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Diplomacia, desenvolvimento e sistema nacional de inovação - Funag

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ministério das relações exterioresMinistro <strong>de</strong> EstadoSecretário-GeralEmbaixador Antonio <strong>de</strong> Aguiar PatriotaEmbaixador Ruy Nunes Pinto Nogueirafundação alexandre <strong>de</strong> gusmãoPresi<strong>de</strong>nteEmbaixador Gilberto Vergne SaboiaInstituto <strong>de</strong> Pesquisa <strong>de</strong>Relações InternacionaisDiretorEmbaixador José Vicente <strong>de</strong> Sá PimentelCentro <strong>de</strong> História eDocumentação DiplomáticaDiretorEmbaixador Maurício E. Cortes CostaA Fundação Alexandre <strong>de</strong> Gusmão, instituída em 1971, é uma fundação pública vinculada aoMinistério das Relações Exteriores e tem a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> levar à socieda<strong>de</strong> civil informaçõessobre a realida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong> e sobre aspectos da pauta diplomática brasileira. Sua missão épromover a sensibilização da opinião pública <strong>nacional</strong> para os temas <strong>de</strong> relações internacionaise para a política externa brasileira.Ministério das Relações ExterioresEsplanada dos Ministérios, Bloco HAnexo II, Térreo, Sala 170170-900 Brasília, DFTelefones: (61) 3411-6033/6034Fax: (61) 3411-9125Site: www.funag.gov.br<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 2 10/10/2011 14:15:37


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>Diplomacia</strong>, Desenvolvimento eSistemas Nacionais <strong>de</strong> Inovação:estudo comparado entreBrasil, China e Reino UnidoBrasília, 2011<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 3 10/10/2011 14:15:37


Direitos <strong>de</strong> publicação reservados àFundação Alexandre <strong>de</strong> GusmãoMinistério das Relações ExterioresEsplanada dos Ministérios, Bloco HAnexo II, Térreo70170-900 Brasília – DFTelefones: (61) 3411-6033/6034Fax: (61) 3411-9125Site: www.funag.gov.brE-mail: funag@itamaraty.gov.brEquipe Técnica:Henrique da Silveira Sardinha Pinto FilhoFernanda Antunes SiqueiraFernanda Leal Wan<strong>de</strong>rleyJuliana Corrêa <strong>de</strong> FreitasMariana Alejarra Branco TroncosoRevisão:Júlia Lima Thomaz <strong>de</strong> GodoyProgramação Visual e Diagramação:Juliana OremImpresso no Brasil 2011Cruz Júnior, Al<strong>de</strong>mar Seabra da.<strong>Diplomacia</strong>, <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>sistema</strong>s nacionais<strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: estudo comparado entre Brasil, Chinae Reino Unido / Al<strong>de</strong>mar Seabra da Cruz Júnior. –Brasília: Fundação Alexandre <strong>de</strong> Gusmão, 2011.292p.ISBN: 978.85.7631.327-41. Relações Internacionais. 2. <strong>Diplomacia</strong>.3. Globalização. Política <strong>de</strong> Inovação.CDU 327.3Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Sonale Paiva– CRB /1810Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional conforme Lein° 10.994, <strong>de</strong> 14/12/2004.<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 4 10/10/2011 14:15:37


A Adhemar (in memoriam)The reasonable man adapts himself to the world:the unreasonable one persists in trying to adaptthe world to himself. Therefore, all progress<strong>de</strong>pends on the unreasonable man.(George Bernard Shaw)<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 5 10/10/2011 14:15:37


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SumárioPrefácio, 11Apresentação e agra<strong>de</strong>cimentos, 17Introdução - Inovação e as transformações na economia mundial, 25Brasil, China e Reino Unido: atores <strong>de</strong>siguais e assimétricos daglobalização, 29Capítulo I – Inovação: métodos, conceitos e paradoxos, 451.1 – Sistemas nacionais, regionais, locais e global <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, 501.2 – O caráter sistêmico da <strong>inovação</strong>, 531.3 – Inovação e incerteza, 55Capítulo II – Alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> C,T&Ino Brasil e na América Latina, 672.1 – A re<strong>de</strong>scoberta do mercado externo e o lento <strong>de</strong>spertar da<strong>inovação</strong>, 802.2 – Políticas <strong>de</strong> integração com base na <strong>inovação</strong>: o Mercosul ea América do Sul, 87<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 7 10/10/2011 14:15:37


Capítulo III – Sistema Brasileiro <strong>de</strong> Inovação: um todo menor quesuas partes, 933.1 – Inovação no Brasil: marchas e contramarchas do <strong>sistema</strong>, 1003.2 – Marco jurídico-político-institucional da <strong>inovação</strong> no Brasil, 1103.3 – SNB: caminhos <strong>de</strong>finidos, <strong>de</strong>stino incerto, 126Capítulo IV – “Aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal naaplicação”, 1374.1 – Percepções do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, 1374.2 – Da centralização econômica para a abertura e o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico, 1424.3 – Governo, socieda<strong>de</strong> e atores do SCI mobilizados pela “zizhuchuangxin”, 1494.4 – Universida<strong>de</strong>s e <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> pesquisa, 1564.5 – Empresas multinacionais vs. “<strong>inovação</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte”, 1614.6 – O programa 2006-2020 <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, 1644.7 – Meio cheia, meio vazia – trunfos e fraquezas do SCI, 1694.8 – A presença fundamental dos “tartarugas marinhas”, 176Capítulo V – Reino Unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e“economia Impon<strong>de</strong>rável”, 1815.1 – De “doente da Europa” a “nação inovadora”, 1875.2 – O (Eco)<strong>sistema</strong> britânico <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, 1945.3 – “Nação Inovadora”, meta-<strong>inovação</strong> e “<strong>inovação</strong> total”, 2105.4 – O sol nunca se põe – ação inter<strong>nacional</strong> para a <strong>inovação</strong>, 2185.5 – SBI: conquistas e <strong>de</strong>safios, 223Conclusões: o papel do MRE num <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> “autocontido”, 227Conectando e mobilizando a diáspora <strong>de</strong> C,T&I brasileira – o papel doItamaraty, 230Bibliografia citada no texto, 247<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 8 10/10/2011 14:15:37


Anexos, 2711.1 – Glossário <strong>de</strong> siglas e acrônimos3.1 – Relação e caracterização dos fundos setoriais no Brasil5.1 – Organograma do SBI do governo trabalhista britânico, atéjunho <strong>de</strong> 2007 (vertente governamental)5.2 – Orçamento do governo britânico para 2006/2007 – gráficocomparativo5.3 – Diagramas do DIUS, Go-Science e Science Innovation Group(SIG/FCO)5.4 – Orçamento do BIS para o biênio 2011-2012: programas eagências5.5 – Quadro do financiamento público à ciência e à pesquisa noReino Unido5.6 – Mapa das instalações do complexo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do setor <strong>de</strong>biotecnologia no Reino Unido5.7 – Quadro das exportações britânicas em 2007Lista <strong>de</strong> quadros e gráficosGráfico 3.1 – Brasil: gastos com <strong>inovação</strong>/receita líquida <strong>de</strong>vendas, 2003/2005, 94Gráfico 3.2 – Participação dos Estados brasileiros – ativida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> ciência e <strong>inovação</strong>, 104Quadro 4.1 – Universida<strong>de</strong>s chinesas – ranking e produçãocientífica, 1995-2005, 158Gráfico 4.2 – Crescimento das exportações <strong>de</strong> alto conteúdotecnológico, 1991-2005, 161Gráfico 4.3 – Volume <strong>de</strong> exportações, setor TIC: países eregiões, 162Gráfico 4.4 – China: exportações <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alta tecnologia,tipo <strong>de</strong> empresa, 165Quadro 5.1 – Indicadores <strong>de</strong> interação universida<strong>de</strong>-empresano Reino Unido, 204Gráfico 5.2 – Evolução do investimento bruto em P&D – paísese blocos, 1981-2003, 206Quadro 5.3 – Reino Unido: PIB real por setor (% do PIB), 209<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 9 10/10/2011 14:15:37


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PrefácioA partir <strong>de</strong> 2007 o <strong>sistema</strong> econômico inter<strong>nacional</strong> entrou em umazona <strong>de</strong> turbulência, registrada publicamente como a mais profunda crise<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o crash <strong>de</strong> 1929, que revelou profundas distorções regulatórias eatualizou distorções estruturais que atravessam os tempos. No centroda instabilida<strong>de</strong>, a economia dos Estados unidos, da União Europeia edo Japão. Apesar das pesadas injeções públicas para manter a economiafuncionando, os três pilares da economia mundial conseguiram apenasanunciar um longo período <strong>de</strong> recuperação, a um custo social e econômicoavassalador. No centro da estagnação situa-se a instabilida<strong>de</strong> políticae geopolítica, que expõe o <strong>de</strong>clínio da economia norte-americana,a centrifugação da união Europeia e a ascensão da China comosuperpotência mundial, e não apenas como uma li<strong>de</strong>rança asiática. Oavanço chinês em meio à crise não apenas se beneficia das dificulda<strong>de</strong>sdos até então países lí<strong>de</strong>res como também energiza a emergência inédita<strong>de</strong> países em <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> como o Brasil, a Índia e vários outros.Há poucas dúvidas sobre o <strong>de</strong>slocamento do dinamismo econômicoe produtivo do mundo para a China, seguida das <strong>de</strong>mais economiasemergentes. Des<strong>de</strong> o início <strong>de</strong>ste século os polos <strong>de</strong> crescimento daeconomia mundial ten<strong>de</strong>ram a se localizar em países antes consi<strong>de</strong>radosperiféricos. De tomadores <strong>de</strong> capital, transformaram-se em credoresdos países avançados. De fornecedores <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra farta e barata,11<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 11 10/10/2011 14:15:37


glauco arbix e rodrigo fonsecapassaram a exibir musculatura nas áreas científicas e tecnológicas. Dereceptores <strong>de</strong> multinacionais tornaram-se base <strong>de</strong> empresas globais, quecompetem em mercados sofisticados, <strong>de</strong> um modo impensável há 20 anos.A turbulência dos avançados não sugere, porém, um céu <strong>de</strong>briga<strong>de</strong>iro para os emergentes. O reposicionamento dos países na novasituação inter<strong>nacional</strong> vai <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong> usarseu potencial e mais ainda <strong>de</strong> produzir novas capacida<strong>de</strong>s. Apenas parailustrar, é certo afirmar que boa parte das exportações brasileiras estábaseada em produtos primários que incorporaram tecnologia e, <strong>de</strong>ssaforma, ganharam competitivida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong>. Como exemplo, temosa tecnologia <strong>de</strong>senvolvida <strong>nacional</strong>mente como no caso da soja, dos<strong>de</strong>rivados da cana-<strong>de</strong>-açúcar ou da extração e tratamento do minério <strong>de</strong>ferro. No entanto, esse reconhecimento não po<strong>de</strong> ignorar que, para o Brasilimportar uma tonelada <strong>de</strong> circuitos integrados, é preciso exportar 1.742toneladas <strong>de</strong> soja. Esse é o peso da transformação inovadora, que colocaimediatamente a necessida<strong>de</strong> do país superar sua extrema <strong>de</strong>pendênciadas commodities. Esse é o <strong>de</strong>safio maior <strong>de</strong> todos os emergentes queprocuram construir, cada um a sua maneira, uma economia baseada nasáreas mais intensivas <strong>de</strong> conhecimento, como forma <strong>de</strong> se conectar como futuro.Todos sabem que a <strong>inovação</strong> é uma das condições básicas <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> qualquer país. Contudo, tamanho <strong>de</strong> mercado,capacida<strong>de</strong> acumulada, condições institucionais, políticas e financeirasfazem toda a diferença. Seja para a <strong>de</strong>cisão das empresas sobre quantoe como inovar, seja na <strong>de</strong>cisão dos governos <strong>de</strong> como e quanto induzir a<strong>inovação</strong>. Nesse mundo, as <strong>de</strong>cisões tornam-se cada vez mais complexaspara empresas e governos. O que exige cada vez maior quantida<strong>de</strong>e qualida<strong>de</strong> no conhecimento das práticas <strong>de</strong> incentivo adotadas pordiferentes países.Para o Brasil, Ciência e Tecnologia são essenciais para diminuira distância que o separa dos países avançados, superar o perfil <strong>de</strong> suaeconomia ainda marcada pela produção <strong>de</strong> commodities e virar a página<strong>de</strong> um passado e, em parte, <strong>de</strong> um presente, marcado por uma economia<strong>de</strong> baixa produtivida<strong>de</strong>. Para isso, a <strong>inovação</strong> em todas as suas vertentes<strong>de</strong>ve se tornar o núcleo dinâmico capaz <strong>de</strong> puxar o conjunto da economia.Multiplicar e otimizar a sinergia entre o setor público e privado, entreo conhecimento que nossas universida<strong>de</strong>s e institutos <strong>de</strong> pesquisa geram12<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 12 10/10/2011 14:15:37


prefáciodiariamente e a economia real movimentada pelas empresas é o únicomodo <strong>de</strong> viabilizar um salto em nosso <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Sem ciênciae pesquisa básica não haverá uma economia inovadora. Sem empresasdinâmicas e altamente produtivas o país não conseguirá se beneficiar <strong>de</strong>suas qualida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>senvolver suas potencialida<strong>de</strong>s. Por isso mesmo, ofortalecimento do <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong>ve estar no coraçãodo esforço que o país faz para aumentar substantivamente o nível <strong>de</strong>seu investimento. Mais do que isso, somente a elevação da qualida<strong>de</strong>do investimento será capaz <strong>de</strong> sustentar o crescimento no longo prazo econstruir as bases <strong>de</strong> uma economia ecologicamente sustentável, baseadanos setores <strong>de</strong> maior <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecimento.São fortes os sinais a indicar que um conjunto significativo <strong>de</strong>empresas mantém seus investimentos em tecnologia mesmo diante dasincertezas da economia mundial e das restrições ao crescimento impostospelas dificulda<strong>de</strong>s fiscais e <strong>de</strong> controle da inflação. A <strong>de</strong>manda crescentepelo financiamento e apoio à <strong>inovação</strong> confirmam os indícios <strong>de</strong> queum <strong>de</strong>stacamento avançado <strong>de</strong> empresas incorporou a necessida<strong>de</strong><strong>de</strong> geração <strong>de</strong> tecnologia em suas estratégias <strong>de</strong> médio e longo prazo.Comportamento raro na trajetória empresarial do país, essa busca éainda mais animadora quando se sabe que o Brasil precisa urgentementetransformar seu aparato produtivo e <strong>de</strong> serviços em um ambiente maisamigável à <strong>inovação</strong>, capaz <strong>de</strong> remunerar e mitigar as incertezas eriscos inerentes à geração <strong>de</strong> tecnologia nova. Aumentar o investimentoprivado em <strong>inovação</strong>, ajudar as empresas a diversificar seus produtos,processos e serviços e estimular as ativida<strong>de</strong>s contínuas em Pesquisa eDesenvolvimento (P&D) é tarefa crucial do setor público.A <strong>inovação</strong> é uma das peças-chave no plano <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong>longo prazo para o país e <strong>de</strong>mandará um crescimento <strong>de</strong> investimentossignificativamente maior do que o ocorrido nos últimos anos. Diretrizesneste sentido estão <strong>de</strong>finidas: enfrentar <strong>de</strong>safios estruturais, expandiro crescimento do investimento empresarial em P&D e do número <strong>de</strong>médias e pequenas empresas inovadoras.Nesse sentido, o lançamento do Plano Brasil Maior (agosto <strong>de</strong>2011) é um marco. Este Plano tem por objetivos centrais acelerar ocrescimento do investimento produtivo e o esforço tecnológico e <strong>de</strong><strong>inovação</strong> das empresas nacionais, e aumentar a competitivida<strong>de</strong> dosbens e serviços nacionais. Historicamente no Brasil, o crescimento dos13<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 13 10/10/2011 14:15:37


glauco arbix e rodrigo fonsecainvestimentos em <strong>inovação</strong> foram inferiores ao crescimento do PIB.No entanto, <strong>de</strong> 2003 a 2005, com a redução das incertezas políticas, asempresas passaram a imprimir um ritmo mais acelerado <strong>de</strong> investimentoem P&D. Estes investimentos empresariais foram impulsionados por umasérie <strong>de</strong> mudanças no marco político, legal e regulatório, com <strong>de</strong>staquepara o lançamento da Política Industrial, Tecnológica e <strong>de</strong> ComércioExterior (PITCE, 2004), a Lei <strong>de</strong> Inovação (2005), a Lei do Bem (2006) e a<strong>de</strong>finição do Plano Nacional <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia e Inovação (2008) e daPolítica <strong>de</strong> Desenvolvimento Produtivo (2008). Ao mesmo tempo, o Estadosustentou um aumento significativo do investimento público em Ciência,Tecnologia e Inovação (CT&I), que resultou em consi<strong>de</strong>rável crescimentodo número <strong>de</strong> pesquisadores (10% a.a.) e da produção acadêmica. Apenasem 2010, o Brasil formou cerca <strong>de</strong> 50 mil mestres e doutores e saltoupara a 13ª posição no ranking <strong>de</strong> países produtores <strong>de</strong> artigos científicos,respon<strong>de</strong>ndo por mais <strong>de</strong> 2% <strong>de</strong> toda a produção mundial.O Brasil possui um ecos<strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> virtuoso em múltiplosaspectos, com uma diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mecanismos <strong>de</strong> fomento à <strong>inovação</strong>,com leis <strong>de</strong> incentivo fiscal, fundos públicos e instituições capazes <strong>de</strong>apoiar a <strong>inovação</strong> tanto no segmento empresarial como no acadêmico.O principal <strong>de</strong>safio agora está em inovar e investir para ampliar acompetitivida<strong>de</strong>, sustentar o crescimento e melhorar a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida,incluindo a sustentabilida<strong>de</strong> como uma dimensão sistêmica.Já há alguns anos a ciência brasileira ganha <strong>de</strong>staque e aumenta suaparticipação inter<strong>nacional</strong> na construção do conhecimento. Esta maiorparticipação vem sendo construída <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o final dos anos 90 por meio<strong>de</strong> um processo intenso <strong>de</strong> ampliação da base <strong>de</strong> pesquisadores e doaprofundamento da cooperação com outros países.Como realça este livro, o Brasil “apresenta sinais <strong>de</strong> amadurecimentoe <strong>de</strong> que logo po<strong>de</strong>ria, graças à sua comprovada capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong>assimilação e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> novas tecnologias, galgar mais umaetapa em sua escala produtiva e evolutiva na direção <strong>de</strong> uma economiado conhecimento. O Brasil experimentou uma rápida e extraordináriadiversificação produtiva em pouco mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos e sua base científicalogra respeito e admiração crescentes em todo o mundo, especialmenteem áreas como energias renováveis, medicina, algumas engenhariase biotecnologia, além das humanida<strong>de</strong>s, on<strong>de</strong> o país dispõe <strong>de</strong> umreconhecido cabedal inter<strong>nacional</strong> (p. 190)”.14<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 14 10/10/2011 14:15:37


prefácioNesse sentido, há uma série <strong>de</strong> ações que precisam ser empreendidaspara tirar proveito da capacida<strong>de</strong> científica disponível e da ampla malha<strong>de</strong> relações internacionais construída ao longo <strong>de</strong> décadas. Estas po<strong>de</strong>riamser coor<strong>de</strong>nadas pela expansão das práticas do que se po<strong>de</strong>ria chamar<strong>de</strong> “diplomacia da <strong>inovação</strong>” entre os diversos atores, estatais e nãogovernamentais, que integram o <strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Estelivro, além <strong>de</strong> importantes aportes <strong>de</strong> conhecimento sobre estratégias <strong>de</strong>fomento a <strong>inovação</strong>, apresenta uma série <strong>de</strong> contribuições neste campoque, se estudadas, <strong>de</strong>senvolvidas e implementadas, po<strong>de</strong>m gerar umaonda revigorante para todo o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.Países <strong>de</strong>senvolvidos e emergentes realizam gran<strong>de</strong>s esforços parainjetar dinamismo em suas economias. Apoiam as pequenas empresasinovadoras, investem em áreas <strong>de</strong> tecnologias criticas e fortalecemo venture capital, entre outras ações. O Brasil avançou muito nainfraestrutura <strong>de</strong> apoio a <strong>inovação</strong>. Porém, esse esforço po<strong>de</strong> se mostrarem vão se as novas oportunida<strong>de</strong>s não forem aproveitadas. O país temnova chance para criar e sustentar uma economia <strong>de</strong> baixo carbono,ambientalmente sustentável, movida pelas áreas mais intensivas emconhecimento.A principal questão que hoje se coloca para as políticas públicas noBrasil e no mundo é como promover o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, introduzindocrescentemente componentes <strong>de</strong> sustentabilida<strong>de</strong> e melhorando ascondições <strong>de</strong> distribuição <strong>de</strong> renda. Em qualquer política pública – maisainda em políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – o como e o quanto são essenciais.Enten<strong>de</strong>r como empresas e governos <strong>de</strong> diversos países colocam emprática suas estratégias <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> é matéria fundamental para qualquerpaís que pretenda jogar um papel relevante na dinâmica política eeconômica inter<strong>nacional</strong>.A leitura <strong>de</strong>ste livro certamente ajudará a estimular essa reflexão.Glauco Arbix, presi<strong>de</strong>nte da FinepRodrigo Fonseca, analista da Finep15<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 15 10/10/2011 14:15:37


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Apresentação e agra<strong>de</strong>cimentosEste trabalho é uma versão revista, ampliada, adaptada e atualizada<strong>de</strong> uma dissertação apresentada ao Curso <strong>de</strong> Altos Estudos (CAE) doMinistério das Relações Exteriores (MRE), em novembro <strong>de</strong> 2009. Ointeresse pelos estudos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong>corre essencialmente <strong>de</strong> minhasativida<strong>de</strong>s docentes e <strong>de</strong> pesquisa como Professor <strong>de</strong> Teoria das RelaçõesInternacionais, Globalização e Sistema Inter<strong>nacional</strong> Contemporâneo,<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2001, quando fui convidado para atuar, como Professor visitante,no Mestrado em Relações Internacionais da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral doRio Gran<strong>de</strong> do Sul (UFGRS) e, mais recentemente, no Mestrado em<strong>Diplomacia</strong> do Instituto Rio Branco (IRBr), em Brasília.Nos primeiros tempos, <strong>de</strong>tinha-me essencialmente em estudossobre globalização política, mormente na caracterização do <strong>sistema</strong>inter<strong>nacional</strong> após o final da Guerra Fria e a queda do Muro <strong>de</strong>Berlim, o que resultou na publicação <strong>de</strong> artigos e capítulos <strong>de</strong> livrossobre o tema, no Brasil e no exterior. Posteriormente, interessei-mepelos aspectos culturais da globalização, especialmente por seupapel no processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>scaracterização ou – para empregar umtermo mais neutro – transformação das i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s sociais dospaíses latino-americanos, para o que me beneficiei enormemente doconvívio com instituições acadêmicas do Peru e do Uruguai, on<strong>de</strong>residi, <strong>de</strong> 2003 a 2009.17<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 17 10/10/2011 14:15:37


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorDe 2006 ou 2007 para cá, talvez influenciado pelo lugar-comummarxista <strong>de</strong> que transformações políticas e culturais (e ainda que oconceito <strong>de</strong> globalização fosse relativamente ignorado na segundameta<strong>de</strong> do século XIX) <strong>de</strong>rivam <strong>de</strong> profundas alterações na infraestruturaeconômica das socieda<strong>de</strong>s (e agora consi<strong>de</strong>rando-se “socieda<strong>de</strong>” comoum <strong>sistema</strong> político-econômico planetário, moldado a partir das forças emecanismos estruturantes da globalização), fui impelido a melhor estudare compreen<strong>de</strong>r quais seriam, em essência, tais mecanismos “estruturantes”daquele fenômeno. Seguindo os passos <strong>de</strong> Schumpeter e da economiaevolucionista e, em distante medida, do próprio Marx – talvez os doisgran<strong>de</strong>s prógonos dos estudos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – po<strong>de</strong>mos encontrar pistas <strong>de</strong>que as principais forças mo<strong>de</strong>ladoras do <strong>sistema</strong> econômico inter<strong>nacional</strong>,em todos os tempos, e que subjazem aos movimentos <strong>de</strong> acumulação eexpansão capitalista, é a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> as economias e socieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>transformarem e adaptarem criativamente o conjunto <strong>de</strong> seus meios,formas, forças e fatores <strong>de</strong> produção. Tais transformações mostram-seessenciais, por sua vez, tanto em escala micro quanto macroeconômica,para forjar a competitivida<strong>de</strong> das economias, aumentar os estoques <strong>de</strong>poupança, assegurar fluxos <strong>de</strong> investimentos, estimular a qualificaçãoe a formação da mão <strong>de</strong> obra e remunerar, mediante o preço-prêmio, aativida<strong>de</strong> inovadora.Se é correta a visão <strong>de</strong> que processos políticos são largamenteinfluenciados – evitaria o vocábulo anticientífico “<strong>de</strong>terminados” –por mudanças econômicas globais ou nacionais, então compreen<strong>de</strong>ros mecanismos da <strong>inovação</strong> e da mudança tecnológica são cruciaispara compreen<strong>de</strong>r as gran<strong>de</strong>s transformações trazidas à baila pelaglobalização. São conhecidas as teorias que imputam, em gran<strong>de</strong> medida,ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e à expansão do complexo industrial-militar norte--americano durante os anos 80, por exemplo, a incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a antigaURSS manter o fôlego na competição estratégica característica da GuerraFria e do bipolarismo.Nos dias atuais, com os países tendo-se transformado essencialmenteem “Estados comerciantes” (Rosecrance, 1986), o papel da <strong>inovação</strong>nas transformações políticas e econômicas mundiais tornou-se aindamais saliente, na medida em que o padrão <strong>de</strong> acumulação capitalistaperseguido pelos Estados e empresas passou a representar a estratégiaprepon<strong>de</strong>rante, senão exclusiva, para a inserção inter<strong>nacional</strong> e a18<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 18 10/10/2011 14:15:37


apresentação e agra<strong>de</strong>cimentosre<strong>de</strong>finição dos parâmetros <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. A antiga disputa i<strong>de</strong>ológica entreEUA e URSS soa hoje em dia um tanto anacrônica, diante da abordagemmais pragmática <strong>de</strong> praticamente todos os países, que passaram a associarestratégias <strong>de</strong> crescimento, <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e afirmação <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r à suacapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atrair investimentos produtivos em setores intensivos emconhecimento e <strong>de</strong> produzir bens e serviços em escala cada vez maior,com mais varieda<strong>de</strong>, diversificação, sofisticação tecnológica e valoragregado.O título <strong>de</strong>ste livro sintetiza, com a acuida<strong>de</strong> que se espera,seus objetivos: trata-se <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver e fortalecer a hipótese – já<strong>de</strong>monstrada em inúmeros estudos e trabalhos clássicos, citados aolongo do texto – <strong>de</strong> que políticas e processos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong><strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m fortemente da ativida<strong>de</strong> inovadora na economia, ou seja,a <strong>inovação</strong> como variável <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. Dessemodo, recorre-se a exemplos <strong>de</strong> outros países, explicitamente Chinae Reino Unido, para se isolar <strong>de</strong>terminadas práticas ou mecanismosque possam orientar e inspirar políticas e processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> noBrasil. A abordagem comparativista é plenamente justificável, nocontexto <strong>de</strong>ste livro, por se tratar <strong>de</strong> longe a mais cômoda, fácil e menosarriscada. Diante da dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição a priori do conceito <strong>de</strong><strong>inovação</strong>, e diante da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer uma estratégiapolítica universal e permanente <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (consoante seus elementos<strong>de</strong> historicida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> multiestabilida<strong>de</strong>, que se verá mais adianteno capítulo I), é mais conveniente recorrer-se à estratégia ex post,<strong>de</strong>screvendo e esmiuçando políticas, processos, programas, condiçõespolíticas, capital humano e capitais intangíveis <strong>de</strong> modo geral, crenças,disposições e herança histórica, com vistas à reconstrução <strong>de</strong> umaprática concreta <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, ancorada na <strong>inovação</strong> – e isso,a partir <strong>de</strong> muito antes que estivéssemos conscientes do conceito e dacentralida<strong>de</strong> da <strong>inovação</strong> como elemento-chave para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>econômico-social.A hipótese central consiste, assim, que China e Reino Unidoconstituem-se em exemplos úteis e casos bem-sucedidos <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> baseados em conhecimento e <strong>inovação</strong>, inspiradoresdas próprias estratégias brasileiras <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. O outro termoque compõe o título é “diplomacia”, e aqui as implicações tornam-semenos evi<strong>de</strong>ntes: nunca como hoje em dia, em tempos <strong>de</strong> globalização, o19<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 19 10/10/2011 14:15:37


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico-tecnológico tem sido realizado por firmas, porpesquisa científica, por ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> pesquisa e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (P&D) nãoconfinadas em espaços nacionais claramente <strong>de</strong>terminados. Ao impulsionare ser impulsionada pela mudança tecnológica e pela transformação do perfilprodutivo dos países, a globalização passa a ser um subproduto da <strong>inovação</strong> e<strong>de</strong> seu impacto na economia. Dessa forma, a diplomacia po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>radacomo um instrumento central no planejamento, pelo Estado, sempre emassociação com o setor privado, <strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>de</strong><strong>inovação</strong>. A redução do hiato tecnológico e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do Brasil em relaçãoaos países industrializados e a alguns outros emergentes – entre os quais<strong>de</strong>sponta a China em particular – <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá da capacida<strong>de</strong> negociadorabrasileira <strong>de</strong> atrair investimentos e <strong>de</strong> criar condições para a transferência eabsorção <strong>de</strong> novas tecnologias para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>nacional</strong>.Tal exige, <strong>de</strong> sua parte, que Governo, centros <strong>de</strong> P&D,universida<strong>de</strong>s e empresas tenham segurança e clareza quanto aopatamar produtivo-tecnológico que o País almeja alcançar e à posiçãoque <strong>de</strong>seja ocupar na divisão inter<strong>nacional</strong> do trabalho. Para tanto, não sealcançará o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> se o Governo não interagir dinamicamentecom as universida<strong>de</strong>s e empresas <strong>de</strong> modo geral, criando condiçõesótimas para a transferência do conhecimento, tácito e codificado, paraas linhas <strong>de</strong> produção. Da mesma forma, as empresas <strong>de</strong>vem dispor <strong>de</strong>condições crescentemente favoráveis para absorver o conhecimentogerado pelas universida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong> pesquisa. Para tornar esse cenárioainda mais complexo, o padrão <strong>de</strong> produção do conhecimento pela ciência<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ter o cientista e o laboratório <strong>nacional</strong> como referência para sesituar hoje em dia em re<strong>de</strong>s internacionais <strong>de</strong> pesquisa e em laboratórioscompartilhados por equipes internacionais e multidisciplinares. Essepadrão foi <strong>de</strong>safiado ainda pela impossibilida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>corrente da própriaglobalização, <strong>de</strong> o conhecimento ser mantido guardado a sete chaves,inacessível a grupos <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> qualquer parte do mundo. Nessesnovos cenários e situações, a diplomacia da <strong>inovação</strong> (acadêmica,empresarial e, sobretudo, governamental, exercida prioritária, embora nãoexclusivamente, pelo Itamaraty, nos tempos atuais) passou a representaruma contribuição indispensável, ainda que claramente insuficiente, paraa formulação e execução <strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.Para a elaboração <strong>de</strong>ste trabalho, beneficiei-me do apoio e daatenção <strong>de</strong> diversas pessoas, grupos <strong>de</strong> trabalho, órgãos governamentais20<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 20 10/10/2011 14:15:37


apresentação e agra<strong>de</strong>cimentose instituições públicas e privadas <strong>de</strong> pesquisa sobre <strong>inovação</strong>. NoUruguai, registro o acesso facilitado que tive à “Comisión Sectorial<strong>de</strong> Investigación Científica” (CSIC), da “Universidad <strong>de</strong> la República”(U<strong>de</strong>laR), por intermédio da sua Diretora, Doutora Judith Sutz, ela própriauma das mais <strong>de</strong>stacadas especialistas em <strong>inovação</strong>, com amplo trânsitointer<strong>nacional</strong>, distinção que compartilha com seu marido, o ProfessorRodrigo Arocena, Reitor da U<strong>de</strong>laR, com quem também tive o prazer<strong>de</strong> entabular proveitosas conversas em torno do objeto da pesquisaque resultou neste livro. Também na CSIC, <strong>de</strong>sfrutei da amiza<strong>de</strong> e daatenção <strong>de</strong> outro pesquisador <strong>de</strong> escol, Carlos Bianchi, recém-regressadoao Uruguai do Instituto <strong>de</strong> Economia da UFRJ, que leu artigos <strong>de</strong>minha autoria sobre o tema e me proveu com insights inspiradores,particularmente no tocante à relação entre instituições públicas, estruturaindustrial e condições macroeconômicas para a <strong>inovação</strong>. Ainda noUruguai, tive sempre acesso facilitado, solidário e dos mais prestativosa Professores como José Manuel Quijano, ex-Diretor da Secretaria doMercosul, e Daniel Rótulo, da Universida<strong>de</strong> ORT. Com o primeirocoorganizei um seminário sobre políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Mercosul,que gerou aportes e elementos para este trabalho e que, <strong>de</strong> certa forma,suscitou paixões entre distintas correntes teóricas e políticas que nele sefizeram representar.Antes <strong>de</strong> me transferir <strong>de</strong> volta a Brasília, contei com o frutíferointercâmbio <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias com o Coor<strong>de</strong>nador-geral <strong>de</strong> Serviços Tecnológicosdo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Reinaldo Ferraz, queme forneceu a perspectiva <strong>de</strong> um dos principais, senão o principal atordo <strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, quanto aos <strong>de</strong>safios <strong>de</strong> implementarpolíticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> a partir <strong>de</strong> trajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência renitentesna evolução econômico-produtiva do Brasil. O Secretário-Executivodo agora Ministério da Ciência,Tecnologia e Inovação (MCTI), DoutorLuiz Antonio Rodrigues Elias, foi sempre muito generoso e solícitonas oportunida<strong>de</strong>s que tive <strong>de</strong> tratar com ele sobre temas que constam<strong>de</strong>ste livro. Aprendi e tenho aprendido muito com ele. Os ProfessoresJosé Eduardo Cassiolato e Helena Lastres, assim como Carlos Henrique<strong>de</strong> Brito Cruz e José Américo da Motta Pacheco, escutaram paciente eatentamente, em distintas ocasiões, sobre minhas incursões no campoda diplomacia da <strong>inovação</strong>, sugerindo ajustes e testando a coerência, aeficácia e a operacionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alguns dos seus elementos essenciais.21<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 21 10/10/2011 14:15:37


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorDo Centro <strong>de</strong> Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), Lúcia Melo muitocontribuiu para o aprimoramento <strong>de</strong> alguns dos argumentos do capítulosobre a China, e Damian Popolo, do Consulado britânico em SãoPaulo, foi um dos mais instigantes interlocutores que tive no processo<strong>de</strong> elaboração <strong>de</strong>ste trabalho, em todas as suas vertentes e capítulos.Também muito aprendi sobre políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, a partir da ótica dosetor empresarial privado brasileiro – que é sobre quem <strong>de</strong>ve recair aresponsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> última instância <strong>de</strong> inovar – com Flávio Grynszpane com distintos diretores, funcionários e formuladores <strong>de</strong> política daAgência Brasileira <strong>de</strong> Desenvolvimento Industrial (ABDI), entida<strong>de</strong>que agra<strong>de</strong>ço na pessoa <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus mais argutos analistas, o DoutorRoberto Alvarez, Gerente <strong>de</strong> Assuntos Internacionais. A todos eles, quecontribuíram em maior ou menor grau, em caráter mais direto ou indireto,mediato ou imediato, para a elaboração <strong>de</strong>ste trabalho, meu profundo esincero agra<strong>de</strong>cimento.Naturalmente que um trabalho sobre diplomacia, qualquer que sejasua abordagem, não po<strong>de</strong>ria ser finalizado sem o concurso <strong>de</strong> colegas eamigos do Itamaraty, com quem tive a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> realizar intercâmbio<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias dos mais recompensadores, em torno <strong>de</strong> pressupostos teóricos,metodológicos e operacionais <strong>de</strong>ste trabalho. Entre os Embaixadores aquem ofereço um preito <strong>de</strong> gratidão por essa oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intercâmbioassomam, em primeiro lugar, André Amado e Hadil Vianna, meus Chefesna minha primeira fase <strong>de</strong> atuação como Chefe da Divisão <strong>de</strong> Ciência eTecnologia (DCTEC) do MRE. Ambos propiciaram-me a gran<strong>de</strong> ventura<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r buscar pôr em prática i<strong>de</strong>ias, princípios, conceitos, estratégiase orientações em gran<strong>de</strong> medida contidas nos capítulos a seguir. AndréAmado foi particularmente receptivo e pioneiro ao me encorajar aestabelecer o vínculo entre os brasileiros da área <strong>de</strong> ciência, tecnologiae <strong>inovação</strong> no exterior (o “braço estendido” do <strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong><strong>inovação</strong>) e os processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológicono Brasil, estratégia que abordo um tanto superficialmente no capítulofinal <strong>de</strong>ste livro, o que não faz justiça à riqueza dos <strong>de</strong>bates que viemos atravar sobre o tema. Os Embaixadores Luiz Alberto Figueiredo Machadoe Benedicto Fonseca renovaram esta confiança ao estimularem-me aempregar, na prática, sob sua orientação, o conceito-chave <strong>de</strong>ste trabalho<strong>de</strong> diplomacia da <strong>inovação</strong>. Agra<strong>de</strong>ço ainda a Edgard Telles Ribeiro,José Felício, João Batista Lanari, Alessandro Can<strong>de</strong>ias, Felipe Fortuna,22<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 22 10/10/2011 14:15:38


apresentação e agra<strong>de</strong>cimentosAdriano Pucci, Éverton Lucero e Benhur Viana por diálogos sobre otema que me ajudaram a elucidar dificulda<strong>de</strong>s específicas e pontuais dapesquisa, em diversos momentos <strong>de</strong> sua elaboração.Uma palavra especial <strong>de</strong> carinho e gratidão a minha bancaexaminadora no LIV CAE: a crítica absolutamente rigorosa, e às vezesdura, dos Embaixadores Ruy Pereira, que a presidiu, Paulo Cor<strong>de</strong>iro,Carlos Azevedo Pimentel, Luciano Macieira e João Gualberto MarquesPorto escoimaram este livro <strong>de</strong> muitas imprecisões e imperfeições queteriam subsistido caso não o tivessem lido com o gran<strong>de</strong> interesse,<strong>de</strong>dicação e esmero com que o fizeram. O longo, paciente e meticulosoexercício <strong>de</strong> arguição preparou-me para sustentar profissional eaca<strong>de</strong>micamente os pressupostos e hipóteses que o trabalho, ora entregueao público, preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar.O eventual valor que possa ser encontrado neste livro em muito <strong>de</strong>vea todas essas contribuições, que certamente não se esgotam nos nomesacima mencionados. Os não poucos problemas que <strong>de</strong>verão ser <strong>de</strong>tectados<strong>de</strong>vem ser atribuídos, no entanto, exclusivamente às limitações do autor.Como em outros agra<strong>de</strong>cimentos <strong>de</strong> minha trajetória acadêmica,este livro traz a perene inspiração <strong>de</strong> Luísa, Aguida e Agmar, agoraacrescida do incentivo e do companheirismo <strong>de</strong> meus amigos do Grupo<strong>de</strong> Pesquisa do Centro <strong>de</strong> Estudos da Cultura Contemporânea <strong>de</strong> SãoPaulo (CEDEC), os Professores Antônio Sérgio Carvalho Rocha(UNIFESP), Jefferson Goulart (UNESP), Eduardo Noronha (UFSCar),Cícero Araújo (USP), Andrei Koerner (Unicamp), Bernardo Ferreira(UERJ), Gilberto Bercovici (USP) e San Romanelli (USP). O grupotrouxe alento, inspiração e segurança para mim em momentos difíceisda elaboração <strong>de</strong>ste trabalho.23<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 23 10/10/2011 14:15:38


