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A Pintura de Temática Religiosa na Academia Imperial das ... - CBHA

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XXIV Colóquio <strong>CBHA</strong>vida e paixão <strong>de</strong> Jesus Cristo, temas envolvendo perso<strong>na</strong>gens bíblicos e, a vida e o martírio dos santos,assim como acontece <strong>na</strong>s pinturas italia<strong>na</strong>s <strong>de</strong> temática religiosa.Os Prêmios <strong>de</strong> Viagem e a Trajetória dos Pensionistas <strong>na</strong> EuropaCom a criação, em 1845, do Prêmio <strong>de</strong> Viagem à Europa (também chamado Prêmio <strong>de</strong> Primeira Or<strong>de</strong>m)Roma tor<strong>na</strong>-se mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> aperfeiçoamento técnico e alvo dos pintores da Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> para aconfecção <strong>de</strong> suas telas em temáticas varia<strong>das</strong>. Como as exigências da Aca<strong>de</strong>mia para uma perfeitacomposição baseiam-se nos âmbitos clássicos <strong>de</strong> representação, Roma é vista como mo<strong>de</strong>lo i<strong>de</strong>al <strong>de</strong>estudo pela facilida<strong>de</strong> do diálogo direto do pensionista com as obras dos gran<strong>de</strong>s mestres europeus.A instituição do prêmio <strong>de</strong> viagem, a partir <strong>de</strong> 1845, permitiu o reforço e a ampliação daqueles laçosorigi<strong>na</strong>is. A permanência <strong>na</strong> Europa possibilitou a vários artistas brasileiros o aperfeiçoamento técnico,segundo os preceitos da prática acadêmica, e a experiência do contato imediato com todo o acervo, queconstituía a gran<strong>de</strong> tradição clássica do oci<strong>de</strong>nte – daí a escolha alter<strong>na</strong>tiva entre Roma ou Paris para osestudos dos pensionistas. 9Dentre os Prêmios <strong>de</strong> Viagem à Europa, conquistados por sete pintores, durante a existência daAca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes, quatro constituem quadros religiosos. São eles: São João Batista nocárcere <strong>de</strong> Vitor Meireles, 1852; Moisés recebendo as tábuas da lei, <strong>de</strong> Zeferino da Costa, 1868; Osacrifício <strong>de</strong> Abel, <strong>de</strong> Rodolfo Amoêdo, 1878 e Flagelação <strong>de</strong> Cristo, <strong>de</strong> Oscar Pereira da Silva, 1887.Vitor Meireles (1832/1903) ingressa <strong>na</strong> Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes em 1847 recebendo oPrêmio <strong>de</strong> Viagem em 1852 10 , com um tema religioso, indo estudar pintura <strong>na</strong> Europa durante o período<strong>de</strong> oito anos. Estuda em Roma com Tommaso Mi<strong>na</strong>rdi, o qual consi<strong>de</strong>ra o pensionista ainda <strong>de</strong>spreparadopara a pintura histórica tamanha a exigência da complexida<strong>de</strong> do tema. Segue orientações <strong>de</strong>Nicola Consoni, professor da Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> São Lucas com quem se especializa em mo<strong>de</strong>lo vivo e emindumentária. Em Paris freqüenta o ateliê <strong>de</strong> Leon Cogniet assistindo ainda as aulas do italiano Gastaldi.Enquanto pensionista <strong>na</strong> Europa, Vitor Meireles <strong>de</strong> Lima realiza quatro importantes telas; duas <strong>de</strong>temática religiosa, uma <strong>de</strong> cunho mitológico e outra representando uma ce<strong>na</strong> da história <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. 11Na época <strong>de</strong> Meireles em Roma, a reforma dos Nazarenos havia evoluído para o Purismo, um movimentoartístico com ecos neoplatônicos. Os Nazarenos, jovens pintores dissi<strong>de</strong>ntes <strong>das</strong> Aca<strong>de</strong>mias noinício do século, tor<strong>na</strong>ram-se então uma plêia<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> prestígio. Tommaso Mi<strong>na</strong>rdi estivera ligadoao grupo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros tempos. 12O professor Jorge Coli trabalha com a trajetória <strong>de</strong> Vitor Meireles em Roma 13 enfatizando ocontato do artista brasileiro com a obra <strong>de</strong> Consoni e dos Nazarenos 14 que, segundo ele influenciarama formação artística do pensionista.9PEREIRA, Sonia Gomes. O ensino <strong>de</strong> arquitetura e a trajetória dos alunos brasileiros <strong>na</strong> École <strong>de</strong>s Beaux-Arts em Paris no séculoXIX. In: PEREIRA, Sonia Gomes (Org.). 