários casos desse tipo, em que o Ministério <strong>Público</strong>oferece denúncias à Justiça para garantir o atendimento gratuito aopaciente, ele explica que sua atuação como promotor tem como objetivofazer com que os “recursos sejam bem-emprega<strong>do</strong>s, bem- utiliza<strong>do</strong>s ebem-administra<strong>do</strong>s”, pois os hospitais da região podem realizar atendimentosde alta complexidade como transplantes ou neurocirurgias, mas“é importante saber que se faz isso para quem pode pagar”.As conquistas e desafios <strong>do</strong> ConselhoMunicipal de Saúde de Passo Fun<strong>do</strong>Os conflitos entre os representantes <strong>do</strong>s usuários e a administraçãomunicipal chamam a atenção para a oposição entre os interesses da redeprivada de atendimento à saúde e os princípios da universalidade e dagratuidade assegura<strong>do</strong>s, em tese, pelo Sistema Único de Saúde. O CMS,espaço para a negociação entre os representantes <strong>do</strong>s usuários, <strong>do</strong> governomunicipal, da rede privada e <strong>do</strong>s profissionais e trabalha<strong>do</strong>res nosistema de saúde, não resolve internamente todas as divergências e acabaenvolven<strong>do</strong>, nos embates, amplos setores da população, os verea<strong>do</strong>res e oMinistério <strong>Público</strong>. O CMS, no caso, tanto impulsiona o debate na cidadesobre a questão da saúde quanto torna-se, ele mesmo, uma caixa de ressonânciadas disputas existentes na sociedade civil para estabelecer asdimensões da atenção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> à saúde.Parcelas da sociedade civil organizaram-se no Fórum Municipal daLuta pela Saúde para enfrentar essa disputa na cidade, elaboran<strong>do</strong> entresi a política para o sistema municipal de saúde e procuran<strong>do</strong> elegerrepresentantes <strong>do</strong>s usuários e <strong>do</strong>s profissionais e trabalha<strong>do</strong>res paraintervir no Conselho. O resulta<strong>do</strong>, para essas organizações, foi o apren-97


98diza<strong>do</strong> de várias práticas para o controle <strong>do</strong> orçamento e a sua utilizaçãopara a defesa <strong>do</strong>s direitos <strong>do</strong>s usuários. Dentre elas, o acompanhamento<strong>do</strong>s problemas na rede pública de saúde concomitante à análise <strong>do</strong>srelatórios orçamentários.Outra forma de exercer o controle foi não aprovar os balancetes apresenta<strong>do</strong>spela Prefeitura. O veto levou ao impedimento da transferênciade verbas federais e estaduais para a ação da Prefeitura na área da saúdee obrigou os gestores a explicarem à população a falta desses recursos.Uma outra conseqüência foi levar os problemas detecta<strong>do</strong>s à Justiça pormeio <strong>do</strong> Ministério <strong>Público</strong>.Do exercício <strong>do</strong> controle derivaram algumas conquistas entre os anosde 2000 e 2002: a ampliação <strong>do</strong> atendimento de média complexidadecom a compra de equipamentos, a criação de obstáculos para a cobrança<strong>do</strong>s honorários médicos e <strong>do</strong>s exames para os usuários <strong>do</strong> SUS e a distribuiçãogratuita <strong>do</strong>s medicamentos básicos.Na opinião <strong>do</strong>s representantes <strong>do</strong>s usuários, para a melhor representatividade<strong>do</strong>s conselheiros é necessário, ainda, o estabelecimento de veículosde comunicação entre eles e o restante da população. Em 2002, oConselho propôs a criação de um jornal e de um programa de rádio queabordassem os problemas na área da saúde, bem como a criação de conselhosregionais na cidade. A realização das reuniões nos bairros tambémcaminha nessa direção.Na legislação federal, os conselhos foram previstos como um mecanismode deliberação junto ao Executivo. Em Passo Fun<strong>do</strong>, o CMS procurouo Legislativo e o Judiciário para que arbitrassem as divergênciascom o Executivo nesse espaço em que sociedade civil e governo estãorepresenta<strong>do</strong>s.Se a Câmara Municipal não se mostrou muito receptiva, o Ministério<strong>Público</strong> teve uma atuação decisiva na reversão de várias decisões <strong>do</strong> Executivoquanto à aplicação <strong>do</strong>s recursos. Boa parte das conquistas deve-seà atuação <strong>do</strong>s promotores e procura<strong>do</strong>res a partir das denúncias apresentadaspelos conselheiros.A força de cada um <strong>do</strong>s atores na relação com os demais residiu naaplicação <strong>do</strong>s argumentos apoia<strong>do</strong>s nas leis que garantem o direito à saúde,o financiamento <strong>do</strong> Sistema Único de Saúde e a gestão <strong>do</strong> sistema, compartilhadacom a sociedade civil por meio <strong>do</strong>s conselhos.Outros argumentos poderão ser soma<strong>do</strong>s aos legais, a depender deuma iniciativa de alguns membros <strong>do</strong> Fórum Municipal da Luta pela Saúde:o debate necessário sobre a construção de indica<strong>do</strong>res que permitam avaliaro alcance <strong>do</strong>s programas na área de saúde. De acor<strong>do</strong> com os da<strong>do</strong>s<strong>do</strong> Ministério da Saúde, em Passo Fun<strong>do</strong> 90% <strong>do</strong>s leitos hospitalares estãona rede privada e nos hospitais filantrópicos. Seria essa uma dimensãojusta da garantia pelo Esta<strong>do</strong> à saúde de to<strong>do</strong>s?