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IntroduçãoInovação e as transformações da economiamundialNo segundo semestre <strong>de</strong> 1986, a revista Foreign Affairs, do Conselho<strong>de</strong> Relações Internacionais (Council on Foreign Relations) dos EstadosUnidos publicou um curto artigo <strong>de</strong> Peter Drucker (Drucker, 1986)intitulado “As Transformações na Economia Mundial” (The changedworld economy), trabalho que gerou gran<strong>de</strong> repercussão inter<strong>nacional</strong>.A conjuntura econômica em que foi publicado era <strong>de</strong> estagnação naAmérica Latina, <strong>de</strong>saquecimento econômico na Europa e nos EUA,início do processo <strong>de</strong> incorporação da Ásia-Pacífico ao eixo dinâmicoda economia mundial e emergência dos novos países industrializados(NIC) 1 . Em essência, o artigo assentava as bases conceituais, teóricas eexplicativas da globalização econômica, fenômeno cujos contornos maissalientes só iriam se fixar na literatura acadêmica e no senso comum apartir da primeira meta<strong>de</strong> da década <strong>de</strong> 1990.A gran<strong>de</strong> transformação mundial observada por Drucker, quecorrespon<strong>de</strong> à passagem <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> econômico inter<strong>nacional</strong>para outro, residia no que viria a <strong>de</strong>finir como as “três <strong>de</strong>sconexões”da economia inter<strong>nacional</strong>: a) a dissociação do valor do produto daquantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> matéria-prima nele incorporada; b) a <strong>de</strong>sconexão daprodução industrial do trabalho industrial; e c) a dissociação entrecomércio e finanças no cenário global. Em termos ainda mais sintéticos,1Glossário <strong>de</strong> siglas e acrônimos constitui o Anexo 1.1 <strong>de</strong>ste trabalho.25<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 25 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorDrucker anunciava o advento da globalização pela passagem <strong>de</strong>finitiva,“estrutural” e irreversível, da macroeconomia do Estado-nação para amacroeconomia inter<strong>nacional</strong>.No tocante às duas primeiras <strong>de</strong>sconexões, o autor trabalhariaconceitos e i<strong>de</strong>ias em certa medida antes elaborados por teóricos do<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> no Brasil e na América Latina, notadamente daComissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL),tais como Celso Furtado (1966, 1992), Cardoso & Faletto (1970) eOsvaldo Sunkel (1978), entre muitos outros. Segundo esses autores,o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (como processo realizado nas economias centrais)seria uma função <strong>de</strong> duas novas realida<strong>de</strong>s: a) redução paulatina dopeso dos produtos primários nas pautas produtivas e exportadoras dospaíses, orientando uma nova divisão inter<strong>nacional</strong> do trabalho; e b) aconversão <strong>de</strong> economias industriais e exportadoras <strong>de</strong> commodities,após o fim da II Guerra Mundial, em economias <strong>de</strong> serviços, comparticipação <strong>de</strong>clinante no PIB dos setores primário e secundário. Emambas situações, tal transformação qualitativa operou-se em paísesque realizaram o duplo esforço tecnológico <strong>de</strong> mudar seu padrãoprodutivo e, consequentemente, alcançar novos patamares na divisãointer<strong>nacional</strong> do trabalho. Tal processo teria sido reproduzido, com asespecificida<strong>de</strong>s do caso, em países asiáticos <strong>de</strong> industrialização recentee em outras economias emergentes da Europa Oci<strong>de</strong>ntal, tais comoIrlanda, Espanha e Portugal, agora em sérias dificulda<strong>de</strong>s financeiras.O padrão <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong>ssas economias emergentes nãoseguiu, entretanto, uma trajetória unilinear que pu<strong>de</strong>sse ser livrementeimitada por outros países. Em alguns casos, como na China, a mudançaoperou-se por meio <strong>de</strong> ampla abertura econômica, promovida porDeng Xiaoping a partir <strong>de</strong> 1979, que possibilitou a entrada maciça <strong>de</strong>investimentos produtivos no país, a partir do acesso <strong>de</strong> multinacionaisao vasto mercado interno e à criação <strong>de</strong> plataformas <strong>de</strong> exportação(“Zonas Econômicas Especiais”) nas megacida<strong>de</strong>s do Mar da China.No caso da Espanha, o governo investiu pesadamente em infraestrutura<strong>de</strong> turismo e beneficiou-se <strong>de</strong> políticas comunitárias <strong>de</strong> redução <strong>de</strong>assimetrias nacionais e regionais. Irlanda e Taiwan <strong>de</strong>senvolveramvantagens competitivas específicas em indústrias <strong>de</strong> software,microprocessadores e microeletrônica – a partir <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> base<strong>de</strong> formação <strong>de</strong> técnicos e engenheiros no exterior, durante os anos 80.26<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 26 10/10/2011 14:15:38


introduçãoEm todos os casos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico recente, em quepese a heterogeneida<strong>de</strong> política, cultural e econômica das respectivasexperiências, um <strong>de</strong>nominador comum prevalecente é o da implementaçãoe articulação (a diferença entre esses dois termos é fundamental) <strong>de</strong>políticas nacionais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, em suas diversas vertentes: científica,tecnológica, setorial, <strong>de</strong> produtos e processos industriais, fornecimento<strong>de</strong> serviços, produção cultural, gestão, infraestrutura e logística, reformasinstitucionais e proposição <strong>de</strong> programas diferenciados <strong>de</strong> inclusão social.A hipótese <strong>de</strong> Drucker, a princípio confirmada por diversos exemplos,atestava que o caminho para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong>veria forçosamentepassar por duas estratégias complementares: reduzir a <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong>matérias-primas, como fator <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> capital, poupança interna,crescimento <strong>de</strong> renda e do produto <strong>nacional</strong>; e reduzir a participação doemprego industrial na população economicamente ativa, em proveito daampliação do setor <strong>de</strong> serviços (setor ao qual, em linhas gerais, estariaassociado o conceito <strong>de</strong> empregabilida<strong>de</strong>) na estrutura ocupacional dopaís. Em suma, o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong>correria da transformação do perfilprodutivo, variável mais importante e mais estável que a da formação<strong>de</strong> reservas e <strong>de</strong> estoque <strong>de</strong> poupança externa, por exemplo. Essatransformação consubstanciar-se-ia, em todos os casos, na passagem<strong>de</strong> uma economia pautada por vantagens comparativas clássicas parauma nova em que predominem vantagens competitivas dinâmicas. Taldinamismo viria a ser, por sua vez, uma função da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o paísou região gerar serviços e produtos novos, diferenciados e <strong>de</strong> crescentevalor agregado 2 .O impacto do artigo <strong>de</strong>veu-se, <strong>de</strong>ssa forma, à objetivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>suas formulações e à inexistência <strong>de</strong> contraprova <strong>de</strong> que processos <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tenham prescindido das duas características essenciaisque o autor assinalara para <strong>de</strong>screver as linhas-mestras do fenômeno daglobalização. Consoante o espírito dos anos 80, que passara a situar oconceito <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> como <strong>de</strong>terminante do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, diversosoutros estudos viriam a perscrutar as molduras institucionais, os fatoresmicroeconômicos e as condicionantes socioculturais da <strong>inovação</strong>. Entre2Diversos estudos subsequentes, como os realizados pela Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pesquisas em SistemasProdutivos e Inovativos Locais – Re<strong>de</strong>Sist, da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong> Janeiro –UFRJ, indicam que a agregação <strong>de</strong> valor ao produto e a criação <strong>de</strong> uma economia avançada <strong>de</strong>serviços não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> necessariamente <strong>de</strong> processos tecnológicos avançados nem pressupõe a<strong>de</strong>scaracterização <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s socioculturais locais.27<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 27 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junioresses textos, sobressaem-se os <strong>de</strong> Nelson (1988), Porter (1990), Lundvall(1992) e Freeman (1987, 1988 – ambos consistindo em dois estudos <strong>de</strong>caso pioneiros sobre o Japão – e 1990). No Brasil, embora a criação doConselho Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq(1950) –, do Fundo <strong>de</strong> Desenvolvimento Técnico-Científico – FUNTEC –,do antigo Banco Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Econômico – BNDE(1967) – e do Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT (1985) –,entre diversos outros órgãos e programas voltados para a capacitaçãoe <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico e tecnológico do país, atestasse umaconsciência <strong>nacional</strong> relativamente pioneira quanto aos vínculos entre<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico e avanço científico-tecnológico (ainda quenão necessariamente houvesse uma consciência entre aquele e o temada <strong>inovação</strong>), somente nos anos 90 apareceriam estudos e pesquisasmais sistemáticos sobre o tema, especialmente através <strong>de</strong> centros comoo Núcleo <strong>de</strong> Economia Industrial e da Tecnologia da Universida<strong>de</strong>Estadual <strong>de</strong> Campinas (NEIT – UNICAMP), o Departamento <strong>de</strong> PolíticaCientífica e Tecnológica (DPCT) do Instituto <strong>de</strong> Geografia, também daUNICAMP, e a Re<strong>de</strong>Sist-UFRJ.Diante da repercussão do artigo <strong>de</strong> Drucker, do êxito daseconomias dos países recém-industrializados da Ásia do Leste e doprestígio angariado por teses evolucionistas neo-schumpeterianasnaqueles países e em círculos acadêmicos crescentemente influentesno Oci<strong>de</strong>nte – as reformas econômicas no Japão pós-Segunda Guerrateriam sido inspiradas diretamente em fórmulas schumpeterianas <strong>de</strong>empreen<strong>de</strong>dorismo e <strong>inovação</strong> – ficou virtualmente assentada, nopensamento econômico não neoclássico (este ainda hegemônico),a convicção <strong>de</strong> que estratégias <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> requerem comocondição primordial mudanças <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>, <strong>de</strong> mentalida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> rotinasprodutivas estimuladoras da <strong>inovação</strong> e do avanço da tecnologia e daciência. Ainda que princípios <strong>de</strong> equilíbrio e <strong>de</strong> gestão macroeconômica(tais como estabilida<strong>de</strong> monetária, responsabilida<strong>de</strong> fiscal, aberturacomercial, respeito aos contratos e expansão das exportações) tenham-secristalizado no discurso, nas políticas, na legislação e nas instituiçõeseconômicas dos diversos países emergentes e sejam consi<strong>de</strong>rados pelosneoclássicos e partidários do Consenso <strong>de</strong> Washington como fatores<strong>de</strong> primeira or<strong>de</strong>m para a estabilida<strong>de</strong> e o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (fatoresque viriam a ser incorporados ao programa da economia política <strong>de</strong>28<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 28 10/10/2011 14:15:38


introduçãomaneira geral), os evolucionistas neo-schumpeterianos tratam essesfatores como variáveis necessárias, mas <strong>de</strong> modo algum suficientes paraa promoção do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. O diferencial da inserção competitivado país no cenário inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá, conforme sustenta a escolaevolucionista, da efetiva incorporação da agenda da <strong>inovação</strong> – aindaque esse termo seja frequentemente apresentado em uma acepção<strong>de</strong>masiadamente genérica – na prática e nas estratégias do governo edos diferentes agentes econômicos sobre os quais recai as tarefas <strong>de</strong>produção, prestação <strong>de</strong> serviços, recrutamento <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra e pesquisae <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (P&D), em suas diferentes etapas, setores, níveis emodalida<strong>de</strong>s.Brasil, China e Reino Unido: atores <strong>de</strong>siguais e assimétricos daglobalizaçãoSem elaborar em maior profundida<strong>de</strong> o caráter necessário eindispensável das trajetórias <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> 3 ,interessa-nos neste trabalho esquadrinhar as políticas e os fundamentosdos <strong>sistema</strong>s nacionais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (SNI) <strong>de</strong> três países: Brasil, Chinae Reino Unido, a partir da i<strong>de</strong>ntificação e análise do funcionamento <strong>de</strong>seus elementos componentes (“atores”), <strong>de</strong> seu histórico, instituições,nível produtivo, grau <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico,interativida<strong>de</strong> com <strong>de</strong>mais atores domésticos e internacionais,orientação político-econômica, limites e <strong>de</strong>sempenho. Como inexisteuma medida universal para i<strong>de</strong>ntificar as características <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong><strong>de</strong> <strong>inovação</strong> bem-sucedido ou em gestação (a <strong>de</strong>speito da existência<strong>de</strong> algumas pesquisas empíricas as quais citarei no transcurso dotrabalho), a análise <strong>de</strong> três <strong>sistema</strong>s muito diferentes entre si, e ao mesmotempo representativos <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>s socioeconômicas mais ou menoshomogêneas, po<strong>de</strong>rá trazer aportes úteis para a compreensão da dinâmicada <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> modo geral 4 .3Hipótese a que haviam chegado muito antes os dois maiores precursores do tratamento do temana literatura econômica, Marx (1974, ca<strong>de</strong>rno IV, e 1984, v. I, livro I, cap. XIII) e Schumpeter(1984 e, sobretudo, 1976).4Tal metodologia básica é a mesma empregada em projeto <strong>de</strong> pesquisa do “Observatório daInovação e da Competitivida<strong>de</strong>” do Instituto <strong>de</strong> Estudos Avançados da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> SãoPaulo – IEA/USP, intitulado “Metodologia para conceber e executar plano <strong>de</strong> mobilizaçãobrasileira pela <strong>inovação</strong> tecnológica” (MOBIT), que consiste em estudo comparado <strong>de</strong> políticas29<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 29 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorPara tanto, será indispensável percorrer, ainda que superficialmente,os principais marcos histórico-jurídico-institucionais da formação dos<strong>sistema</strong>s, procedimento necessário para a vinculação correta entre asexigências dinâmicas e cambiantes da cena econômica inter<strong>nacional</strong> e asrespostas a esses <strong>de</strong>safios apresentadas por autorida<strong>de</strong>s governamentais,aca<strong>de</strong>mia e setor produtivo dos três países. A partir <strong>de</strong>ssa i<strong>de</strong>ntificação,buscar-se-á analisar as estratégias atuais dos respectivos governos parao fortalecimento dos seus <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. No caso brasileiro,interessará particularmente analisar as diretrizes do Plano <strong>de</strong> Ação <strong>de</strong>Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional(PACTI), adotado pelo MCT em novembro <strong>de</strong> 2007 (também <strong>de</strong>nominadoPrograma <strong>de</strong> Aceleração do Crescimento – PAC da Ciência e Tecnologia),do seu sucedâneo para 2011-2014 e reconstruir algumas das críticas eanálises formuladas pela comunida<strong>de</strong> brasileira <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia eInovação (C,T&I) atinentes às estratégias e objetivos do primeiro Plano,sobretudo em áreas como C&T e política industrial.Importará especialmente neste trabalho avaliar o papel que cabee <strong>de</strong>sempenha o Itamaraty no Sistema Brasileiro <strong>de</strong> Inovação (SNB),por intermédio <strong>de</strong> Departamentos e Agências como o Departamento <strong>de</strong>Temas Científicos e Tecnológicos (DCT), <strong>de</strong> Promoção Comercial (DPR)e o <strong>de</strong> Comunida<strong>de</strong>s Brasileiras no Exterior (DCB) 5 . Ao adotar nestetrabalho a perspectiva dos estudos <strong>de</strong> globalização (Drucker, 1986, Hel<strong>de</strong>t al., 2000, cap. 3 a 5, Stiglitz, 2006, Dehesa, 2006 e Ianni, 2002, entreoutros) relativos à liberalização, articulação e integração progressiva dosmercados mundiais e da interconexão das re<strong>de</strong>s financeiras e comerciaisglobais, per<strong>de</strong> força metodológica, heurística e explicativa o conceitoe <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> Canadá, Estados Unidos, Finlândia, França, Irlanda, Japão e ReinoUnido. O presente trabalho diferencia-se do projeto MOBIT, entre diversos aspectos, pelo escopogeográfico e temático mais limitado (Brasil, China e Reino Unido) e por sua ênfase operacional noconceito <strong>de</strong> “diplomacia da <strong>inovação</strong>”, que ressalta o papel do setor externo dos governos e setoresprodutivos dos três países na formulação e implementação <strong>de</strong> políticas e agendas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.5Não tratarei neste trabalho do <strong>de</strong>stacado papel no tratamento da <strong>inovação</strong> assumido por Divisõescomo a <strong>de</strong> Proprieda<strong>de</strong> Intelectual (DIPI) e a <strong>de</strong> Desarmamento e Tecnologias Sensíveis (DDS),uma vez que tal opção engendraria necessariamente estudo mais aprofundado sobre os regimesinternacionais <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> intelectual e <strong>de</strong> não proliferação, objeto <strong>de</strong> trabalhos específicosno Brasil e no exterior, e mesmo no âmbito do Curso <strong>de</strong> Altos Estudos do MRE (CAE). Nãoobstante a contribuição primordial <strong>de</strong> tais setores para os estudos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, será posta ênfaseantes em aspectos sistêmicos estruturais dos SNI, e não nos seus sub<strong>sistema</strong>s.30<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 30 10/10/2011 14:15:38


introdução<strong>de</strong> <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> 6 . Comércio inter<strong>nacional</strong> fortementecaracterizado por fluxos intrafirma, extrema mobilida<strong>de</strong> financeira emonetária, <strong>de</strong>slocamento espacial dinâmico <strong>de</strong> investimentos produtivos,transferência <strong>de</strong> ciclos econômicos <strong>de</strong> economias nacionais maiores paraoutras menores, migrações e diáspora <strong>de</strong> cérebros, instantaneida<strong>de</strong> dascomunicações, entre diversos outros possíveis elementos constitutivosda globalização econômica, indicariam a perda relativa <strong>de</strong> influência dosgovernos para administrar plenamente suas agendas macroeconômicas.Essa perda <strong>de</strong> controle sobre as políticas econômicas não po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>ixar<strong>de</strong> expor <strong>de</strong>cisões relativas ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico e tecnológico e àformulação <strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> aos ciclos e sobressaltos da economiainter<strong>nacional</strong> como um todo. Desse modo, e no caso do fortalecimentodo SNB, o Itamaraty <strong>de</strong>ve ocupar papel <strong>de</strong> relevo na constituição e atémesmo na operação do <strong>sistema</strong>, a exemplo do que ocorre nas Chancelarias<strong>de</strong> outros países, sobretudo europeus e alguns asiáticos, como o Japão.Ainda que haja profusão <strong>de</strong> exemplos concretos <strong>de</strong> como oMinistério atuou no sentido <strong>de</strong> promover transferência <strong>de</strong> tecnologia,direta (po<strong>de</strong>-se citar a cooperação que engendrou o lançamentodo “Satélite sino-brasileiro <strong>de</strong> recursos terrestres” – CBERS) ouindiretamente (a atuação na OMC para o licenciamento <strong>de</strong> patentes<strong>de</strong> medicamentos <strong>de</strong> uso contínuo, por exemplo), operando, <strong>de</strong>ssemodo, no núcleo substantivo formador do SNB, há elementos queindicam que essa atuação respon<strong>de</strong> antes a iniciativas específicas,focalizadas e/ou provocadas, do que a uma visão propositiva eestratégica <strong>de</strong> fortalecimento do <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> C,T&I. Talatuação mais propositiva ajudaria a i<strong>de</strong>ntificar e antecipar tendências<strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico e <strong>de</strong> acompanhamento sistemáticodas práticas que conformam o funcionamento do SNI <strong>de</strong> outros países 7 .Dessa forma, o papel do Itamaraty no SNB po<strong>de</strong> ser substancialmenteampliado, à luz <strong>de</strong> dois argumentos fundamentais: a) a crescente6Carlsson et al. (p. 234, 2002) ressaltam que “a transferência <strong>de</strong> tecnologia po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>radacomo a ativida<strong>de</strong> central <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>”, o que o torna largamente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>fatores e condições supradomésticos e, portanto, diplomáticos, <strong>de</strong> negociação.7Vale mencionar, nesse aspecto, a discreta participação do Itamaraty em órgãos como o ConselhoNacional <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia (CCT), que em suas reuniões – por sua vez muito espaçadas einfrequentes – nem sempre tem contado com representante do Ministério (embora tal participaçãoesteja prevista na Lei nº 9.257/96), e sua virtual ausência em programas como o PACTI – Apoioà Capacitação Tecnológica da Indústria, do MCT.31<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 31 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorinter<strong>nacional</strong>ização das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> C,T&I e a necessida<strong>de</strong>correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> haver um órgão informador e catalisador da ofertae da disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviços e <strong>de</strong> conhecimento nessas áreas, emescala global; e b) o fato <strong>de</strong> o Ministério ser as “antenas sensíveis”(a expressão é <strong>de</strong> Gilberto Amado) do país no exterior. O MRE po<strong>de</strong>ria,<strong>de</strong>ssa forma, esten<strong>de</strong>r ainda mais sua interconexão com os <strong>de</strong>mais atoresdo SNB, na Esplanada dos Ministérios e além <strong>de</strong>la, coor<strong>de</strong>nação quereconhecidamente se situa em patamar aquém do i<strong>de</strong>al.De fato, crítica recorrente que permeia a literatura brasileira <strong>de</strong> C,T&Ié a notória <strong>de</strong>sarticulação entre os segmentos constitutivos do <strong>sistema</strong>,tanto públicos quanto privados (Caldas et al., p. 52, Arbix, 2001; p. 56,Nasser, 2007; p. 1393, 2005), o que resulta em superposição <strong>de</strong> iniciativase competências, vazios institucionais e consequente subaproveitamento<strong>de</strong> programas e recursos. O Itamaraty – e particularmente o DCT, o DCBe o DPR –, por sua especificida<strong>de</strong> <strong>de</strong> facilitar a interação e a conectivida<strong>de</strong>entre entida<strong>de</strong>s e comunida<strong>de</strong>s brasileiras e estrangeiras, no Brasil eno exterior, po<strong>de</strong>ria abraçar novas e <strong>de</strong>cisivas responsabilida<strong>de</strong>s emprogramas <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> tecnologia e <strong>de</strong> conhecimento, além dasatribuições clássicas no campo da cooperação inter<strong>nacional</strong>, e levando-seplenamente em conta as regras e regimes <strong>de</strong> comércio inter<strong>nacional</strong> e<strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> industrial e intelectual.Visto isso, <strong>de</strong>ve-se dizer que o trabalho não tem a pretensão <strong>de</strong>explorar as diversas formas e modalida<strong>de</strong>s possíveis pelas quais oMRE po<strong>de</strong> atuar, em coor<strong>de</strong>nação com o MCT e com o Ministériodo Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), entreoutros, para fortalecer e amalgamar o SNB, mas somente firmarcaminhos mais evi<strong>de</strong>ntes pelos quais sua posição no <strong>sistema</strong> <strong>de</strong>veráser inevitavelmente fortalecida. O trabalho não aspirará, a<strong>de</strong>mais,formular recomendações elaboradas e minuciosas <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong>C,T&I para o Ministério, embora pretenda, mais mo<strong>de</strong>stamente,indicar o emprego <strong>de</strong> procedimentos e rotinas que ampliem eaprimorem o programa <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> uma Divisão como a <strong>de</strong>Ciência e Tecnologia (DCTEC). Po<strong>de</strong>-se <strong>de</strong>ixar já consignado,nesse sentido, os imperativos <strong>de</strong> estreitar os vínculos e a articulaçãoentre o DCT, o DPR e o DCB e <strong>de</strong> aprofundar a interação existenteda DCTEC com os <strong>de</strong>mais órgãos integrantes do SNB, tanto emtermos horizontais quanto verticais. É <strong>de</strong> se esperar, <strong>de</strong>sse modo,32<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 32 10/10/2011 14:15:38


introduçãoque a área do Ministério com responsabilida<strong>de</strong>s diretas sobre otema da <strong>inovação</strong> disponha <strong>de</strong> flexibilida<strong>de</strong>, iniciativa e recursosparaperceber as transformações do seu meio, perceber seletivamente as <strong>de</strong>mandasexternas e implementar ações que respondam a essas <strong>de</strong>mandas. Essa lógica,mais do que dotar a instituição <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> resposta, <strong>de</strong>ve principalmentecriar rotinas <strong>de</strong> busca, ou seja, mecanismos institucionais <strong>de</strong> permanente vigíliados horizontes científicos e das oportunida<strong>de</strong>s tecnológicas (Fuck & Bonacelli,p. 127, 2008).O trabalho buscará, assim (mormente nos capítulos II e VI), trazer àdiscussão aportes adicionais e complementares que permitam ao MREintensificar sua interação com elementos componentes do SNB e <strong>de</strong>outros <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, com potencial e abertura para, por sua vez,<strong>de</strong>senvolver e estimular nosso próprio <strong>sistema</strong>. Atenção à parte, aindaque <strong>de</strong> caráter introdutório, <strong>de</strong>verá ser conferida às possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>integração produtiva e científico-tecnológica com o entorno regionalsul-americano, particularmente com o Mercosul, tendo em vista osacordos aprovados nesse campo. Dessa forma, o Itamaraty atuaria emconformida<strong>de</strong> com sua função precípua, <strong>de</strong> forma ampliada e propositiva,<strong>de</strong> ser o elo facilitador entre políticas, experiências, projetos e instituições,no Brasil e no exterior, que constituem ou po<strong>de</strong>rão vir a constituir umavariada, multifacetada e não facilmente discernível re<strong>de</strong> <strong>nacional</strong> – <strong>de</strong>componentes supradomésticos – <strong>de</strong> C,T&I.Esse renovado papel que o Itamaraty po<strong>de</strong>rá assumir para apoiaro fortalecimento do SNB encontra paralelo em Chancelarias <strong>de</strong> outrospaíses, mormente os industrializados, mas também – em menor escala – <strong>de</strong>países emergentes como Índia, África do Sul, Argentina, México e Peru,para citar alguns casos, com graus bastante heterogêneos <strong>de</strong> intervenção,recursos, articulação e apoio aos respectivos <strong>sistema</strong>s nacionais. Há casosem que, embora o <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> correspon<strong>de</strong>nte se encontre em estadoincipiente ou mesmo embrionário (sem tentar <strong>de</strong>finir o que significamesses adjetivos), a Chancelaria <strong>de</strong>sempenha papel ativo e <strong>de</strong>sproporcionalpara o seu fortalecimento ou constituição, como é o caso do Torre Tagleno Peru. Há outros em que, ao contrário, o <strong>sistema</strong> exibe consi<strong>de</strong>rávelorganização e articulação, mas a Chancelaria opera pouco, informalmente33<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 33 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniore sem responsabilida<strong>de</strong> funcional direta no processo, como é o caso doTlatelolco no México. Nesse último caso, trata-se <strong>de</strong> país emergentecom <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> relativamente maduro, mas cuja Chancelariaainda não <strong>de</strong>senvolveu todo o seu potencial <strong>de</strong> apoio à consolidação do<strong>sistema</strong>. Em grau um pouco mais <strong>de</strong>senvolvido e articulado, seria essa aposição que ocuparia o Itamaraty em relação ao funcionamento do SNB.A parte mais sistemática e empírica do trabalho estará apoiadano estudo <strong>de</strong> dois <strong>sistema</strong>s nacionais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, China e ReinoUnido, com enfoque, neste caso, no papel ocupado pelo Foreign andCommonwealth Office (FCO) e pelas principais agências e entida<strong>de</strong>sque constituem o <strong>sistema</strong> britânico <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (SBI); no outro, trata-se<strong>de</strong> <strong>de</strong>screver e analisar o <strong>sistema</strong> da China a partir <strong>de</strong> suas inúmerasorganizações funcionalmente especializadas, forçadas a competir entresi sob a supervisão estratégica algo <strong>de</strong>scentralizada <strong>de</strong> parte do Conselho<strong>de</strong> Estado e <strong>de</strong> órgãos subordinados como o Ministério da Ciência eTecnologia (MOST) (Liu & White, pp. 1097-1099, 2001) 8 . A escolha dosexemplos <strong>de</strong> China e Reino Unido para compor este trabalho resi<strong>de</strong> numadupla justificativa 9 : ambos contam, por motivos diferentes, com <strong>sistema</strong>smais articulados, estruturados e <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho “superior” ao brasileiro,conforme critérios quantitativos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho (exportação <strong>de</strong> bens eserviços <strong>de</strong> maior valor agregado e <strong>de</strong> elevado conteúdo tecnológico,capacitação profissional nas áreas <strong>de</strong> engenharia e matemáticas, dispêndio8A aparente contradição entre uma estrutura política centralizada e fechada e um processo<strong>de</strong>cisório político-administrativo <strong>de</strong>scentralizado e aberto ao mercado, também em temas <strong>de</strong><strong>inovação</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico, foi apodada por Lieberthal, pp. 179-180,1995) <strong>de</strong> “autoritarismo fragmentado”.9O termo “exemplo” é aqui mais a<strong>de</strong>quado que estudos <strong>de</strong> caso por não ter este trabalhoa pretensão <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r ou comprovar hipóteses específicas atinentes ao funcionamento dos<strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> ambos países (ou dos três, se consi<strong>de</strong>rarmos o Brasil). Em termosmetodológicos, trata-se mais <strong>de</strong> realizar um levantamento e recenseamento das característicasmais salientes <strong>de</strong>sses <strong>sistema</strong>s, <strong>de</strong> modo a i<strong>de</strong>ntificar e a <strong>de</strong>screver suas especificida<strong>de</strong>s e cotejá-lascom as políticas, práticas e instituições adotadas em outros <strong>sistema</strong>s. A partir <strong>de</strong>ssa verificaçãoinicial <strong>de</strong> práticas e <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> conceitos aplicáveis às três realida<strong>de</strong>s, o trabalho <strong>de</strong>veráextrair algumas experiências <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> para o SNB, sem preten<strong>de</strong>r que as práticas assimi<strong>de</strong>ntificadas sejam absolutamente mais a<strong>de</strong>quadas ou eficazes ou perfeitamente fungíveis paraa realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> outros países. O enfoque comparatista neste trabalho <strong>de</strong>para-se, assim, com limitesque o impe<strong>de</strong>m <strong>de</strong> transcen<strong>de</strong>r a perspectiva da abordagem institucional, <strong>de</strong> políticas públicas, <strong>de</strong>atores e processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Um estudo <strong>de</strong> caso exigiria, portanto, análise muito mais amplae contextualizada das condicionantes históricas, políticas, culturais e i<strong>de</strong>ológicas indispensáveisaos estudos mais completos sobre <strong>inovação</strong>, na perspetiva evolucionista e pós-schumpeterianaa que o tema (e também este trabalho) se filia.34<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 34 10/10/2011 14:15:38


introduçãogovernamental em níveis absoluto e relativo em C&T e da economiaem geral em programas <strong>de</strong> P&D, somente para citar alguns exemplos evariáveis). Não se justificaria, primeiramente, escolher como exemplospaíses cujos SNI tenham <strong>de</strong>sempenho marcadamente inferior ao brasileiro(com os quais se supõe teríamos menos a apren<strong>de</strong>r, embora essa suposiçãoseja <strong>de</strong> caráter mais heurístico do que um dado concreto e necessário darealida<strong>de</strong>); em segundo lugar, trata-se <strong>de</strong> países extremamente diferentesentre si, não só no que se refere à gestão e operação <strong>de</strong> seus <strong>sistema</strong>squanto no que tange às suas trajetórias históricas e econômicas 10 .De outra parte, o Reino Unido po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado <strong>de</strong>mocraciarepresentativa <strong>de</strong> grupo <strong>de</strong> países industrializados <strong>de</strong> elevado coeficiente<strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, po<strong>de</strong>ndo ser consi<strong>de</strong>rado até certo ponto como amostrada União Europeia e mesmo da Organização para a Cooperação eDesenvolvimento Econômico (OCDE). O Reino Unido é o país queconstruiu o primeiro <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do mundo, a partir <strong>de</strong> umarobusta estrutura industrial e <strong>de</strong> serviços, já na primeira meta<strong>de</strong> doséculo XIX, prosperida<strong>de</strong> que emulou o comportamento e o <strong>de</strong>sempenhoeconômico <strong>de</strong> diversos países, não somente do Oci<strong>de</strong>nte. Essa realida<strong>de</strong>econômica e social do país reflete com acuida<strong>de</strong> sua contribuição parao conhecimento e o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico e tecnológico, emperspectiva histórica e, nos dias <strong>de</strong> hoje, em escala global. Na medidaainda em que o país constitui um “tipo i<strong>de</strong>al” <strong>de</strong> funcionamento <strong>de</strong><strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no capitalismo avançado da era da globalização,trata-se <strong>de</strong> referência mais nítida para ajudar a compreen<strong>de</strong>r o tipo <strong>de</strong>SNB que po<strong>de</strong>mos erigir, tanto em termos das instituições e práticasque po<strong>de</strong>rão ser aproveitadas quanto das experiências que terão <strong>de</strong> ser<strong>de</strong>scartadas. No caso da China, po<strong>de</strong>ria haver mais pontos e práticas aserem aproveitados, dadas a semelhança <strong>de</strong> sua trajetória histórica coma brasileira e sua condição <strong>de</strong> maior país emergente, categoria da qualtambém participamos.A função proeminente do FCO no <strong>sistema</strong> britânico tambémrepresenta aporte <strong>de</strong> primeira or<strong>de</strong>m para orientar um papel reforçadoe ampliado que o Itamaraty po<strong>de</strong>rá vir a assumir em nosso próprio<strong>sistema</strong>. Ainda em relação ao Reino Unido, argumente-se que, por serum país territorialmente pequeno, com alta intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s10Vale lembrar a condição chinesa <strong>de</strong> ex-colônia britânica, o que introduziria uma dimensãomais complexa à caracterização <strong>de</strong> seu SNI.35<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 35 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>de</strong> C,T&I, distribuídas <strong>de</strong> modo relativamente homogêneo por todo oarquipélago, torna-se mais fácil visualizar a operação dos distintos evariados componentes que <strong>de</strong>finem o <strong>sistema</strong>, numa re<strong>de</strong> em que todas aspartes constituem conexões importantes e nenhuma assume protagonismo<strong>de</strong>smesurado em relação às <strong>de</strong>mais 11 .O exemplo chinês é igualmente útil, representativo e instigante,por motivos bastante diversos. Se o país é conhecido por ter sido palcodas gran<strong>de</strong>s invenções da antiguida<strong>de</strong> – pólvora, papel, porcelana,compasso, entre outros (para não se mencionar, num toque anedótico, osorvete) – por outro lado cultivou, ao longo dos séculos, uma imagem<strong>de</strong> isolamento e <strong>de</strong>sconfiança em relação ao Oci<strong>de</strong>nte, imagem essa queveio a ser simbolicamente rompida com a histórica visita <strong>de</strong> RichardNixon a Pequim, em fevereiro <strong>de</strong> 1972 12 . Nesse aspecto, a experiênciahistórica chinesa é perfeitamente antitética à britânica.O fim do isolamento chinês e o princípio das reformas capitalistasna China, a partir <strong>de</strong> 1979 (Yier, 1984), indicam o caráter emblemáticoda <strong>inovação</strong> para a transformação radical do perfil econômico-produtivodo país mais populoso do mundo, num espaço <strong>de</strong> apenas duas ou trêsdécadas. A passagem <strong>de</strong> uma economia rural, atrasada, <strong>de</strong> subsistência,para uma outra caracterizada por exportações cuja terça parte é composta<strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alto valor tecnológico (OCDE/MOST-China, p. 10,2007), que correspon<strong>de</strong> à segunda maior capacida<strong>de</strong> produtiva mundial<strong>de</strong> conteúdo tecnológico (Porter et al., p. 16, 2008), respon<strong>de</strong> por 6%dos artigos científicos publicados em revistas in<strong>de</strong>xadas e apresenta omaior índice médio <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> patentes em todo omundo (OCDE, p. 185, 2008), constitui um sofisticado laboratório <strong>de</strong>acompanhamento <strong>de</strong> políticas indutoras <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.Desse modo, o estudo mais sistemático – ainda que sem o <strong>de</strong>vidoaprofundamento – das características e evolução do <strong>sistema</strong> chinês <strong>de</strong><strong>inovação</strong> po<strong>de</strong>rá fornecer elementos comparativos úteis e aproveitáveispara a formulação <strong>de</strong> políticas brasileiras nessa área. Ainda queespecificamente a Chancelaria chinesa tenha atuação e influência mais11O que não po<strong>de</strong>ria ser dito em relação ao Brasil, consi<strong>de</strong>rando o papel proeminente que algunslaboratórios científicos e empresas assumem no SNB.12Durante a “Revolução Cultural” <strong>de</strong> Mao Tsé-Tung, a China chegou a chamar para consultastodos os seus Embaixadores no exterior, mantendo plenamente operacional apenas a Embaixadano Cairo, o que seria mais uma evidência do isolamento do país nesse período (Amado, pp. 75e 79, 1984).36<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 36 10/10/2011 14:15:38


