Fragmentos urbanos: identi<strong>da</strong>de, moderni<strong>da</strong>de ecosmopolitismo nas metrópoles latino-americanasAngela PrysthonO propósito desta comunicação é debater os modos de consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>sci<strong>da</strong>des latino-americanas como modelos de urbani<strong>da</strong>de e de moderni<strong>da</strong>de.Objetivamos investigar como a partir <strong>da</strong>s referências <strong>da</strong>s grandes metrópolesmundiais, e muitas vezes Madri e Lisboa, foi constituí<strong>da</strong> e dissemina<strong>da</strong>uma idéia de “civilização” latino-americana.Pretendemos investigar de que maneira as ci<strong>da</strong>des latino-americanasse tornaram elas próprias modelos, referências, não apenas para as ci<strong>da</strong>desmenores dos seus países, mas também vieram a ser padrão de um outrotipo de urbani<strong>da</strong>de, transformando-se em modelos de uma urbani<strong>da</strong>deperiférica e alternativa. Muitas vezes até instituindo novas formas de olhare pensar a ci<strong>da</strong>de. Esse movimento constante (de busca de referênciasnas grandes metrópoles mundiais, de incessante procura de adequação apadrões – de certo modo impossíveis – de modernização internacional e,simultaneamente, de estabelecimento de um novo cosmopolitismo síntese,de consoli<strong>da</strong>ção de um modelo alternativo e híbrido de ci<strong>da</strong>de) faz <strong>da</strong> históriacultural latino-americana um ponto de parti<strong>da</strong> privilegiado de análise (comoobjeto e como ponto de vista) e faz <strong>da</strong> produção cultural latino-americanaum foco muito rico e cheio de nuances para a compreensão <strong>da</strong> culturaglobal. Embora seja importante ressaltar que essa busca de modelos nãoé uma prerrogativa latino-americana ou periférica. Adrián Gorelik afirma que:To<strong>da</strong>s las ciu<strong>da</strong>des se espejaron siempre en otras ciu<strong>da</strong>des, buscando modelosque encarnan virtudes o vicios, Jerusalem o Babilonia, o, menos metafóricamente,la digni<strong>da</strong>d del progreso o de la historia, París o Nueva York, Venecia o Barcelona.(GORELIK, 2004, 73)O conceito de cosmopolitismo enquanto fenômeno urbano, de avançotecnológico, <strong>da</strong> utopia do novo, se tornará importante não apenas para osgrandes centros, para as grandes metrópoles européias que se constituíramcomo arquétipos <strong>da</strong> moderni<strong>da</strong>de urbana, mas é um dos pilares <strong>da</strong> formaçãodos modernismos locais, dos movimentos artísticos de vanguar<strong>da</strong> nospaíses periféricos. Ao mesmo tempo, enquanto a atitude cosmopolitavem servindo de modelo para as culturas periféricas desde os séculosXVIII e XIX (este artigo refere-se especificamente à América Latina), aapropriação do exotismo, de elementos culturais não-europeus nasprimeiras aparições do modernismo (influências africanas no Cubismo,primitivismo, jazz etc.) não deixam de fazer parte do cosmopolitismometropolitano. Edward Said nota, entretanto, que:Most histories of European aesthetic modernism leave out the massive infusionsof non-European cultures into the metropolitan heartland during the early yearsof this century, despite the patently important influence they had on modernistartists like Picasso, Stravinsky and Matisse, and on the very fabric of a societythat largely believed itself to be homogeneously white and Western. (SAID, 1994, 292)Se, do lado europeu, essa influência periférica no modernismo ocidentalfoi, em parte, constante e delibera<strong>da</strong>mente omiti<strong>da</strong> <strong>da</strong> maioria dos relatoshistóricos desse modernismo “dominante”, do lado dos países periféricos,a hegemonia <strong>da</strong> visão européia vai provar ser difícil de ignorar ou superar.Nos países <strong>da</strong> América Latina, a idéia de cópia de modelos metropolitanosfoi considera<strong>da</strong>, desde o período colonial e quase sempre durante as épocasanteriores aos movimentos modernistas, como característica inerente <strong>da</strong>sculturas dessa região, como um fardo a ser carregado por todos os artistas,escritores e pensadores <strong>da</strong>s “margens”. Na ver<strong>da</strong>de, a cópia <strong>da</strong> culturaeuropéia configurava-se como única forma de legitimar a produção culturaldesses países. Neste sentido, a adoção de uma postura cosmopolita talveztenha um peso, uma gravi<strong>da</strong>de maior na periferia do que no centro. Ossonhos tecnológicos e a fascinação pela mo<strong>da</strong> são mais fantasmagóricos(porque mais distantes, porque em geral chegam depois) para o artistaperiférico e quiçá por isso de alguma forma mais intensos. Convém,58 ~ ~ 6.2 | 2007