O exercício <strong>do</strong> controle <strong>do</strong> orçamento público pelo CMS já apresentoualgumas conquistas, mas concomitantemente apontou novos desafioscomo a extensão social <strong>do</strong> controle e a necessidade de parâmetros para aavaliação das políticas públicas na área de saúde.BibliografiaConferência Nacional de Saúde,11ª. Resoluções. 2000, pg. 187. (mimeo).Conselho Municipal de Saúde de Passo Fun<strong>do</strong>. Resolução nº 002/2001.Conselho Municipal de Saúde de Passo Fun<strong>do</strong>. Resolução nº 003/2001.Conselho Municipal de Saúde de Passo Fun<strong>do</strong>. Ofício nº 120/02, 16 deabril de 2002 para o Ministério <strong>Público</strong> Federal.Plenário <strong>do</strong> Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 33 de 23 dedezembro de 1992.Jornal Diário da Manhã. “Justiça obriga Prefeitura a comprar autoclavespara HBCS”. Passo Fun<strong>do</strong>/RS: 05 de abril de 2002.Diário da Manhã. “TJ derruba comprovante de renda no PAM”. PassoFun<strong>do</strong>, RS.Diário da Manhã. “Comissão confirma suspeita de desvio no uso deverbas <strong>do</strong> HCS”. Passo Fun<strong>do</strong>, RS, 03 de maio 2002.Diário da Manhã. “Liminar determina que Esta<strong>do</strong> libere convênios naárea de assistência social”. Passo Fun<strong>do</strong>, 10 julho de 2002.Diário da Manhã. “Promotoria denuncia compra irregular de equipamentos”.Passo Fun<strong>do</strong>, RS, 1º de agosto de 2002.JUNQUEIRA, Virgínia. Saúde na cidade de São Paulo (1989-2000). Observatório<strong>do</strong>s Direitos <strong>do</strong> Cidadão: acompanhamento e análise daspolíticas públicas da cidade de São Paulo. São Paulo: Instituto Pólis /PUC – SP, jan. 2002.PREFEITURA MUNICIPAL DE PASSO FUNDO. Lei Orçamentária Anualnº 3834 de 19 de dezembro de 2001.99


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Agenda101


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Indicações para uma agenda sobreo controle social <strong>do</strong> orçamentopúblicoSílvio Caccia BavaAs pesquisas realizadas sobre os instrumentos jurídicos à disposiçãoda cidadania para o controle social <strong>do</strong> orçamento público e sua utilização,juntamente com os estu<strong>do</strong>s de caso de experiências relevantes sobre otema, levantam uma série de questões que consideramos relevantes paraa construção de uma agenda de debates.Dentre os temas que surgem como relevantes para a discussão <strong>do</strong>sresulta<strong>do</strong>s desta pesquisa destacamos:1. O significa<strong>do</strong> da participaçãoA participação, nos conselhos, por exemplo, é vista em muitos casos,como de caráter distinto da participação nos fóruns popularesde acompanhamento <strong>do</strong> orçamento. No primeiro caso, são iniciativas<strong>do</strong> legislativo ou de governo que criam os conselhos enquantoespaços de negociação <strong>do</strong> que venha a se configurar como interessepúblico. Um espaço teoricamente concebi<strong>do</strong> como espaço de expressão<strong>do</strong>s conflitos entre os distintos atores que disputam o senti<strong>do</strong>e a abrangência das políticas públicas. No segun<strong>do</strong> caso, sãoredes de entidades da sociedade civil que, de forma autônoma eindependente <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, se organizam para exercer a vigilância cívicasobre o gasto público. Pode-se compreender que, mesmo asexperiências de organização de fóruns e redes, como no caso <strong>do</strong>sfóruns nacionais de assistência social e de defesa <strong>do</strong>s direitos dacriança e <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente, são fóruns que qualificam a intervençãodas entidades que representam os interesses de defesa da cidadanianos conselhos de gestão correspondentes. Assim, parece relevantediferenciar o que são as articulações independentes promovidaspelas entidades e movimentos da sociedade civil, que permitema constituição de uma identidade de propósitos e estratégiasde ação conjunta, e o que são estas novas esferas públicas de103