introduçãomo<strong>de</strong>sta e discreta que o FCO na formulação das políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>do país, sua “diplomacia da <strong>inovação</strong>”, conduzida <strong>de</strong> forma relativamente<strong>de</strong>scentralizada pelos incontáveis atores que constituem o <strong>sistema</strong>, po<strong>de</strong>indicar caminhos, mutatis mutandis, a serem observados e eventualmenteutilizados pelo Itamaraty.Também <strong>de</strong> forma diametralmente distinta do Reino Unido, a Chinapossui vastos população e território, caracterizados por profundas<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, diferenças e heterogeneida<strong>de</strong>s. Outras antinomiasem relação ao caso britânico seriam a pouca dispersão espacial dasativida<strong>de</strong>s inovadoras, gran<strong>de</strong>mente concentradas na costa Lestebanhada pelo Mar da China 13 , o ainda elevado centralismo <strong>de</strong>cisórioe, mais importante, o fato <strong>de</strong> todo o <strong>sistema</strong> ter sido constituído emintervalo <strong>de</strong> poucos anos. Enten<strong>de</strong>r corretamente como tal esforçofoi empreendido em curto espaço <strong>de</strong> tempo interessa diretamenteàs estratégias <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e à política externa brasileira,como instrumento <strong>de</strong> primeira or<strong>de</strong>m para alavancar programas <strong>de</strong>crescimento com inclusão social. Finalmente, um elemento essencialpara se estudar o <strong>sistema</strong> chinês <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – elemento que transcen<strong>de</strong>sua localização no próprio país – é o fato <strong>de</strong> o processo <strong>de</strong> expansãovertiginosa da economia chinesa haver sido – e continuar sendo –concomitantemente causa e consequência da globalização.Este trabalho está dividido em duas partes e seis capítulossubsequentes, além <strong>de</strong>sta introdução e diversos anexos. A primeira parte é<strong>de</strong> natureza mais teórica e conceitual, em que são apresentados elementosexplicativos e <strong>de</strong>finidores da <strong>inovação</strong> e apresentadas as linhas gerais dasprincipais escolas <strong>de</strong> pensamento econômico que buscam essencialmentedar uma feição operacional ao conceito. A primeira parte contempla aindaum segundo capítulo, que trata dos nexos entre <strong>inovação</strong> e globalizaçãonos contextos latino-americano, mercosulino e brasileiro em particular,com o qual já se vislumbram amplos espaços para a ação diplomáticaem processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico,em escalas regional e global (e mesmo <strong>nacional</strong>).O primeiro capítulo traz uma visão sintética e esquemática do estadoda arte da teoria da <strong>inovação</strong>, juntamente com uma rápida abordagem doselementos essenciais <strong>de</strong>finidores <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>,13As províncias <strong>de</strong> Pequim, Jiangsu, Shangai e Guangdong respon<strong>de</strong>m por 46,2% <strong>de</strong> toda apesquisa e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> realizada no país (OCDE, p. 25, 2001).37<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 37 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorexpressão que, como se verá, é problemática em seus três termoscomponentes. Tais dificulda<strong>de</strong>s não serão impedimento, conforme espero,para vislumbrar caminhos mais ou menos consensuais quanto aos rumosque o Brasil po<strong>de</strong>rá trilhar para construir e consolidar o seu próprio<strong>sistema</strong>. Também nessa rápida abordagem teórica, caberão algumasdigressões referentes à matriz metodológica da economia evolucionista,tradição que sustenta as análises, conceitos e mo<strong>de</strong>los explicativos dateoria da <strong>inovação</strong>. Esse capítulo mais propedêutico po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>radoessencial para o trabalho, na medida em que políticas e instituiçõesvoltadas para a <strong>inovação</strong> <strong>de</strong>vem obe<strong>de</strong>cer a uma certa lógica teórica,sistêmica e organizacional, não <strong>de</strong>vendo jamais, portanto, serem objeto<strong>de</strong> experimentação ou resultado <strong>de</strong> projetos voluntaristas (e ainda que nãose possa i<strong>de</strong>ntificar um mo<strong>de</strong>lo universal ou tipo i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> SNI para servir<strong>de</strong> referência aos <strong>de</strong>mais). Nesse capítulo inicial serão apresentadas ediscutidas as linhas gerais dos princípios formulados em textos clássicose <strong>de</strong> vanguarda da disciplina. Interessar-nos-á especialmente, nestaetapa, a assim chamada “visão do Sul” dos processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, talqual formulada em trabalhos como os <strong>de</strong> Arocena & Sutz (2000, 2005),Dagnino (2002), Cassiolato, Lastres & Maciel (2003) e Cassiolato etal. (2005).Na medida em que o tema está aberto a abordagens virtualmenteinesgotáveis (há, por exemplo, trabalhos acadêmicos sobre arranjosprodutivos locais na área <strong>de</strong> indústria cultural, com enfoque em temascomo o maracatu rural <strong>de</strong> Pernambuco, o carnaval da Bahia ou o Bumbameu Boi <strong>de</strong> Parintins), tratarei mais <strong>de</strong>tidamente apenas dos aspectosteóricos e institucionais que po<strong>de</strong>riam interessar mais diretamente àdiplomacia brasileira, como os fundamentos do mo<strong>de</strong>lo da “hélice tripla”<strong>de</strong> Etzkowitz & Ley<strong>de</strong>sdorff (1997, 2000), que propõe a integração <strong>de</strong>ações entre Governo, <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> ensino e pesquisa e setor produtivo,como alternativa ao mo<strong>de</strong>lo linear <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> prevalecente até a década<strong>de</strong> 1990. Além disso, dar-se-á ênfase à perspectiva institucionalista da<strong>inovação</strong>, relativa aos limites e possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> que dispõem os governospara formalizar políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> para C,T&I, com vistas àconstituição ou fortalecimento <strong>de</strong> um SNI. Questões como aprendizado(tácito e codificado), ambiente macroeconômico, expressões culturais,infraestrutura, aspectos logísticos e gerenciais, inserção inter<strong>nacional</strong> e,sobretudo, divisão dos custos e efetiva articulação entre as três pontas38<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 38 10/10/2011 14:15:38


introduçãoda “hélice tripla” ou do “Triângulo <strong>de</strong> Sábato” (1968) são consi<strong>de</strong>radosprimordiais para se ter em conta quando da formulação <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong><strong>inovação</strong>.No segundo capítulo serão aprofundados os nexos entre globalizaçãoe <strong>inovação</strong>, a partir da experiência e das trajetórias históricas eeconômicas latino-americanas, quando serão tratados com mais pormenoras dificulda<strong>de</strong>s enfrentadas por esses países para constituírem genuínos<strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. A razão para tratar da perspectiva continental antesda brasileira (objeto do terceiro capítulo, que inaugura a segunda partedo trabalho) é o fato <strong>de</strong> as dificulda<strong>de</strong>s históricas para a constituiçãodo SNB compartilharem raízes comuns com as <strong>de</strong> todos os países daregião. Além do tratamento <strong>de</strong>ssas causas comuns, o segundo capítuloabordará os problemas mais especificamente brasileiros no que tange aosnexos entre <strong>inovação</strong>, globalização e integração regional (passando pelasfases da Substituição <strong>de</strong> Importações, do assim chamado “Consenso <strong>de</strong>Washington” e do neo<strong>de</strong>senvolvimentismo dos dias atuais), alertando paraos riscos que a <strong>de</strong>mora em se alcançar patamares científico-tecnológicosmais elevados acarretam para as pretensões <strong>de</strong>senvolvimentistas dopaís e para as próximas gerações. O segundo capítulo incorporará,ainda, <strong>de</strong>scrição e sugestão <strong>de</strong> ações para o Itamaraty no campo da<strong>inovação</strong>, com impacto potencial e efetivo nas relações com seusvizinhos sul-americanos.A segunda parte, composta dos capítulos III a VI, dispensa maioresapresentações e está voltada para a <strong>de</strong>scrição e análise comparativaelementar do funcionamento dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> dos três paísesobjeto <strong>de</strong>ste estudo. O capítulo III será, <strong>de</strong>sse modo, <strong>de</strong>dicado à <strong>de</strong>scriçãosucinta do SNB, dos aspectos fundamentais <strong>de</strong> sua evolução – dosanos 50 até os dias <strong>de</strong> hoje – e <strong>de</strong>ter-se-á em duas questões <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>importância para o seu futuro nos próximos anos, sobretudo a primeira:a análise das novas políticas do Governo Fe<strong>de</strong>ral e do marco regulatóriopara a área <strong>de</strong> C,T&I (Lei da Inovação/2004, Lei do Bem/2005, PolíticaIndustrial, Tecnológica e <strong>de</strong> Comércio Exterior – PITCE e Plano <strong>de</strong> Ação2007-2010 do MCT [“PAC da Ciência e Tecnologia”, MCT, 2007]) ea proposta <strong>de</strong> que o Itamaraty venha a ter uma posição mais <strong>de</strong>stacadano <strong>sistema</strong>, a partir do acompanhamento sistemático e articulado – nosâmbitos doméstico e inter<strong>nacional</strong>, como um dos focos da vertentegovernamental do SNB – das ações, políticas, instituições, programas,39<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 39 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorprojetos e processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico--tecnológico no Continente sul-americano e em países e regiões <strong>de</strong> largatradição e vocação nessas áreas (ainda que a formulação <strong>de</strong> uma propostaacabe por quebrar o tom essencialmente <strong>de</strong>scritivo do capítulo). A análisedo caso brasileiro se completa no sexto e último capítulo, reservado paraa apresentação e o <strong>de</strong>lineamento mais específico da referida proposta,<strong>de</strong> múltiplas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> realização, que po<strong>de</strong>riam envolverdiretamente diversas áreas do Itamaraty.O quarto e quinto capítulos tratarão, respectivamente, dos SNIda China (SCI) e britânico (SBI). No caso da China, conforme antesassinalado, a característica mais marcante <strong>de</strong> seu <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> é adramática mudança <strong>de</strong> perfil a partir da reforma institucional <strong>de</strong> 1985, ou<strong>de</strong> alguns poucos anos antes, quando o Partido Comunista Chinês (PCC)transformou completa e radicalmente a estrutura produtiva do país. Emduas décadas, foram constituídos milhares <strong>de</strong> laboratórios <strong>de</strong> pesquisae <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> em empresas médias, gran<strong>de</strong>s e multinacionais; <strong>de</strong>1996 a 2007 o país passou <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> graduados por ano para quasequatro milhões; ultrapassou o Japão em número absoluto <strong>de</strong> cientistas com<strong>de</strong>dicação exclusiva (um milhão atuais, atrás apenas dos Estados Unidos).Em setores como formação e treinamento <strong>de</strong> cientistas e trabalhadoresqualificados, intensida<strong>de</strong> tecnológica da produção e das exportações,participação do setor <strong>de</strong> serviços e do setor privado – especialmente dasempresas multinacionais – formação do PIB, instalação <strong>de</strong> incubadoras<strong>de</strong> empresas <strong>de</strong> base tecnológica, criação <strong>de</strong> parques científicos (scienceparks), <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> patentes e financiamento à P&D, em termos públicose privados, entre diversos outros indicadores disponíveis (como, porexemplo, OCDE, 2006c), a China <strong>de</strong>sponta como o país que em menortempo (com um possível paralelo com a Irlanda, conforme Godoi, 2007)estruturou um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> baseado em vantagens comparativasdinâmicas e reveladas 14 .Impressionam especialmente os números que informam a cifra<strong>de</strong> US$ 281 bilhões (2006) <strong>de</strong> exportações <strong>de</strong> produtos chineses <strong>de</strong>elevado componente tecnológico, mais <strong>de</strong> cem vezes superior ao índice14Vantagens competitivas reveladas <strong>de</strong>signam a participação efetiva <strong>de</strong> um produto, empresa ousetor no mercado a partir <strong>de</strong> variáveis como preço, qualida<strong>de</strong>, certificação, processos <strong>de</strong> fabricaçãoe capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e diferenciação. Distingue-se da vantagem competitiva potencial, queexpressa a capacida<strong>de</strong> da empresa <strong>de</strong> tranformar insumos em produtos com máximo rendimento,indicando <strong>de</strong>sse modo sua capacida<strong>de</strong> técnica e gerencial.40<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 40 10/10/2011 14:15:38


introduçãoregistrado quinze anos antes, em 1991 (Cao, p. 02, 2008). Particularmenteimportante é o dado que indica, a partir da <strong>de</strong>composição dos fatores <strong>de</strong>crescimento econômico da China, um total <strong>de</strong>sequilíbrio da produçãoentre os três setores básicos da economia, com o <strong>de</strong> produtos e serviços<strong>de</strong> alto componente tecnológico expandindo-se a taxas superiores a 30%anuais, consi<strong>de</strong>rando os casos emblemáticos da nanotecnologia e datecnologia da informação e das comunicações (TIC).O capítulo sobre China não só <strong>sistema</strong>tizará o diagnóstico e aevolução do SCI como tratará dos <strong>de</strong>safios e obstáculos à manutençãodo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> baseado em estratégias <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Será <strong>de</strong>dicadaatenção especial ao Programa Estratégico para a Ciência e Tecnologia2006-2020 e a análise contextualizada <strong>de</strong> marcos recentes do <strong>sistema</strong>como a Lei <strong>de</strong> reconhecimento da proprieda<strong>de</strong> privada, <strong>de</strong> 1999, e a<strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> ingressar na OMC, em 2001. Aspectos fundamentais doprocesso <strong>de</strong> constituição do SCI a serem analisados no capítulo serãoainda a estratégia <strong>de</strong> aprendizagem e fixação <strong>de</strong> objetivos estratégicospara a área <strong>de</strong> C,T&I (com os programas e medidas correspon<strong>de</strong>ntes paraa instituição <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>), a partir da emulação – e muitas vezesda imitação direta – da experiência <strong>de</strong> outros países. Não seria por outrarazão que a maior preocupação hoje do governo é reforçar o conceito <strong>de</strong>economia da <strong>inovação</strong> baseada majoritariamente na produção científicae tecnológica doméstica.Além das características e elementos centrais antecipados acima,caberá abordar, no caso britânico (capítulo 5), o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong>scentralizado,autônomo e horizontal das entida<strong>de</strong>s públicas integrantes do <strong>sistema</strong>.Nesse capítulo, será fundamental compreen<strong>de</strong>r a relação singular entre osórgãos governamentais com responsabilida<strong>de</strong> primária pela formulaçãoda política científica, tecnológica e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do país (equivalentes, emconjunto, ao que seria um MCT britânico), mormente o Department forBusiness, Innovation and Skills (BIS, antigo Department for Innovation,Universities and Skills – DIUS) e os sete Conselhos <strong>de</strong> Pesquisa (ResearchCouncils). Estes últimos são encarregados <strong>de</strong> financiar a pesquisa básica,aplicada e o treinamento científico no Reino Unido, implementando umaagenda in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, mas concatenada com os objetivos governamentais<strong>de</strong> promoção da C,T&I. Nesse caso, a política científica no Reino Unido,e em gran<strong>de</strong> parte a tecnológica, são <strong>de</strong>finidas a partir <strong>de</strong> uma complexanegociação que envolve a área do conhecimento atinente a um Conselho41<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 41 10/10/2011 14:15:38


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorespecífico e as priorida<strong>de</strong>s fixadas pelos órgãos governamentais. Porconta do mecanismo <strong>de</strong> alocação <strong>de</strong> recursos diretamente dos Councilspara as diversas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> pesquisa, o perfil da C,T&I do país, emseu aspecto governamental, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> fundamentalmente das priorida<strong>de</strong>s<strong>de</strong>terminadas prima facie pela própria comunida<strong>de</strong> científica britânica.Os Research Councils acabam por atuar, <strong>de</strong> outra parte, <strong>de</strong> formasupletiva ao setor privado em P&D, ao promover o financiamento <strong>de</strong>pesquisas e áreas relegadas a segundo plano pelas empresas, mas que seafiguram como estratégicas para a manutenção ou ampliação dos níveis<strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong> do país.Atenção especial será dada ao Science and innovation investimentframework 2004-2014, que almeja expandir a atual taxa <strong>de</strong> investimentogovernamental em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> C,T&I dos atuais 1,9% anuais para 2,5%nos próximos anos (percentual insatisfatório para os britânicos, diante daperda <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> do país, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> meados da década <strong>de</strong> 90, frenteao Japão – que <strong>de</strong>stina 3,2% do seu PIB para essas ativida<strong>de</strong>s –, Alemanhae EUA – 2,6% – e França – 2,2% – OCDE, p. 02, 2005), assim como aoLivro Branco Innovation Nation, publicado em 2008 pelo antigo DIUS.Uma das razões estruturais do alto <strong>de</strong>sempenho, em níveis absolutos, doSBI – em termos <strong>de</strong> sustentação <strong>de</strong> uma economia <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> altaintensida<strong>de</strong> tecnológica, ou uma “economia impon<strong>de</strong>rável” (weightlesseconomy), conforme <strong>de</strong>finem alguns economistas (Quah, 1999) – <strong>de</strong>corredo equilíbrio entre as três vertentes do <strong>sistema</strong>, nas quais o setor privadocontribui com níveis <strong>de</strong> P&D superiores ao da média da União Europeia(OCDE, p. 02, 2005). Isto permite fazer com que esforços <strong>de</strong> pesquisa dasuniversida<strong>de</strong>s e programas governamentais potencializem-se mutuamente.As diretrizes <strong>de</strong> investimento para 2014 correspon<strong>de</strong>riam, assim, a um sinal<strong>de</strong> alerta ante as evidências <strong>de</strong> que a ação governamental se estaria tornandopaulatinamente <strong>de</strong>fasada em relação aos esforços <strong>de</strong>senvolvidos pelos<strong>de</strong>mais atores do <strong>sistema</strong> (<strong>de</strong>fasagem que ten<strong>de</strong> a se exacerbar no contexto<strong>de</strong> severa crise fiscal e contração <strong>de</strong> investimentos imposta pelo GabineteConservador). Outro aspecto a ser salientado no capítulo é o tradicional<strong>de</strong>sempenho do setor privado em áreas como ciências biológicas, novosmateriais, tecnologia da informação, cultura, entretenimento e serviços emgeral, como aspectos mo<strong>de</strong>ladores centrais do SBI.No sexto e último capítulo <strong>de</strong>scortina-se a hipótese, ainda <strong>de</strong> cunhoexploratório, <strong>de</strong> que caberia às Chancelarias em geral e ao MRE em42<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 42 10/10/2011 14:15:38


introduçãoparticular um papel proeminente na conformação e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> dosrespectivos SNI. O Itamaraty po<strong>de</strong>, nesse sentido, por intermédio do DCTe particularmente da DCTEC, aumentar sua contribuição para promovermaior interação entre os agentes e ajudar a fortalecer os mecanismos <strong>de</strong>articulação e operação do SNB. Como regra, a DCTEC opera em tan<strong>de</strong>mcom a área inter<strong>nacional</strong> do MCT e, em menor medida, com o MDIC, MEC,e com os Ministérios da Saú<strong>de</strong>, Defesa, Comunicações, Minas e Energiae Agricultura, <strong>de</strong> modo a auscultá-los sobre suas priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuaçãointer<strong>nacional</strong>, notadamente no que se refere a negociações <strong>de</strong> transferênciae licenciamento <strong>de</strong> tecnologia. O <strong>de</strong>safio proposto é fazer com que o DCTpossa atuar <strong>de</strong> forma mais propositiva, transcen<strong>de</strong>ndo o escopo básico eessencial dos acordos <strong>de</strong> cooperação e sugerindo programas e iniciativas(a partir <strong>de</strong> informações coligidas no âmbito do Sistema <strong>de</strong> informações emC&T no exterior – SICTEX, por exemplo) que possam ser <strong>de</strong> importânciacrítica para a gestão e avaliação <strong>de</strong> políticas governamentais <strong>de</strong> C,T&I epara o preenchimento <strong>de</strong> lacunas <strong>de</strong> conhecimento, produtos e processosessenciais à operação do SNB.É o Itamaraty quem ostenta, portanto, no Estado brasileiro e noâmbito do SNB, as melhores condições para conhecer a realida<strong>de</strong> edisponibilida<strong>de</strong>, não somente <strong>de</strong> cooperação, mas <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong>tecnologia e <strong>de</strong> apropriação <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> bem-sucedidasno exterior, mormente no quadro dos países da OCDE e das economiasemergentes. Preten<strong>de</strong>-se que o Itamaraty tenha condições <strong>de</strong> organizaruma ampla re<strong>de</strong> <strong>de</strong> cientistas, empresários e gestores da área <strong>de</strong> C,T&I noexterior, revertendo as <strong>de</strong>svantagens acarretadas pela diáspora brasileira epela “fuga <strong>de</strong> cérebros” em fator positivo <strong>de</strong> integração das experiênciasinternacionais para a orientação, financiamento, re<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> metas eestratégias, harmonização e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do SNB. A tarefa, como severá, é das mais <strong>de</strong>safiadoras, na medida em que pressupõe a mobilizaçãoda comunida<strong>de</strong> brasileira <strong>de</strong> C,T&I no exterior e o aprofundamento daarticulação do Ministério com os <strong>de</strong>mais atores do SNB. O Itamaratydispõe, no entanto, <strong>de</strong> vocação para o <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong>ssa tarefa, que passariapor uma importante expansão das tarefas e competências do SICTEX 15 .15Ressalte-se, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já, que uma atuação mais eficiente e efetiva dos SICTEX requereria aconstituição <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> observatórios <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do Brasil no exterior, nos mol<strong>de</strong>s, mutatismutandis, da Science and Innovation Network (SIN) britânica. Voltarei a esse ponto mais adiante,nos capítulos 5 e 6 infra.43<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 43 10/10/2011 14:15:39