185 anos <strong>de</strong> Escola <strong>de</strong> Belas Artes, p. 93.10Tela: São João Batista no cárcere, 1852.11As duas telas <strong>de</strong> temática religiosa são: Degolação <strong>de</strong> São João Batista e A flagelação <strong>de</strong> Cristo; o quadro Bacante correspon<strong>de</strong>à temática mitológica e A primeira missa no Brasil à temática da história <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.12COLI, Jorge. Vitor Meireles: um artista do Império, Rio <strong>de</strong> Janeiro: MNBA, 2004, p.24.13I<strong>de</strong>m. Vitor Meireles e a pintura inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Campi<strong>na</strong>s: Unicamp, 1997. (Tese <strong>de</strong> Livre Docência)14Em 1809 Friedrich Overbeck, homem <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s convicções religiosas, fundou junto com Franz Pforr em Vie<strong>na</strong>, em cujaAca<strong>de</strong>mia ambos estudavam e <strong>de</strong> cujos ensinos estavam <strong>de</strong>siludidos, a Irmanda<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Lucas, uma confraria <strong>de</strong> artistas erguidapraticamente conforme as formas e os costumes <strong>de</strong> uma or<strong>de</strong>m religiosa. Com ela e em reação contra o racio<strong>na</strong>lismo, hedonismoe laicismo da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu tempo pretendiam pôr em prática as idéias dos irmãos Schlegel que anunciavam o ressurgimento<strong>de</strong> uma arte cristã baseada acima <strong>de</strong> tudo no sentimento. Atraídos pelo catolicismo, os membros da confraria transferiram-se em1810 para Roma conduzidos por Overbeck e Pforr, que morreria dos anos <strong>de</strong>pois. Em Roma, e vivendo no antigo Convento <strong>de</strong>São Isidoro, os confra<strong>de</strong>s receberam o nome <strong>de</strong> <strong>na</strong>zarenos, talvez por causa da temática <strong>das</strong> suas pinturas. Overbeck continuaproduzindo em Roma até a sua morte em 1867.5 · Regi<strong>na</strong>ldo da Rocha Leite


XXIV Colóquio <strong>CBHA</strong>Outro pintor contemplado com o Prêmio <strong>de</strong> Viagem à Europa 15 em pintura com temáticareligiosa é João Zeferino da Costa (1840/1915). Ingressa <strong>na</strong> Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes em1857 recebendo logo <strong>de</strong>pois a medalha <strong>de</strong> ouro com a composição Daniel <strong>na</strong> gruta dos leões. Em1869 segue para Roma matriculando-se <strong>na</strong> Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> São Lucas seguindo o curso <strong>de</strong> CesareMariani. Logra a obtenção do primeiro prêmio <strong>de</strong> nu, e em seguida, o <strong>de</strong> composição em pinturahistórica com a tela O Profeta Natan quando reprova o Rei Davi pelo <strong>de</strong>lito que este comete à mulher<strong>de</strong> Uria, assunto <strong>de</strong> temática bíblica. O governo brasileiro recompensa o esforço do artista com dois milfrancos e prorroga o prazo da sua pensão para mais três anos.O professor Luciano Migliaccio compara as obras <strong>de</strong> Zeferino da Costa com as dos pintoresitalianos do período Barroco, Domenichino e Giovanni Lanfranco, apontando características análogasem obras do período da sua formação em Roma 16 .Zeferino da Costa, já como professor da Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes, recebe a encomendapara a execução dos painéis da Igreja da Can<strong>de</strong>lária do Rio <strong>de</strong> Janeiro retor<strong>na</strong>ndo à Roma para aexecução dos cartões preparativos. De volta ao Brasil, é responsável por mais <strong>de</strong> vinte anos, pelaconfecção <strong>das</strong> pinturas em marouflage 17 para a igreja carioca. Além <strong>das</strong> seis telas da <strong>na</strong>ve que contama história da fundação da primitiva igreja, o artista executa para a capela-mor as obras sobre a iconografiaMaria<strong>na</strong>: Anunciação, Esponsalício, Purificação e Assunção. É, também, <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Zeferino da Costao programa iconográfico Mariano: A Virgem ro<strong>de</strong>ada <strong>das</strong> sete Virtu<strong>de</strong>s, que é formado por oito telas.São elas: Virtu<strong>de</strong>s Teologais (Fé, Esperança e Carida<strong>de</strong>) e Virtu<strong>de</strong>s Car<strong>de</strong>ais (Prudência, Justiça,Temperança e Fortaleza), além da própria figura <strong>de</strong> Maria.Rodolfo Amoêdo (1857/1941), nosso terceiro pensionista em pintura religiosa, ingressa <strong>na</strong>Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes em 1874 sendo aluno <strong>de</strong> Vitor Meireles, Zeferino da Costa e Agostinhoda Motta. Em 1878 obtêm o Prêmio <strong>de</strong> Viagem à Europa com a tela <strong>de</strong> assunto bíblico O sacrifício <strong>de</strong>Abel indo estudar em Paris com Cabanel, passando pelo ateliê Boulanger-Lefebvre e com Puvis <strong>de</strong>Chavannes. Os “envios <strong>de</strong> pensionista” <strong>de</strong> Rodolfo Amoêdo são, como todos os enviados pelos bolsistas,avaliados por uma comissão formada por professores da Aca<strong>de</strong>mia