negociação de interesses. Essas são identificadas pelos conselhosde gestão, com um papel ambíguo, no senti<strong>do</strong> de que servem, emsua grande maioria, como formas de legitimação da política <strong>do</strong>governo, quan<strong>do</strong> deveriam ser espaços de disputa quanto ao desenhoe implementação de políticas públicas.2. O uso de instrumentos jurídicos na luta pela afirmação e ampliaçãode direitosParecem ser muito pouco usa<strong>do</strong>s na defesa <strong>do</strong>s direitos de cidadania,os instrumentos jurídicos que a Constituição de 1988 e legislaçõesposteriores tornaram disponíveis para os cidadãos e suas entidadese movimentos. Quais as razões para que isto se dê? Trata-se<strong>do</strong> desconhecimento por parte das entidades e movimentos destesinstrumentos? Trata-se de uma descrença na efetividade da Justiçaexercer seu papel no senti<strong>do</strong> de garantir o controle <strong>do</strong> orçamentopúblico? Trata-se de uma característica da cultura política <strong>do</strong>scidadãos e entidades da sociedade civil, que não valorizam os instrumentosde regulação democrática à sua disposição?De fato, a pesquisa revelou um comportamento bastante diferencia<strong>do</strong>entre organismos similares, em distintas regiões <strong>do</strong> País. É ocaso da atenção <strong>do</strong>s Tribunais de Contas <strong>do</strong>s esta<strong>do</strong>s, que trataramas demandas por informação, realizadas por esta pesquisa,de maneira diferenciada, por vezes até antagônica. Já o Ministério<strong>Público</strong> aparece como uma instituição bastante engajada na defesa<strong>do</strong>s interesses da cidadania e, no entanto, a impressão que setem é de que as entidades e movimentos da sociedade civil igualmentenão atribuem a ele a importância que ele pode ter se foremconstituídas alianças entre as entidades e movimentos e esta novainstância de fiscalização disponível para a defesa de direitos.3. A Lei de Responsabilidade Fiscal passou a exigir <strong>do</strong>s governos municipais,estaduais e federal prestações de contas periódicas. Queinfluência teve este tipo de exigência sobre as iniciativas decontrole social <strong>do</strong> orçamento público? Como têm si<strong>do</strong> apresentadasestas prestações de contas, elas tornam mais transparente àgestão <strong>do</strong>s recursos públicos?1044. As iniciativas de controle social <strong>do</strong> orçamento público têm si<strong>do</strong>promovidas por coletivos heterogêneos de entidades da sociedadecivil. São associações profissionais, ONGs, movimentos sociais, sindicatos,que se somam na tentativa de exercer o controle social<strong>do</strong> orçamento público. Qual o papel que cada uma destas entidadestêm assumi<strong>do</strong> neste processo? Há uma “especialização” de