Capítulo IInovação: métodos, conceitos e paradoxosA onda expansiva dos estudos sobre <strong>inovação</strong> coincidiu com a fase<strong>de</strong> turbulência da economia mundial dos anos 80, após os dois choquesdo petróleo e o choque da dívida das economias periféricas. A criseabalou os fundamentos <strong>de</strong> dois mo<strong>de</strong>los opostos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>: oneoclássico, baseado em teorias <strong>de</strong> equilíbrio geral, que em parte havialevado os países europeus oci<strong>de</strong>ntais à estagnação (a “euroesclerose” dosanos 70 e início dos anos 80) e o <strong>nacional</strong>-<strong>de</strong>senvolvimentista, articuladoem torno do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> importações na América Latina,em franco <strong>de</strong>clínio num momento em que a economia mundial passavapor transformações estruturais, tais como: emergência <strong>de</strong> novos atoreseconômicos, impacto <strong>de</strong> transações monetárias e financeiras em escalaglobal, perda <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong>, aumento exponencial do endividamentoexterno dos países em <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e recru<strong>de</strong>scimento dasreivindicações, <strong>de</strong> parte <strong>de</strong>sses países, por uma nova or<strong>de</strong>m econômicainter<strong>nacional</strong>.A abordagem das teorias da <strong>inovação</strong>, evolucionistas ouneo-schumpeterianas dos anos 80, contestavam os fundamentos<strong>de</strong> ambas escolas econômicas, por motivos diversos. No primeirocaso, o que estava em jogo era a concepção neoclássica <strong>de</strong> que aeconomia seria regida por variáveis estáticas, tais como taxas <strong>de</strong>lucro, acumulação, custo <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra, oferta <strong>de</strong> crédito, juros, livre45<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 45 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorconcorrência e, sobretudo, não regulamentação, ou regulamentaçãomínima e <strong>de</strong> caráter supletivo das ativida<strong>de</strong>s econômicas pelo Estado.Tais variáveis estáticas expressam-se em formulações quantitativas eaxiomáticas sobre os <strong>de</strong>terminantes do equilíbrio e da prosperida<strong>de</strong>econômica, o que pareceria notoriamente insuficiente aos teóricosevolucionistas.No caso da substituição <strong>de</strong> importações, as principais críticas(não formuladas diretamente, por haverem dialogado apenasescassamente com os cepalinos e estruturalistas latino-americanos– se é que tal diálogo chegou a ser entabulado) recaíram sobre ocaráter relativamente fechado dos <strong>sistema</strong>s econômicos dos países doContinente, cuja baixa exposição aos fluxos dinâmicos da economiainter<strong>nacional</strong> e da nascente globalização os <strong>de</strong>ixariam na condição <strong>de</strong>retardatários do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico. Sua estrutura produtiva,caracterizada por baixa concorrência, orientação para o mercadointerno (inward-oriented) e baseada em produtos estandardizados comescasso valor agregado, também contradizia os principais postuladosevolucionistas.Tal crítica ambi<strong>de</strong>stra, direcionada a neoclássicos e <strong>nacional</strong>--<strong>de</strong>senvolvimentistas, quer salientar o fato <strong>de</strong> que teorias <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>correspon<strong>de</strong>m prima facie a uma teoria do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>,aplicável tanto a países industrializados como emergentes, a regiõesou mesmo a cida<strong>de</strong>s ou áreas geográficas exíguas. Um primeiro eaparente paradoxo do evolucionismo – que ao final se transfiguraem elemento explicativo robusto – é a rejeição às variáveis fixas quecaracterizam as teorias neoclássicas ou marginalistas, assim comoà base metodológica do agente racional maximizador do lucro e darenda. Conforme atentaria um dos pioneiros e principais proponentesdo conceito <strong>de</strong> “<strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>”,Deve-se recordar que, quando o conceito foi formulado no começo da década <strong>de</strong>80, seguia sendo um princípio-padrão entre economistas e formuladores <strong>de</strong> políticaque reduzir salários médios nominais ou <strong>de</strong>svalorizar a moeda era o meio maisefetivo – quiçá o único – para promover a competitivida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong> das firmasdomésticas. A competitivida<strong>de</strong> não <strong>de</strong>terminada por fatores <strong>de</strong> preço [non-price]era consi<strong>de</strong>rada <strong>de</strong> importância marginal. Essa mudança [relativa aos novos fatores<strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong>] é importante na medida em que o conceito foi originariamente46<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 46 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxosproposto como uma resposta e uma reação crítica a tais concepções simplistas <strong>de</strong>competitivida<strong>de</strong> (Lundvall, p. 97, 2007) 16 .O aparente paradoxo levantado acima po<strong>de</strong> ser expresso da seguintemaneira: <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> leis econômicas rígidasou apenas quantificáveis em mo<strong>de</strong>los matemáticos para que alcancemestatuto <strong>de</strong> vali<strong>de</strong>z, contrariamente às teorias neoclássicas e aos mo<strong>de</strong>losexplicativos <strong>de</strong> fluxos comerciais e financeiros internacionais, porexemplo. Por outro lado, o termo teoria (incorporado ao instrumentalevolucionista) supõe o emprego <strong>de</strong> variáveis, conceitos e mo<strong>de</strong>losexplicativos para a sua vali<strong>de</strong>z. De fato, as numerosas <strong>de</strong>finições <strong>de</strong><strong>inovação</strong> são integradas por um léxico mais ou menos comum a todas elas,com nuances e diferenças <strong>de</strong> ênfase. Em praticamente todas as <strong>de</strong>finições,confere-se ênfase a aspectos mais qualitativos que quantitativos doconceito, relativos à interação e à difusão <strong>de</strong> conhecimento e processosprodutivos (Freeman, p. 01, 1987), ao arcabouço institucional e estruturaprodutiva (Lundvall, p. 10, 1992), assim como a “fatores culturais,sociais, políticos, econômicos, organizacionais e institucionais queinfluenciam o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, difusão e uso <strong>de</strong> inovações.” (Edquist,p. 14, 1997b). Definição mais sintética e que não exclui nenhum <strong>de</strong>ssestermos e enfoques é a <strong>de</strong> Balzat e Hanusch (p. 197, 2004):Sistema <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> po<strong>de</strong> ser percebido como um sub<strong>sistema</strong>historicamente construído da economia <strong>nacional</strong> no qual diversas organizaçõese instituições interagem e influenciam-se reciprocamente no processo <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s inovadoras.Outro aspecto saliente da <strong>de</strong>finição acima, que exprime umadimensão adicional do rompimento com a tradição neoclássica, é a“historicida<strong>de</strong>” do conceito, valor <strong>de</strong> suma importância para o argumento<strong>de</strong>ste trabalho (e para os esforços <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> realizados pelo Brasil,como pretendo sustentar), na medida em que experiências bem-sucedidas<strong>de</strong> amadurecimento da economia da <strong>inovação</strong> não são automaticamentetransplantáveis para outros países ou realida<strong>de</strong>s sociais (à luz justamente<strong>de</strong> suas especificida<strong>de</strong>s históricas), diferentemente dos postulados16As traduções <strong>de</strong> citações <strong>de</strong> texto em língua estrangeira são <strong>de</strong> minha responsabilida<strong>de</strong>, quandonão indicado em contrário.47<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 47 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junioreconômicos mais ortodoxos que reivindicam vali<strong>de</strong>z axiomática euniversal.Antes <strong>de</strong> prosseguir com a análise conceitual e epistemológica dos<strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, cabe um breve comentário quanto às bases teóricae metodológica sobre as quais o conceito foi erigido: além <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong>uma construção herdada diretamente da crítica schumpeteriana (conformea qual mo<strong>de</strong>los estáticos e ortodoxos seriam sacudidos pela figura doempreen<strong>de</strong>dor, que a partir <strong>de</strong> recombinações <strong>de</strong> processos e produtospo<strong>de</strong>ria alterar seguidamente os <strong>de</strong>mais fatores econômicos tais comopreço, remuneração, lucro, investimento, etc.) e, antes, da visão marxistada evolução do capitalismo, as teorias da <strong>inovação</strong> consistem em críticasavant la lettre aos postulados que viriam a ser consubstanciados noConsenso <strong>de</strong> Washington. Cristopher Freeman, em trabalho apresentadoem 1982 à OCDE, <strong>de</strong>fendia um papel <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque para as políticaspúblicas nos processos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>de</strong> superação das brechastecnológicas e <strong>de</strong> conhecimento (catch up), assim como a adoção <strong>de</strong> umanova perspectiva econômica, que i<strong>de</strong>ntificava a prevalência <strong>de</strong> processos<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e aprendizagem em experiências <strong>de</strong> crescimento e <strong>de</strong> criação<strong>de</strong> bem-estar. Tratava-se claramente <strong>de</strong> uma visão “paracepalina”, namedida em que, no caso latino-americano, exigiria uma resposta docontinente em termos <strong>de</strong> diversificação produtiva, adoção <strong>de</strong> novospadrões tecnológicos e reposicionamento na divisão inter<strong>nacional</strong>do trabalho, com vistas à construção <strong>de</strong> uma nova or<strong>de</strong>m econômicainter<strong>nacional</strong>.Na medida em que o conceito enfatiza aspectos intangíveis do<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, tais como o investimento nas pessoas, nas instituiçõese na criação <strong>de</strong> competências (competence building), torna-se clarotributário da teoria crítica na economia, que rejeita políticas <strong>de</strong>crescimento e <strong>de</strong> expansão da renda <strong>nacional</strong> baseadas em custos relativos<strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra e que pressupõe “(...) contextos marcados por certo nível<strong>de</strong> conflito em que ao menos um grupo social tem reivindicações legítimasa apresentar” (Mjøset, p. 43, 2005, apud Lundvall, p. 98, 2007).Outra característica metodológica das teorias <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> é suaconsanguinida<strong>de</strong> com as teorias econômicas evolucionistas, <strong>de</strong>rivadasdo cientificismo do século XIX que impregnava as ciências sociais.A metáfora mais difundida é a da “seleção natural” <strong>de</strong> instituiçõese agentes econômicos, em que estes, no caso e primordialmente as48<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 48 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxosfirmas, mantêm-se no mercado como consequência <strong>de</strong> sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong>suplantar os concorrentes. No caso das teorias da <strong>inovação</strong>, a metáforadarwinista ganhou força e atualida<strong>de</strong> com a interpretação complementar<strong>de</strong> que somente empresas que obtêm preço-prêmio por seu pioneirismo emdifundir novos produtos ou adotar novas técnicas ou processos gerenciais,produtivos ou organizacionais, teriam condições <strong>de</strong> se expandirem nomercado. Ou seja, somente unida<strong>de</strong>s econômicas capazes <strong>de</strong> inovarconstantemente, seja por pioneirismo <strong>de</strong> mercado ou por imitação dasempresas lí<strong>de</strong>res, teriam como se manter. Tal paralelo ganhou força ea<strong>de</strong>ptos entre os evolucionistas neo-schumpeterianos 17 com o <strong>de</strong>scréditogradual e correspon<strong>de</strong>nte das teorias neoclássicas baseadas em vantagenscomparativas estáticas e na cristalização da função e da produtivida<strong>de</strong>dos fatores e dos meios <strong>de</strong> produção nas economias capitalistas 18 . Namedida em que os neo-schumpeterianos (sobretudo Nelson & Winter,1982) vieram a consi<strong>de</strong>rar a tecnologia, o conhecimento e a <strong>inovação</strong>como fatores endógenos dos processos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, a metáforaorganicista (não adotada pelo próprio Schumpeter, que preferia uma linhaevolucionista mais “branda”, genérica e não transplantável do naturalismo<strong>de</strong> Darwin) tornou-se mais persuasiva. Isso porque os estudos econômicosforam então enriquecidos por uma dinâmica <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> maisvariada e sofisticada (ainda que não em termos estritamente formais <strong>de</strong>refutação e vali<strong>de</strong>z <strong>de</strong> hipóteses), em que diversos novos fatores, tais comocapital humano, social, político e natural, e suas interações entrecruzadasna dinâmica da “nova economia”, vieram a assumir importância crescentenas políticas contemporâneas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> 19 . Tal como na biologiaevolucionista, os organismos e práticas econômicas evoluiriam a partir<strong>de</strong> mutações incrementais, “fenotípicas”, cumulativas e adaptativas aomeio em que se situam. Na economia, fatores impon<strong>de</strong>ráveis e intangíveis<strong>de</strong>terminariam a evolução das instituições e das empresas e indicariamos rumos do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, num processo adaptativo e permanente17Reunidos, em gran<strong>de</strong> medida, em torno do Journal of Evolutionary Economics.18O argumento da seleção natural também se configura na base do argumento neoclássico, a partir<strong>de</strong> fatores diferenciados <strong>de</strong> preço e produto, sendo a competitivida<strong>de</strong> empresarial basicamente<strong>de</strong>terminada pelo primeiro, ao passo que, para os evolucionistas, o aspecto da seleção natural émais evi<strong>de</strong>nte a partir <strong>de</strong> critérios <strong>de</strong> diversificação e introdução <strong>de</strong> novos produtos e processos,com a variável preço sendo prepon<strong>de</strong>rante somente ex post.19Esse viria a ser o tema central da proposta <strong>de</strong> Joseph Stiglitz (1998) <strong>de</strong> ampliar os objetivose a agenda do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> na era pós-Consenso <strong>de</strong> Washington.49<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 49 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>de</strong> tentativa e erro das práticas mais aptas 20 . A fragilida<strong>de</strong> epistomológicabásica <strong>de</strong>ssa concepção, segundo críticos da linha mais conservadora,radicaria precisamente em sua pouca “cientificida<strong>de</strong>”, em sua escassacapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> generalizar, experimentar ou extrapolar.Tendo repassado alguns aspectos-chave conceituais e metodológicosda teoria da <strong>inovação</strong>, cabe agora tratar dos elementos essenciaisintegrantes da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> cada um dos termos da expressão “<strong>sistema</strong><strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>” (SNI). Tal análise contribuirá para a compreensãodas alternativas e das políticas públicas voltadas para a <strong>inovação</strong>,inclusive, conforme se verá, em suas dimensões internacionais einterinstitucionais. Comecemos com a <strong>de</strong>limitação geográfica <strong>de</strong> um<strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.1.1 – Sistemas nacionais, regionais, locais e global <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>Conforme assinalado na introdução, haveria um segundo paradoxoinerente ao conceito (o primeiro, também visto acima, é <strong>de</strong> or<strong>de</strong>mmetodológica: uma teoria que ganha po<strong>de</strong>r explicativo sem recorrer a leis <strong>de</strong>caráter universal), na medida em que as teorias da <strong>inovação</strong> correspon<strong>de</strong>mplenamente aos movimentos que <strong>de</strong>ram forma à globalização econômica.No plano político, a globalização po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finida por uma série <strong>de</strong> novascaracterísticas em relação ao <strong>sistema</strong> inter<strong>nacional</strong> da época da GuerraFria, tais como fortalecimento <strong>de</strong> regimes multilaterais, primazia <strong>de</strong><strong>de</strong>terminados valores universais (especialmente os Direitos Humanos),multiplicação <strong>de</strong> atores internacionais (como as ONG), intensificaçãodos movimentos <strong>de</strong> integração regional e crescente autonomia do direitointer<strong>nacional</strong>. No plano econômico, a expansão do comércio inter<strong>nacional</strong>intrafirma, a inter<strong>nacional</strong>ização e a <strong>de</strong>sterritorialização da produção,a <strong>de</strong>sconexão entre comércio inter<strong>nacional</strong> e finanças, a integraçãodos mercados e a redução da capacida<strong>de</strong> do po<strong>de</strong>r público <strong>de</strong> formularpolíticas econômicas à margem dos movimentos <strong>de</strong> mercado, entremuitos outros fatores, apontam para uma <strong>de</strong>s<strong>nacional</strong>ização progressiva<strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões, em que o Estado <strong>nacional</strong>, ainda que não perca parcelas<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r em termos absolutos (uma vez que esses movimentos não se20Uma discussão metodológica exaustiva em torno dos postulados da economia evolucionistapós-schumpeteriana foi realizada por Witt (2008).50<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 50 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxosconfiguram num mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> soma-zero), per<strong>de</strong> relativamente diante <strong>de</strong>ssasnovas realida<strong>de</strong>s trazidas à baila pela globalização 21 .Uma vez que teorias e políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> concitam os países menos<strong>de</strong>senvolvidos a adotar políticas <strong>de</strong> inserção inter<strong>nacional</strong>, a buscar competirem mercados globais e a reconhecer a integração <strong>de</strong> fato <strong>de</strong> diversasca<strong>de</strong>ias produtivas globais, a partir do conceito da <strong>de</strong>sterritorialização daprodução, qual o sentido <strong>de</strong> se propor uma política <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>?Quão eficazes po<strong>de</strong>riam ser (ainda que formuladas num sentido hipotéticoótimo) como instrumentos do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>? Como conciliar, por fim, aperda <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> gestão econômica em nível <strong>nacional</strong> com a necessida<strong>de</strong>– expressamente reconhecida pela teoria – <strong>de</strong> que o Estado <strong>nacional</strong> tenhamaior influência e po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão na formulação da política econômicaem geral e da política <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> em particular 22 ?Parte da resposta a essas perguntas po<strong>de</strong>-se valer da visão do Estadocomo um <strong>sistema</strong> aberto (diferentemente, por exemplo, do que seria aChina à época da Revolução Cultural 23 ) no qual, entretanto, as conexõescom os elementos externos são significativamente mais fracas do quecom os internos. A inter<strong>nacional</strong>ização <strong>de</strong> diversas empresas brasileiras,sobretudo em países vizinhos, as políticas <strong>de</strong> integração sul-americanaimpulsionadas pelo Itamaraty e a própria dinâmica social <strong>de</strong> integração<strong>de</strong> áreas geográficas contíguas indicam um reforço <strong>de</strong>sses laços externosregionais, em <strong>de</strong>trimento dos propriamente nacionais. Instrumentos comoo Fundo <strong>de</strong> Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM) indicamque muitas políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>inovação</strong> passaram a serconsi<strong>de</strong>radas sob o prisma regional, e não exclusivamente <strong>nacional</strong>,como era a tônica – com importantes exceções – na era da substituição<strong>de</strong> importações. De outra parte, o Brasil e os <strong>de</strong>mais países são séria e21Uma síntese difundida em estudos <strong>de</strong> globalização sobre o arrefecimento do po<strong>de</strong>r relativodo Estado foi proposta por Daniel Bell: “O Estado-nação tornou-se <strong>de</strong>masiadamente gran<strong>de</strong>para as coisas pequenas e <strong>de</strong>masiadamente pequeno para as coisas gran<strong>de</strong>s” (Bell, 1988). Sobreas assimetrias e <strong>de</strong>sequilíbrios da globalização econômica que afetam os países <strong>de</strong> menor<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo ver (Nogueira) Batista (2001).22Balzat & Hanusch (p. 207, 2004), ao referirem-se a políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> da União Europeia,propõem que, em termos analíticos, um conceito supra<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> possaser preferível a um <strong>nacional</strong>, embora admitam ser “(...) ainda cedo para pensar em termos <strong>de</strong> um<strong>sistema</strong> supra<strong>nacional</strong> europeu <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>”.23O exemplo da China como contraste dramático entre as fases pré e pós-globalização econômicapo<strong>de</strong> ser expresso pelo fato <strong>de</strong> manter, à época <strong>de</strong> Mao Tsé-Tung, níveis <strong>de</strong> comércio inter<strong>nacional</strong>inferiores a US$ 1 bilhão, quando atualmente tais cifras ascen<strong>de</strong>m a <strong>de</strong> US$ 1 trilhão.51<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 51 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniordiretamente afetados por <strong>de</strong>cisões econômicas adotadas em distintaspartes do globo.Não obstante esses fatores, o Estado ainda enfeixa atribuições eresponsabilida<strong>de</strong>s que o situam como principal agente promotor <strong>de</strong>políticas e <strong>de</strong> indução <strong>de</strong> inovações, em seu território, assim como nosentornos regional e global, no caso da maioria dos países emergentese industrializados. Há <strong>de</strong> se ter presente ainda o fato <strong>de</strong> que na amplamaioria dos países da OCDE – com o Japão constituindo o exemplomais conspícuo – o setor privado exerce participação prepon<strong>de</strong>ranteem ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> pesquisa e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (P&D), o que não elidiriao caráter “<strong>nacional</strong>” <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s, consi<strong>de</strong>rando-se, por exemplo,as taxas <strong>de</strong> reinvestimento e a formação e treinamento da força <strong>de</strong>trabalho, consi<strong>de</strong>radas nacionais nesses casos. Apesar das inúmerasconexões com o exterior, po<strong>de</strong>-se supor que as políticas públicas e osinvestimentos em <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> modo geral – inclusive os privados –alcançam, prioritariamente e num primeiro momento, o nível <strong>nacional</strong>.No longo prazo, porém, a própria dinâmica trans, inter e supra<strong>nacional</strong>da globalização encarrega-se <strong>de</strong> diluir o impacto pretendidamentedoméstico das políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, o que penaliza especialmente ospaíses e economias insuficientemente inovadores.Outro efeito importante que limita o caráter “<strong>nacional</strong>” das políticas<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – e com efeitos marcantes no caso brasileiro e na maioriados países emergentes – vincula-se a um aspecto central <strong>de</strong>finidor dofenômeno: criação, promoção, difusão e financiamento do conhecimento.Em parte expressiva dos casos, os esforços <strong>de</strong> formação e capacitaçãocientíficas acabam por se tornar improdutivos – a partir <strong>de</strong>ssa perspectiva“<strong>nacional</strong>” dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – quando <strong>de</strong>stacados e numerososcientistas daqueles países emergentes emigram para trabalhar em agênciasgovernamentais e no setor privado <strong>de</strong> outros países, quase sempreindustrializados. Já estes países, justamente por possuírem <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong><strong>inovação</strong> maduros, po<strong>de</strong>m oferecer remuneração e condições <strong>de</strong> trabalhomais estáveis e atrativas para a geração e a difusão <strong>de</strong> conhecimentoem suas próprias instituições, acentuando a <strong>de</strong>fasagem tecnológica e <strong>de</strong><strong>inovação</strong> entre um e outro grupo <strong>de</strong> países 24 .24Exporei, no capítulo VI <strong>de</strong>ste trabalho, i<strong>de</strong>ias gerais <strong>de</strong> como o MRE po<strong>de</strong> operar parareintegrar, ainda que limitada e parcialmente, a diáspora brasileira da <strong>inovação</strong> ao emergente<strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> brasileiro.52<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 52 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxosNenhum <strong>de</strong>sses embaraços ou limites <strong>de</strong>scaracteriza, no entanto,esforços genuinamente nacionais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Ao investirem em seus<strong>sistema</strong>s, um problema maior para os países que o <strong>de</strong> dispersar partedos recursos em re<strong>de</strong>s internacionais, as quais não po<strong>de</strong>m controlarplenamente, são as incertezas inerentes ao comportamento dos <strong>sistema</strong>se <strong>de</strong> seus agentes, sobretudo, como no caso brasileiro, quando suas partesconstitutivas não estão integradas e amadurecidas.1.2 – O caráter sistêmico da <strong>inovação</strong>A primeira conexão que transparece em um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> éa que se estabelece entre produtores e consumidores ou usuários, queocorreria majoritariamente, mas não exclusivamente, no espaço <strong>nacional</strong>,<strong>de</strong> uma ou outra ponta <strong>de</strong>ssa relação. Em linguagem sistêmica, trata-se <strong>de</strong>um mo<strong>de</strong>lo binário em que um produto, ou output específico, funcionacomo uma provisão, ou input apropriado para o outro polo. Deve-se terpresente essa <strong>de</strong>scrição básica na medida em que a interação somenteserá significativa caso haja correspondência ou convergência <strong>de</strong> interessesentre os agentes. O caráter sistêmico da <strong>inovação</strong> po<strong>de</strong> prestar-se apercepções equivocadas, na medida em que, nas caracterizações usuais<strong>de</strong> <strong>sistema</strong> (sobretudo as <strong>de</strong>rivadas <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los mecanicistas, naturalistasou organicistas), predominam interpretações conforme as quais este po<strong>de</strong>ser livremente criado, administrado, imitado, suprimido ou manipulado.Se isso é verda<strong>de</strong> para <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>s mecânicas, no caso dos<strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – e justamente por não serem passíveis <strong>de</strong> análisesomente a partir <strong>de</strong> instrumentos unilineares e neoclássicos tradicionais –o grau <strong>de</strong> controle do Estado, ou <strong>de</strong> outra instituição <strong>de</strong> maior <strong>de</strong>staque no<strong>sistema</strong>, sobre o seu <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e expansão, é bastante limitado 25 .Um erro crucial das políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, nesse sentido, é a ênfase<strong>de</strong>sproporcional em aspectos da oferta, e não da <strong>de</strong>manda e absorção<strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.A caracterização mecanicista dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> vemnormalmente acompanhada <strong>de</strong> interpretações unilineares sobre o seufuncionamento e articulação. Nesse caso, prevalece o esquema segundoo qual bastaria ao Estado formular políticas <strong>de</strong> apoio à ciência básica que25Os textos clássicos sobre teoria dos <strong>sistema</strong>s nas Ciências Sociais são os trabalhos <strong>de</strong> Buckley(1967) e Bertalanffy (2009).53<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 53 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junioresta geraria, por sua vez, automática e subsequentemente, conhecimentotecnológico aplicado à indústria. Esta agrupar-se-ia geograficamenteentão, em aglomerados produtivos <strong>de</strong> elevado valor em termos <strong>de</strong> P&D,gerando transbordamentos produtivos (spillovers) sobre o setor principal<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> e sobre novos fornecedores, secundários e terciários, parte<strong>de</strong> uma ca<strong>de</strong>ia dinâmica <strong>de</strong> produção e prestação <strong>de</strong> serviços 26 . Osprocessos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, em sua configuração sistêmica <strong>de</strong>rivada dasteorias evolucionistas, levam em conta a inter-relação complexa entre osdiversos atores e entre os níveis micro e macro <strong>de</strong> análise. No primeirocaso, experiências bem-sucedidas na universida<strong>de</strong> ou na indústria – umexemplo seria a parceria Telebras - Instituto <strong>de</strong> Física da Unicamp, emmeados da década <strong>de</strong> 90, para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> fibras óticas – po<strong>de</strong>mafetar positivamente o nível macro, como um <strong>sistema</strong> tecnológico, um“bloco <strong>de</strong> competências” ou mesmo o <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>como um todo 27 . A outra relação, <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> Estado que afetamo nível micro, é mais óbvia, ainda que os resultados <strong>de</strong>ssa orientaçãotop-down das políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – contrariamente a outras políticaseconômicas, como a monetária, fiscal e creditícia, por exemplo – sejamquase sempre incertos.Se é verda<strong>de</strong> que um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>prepon<strong>de</strong>rantemente do fator espacial para ser <strong>de</strong>finido – comoatesta a crescente in<strong>de</strong>terminação espacial da produção e dosserviços na era da globalização –, <strong>de</strong> outra parte requer sempreum nível <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação e conhecimento recíproco <strong>de</strong> práticas,valores, idiossincrasias sociais e cultura organizacional. Se níveis <strong>de</strong>coor<strong>de</strong>nação como esse ocorrem muitas vezes <strong>de</strong> forma “espontânea”e não planejada, é certo que uma entida<strong>de</strong> com legitimida<strong>de</strong> e26Lemos (p. 160, 2000) formula sua crítica ao mo<strong>de</strong>lo linear, em gran<strong>de</strong> medida herdado daescola neoclássica, nos seguintes termos: “(...) noções lineares sobre o processo inovativo –como aquelas que o tratavam como resultado das ativida<strong>de</strong>s realizadas na esfera da ciência, queevoluiria unidirecionalmente para a tecnologia, até chegar à produção e ao mercado – já não secolocam mais no centro do <strong>de</strong>bate. Adicionalmente, na mesma medida que a ciência não po<strong>de</strong>ser consi<strong>de</strong>rada como fonte absoluta <strong>de</strong> inovações, também as <strong>de</strong>mandas que vêm do mercadonão <strong>de</strong>vem ser tomadas como o único elemento <strong>de</strong>terminante do processo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.”27Carlsson et al. (2002) preferem empregar os conceitos <strong>de</strong> <strong>sistema</strong> tecnológico ou bloco <strong>de</strong>competências ao invés <strong>de</strong> SNI, argumentando que a dimensão geográfica seria menos precisapara a caracterização <strong>de</strong> <strong>sistema</strong> do que as efetivas coesão e <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> dos transbordamentosprodutivos, da mesma forma que suas complementarieda<strong>de</strong>, produtivida<strong>de</strong> e estímulo à <strong>inovação</strong>seriam mais relevantes que o fator <strong>nacional</strong>.54<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 54 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxoscapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong>sses fatores e variáveis – no caso,o Estado – po<strong>de</strong>rá ser <strong>de</strong>cisiva para estimular re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>e propiciar recursos para o seu financiamento e funcionamento.Tal atuação não <strong>de</strong>verá, contudo, confundir-se com a pretensão <strong>de</strong>controlar todos os aspectos do processo, o que seria <strong>de</strong> certo modoincongruente e contraproducente. O Estado, portanto, assim comoos <strong>de</strong>mais copartícipes do processo, <strong>de</strong>verão reconhecer e respeitaro caráter incerto e in<strong>de</strong>terminado dos processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> comohipótese básica <strong>de</strong> trabalho para a formulação <strong>de</strong> políticas, tendopresente essa característica na avaliação dos resultados pretendidos.1.3 – Inovação e incertezaSe incerteza é uma palavra corriqueira ao gestor público <strong>de</strong> ummodo geral, no caso das políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> o problema torna-seainda mais conspícuo. Uma das razões notórias <strong>de</strong>ssa dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong>controlar resultados <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> fica evi<strong>de</strong>nte quando setraça um paralelo com instrumentos <strong>de</strong> política fiscal para estimularoutros setores e ativida<strong>de</strong>s da economia. No caso da cultura, porexemplo, o Brasil possui manifestações maduras, tanto <strong>de</strong> linguagemlocal quanto universal, reconhecidas mundialmente. Desse modo,é quase certo que instrumentos <strong>de</strong> renúncia fiscal gerarão obrascriativas e inovadoras, consi<strong>de</strong>rando o cabedal e o repositório <strong>de</strong>ssasmanifestações que permeiam a tessitura da socieda<strong>de</strong> brasileira. Omesmo po<strong>de</strong> ser dito em relação às políticas <strong>de</strong> incentivo à produçãoagrícola, em que o Brasil tornou-se market maker em distintosmomentos <strong>de</strong> sua história econômica – inclusive nos tempos atuais.No caso das políticas <strong>de</strong> estímulo à <strong>inovação</strong>, entretanto, o Estado nãoconta com o apoio das variáveis anteriores para assegurar o êxito dasua aplicação. Nesses casos, ainda que o financiamento público possaser um elemento importante, não será exclusivo nem <strong>de</strong>terminante,sobretudo no nível micro, em que empresas selecionadas recebemincentivos diretos 28 .28Glauco Arbix inicia seu Inovar ou Inovar (2007) com o exemplo da indústria brasileira do pão<strong>de</strong> queijo, que veio a ganhar amplas faixas do mercado inter<strong>nacional</strong> após <strong>de</strong>senvolver tecnologiasimples e barata <strong>de</strong> criogenia que assegura a durabilida<strong>de</strong> do produto, sem perda <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>.55<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 55 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorO componente <strong>de</strong> incerteza da <strong>inovação</strong> está relacionado, portanto,a fatores e a motivações muitas vezes não alcançáveis por políticas <strong>de</strong>incentivo, que envolvem os conceitos formulados pelos evolucionistase particularmente pelo subgrupo dos neo-schumpeterianos. Adificulda<strong>de</strong> está relacionada, em primeira análise, ao papel central<strong>de</strong>sempenhado pelo conhecimento nos processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.Nesses casos, e naturalmente, o Estado po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve interferir paraque o conhecimento produzido possa conectar-se à produção epara que o componente <strong>de</strong> incerteza seja mitigado. Três problemas,entretanto, apresentam-se imediatamente a essa estratégia: 1) políticaseducacionais e <strong>de</strong> fomento à ciência e à tecnologia são <strong>de</strong> longamaturação, normalmente envolvendo o período <strong>de</strong> uma geração(caso em que a questão educacional está intimamente relacionadaa propostas <strong>de</strong> inclusão social); 2) educação e aprendizagem para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> competências e soluções tecnológicas <strong>de</strong>vemcontemplar não somente a instrução formalizada, mas também umaperspectiva crítica e inquieta (muito na linha do que preconizavaPaulo Freire, por exemplo) <strong>de</strong> “apren<strong>de</strong>r a apren<strong>de</strong>r” e <strong>de</strong> buscarsoluções não convencionais para problemas <strong>de</strong> produção, prestação<strong>de</strong> serviços e organização produtiva. Os governos, <strong>de</strong> modo geral, nãoestão equipados para enfrentar esse <strong>de</strong>safio mais complexo; 3) comocorolário <strong>de</strong>ssa perspectiva, as políticas educacionais e <strong>de</strong> C,T&Iquase sempre consi<strong>de</strong>ram o conhecimento codificado, justamenteaquele <strong>sistema</strong>tizado e que se po<strong>de</strong> livremente reproduzir, <strong>de</strong>ixando<strong>de</strong> lado os igualmente importantes aspectos tácitos do conhecimento.Processos técnicos, matemáticas, engenharias e ciências naturaiscorrespon<strong>de</strong>m a disciplinas que normalmente são consi<strong>de</strong>radas emambientes <strong>de</strong> fomento à pesquisa científica e tecnológica comoexemplos <strong>de</strong> conhecimento plenamente <strong>de</strong>codificável e reprodutível.Elemento crucial para o êxito <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> éconsi<strong>de</strong>rar a forma como o conhecimento tácito po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>senvolvidoou transmitido no interior <strong>de</strong> organizações ou setores produtivos. Talconhecimento é sintetizado na literatura <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> como um modo<strong>de</strong> “fazer, utilizar e interagir” (doing, using and interacting, DUI) comgran<strong>de</strong>s dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ser replicado em contextos sociais on<strong>de</strong> nãofoi originariamente concebido. Trata-se, por exemplo, <strong>de</strong> formas <strong>de</strong>aprendizagem e gestão peculiares ao funcionamento <strong>de</strong> <strong>sistema</strong>s como os56<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 56 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxosdo polo tecnológico <strong>de</strong> Santa Rita do Sapucaí (MG), do polo calçadista<strong>de</strong> Cariri (CE) ou da Arranjo Produtivo Local <strong>de</strong> instrumentos médicose odontológicos <strong>de</strong> Campo Mourão (PR) 29 .Jensen et al. (2007) buscaram avançar uma <strong>de</strong>finição operacional <strong>de</strong>conhecimento tácito, em que o <strong>de</strong>sconhecimento <strong>de</strong> seus mecanismosformadores e transmissores po<strong>de</strong> gerar resultados distintos daquelespretendidos por políticas públicas mais lineares <strong>de</strong> fomento à C&T eà <strong>inovação</strong>. Entre os exemplos <strong>de</strong> práticas que se enquadrariam sobessa <strong>de</strong>finição, foi mencionado o funcionamento <strong>de</strong> grupos <strong>de</strong> trabalhointerdisciplinares na estrutura da organização ou da empresa; a criação<strong>de</strong> círculos <strong>de</strong> controle <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> 30 ; instituição <strong>de</strong> <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong>recolhimento <strong>de</strong> sugestões; formação <strong>de</strong> grupos autônomos; integração<strong>de</strong> funções; interação direta e feedback <strong>de</strong> clientes; e instituição <strong>de</strong>competências flexíveis. O aspecto indispensável do conhecimento tácitona <strong>inovação</strong> foi ressaltado pelos autores no sentido <strong>de</strong> queLevar em conta ambos modos <strong>de</strong> conhecimento [tácito e codificado] e sua evoluçãona economia do conhecimento trará implicações positivas para as políticas públicase para a criação <strong>de</strong> instituições. A educação <strong>de</strong>ve preparar os estudantes paratrabalhar com códigos globais e especializados <strong>de</strong> diferentes disciplinas, assimcomo <strong>de</strong>ve envolvê-los no aprendizado e no <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> códigos locais,através <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s e iniciativas para a solução <strong>de</strong> problemas (Jensen et al.,p. 690, 2007).Os mesmos autores conduziram estudo empírico-operacional emempresas inovadoras dinamarquesas, no qual ficou <strong>de</strong>monstrado que “(...)a firma que combina uma versão robusta do modo ‘ciência, tecnologiae <strong>inovação</strong>’ [modo STI, conhecimento codificado] com uma versãoigualmente intensa do modo DUI [conhecimento tácito] é a que exce<strong>de</strong>em <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> produto.” (Jensen et al., p. 691, 2007).Um <strong>de</strong>stacado aspecto tácito do conhecimento, sempre invocadopelos estudiosos da <strong>inovação</strong>, é o fato <strong>de</strong> o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> paísesasiáticos estar calcado em valores impon<strong>de</strong>ráveis como disciplina,29Sobre a experiência da aplicação <strong>de</strong> conhecimento tácito no polo tecnológico <strong>de</strong> Santa Ritado Sapucaí ver Queiroz (2007).30Tais círculos, <strong>de</strong>senvolvidos no Japão em 1962, consistem em grupo <strong>de</strong> trabalhadoresvoluntários em uma empresa que se reúnem regularmente para aprimorar as condições <strong>de</strong>trabalho e <strong>de</strong> produção.57<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 57 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorvalorização da educação e <strong>de</strong> todas as formas <strong>de</strong> aprendizado, coesãosocial e espírito comunitário, forte confiança interpessoal e nasinstituições 31 . Nesse aspecto, fica patente a intangibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fatoresque integram o conceito <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Se tal circunstância amplia onível <strong>de</strong> incerteza com que tem <strong>de</strong> lidar o administrador público, poroutro lado os fatores intangíveis po<strong>de</strong>m também gerar externalida<strong>de</strong>spositivas, quando uma socieda<strong>de</strong> conta com estímulos para <strong>de</strong>senvolversua autonomia, criativida<strong>de</strong> e capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciativa, à margem dosincentivos oferecidos pelas relações <strong>de</strong>scentralizadas <strong>de</strong> livre intercâmbiocaracterísticas do capitalismo. Nesse sentido, o obstáculo mais sério aser enfrentado por países <strong>de</strong> menor <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo, em suaspolíticas <strong>de</strong> incentivo à <strong>inovação</strong> (e conforme o aspecto transdisciplinarque tipifica o conceito), seria a persistência <strong>de</strong> situações <strong>de</strong> exclusãoe <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> ou, mais apropriadamente, <strong>de</strong> pobreza como privação<strong>de</strong> capacida<strong>de</strong>s, conforme <strong>de</strong>fine Amartya Sen (SEN, 2000). Lundvallconsi<strong>de</strong>ra que a abordagem <strong>de</strong> Sen não só contribui como se encaixaprecisamente na caracterização dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>:Po<strong>de</strong>-se pensar nelas [inovações] como resultados <strong>de</strong> processos <strong>de</strong> aprendizagemque contribuem para a remoção <strong>de</strong> restrições à liberda<strong>de</strong> tais como ignorância,ausência <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s educacionais e econômicas; po<strong>de</strong>-se ainda pensarsobre elas como contribuições à promoção <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>s substantivas, tais comoa capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhar, comunicar, apren<strong>de</strong>r e participar <strong>de</strong>mocraticamenteno processo político. Todos esses são elementos importantes para o processo <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (Lundvall, p. 114, 2007).Dessa forma, elementos essenciais do conceito <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, nãoplenamente alcançáveis pelas políticas públicas, mas que <strong>de</strong>vem serconsi<strong>de</strong>rados em sua formulação, compreen<strong>de</strong>m capital social (a questãoda confiança e do conhecimento tácito), capital humano (inclusão sociale aprendizagem), capital político (articulação entre os diferentes órgãosdo Estado para a promoção da <strong>inovação</strong> na economia, na administração31O fator confiança teria um impacto direto na produtivida<strong>de</strong> dos fatores na medida em queindicaria um grau reduzido <strong>de</strong> conflito social e <strong>de</strong> mobilização do Estado e do Judiciário paraa solução <strong>de</strong> controvérsias. Knack & Keefer (1997) trabalharam com a hipótese <strong>de</strong> que o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico seria uma função do nível <strong>de</strong> confiança disseminado pela socieda<strong>de</strong>.Conclusão semelhante, a partir <strong>de</strong> outros pressupostos, consta da literatura sociológica, emtrabalhos como os <strong>de</strong> Durkheim, Parsons e Luhmann. V. Misztal (1996).58<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 58 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxospública e nas relações com a socieda<strong>de</strong>) e outras formas pertencentes àmesma família, como “capital tecnológico” e “capital natural” 32 .Além do aprendizado, do conhecimento, da incorporação <strong>de</strong> novasformas <strong>de</strong> capital i<strong>de</strong>ntificadas por teóricos do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> esociólogos da cultura 33 , da interativida<strong>de</strong>, do seu caráter sistêmico e (co-)evolucionário, a <strong>inovação</strong> apresenta outras características <strong>de</strong>finidorasessenciais, tais como:a) cumulativida<strong>de</strong> e irreversibilida<strong>de</strong>: na medida em que <strong>de</strong>terminadasexperiências econômicas, sociais e gerenciais tornam-sebem-sucedidas e são “selecionadas” pelo mercado, comunida<strong>de</strong>sou organizações, só virão a ser substituídas quando novas práticasse revelarem funcionalmente mais aptas ou <strong>de</strong> rendimento superiorpara a maximização do lucro, a satisfação dos consumidores e apromoção dos objetivos organizacionais propostos;b) trajetória <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte (path <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ncy): elemento que reforçaas dificulda<strong>de</strong>s e incertezas alusivas às políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> éa conjugação dos elementos intangíveis atinentes ao conceitocom a herança histórica expressa na trajetória econômica esocial <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. As vantagens comparativasbrasileiras no agronegócio, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os tempos em que dominava ocomércio mundial <strong>de</strong> café, passando pelos sucessivos recor<strong>de</strong>sna produção e exportação <strong>de</strong> grãos, e a ocupação do posto<strong>de</strong> primeiro rebanho bovino do mundo (MRE, p. 59, 2003)<strong>de</strong>terminaram as trajetórias tecnológicas que se seguiriam:expansão exponencial da P&D a cargo da Empresa Brasileira<strong>de</strong> Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA, a li<strong>de</strong>rança brasileiraem pesquisa <strong>de</strong> biocombustíveis, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a instituição do programaProálcool na década <strong>de</strong> 70, e o complexo <strong>de</strong> P&D representadopelos quase 700 programas <strong>de</strong> Mestrado e Doutorado no Brasil emciências da base direta do agronegócio (Tecnologia <strong>de</strong> Alimentos,Ciências Agrárias, Biologia e Biotecnologia, Medicina Veterinária32Ressalte-se, nesse aspecto, as práticas inovadoras sociais e <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> capital políticoconsubstanciadas em experiências como o orçamento participativo em diversas administraçõesmunicipais brasileiras e a instituição, pelo Itamaraty, dos Conselhos <strong>de</strong> Cidadãos e dos Consuladositinerantes no exterior.33Bourdieu (1986) teria sido o formulador das expressões intangíveis e imateriais do capital,acima enunciadas.59<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 59 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniore Zootecnia) 34 , para citar os elementos mais importantes <strong>de</strong>ssecomplexo <strong>de</strong> pesquisa. Se, por um lado, tal estrutura revelou-se<strong>de</strong> primeira or<strong>de</strong>m para a expansão e o equilíbrio econômicobrasileiro em diversas etapas <strong>de</strong> sua história, por outro criou certainércia que torna mais difícil o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da pesquisa emoutras áreas do conhecimento cruciais para o ingresso na “novaeconomia”, como certas engenharias (especialmente engenhariada produção e engenharia genética), matemáticas e alguns camposda física (materiais e optoeletrônica, por exemplo).Dificulda<strong>de</strong> adicional inerente ao conceito <strong>de</strong> trajetória <strong>de</strong><strong>de</strong>pendência é o fato <strong>de</strong> que os prêmios e vantagens <strong>de</strong> mercado (no caso,a mudança do perfil produtivo <strong>de</strong> um país na direção <strong>de</strong> bens e serviços<strong>de</strong> componente tecnológico mais elevado) tornam-se mais escassos edifíceis <strong>de</strong> alcançar quando se tem <strong>de</strong> enfrentar competidores que hámuito já realizaram essa mudança (caso dos países industrializados) e que,portanto, passam a erigir barreiras jurídicas e comerciais que dificultama ascensão da escala produtiva e <strong>de</strong> prestação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> paísesemergentes. Tais dificulda<strong>de</strong>s expressam-se inexoravelmente na forma<strong>de</strong> barreiras ao comércio, à transferência <strong>de</strong> tecnologia e na imposição <strong>de</strong>regimes estritos <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> intelectual, quando o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>daqueles países pautava-se justamente pela inexistência ou relaxamento<strong>de</strong> tais barreiras internacionaisUma trajetória <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência não tem, naturalmente, o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>cristalizar vantagens comparativas estáticas ou enrijecer a posição dospaíses e <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> na divisão inter<strong>nacional</strong> do trabalho.As incertezas e dificulda<strong>de</strong>s são sempre maiores para <strong>de</strong>stravar essastrajetórias quando um país não dispõe <strong>de</strong> uma base produtiva e industrialmais diversificada (base que caracteriza, em certa e <strong>de</strong>clinante medida,a economia brasileira). A alta <strong>de</strong> 2007/primeiro semestre <strong>de</strong> 2008 dascommodities em todo o mundo trouxe <strong>de</strong>sincentivos importantes para queo governo e a socieda<strong>de</strong> brasileira investissem em P&D <strong>de</strong> alternativas“portadoras <strong>de</strong> futuro” e <strong>de</strong> elevados conteúdo científico-tecnológico evalor agregado. A trajetória <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência afeta igualmente, <strong>de</strong> outra34Essas cinco áreas do conhecimento, entre as 49 que compõem a estrutura da pesquisa e dapós-graduação no Brasil, <strong>de</strong>têm 435 dos 2.256 programas <strong>de</strong> pós-graduação do país, com 435Mestrados e mais cerca <strong>de</strong> 270 Doutorados.60<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 60 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior(...) não é o tipo <strong>de</strong> instituição que gerará um <strong>sistema</strong> em particular, masa coexistência <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> instituições, seu padrão <strong>de</strong> interação e aretroalimentação que receberão <strong>de</strong> seu entorno (Niosi, pp. 218-219, 1993).Coerentemente, <strong>de</strong>ssa vez, com o próprio conceito <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, amultiestabilida<strong>de</strong> exigirá dos tomadores <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão e empreen<strong>de</strong>dorespropostas originais, interpretação a<strong>de</strong>quada das variáveis e circunstânciasmais significativas que afetam o processo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, autorida<strong>de</strong> paraimplementação das propostas e espírito “<strong>de</strong>struidor criativo” para aplicarpolíticas e <strong>de</strong>senvolver processos não convencionais, maximizadores dosresultados pretendidos.d) o componente crucial da interativida<strong>de</strong>: na medida em queconhecimento, história, variabilida<strong>de</strong> e irreversibilida<strong>de</strong>constituem uma amálgama <strong>de</strong> fatores que caracterizam um<strong>sistema</strong>, acrescente-se a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que tais fatores disponham<strong>de</strong> condições ótimas <strong>de</strong> intercâmbio e <strong>de</strong> comunicabilida<strong>de</strong> entreos atores que o integram. Segundo Lundvall (p. 415, 1998),a interativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>signava, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primórdios dos estudossobre <strong>inovação</strong> dos anos 80, “o papel crucial <strong>de</strong>sempenhadopelas inter<strong>de</strong>pendências não comercializáveis para explicar aintensida<strong>de</strong> e os rumos do processo”. Ainda segundo o economistasueco, caso o intercâmbio <strong>de</strong>sses elementos intangíveis não tivesselugar na socieda<strong>de</strong>, mas apenas a pura e simples relação <strong>de</strong> troca<strong>de</strong> produtos finais, não haveria lugar para a <strong>inovação</strong> e inexistiriaum <strong>sistema</strong> econômico com as feições do capitalismo mo<strong>de</strong>rno(Lundvall, p. 409, 1998). Este seria <strong>de</strong>finido, <strong>de</strong>sse modo, a partir<strong>de</strong> bases schumpeterianas e pós-schumpeterianas <strong>de</strong> circulação,aprimoramento e irreversibilida<strong>de</strong> dos avanços tecnológicos, osquais se manifestam, em última análise, como uma dimensãomaterializada especial do conhecimento.Essa “dimensão especial” consi<strong>de</strong>ra o conhecimento comoinstrumento para satisfação <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>s e que, para tanto, suadifusão e disseminação <strong>de</strong>ve aten<strong>de</strong>r aos interesses da socieda<strong>de</strong> –tendo-se em conta a forma <strong>de</strong>sigual como os frutos do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>tecnológico beneficiam e afetam distintos segmentos sociais. A62<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 62 10/10/2011 14:15:39


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxosinterativida<strong>de</strong> assegura ao conceito <strong>de</strong> <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> um caráternão linear, <strong>de</strong> resultados não plenamente controláveis, a partir dofuncionamento <strong>de</strong> uma “re<strong>de</strong> trilateral <strong>de</strong> organizações híbridas”, entreaca<strong>de</strong>mia, governo e empresas, na qual cada um <strong>de</strong>sses elementospo<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>senvolver uma intrincada re<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicações, relaçõesinstitucionais, funcionais e organizativas e <strong>de</strong> troca <strong>de</strong> experiênciascom os <strong>de</strong>mais. Nesse aspecto, a ênfase não seria basilarmente aprodução <strong>de</strong> conhecimento – que, como a experiência bem <strong>de</strong>monstra,po<strong>de</strong> estar em gran<strong>de</strong> parte indisponível para a socieda<strong>de</strong> – mas opleno funcionamento das conexões entre as diversas partes e atoresdo <strong>sistema</strong> que produzem e <strong>de</strong>têm o conhecimento.Etzkowitz & Ley<strong>de</strong>sdorff, em sua influente proposta <strong>de</strong>compreensão do <strong>sistema</strong> a partir <strong>de</strong> uma “Hélice Tripla” <strong>de</strong> relaçõesentre universida<strong>de</strong>, indústria e governo (1997 e 2000), reservamum papel proeminente à primeira, contrariamente à primazia daempresa na análise dos SNI, ou do governo, no caso do “Triângulo<strong>de</strong> Sábato” (1968, 1982). A proposta essencial da “Hélice Tripla” é <strong>de</strong>que a universida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>sempenhar uma terceira função, além dastradicionais <strong>de</strong> ensino e pesquisa: na absorção <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> tecnológicapelas empresas, fornecimento <strong>de</strong> propostas e soluções para problemascomplexos <strong>de</strong> gestão governamental e instrumento <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>regional, <strong>de</strong> setores da indústria e <strong>de</strong> otimização das capacida<strong>de</strong>sinovadoras e produtivas em nível local. Essa terceira função, emboraainda não incorporada institucionalmente às competências formais dasuniversida<strong>de</strong>s, vem sendo largamente <strong>de</strong>sempenhada em uma série <strong>de</strong>países, com intensida<strong>de</strong> e resultados diversos.A multiplicação <strong>de</strong> parques científicos e polos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>correspon<strong>de</strong>m a um esquema i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> interativida<strong>de</strong> entre a universida<strong>de</strong>e a empresa, embora não haja um formato semelhante que explore aspossibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interação <strong>de</strong> ambas com o Estado. Isso porque, aorepresentar os interesses da socieda<strong>de</strong> como um todo, este disporia <strong>de</strong>pouca agilida<strong>de</strong> e recursos para adaptar-se a todas as condições locaise setoriais que estão no cerne dos processos inovativos. Desse modo,uma maior interativida<strong>de</strong> com o Estado, com vistas ao fortalecimento<strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, terá forçosamente <strong>de</strong> vir acompanhada <strong>de</strong>instrumentos setoriais (mecanismo que, em gran<strong>de</strong> medida, tem rendidobons frutos no caso brasileiro) e <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong>scentralizadas, em níveis63<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 63 10/10/2011 14:15:39


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorestadual e local, <strong>de</strong> capacitação tecnológica <strong>de</strong> empresas e <strong>de</strong> experiências<strong>de</strong> empo<strong>de</strong>ramento (empowerment) social 37 .O caráter sistêmico da <strong>inovação</strong> configura, portanto, um estado <strong>de</strong>inter<strong>de</strong>pendência entre os atores que o compõem, numa dinâmica emque o fortalecimento e o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> um vértice do <strong>sistema</strong>(o Estado, por exemplo), condiciona o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> dos <strong>de</strong>mais.Tal é o caso, por exemplo, das amplas reformas econômicas na China,que permitiram o florescimento <strong>de</strong> um setor privado robusto, sendo queeste, por sua vez, ensejou o fortalecimento econômico do Estado e o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> pesquisa científica e tecnológicarapidamente alçado à condição <strong>de</strong> um dos mais respeitados do mundo.Assim, as diferenças <strong>de</strong> ênfase entre diversos enfoques sobre se aresponsabilida<strong>de</strong> maior pelo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do <strong>sistema</strong> <strong>de</strong>ve recairsobre as firmas como unida<strong>de</strong>s centrais <strong>de</strong> análise (mo<strong>de</strong>lo dos <strong>sistema</strong>snacionais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>), sobre as universida<strong>de</strong>s (“Hélice Tripla”) ousobre o Estado (“Triângulo <strong>de</strong> Sábato”), é pouco importante do ponto<strong>de</strong> vista operacional, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que tais unida<strong>de</strong>s estejam em efetivainteração, mediante acesso a canais a<strong>de</strong>quados <strong>de</strong> financiamento, re<strong>de</strong>s<strong>de</strong>simpedidas <strong>de</strong> acesso e transmissão <strong>de</strong> informações e conhecimentoe coparticipação em esquemas institucionais e organizacionais <strong>de</strong>promoção <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.Não há registro <strong>de</strong> que um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> possa ser constituídoexclusivamente por uma <strong>de</strong>ssas vertentes do <strong>sistema</strong> 38 . A experiênciadas antigas economias planificadas do Leste Europeu e mesmo daAmérica Latina <strong>de</strong>monstram que a falta <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação entre auniversida<strong>de</strong> e as firmas foi um fator <strong>de</strong>cisivo para o arrefecimento dosprocessos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e para a <strong>de</strong>saceleração do crescimento, em umcontexto em que outros competidores no Oci<strong>de</strong>nte e na Ásia do Lesteseguiam em direção oposta <strong>de</strong> expansão e diversificação. Do mesmomodo, situações em que se confere ao mercado e à iniciativa privada aresponsabilida<strong>de</strong> pelo avanço da <strong>inovação</strong>, a partir da in<strong>de</strong>terminação37Notável experiência <strong>de</strong> <strong>de</strong>scentralização na conectivida<strong>de</strong> Estado-universida<strong>de</strong>-empresa noBrasil foi o programa Disque Tecnologia do Estado <strong>de</strong> São Paulo, com o apoio do Governoestadual e do Sindicato das Micro e Pequenas Indústrias do Estado (SIMPI) e executado pelaUniversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Os êxitos do programa foram ressaltados em Barbosa (2004) e porSutz (2000).38A antiga União Soviética, por exemplo, embora dispusesse <strong>de</strong> um importante <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> ciênciae tecnologia, não possuía um <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.64<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 64 10/10/2011 14:15:40


<strong>inovação</strong>: métodos, conceitos e paradoxosdo resultado líquido das relações <strong>de</strong> troca <strong>de</strong>scentralizadas na socieda<strong>de</strong>,resulta incongruente com a dinâmica da <strong>inovação</strong>, que requer umgrau <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação consciente e planejado, não casual, aleatórioou <strong>de</strong>terminístico, entre os atores do <strong>sistema</strong>. A proposta <strong>de</strong> que oEstado e o planejamento econômico sejam afastados das políticas <strong>de</strong><strong>inovação</strong>, em prol da visão neoclássica <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rá-las como umaexternalida<strong>de</strong> do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico, compreendido a partir<strong>de</strong> relações estáticas <strong>de</strong> livre intercâmbio e <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>fatores, não foi capaz <strong>de</strong> gerar inovações, como bem <strong>de</strong>monstram oscasos das construções dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> países como Japão, EstadosUnidos, Alemanha e Reino Unido, que sempre contaram com po<strong>de</strong>rosasinstituições e agências governamentais <strong>de</strong> fomento científico--tecnológico e à <strong>inovação</strong>. No caso dos países anglo-saxônicos, se aempresa era o foco <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, o comportamento das firmasera incentivado ou restringido pelo Estado na direção dos objetivos <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> pre<strong>de</strong>terminados 39 . Finalmente, um entendimento <strong>de</strong>que as políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong>vam ser dirigidas prepon<strong>de</strong>rantementepelas universida<strong>de</strong>s geraria uma distorção (presente, em menor medida,nas duas outras esferas do <strong>sistema</strong>) <strong>de</strong> encapsulamento do conhecimentoe <strong>de</strong> <strong>de</strong>svinculá-lo das agendas produtivas, num caso, e das urgênciasdo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> com equida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> outro. Somente, portanto, oimbricamento das lógicas, motivações, crenças, disposições e modos<strong>de</strong> operação das três esferas constitutivas (e consi<strong>de</strong>rando que as trêsestejam “minimamente” <strong>de</strong>senvolvidas) po<strong>de</strong>rá ensejar uma dinâmicasuperpositiva (uma “re<strong>de</strong> trilateral <strong>de</strong> organizações híbridas”) voltadapara a construção e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> <strong>de</strong><strong>inovação</strong>.Concessão importante a se fazer à universida<strong>de</strong> nesse processo tema ver com um aspecto fundamental da sociologia da ciência, que englobadois valores básicos encampados pela pesquisa científica, assinaladospor Lundvall & Borrás (p. 606, 2006). O primeiro advoga que39Seriam exemplos <strong>de</strong>ssas políticas <strong>de</strong> Estado que contrariavam interesses das corporações oBayh-Dole Act nos Estados Unidos (University and Small Business Patent Procedures Act), <strong>de</strong>1980, que dispunha sobre direitos <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> intelectual obtidos a partir <strong>de</strong> P&D realizadacom recursos governamentais. No caso do Reino Unido, po<strong>de</strong>m ser mencionados programascomo o SMART e o LINK, <strong>de</strong> apoio a pequenas e médias empresas e <strong>de</strong> estabelecimento <strong>de</strong>programas <strong>de</strong> cooperação e integração <strong>de</strong> esforços inovadores <strong>de</strong>ssas empresas. Deter-me-ei umpouco mais nesses programas no cap. V infra.65<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 65 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorSomente quando é permitido à pesquisa básica mover-se através <strong>de</strong> suas própriastrajetórias po<strong>de</strong>rá produzir [o conhecimento] insuspeito, capaz <strong>de</strong> abrir novasavenidas para a pesquisa aplicada e para as soluções técnicas.O segundo valor refere-se à condição da ciência crítica e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntecomo um elemento crucial da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>mocrática, uma vez que(...) o conhecimento científico gerado em fontes in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes consiste numrecurso fundamental para um processo político-<strong>de</strong>cisório aberto, transparente erepresentativo.Ainda que a teoria dos <strong>sistema</strong>s nacionais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> reserve umlugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque para o setor privado, no caso <strong>de</strong> países emergentes e,sobretudo, da América Latina, a situação é <strong>de</strong> franca assimetria entreesses setores, em que os níveis <strong>de</strong> investimento em P&D e em C,T&Isão dominados pelo Estado (com a exceção do Brasil e, em menor grau,México e Argentina) e com a iniciativa privada muito recentementeassumindo maiores responsabilida<strong>de</strong>s, ainda que <strong>de</strong> forma incipiente, naconstituição do respectivo SNI 40 . Outro aspecto que assinala a primazia doEstado <strong>nacional</strong> na América Latina, em comparação com a caracterizaçãoe nível <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> inovadora nos países industrializados, é o fato <strong>de</strong>aqui o <strong>sistema</strong> universitário público ser o responsável, na maioria doscasos, pela quase totalida<strong>de</strong> da pesquisa científica e da maior parte do<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico.Passarei agora a tratar, no capítulo a seguir, das especificida<strong>de</strong>s,principais caraterísticas e elementos comuns aos SNI dos países latino--americanos <strong>de</strong> um modo geral, antes <strong>de</strong> tratar mais especificamentedo caso brasileiro e dos elementos constitutivos do seu <strong>sistema</strong> emparticular. O tratamento do caso latino-americano <strong>de</strong>verá servir aindapara corroborar a sub-hipótese da representativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alguns SNI –Brasil, China e Reino Unido – em relação aos <strong>sistema</strong>s e estratégias <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> um grupo mais amplo <strong>de</strong> países a que estão social,geográfica e historicamente vinculados.40Eros Grau (p. 292, 2002), ao referir-se à política brasileira <strong>de</strong> reserva <strong>de</strong> mercado para ainformática, <strong>de</strong> 1984, vislumbrava diversos elementos comprobatórios da tese segundo a qual “(...)o empresariado privado <strong>de</strong>ixa sempre ao Estado a iniciativa da busca <strong>de</strong> caminhos inovadores.”66<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 66 10/10/2011 14:15:40