brasileira. No caso específico doartista, por Vitor Meireles e José Maria <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros, como po<strong>de</strong>mos ver a seguir:(...) que estes trabalhos revelam gran<strong>de</strong> aproveitamento, <strong>de</strong>ixando antever o resultado fi<strong>na</strong>l dos seusesforços, que por certo atingirão; libertando-se mais tar<strong>de</strong> da situação transitória e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, que oestudo, a prática e os preceitos da Escola francesa contemporânea, tanto influem e o induzem a sentir<strong>de</strong>sse modo. O esboceto representando Jesus Cristo em Cafar<strong>na</strong>um é uma boa composição que paraexecuta-lo requer o dito pensionista – prorrogação por dois anos do prazo <strong>de</strong> sua pensão – <strong>na</strong> forma do art.9 <strong>das</strong> instruções dos pensionistas. Esse quadro <strong>de</strong>vendo ser bem executado e <strong>de</strong> modo que a figura doprotagonista adquira mais importância nessa composição, constituirá certamente um dos trabalhos mais valiososdo jovem artista. Por isso parece à Comissão ser justo o pedido a que ele tem direito: – Aca<strong>de</strong>mia<strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes – 3 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1884 – Victor Meirelles – José Maria <strong>de</strong> Me<strong>de</strong>iros. 18Nessa avaliação po<strong>de</strong>-se notar o controle que a Aca<strong>de</strong>mia exerce sobre as ativida<strong>de</strong>s do pensionista,porém reconhece que após a conclusão dos seus estudos o bolsista <strong>de</strong>ve procurar seu própriocaminho no campo estético “libertando-se dos preceitos da Escola Francesa”. Nota-se também que, atemática religiosa permite ao aluno executar, <strong>de</strong>ntro dos métodos exigidos pela Aca<strong>de</strong>mia, trabalhos <strong>de</strong>gran<strong>de</strong> prestígio.Oscar Pereira da Silva (1867/1939) estuda <strong>na</strong> Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes com VitorMeireles e Zeferino da Costa conquistando o Prêmio <strong>de</strong> Viagem em pintura com um tema religioso,15Tela: Moisés recebendo as tábuas da lei, 1868.16MIGLIACCIO, Luciano. O século XIX. In: MOSTRA DO REDESCOBRIMENTO, São Paulo: Fundação Bie<strong>na</strong>l <strong>de</strong> São Paulo, 2002.17Técnica francesa muito difundida durante o fi<strong>na</strong>l do século XIX, em que a pintura é executada sobre a tela, sendo afixadaposteriormente à pare<strong>de</strong>.18Ata da Sessão, 13 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1884. Arquivo do Museu D. João VI/EBA/UFRJ.6 · Regi<strong>na</strong>ldo da Rocha Leite


XXIV Colóquio <strong>CBHA</strong>Flagelação <strong>de</strong> Cristo, em 1887. É o último premiado no período <strong>de</strong> vigência da Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong>, viajapara Paris e se especializa com Gerôme e Bon<strong>na</strong>t. Ao voltar da Europa, o pintor encontra <strong>na</strong> produçãoreligiosa um alicerce para a sua experiência profissio<strong>na</strong>l realizando em São Paulo a pintura <strong>de</strong> duasigrejas on<strong>de</strong> a temática Maria<strong>na</strong> se sobrepõe. Para a igreja <strong>de</strong> Nossa Senhora da Consolação produzquatro telas que la<strong>de</strong>iam o altar-mor: Profecia do Velho Simeão, Encontro <strong>de</strong> Maria com Isabel, Nativida<strong>de</strong><strong>de</strong> Jesus Cristo e Apresentação <strong>de</strong> Jesus no Templo. Na igreja <strong>de</strong> Santa Cecília é responsável pelaconfecção <strong>das</strong> obras: Os quatro Evangelistas, pintada <strong>na</strong> cúpula, Assunção da Virgem e Esponsais <strong>de</strong> Maria.Consi<strong>de</strong>rações Fi<strong>na</strong>isA conclusão que se impõe é que a pintura <strong>de</strong> temática religiosa do século XIX continua nos dias<strong>de</strong> hoje sujeita a interpretações restritivas e comentários preconceituosos, inexistindo obra <strong>de</strong> referênciasobre o assunto. Devido à ausência <strong>de</strong> questio<strong>na</strong>mentos com base <strong>na</strong> produção e no ensino da pintura<strong>de</strong> temática religiosa da Aca<strong>de</strong>mia <strong>Imperial</strong> <strong>das</strong> Belas Artes, esse ma<strong>na</strong>ncial permanece numa área <strong>de</strong>sombras. Nossa comunicação teve como objetivo instigar a produção intelectual dos pesquisadoresque se interessam pelas questões do oitocentos <strong>na</strong> historiografia da arte brasileira, para que possa servisto com mais atenção esse gênero tão relevante <strong>na</strong> formação dos artistas do século XIX no Brasil.7 · Regi<strong>na</strong>ldo da Rocha Leite

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