competências, ou não? É possível reconhecer estratégias de ampliaçãodesta participação para outros setores organiza<strong>do</strong>s?5. Muito <strong>do</strong>s esforços destes coletivos de entidades que atuam nocontrole social <strong>do</strong> orçamento público se orientam no senti<strong>do</strong> dadivulgação <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s de seu trabalho de fiscalização. Quaisos instrumentos que estão sen<strong>do</strong> utiliza<strong>do</strong>s para a publicização<strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s de seu trabalho? É conheci<strong>do</strong> da população local oresulta<strong>do</strong> da fiscalização das contas <strong>do</strong> Executivo?6. Há diversas iniciativas de capacitação das organizações dasociedade civil para a utilização <strong>do</strong>s instrumentos legais para ocontrole social <strong>do</strong> orçamento público. Há possibilidades de ampliação<strong>do</strong>s atores que realizam essa capacitação? Quais os conteú<strong>do</strong>sque devem ser aprofunda<strong>do</strong>s ou introduzi<strong>do</strong>s para ampliara capacidade de intervenção da sociedade civil? Como ampliaro público atingi<strong>do</strong> por iniciativas desse tipo? Quais os meios paraampliar a informação <strong>do</strong>s cidadãos sobre os instrumentos legaispara o controle social <strong>do</strong> orçamento público?7. Existem momentos particulares na discussão da peça orçamentária.São momentos de decisões que influenciarão posteriormente as possibilidadesde alocação de recursos. O Planoplurianual, a Lei de DiretrizesOrçamentárias, a Lei Orçamentária Anual. Quais são as práticasdestes fóruns na tentativa de influenciar cada um desses momentos?Como podemos avaliar os resulta<strong>do</strong>s deste trabalho de lobby?8. Certos instrumentos à disposição da cidadania têm si<strong>do</strong> muitopouco usa<strong>do</strong>s na mobilização pelo controle social <strong>do</strong> orçamentopúblico. Um deles são as audiências públicas. Apesar de estarem àdisposição, a realização das audiências muitas vezes é provocadapor parlamentares, na falta de iniciativas da sociedade civil. Apouca utilização deste instrumento se deve a quê? O jogo de forçasnas Câmaras Municipais já está defini<strong>do</strong> e as audiências nãomodificam isso? A população fica saben<strong>do</strong> <strong>do</strong> que acontece nasaudiências públicas? Não há preparo por parte <strong>do</strong> movimento paraquestionar as contas municipais nestas audiências?9. Há uma compreensão de que os interesses <strong>do</strong>s verea<strong>do</strong>res conflitamcom os interesses destas novas esferas públicas de participação,sejam elas conselhos, ou novos movimentos que manejamtemas entendi<strong>do</strong>s como de sua exclusiva competência. Estas práticassão compreendidas como práticas concorrentes. Como se105


pode equacionar esta questão a partir da compreensão de que ademocracia representativa e a democracia direta sejam iniciativascomplementares e que podem se reforçar no exercício <strong>do</strong> controlesocial <strong>do</strong> orçamento público?10. O que pode se observar <strong>do</strong>s processos analisa<strong>do</strong>s, é que as conquistascidadãs dependem da capacidade de mobilização <strong>do</strong>s fórunse redes que os sustentam. A questão que se coloca a partir destaconstatação é a de qualificar qual a relação que estas entidades emovimentos têm com a sociedade civil como um to<strong>do</strong>. Quais aspráticas de relação com a comunidade, com as demais entidades daregião? São feitas assembléias, há jornais informan<strong>do</strong> o que se passa?Qual a relação <strong>do</strong> representante com o representa<strong>do</strong>?11. A linguagem cifrada da contabilidade, utilizada na prestação decontas por parte das prefeituras, assim como a amplitude das rubricasque impedem a identificação <strong>do</strong>s gastos, são instrumentosde ocultação <strong>do</strong> processo de alocação de recursos por parte daadministração pública. De quais mecanismos a cidadania podelançar mão para exigir mais transparência na linguagem e na identificaçãoda alocação <strong>do</strong>s recursos?12. As denúncias sobre os processos de licitação e os contratos dasprefeituras para a realização de obras e serviços são freqüentes,assim como as denúncias de falta de acesso ao conteú<strong>do</strong> dessescontratos. Que informações devem ser divulgadas para que os processosde licitação possam ser avalia<strong>do</strong>s pela sociedade civil? Deque mo<strong>do</strong> garantir o acesso público ao conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s contratos eaos critérios para a definição <strong>do</strong>s preços estipula<strong>do</strong>s?13. A questão da discussão <strong>do</strong> orçamento é uma face da discussão <strong>do</strong>plano de governo, suas prioridades, sua execução. Por isso mesmo, aquestão <strong>do</strong> controle orçamentário não pode se restringir ao controlesobre o desvio de recursos, sobre a corrupção. Esta iniciativa poderiaser mais efetiva se articulasse os conselhos de defesa de direitos epudesse construir uma visão de conjunto sobre a efetividade daspolíticas no município, colaboran<strong>do</strong> assim para a construção de algocomo um conselho de desenvolvimento <strong>do</strong> município, onde estasiniciativas cidadãs pudessem ganhar maior articulação.10614. As relações entre as Câmaras Municipais e o Executivo são, tradicionalmente,relações de cooptação e subserviência. Com a presençade representantes <strong>do</strong>s movimentos sociais eleitos como par-