Capítulo IIAlguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong>C,T&I no Brasil e na América LatinaAs trajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência da América Latina apontam parauma or<strong>de</strong>m econômica e um <strong>sistema</strong> produtivo fortemente calcadona existência <strong>de</strong> abundantes matérias-primas. A regra nesses países –inclusive no Brasil – é a participação das commodities no PIB e nasexportações sempre em or<strong>de</strong>m muito superior a 50%. Alguns paísescomo Cuba, Costa Rica e México lograram alcançar parcela importante<strong>de</strong> participação <strong>de</strong> serviços em seu setor produtivo com o turismo (quenão <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma commodity, quando voltado para a exploraçãodo patrimônio natural) e, mais recentemente – com a liberalizaçãoeconômico-comercial dos anos 90 –, com as tecnologias da informaçãoe das comunicações (TIC). Os países andinos, apesar <strong>de</strong> recentestransformações pontuais em seu <strong>sistema</strong> produtivo, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m dasexportações <strong>de</strong> minerais metálicos, enquanto os países platinos Argentinae Uruguai <strong>de</strong>têm importante participação – amplamente majoritária, nosegundo caso – <strong>de</strong> carne, lácteos e <strong>de</strong>rivados em suas pautas exportadoras.Somente o Brasil possui uma relativa diversificação industrial e <strong>de</strong>serviços em sua estrutura produtiva, com certo componente agregado<strong>de</strong> elevada base tecnológica 41 .41Bortagaray & Tiffin, escrevendo no ano 2000, <strong>de</strong>monstram que, numa lista amplamentedominada pelo Brasil, apenas Argentina, Cuba, Costa Rica e México também contavam comaglomerados industriais inovadores expressivos na América Latina: Mar <strong>de</strong>l Plata, <strong>de</strong> indústria67<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 67 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorDe modo geral, a fase da substituição <strong>de</strong> importações levou algunspoucos países a montar uma base industrial e <strong>de</strong> infraestrutura que lhespermitiram expandir o setor secundário (Argentina, Brasil e México),numa época em que a competição inter<strong>nacional</strong> era pautada pela produçãoem massa <strong>de</strong> bens padronizados e pela baixa diferenciação <strong>de</strong> produtose serviços. Conforme sintetizaram Cassiolato & Lastres p. 244, 2000),O pequeno esforço quanto ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s inovadoras eas conseqüentes fragilida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>ficiências tecnológicas da indústria local[latino-americana] foram consi<strong>de</strong>rados como não tendo representado empecilhosignificativo ao crescimento econômico durante o processo <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong>importações. Na fase mais recente, todavia, estes fatores constituem um importantegargalo. De fato, um importante contraste entre a tendência dos países maisavançados e o caso brasileiro refere-se, por exemplo, ao engajamento do setorempresarial nos esforços inovativos e <strong>de</strong> P&D.O relativo êxito, em muitos países, do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> SI, a baixainterconectivida<strong>de</strong> do <strong>sistema</strong> econômico inter<strong>nacional</strong> (aindacaracterizado pela prepon<strong>de</strong>rância da macroeconomia do Estado-nação),a manutenção, durante os anos 70, <strong>de</strong> alguma estabilida<strong>de</strong> nas relações<strong>de</strong> intercâmbio com os países centrais, a manutenção dos serviçosda dívida externa em termos administráveis nas contas nacionais, aprimazia <strong>de</strong> um padrão não competitivo, patrimonialista 42 , do setorprivado, especialmente no Brasil, aliados às amplas re<strong>de</strong>s protecionistascomerciais, geraram <strong>de</strong>sincentivos e uma baixa propensão a inovar ea incorporar novas tecnologias a uma produção que, essencialmente,contava com mercados internos e externos mais ou menos cativos e pouco<strong>de</strong>safiados pela concorrência 43 .química; Havana e San José (Costa Rica), setor <strong>de</strong> biotecnologia; e Cuernavaca e Guadalajara,complexo da indústria eletrônica. Cf. em Bortagaray & Tiffin (pp. 28-30, 2000).42Já nos estertores do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> SI no Brasil, durante o Governo Sarney, multiplicaram-se asoperações <strong>de</strong> socorro a empresas <strong>de</strong>ficitárias e em situação pré-falimentar, que atingiram setorescomo eletroeletrônicos, distribuição <strong>de</strong> combustíveis, transporte aéreo, ensino privado, indústriaalimentícia, si<strong>de</strong>rurgia e têxteis, entre vários outros. Por suas operações <strong>de</strong> compra <strong>de</strong> açõessem <strong>de</strong>manda no mercado <strong>de</strong> capitais, o BNDES atuava, <strong>de</strong>sse modo, como um dos principaissustentáculos do estado patrimonial brasileiro nessa fase crítica da SI.43No Brasil, figura que <strong>de</strong>stoou <strong>de</strong>sse movimento <strong>de</strong> acomodação seria o economista e cientistaJosé Pelúcio Ferreira, i<strong>de</strong>alizador do primeiro fundo <strong>de</strong> tecnologia (FUNTEC) do BNDESe segundo Presi<strong>de</strong>nte da Financiadora <strong>de</strong> Estudos e Pesquisas (FINEP). Estimulou a criação68<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 68 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinaOutros fatores que ressaltam o relativo <strong>de</strong>sinteresse em inovar era apredominância <strong>de</strong> uma balança intensamente importadora <strong>de</strong> tecnologias;níveis inexpressivos <strong>de</strong> investimento em C&T e em P&D <strong>de</strong> parte <strong>de</strong>empresas e do Governo; e a primazia das universida<strong>de</strong>s públicas naformação <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra qualificada, com uma cultura <strong>de</strong> absorção <strong>de</strong>ssamão <strong>de</strong> obra basicamente pelo Estado (empresas públicas, autarquias,gran<strong>de</strong>s empreendimentos <strong>de</strong> infraestrutura e pelas universida<strong>de</strong>spúblicas). Ao adquirir tecnologias maduras para o setor produtivo, naforma <strong>de</strong> bens <strong>de</strong> capital, a América Latina <strong>de</strong>scurava das transformaçõesque se processavam na economia inter<strong>nacional</strong> e mostrava-se fragilizadadiante das reformas empreendidas por países asiáticos durante a década<strong>de</strong> 80, que se preparavam para ingressar na economia do conhecimento.O Brasil, ainda que tenha mantido a opção, durante o período dos choquesdos anos 70, <strong>de</strong> manter seu nível <strong>de</strong> investimentos em infraestrutura(a política do “ajuste mitigado”), não escaparia, juntamente com os<strong>de</strong>mais países do Continente, da condição <strong>de</strong> retardatário (late-comer)do processo <strong>de</strong> globalização.Carlota Pérez corrobora essa interpretação do “pecado original”da era pré-globalização e pré-concorrencial do setor privado latino--americano:A maior parte das empresas não foi constituída para evoluir. A maioria foi paraoperar tecnologias maduras, supostamente já otimizadas. Não se esperava queas empresas alcançassem competitivida<strong>de</strong> por elas próprias. A lucrativida<strong>de</strong>era <strong>de</strong>terminada por fatores exógenos, como a proteção tarifária, subsídios àexportação e numerosas formas <strong>de</strong> auxílio governamental, ao invés da capacida<strong>de</strong>da própria empresa aumentar a produtivida<strong>de</strong> ou qualida<strong>de</strong> (Pérez, p. 32, 1989;apud Cassiolato & Lastres, pp. 243-244, 2000).Não obstante as mazelas da fase final da SI, pô<strong>de</strong>-se registrar nesseperíodo certo avanço da capacida<strong>de</strong> tecnológica das empresas, por meio<strong>de</strong> inovações localizadas, parciais e incrementais, sempre com o benefícioda condição não concorrencial do capitalismo brasileiro. O fim da GuerraFria trouxe amplas evidências do fracasso do capitalismo <strong>de</strong> Estado a<strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 100 cursos <strong>de</strong> pós-graduação no Brasil, durante a sua gestão, e foi fundador daCoor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong>Janeiro (COPPE/UFRJ).69<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 69 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorque, <strong>de</strong> certo modo, a SI estava associada, e afastou dúvidas quanto ànecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um setor privado autônomo e exposto à concorrênciacomo agente <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Na América Latina, e particularmente noBrasil,A acomodação do Estado e do setor privado resultante foi um dos <strong>de</strong>terminantesprofundos da ineficiência e da falta <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> que envolveram a nossaindústria, e está na raiz do esgotamento <strong>de</strong> todo o ciclo <strong>de</strong>senvolvimentista (Arbix,p. 37, 2007).Não obstante ainda a correção do diagnóstico relativo à parcacompetitivida<strong>de</strong> da indústria na América Latina, o tratamento <strong>de</strong> choqueque se seguiu (ampla e incondicional abertura econômica, privatizações,<strong>de</strong>sregulamentação, retraimento do Estado e <strong>de</strong>sarticulação <strong>de</strong> setoresprodutivos nacionais) teve efeitos <strong>de</strong>letérios sobre as políticas <strong>de</strong><strong>inovação</strong> que se esboçavam na virada dos anos 80 para os 90, sobretudono Brasil, on<strong>de</strong> se vislumbravam boas perspectivas a partir da criação doMCT em 1985 e, antes, da promulgação da Lei n o 7.232/84, que instituiua Política Nacional <strong>de</strong> Informática 44 . Tais efeitos <strong>de</strong>letérios – que sóviriam a ser parcialmente revertidos mais para o final da década, coma criação e multiplicação <strong>de</strong> Fundos Setoriais – consubstanciavam-sena <strong>de</strong>sarticulação do setor privado do país, cujo potencial dinamismopassou a ser assumido pelas multinacionais, o que acabou por exacerbaro afastamento entre universida<strong>de</strong> e indústria. Sendo o setor dinâmico<strong>de</strong>ssa última <strong>de</strong> natureza trans e multi<strong>nacional</strong>, os impulsos para a<strong>inovação</strong> provinham das matrizes, <strong>de</strong> forma codificada, e num contexto<strong>de</strong> enrijecimento contínuo do regime <strong>de</strong> proteção patentária adotado pelopaís 45 . Por outro lado, é inegável que a estabilida<strong>de</strong> macroeconômica44Uma das mais eloquentes <strong>de</strong>fesas da política brasileira <strong>de</strong> apoio à informática nos anos 80 éa <strong>de</strong> Evans (1986).45O marco <strong>de</strong>sse novo regime liberalizante terá sido a promulgação da Lei <strong>de</strong> Patentes (n o 9.279, <strong>de</strong>14/05/96). Alguns autores interpretam, contudo, <strong>de</strong> forma positiva e diferente as políticas <strong>de</strong> aberturaeconômica dos anos 90 e sugerem que favoreceram a capacitação tecnológica da indústria <strong>nacional</strong>:“Do ponto <strong>de</strong> vista dinâmico, dados apontam para uma certa estabilida<strong>de</strong> da participação <strong>de</strong> setoresintensivos em tecnologia, cujo <strong>de</strong>slocamento, como apontado pelas novas teorias do crescimento,po<strong>de</strong>ria comprometer os ganhos dinâmicos da abertura. Nesse contexto, os impactos positivos sobreo progresso técnico <strong>de</strong>rivado do acesso a bens <strong>de</strong> capital da fronteira, a menores custos, e dos maioresincentivos gerados pela concorrência dos importados, parecem ter garantido um saldo claramentepositivo em termos <strong>de</strong> estímulo ao crescimento econômico.” (Moreira & Correa, p. 89, 1997).70<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 70 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinaalcançada no período – ainda que não a “econômica”, em sentido lato– propiciaria as bases para o “neo<strong>de</strong>senvolvimentismo” do período2003 – dias atuais e suas implicações para as políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico 46 .Po<strong>de</strong>-se relacionar cinco consequências <strong>de</strong>sestimuladoras para a<strong>inovação</strong> na América Latina durante os anos 90, que <strong>de</strong>puseram contraa constituição <strong>de</strong> SNI em países do Continente. Se na primeira meta<strong>de</strong>da década procurava-se remover os resquícios da SI que atravancavam apassagem para um novo contexto <strong>de</strong> reforma, disciplina e realismo fiscais,na segunda meta<strong>de</strong>, quando esse bloco <strong>de</strong> reformas havia avançado,eclodiu a crise financeira das economias emergentes, cujo epílogo foi aimplosão da política <strong>de</strong> conversibilida<strong>de</strong> na Argentina.O primeiro fator refere-se às consequências diretas da disseminaçãodo Consenso <strong>de</strong> Washington, que levou a uma drástica retração dacapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o Estado formular políticas públicas mais agressivaspara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. Segundo Sutz (p. 286, 2000), a transferência<strong>de</strong> parte das políticas <strong>de</strong> crescimento do Estado para as multinacionaisenfraqueceu, como exemplo, a política <strong>de</strong> compras governamentais,comprometendo ainda mais a <strong>de</strong>manda do po<strong>de</strong>r público <strong>de</strong> bens eserviços <strong>de</strong> alto conteúdo tecnológico e dificultando a aproximação entreempresas e universida<strong>de</strong>s.Um segundo fator terá sido o aprofundamento paradoxal da<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> recursos naturais num período <strong>de</strong> <strong>de</strong>svalorização46As diferenças essenciais entre o <strong>de</strong>senvolvimentismo da fase <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> importaçõese o atual foram tratados por Bresser-Pereira (2004) e Sicsú, De Paula & Michel (2007). Oprimeiro infere que “O antigo <strong>de</strong>senvolvimentismo estava baseado no mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> substituição<strong>de</strong> importações e, portanto, na proteção da conta comercial. Hoje, os gran<strong>de</strong>s protecionistassão os países ricos. Ao Brasil, interessa continuar a abrir sua conta comercial, embora <strong>de</strong> umaforma negociada, com a <strong>de</strong>vida reciprocida<strong>de</strong>, para po<strong>de</strong>r exportar. Segundo, o Brasil já temuma infraestrutura econômica razoavelmente instalada, <strong>de</strong> forma que não há mais necessida<strong>de</strong><strong>de</strong> o Estado investir diretamente em indústrias como a si<strong>de</strong>rúrgica ou a petroquímica, que o setorprivado po<strong>de</strong> conduzir melhor. Terceiro, a preocupação com a estabilida<strong>de</strong> macroeconômica éhoje mais necessária do que no passado <strong>de</strong>vido à instabilida<strong>de</strong> causada pelos fluxos <strong>de</strong> capitalinternacionais.” O segundo grupo <strong>de</strong> autores argumenta em termos semelhantes, no sentido <strong>de</strong>que “(...) a alternativa novo-<strong>de</strong>senvolvimentista não objetiva pavimentar a estrada que po<strong>de</strong>rialevar o Brasil a ter uma economia centralizada, com um Estado forte e um mercado fraco. Estaalternativa também não objetivaria construir o caminho para a direção oposta, em que unicamenteo mercado comandaria a economia, com um Estado fraco. Uma visão novo-<strong>de</strong>senvolvimentistarejeitaria essas duas possibilida<strong>de</strong>s extremas.” (Bresser-Pereira, p. B-2, 2004; Sicsú, De Paula& Michel, p. 509, 2007).71<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 71 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorestrutural do preço das commodities no mercado inter<strong>nacional</strong>, comouma consequência diretamente observável da globalização e <strong>de</strong> seucomponente central <strong>de</strong> avanço tecnológico generalizado. Segundoinforme da CEPAL <strong>de</strong> 1996,O processo <strong>de</strong> reestruturação do aparato produtivo [na América Latina] temmostrado uma tendência generalizada <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> uso intensivo <strong>de</strong>recursos naturais próprios e contra a utilização <strong>de</strong> produtos que po<strong>de</strong>riam incorporarproporcionalmente maior intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> engenharia e tecnologia(CEPAL, p. 71, 1996; apud SUTZ, p. 286, 2000).Tal avaliação é corroborada por estatísticas que assinalam a quedaexpressiva da participação <strong>de</strong> manufaturas e <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> maior valoragregado no PIB <strong>de</strong> países como Argentina, Brasil, Chile e México(Martins, p. 162, 2003). A contração industrial levada a cabo pelaabertura da economia latino-americana teria acarretado, <strong>de</strong>ssa forma,uma redução da <strong>de</strong>manda por <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> estímulos para a absorção ouprodução <strong>de</strong> novas tecnologias e <strong>de</strong> conhecimento associado a processosinovadores, levando ao que fora caracterizado pela CEPAL (p. 71, 1996)<strong>de</strong> “inserção regional neoperiférica” da América Latina na economiamundial 47 . O ambiente político dos anos 90 fortalecia, além disso, entreformuladores <strong>de</strong> política, a convicção neoclássica <strong>de</strong>terminista <strong>de</strong> que47A relação entre <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> matérias-primas (com o consequente baixo grau <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>,<strong>de</strong> diversificação e <strong>de</strong> agregação <strong>de</strong> valor ao produto) e vulnerabilida<strong>de</strong> econômica dos paíseslatino-americanos, especialmente os andinos, foi tratada por Vial (2002). O trabalho <strong>de</strong>monstracomo a alta concentração da pauta exportadora em poucos produtos primários <strong>de</strong>ixa esses paísesparticularmente vulneráveis a choques externos. O Brasil seria o país com o menor coeficiente<strong>de</strong> vulnerabilida<strong>de</strong> no Continente às crises externas, mas países como Venezuela, Peru, Equador,Colômbia e Bolívia (esta, em menor grau entre os <strong>de</strong>mais) estariam mais expostos à volatilida<strong>de</strong>dos mercados financeiros e <strong>de</strong> seus termos <strong>de</strong> intercâmbio. Segundo o autor, esses termos “(...)po<strong>de</strong>m ser muito voláteis porque sua [corrente <strong>de</strong> comércio] está muito concentrada em poucosprodutos <strong>de</strong> preços muito voláteis, sejam ou não recursos naturais; está, além disso, baseada emimportações muito concentradas ou ainda porque, mesmo que as exportações sejam diversificadas,estão dirigidas a um único mercado importante”.Po<strong>de</strong> ocorrer também que haja “(...) uma forte especialização em poucos produtos sem relaçãodireta com recursos naturais, mas que são poucos e po<strong>de</strong>m ser atingidos por flutuações, comimpacto muito forte na economia <strong>nacional</strong> (Costa Rica, por exemplo). Um terceiro caso po<strong>de</strong> seraquele em que o país tenha uma pauta exportadora bastante diversificada em termos <strong>de</strong> produtos,mas muito concentrada em um único mercado <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino (México ou Canadá, por exemplo),<strong>de</strong> modo que o ciclo da economia importadora se transfere diretamente ao país exportador”(Vial, pp. 8-9, 2002, grifo meu).72<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 72 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinao avanço tecnológico, como fator exógeno do crescimento, se seguiriamecanicamente à estabilização, como consequência <strong>de</strong> uma pretendidadinâmica gerada pela liberalização.Um terceiro e relativamente insólito fator <strong>de</strong>sestimulador da<strong>inovação</strong> latino-americana nos anos 90, apontado por Sutz (p. 287,2000), são os conflitos e a proverbial <strong>de</strong>sconfiança entre a universida<strong>de</strong>e o setor produtivo. Se bem que a ascensão das oposições ao po<strong>de</strong>r apartir do começo <strong>de</strong>sta década arrefeceu substancialmente esse tipo <strong>de</strong>animosida<strong>de</strong>s, fortalecendo, portanto, a conectivida<strong>de</strong> e a interativida<strong>de</strong>entre os três vetores da <strong>inovação</strong>, nos anos 90 tais conflitos nutriam-seda memória do patrimonialismo e do cartorialismo do período da SI enotadamente dos tempos da “Nova República”, assim como do própriomo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> abertura e <strong>de</strong> importação <strong>de</strong> tecnologias maduras e acabadasdos anos 90 48 .As <strong>de</strong>sconfianças da universida<strong>de</strong> com o setor produtivo<strong>de</strong>corriam (e <strong>de</strong>correm, ainda em certos países) do fato <strong>de</strong> este últimoter historicamente prescindido da <strong>inovação</strong> e da P&D como fator<strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> inserção, preferindo antes os favores <strong>de</strong>generosas políticas fiscais, do rentismo ou mesmo do subsídio e dassubvenções diretas a empresas ineficientes e/ou que se mantinham nomercado à custa da produção padronizada e rotinizada, <strong>de</strong>satentas àscondições trabalhistas e laborais e <strong>de</strong>sacostumadas à concorrência. Auniversida<strong>de</strong> mantinha relações <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconfiança com o setor público,sobretudo nos anos 90, por este constituir-se no outro polo da relaçãoque perpetuava o patrimonialismo e que, mais recentemente, haviapermitido justamente a <strong>de</strong>s<strong>nacional</strong>ização <strong>de</strong> parte importante daprodução. Em qualquer cenário, a universida<strong>de</strong> via-se alijada ou,no máximo, ocupava posição marginal ou “cosmética” nos projetos<strong>de</strong> crescimento e estabilização, coerentemente com a perspectivaexógena da C&T atribuída pelos neoclássicos aos processos <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. Bértola et al. (2005) sintetizam esse entraveestrutural básico para a <strong>inovação</strong> no contexto uruguaio, que po<strong>de</strong>,entretanto, ser perfeitamente estendido à maior parte da AméricaLatina, pelo menos até meados dos anos 90:48O conceito <strong>de</strong> “Estado cartorial” foi proposto por Jaguaribe (p. 99, 1958) e retomado emJaguaribe et al. (pp. 48-50, 1989).73<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 73 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorA concentração do po<strong>de</strong>r nas mãos <strong>de</strong> poucos atores políticos estimula osempresários a perseguir rendas especulativas e a dirigir seus esforços à obtenção<strong>de</strong> favores políticos, antes que a inovar para obter vantagens competitivas genuínas(Bértola, p. 14, 2005).Em conexão com os fatores acima, como a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisaestava e está (a <strong>de</strong>speito da expansão vertiginosa do ensino privado)fundamentalmente a cargo das universida<strong>de</strong>s públicas – que respon<strong>de</strong>mpor praticamente a totalida<strong>de</strong> da C,T&I produzida em suas respectivasáreas em diversos países – e como a universida<strong>de</strong> travou lutas <strong>de</strong>cisivaspela mudança política – a começar pela luta contra os regimes <strong>de</strong> exceçãodos anos 70 e 80 – a sua contribuição direta para a <strong>inovação</strong> econômicaviu-se notavelmente atrasada. Não é mera coincidência, portanto, que ofim dos regimes <strong>de</strong> exceção, o esgotamento da SI e a relativa superaçãodas políticas dos anos 90, consubstanciadas no Consenso <strong>de</strong> Washington,testemunharam o início <strong>de</strong> novo ciclo <strong>de</strong>senvolvimentista no Continente,no qual a universida<strong>de</strong> ocupa um papel muito mais proeminente queoutrora 49 .Diante do contraste entre os dois tempos ocupados pelauniversida<strong>de</strong> na América Latina, até o final dos anos 90 e <strong>de</strong>pois, po<strong>de</strong>seagora vislumbrar duas funções essenciais adicionais da universida<strong>de</strong>contemporânea latino-americana, além das duas tradicionais (ensinoe pesquisa) e da terceira, <strong>de</strong> elemento facilitador da transferência eabsorção <strong>de</strong> tecnologia <strong>de</strong> parte das empresas, tal como propuseramEtzkowitz e Ley<strong>de</strong>sdorff em textos (1997 e 2000) mencionados nocapítulo anterior: uma seria a necessida<strong>de</strong> e a disposição correspon<strong>de</strong>nte<strong>de</strong> fazer com que a pesquisa possa ter um retorno social mais rápidoou imediato, a <strong>de</strong>speito das essenciais consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> Lundvall &Borrás (p. 606, 2006) acima assinaladas, <strong>de</strong> assegurar a manutenção <strong>de</strong>um status epistemológico minimamente condizente com as exigênciasdo rigor e do método científico. A consciência <strong>de</strong>ssa premência socialna universida<strong>de</strong> latino-americana tem ensejado práticas como atuaçãocomunitário-profissional; orientação para a solução <strong>de</strong> problemassociais locais e regionais; a intensificação da pesquisa participativa e49É particularmente feliz a antítese proposta por Matil<strong>de</strong> Luna no título do seu “La visión<strong>de</strong>l sector privado hacia la universidad pública: <strong>de</strong> semillero <strong>de</strong> guerrilleros a semillero <strong>de</strong>empren<strong>de</strong>dores” (1997).74<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 74 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latina<strong>de</strong> campo; a participação em programas <strong>de</strong> apoio às micro e pequenasempresas; a participação em arranjos produtivos locais; e, justamente,maior interativida<strong>de</strong> com o po<strong>de</strong>r público, em seus diversos níveis, ecom a socieda<strong>de</strong> civil, <strong>de</strong> modo a facilitar a compreensão dos problemase necessida<strong>de</strong>s da população em geral 50 .Este último ponto remete-nos à quinta função da universida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> atorsocial e <strong>de</strong> partícipe do processo político (cuja expressão mais extremaseria a <strong>de</strong> ser o semillero <strong>de</strong> guerrilleros dos anos 60 e 70), que levouàs transformações sociais e políticas experimentadas no Continente nasúltimas décadas. Se bem que tal função confun<strong>de</strong>-se em si mesma coma própria história da instituição universitária, primeiro no Oci<strong>de</strong>nte e,<strong>de</strong>pois, no mundo, a novida<strong>de</strong> é que esse papel renovado da universida<strong>de</strong>ganha importância crescente na medida em que – como vem ocorrendonos últimos tempos – passa a dispor <strong>de</strong> condições econômicas, materiais,políticas e sociais substancialmente melhores para coarticular com os<strong>de</strong>mais atores primordiais do <strong>sistema</strong> uma política e um processo <strong>de</strong><strong>inovação</strong> <strong>nacional</strong>.Retornando à discussão dos fatores <strong>de</strong>sestimuladores da <strong>inovação</strong>na América Latina, o quarto e mais importante é o caráter estrutural epersistente da pobreza e das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s.O vínculo entre pobreza, baixo crescimento econômico e baixastaxas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> em países <strong>de</strong> menor <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo jáhavia sido intuído em 1952 pelo economista estônio Ragnar Nurkse,em sua formulação sobre o “círculo vicioso da pobreza” 51 : países combaixo nível <strong>de</strong> renda per capita e/ou <strong>de</strong> elevada concentração <strong>de</strong> rendanão teriam disponibilida<strong>de</strong> nem incentivos para investir; o baixo nível<strong>de</strong> investimento acarretaria baixos níveis <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> do trabalho(e, consequentemente, condições insuficientes para a <strong>inovação</strong> e o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico e tecnológico); com a baixa produtivida<strong>de</strong>,viria então baixos níveis <strong>de</strong> renda (com a consequente baixa propensãoa poupar), <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda e <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> capital, completando-se a50Exemplo eloquente <strong>de</strong>ssas novas funções da Universida<strong>de</strong> latino-americana tem sido arealização dos “Seminários Regionais Permanentes” sobre Universida<strong>de</strong> e Integração Fronteiriça,mobilizadores <strong>de</strong> <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong>ssas instituições atuantes na fronteira dos países sul-americanos. Omais recente dos quais teve lugar na Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Pelotas (UFPel), em maio <strong>de</strong> 2011.51Naturalmente que a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> “<strong>inovação</strong>” ainda não havia ainda sido elaborada plenamente,mas o pensamento <strong>de</strong> Schumpeter, que lançara suas bases, circulava com gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolturana Europa no período pós-Guerra.75<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 75 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorconhecida tautologia presente em teorias do sub<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> que“um país é pobre porque é pobre” (Nurkse, p. 571, 1952).Naturalmente que a tese do “círculo vicioso”, embora inteiramenteválida para a maioria dos países da África subsaariana, tem alcanceapenas limitado na América Latina, e ainda assim em economiasmenores amplamente dominadas por matérias-primas e por setoreseconômicos tradicionais. Alguns países – impulsionados por amplosmercados domésticos, por acordos <strong>de</strong> integração regional ou <strong>de</strong> livre--comércio e por políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> industrial (casos <strong>de</strong>Brasil, México e Argentina) – lograram escapar em parte do círculo dapobreza, associado à <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> matérias-primas e vulnerabilida<strong>de</strong>cíclica das contas externas ao contexto macroeconômico dos seusprincipais mercados comerciais. No entanto, fica claro no esquemateórico do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> Nurkse – inspirado em Gunnar Myrdal,sem que ambos jamais o tenham enunciado nesses termos – que oponto <strong>de</strong> rompimento da “trajetória <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência” da pobreza sesitua na capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> doméstico <strong>de</strong>P&D. Isso porque problemas <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> capital em países nãoindustrializados <strong>de</strong>correm do fato <strong>de</strong> que investimentos não produtivosou produtivos <strong>de</strong> baixa intensida<strong>de</strong> tecnológica não geram ativos estáveis,imobilizados, capazes <strong>de</strong> impactar favoravelmente os fundamentos daeconomia. Investimentos em setores mais avançados ou <strong>de</strong> maior valoragregado, ou ten<strong>de</strong>ntes a evoluir para esses setores (como o exemploda implantação da indústria automobilística no Brasil, nos anos 50) sãocapazes <strong>de</strong> gerar transbordamentos (“spillovers”) formadores <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>iasprodutivas ou <strong>de</strong> valor. Tais investimentos, além <strong>de</strong> estarem baseados emformação e transferência <strong>de</strong> conhecimento, são mais difíceis <strong>de</strong> serem<strong>de</strong>sarticulados e dispõem <strong>de</strong> maior flexibilida<strong>de</strong> para enfrentar choquesexternos. Isso justamente por conta dos fatores intangíveis que assegurama cumulativida<strong>de</strong> e a irreversibilida<strong>de</strong> do conhecimento os quais, naprática, funcionam como ativos econômicos permanentes.Políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, transferência e absorção <strong>de</strong> tecnologia,preferivelmente a <strong>de</strong>senvolvida no próprio país, região ou blocoeconômico são, portanto, o primeiro fator a se ter em conta quando seprocura combater os fatores estruturais da pobreza, que radicam, emúltima análise, na incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> os segmentos mais marginalizados dasocieda<strong>de</strong> terem acesso ao conhecimento, em suas diversas modalida<strong>de</strong>s76<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 76 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinae expressões, caracteristicamente na forma da educação sistemática esequencial, <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> crucial do Estado. A lógica econômica(além <strong>de</strong> ética, filosófica e política) que nos impele a priorizar a educaçãobásica como política <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>de</strong> inclusão é a mesma queexige um firme pacto social entre os três principais agentes da <strong>inovação</strong>, eentre estes e a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> modo geral, para alavancar maior capacitaçãocientífico-tecnológica do país e consequentemente modificar seu nível<strong>de</strong> inserção inter<strong>nacional</strong> e sua posição relativa na divisão inter<strong>nacional</strong>do trabalho.Judith Sutz (p. 287, 2000) alerta para as consequências sociais eeconômicas da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> como obstáculo ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecno--produtivo:[Nesse cenário,] a <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> estimula a adoção <strong>de</strong> opções fáceis do tipocompetitivida<strong>de</strong> espúria baseada em salários baixos e uso insustentável <strong>de</strong> recursosnaturais, parca atenção a direitos trabalhistas, baixa priorida<strong>de</strong> à formação eeducação <strong>de</strong> trabalhadores e estratégias curto-prazistas <strong>de</strong> maximização dolucro. Quando a gran<strong>de</strong> maioria das empresas po<strong>de</strong> sobreviver e mesmo crescer<strong>de</strong>ssa forma, isto é, evitando os <strong>de</strong>safios da competitivida<strong>de</strong> estrutural baseadano conhecimento e na aprendizagem, será difícil que as universida<strong>de</strong>s sejamreconhecidas como parceiras potenciais no processo <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>de</strong>crescimento econômico.Uma quinta e última consequência <strong>de</strong>sestimuladora da <strong>inovação</strong>(resultado da combinação das épocas da SI e do Consenso <strong>de</strong> Washingtonna América Latina) é a indiferença, na maioria dos países, em relaçãoà formação <strong>de</strong> uma institucionalida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada para promover o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> um SNI. Incentivos fiscais são normalmenteconferidos sem condições <strong>de</strong> correta mensuração das contrapartidasexigidas; combinam-se duplicação <strong>de</strong> funções (como incentivos a P&Drealizados pelas mesmas empresas, proce<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> fontes múltiplas),vazios institucionais (como ausência <strong>de</strong> mecanismos <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação<strong>de</strong> esforços <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> entre as diversas esferas <strong>de</strong> Governo) e a<strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> provisão orçamentária ou <strong>de</strong> abastecimento <strong>de</strong>fundos <strong>de</strong> apoio a programas <strong>de</strong> C,T&I. Mais grave <strong>de</strong> tudo é a ausênciapronunciada – especialmente no Brasil, como veremos no capítulo IIIa seguir, realida<strong>de</strong> que perdura até os dias <strong>de</strong> hoje – da interativida<strong>de</strong>,77<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 77 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorcomo fator intangível e evolucionário dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, entreos diversos atores potencialmente capazes <strong>de</strong> realizá-los.Mencione-se, nesse aspecto, o pouco entusiasmo que políticas <strong>de</strong><strong>inovação</strong> <strong>de</strong>spertam junto ao setor privado e à socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> modo geral 52 ,basicamente pelo fato <strong>de</strong> essas políticas serem <strong>de</strong> longo prazo <strong>de</strong> maturaçãoe <strong>de</strong> evolução apenas incremental (em comparação com as estratégiaseminentemente curto-prazistas do empresariado) 53 . O <strong>de</strong>sequilíbrio damaioria dos <strong>sistema</strong>s nacionais latino-americanos, no sentido <strong>de</strong> que oGoverno ocupa posição largamente predominante na sua configuração– novamente o Brasil seria uma relativa exceção – também po<strong>de</strong> seratribuído a uma combinação paradoxal <strong>de</strong> ausência <strong>de</strong> regulamentos cominflação institucional, em que novos programas são criados para aten<strong>de</strong>ra <strong>de</strong>mandas pontuais do setor privado e da universida<strong>de</strong>, mas sem onecessário planejamento em termos <strong>de</strong> articulação <strong>de</strong>ssas <strong>de</strong>mandas comum projeto a longo prazo. Muitas vezes os novos programas são construídossobre os remanescentes <strong>de</strong> outros já extintos ou <strong>de</strong>sativados. As questões<strong>de</strong> longo prazo e do déficit ou inflação institucional na constituição <strong>de</strong> umSNI conjugam-se entre si na medida em que a criação <strong>de</strong> instituições eprogramas somente se justificam, nesse aspecto, quando concebidas comopolíticas <strong>de</strong> Estado, e não <strong>de</strong> governo. Nessa moldura institucional <strong>de</strong>longo prazo, <strong>de</strong>ve ficar claro que nenhum vértice do “Triângulo <strong>de</strong> Sábato”<strong>de</strong>ve ter absoluta primazia na configuração do <strong>sistema</strong>, embora tambémsejam claras as responsabilida<strong>de</strong>s diferenciadas do Estado em sua fase <strong>de</strong>constituição. Conforme argumenta Hollingsworth (p. 12, 2002),52Park & Park (2003) quantificaram a emergência <strong>de</strong> um genuíno <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> quandoinvestimentos em P&D passam a representar 2% do PIB, ponto a partir do qual um SNI adquirecomportamento propriamente sistêmico. Segundo os autores (p. 412), “Essa barreira <strong>de</strong> 2%não é <strong>de</strong> forma alguma arbitrária. Devido a restrições orçamentárias enfrentadas pelo setorpúblico, o nível <strong>de</strong> 2% é atingido apenas quando o setor privado contribui com a maior partedo investimento <strong>nacional</strong> em P&D e, <strong>de</strong>sse modo, chega-se a uma divisão balanceada entre opúblico e o privado.” Como crítica ao cuidadoso trabalho empírico realizado pelos autores,ressalte-se o fato <strong>de</strong> aspectos econômicos intangíveis, sobretudo a intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecimentotácito presente nas articulações sistêmicas, não terem sido levados em consi<strong>de</strong>ração no estudo.O Reino Unido, por exemplo (cuja economia é marcada pela presença especialmente marcante<strong>de</strong> fatores e condições impon<strong>de</strong>ráveis para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> seu <strong>sistema</strong>, sobretudo no quese refere a condições para a disseminação da aprendizagem), vem dispen<strong>de</strong>ndo 1,9% <strong>de</strong> seu PIBnos últimos anos com P&D.53É sintomática, nesse sentido, a longa espera, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início do Governo Lula e mesmo um poucoantes, pela implantação e funcionamento <strong>de</strong> fábrica <strong>de</strong> fracionamento <strong>de</strong> plasma (Hemobras)em Pernambuco.78<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 78 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinaSe houvesse uma socieda<strong>de</strong> puramente <strong>de</strong> mercado ou uma socieda<strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nadaunicamente pelo Estado, haveria muita rigi<strong>de</strong>z e pouca diversida<strong>de</strong> para lidar comas enormes incertezas do ambiente [econômico] global. A socieda<strong>de</strong> com muitopouca diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mecanismos <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação teria pouca capacida<strong>de</strong> paraadaptar-se às novas circunstâncias.Em síntese, pelas características do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> SI e do Consenso<strong>de</strong> Washington, fica claro que ambas as fórmulas, apesar dos principaispontos positivos que legaram para a economia latino-americana –criação <strong>de</strong> um mercado e <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> massa, numcaso, e estabilida<strong>de</strong> institucional com disciplina fiscal e monetária,em outro – <strong>de</strong>scuraram amplamente, na maioria das vezes, da criaçãoe fortalecimento institucional, político e econômico <strong>de</strong> um SNI. Noprimeiro caso, pelas facilida<strong>de</strong>s concedidas ao setor privado <strong>de</strong>rivadas<strong>de</strong> sua condição monopolista, patrimonialista, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte e associada;em outro, pelo estancamento da <strong>inovação</strong> e pelo retraimento do Estado,a partir da percepção neoclássica <strong>de</strong> que o equilíbrio e o crescimentoeconômico – e, consequentemente, a <strong>inovação</strong> e o avanço tecnológico –dar-se-iam amplamente pela dinâmica da competição privada 54 .Ainda que a presente década, sobretudo a partir do fim daconversibilida<strong>de</strong> na Argentina, tenha testemunhado a superação <strong>de</strong>muitos dos entraves <strong>de</strong> que pa<strong>de</strong>ciam os processos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>e <strong>de</strong> crescimento e estabilização <strong>de</strong> décadas passadas, persistem nosdias atuais transtornos característicos do período da SI e típicos da<strong>de</strong>sregulamentação <strong>de</strong> mercados, que representam obstáculos <strong>de</strong> montaao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico da América Latina. Tratarei rapidamentea seguir <strong>de</strong>ssas dificulda<strong>de</strong>s mais contemporâneas e <strong>de</strong> seu impactoespecífico no programa neo<strong>de</strong>senvolvimentista em implantação, comas consequentes repercussões para a capacitação tecnológica brasileira.Depois, inaugura-se a segunda parte <strong>de</strong>ste trabalho, <strong>de</strong> caráter maisempírico-<strong>de</strong>scritivo, alusiva ao estudo dos exemplos brasileiro, daChina e do Reino Unido, nessa or<strong>de</strong>m, com foco no funcionamento dosrespectivos SNI.54Conforme complementam Cassiolato & Lastres, escrevendo em 2000 (p. 247), “O resultadolíquido é que o capital tecnológico, assim como parte importante da capacitação dos recursoshumanos gerados e acumulados <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o período <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> importações, tornaram-seobsoletos no período atual.”79<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 79 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior2.1 – A re<strong>de</strong>scoberta do mercado externo e o lento <strong>de</strong>spertar da<strong>inovação</strong>Os primeiros anos da década passada foram marcados pela chegadadas oposições ao po<strong>de</strong>r na América Latina e, no caso brasileiro, observouse,<strong>de</strong>s<strong>de</strong> algo antes, importante mo<strong>de</strong>rnização e aprimoramento dacultura empresarial e das práticas <strong>de</strong> gestão e capacitação tecnológica doempresariado brasileiro. Forçados pela competição dos anos 90, algunssegmentos importantes da indústria, especialmente a <strong>de</strong> transformaçãoe o agronegócio, lograram superar o arcaísmo que caracterizava – e aindacaracteriza, em certa medida – as relações <strong>de</strong> produção no país. Talmo<strong>de</strong>rnização, <strong>de</strong>finida essencialmente pela aplicação <strong>de</strong> padrõesglobais <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> à produção, tanto privada quando dasempresas estatais, chegou ao seu ponto mais conspícuo em 2007, quandopela primeira vez o país registrou níveis mais elevados <strong>de</strong> investimentoexterno do que atração <strong>de</strong> investimentos <strong>de</strong> parte <strong>de</strong> companhias ecapitais estrangeiros. Outros dados indicadores <strong>de</strong>ssa mo<strong>de</strong>rnizaçãoincluem: a liquidação da dívida junto ao Fundo Monetário Inter<strong>nacional</strong>(FMI), em janeiro <strong>de</strong> 2006; obtenção <strong>de</strong> grau <strong>de</strong> investimento pelasagências classificadoras Fitch e Standard & Poor’s, em abril e maio <strong>de</strong>2008; elevação da rentabilida<strong>de</strong> das 500 maiores socieda<strong>de</strong>s anônimasbrasileiras, pelo quinto ano consecutivo (2003-2007), acima do patamar<strong>de</strong> 10%, resultado que não se observava <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo da década <strong>de</strong>80 55 ; crescimento da produção industrial <strong>de</strong> 5,3% em 2007, em relaçãoa 2006 (o crescimento fora <strong>de</strong> 2,8% em 2003, em relação a 2002) 56 ;elevação do nível das reservas internacionais, que alcançaram o patamar<strong>de</strong> US$ 200 bilhões; e significativo aumento da participação das classesmais <strong>de</strong>sfavorecidas nos níveis nacionais <strong>de</strong> consumo: a composiçãodas classes “A” e “B” passou <strong>de</strong> 20% para 23%; a “C” <strong>de</strong> 33% para49%; e as “D” e “E” encolheram <strong>de</strong> 46% para 27%, o que significaque houve melhoria importante das condições <strong>de</strong> vida e dos níveis <strong>de</strong>renda <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 46% dos mais pobres no Brasil (novembro <strong>de</strong> 2007 –dados comparativos em relação aos percentuais <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2002) 57 .55Revista Conjuntura Econômica, edição <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 2008.56Cenário Econômico – Macroanálise nº 180, edição <strong>de</strong> 02/01/08).57Folha <strong>de</strong> São Paulo, 16/12/07, p. B- 1.80<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 80 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinaA manutenção das políticas <strong>de</strong> estabilização macroeconômica– inclusive mediante a nomeação <strong>de</strong> dirigente da oposição para aPresidência do Banco Central –, a retomada do viés <strong>de</strong>senvolvimentistae exportador, relegado a plano secundário durante os anos 90 e ocenário inter<strong>nacional</strong> favorável foram fatores essenciais explicativosda mo<strong>de</strong>rnização econômica recente. Do lado do setor privado, foramregistradas mudanças radicais <strong>de</strong> perfil produtivo, corporativo eorganizacional, que po<strong>de</strong>m ser sintetizadas nos cinco pontos seguintes,relacionados por Arbix (p. 106, 2007):a) [adoção <strong>de</strong>] novas estratégias competitivas das empresas brasileiras voltadas paraconquistar novos mercados baseando-se na <strong>inovação</strong> tecnológica e na diferenciação<strong>de</strong> produtos; b) mudanças estruturais e organizacionais das firmas; c) a<strong>de</strong>quação dasfirmas às normas e padrões internacionais via <strong>inovação</strong> tecnológica; d) [aplicaçãodo critério da] <strong>inovação</strong> tecnológica (...) como fundamental para <strong>de</strong>terminar o<strong>de</strong>sempenho exportador das firmas; e e) novo esforço <strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong>ização dasfirmas brasileiras com foco na <strong>inovação</strong> tecnológica.Aspecto <strong>de</strong>terminante para se acompanhar a estabilização,mo<strong>de</strong>rnização e expansão econômica brasileiras recentes (e ainda que opanorama <strong>de</strong> crescimento geral da economia tenha-se situado em patamarinferior ao <strong>de</strong> outros países emergentes nos últimos anos) foi a expansãovertiginosa do agronegócio. Em 2007, o setor experimentou taxa <strong>de</strong>crescimento <strong>de</strong> 7,89% (SUT/CNA e CEPEA/USP). Entre julho <strong>de</strong> 2007e junho <strong>de</strong> 2008 a balança comercial brasileira do agronegócio teve umsuperávit <strong>de</strong> US$ 55 bilhões, contra um déficit <strong>de</strong> US$ 24,2 bilhões dos<strong>de</strong>mais setores (MAPA e SECEX/MDIC). Desse modo, o agronegócio,isoladamente, foi o gran<strong>de</strong> responsável pelo expressivo saldo <strong>de</strong>US$ 30,8 bilhões na balança comercial brasileira. O Brasil passou nosúltimos anos à condição <strong>de</strong> market maker mundial em uma cesta <strong>de</strong>produtos como carne bovina, soja, cana-<strong>de</strong>-açúcar, frango, milho e leite.Esse panorama, porém, e apesar do impacto sumamente positivosobre as contas nacionais e o setor externo da economia <strong>de</strong> maneirageral, é <strong>de</strong> contribuição não totalmente favorável para a transformaçãoqualitativa dos fundamentos da economia brasileira. Um primeiro fator<strong>de</strong> risco que a elevada <strong>de</strong>pendência do agronegócio po<strong>de</strong> acarretar paraa economia dos países latino-americanos e a brasileira em particular81<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 81 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorfoi assinalado anteriormente, na forma <strong>de</strong> uma correlação direta entrepredominância <strong>de</strong> produtos primários nas exportações e a vulnerabilida<strong>de</strong>dos países a choques externos (Vial, 2002); um segundo fator, associadoao primeiro, e <strong>de</strong>stacado por Drucker (1986) em sua análise dos fatoresestruturais da globalização econômica, é a <strong>de</strong>sconexão da economia <strong>de</strong>produtos primários da economia industrial. Ainda que a partir <strong>de</strong> 2003os preços internacionais das commodities tenham passado por elevaçãoprogressiva, tratava-se <strong>de</strong> fenômeno cíclico, alentado por investimentosespeculativos em bolsas <strong>de</strong> mercadorias e por expansão abrupta doconsumo global 58 . Entre diversos exemplos <strong>de</strong> <strong>de</strong>rrubada recente(<strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2008) <strong>de</strong> preços das mercadorias na sequência da criseeconômica global, assinale-se o da soja (40,5%, <strong>de</strong> US$ 555 a toneladamétrica em junho, para US$ 330 em fins <strong>de</strong> novembro); carne, queda <strong>de</strong>11,2%; petróleo, 59%; café, 17%; arroz, 32,5%; e cobre, 55% 59 .Um terceiro fator <strong>de</strong> risco da <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> commodities é suabaixa intensida<strong>de</strong> em investimentos, mão <strong>de</strong> obra e ciência e tecnologia.Ainda que no Brasil, neste último caso, sejam abundantes os exemplos<strong>de</strong> pesquisas que resultaram em melhoramentos genéticos <strong>de</strong> inúmerasespécies cultiváveis, como o caso do algodão, da cana-<strong>de</strong>-açúcar e dosuco <strong>de</strong> laranja 60 , trata-se <strong>de</strong> pesquisas voltadas para a manutenção dasproprieda<strong>de</strong>s básicas dos produtos, não havendo como alterar sua condiçãoeconômica básica <strong>de</strong> commodity. Um outro paradoxo ilustra os limitesda produtivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produtos agrícolas como fator <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>:<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1993 até os dias <strong>de</strong> hoje, a produção agrícola brasileira <strong>de</strong> grãos58As razões para a elevação do preço das commodities em 2008 foram abordadas pelo entãoMinistro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, em artigo publicado no jornal Folha<strong>de</strong> São Paulo (04/05/2008, p. A-3). Entre essas razões não constam – o que é essencial para oargumento <strong>de</strong>sta seção – problemas relativos à oferta ou <strong>de</strong> aumento da fome e da pobreza nomundo, havendo ocorrido justamente o oposto: aumento da oferta e do consumo e redução dafome e da pobreza, como tendência global (PNUD, pp. 45-46, 2003).59Cf. no portal , 7/12/2008.60O sequenciamento genético da Xyllela fastidiosa – bactéria que afeta os laranjais e cafezais<strong>de</strong> São Paulo (originando prejuízos anuais da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> US$ 100 milhões) – pelo consórcio“Organização para o seqüenciamento e análise <strong>de</strong> nucleotí<strong>de</strong>os” (ONSA, em inglês), coor<strong>de</strong>nadopela Fundação para o Amparo à Pesquisa do Estado <strong>de</strong> São Paulo – FAPESP, é consi<strong>de</strong>rado umdos gran<strong>de</strong>s feitos científicos e tecnológicos brasileiros recentes. Matéria sobre a pesquisa foipublicada na revista Nature, edição <strong>de</strong> 13/07/2000. Consi<strong>de</strong>re-se ainda a relação custo-benefíciodireta do investimento governamental em C&T (no caso, para o projeto ONSA/FAPESP), daor<strong>de</strong>m <strong>de</strong> US$ 15 milhões (Campos, p. 57, 2004), que resultou em benefícios anuais, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2001,dos US$ 100 milhões mencionados acima.82<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 82 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinacresceu <strong>de</strong> 57 milhões <strong>de</strong> T/ano para 145,7 milhões <strong>de</strong> T/ano, em 2008e 161,5 milhões em 2010/2011. Paralelamente, houve uma queda, <strong>de</strong>cerca <strong>de</strong> 24%, do valor bruto das vendas externas <strong>de</strong> grãos em 2005, emrelação a 2004, contra um <strong>de</strong>créscimo do volume exportado <strong>de</strong> apenas5,2% no mesmo período e com um incremento da área plantada, também<strong>de</strong> 2004 para 2005, <strong>de</strong> 736 mil hectares 61 .O paradoxo fica ainda evi<strong>de</strong>nte diante do crescimento continuado daprodutivida<strong>de</strong> do agronegócio brasileiro e do total exportável ano a ano,ao mesmo tempo em que os preços dos produtos agrícolas no mercadointer<strong>nacional</strong> comportam-se <strong>de</strong> maneira errática. Desse modo, o Brasilfica comprometido a ampliar cada vez mais suas exportações <strong>de</strong> produtosagrícolas para manter relativamente estável suas receitas. Quanto maior aprodução e a produtivida<strong>de</strong> brasileira, porém, maior o impacto negativosobre os preços, sobretudo em se consi<strong>de</strong>rando a condição do país <strong>de</strong>market maker em diversos produtos, apontada acima 62 .Um quarto fator seria a excessiva concentração do mercado <strong>de</strong>insumos básicos para a agricultura brasileira, em que apenas seisempresas açambarcam mais <strong>de</strong> 70% do mercado <strong>de</strong> <strong>de</strong>fensivos agrícolasdo país. No caso dos fertilizantes, essa relação é ainda mais <strong>de</strong>letéria, umavez que três empresas aten<strong>de</strong>m a mais <strong>de</strong> 95% do mercado <strong>de</strong> matérias--primas (Cargill, Bunge e Yara) 63 . O juízo <strong>de</strong> valor justifica-se pelo fato<strong>de</strong> que tal oligopolização reduz a concorrência e impacta negativamenteos preços dos produtos, sobretudo no mercado interno (com aumentos <strong>de</strong>61Cf. em Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística – IBGE, “Problemas climáticos fazemsafra <strong>de</strong> grãos cair 5,2% em 2005”, IBGE, Assessoria <strong>de</strong> Comunicação Social, 30/06/2006,disponível em: .62Uma outra perspectiva <strong>de</strong>sse paradoxo resi<strong>de</strong> no fato <strong>de</strong> que, se o aprimoramento da C&Tbrasileira no agronegócio contribui para a queda dos preços das commodities, com inegáveisreflexos positivos sociais para o mercado doméstico, por outro lado não gera efeitos impactantespositivos, em termos absolutos, para o valor das exportações – um dos esteios principais doatual mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong>senvolvimentista “para fora” do agronegócio. Conforme sustentam Costa &Freitas (2006:16), o melhoramento genético do milho, da soja e do trigo, em escala global, gerouaumento <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses cultivos e redução correspon<strong>de</strong>nte do preço. No caso do milho,o aumento <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> foi <strong>de</strong> 21% e a queda correspon<strong>de</strong>nte do preço, <strong>de</strong> 8%; para a soja,os níveis foram <strong>de</strong> 31% e 30%; e para o trigo, 34% e 28%, respectivamente. Em outras palavras,o aprimoramento tecnológico e a <strong>inovação</strong> no agronegócio resultam em ganhos apenas marginaisnos preços das mercadorias correspon<strong>de</strong>ntes.63Dados apresentados pelo Superinten<strong>de</strong>nte Técnico da Confe<strong>de</strong>ração Nacional da Agricultura– CNA, Ricardo Cotta Ferreira, no “II Curso sobre Cooperação Inter<strong>nacional</strong> em Ciência,Tecnologia e Inovação (C,T&I)”, Brasília, DCT/DCTEC, 20/08/08.83<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 83 10/10/2011 14:15:40