Dossiê Debateentretanto, não admitir ingenuamente, de antemão, que os latino-americanosseriam mais cosmopolitas que os europeus por esse motivo. De modo geral,inclusive, a afirmação de um produto cultural cosmopolita é mais relevantedentro de um contexto interno (a saber, de um nível nacional) que no contextoamplo exterior (internacional). Como se a cultura cosmopolita fosse maisimportante diante de um consumidor local (que estaria supostamente maisexposto aos fascínios <strong>da</strong>s “diferenças em desfile”) do que diante de ummercado mundial (já que o que faria “diferença” seria a cor local, a “diferença”regional ou as marcas folclóricas).Jeffrey D. Needell menciona um padrão comum nas relações entre a culturados colonizados e a dos colonizadores, como constando de três etapas: conflito,a<strong>da</strong>ptação e rejeição (NEEDELL, 1993, 12). De acordo com a sua abor<strong>da</strong>gem,estas três fases se estenderiam desde o início do processo colonialistapropriamente dito até um período em que já não se tratava de ser colônia,mas neocolônia (colonialismo cultural apenas, sem que necessariamenteexistisse vínculo oficial). As últimas déca<strong>da</strong>s do século XIX na AméricaLatina se inscrevem mais certamente na segun<strong>da</strong> fase do colonialismocultural, na qual é indispensável a a<strong>da</strong>ptação aos moldes cosmopolitaseuropeus para que os intelectuais (mais provavelmente também parte <strong>da</strong>elite econômica) destes países vejam a si próprios fazendo e tendo sentido.Desde a época colonial, a problematização <strong>da</strong> “impossibili<strong>da</strong>de” <strong>da</strong>afirmação de uma cultura autóctone e <strong>da</strong>s relações <strong>da</strong> colônia com a metrópolejá se havia configurado como o eixo de discussão sobre a identi<strong>da</strong>de cultural<strong>da</strong> América Latina. Entretanto, a adoção de modelos culturais europeus emum contexto diferente do original ia além do âmbito cultural, fazendo partede uma estrutura maior, que também dizia respeito a ordens econômicas earranjos políticos. A óbvia inadequação de certos modelos para o contextolatino-americano não impediu, contudo, que aparecessem soluçõesimprevistas, originais e sugestivas de combinação entre os elementosnativos e a imitação <strong>da</strong> metrópole.Inclusive, simultaneamente a esse movimento de constantementebuscar no estrangeiro (na metrópole) os embasamentos econômicos,culturais e políticos, surge também a ideologia <strong>da</strong> “identi<strong>da</strong>de nacional”.Justamente quando aparece a noção de que o produto de integração doelemento alienígena com o autóctone vai fun<strong>da</strong>r uma identi<strong>da</strong>de única,iniciará uma cultura propriamente nacional. As “identi<strong>da</strong>des nacionais”latino-americanas estariam sempre, portanto, sob o signo <strong>da</strong> miscigenação,do hibridismo, do “atraso” e, no mínimo, do descompasso (em relação àmetrópole). Considerando-se que tanto hibridismo quanto descompassosão conceitos extremamente negativos no pano de fundo dessa época(século XIX e início do século XX), a auto-imagem resultante para os paíseslatino-americanos não pode ser muito positiva. De um lado o hibridismo,que conota, durante o século XIX e grande parte do século XX, degeneraçãoracial e conseqüentemente sócio-cultural (YOUNG, 1995, 1-25); do outro odescompasso, o atraso em relação às organizações políticas, ao avançotecnológico, às mo<strong>da</strong>s culturais do “Centro” desenvolvido. A identi<strong>da</strong>decultural latino-americana foi, assim, sendo desconsidera<strong>da</strong> (tanto por europeuse norte-americanos como pelos próprios latino-americanos) ao longo dosséculos por sua “irrelevância” no mundo ocidental, por estar permanentementeneste lugar intermediário entre Mesmo ocidental e Outro exótico.O nó <strong>da</strong> questão é que a Ibero-América sempre foi vista, mesmo por seus pensadoresclássicos, não como autóctone, mas simplesmente como obsoleta. (MORSE,1988, 127)Apesar <strong>da</strong> hegemonia de uma visão negativa ou simplesmente negligente<strong>da</strong>s identi<strong>da</strong>des e culturas nacionais latino-americanas (principalmente <strong>da</strong>parte dos “metropolitanos” europeus e norte-americanos), não só despontamos nacionalismos, como também a construção de uma contra-ideologia,que mina e/ou relativiza as hierarquias, e de uma dialética <strong>da</strong> colonização~ 6.2 | 2007~ 59
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