lamentares, o parlamento ganhou nova dimensão, tornan<strong>do</strong>-seum espaço de disputas, um espaço de embates quanto às alternativasde políticas públicas a serem a<strong>do</strong>tadas no município. Resgataros mecanismos que sujeitam as Câmaras Municipais, atribuirlhestransparência, não é também uma forma de reforçar o controlepúblico sobre o orçamento?15. A questão <strong>do</strong>s orçamentos autorizativos ou mandatórios está nocerne da questão <strong>do</strong> controle social. As peças orçamentárias sãoelaboradas para dar a maior governabilidade possível ao Executivo.O remanejamento de suas verbas, o contingenciamento <strong>do</strong>sgastos, as estimativas de arrecadação, as isenções fiscais, tu<strong>do</strong>isso precisa passar por uma nova discussão que permita instituirnovos procedimentos que restrinjam esta liberdade de atuação<strong>do</strong> Executivo, seja sobre as políticas de arrecadação, seja sobre aspolíticas de gasto público.16. A transparência da administração supõe uma organização internapara a prestação de contas e programas de informatização <strong>do</strong>sda<strong>do</strong>s que permitam a sua socialização em linguagem adequada.Que tecnologias de informatização <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s poderiam facilitaro acesso e a compreensão da sociedade civil às contas públicas?17. Falta uma avaliação das potencialidades e <strong>do</strong>s problemas de cadaum <strong>do</strong>s instrumentos legais para o controle social <strong>do</strong> orçamentopúblico, pois a sua utilização pela sociedade civil ainda é bastanteincipiente. Por outro la<strong>do</strong>, alguns deles, como os dispositivos daLei de Responsabilidade Fiscal de obrigatoriedade da prestação decontas para a sociedade, só foram cria<strong>do</strong>s recentemente. Assimsen<strong>do</strong>, os ajustes ou mudanças necessários nos instrumentos legaissó poderão ser melhor avalia<strong>do</strong>s com a sua utilização maisfreqüente.18. A participação é um tema da moda. To<strong>do</strong>s governantes queremse assumir como democráticos e abertos à participação popularou cidadã. O fato é que muito poucos compreendem a participaçãocidadã como uma estratégia de socialização de poder. Muitopoucos querem abrir mão de sua capacidade de tomar decisões etransferi-la a instâncias colegiadas de participação cidadã. Cumpreidentificar quais são os projetos políticos que orientam a atuação<strong>do</strong>s executivos, uma vez que da perspectiva de muitos deles,a participação é uma forma de legitimar as ações e o programa degoverno, sem condições para alterar seu projeto.107