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junioraté 100%, em alguns casos), e faz com que parte expressiva das receitasauferidas pelo agronegócio brasileiro sejam dirigidas às matrizes daquelasempresas, <strong>de</strong>sviando novos investimentos no país, sobretudo em P&D,sem mencionar o impacto negativo sobre a competitivida<strong>de</strong> geral dosetor. Tal <strong>de</strong>pendência é ainda mais aguda na medida em que o Brasilnão dispõe <strong>de</strong> condições para tornar-se autossuficiente na produção <strong>de</strong>fosfatados e nitrogenados, base da produção <strong>de</strong> adubos, em prazo inferiora <strong>de</strong>z anos 64 .Um quinto problema seria o impacto ambiental da expansão doagronegócio, principalmente da criação bovina em áreas amazônicas,sobre a biodiversida<strong>de</strong> e sobre um potencial genético potencialmenteconversível em insumos biotecnológicos <strong>de</strong> alto valor agregado. Apesardos êxitos relativos do Ministério do Meio Ambiente em conter o ritmo<strong>de</strong> <strong>de</strong>smatamento na Amazônia, verifica-se uma expansão vertiginosa dafronteira pecuária naquela região, com a duplicação da população bovinaem <strong>de</strong>z anos, <strong>de</strong> 37 milhões para 73 milhões <strong>de</strong> cabeças em 2007. Nãoé <strong>de</strong>sprezível tampouco o impacto social <strong>de</strong>sse crescimento, que tem nogran<strong>de</strong> agronegócio seu principal componente, e com as consequênciasprevisíveis para a estabilida<strong>de</strong> social <strong>de</strong> povos tradicionais, populaçõesindígenas, ribeirinhos, pescadores e comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes daagricultura familiar e <strong>de</strong> subsistência 65 .À expansão da fronteira pecuária correspon<strong>de</strong> a expansão dasfronteiras energética e agrícola, sobretudo da monocultura da soja, naregião. Tal movimento tem implicações diretas para a política externabrasileira, uma vez que são intensamente questionados na Bolívia osprojetos <strong>de</strong> aproveitamento hidrelétrico do Rio Ma<strong>de</strong>ira (Santo Antônioe Jirau) e o escoamento <strong>de</strong>ssa produção estaria vinculado a projetos<strong>de</strong> integração da infraestrutura física sul-americana, como a RodoviaInteroceânica (que liga o Estado do Acre aos portos peruanos <strong>de</strong> Ilo,Matarani e San Juan <strong>de</strong> Ancona) e o eixo <strong>de</strong> transporte multimodalPaita-Yurimaguas, facilitando o transporte <strong>de</strong> pessoas e mercadoriasentre o Estado do Amazonas e os portos do norte do Peru. Tais projetos<strong>de</strong> integração física justificam-se, no plano estritamente econômico,64Estimativa do Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Reinhold Stephanes, durantelançamento do “Plano Safra” em Ponta Grossa-PR, julho <strong>de</strong> 2008.65Dados obtidos da matéria “Em <strong>de</strong>z anos, número <strong>de</strong> bois na Amazônia Legal quase dobrou”,Radiobras – Agência Brasil, 19/12/2007.84<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 84 10/10/2011 14:15:40


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinasobretudo pelas perspectivas <strong>de</strong> barateamento significativo do escoamentoda produção agrícola do Centro-Oeste brasileiro para os mercados daÁsia-Pacífico 66 .Não obstante os efeitos positivos <strong>de</strong>sse movimento para a integraçãosul-americana, Eduardo Gudynas critica o que seria uma “sojificação”brasileira e uma “primarização” das economias sul-americanas 67 . Oprincipal componente <strong>de</strong> uma integração física sul-americana baseadaem produtos primários seria, conforme sustenta o autor uruguaio, umacristalização <strong>de</strong> vantagens comparativas estáticas regionais, quando acompetição inter<strong>nacional</strong> exigiria investimentos mais <strong>de</strong>stacados emvantagens competitivas dinâmicas, o que relegaria a plano secundárioprojetos <strong>de</strong> expansão da base e da infraestrutura da produção,armazenamento e escoamento <strong>de</strong> commodities. Conforme apontaGudynas, as políticas <strong>de</strong> integração sul-americanas seriam marcadaspelo paradoxo <strong>de</strong> serem(...) apresentadas como <strong>de</strong> “integração regional”, quando na verda<strong>de</strong> se trata <strong>de</strong>“interconexões”, na maior parte fronteiriças, <strong>de</strong> modo a facilitar o transporte <strong>de</strong>mercadorias e fornecer recursos e energia necessários à expansão das exportações(Gudynas, p. 02, 2006).Esse padrão <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> “para fora”, característica <strong>de</strong> partesignificativa da economia brasileira, seria também questionado por Arbix(pp. 77-78, 2007):(...) estudos mais recentes sobre as exportações tornaram evi<strong>de</strong>nte que o Brasilpossui vantagens comparativas estáticas nos produtos intensivos em mão-<strong>de</strong>-66Sobre as priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> integração física do Itamaraty na América do Sul consultar a coletâneaObras <strong>de</strong> integración física en América <strong>de</strong>l Sur (MRE, 2007).67Tal diagnóstico aplicar-se-ia ao caso brasileiro caso sejam corretos os dados apresentadospela Associação <strong>de</strong> Comércio Exterior do Brasil (AEB), <strong>de</strong> que “cerca <strong>de</strong>” 65% das receitasdas exportações brasileiras provêm <strong>de</strong> commodities, e que “pela primeira vez <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1980 aparticipação dos manufaturados na pauta <strong>de</strong> exportações é inferior a 50%”. Conforme avaliouo Vice-Presi<strong>de</strong>nte da entida<strong>de</strong>, José Augusto <strong>de</strong> Castro, “Só o preço das commodities temcontribuído positivamente para o <strong>de</strong>sempenho da balança comercial, e isso é perigoso porquenão temos alternativa se a conjuntura mundial mudar.” Cf. em “Agronegócio garante saldocomercial”, Estado <strong>de</strong> S. Paulo, 13/07/08, p. B-1. Não obstante o tom um tanto alarmista damatéria, os números apresentados quanto a uma possível “reprimarização” da economia brasileiranão diferem significativamente dos apresentados mais acima pela Confe<strong>de</strong>ração Nacional daAgricultura e pelo CEPEA/USP.85<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 85 10/10/2011 14:15:41


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorobra pouco qualificada e recursos naturais; pesquisas mostram ainda que ainter<strong>nacional</strong>ização das empresas brasileiras tem sido mais evi<strong>de</strong>nte nas indústriasintensivas em mão-<strong>de</strong>-obra e recursos naturais.O atual quadro econômico do neo<strong>de</strong>senvolvimentismo indica aexistência <strong>de</strong> dois setores e processos bem-sucedidos para alavancaruma política sustentável <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>: o agronegócio e a recentemo<strong>de</strong>rnização do capitalismo brasileiro com a inter<strong>nacional</strong>ização <strong>de</strong>suas principais firmas. Um ponto a consi<strong>de</strong>rar, portanto – e isso <strong>de</strong>veráexigir uma ação mais direta do Estado brasileiro e mesmo do Itamaraty,como seu ponto <strong>de</strong> conexão com o entorno regional – é que o agronegóciorequer certos controles e externalida<strong>de</strong>s em seu processo <strong>de</strong> expansão(requisitos ambientais, disciplinas <strong>de</strong> utilização do solo e da proprieda<strong>de</strong>rural, estímulo à diversida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sincentivos ao monocultivo, preferênciapor arranjos produtivos mais intensivos em mão <strong>de</strong> obra e cooperativas,etc.), ao passo que as políticas <strong>de</strong> promoção da ciência e da tecnologiarequerem amplo esforço do Estado e da socieda<strong>de</strong> para se consolidaremcomo instrumento <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do país. Ou seja, enquanto há orisco <strong>de</strong> que a agenda do agronegócio se torne em parte negativa, a daC,T&I somente comporta aspectos potencialmente favoráveis (ao menosno caso brasileiro). Esse paralelo cobra sentido quando se consi<strong>de</strong>ra,por exemplo, que do total das exportações brasileiras <strong>de</strong> produtosindustrializados em 2006, apenas 8,7% correspondiam a produtos <strong>de</strong>alta intensida<strong>de</strong> tecnológica (MDIC/SECEX, 2007). Assim sendo,o esforço inovador brasileiro requer maior <strong>de</strong>dicação a setores maisintensivos em ciência e tecnologia, em sentido lato, do que propriamenteao agronegócio, em sentido estrito. No caso brasileiro, e a <strong>de</strong>speitoda existência <strong>de</strong> extensas áreas agricultáveis ainda inexploradas, osprodutos agrícolas e as commodities <strong>de</strong> modo geral (com exceção doshidrocarbonetos, cuja participação no mercado inter<strong>nacional</strong> obe<strong>de</strong>cea lógica distinta) aproximaram-se <strong>de</strong> limites <strong>de</strong> preço, produtivida<strong>de</strong>,concentração, oligopolização e, particularmente, <strong>de</strong>manda no mercadomundial. Sabe-se perfeitamente, sob uma outra ótica, que o problema dafome no mundo não <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> uma questão <strong>de</strong> escassez <strong>de</strong> oferta ou <strong>de</strong>produtivida<strong>de</strong>, mas <strong>de</strong> arranjos <strong>de</strong> preço, mercado, logística e canais <strong>de</strong>distribuição (ou seja, relaciona-se mais às distorções do <strong>sistema</strong> do que,como supõem os liberais-neoclássicos, a “falhas <strong>de</strong> mercado”).86<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 86 10/10/2011 14:15:41


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinaEm termos gerais, o argumento apresenta duas premissas: o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do agronegócio brasileiro encontra-se próximo dafronteira tecnológica mundial, sobretudo a partir <strong>de</strong> pesquisas naárea <strong>de</strong> engenharia genética; esse resultado, ainda que notável, nãoé por si só capaz <strong>de</strong> alçar o país ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>de</strong> modificarsua posição relativa na divisão inter<strong>nacional</strong> do trabalho, permitindoao país, na linha do aforismo <strong>de</strong> Ragnar Nurkse, <strong>de</strong>ixar, em muitosaspectos, <strong>de</strong> “ser pobre porque é pobre” 68 . Uma necessida<strong>de</strong> crucialdo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> brasileiro seria, portanto, o fortalecimento <strong>de</strong> seucapital tecnológico na indústria e nos serviços, como forma <strong>de</strong> alcançarmaior diversificação produtiva, garantindo por sua vez ampliação <strong>de</strong>mercados, elevação do nível geral da mão <strong>de</strong> obra, da oferta e qualida<strong>de</strong>do emprego e incremento da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> investimento do Estado.Conforme espero po<strong>de</strong>r sugerir convincentemente no capítulo VI infra,caberia ao Itamaraty importante papel nesse processo <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnizaçãoe diversificação tecnológica e inovadora <strong>de</strong> segmentos econômicos<strong>de</strong>cisivos para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.2.2 – Políticas <strong>de</strong> integração com base na <strong>inovação</strong>: o Mercosule a América do SulNo mesmo diapasão em que as diversas áreas geográficas etemáticas do MRE trabalham para promover a integração física,política e econômico-social da América do Sul, caberia um esforço<strong>de</strong> integração – além dos acordos <strong>de</strong> cooperação inter<strong>nacional</strong> e<strong>de</strong> iniciativas <strong>de</strong> cooperação/integração regional como a ReuniãoEspecializada <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia do Mercosul (RECyT) – nosentido <strong>de</strong> se buscar complementarida<strong>de</strong>s em C,T&I com os países daregião. Tais iniciativas po<strong>de</strong>riam contemplar a expansão da aindaincipiente integração produtiva, aproveitando-se a institucionalida<strong>de</strong>do Mercosul, da União <strong>de</strong> Nações Sul-Americanas (UNASUL)e/ou ainda da Organização do Tratado <strong>de</strong> Cooperação Amazônica68O Brasil, na verda<strong>de</strong>, em função dos seus dualismos sobejamente estudados na literaturaeconômica e sociológica, melhor seria caracterizado como um país “meio pobre”, em funçãodos seus renitentes indicadores <strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> renda, mas também pelo seu movimento <strong>de</strong>expansão e inclusão econômico-social fruto da mo<strong>de</strong>rnização. Melhor ainda seria relembraro conhecido diagnóstico <strong>de</strong> que o Brasil “não é um país sub<strong>de</strong>senvolvido, é um país injusto”.87<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 87 10/10/2011 14:15:41


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior(OTCA) 69 . No caso <strong>de</strong> integração <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> C&Tsul-americanas, cabe <strong>de</strong>stacar a proposta do Governo peruano, <strong>de</strong> abril<strong>de</strong> 2006 70 , <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> uma “Re<strong>de</strong> virtual <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> tecnológica”,no âmbito da então Comunida<strong>de</strong> Sul-Americana <strong>de</strong> Nações. O espíritoda proposta, que se coaduna com princípios da economia evolucionistapós-schumpeteriana (<strong>de</strong> romper com trajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência queajudaram a incutir uma visão <strong>de</strong>rrotista sobre a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossospaíses <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver uma civilização tecnológica avançada) contempla,entre outros princípios,(...) a integração das forças produtivas do espaço sul-americano, com o objetivo<strong>de</strong> impulsionar novas trajetórias tecnológicas em nossos países que incentivem acriação e a <strong>inovação</strong> e propiciem a implementação <strong>de</strong> projetos a fim <strong>de</strong> competir nomercado, sob a ótica <strong>de</strong> uma nova li<strong>de</strong>rança industrial, que promova a modificaçãodo padrão econômico primário-exportador em favor <strong>de</strong> outro <strong>de</strong> maior baseindustrial, que fortaleça nossas economias.No plano do Mercosul, a “diplomacia da <strong>inovação</strong>” po<strong>de</strong>ria fortalecere disseminar estudos e projetos <strong>de</strong> integração produtiva e <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ias<strong>de</strong> valor, tal como contemplado na Declaração nº 12/08 do Conselhodo Mercado Comum, aprovada durante a XXXV reunião do Conselhoem San Miguel <strong>de</strong> Tucumán, Argentina, em 30/06/08, que instituiu o“Programa <strong>de</strong> Integração Produtiva do Mercosul” 71 . Entre os pontosfortes a <strong>de</strong>stacar do programa mencionem-se a “iniciativa setorial <strong>de</strong>cooperação fronteiriça” 72 , a criação do “Grupo <strong>de</strong> integração produtiva doMercosul” e da “Agência Mercosul <strong>de</strong> integração produtiva”, assim comoa revitalização do “Observatório regional permanente sobre integração69Reunião <strong>de</strong> Ministros e Altas Autorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia dos países-membrosda OTCA; Estratégia <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia para a Amazônia; Reunião da Associação <strong>de</strong>Universida<strong>de</strong>s Amazônicas – UNAMAZ.70Carta do Chanceler Oscar Maúrtua <strong>de</strong> Romana ao Chanceler Celso Amorim, 21/04/2006.71Na mesma reunião do CMC foi aprovado o “Programa-marco <strong>de</strong> ciência, tecnologia e <strong>inovação</strong>do Mercosul para 2008-2012” (Declaração nº 03/08), cujo texto e apêndices estão disponíveisno en<strong>de</strong>reço .72Nesse aspecto, vale ressaltar que a Embaixada em Montevidéu vinha negociando com oMinistério do Desenvolvimento Social do Uruguai (MIDES) a mobilização da indústria uruguaia<strong>de</strong> software e componentes <strong>de</strong> informática a instalação <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviços e/ou produção emmunicípio da fronteira, com capital <strong>de</strong> risco, investimentos, tecnologia e P&D fornecidos porambos países, com apoio dos respectivos setores privados, e que preten<strong>de</strong> contar com recursosdo FOCEM.88<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 88 10/10/2011 14:15:41


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinaprodutiva no Mercosul” (ORPIP). Entre os princípios norteadoresdo Programa-marco <strong>de</strong> C,T&I 2008-2012, cabe mencionar o “Eixo”nº 04, que trata da integração da infraestrutura da C,T&I do bloco,dos respectivos marcos legais, capacitação profissional, cooperaçãointer<strong>nacional</strong> extrabloco, mecanismos <strong>de</strong> financiamento e base <strong>de</strong> dadospara a informação <strong>de</strong> C,T&I dos países da região.Não obstante a riqueza, o alcance e a antevisão que tais iniciativaspropiciam, há <strong>de</strong> se lembrar que não são inéditas, havendo antece<strong>de</strong>ntesnão tão longínquos e <strong>de</strong> nível <strong>de</strong> ambição comparável ao do novo marconormativo da integração regional 73 . Em 26/09/02, por ocasião <strong>de</strong> visitado então Presi<strong>de</strong>nte Eduardo Duhal<strong>de</strong> a Brasília, Brasil e Argentinaadotaram “Entendimentos bilaterais sobre temas econômico-comerciais”,nos quais constava em <strong>de</strong>staque o tema da integração produtiva e daconstituição <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ias produtivas, na sequência do Acordo assinado em21/03/2002 74 . Tais entendimentos geraram compromissos subsequentes<strong>de</strong> integração produtiva para os setores automotivo, turismo, ma<strong>de</strong>iras,móveis e frangos e suínos.Tal como se encontrava enunciado no texto dos Entendimentos ficapatente que a perspectiva da integração produtiva se dava no sentido<strong>de</strong> promover e fortalecer as vantagens competitivas estáticas <strong>de</strong> ambospaíses, a partir <strong>de</strong> produtos que já contavam com importante presença<strong>de</strong> mercado inter<strong>nacional</strong>, inclusive extrarregional. Nesse sentido, muitoembora fosse correto falar-se <strong>de</strong> integração produtiva, não se tratava<strong>de</strong> complementação produtiva, ou <strong>de</strong> integração produtiva calcada empolíticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> parcerias tecnológicas.Nesse aspecto, o programa <strong>de</strong> integração produtiva no Mercosul quetalvez mais tenha sido lembrado foi o “Foro <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> da ca<strong>de</strong>ia73O então Embaixador em Buenos Aires, José Botafogo Gonçalves, opinou, em 2003, que “Aintegração das ca<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> valor seria o passo crucial para o estabelecimento <strong>de</strong> uma verda<strong>de</strong>iraintegração econômica.” Cf. em “Argentina recupera-se do <strong>de</strong>sastre, diz Embaixador” (Tempo RealCEBRI, ed. <strong>de</strong> 07/05/2003, p. 02. Disponível em .74Gazeta Mercantil, 22/03/2002. O parágrafo dos “Entendimentos Bilaterais” que se referia àsca<strong>de</strong>ias produtivas anunciava que “Os dois Governos ratificaram a importância <strong>de</strong> continuar ostrabalhos sobre as ca<strong>de</strong>ias produtivas, em particular nos setores automotor, têxtil e confecções,ma<strong>de</strong>ira e móveis e frangos e suínos, utilizando metodologia <strong>de</strong> análise e articulação das ca<strong>de</strong>iasprodutivas proposta pelo Brasil e consensuada com a Argentina, que permita um enfoque integraldo tema com a participação dos atores envolvidos, tanto do setor público quanto privado. Oobjetivo <strong>de</strong>ssa iniciativa é o <strong>de</strong> alcançar a integração efetiva do parque produtivo do Mercosule a melhoria dos níveis <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong>, sobre a base <strong>de</strong> um processo virtuoso<strong>de</strong> especialização produtiva e complementação industrial”.89<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 89 10/10/2011 14:15:41


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorprodutiva <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira e móveis”, que previa uma i<strong>de</strong>ntificação dos atoresque compõem o setor e que pu<strong>de</strong>ssem constituir um <strong>sistema</strong> produtivointegrado, com vistas à melhoria e expansão da produção e a conquista<strong>de</strong> novos mercados. O projeto não teve maiores repercussões porque severificou que a ponta dinâmica da ca<strong>de</strong>ia, isto é, a parte <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong><strong>de</strong>sign dos móveis, estava basicamente concentrada nos municípios doVale dos Vinhedos, no Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, e que a integração produtivaque se pretendia cristalizava as vantagens comparativas regionais, com“o Uruguai fornecendo a ma<strong>de</strong>ira e a fabricação ficando por conta do RioGran<strong>de</strong> do Sul”, conforme chegou a sugerir um ex-Governador do Estado.Tais dificulda<strong>de</strong>s em torno do projeto moveleiro – cuja <strong>de</strong>scriçãomais pormenorizada não caberia aqui – e da integração produtiva <strong>de</strong>modo geral no Mercosul e na América do Sul <strong>de</strong>vem servir <strong>de</strong> alertapara as recentes e futuras iniciativas que passaram a compor a agenda dadiplomacia brasileira e dos países vizinhos. Se bem que as preocupaçõescom <strong>inovação</strong> constem claramente da Declaração 12/08 do CMC, é <strong>de</strong>suma importância que iniciativas <strong>de</strong> caráter micro, ou bottom-up, tenhamum sentido estratégico mais amplo que transcenda o plano setorial.Tal sentido se revela não propriamente nos resultados econômico--financeiros da integração produtiva, mas na replicação do seu modusfaciendi entre as unida<strong>de</strong>s produtivas com potencial <strong>de</strong> virem a constituirum <strong>sistema</strong> regional ou local <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. A dimensão fronteiriça daintegração produtiva torna-se especialmente relevante na medida emque experiências bem-sucedidas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> ten<strong>de</strong>m a ser observadasem aglomerados empresariais (clusters) com presença relativamentehomogênea dos fatores que possibilitam sua indução: forte interativida<strong>de</strong>e cooperação entre as empresas, intercâmbio <strong>de</strong> conhecimento, circulação<strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra qualificada ou semiqualificada, presença <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>se escolas técnicas <strong>de</strong> vocação regional, capital <strong>de</strong> risco ou apoio oriundo<strong>de</strong> financiamentos governamentais ou multilaterais, etc.Iniciativas <strong>de</strong> integração produtiva nessa modalida<strong>de</strong> bottom up –<strong>de</strong> forte impacto político nos esforços brasileiros <strong>de</strong> integração regionale que po<strong>de</strong>m, inclusive, conforme salientado em capítulo anterior,influenciar políticas públicas <strong>de</strong> caráter mais geral ou <strong>nacional</strong> – requeremminuciosos estudos <strong>de</strong> mercado sobre as características dos <strong>sistema</strong>sregionais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> on<strong>de</strong> preten<strong>de</strong>m estar situadas, tendo presente quea região objeto <strong>de</strong> análise constitui um espaço produtivo distinto, que90<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 90 10/10/2011 14:15:41


alguns elementos para o <strong>de</strong>bate e políticas <strong>de</strong> c,t&i no brasil e na américa latinatranscen<strong>de</strong> o dos países que a compõem e que não constitui tão somenteuma soma automática dos fatores produtivos <strong>de</strong>ssa região. Em suma,somente quando regiões integradas por países distintos lograrem gerarrotas tecnológicas próprias, adquirir confiança, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e “linguagem”comum é que po<strong>de</strong>rão tornar-se espaços dinâmicos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Talabordagem não po<strong>de</strong>rá estar ausente da implementação <strong>de</strong> iniciativas<strong>de</strong> integração produtiva, <strong>de</strong> parte do Itamaraty ou do MDIC, a quemcaberá vincular políticas industriais com a diplomacia da <strong>inovação</strong>,tanto ao incorporar atores e <strong>sistema</strong>s regionais ao processo quanto aovaler-se <strong>de</strong> outras experiências <strong>de</strong> integração produtiva, em contextossociogeográficos <strong>de</strong> regiões com características similares às dos paísessul-americanos.Este capítulo buscou explorar, num corte histórico e espacial, asdificulda<strong>de</strong>s enfrentadas pela América Latina para se inserir <strong>de</strong> modocompetitivo nos eixos dinâmicos da globalização econômica. Se asgran<strong>de</strong>s transformações que ensejaram a globalização política encontraramcomo seus promotores principais os países do Sul e da América Latinaem particular – primazia dos Direitos Humanos, fortalecimento domultilateralismo e da integração política, incorporação <strong>de</strong> temassociais e da temática do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> à agenda inter<strong>nacional</strong> –,esses países tradicionalmente ocupam posição secundária na agendada globalização econômica. Temas como transferência <strong>de</strong> tecnologia(a partir, por exemplo, da experiência da China <strong>de</strong> condicionarinvestimentos estrangeiros à criação <strong>de</strong> centros <strong>de</strong> pesquisas tecnológicasvinculados às empresas), <strong>de</strong>mocratização e apropriação do conhecimento,acesso aos mercados dos países industrializados, disciplina globalpara investimentos não produtivos, regras mais claras e equitativaspara a competição inter<strong>nacional</strong> e incorporação dos países <strong>de</strong> menor<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo no processo <strong>de</strong>cisório dos foros e organismoseconômicos multilaterais compõem a nova agenda da globalizaçãoeconômica, para cuja elaboração a participação dos países emergentes e“do Sul” será inevitável e indispensável. De outra parte, o capítulo buscoumostrar novas perspectivas pelas quais plataformas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> po<strong>de</strong>mse incorporar à agenda neo<strong>de</strong>senvolvimentista dos países da região. Opeso <strong>de</strong>terminante do Brasil dos dias atuais na economia, na política, noprogresso científico e nos processos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico daregião alçam-no à condição <strong>de</strong> exemplo <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>91<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 91 10/10/2011 14:15:41


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorconcebidas por cepalinos, estruturalistas e escolas representativas dopensamento latino-americano em ciência, tecnologia e socieda<strong>de</strong> 75 . Tais<strong>de</strong>staque e representativida<strong>de</strong> requerem uma <strong>de</strong>scrição e uma análise maisminuciosa do ainda incipiente <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.É o que pretendo realizar no próximo capítulo, que inaugura a segundaparte, mais <strong>de</strong>scritiva, <strong>de</strong>ste trabalho.75Três expoentes <strong>de</strong>ssa tradição seriam Sábato (1975), Oteiza & Vessuri (1993) e Dagnino (2002).92<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 92 10/10/2011 14:15:41


Capítulo IIISistema Brasileiro <strong>de</strong> Inovação: um todo menorque suas partesO <strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (SNB) não po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong>expressar os dualismos característicos da socieda<strong>de</strong> brasileira. Aexistência <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong>, em sentido lato, representa por si mesmo orápido e notável amadurecimento, no espaço <strong>de</strong> menos <strong>de</strong> duas décadas,do padrão produtivo do país, amadurecimento que se constata por suadiversificação, ampliação, novos processos e maior exposição ao riscoe às vicissitu<strong>de</strong>s do capitalismo inter<strong>nacional</strong>. Se é correto afirmar que,em meados dos anos 90, o Brasil dispunha <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> pesquisacientífica e tecnológica estruturado, é certo – pelas razões discutidas eapontadas nos capítulos anteriores – que esse <strong>sistema</strong> veio a incorporarinequivocamente o componente da <strong>inovação</strong>, a partir do envolvimento <strong>de</strong>alguns segmentos do setor produtivo, público e privado, em processos <strong>de</strong>incorporação e absorção <strong>de</strong> conhecimento. Essa parcial e ainda limitadaconversão da economia brasileira em uma economia do conhecimentotrouxe, entretanto, forte impacto para a inserção e a competitivida<strong>de</strong>inter<strong>nacional</strong> do país, bem como consequências benéficas concretaspara a balança comercial e para a sustentabilida<strong>de</strong> dos seus indicadoresmacroeconômicos ao longo <strong>de</strong>ste século XXI.Segundo a Pesquisa <strong>de</strong> Inovação Tecnológica (PINTEC) realizadapelo Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística (IBGE), em parceriacom a Financiadora <strong>de</strong> Estudos e Projetos (FINEP) do MCT (IBGE,93<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 93 10/10/2011 14:15:41


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior2007), o número <strong>de</strong> empresas industriais inovadoras no país passou em2005 para 30.377, em relação às 28.037 <strong>de</strong> 2003, representando umaumento <strong>de</strong> 8,4% 76 . Em relação aos dispêndios das empresas brasileirasem ativida<strong>de</strong>s inovadoras, a PINTEC registrou um incremento <strong>de</strong>sseinvestimento <strong>de</strong> 2,46% para 2,77% em relação ao faturamento total <strong>de</strong>ssasempresas, conforme indicado no gráfico 3.1 abaixo (IBGE, p. 44, 2007):Gráfico 3.1 – Dispêndios nas ativida<strong>de</strong>s inovativas comopercentual da receita líquida <strong>de</strong> vendas, segundo ativida<strong>de</strong>sselecionadas da Indústria – Brasil – 2003/200576A PINTEC é expressamente inspirada no Manual <strong>de</strong> Oslo da União Europeia (1997) e,mais especificamente, no mo<strong>de</strong>lo proposto pela Oficina Estatística EUROSTAT para arealização da Community Innovation Survey – CIS III 1998-2000, da qual participaramos 15 países-membros. Ver IBGE, p. 14, 2007.94<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 94 10/10/2011 14:15:41


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesO comportamento inovador geral das empresas reflete um ligeiroaumento da intensida<strong>de</strong> da pesquisa e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (P&D) do setorprivado brasileiro que, entretanto, tem-se revelado constante e crescente<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2004, reduzindo gradativamente a diferença em relação aos gastospúblicos (Governo Fe<strong>de</strong>ral e governos estaduais), <strong>de</strong> modo que ambossetores respon<strong>de</strong>m grosso modo por cerca <strong>de</strong> 50% da P&D cada um nopaís (MCT, p. 61, 2007). Setores <strong>de</strong> alta ou média intensida<strong>de</strong> tecnológica,como o aeroespacial, material <strong>de</strong> transporte, químicos, máquinas eequipamentos, biocombustíveis e eletroeletrônicos ampliaram suaparticipação no mercado inter<strong>nacional</strong>, o que se refletiu no crescimentoprogressivo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2002, do percentual das exportações brasileiras nototal das exportações mundiais, <strong>de</strong> 0,932%, em 2002, para 1,164, em 2007(MDIC, p. 23, 2008). O setor agropecuário mostrou-se, entretanto, comoo gran<strong>de</strong> responsável, no período, pelo aumento do impacto da produçãobrasileira no comércio mundial. A produtivida<strong>de</strong> dos biocombustíveis,graças a pesquisas realizadas por entida<strong>de</strong>s como EMBRAPA e pordiversos institutos agronômicos universitários do país, consolidou-secomo a mais alta no mundo, com 6.800 litros por hectare, em relação àprodutivida<strong>de</strong> do etanol e do biodiesel em outros países, com crescimentomédio anual <strong>de</strong> 3,77% (Gol<strong>de</strong>mberg, p. 05, 2008).Esses e diversos outros exemplos <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização e expansão daeconomia e da produção brasileiras, da produtivida<strong>de</strong> e das exportações,sempre com aumento correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> conhecimento e valor agregado,autorizam-nos a estimar que tais experiências <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> estariamse revestindo <strong>de</strong> caráter sistêmico na economia brasileira. Em outraspalavras, com base nos conceitos e elementos apresentados em capítulosanteriores, os diversos agentes econômicos brasileiros estariam, emsua maioria, segundo essa perspectiva mais otimista, valendo-se maisdo intercâmbio e do apoio <strong>de</strong> agências governamentais e <strong>de</strong> polos <strong>de</strong>produção <strong>de</strong> conhecimento com vistas ao aprimoramento contínuo eirreversível do padrão produtivo brasileiro. No entanto, em comparaçãocom os 38 países da OCDE e observadores, as exportações <strong>de</strong> serviços(que constituem um indicador preciso <strong>de</strong> participação <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>sintensivas em conhecimento no comércio) do Brasil situam-se, em termosabsolutos, à frente apenas <strong>de</strong> Finlândia, Islândia e Nova Zelândia (OCDE,p. 69, 2006). A participação <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alta e média intensida<strong>de</strong>tecnológica na pauta exportadora brasileira <strong>de</strong>cresceu ligeiramente em95<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 95 10/10/2011 14:15:41


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior2007, por sua vez, em relação a anos anteriores (MDIC, p. 15, 2008).Indique-se, além disso, que o aumento <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s inovadoras <strong>de</strong> partedas indústrias brasileiras é essencialmente marcado pela importação <strong>de</strong>bens <strong>de</strong> capital, que se traduz efetivamente em <strong>inovação</strong> somente quandoa tecnologia incorporada a máquinas e equipamentos po<strong>de</strong> ser livrementereproduzida ou aperfeiçoada endogenamente pela firma (por meio, porexemplo, <strong>de</strong> processos <strong>de</strong> engenharia reversa), em etapas posteriores <strong>de</strong>sua evolução 77 .Entre esses dados positivos e algo negativos <strong>de</strong>sponta, entretanto,um importante contraste indicativo do grau <strong>de</strong> <strong>de</strong>sarticulação ou, aomenos, do caráter incipiente do SNB, inclusive diante das incontestáveisevidências <strong>de</strong> <strong>de</strong>sindustrialização da economia brasileira durante operíodo 2007-2011. Apesar <strong>de</strong> o Brasil ser um dos países com a maior taxa<strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> publicações científicas in<strong>de</strong>xadas em todo o mundo,alcançando perto <strong>de</strong> 2% do total em 2006 (Bound, p. 30, 2008) e tendochegado a 2,7% em 2011, o número <strong>de</strong> patentes registradas no UnitedStates Patent and Tra<strong>de</strong>mark Office (USPTO) foi <strong>de</strong> apenas 0,08% dototal. Ainda que se possa corretamente argumentar contra o <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong>patentes como critério <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (diante da característica intrínseca eprimordial da intangibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte dos processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>)e contra a produção acadêmico-científica in<strong>de</strong>xada como condição nãosuficiente para o incremento da taxa <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> na economia <strong>de</strong> modogeral, torna-se evi<strong>de</strong>nte que tal <strong>de</strong>scompasso é uma das manifestaçõesmais conspícuas da <strong>de</strong>sarticulação, da <strong>de</strong>sfuncionalida<strong>de</strong> e do isolamento<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados elementos críticos para o funcionamento do SNB.Essa <strong>de</strong>sarticulação entre a produção do conhecimento no país,operação <strong>de</strong> mecanismos <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> tecnologia e absorçãodo conhecimento <strong>de</strong> modo geral pelo setor privado e as dificulda<strong>de</strong>s<strong>de</strong> interação entre o Governo e o setor produtivo são explicitamentereconhecidas, além <strong>de</strong> pela quase totalida<strong>de</strong> dos analistas <strong>de</strong> C,T&I77Hirata (p. 137, 2006) reafirma o entendimento <strong>de</strong>rivado da leitura dos números da PINTEC:“A aquisição <strong>de</strong> máquinas e equipamentos continua sendo a forma mais comum <strong>de</strong> aquisição<strong>de</strong> tecnologia por parte das empresas, possivelmente também a mais barata e mais fácil, comresultados limitados nos médio e longo prazos, se não houver outras estratégias.” Também Paulae Silva (p. 1339, 2005) concorda que “a aquisição <strong>de</strong> máquinas e equipamentos continua sendo oprincipal meio <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização tecnológica, enquanto são reduzidas tanto as ativida<strong>de</strong>s internas<strong>de</strong> P&D quanto as articulações com outras empresas e com as instituições <strong>de</strong> pesquisa”.96<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 96 10/10/2011 14:15:41


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesbrasileiros 78 , pelo próprio MCT, na introdução ao seu Plano <strong>de</strong> Ação2007-2010, que evoca a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma coor<strong>de</strong>nação entre a política<strong>de</strong> C,T&I e a Política Industrial (MCT, p. 31, 2007). Nesse aspecto,iniciativas do Governo Fe<strong>de</strong>ral como a promulgação das Leis <strong>de</strong> Inovação(n o 10.973, <strong>de</strong> 02/12/2004), “do Bem” (n o 11.196, <strong>de</strong> 21/11/2005), <strong>de</strong>Informática (n o 8.248, <strong>de</strong> 23/10/1991, aperfeiçoada pela Lei n o 11.077,<strong>de</strong> 30/12/2004) e, mais recentemente, da Lei n° 12.349/10, assim comoa instituição do mencionado Plano <strong>de</strong> Ação 2007-2010 <strong>de</strong> C,T&I para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>nacional</strong>, e da Política <strong>de</strong> Desenvolvimento Produtivodo MDIC, consistem em políticas explícitas para promover, basicamente,sob a égi<strong>de</strong> do Estado, a incorporação <strong>de</strong> conhecimento científico--tecnológico à estrutura produtiva do país.Em linhas gerais, portanto, o SNB situa-se numa escala intermediáriaentre os <strong>sistema</strong>s mais maduros e consolidados dos países mais<strong>de</strong>senvolvidos da OCDE e entre a vasta maioria dos países do mundoque sequer contam com um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> ciência e tecnologia, quanto mais<strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. O Brasil pertence claramente a uma categoria <strong>de</strong> paísescomo os BRIC ou IBAS, além talvez <strong>de</strong> Argentina, México e Malásia,que dispõem <strong>de</strong> um certo grau <strong>de</strong> diversificação <strong>de</strong> pesquisa e produção <strong>de</strong>conteúdo tecnológico, presença <strong>de</strong> instituições fomentadoras da pesquisae certo grau <strong>de</strong> articulação com o setor privado, a<strong>de</strong>mais da existência <strong>de</strong>centros <strong>de</strong> pesquisa científica e <strong>de</strong> P&D que lhes permitem <strong>de</strong>spren<strong>de</strong>r-seem certa medida <strong>de</strong> trajetórias <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> que os relegam auma posição mais estática que dinâmica na divisão inter<strong>nacional</strong> dotrabalho. Nesse aspecto, o caráter intermediário ou imperfeito do SNI<strong>de</strong>sses países – o Brasil, nesse grupo, situando-se atrás apenas da Chinae, menos evi<strong>de</strong>ntemente, da Rússia – reflete sua posição relativa nocenário inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> países emergentes ou <strong>de</strong> potências regionais“semiperiféricas”. Em termos concretos, trata-se <strong>de</strong> países com condições<strong>de</strong> efetiva autonomia para consolidarem <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e políticas<strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> em prazos relativamente curtos, <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> umadécada (ou <strong>de</strong> países com “capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> resistência”, conforme exortariaHélio Jaguaribe).78Ver, por exemplo, Hirata (p. 78, 2006), Possas (p. 344, 2005), Dagnino & Dias (p. 378, 2007),Salles Filho & Bonacelli (p. 30, 2007), Possas, Suzigan & Furtado (p. 178, 2006), entre váriosoutros. Newton Hirata lamenta “[ser] consenso nos meios empresarial e acadêmico que a interaçãoé baixa, que empresas e aca<strong>de</strong>mia estão em universos paralelos”.97<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 97 10/10/2011 14:15:41


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorPo<strong>de</strong>-se então inferir que, não obstante a germinação do <strong>sistema</strong>brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, a partir das transformações estruturaisdo padrão produtivo e da forma <strong>de</strong> atuação do empresariadobrasileiro a partir da segunda meta<strong>de</strong> dos anos 90 – mais exposto àcompetição, incorporador <strong>de</strong> um viés mais exportador na indústria,tendo <strong>de</strong>spertado para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intensificação <strong>de</strong> parceriascom outros segmentos da socieda<strong>de</strong> (fornecedores, consumidores,Governo, aca<strong>de</strong>mia, outras empresas) e com o virtual <strong>de</strong>saparecimentoposterior do estado patrimonial no Brasil – a noção <strong>de</strong> “<strong>sistema</strong>” nãoé ainda rigorosamente aplicável no caso brasileiro, pois exigiria umaexponenciação muito maior dos fatores positivos elencados acima.Corolário importante a se <strong>de</strong>stacar <strong>de</strong>ssa afirmação é que o SNB plenonão surgirá a partir <strong>de</strong> condições espontâneas <strong>de</strong> mercado, uma vezque o padrão <strong>de</strong> acumulação das empresas brasileiras não transpôso limiar da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> constante e <strong>de</strong> articulaçãorotineira com os <strong>de</strong>mais segmentos da socieda<strong>de</strong>, prevalecendoainda certas condições tradicionais <strong>de</strong> pseudocompetitivida<strong>de</strong>como mão <strong>de</strong> obra relativamente barata, amplo mercado, produçãomassificada e estandardizada, parque industrial e estoque <strong>de</strong> bens <strong>de</strong>capital recentemente renovados. Essa ressalva po<strong>de</strong> ser corroboradapelo retraimento da participação dos bens industriais na pauta <strong>de</strong>exportações, relativamente à dramática expansão do agronegóciobrasileiro nesta década. Em termos absolutos, porém, o aprendizadoexportador da primeira meta<strong>de</strong> dos anos 90 e <strong>de</strong>sta década – emgran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>vido aos acordos <strong>de</strong> livre-comércio assinados peloBrasil e, em especial, ao Mercosul e ao esforço político-diplomático<strong>de</strong> diversificação <strong>de</strong> mercados – permitiu a parcela relevante daindústria brasileira voltar-se para fora e assumir papel crescente <strong>de</strong>investidora <strong>de</strong> peso no mercado inter<strong>nacional</strong>.Nasser (pp. 1379-1380, 2005) sintetiza com proprieda<strong>de</strong> acircunstância <strong>de</strong> o Brasil ainda não dispor <strong>de</strong> um SNI consolidado,valendo-se <strong>de</strong> comparações com os países <strong>de</strong> maior PIB no mundo:Não há país dito <strong>de</strong>senvolvido que não seja <strong>de</strong>senvolvido tecnologicamente,po<strong>de</strong>ndo-se até mesmo afirmar que ser <strong>de</strong>senvolvido é estar no estado <strong>de</strong> arte doconjunto <strong>de</strong> técnicas críticas para a produção <strong>de</strong> ponta, isto é, para os afazereseconômicos com maior valor agregado. (grifo meu)98<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 98 10/10/2011 14:15:42


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesPreceitua, mais além, queHá países, como os Estados Unidos e a Alemanha, que têm gran<strong>de</strong> dimensãocientífica e tecnológica simultaneamente; há países como a Índia, com gran<strong>de</strong>expressão científica mas mo<strong>de</strong>sta dimensão tecnológica e países como o Japão,com gran<strong>de</strong> expressão tecnológica, mas menor expressão científica.O Brasil guardaria claramente mais semelhanças com o caso da Índia,ainda que tanto sua pesquisa científica quanto sua expressão tecnológicasituem-se em patamar relativamente inferior ao do país asiático 79 .Este capítulo buscará apontar os pontos fortes e <strong>de</strong>stacados do SNB,assim como suas <strong>de</strong>ficiências, com vistas a apoiar a compreensão sobreo seu funcionamento e, <strong>de</strong>sse modo, dispor <strong>de</strong> elementos e sugestõesgerais para a formulação <strong>de</strong> políticas públicas, mais particularmente <strong>de</strong>parte do Itamaraty, para a operação e <strong>de</strong>sempenho do <strong>sistema</strong> – o queserá feito ainda, sob uma perspectiva diferente, também no capítulo VI.Desse modo, serão apresentados: a) a <strong>de</strong>scrição, em linhas gerais, do<strong>sistema</strong>. Essa <strong>de</strong>scrição virá acompanhada <strong>de</strong> um argumento normativobásico em prol da sua diversificação, da mesma forma em que sebusca a diversificação <strong>de</strong> outras áreas-chave da economia brasileira,como exportações e matriz energética; b) a <strong>de</strong>scrição dos instrumentosinstitucionais adotados nos últimos anos (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> ao menos a instituiçãodos Fundos Setoriais nos anos 90) 80 para o fortalecimento do <strong>sistema</strong>;c) alguns exemplos relativos ao papel que o MRE ocupa no <strong>sistema</strong> eem seus programas <strong>de</strong> fomento; d) a menção a algumas experiênciasbem-sucedidas que têm orientado a formulação <strong>de</strong> políticas públicaspara o setor (a dimensão bottom up do <strong>sistema</strong>); e) a enumeração dosseus principais trunfos e <strong>de</strong>ficiências; e f) sugestões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m geral parao seu aprimoramento.79Além do PIB indiano crescer mais rapidamente que o brasileiro (8,7% em 2007, contra 4,6%do Brasil), o país produz cinco vezes mais patentes (Bound, p. 20, 2008) e suas companhiasinvestem mais em P&D, além <strong>de</strong> produzirem, em termos absolutos, quase o dobro dos artigoscientíficos publicados por brasileiros no exterior (King, p. 312, 2004), embora haja evidências <strong>de</strong>que essa diferença esteja se reduzindo. O Brasil, por outro lado (pelo menos até 2004, conformedados da OCDE), <strong>de</strong>tinha patamar superior geral <strong>de</strong> investimentos em P&D (0,91% do PIB,contra 0,78% da Índia), assim como <strong>de</strong> investimentos públicos em ensino superior (0,35% doPIB, contra apenas 0,03 no caso da Índia) (OCDE, pp. 40-43, 2006).80A relação dos fundos e respectivas fontes <strong>de</strong> financiamento encontram-se no Anexo 3.1, apartir <strong>de</strong> tabela elaborada por Pereira (pp. 10-11, 2005).99<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 99 10/10/2011 14:15:42


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior3.1 – Inovação no Brasil: marchas e contramarchas do <strong>sistema</strong>O <strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> ciência, tecnologia e <strong>inovação</strong> surpreen<strong>de</strong>e impressiona para o padrão <strong>de</strong> países não industrializados, suscitandocerta perplexida<strong>de</strong> do porquê <strong>de</strong> não haver ainda atingido os patamares <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> observados em países como China, Espanha ou Itália.Embora <strong>de</strong> institucionalida<strong>de</strong> recente – a criação do MCT em 1985 <strong>de</strong>finiriauma marco e um locus <strong>de</strong> formulação e implementação <strong>de</strong> políticas e umreconhecimento <strong>de</strong> que caberia ao Estado a responsabilida<strong>de</strong> maior pelacapacitação tecnológica do país – a base da pesquisa científica apresentaresultados respeitáveis e notáveis. O Brasil já dispunha, entretanto, <strong>de</strong> umimportante <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> fomento à pesquisa <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1951, a partir da criaçãodo Conselho Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Científico e Tecnológico –CNPq e da Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal do EnsinoSuperior – CAPES, bem como havia uma disposição do Governo doEstado <strong>de</strong> São Paulo, já nos anos 60, <strong>de</strong> investir fortemente na criação<strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> estadual <strong>de</strong> C&T, a partir da <strong>de</strong>stinação compulsória <strong>de</strong>recursos orçamentários e fiscais mínimos para tais ativida<strong>de</strong>s. Os trêssetores do <strong>sistema</strong> brasileiro – governo, infraestrutura <strong>de</strong> pesquisa esetor privado – exibem uma grandiosa organização <strong>de</strong> apoio à produçãocientífica e tecnológica, embora, como se verá, os resultados agregadosainda <strong>de</strong>ixem muito a <strong>de</strong>sejar. Uma das razões principais para esse baixo<strong>de</strong>sempenho relativo do <strong>sistema</strong> é que, frequentemente, e na maiorparte das vezes, é consi<strong>de</strong>rado sob uma perspectiva estática, em que aexcelência <strong>de</strong> suas partes componentes não se traduz na excelência do<strong>sistema</strong> como um todo. Tanto na realida<strong>de</strong> da vida econômica quantonas concepções metodológicas da teoria dos <strong>sistema</strong>s são as relaçõesentre as partes constitutivas que <strong>de</strong>finirão sua natureza, e não a meraexistência <strong>de</strong>ssas partes 81 .O MCT po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado o expoente ou a “nau capitânia”do SNB. Com orçamento inicial <strong>de</strong> quase US$ 6 bilhões para 2008,correspon<strong>de</strong>ntes a 38,7% dos recursos <strong>de</strong> P&D do Governo Fe<strong>de</strong>ral 8281Hillel Ruben (p. 67, 1985) salienta o traço distintivo <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> ou conjunto, em oposição aagregados <strong>de</strong> partes, em que “(...) as relações entre as partes, no primeiro caso, são <strong>de</strong>terminantespara a sua <strong>de</strong>finição, ao passo que [em um agregado] tais relações não representam nenhumaimportância.”82Dado informado por Adriano Duarte, da Secretaria <strong>de</strong> Desenvolvimento Tecnológico e Inovaçãodo MCT, no “II Curso sobre Cooperação Inter<strong>nacional</strong> em C,T&I”, Brasília, 19/08/2008.100<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 100 10/10/2011 14:15:42


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partese com R$ 41 bilhões adicionais disponíveis para o triênio 2008-2010,por conta do Plano <strong>de</strong> Ação Ciência, Tecnologia e Inovação parao Desenvolvimento Nacional (PACTI) (integrado ao Programa <strong>de</strong>Aceleração <strong>de</strong> Crescimento – PAC), o Ministério mantém 13 unida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> pesquisa e quatro outras entida<strong>de</strong>s vinculadas, todas com reputação<strong>de</strong> excelência em seus respectivos campos <strong>de</strong> atuação 83 . Entre as diversasações do MCT po<strong>de</strong>m ser relacionadas a elaboração <strong>de</strong> indicadores<strong>de</strong> avaliação, estudos e diagnósticos <strong>de</strong> mercado e perfis <strong>de</strong> projeto,cooperação inter<strong>nacional</strong>, <strong>de</strong>scentralização (com foco em programasnas regiões Norte e Nor<strong>de</strong>ste), inclusão social, popularização e difusãoda C&T, fomento preferencial às áreas <strong>de</strong> ciências exatas e biomédicas,segurança alimentar, ca<strong>de</strong>ias produtivas e arranjos produtivos locais,entre outras. Há <strong>de</strong> se assinalar, como um problema a se ter em contana organização do MCT, a sobreposição <strong>de</strong> programas e funções entredistintas agências do Ministério, especialmente, mas não exclusivamente,no que tange à cooperação inter<strong>nacional</strong> realizada por órgãos como aSecretaria <strong>de</strong> Política <strong>de</strong> Informática, o Departamento <strong>de</strong> Popularizaçãoe Difusão da C&T e o Departamento <strong>de</strong> Ações Regionais para a InclusãoSocial, que não raro duplicam agendas, geram vazios funcionais ou não secoor<strong>de</strong>nam entre si, sobretudo na área <strong>de</strong> TIC, tema tratado diretamentepor até quatro órgãos ou agências do Ministério 84 .Além do MCT, o setor público-estatal do SNB é constituídopelos Ministérios da Educação (CAPES, <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>s e83A estrutura regimental do MCT foi <strong>de</strong>finida pelo Decreto nº 5886, <strong>de</strong> 6/9/2006. Os 13 institutos<strong>de</strong> pesquisa são o Instituto Nacional <strong>de</strong> Pesquisas da Amazônia (INPA), Instituto Nacional <strong>de</strong>Pesquisas Espaciais (INPE), Instituto Nacional <strong>de</strong> Tecnologia (encarregado basicamente <strong>de</strong>programas <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> tecnologia), Instituto Nacional do Semiárido, Instituto Brasileiro<strong>de</strong> Informação em Ciência e Tecnologia (encarregado da área <strong>de</strong> tecnologias da informação edas comunicações – TIC), Centro <strong>de</strong> Pesquisas (<strong>de</strong> Tecnologia da Informação) Renato Archer,Centro Brasileiro <strong>de</strong> Pesquisas Físicas (CBPF), Laboratório Nacional <strong>de</strong> Astrofísica (LNA),Laboratório Nacional <strong>de</strong> Computação Científica (LNCC), Museu <strong>de</strong> Astronomia e CiênciasAfins (MAST), Museu Paraense Emílio Goeldi, Centro <strong>de</strong> Tecnologia Mineral e ObservatórioNacional (ON). As unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scentralizadas são a Agência Espacial Brasileira (AEB), ComissãoNacional <strong>de</strong> Energia Nuclear (CNEN – autarquia), CNPq (Fundação) e FINEP (empresa pública).O Ministério supervisiona ainda os planos estratégicos formulados pelas organizações sociaisna área <strong>de</strong> C&T, a Associação Brasileira <strong>de</strong> Tecnologia Luz Síncroton (ABTLuS), Instituto <strong>de</strong>Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, Instituto Nacional <strong>de</strong> Matemática Pura e Aplicada(IMPA), Re<strong>de</strong> Nacional <strong>de</strong> Pesquisa (RNP) e Centro <strong>de</strong> Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE).84Entrevista ao autor concedida pelo Coor<strong>de</strong>nador-geral <strong>de</strong> Serviços Tecnológicos do MCT,Reinaldo Ferraz, Brasília, novembro <strong>de</strong> 2007.101<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 101 10/10/2011 14:15:42


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorEscolas Técnicas) 85 , Agricultura, Pecuária e Abastecimento (EMBRAPA,Instituto Nacional <strong>de</strong> Meteorologia e Comissão Executiva do Plano daLavoura Cacaueira – CEPLAC), MDIC (BNDES, Agência Brasileira <strong>de</strong>Desenvolvimento Industrial – ABDI, Instituto Nacional <strong>de</strong> Metrologia,Normalização e Qualida<strong>de</strong> Industrial – INMETRO e Instituto Nacional daProprieda<strong>de</strong> Industrial – INPI) 86 , Saú<strong>de</strong> (Fundação Osvaldo Cruz – FIOCRUZe Secretaria <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos – SCTIE) 87 , Minase Energia (Centro <strong>de</strong> Pesquisas e Desenvolvimento da Petrobras – CENPESe Centro <strong>de</strong> Pesquisas <strong>de</strong> Energia Elétrica – CEPEL, DepartamentoNacional <strong>de</strong> Produção Mineral – DNPM, Companhia <strong>de</strong> Pesquisa <strong>de</strong>Recursos Minerais – CPRM/Serviço Geológico do Brasil), Defesa (InstitutoTecnológico da Aeronáutica – ITA, Centro Técnico Aeroespacial –CTA, Instituto Militar <strong>de</strong> Engenharia – IME e Centro Tecnológico doExército – CETEx), Comunicações e Planejamento, Orçamento e Gestão(especialmente por conta do IBGE e do levantamento <strong>de</strong> indicadores). Além<strong>de</strong>sses caberiam (num plano normativo) a Ministérios como o da Cultura edas Relações Exteriores ações voltadas para o fortalecimento dos processos<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no país, a partir da preservação e valorização <strong>de</strong> manifestaçõesautóctones e locais, num caso, e em outro, da articulação e mobilização <strong>de</strong>parcerias externas para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> 88 .85Há 2.165 universida<strong>de</strong>s no Brasil, das quais 230 públicas e 55 Fe<strong>de</strong>rais, além <strong>de</strong> 39 EscolasTécnicas Fe<strong>de</strong>rais, <strong>sistema</strong> que, no total, congrega mais <strong>de</strong> 4,5 milhões <strong>de</strong> estudantes e pesquisadores(Bound, p. 42, 2008). Com as poucas exceções das universida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong> corte confessional,a pesquisa científica no Brasil está reservada quase que exclusivamente às entida<strong>de</strong>s públicas. Talcircunstância evi<strong>de</strong>ncia o saudável paradoxo <strong>de</strong> que, no Brasil, o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> possui dois <strong>de</strong>seus vértices (governo e universida<strong>de</strong>s) fortemente interconectados sob as perspectivas operativa efuncional, muito embora, sob as dimensões epistemológica e acadêmica, as universida<strong>de</strong>s gozem <strong>de</strong>integral in<strong>de</strong>pendência. Bonacelli & Salles-Filho (2007) apresentam visão mais crítica das relaçõesentre o Estado e as Organizações Públicas <strong>de</strong> Pesquisa (OPP) no sentido <strong>de</strong> que estas pa<strong>de</strong>ceriam<strong>de</strong> ampla <strong>de</strong>scoor<strong>de</strong>nação político-operacional com o Estado e <strong>de</strong> que são por ele estranguladasorçamentariamente, em uma visão “curto-prazista e ad hoc”. “Em nenhum momento se colocouna pauta uma agenda meso ou macroinstitucional <strong>de</strong> organização e coor<strong>de</strong>nação das OPPs, <strong>de</strong>ntroda perspectiva sistêmica do cenário <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> C,T&I” (Bonacelli & Salles-Filho, p. 31, 2007).86Há no Brasil mais <strong>de</strong> 2.000 laboratórios <strong>de</strong> metrologia, calibração e certificação (Grando,p. 1041, 2005).87Cabe ao Departamento <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia da SCTIE “formular, implementar e avaliar asPolíticas Nacionais <strong>de</strong> Assistência Farmacêutica e <strong>de</strong> Medicamentos, incluindo hemo<strong>de</strong>rivados,vacinas, imunobiológicos e outros insumos relacionados.” Cf. em .88Ressalte-se a criação, em 2011, no âmbito do Ministério da Cultura, da “Secretaria <strong>de</strong> Inovaçãoe da Economia Criativa”, voltada para avaliar, promover e expandir esse setor no PIB e naeconomia brasileira <strong>de</strong> modo geral.102<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 102 10/10/2011 14:15:42


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesOutra vertente <strong>de</strong> primeira dimensão do SNB são os <strong>sistema</strong>sestaduais <strong>de</strong> fomento e amparo à pesquisa, entre os quais <strong>de</strong>sponta o daFundação <strong>de</strong> Amparo à Pesquisa do Estado <strong>de</strong> São Paulo – FAPESP,com orçamento anual <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> R$ 500 milhões, formados a partir da<strong>de</strong>stinação <strong>de</strong> até 1,0% dos tributos arrecadados pelo Estado <strong>de</strong> São Paulo,conforme estipula a Constituição estadual 89 . Além da FAPESP, outrasagências estaduais mais <strong>de</strong>stacadas são a FAPERJ (orçamento para 2008<strong>de</strong> R$ 223 milhões) e a FAPEMIG (R$ 200 milhões, também para 2008),fazendo com que os <strong>sistema</strong>s estaduais <strong>de</strong> C&T somados alcancem cerca<strong>de</strong> 25% dos fundos públicos gerais diretamente <strong>de</strong>stinados à C,T&I noBrasil (os 75% restantes constam do orçamento do MCT).Se o aporte dos <strong>sistema</strong>s estaduais representa um reforço consi<strong>de</strong>rávelpara o SNB, não só em termos orçamentários, mas sobretudo qualitativos,ele também expressa uma <strong>de</strong> suas mais sérias distorções: a concentraçãopronunciada das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> C,T&I na região Su<strong>de</strong>ste do país. O gráficoa seguir, extraído <strong>de</strong> Bound (p. 58, 2008), expressa a total supremacia dostrês gran<strong>de</strong>s Estados do Su<strong>de</strong>ste em quesitos como <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> patentes,matrículas em universida<strong>de</strong>s, investimentos em C&T e publicações emrevistas e periódicos in<strong>de</strong>xados inter<strong>nacional</strong>mente. Como dado queexemplifica <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>finitiva essas distorções, a Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> SãoPaulo (USP) é responsável pela publicação <strong>de</strong> 25% dos artigos científicosbrasileiros em revistas in<strong>de</strong>xadas. Isso quer dizer que, se a participaçãobibliométrica inter<strong>nacional</strong> brasileira é <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 2% do total mundial,a USP sozinha respon<strong>de</strong> por 0,5% <strong>de</strong>sse volume.89Crodowaldo Pavan (p. 348, 2002) afirma que, por mecanismos e artifícios contábeis diversos,o orçamento da entida<strong>de</strong> jamais alcançou, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua criação em 1962 (com exceção do GovernoCarvalho Pinto) o 1,0% estipulado, havendo anos em que o orçamento se situou em apenas 0,11%da arrecadação fiscal do Estado.103<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 103 10/10/2011 14:15:42


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorGráfico 3.2 – Participação dos Estados brasileiros em ativida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> ciência e <strong>inovação</strong>Share or totalTal hipertrofia da C,T&I brasileira nos três gran<strong>de</strong>s Estados doSu<strong>de</strong>ste é particularmente <strong>de</strong>letéria para a constituição do SNB,consi<strong>de</strong>rando que as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> requerem transbordamentosprovenientes <strong>de</strong> distintas bases geográficas simultaneamente para quese possa mitigar as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>sníveis <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.Assim, apenas a <strong>de</strong>stinação hipotética <strong>de</strong> maiores recursos fiscais naárea <strong>de</strong> C&T para o Estado do Amazonas, a partir da repartição <strong>de</strong>exce<strong>de</strong>ntes produtivos e <strong>de</strong> capital gerados em São Paulo, não servirápara que o Norte esteja integrado ao SNB. Do mesmo modo, as cerca<strong>de</strong> 450 companhias que integram o Polo Industrial <strong>de</strong> Manaus e o quase1,5% gerado para a formação do PIB brasileiro não são suficientes paraque a região esteja plenamente integrada ao SNB, pelo fato <strong>de</strong> a P&Dque movimenta as ativida<strong>de</strong>s daquele distrito industrial ser oriunda <strong>de</strong>104<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 104 10/10/2011 14:15:42


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partespolíticas formuladas pelas matrizes no exterior ou por subsidiárias oucoligadas no Sul e Su<strong>de</strong>ste do país. Ou seja: mais recursos fiscais eampliação da base industrial <strong>de</strong> uma região são condições necessárias,mas não suficientes, para sua incorporação a um genuíno SNI. O<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> regional <strong>de</strong>sigual afeta seriamente a implantação <strong>de</strong> umSNI no país uma vez que esse processo se sustenta somente a partir <strong>de</strong>uma espiral virtuosa e coevolutiva dos fatores que induzem a <strong>inovação</strong>,tais como disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> capital e <strong>de</strong> investimentos públicos e <strong>de</strong> P&Dpelas empresas, fortalecimento da pesquisa científica <strong>de</strong> base regional,integração regional física e da infraestrutura, introdução <strong>de</strong> novos setoresprodutivos e conexão <strong>de</strong>sses novos setores com os mercados domésticoe inter<strong>nacional</strong> 90 .Como corolário evi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>ssas consi<strong>de</strong>rações sobre a hipertrofiado Su<strong>de</strong>ste e particularmente <strong>de</strong> São Paulo nos indicadores <strong>de</strong> C,T&I,tal realida<strong>de</strong> contribui mais para o fortalecimento e consolidação <strong>de</strong> um“<strong>sistema</strong> paulista <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>” do que propriamente do SNB 91 . Um gran<strong>de</strong>paradoxo gerado pela concentração da ciência brasileira em poucosestados é que a produção científica sobre a região amazônica, no exteriore em outros Estados, é infinitamente superior, em termos quantitativose qualitativos, à pesquisa gerada na Amazônia, e a <strong>de</strong>speito da elevadareputação inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> um centro <strong>de</strong> pesquisas do porte do INPA.A projeção do Estado brasileiro na constituição do SNB, além<strong>de</strong> marcante no caso da pesquisa científica e tecnológica – <strong>de</strong>vido aopeso do <strong>sistema</strong> universitário público na promoção e expansão <strong>de</strong>ssasativida<strong>de</strong>s –, é igualmente expressiva no caso da ativida<strong>de</strong> econômica<strong>de</strong> modo geral, por conta <strong>de</strong> sua participação direta e indireta em P&D,em áreas como energia e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> industrial. De fato, <strong>sistema</strong>steóricos <strong>de</strong> cunho evolucionista como o “Triângulo <strong>de</strong> Sábato” e a“Hélice Tripla” <strong>de</strong> Etkowitz/Ley<strong>de</strong>sdorff teriam dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> serem90Os riscos para as políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> negligenciarem esforços <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> regionaltêm um eloquente paralelo no nível microeconômico, conforme sugere Moraes Mello (p. A-3,2008): “Investir em C&T não é a garantia <strong>de</strong> sobrevivência para nenhum empreendimento.Não investir em C&T é certamente uma sentença <strong>de</strong> morte para qualquer empreendimento quepretenda manter-se ativo em longo prazo.”91Em épocas passadas, durante um curto período nos anos 90, a concentração da pesquisacientífica na região Su<strong>de</strong>ste, e especialmente no Estado <strong>de</strong> São Paulo, chegou a constituir umapolítica <strong>de</strong>liberada do MCT, sob o argumento <strong>de</strong> que os recursos investidos em São Pauloteriam um po<strong>de</strong>r multiplicador e um “coeficiente <strong>de</strong> eficiência marginal” superior ao <strong>de</strong> recursosinvestidos nas regiões Norte e Nor<strong>de</strong>ste do Brasil.105<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 105 10/10/2011 14:15:42