PÓLISINSTITUTO DE ESTUDOS,FORMAÇÃO E ASSESSORIAEM POLÍTICAS SOCIAISRua Araújo, 124 - Centro - CEP 01220-020 - São Paulo - SPtelefone: 0xx11 3258.6121 - fax: 0xx11 3258.3260endereço eletrônico: polis@polis.org.br - sítio na internet: www.polis.org.brCoordena<strong>do</strong>ria Executiva: Jane Casella, Silvio Caccia Bava, José Carlos Vaz.Equipe Técnica: Ana Claudia Chaves Teixeira, Anna Luiza Salles Souto, BiancaSantos, Christiane Costa, Edie Pinheiro, Eduar<strong>do</strong> de Lima Caldas, GabrielaLotta, Hamilton Faria, Jane Casella, João Nassif, Jorge Kayano, José CarlosVaz, José Cézar Magalhães Jr., Juliana Lordello Sicoli, Kazuo Nakano, Maria<strong>do</strong> Carmo Alves Albuquerque, Maria Elisabeth Grimberg, Nelson Saule Jr.,Nilde Balcão, Osmar de Paula Leite, Othon Luiz <strong>do</strong> A. Silveira Jr., Paula FreireSantoro, Pedro Pontual, Renato Cymbalista, Ruth Simão Paulino, Silvio CacciaBava, Stela Ferreira, Tatiana Maranhão, Veronika Paulics, Vilma Barban.Equipe Administrativa: Antonio Vicente de Amorim Filho, Benedita AparecidaAlegre de Oliveira, Fabiana Maria da Silva, Gisele Balestra, João Carlos Ignácio,Maria Josete Pereira da Silva, Maria Salete Pereira da Silva, Melania Alves, MessiasPinto, Patrícia Gaturamo, Rosângela Maria da Silva Gomes, Viviane Cosme Chaves.Estagiários: Clarissa Costa de Oliveira, Daniel Ho, Diego Franco, Iara Rolnik,Luiz Sertório Teixeira, Mariana Marques, Patrícia Car<strong>do</strong>so, Paula Pollini,Rafael D’Almeida Martins, Tania Masseli, Thais Cattel, Thais Ricar<strong>do</strong>, VanessaSouza, Weber Sutti.108Conselho de Administração: Presidente - Heloísa Helena Canto Nogueira.Vice-Presidente - Tereza Belda. Conselheiros - Ana Amélia da Silva, AnaLuiza Salles Souto, Aziz Ab.Saber, Francisco de Oliveira, Hamilton Faria, JaneCasella, José Carlos Vaz, Ladislau Dowbor, Marco Antonio de Almeida, MariaElisabeth Grimberg, Marta Esteves de Almeida Gil, Nelson Saule Jr., Osmarde Paula Leite, Paulo Augusto de Oliveira Itacarambi, Peter Spink, SilvioCaccia Bava, Vera da Silva Telles, Veronika Paulics.


O INSTITUTO PÓLIS é uma entidade civil, sem fins lucrativos, apartidáriae pluralista fundada em junho de 1987. Seu objetivo é a reflexão sobreo urbano e a intervenção na esfera pública das cidades, contribuin<strong>do</strong>assim para a radicalização democrática da sociedade, a melhoria daqualidade de vida e a ampliação <strong>do</strong>s direitos de cidadania.Sua linha de publicações visa contribuir para o debate sobre estu<strong>do</strong>se pesquisas sobre a questão urbana. Volta-se para o subsídiodas ações e reflexões de múltiplos atores sociais que hojeproduzem e pensam as cidades sob a ótica <strong>do</strong>s valores democráticosde igualdade, liberdade, justiça social e equilíbrio ecológico.Tem como público os movimentos e entidades populares, ONGs,entidades de defesa <strong>do</strong>s direitos humanos, meios acadêmicos, centrosde estu<strong>do</strong>s e pesquisas urbanas, sindicatos, prefeituras e órgãosformula<strong>do</strong>res de políticas sociais, parlamentares comprometi<strong>do</strong>scom interesses populares.A temática das publicações refere-se aos campos de conhecimentoque o INSTITUTO PÓLIS definiu como prioritários em sua atuação:Desenvolvimento Local e Gestão Municipal – democratizaçãoda gestão, descentralização política, reforma urbana, experiênciasde poder local, políticas públicas, estu<strong>do</strong>s compara<strong>do</strong>s de gestão,indica<strong>do</strong>res sociais.Democratização <strong>do</strong> Poder Local e Construção da Cidadania – lutassociais urbanas, conselhos populares, mecanismos juridico-institucionaisde participação, direitos de cidadania.Sustentabilidade, Cultura e Qualidade de Vida – desenvolvimentocultural, políticas culturais, programas de combate à fome,políticas de segurança alimentar, saneamento ambiental, políticasambientais.Estes campos de conhecimento são trabalha<strong>do</strong>s na dimensão local eapresentam três linhas de trabalho como referencial analítico: a discussãosobre a qualidade de vida, a busca de experiências inova<strong>do</strong>rase a formulação de novos paradigmas para a abordagem da questãourbana e local.Para isso, o INSTITUTO PÓLIS, além das publicações, realiza seminários,cursos, workshops, debates, vídeos, pesquisas acadêmicas e aplicadas.Possui uma equipe de profissionais habilita<strong>do</strong>s para responderàs exigências técnicas e às demandas próprias para a formulação deum projeto democrático e sustentável de gestão pública.109


110publicações pólis01 Reforma Urbana e o Direito à Cidade (Esgotada)02 Cortiços em São Paulo: o Problema e suas Alternativas (Esgotada)03 Ambiente Urbano e Qualidade de Vida04 Mutirão e Auto-Gestão em São Paulo: uma Experiência de Construção de Casas Populares05 Lages: um jeito de governar06 Prefeitura de Fortaleza: Administração Popular 1986/8807 Mora<strong>do</strong>res de Rua08 Estu<strong>do</strong>s de Gestão: Ronda Alta e São João <strong>do</strong> Triunfo09 Experiências Inova<strong>do</strong>ras de Gestão Municipal10 A Cidade faz a sua Constituição11 Estu<strong>do</strong>s de Gestão: Icapuí e Janduís12 Experiências de Gestão Cultural Democrática13 As Reivindicacões Populares e a Constituição14 A Participação Popular nos Governos Locais (Esgotada)15 Urbanização de Favelas: Duas Experiências em Construção16 O Futuro das Cidades (Esgotada)17 Projeto Cultural para um Governo Sustentável (Esgotada)18 Santos: O Desafio de Ser Governo19 Revitalização de Centros Urbanos20 Moradia e Cidadania: Um Debate em Movimento21 Como Reconhecer um Bom Governo?22 Cultura, Políticas Publicas e Desenvolvimento Humano (Esgotada)23 São Paulo: Conflitos e Negociações na Disputa pela Cidade24 50 Dicas – Idéias para a Ação Municipal (Esgotada)25 Desenvolvimento Local – Geração de Emprego e Renda26 São Paulo: a Cidade e seu Governo – O olhar <strong>do</strong> Cidadão27 Políticas Públicas para o Manejo <strong>do</strong> Solo Urbano: Experiências e Possibilidades28 Cidadania Cultural em São Paulo 1989/92: Leituras de uma Política Pública29 Instrumentos Urbanísticos contra a Exclusão <strong>Social</strong>30 Programas de Renda Mínima no Brasil: Impactos e Potencialidades31 Coleta Seletiva: Reciclan<strong>do</strong> Materiais, Reciclan<strong>do</strong> Valores (Esgotada)32 Regulação Urbanística e Exclusão Territorial33 Desenvolver-se com Arte34 <strong>Orçamento</strong> Participativo no ABC: Mauá, Ribeirão Pires e Santo André35 Jovens: Políticas Públicas – Merca<strong>do</strong> de Trabalho36 Desenvolvimento Cultural e Planos de Governo37 Conselhos Gestores de Políticas Públicas38 Diretrizes para uma Política Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional39 Gênero e Raça nas Políticas Públicas


40 Aspectos Econômicos de Experiências de Desenvolvimento Local41 O Reencantamento <strong>do</strong> Mun<strong>do</strong>: Arte e Identidade Cultural na Construção deum Mun<strong>do</strong> Solidário42 Segurança Alimentar e Inclusão <strong>Social</strong> : A escola na promoção da saúde infantil43 Fortalecimento da Sociedade Civil em Regiões de Extrema Pobrezaoutras publicaçõesOrdenamento Jurídico: Inimigo Declara<strong>do</strong> ou Alia<strong>do</strong> Incompreendi<strong>do</strong>?Alternativas Contra a FomePoder Local, Participação Popular e Construção da CidadaniaPara quê Participação Popular nos Governos Locais?Democratização <strong>do</strong> <strong>Orçamento</strong> <strong>Público</strong> e os Desafios <strong>do</strong> LegislativoOs Desafios da Gestão Municipal DemocráticaDireito à Cidade e Meio AmbienteFalas em Torno <strong>do</strong> Lixo125 Dicas - Idéias para a Ação MunicipalGuia <strong>do</strong> Estatuto da CidadeNovos Contornos da Gestão Local: Conceitos em ConstruçãoMonitoramento e Avaliação <strong>do</strong> EmpoderamentoA Situação <strong>do</strong>s Direitos Humanos das Comunidades Negras e Tradicionais de AlcântaraCadernos de Proposições para o Século XXISérie Desafios da Gestão Municipal DemocráticaSére Observatório <strong>do</strong>s Direitos <strong>do</strong> CidadãoCadernos PólisPólis Paperspara adquirir esta e outras publicações<strong>do</strong> pólisProcure o setor de publicações <strong>do</strong> Instituto Pólis no telefone (0xx11) 3258.6121ramal 256 ou pelo correio eletrônico: publicacoes@polis.org.br111


Esta publicação foi impressa com as fontes Rotis SemiSans-Light eRotis SemiSans-Bold em papel Pólen Soft 80g.Tiragem: 1000 exemplaresNovembro, 2003

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