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junioraplicados ao caso brasileiro, em vista da participação direta do Estado nacompetitivida<strong>de</strong> e qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus <strong>sistema</strong>s produtivo e universitário.No primeiro caso, a participação estatal direta se dá por intermédio <strong>de</strong>entida<strong>de</strong>s como as Indústrias Nucleares do Brasil – INB, Petrobras,BNDES e Itaipu bi<strong>nacional</strong> e seu parque tecnológico, por exemplo. Nocaso da Petrobras, assinalem-se os investimentos da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> US$ 1bilhão em P&D (5% dos quais em biocombustíveis e US$ 100 milhõesem áreas menos <strong>de</strong>senvolvidas do país) e um lucro líquido, em 2007,<strong>de</strong> R$ 21,5 bilhões, correspon<strong>de</strong>ntes a três vezes e meia o orçamentoprojetado do MCT para o mesmo ano. A empresa abriga milhares <strong>de</strong>cientistas, a maioria dos quais estará situada no maior laboratório daAmérica Latina, o Centro <strong>de</strong> Pesquisas e Desenvolvimento LeopoldoA. Miguez <strong>de</strong> Mello (CENPES), na Ilha do Fundão, no Rio <strong>de</strong> Janeiro.Gran<strong>de</strong> parte dos engenheiros da empresa completou ciclo <strong>de</strong> pesquisasnas mais prestigiosas instituições acadêmicas mundiais nas áreas <strong>de</strong>engenharia do petróleo, geofísica, geoquímica e engenharia <strong>de</strong> produção,sobretudo nos Estados Unidos e Inglaterra 92 .Já o BNDES comprometeu, em 2007, recursos da or<strong>de</strong>m R$ 1,6bilhão para diversos programas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e capacitaçãotecnológica <strong>de</strong> empresas, por intermédio <strong>de</strong> diversos programascomo o Fundo Tecnológico – FUNTEC (modalida<strong>de</strong> fundo perdidonão reembolsável), dirigido a programas principalmente nas áreas<strong>de</strong> energias renováveis provenientes da biomassa, software, soluçõesbiológicas para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da agropecuária e fármacos obtidospor biotecnologia avançada; programas na modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> crédito àsempresas, como Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação, Inovação para aProdução e outros específicos, como para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do <strong>sistema</strong>brasileiro <strong>de</strong> TV digital e fortalecimento das empresas do setor e para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da ca<strong>de</strong>ia produtiva farmacêutica; e programas <strong>de</strong> apoiovia participação acionária, entre os quais se <strong>de</strong>staca o CRIATEC, fundo<strong>de</strong> investimento para incentivar empresas inovadoras (seed capital),normalmente pequenas e médias, e prover apoio gerencial a<strong>de</strong>quado aessas empresas em fase <strong>de</strong> constituição ou consolidação 93 .92Informação prestada por Gerson José Faria Fernan<strong>de</strong>s, Gerente-Geral <strong>de</strong> Gestão Tecnológicado CENPES, no “II Curso sobre Cooperação Inter<strong>nacional</strong> em C,T&I”, Brasília, 21/08/2008.93Cf. em .106<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 106 10/10/2011 14:15:42


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesAinda no tocante à participação estatal em programas <strong>de</strong> fomento aempresas e investimentos, há <strong>de</strong> se recordar que gran<strong>de</strong>s multinacionaisbrasileiras <strong>de</strong> <strong>de</strong>stacada participação na balança comercial do país,como EMBRAER e Vale do Rio Doce, foram criadas como estatais,corroborando a experiência e a trajetória <strong>de</strong> participação do Estado no<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> industrial do país. No caso do setor mais importanteda balança comercial brasileira, o agronegócio, há <strong>de</strong> se ter sempre emconta, por sua vez, o papel primordial <strong>de</strong>sempenhado pela EMBRAPApara a competitivida<strong>de</strong> do setor no cenário mundial, a partir <strong>de</strong> seuplantel <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 2.200 cientistas e pesquisadores, mais da meta<strong>de</strong> dosquais com título <strong>de</strong> Doutor (Bound, p. 75, 2008) 94 . Sendo a produçãocientífica quase que integralmente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> aportes públicos noBrasil, fecha-se um círculo em que a presença do po<strong>de</strong>r público tem sidosempre marcante em todas as etapas, ciclos e modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> evoluçãodo SNB, ao longo das últimas décadas e, porque não dizer, ao longo dahistória econômica do país pós-1930.Com tamanho peso do Estado na história econômica brasileira 95 nãosurpreen<strong>de</strong> que o setor privado tenha sido inibido (ou, talvez, tenha-seautoinibido) em realizar investimentos em P&D e C,T&I no processoprodutivo. O resultado <strong>de</strong>sse processo é que hoje as empresas privadasabsorvem cerca <strong>de</strong> 25% dos cientistas brasileiros, ao passo que essacifra ultrapassa os 80% na maioria dos países da OCDE. Ainda querecentemente, nos dois ou três últimos anos, se venha observando umaumento da participação do investimento privado em P&D – tendoinclusive ultrapassado o nível <strong>de</strong> investimento público, na or<strong>de</strong>m<strong>de</strong> R$ 10,45 bilhões contra R$ 10,33 bilhões (Bound, p. 28, 2008) –vimos que gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>sse investimento é contabilizado na forma <strong>de</strong>aquisição <strong>de</strong> bens <strong>de</strong> capital do exterior, o que apoia a expansão da ofertae o aumento dos lucros, mas não gera necessariamente diversificaçãoprodutiva nem introdução <strong>de</strong> novos produtos ou setores no mercado.Outro dado que informa as dificulda<strong>de</strong>s estruturais do setor privado no94Gasques, Bastos e Bacchi (p. 435, 2008) ressaltam a condição da EMBRAPA <strong>de</strong> “maisimportante empresa <strong>de</strong> pesquisa agropecuária tropical do mundo”.95Celso Furtado (p. 102, 1974) assim sintetiza o papel <strong>de</strong>terminante e crucial do Estado brasileirono processo <strong>de</strong> industrialização: “As ondas sucessivas <strong>de</strong> expansão industrial no Brasil duranteo período pós-guerra não po<strong>de</strong>m ser explicadas se não se tem em mente o papel autônomo<strong>de</strong>sempenhado pelo governo, tanto subsidiando investimento como ampliando a <strong>de</strong>manda. Oquadro geral foi o processo <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> importações”.107<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 107 10/10/2011 14:15:42


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorBrasil para inovar é que 97,4% do total das firmas respon<strong>de</strong>ram, no ano2000, por apenas 25,6% das exportações, ao passo que as transnacionaisinstaladas no país (2,2% do total das firmas) foram responsáveis por37,9% das exportações (Arbix, p. 89, 2007). Esse dado indica a baixacapacida<strong>de</strong> e propensão das pequenas e médias empresas a inovar,persistindo no imaginário socioeconômico brasileiro a percepção <strong>de</strong>que tal ativida<strong>de</strong> estaria reservada apenas às gran<strong>de</strong>s corporações, <strong>de</strong>gran<strong>de</strong>s ativos e receitas líquidas milionárias. Essa percepção contrastacom a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pequenas e médias empresas <strong>de</strong> diversos paíseseuropeus, notadamente <strong>de</strong> regiões como a Emilia Romagna no norte daItália, Valência, na Espanha, e norte da Áustria, com elevada intensida<strong>de</strong><strong>de</strong> pequenas e médias empresas inovadoras e propensão a exportar(Kaminski, Oliveira & Lopes, pp. 30-31, 2008).Em estudo do Departamento <strong>de</strong> Engenharia Mecânica da EscolaPolitécnica <strong>de</strong> São Paulo, a cargo dos autores acima, concluiu-se quepequenas e médias empresas com os melhores índices <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>são mais propensas a exportar e exibem índice <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong>significativamente superior, também no mercado doméstico, àsconcorrentes que não inovam. Em seu estudo referente às pequenas emédias empresas do setor metal-mecânico do anel industrial <strong>de</strong> São Paulo,os autores concluíram que a <strong>inovação</strong> brota a partir da interação <strong>de</strong>ssasempresas com firmas <strong>de</strong> consultoria, fornecedores <strong>de</strong> protótipos e testes,universida<strong>de</strong>s, clientes e centros <strong>de</strong> pesquisa. As pequenas empresas queinovam contam, além disso, com um Departamento <strong>de</strong> Desenvolvimento<strong>de</strong> Produto em sua estrutura organizacional (Kaminski, Oliveira & Lopes,p. 35, 2008). Nem no setor metal-mecânico das pequenas empresas docinturão industrial <strong>de</strong> São Paulo, nem nas <strong>de</strong>mais pequenas empresasbrasileiras <strong>de</strong> modo geral, tal comportamento inovador é recorrente, o queexplicaria, em gran<strong>de</strong> medida, a gran<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sproporcional participaçãodas multinacionais no comércio exterior brasileiro e as dificulda<strong>de</strong>scorrespon<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> um processo autóctone <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.O problema básico do SNB po<strong>de</strong> ser localizado, em síntese,precisamente nesse ponto: muito embora o Brasil esteja pontilhado<strong>de</strong> exemplos bem-sucedidos <strong>de</strong> comportamento inovador, e comtransbordamentos expressivos por diversos setores da economia, trata-seainda <strong>de</strong> exemplos, <strong>de</strong> casos isolados (ainda que crescentes em gêneroe número), sem a crucial <strong>sistema</strong>ticida<strong>de</strong> que faz com que estejam em108<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 108 10/10/2011 14:15:42


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesestreita conexão econômica entre si e com os <strong>de</strong>mais atores do processo<strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Esses exemplos incluiriam a indústria aeronáutica eaeroespacial, o setor <strong>de</strong> biocombustíveis e <strong>de</strong> energias renováveisambientalmente limpas, os Parques Tecnológicos <strong>de</strong> São Carlos e SãoJosé dos Campos, o Porto Digital no Recife, a “tecnópole” <strong>de</strong> Santa Ritado Sapucaí e a experiência <strong>de</strong> incubadoras <strong>de</strong> empresas em cida<strong>de</strong>s comoFlorianópolis, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Campinas e Belo Horizonte.Um dos gran<strong>de</strong>s exemplos <strong>de</strong> criativida<strong>de</strong> da indústria brasileira, quecapturou o imaginário coletivo e <strong>de</strong> boa parte dos analistas <strong>de</strong> C,T&Ino Brasil, é o da indústria do pão <strong>de</strong> queijo 96 , que <strong>de</strong>mandou intensainteração <strong>de</strong> empresas com Universida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong> pesquisa – casodas Universida<strong>de</strong>s Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong> Viçosa e Lavras e o Centro Tecnológico<strong>de</strong> Minas – CETEC – o que resultou em soluções que geraram 400 novasempresas, 8.000 pontos <strong>de</strong> venda, taxas anuais <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> 100%e geração <strong>de</strong> mercado externo em ao menos 16 países (Paula e Silva,p. 1343, 2005).A feição problemática <strong>de</strong>sses e <strong>de</strong> outros trunfos da <strong>inovação</strong>na indústria é que, ao po<strong>de</strong>rem ser enumerados e <strong>de</strong>stacados, nãorepresentam a realida<strong>de</strong> predominante do setor produtivo do país;tampouco são capazes, por si mesmos, <strong>de</strong> exibir comportamentosistêmico, na forma <strong>de</strong> repetição e multiplicação recorrentes <strong>de</strong>ssescasos, em níveis crescentes e exponenciais (e apesar do efeito miméticoe catalisador positivo que po<strong>de</strong>m induzir entre empreen<strong>de</strong>dores do país).Um indício, portanto, <strong>de</strong> efetivo funcionamento do SNB a partir <strong>de</strong>ssascaracterísticas dinâmicas seria a multiplicação <strong>de</strong> bons exemplos comoos acima indicados, incorporando-se ao imaginário da <strong>inovação</strong> até quevenham a suplantar práticas concorrenciais tradicionais, expressão <strong>de</strong>uma pseudocompetitivida<strong>de</strong> (ou mesmo “espúria”, como preferiria Sutz,p. 287, 2000) das empresas brasileiras.Tais limitações não escapam à atenção do Estado brasileiro, <strong>de</strong>s<strong>de</strong>ao menos o final da década <strong>de</strong> 90 e, especialmente, durante o governoatual, que encetou uma série <strong>de</strong> instrumentos e medidas para intensificare tornar regra a geração <strong>de</strong> ambientes inovadores nas empresas. Aindaque a formação <strong>de</strong> um arcabouço institucional caracterizado pela adoção<strong>de</strong> diversas medidas <strong>de</strong> incentivo, muitas das quais inéditas e ousadas,não possa assegurar por si só os resultados pretendidos, trata-se <strong>de</strong> base96Ver, por exemplo, Paula e Silva, 2005 e Arbix, 2007 (nota 28 acima).109<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 109 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorindispensável, <strong>de</strong> sinalização e orientação clara do Estado em relação aoperfil produtivo que <strong>de</strong>seja fazer vigorar no país. As políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>e <strong>de</strong> capacitação em C&T situam-se, no entanto, entre as <strong>de</strong> resultadomais incerto, exigindo constância, li<strong>de</strong>rança, persistência e sentido<strong>de</strong> longo prazo 97 , uma vez que são marcadas pela impon<strong>de</strong>rabilida<strong>de</strong>,intangibilida<strong>de</strong> e por externalida<strong>de</strong>s, como bem <strong>de</strong>monstram as incertezasgeradas pela crise financeira inter<strong>nacional</strong> iniciada em 2008. A seguirapresentarei brevemente, <strong>de</strong> forma resumida, os instrumentos adotadosem anos recentes pelo Governo Fe<strong>de</strong>ral para a promoção e incentivo à<strong>inovação</strong>.3.2 – Marco jurídico-político-institucional da <strong>inovação</strong> no BrasilNão há diferenças marcantes entre os mecanismos e modalida<strong>de</strong>sadotados por diversos países, industrializados e emergentes, para estimularo processo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e expansão da C&T em suaseconomias, até porque tais mecanismos tornaram-se relativamentehomogêneos a partir da plena vigência <strong>de</strong> um regime multilateral <strong>de</strong>comércio. Já no acordo <strong>de</strong> subsídios e medidas compensatórias daOrganização Mundial do Comércio – OMC, foram consagrados em seuartigo “8.2 (a)” e incisos a subvenção e o incentivo fiscal a inovaçõesem produtos e processos, por meio dos chamados subsídios autorizados(non-actionable subsidies), que permitem o apoio a ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> pesquisa<strong>de</strong>senvolvidas por empresas ou universida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o montante dosubsídio não ultrapasse o limite <strong>de</strong> 75% dos custos totais da pesquisaindustrial em questão 98 .Os mecanismos utilizados pelos Estados para subsidiar a <strong>inovação</strong>(como <strong>de</strong> resto as ativida<strong>de</strong>s econômicas permitidas pelos Acordos97Ao menos em teoria, o Governo Fe<strong>de</strong>ral tem <strong>de</strong>monstrado intenção <strong>de</strong> que políticas<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Brasil configurem-se efetivamente em políticas <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> longoprazo. O Presi<strong>de</strong>nte Lula salientou, por exemplo, ao final <strong>de</strong> seu discurso <strong>de</strong> aberturada III Conferência Nacional <strong>de</strong> C,T&I, realizada em Brasília, <strong>de</strong> 16 a 18/11/2005, que“(...) o Brasil sempre foi pensado <strong>de</strong> quatro em quatro anos, o Brasil nunca foi pensadopara 20 anos ou para 30 anos. E quando o país é pensado apenas <strong>de</strong> quatro em quatroanos a nação fica tão medíocre quanto os dirigentes que a dirigiram”.98Cf. em WTO Legal Texts – Annex 1A – Multilateral Agreements on Tra<strong>de</strong> in Goods, “Subsidiesand Countervailing Measures”, disponível em .110<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 110 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesmultilaterais <strong>de</strong> modo geral) divi<strong>de</strong>m-se em mecanismos técnicos efinanceiros. Basicamente, os primeiros compreen<strong>de</strong>m os instrumentosque afetam direta e imediatamente a gestão da empresa, por meio <strong>de</strong>normas ou procedimentos que modificam (positivamente) sua rotinaprodutiva. Entre tais mecanismos, situam-se os que reforçam ou instalamuma estrutura <strong>de</strong> P&D, por intermédio, por exemplo, da criação <strong>de</strong>um Departamento <strong>de</strong> Desenvolvimento <strong>de</strong> Produto; a instalação ouutilização <strong>de</strong> laboratórios públicos <strong>de</strong> aferição, calibração e análises; orecurso a instituições ou procedimentos <strong>de</strong> certificação; o livre acessoe/ou utilização <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> normalização, metrologia e qualida<strong>de</strong>,oferecidos, no Brasil, pelo INMETRO; o acesso a instrumentos <strong>de</strong> difusãoe repasse <strong>de</strong> tecnologias, como publicações especializadas e técnicas,participação em feiras, seminários e eventos e acordos corporativo--empresariais <strong>de</strong> repasse <strong>de</strong> tecnologias; o acesso a serviços <strong>de</strong> proteçãoda proprieda<strong>de</strong> intelectual e operação em <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> transferência<strong>de</strong> tecnologia, em bases comerciais ou não onerosas; e a instituiçãoou negociação <strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong> comércio exterior facilitadores daabsorção, incorporação ou transferência <strong>de</strong> tecnologia.No caso dos mecanismos financeiros <strong>de</strong> fomento à C,T&I trêsinstrumentos se <strong>de</strong>stacam: o primeiro (ainda que menos difundido noBrasil) é o uso do po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> compra do Estado com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> segerar processo ou produto inovador, tanto por intermédio <strong>de</strong> preferênciaoutorgada a empresas nacionais quanto a estrangeiras, especialmente,neste último caso, por intermédio <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong> offset 99 . Os outrosdois instrumentos são os incentivos fiscais clássicos, outorgados sob aforma <strong>de</strong> isenções e reduções, e o financiamento direto <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>P&D em empresas, que compreen<strong>de</strong>m: subvenções, parcerias Governo--empresa para projetos específicos, por intermédio <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>s,centros tecnológicos ou centros e institutos <strong>de</strong> pesquisa do <strong>sistema</strong>MCT, contratos <strong>de</strong> risco, empréstimos em condições favoráveis e seed99Trata-se <strong>de</strong> licitações internacionais em que a empresa prestadora do serviço ou fornecedora dobem compromete-se a prover contrapartidas tecnológicas, preferências a empresas brasileiras naaquisição <strong>de</strong> bens ou prestação <strong>de</strong> serviços subsidiários, ou outras modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> compensaçãoe contrapartida em relação ao contrato a ser executado no Brasil. Para o estudo das normas emodalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aplicação <strong>de</strong> contratos <strong>de</strong> offset no regime brasileiro <strong>de</strong> compras governamentaisver Galvani (2007). Em 4 e 5/10/2005 o Itamaraty promoveu o Seminário Inter<strong>nacional</strong> sobreCompensação Comercial, Industrial e Tecnológica (“offset”), em Brasília.111<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 111 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorcapital (apoio financeiro inicial) para a constituição <strong>de</strong> empresas ou<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> processos tecnológicos no âmbito da empresa.No Brasil todos esses mecanismos, em maior ou menor grau,situam-se no marco tecnológico <strong>de</strong> apoio à <strong>inovação</strong>, especialmente,a partir <strong>de</strong> 2004, com a promulgação da Lei da Inovação (nº 10.973,regulamentada pelo Decreto nº 5.563, <strong>de</strong> 11/10/2005). A lei constitui umdos principais instrumentos da PITCE, cujas diretrizes foram lançadasno segundo semestre <strong>de</strong> 2003, tendo sido formalmente adotada em31/03/2004. A Política foi estruturada em três “Eixos”, a saber: “açõeshorizontais”, “opções estratégicas” e “áreas portadoras <strong>de</strong> futuro”, essaúltima correspon<strong>de</strong>ndo a nomenclatura que <strong>de</strong>signa a biotecnologia, ananotecnologia e as energias renováveis.A lei n o 10.973 constitui essencialmente instrumento <strong>de</strong> apoiotécnico às empresas, mas prevê também concessão <strong>de</strong> incentivosfiscais, <strong>de</strong> modalida<strong>de</strong>s diversas, para a <strong>inovação</strong> (Art. 20 eparágrafos) 100 . Entre seus princípios regentes, <strong>de</strong>stacar-se-iam oestímulo à formação <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s e alianças entre empresas e Instituições<strong>de</strong> Ciência e Tecnologia (ICT – art. 3º da Lei); apoio à incubação <strong>de</strong>empresas e utilização <strong>de</strong> materiais e da infraestrutura <strong>de</strong> pesquisa dasentida<strong>de</strong>s públicas <strong>de</strong> C&T por parte das empresas, mediante convênio(art. 20, § 13º); facilitação para a transferência <strong>de</strong> tecnologia e aprestação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> P&D e <strong>inovação</strong> às empresas, <strong>de</strong> parte dasICT; participação do pesquisador nos lucros oriundos da aplicação da<strong>inovação</strong> tecnológica pela empresa (art. 14); possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuaçãodo pesquisador diretamente na empresa, mantida a remuneração,proventos e vantagens da instituição pública <strong>de</strong> origem (art. 15);possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> encomenda <strong>de</strong> produto ou serviço <strong>de</strong> alto conteúdotecnológico diretamente pelo po<strong>de</strong>r público, em <strong>de</strong>terminadascircunstâncias, em condições mais flexíveis e favoráveis que asestipuladas pela Lei n o 8.666/93 (art. 7º); contratação preferencial100Conforme salientam analistas brasileiros <strong>de</strong> C&T e particularmente Moreira et al. (p. 05,2007), a lei 10.973 foi inspirada na “Lei <strong>de</strong> Inovação e Pesquisa da França (99-587, <strong>de</strong> 12/07/99)”,que regula “procedimentos legais da relação público-privada e cria mecanismos que estimulema <strong>inovação</strong> tecnológica no ambiente universitário.” Outra fonte <strong>de</strong> inspiração foi o aclamado“Bayh-Dole Act” dos Estados Unidos (University and Small Business Patent Procedures Act), <strong>de</strong><strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1980, que permitiu que universida<strong>de</strong>s, pequenas e médias empresas e instituiçõessem fins lucrativos pu<strong>de</strong>ssem reter a titularida<strong>de</strong> dos inventos, produtos e processos tecnológicos<strong>de</strong>senvolvidos com recursos públicos.112<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 112 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partespor núcleos públicos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> tecnológica <strong>de</strong> invento ou processo<strong>de</strong>senvolvido por inventor in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte (art. 23); apoio financeirodireto ao setor produtivo e concessão <strong>de</strong> condições especiais paraconstituição <strong>de</strong> empresa tecnológica inovadora (art. 20, § 2º). AFINEP é a agência encarregada da gestão, previsão orçamentária econcessão dos recursos solicitados nos projetos correspon<strong>de</strong>ntes, porintermédio dos Fundos Setoriais e particularmente do Fundo Nacional<strong>de</strong> Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT.As disposições finais da Lei <strong>de</strong> Inovação <strong>de</strong>mandaram a aprovaçãoposterior <strong>de</strong> outra Lei que regulamentasse incentivos fiscais <strong>de</strong> estímuloàs ativida<strong>de</strong>s inovadoras, o que veio a ocorrer em 21/11/05 com apromulgação da chamada “Lei do Bem” (n o 11.196), que estipula, entreoutros dispositivos 101 , reduções <strong>de</strong> alíquotas <strong>de</strong> IPI quando da aquisição<strong>de</strong> equipamentos <strong>de</strong>stinados à P,D&I, aplicação <strong>de</strong> alíquota zero a imposto<strong>de</strong> renda inci<strong>de</strong>nte sobre remessas ao exterior para registro <strong>de</strong> marcas,patentes e cultivares 102 e redução <strong>de</strong> impostos referentes a pagamentosa micro e pequenas empresas, quando efetuados com o propósito <strong>de</strong>promover ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> P&D (art. 17 a 26, cap. III). Outra medida <strong>de</strong>impacto trazida pela Lei foi a estipulação <strong>de</strong> subvenções econômicasdiretas às empresas para a contratação <strong>de</strong> pesquisadores com titulaçãomínima <strong>de</strong> Mestre. Em termos gerais, a Lei do Bem atuaria mais no planodos incentivos fiscais, ao passo que a Lei <strong>de</strong> Inovação operaria mais nonível do apoio técnico às empresas.Já em 2006 foram apresentados 1.099 projetos voltados para aobtenção <strong>de</strong> benefícios instituídos por ambas leis, envolvendo recursosda or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> US$ 1,9 bilhão, valores que representam uma <strong>de</strong>mandaseis vezes superior à oferta <strong>de</strong> recursos disponível nos Fundos Setoriais101Quando da aquisição <strong>de</strong> produtos ou serviços <strong>de</strong>stinados à P&D em empresas, o ven<strong>de</strong>dor<strong>de</strong>verá emitir nota fiscal com os dizeres “Os produtos objeto <strong>de</strong>sta Nota se <strong>de</strong>stinam à pesquisae ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico, sendo, portanto, objeto <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> 50% no IPI, nos termosda Lei nº 11.196/2005, artigo 17, inciso II, e do Decreto nº 5.798/2006, artigo 3º, inciso II eartigo 5º”. Este exemplo mais minucioso corroboraria a avaliação <strong>de</strong> que o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> isençõesfiscais <strong>de</strong>correntes das Leis do Bem e <strong>de</strong> Inovação estaria plenamente incorporado à estruturatributária do país e potencialmente integrado à rotina do relacionamento com fornecedores <strong>de</strong>parte <strong>de</strong> empresas com ativida<strong>de</strong>s inovadoras e <strong>de</strong> P&D.102É <strong>de</strong> se crer que tal dispositivo seja <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> e constitua estímulo adicional para<strong>inovação</strong> nas empresas, consi<strong>de</strong>rando o prazo mínimo <strong>de</strong> oito anos para concessão <strong>de</strong> patentespraticado pelo Instituto Nacional da Proprieda<strong>de</strong> Industrial – INPI, em relação aos prazos bemmais céleres praticados por órgãos congêneres <strong>de</strong> outros países.113<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 113 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorcorrespon<strong>de</strong>ntes (Moreira et al., p. 09, 2007). No caso da Lei do Bem,outro fator que estimularia os empresários a estreitarem parcerias com omeio científico seria o automatismo da aplicação dos benefícios previstos,que não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>riam <strong>de</strong> autorização prévia do MCT, como antes sepassava com os Programas <strong>de</strong> Desenvolvimento Tecnológico Industriale Agropecuário (PDTI e PDTA).Subsistem, entretanto, dúvidas <strong>de</strong> monta quanto à eficácia dosinstrumentos utilizados para promoção da <strong>inovação</strong> no Brasil. O volume<strong>de</strong> pedidos <strong>de</strong> apoio verificado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2006 não estaria contemplandoo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> áreas estratégicas assinaladas pela PITCE, taiscomo biotecnologia, energias renováveis, fármacos e medicamentos,concentrando-se antes em programas <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização/atualização <strong>de</strong>estruturas produtivas preexistentes. Segundo avalia Brito Cruz (p. 38,2008), referindo-se às Leis <strong>de</strong> Inovação e do Bem, na prática “(...) a oferta<strong>de</strong> incentivos fiscais ainda tem sido pouco utilizada, porque há muitasincertezas sobre o seu funcionamento 103 ”. Uma crítica mais contun<strong>de</strong>nteé apresentada por Dagnino (2008), no sentido <strong>de</strong> que a atual políticacientífico-tecnológica (PCT) seria “<strong>de</strong>sfuncional”, pelo fato <strong>de</strong> que menos<strong>de</strong> 1% dos Mestres e Doutores brasileiros estão sendo absorvidos pelainiciativa privada para atuarem em P&D, apesar <strong>de</strong> o Governo “estarpraticamente pagando [às empresas] para que empreguem Mestres eDoutores”. Ao avaliar os resultados da PINTEC conduzida pelo IBGEem 2006, o autor assinala que(...) apenas 100 das 30.000 empresas que inovam introduziram no mercado (nosúltimos três anos) alguma <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> processo realmente nova; a importânciaque tem a P&D na estratégia <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> das empresas inovadoras é quatro vezesmenor do que a aquisição <strong>de</strong> máquinas; das empresas inovadoras, só 7% mantêmrelação com universida<strong>de</strong>s e institutos <strong>de</strong> pesquisa e, <strong>de</strong>ssas, 70% atribuem a essarelação baixa importância; (...) entre as empresas que não inovam, 12% <strong>de</strong>claramcomo causa a escassez <strong>de</strong> fontes <strong>de</strong> financiamento e 70% apontam condições <strong>de</strong>mercado (Dagnino, p. A-3, 2008).103As informações aparentemente contraditórias entre alta <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> recursos para a <strong>inovação</strong>previstos nas Leis do Bem e <strong>de</strong> Inovação e a subutilização <strong>de</strong> fundos lamentada pelo DiretorCientífico da FAPESP <strong>de</strong>rivam, no primeiro caso, da ina<strong>de</strong>quação da gran<strong>de</strong> maioria dos pedidose projetos aos requisitos e condições estipulados naqueles instrumentos. Tal realida<strong>de</strong> enseja aimportância e a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> longas campanhas <strong>de</strong> esclarecimento e informação quanto aoalcance <strong>de</strong> ambas Leis.114<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 114 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesDagnino admoesta, a<strong>de</strong>mais, a própria comunida<strong>de</strong> acadêmica<strong>de</strong> C,T&I por ser alegadamente movida por uma “dinâmica cognitivadominada pelo interesse das empresas”, e também o MCT por operar“segundo uma lógica sistêmica fechada, condicionada quase queexclusivamente pelos interesses e perspectivas do setor privado” 104 . Taiscríticas <strong>de</strong>vem ser recebidas com certo ceticismo diante do fato singelo<strong>de</strong> que nenhum processo <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> na história econômicamo<strong>de</strong>rna prescindiu do capitalismo e da livre iniciativa empresarialpara se concretizar. O alerta do autor torna-se, por outro lado, mais queapropriado consi<strong>de</strong>rando-se as cicatrizes <strong>de</strong> ineficiência e <strong>de</strong> favoritismo<strong>de</strong>ixadas pelas relações patrimonialistas Estado-setor privado naeconomia brasileira.O então Ministro da C&T, Sérgio Rezen<strong>de</strong>, apesar <strong>de</strong> reconhecera aproximação e melhor coor<strong>de</strong>nação entre as políticas industrial e <strong>de</strong>C&T nos últimos tempos, admite que a meta da Lei <strong>de</strong> Inovação <strong>de</strong>facilitar a interação entre empresas e o setor <strong>de</strong> pesquisas “não temdado muito resultado”. Quanto à aplicação da Lei do Bem, o Ministroadmite que “as empresas não têm sentido que esses incentivos [fiscais]são suficientes” (Rezen<strong>de</strong>, p. 05, 2008). Ao final <strong>de</strong> 2008, entretanto,o quadro seria mais alvissareiro que em 2006, em relação à <strong>de</strong>manda<strong>de</strong> recursos da FINEP para projetos ao amparo das Leis do Bem e<strong>de</strong> Inovação: foram 2.665 projetos apresentados, correspon<strong>de</strong>ndo auma <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> US$ 6 bilhões, e 245 os aprovados (contra 147 em2006), correspon<strong>de</strong>ndo a <strong>de</strong>sembolsos <strong>de</strong> R$ 450 milhões. Outro fatorpositivo <strong>de</strong>sses números, <strong>de</strong> caráter mais qualitativo, é que os projetosaprovados passaram a refletir mais e melhor as áreas e priorida<strong>de</strong>sestratégicas governamentais <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da C,T&I, o que indicamaior divulgação e conhecimento <strong>de</strong>sses instrumentos <strong>de</strong> fomento eo crescimento da base <strong>de</strong> empresas propensas a inovar. Como fatornegativo, ressalte-se a persistência da ampla concentração <strong>de</strong> projetosoriundos da região Su<strong>de</strong>ste. As regiões Norte, Nor<strong>de</strong>ste e Centro-Oestetiveram apenas 35 projetos aprovados, apenas cinco dos quais proce<strong>de</strong>ntesda região Norte 105 . A tendência aponta, portanto, para o fortalecimento –e não recuo – dos programas governamentais, tendência que terá <strong>de</strong> ser104Opiniões vertidas durante o II Curso sobre cooperação inter<strong>nacional</strong> em C,T&I, Brasília,MRE, 03/09/08.105Cf. em .115<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 115 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorsubmetida a mais uma dura prova, por conta do reforço das trajetórias<strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência e <strong>de</strong> especialização da economia brasileira, em tempos<strong>de</strong> crise financeira inter<strong>nacional</strong>.Ainda que seja necessário aguardar os resultados <strong>de</strong> novas pesquisas<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> a cargo do IBGE para melhor aferir o impacto da nova PCT doGoverno, não se <strong>de</strong>ve esperar mudanças expressivas no comportamentodas empresas no tocante à sua articulação com o próprio governo e com auniversida<strong>de</strong>. De fato, do total <strong>de</strong> 0,7% das empresas que, <strong>de</strong> acordo coma pesquisa PINTEC 2005 introduziram alguma <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> produto nomercado, quase 40% correspon<strong>de</strong>m a gran<strong>de</strong>s multinacionais, brasileirasou estrangeiras. A recente “freada brusca” da economia mundial e suasimplicações para o comportamento das empresas <strong>de</strong>verão tambémcontribuir para <strong>de</strong>sestimular o comportamento inovador, que requererágran<strong>de</strong>s volumes <strong>de</strong> crédito e um improvável processo <strong>de</strong> reconversãoindustrial numa conjuntura <strong>de</strong> crise. Pelo contrário, conforme assinaladoanteriormente, os dados indicam uma tendência <strong>de</strong> <strong>de</strong>sindustrialização,em gran<strong>de</strong> parte provocada pelo binômio perverso apreciação cambial– juros elevados. No caso brasileiro, porém, a crise inter<strong>nacional</strong> terá<strong>de</strong> consistir em oportunida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> parte do governo e das empresas, paraque o nível <strong>de</strong> produção alcance etapa <strong>de</strong> menor vulnerabilida<strong>de</strong> e maiorconteúdo tecnológico, para um melhor enfrentamento da competição,quando os níveis globais <strong>de</strong> consumo tornarem a se recuperar. Coma exceção <strong>de</strong> alguns poucos analistas <strong>de</strong> C&T – o principal dos quaisRoberto Dagnino (que tem concitado o governo a seguir em direçãoexatamente oposta às das Leis <strong>de</strong> Inovação e do Bem, não mais <strong>de</strong>stinandorecursos públicos a empresas privadas) – a avaliação geral é <strong>de</strong> queos instrumentos que consubstanciam a PCT são a<strong>de</strong>quados, mas querequererão persistência e tenacida<strong>de</strong> para que seus efeitos se façam sentir(ao duplicar, por exemplo, o número <strong>de</strong> empresas inovadoras no Brasil,<strong>de</strong> todos os portes e em todas as regiões).Outros dois programas fundamentais que compõem o marco da<strong>inovação</strong> tecnológica no Brasil são o referido Plano <strong>de</strong> Ação 2007-2010do MCT (PACTI, ou PAC da C&T) e a Política <strong>de</strong> DesenvolvimentoProdutivo (PDP) formulada pelo MDIC. Também em ambos casos areceptivida<strong>de</strong> da aca<strong>de</strong>mia e da socieda<strong>de</strong> brasileiras tem sido bastantepositiva, especialmente no caso da PDP, após o país ter atravessadoquase quinze anos sem nenhuma política industrial. Ambos programas116<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 116 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesoperariam em tan<strong>de</strong>m, como <strong>de</strong>sejam as autorida<strong>de</strong>s governamentaise particularmente o MCT, articulando-se por sua vez com o Plano<strong>de</strong> Desenvolvimento da Educação e com o Programa “Mais Saú<strong>de</strong>”,compondo um quadro multitemático e multissetorial <strong>de</strong> apoio à <strong>inovação</strong>e à capacitação científico-tecnológica do país. Um gran<strong>de</strong> méritoinicial <strong>de</strong>ssas iniciativas é, portanto, o <strong>de</strong> buscar envolver distintasagências e instâncias governamentais num movimento entrelaçado <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>inovação</strong>, uma vez que muitos esforços anteriores<strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação entre atores-chave do SNB malograram pela falta<strong>de</strong> sinergia e <strong>de</strong> harmonização <strong>de</strong> iniciativas, no âmbito do própriogoverno. A PITCE, o PACTI, a PDP e o próprio PAC <strong>de</strong> modo geral,além dos programas complementares nas áreas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e educação,visam a atacar simultaneamente os entraves tanto “intangíveis” (comoeducação, formação <strong>de</strong>ficiente e/ou insuficiente <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra e baixacoor<strong>de</strong>nação intrassistêmica no SNB) quanto “tangíveis” do <strong>sistema</strong>, taiscomo infraestrutura física e <strong>de</strong> pesquisa, investimento, geração e absorção<strong>de</strong> tecnologias e estímulo à mo<strong>de</strong>rnização <strong>de</strong> produtos e processos emempresas <strong>de</strong> portes diferentes.A PDP tem como seu principal e <strong>de</strong>clarado objetivo “darsustentabilida<strong>de</strong> ao atual ciclo <strong>de</strong> expansão” 106 , a partir <strong>de</strong> quatromacrometas para 2010: expandir a taxa geral <strong>de</strong> investimento dos atuais17,6 para 21% do PIB; ampliar a participação das exportações brasileirasno comércio mundial, <strong>de</strong> 1,16 para 1,25%; elevar a taxa <strong>de</strong> gastos privadosem P&D, <strong>de</strong> 0,51 para 0,65% do PIB, alcançando US$ 18,2 bilhões em2010 107 ; e expandir em 10% o total <strong>de</strong> empresas pequenas e médias querealizam ativida<strong>de</strong>s inovadoras.A PDP é caracterizada por três gran<strong>de</strong>s grupos <strong>de</strong> programas, voltadospara: i – “expandir e consolidar a li<strong>de</strong>rança brasileira” (em áreas em queo Brasil se <strong>de</strong>staca como exportador <strong>de</strong> primeira gran<strong>de</strong>za no mercadointer<strong>nacional</strong>, tais como carnes, confecções e têxteis, celulose, mineraçãoe si<strong>de</strong>rurgia); ii – “fortalecer a competitivida<strong>de</strong>” (que correspon<strong>de</strong> aáreas em que o Brasil já possui competitivida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong>, como106A íntegra da apresentação do PDP, discursos e documentos <strong>de</strong> trabalho alusivos à sua concepçãoestão disponíveis em .107Embora não haja ainda dados <strong>de</strong>finitivos relativos a 2010, é certo que esse índice <strong>de</strong> 0,65% nãopô<strong>de</strong> ser alcançado, diante da forte retração econômica verificada no Brasil em 2009. Nesse ano,segundo o MCT o percentual <strong>de</strong> gastos empresariais em P&D situou-se na faixa <strong>de</strong> 0,58%, contra0,61% do gasto público (conferir em .117<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 117 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>sistema</strong> agroindustrial, couro, calçados e artefatos, indústria aeronáuticae bens <strong>de</strong> capital seriados); e iii – “[mobilização] em áreas estratégicas”essenciais ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, tais como energias renováveis, complexoindustrial da saú<strong>de</strong>, nanotecnologia e biotecnologia. Os recursos paraa implementação da PDP provêm <strong>de</strong> três fontes: R$ 210,4 bilhõesdo MDIC e do BNDES (triênio 2008-2010), para apoio à indústriae ao setor <strong>de</strong> serviços; R$ 41,2 bilhões do orçamento do MCT e doBNDES para financiamento à <strong>inovação</strong>, no âmbito do PACTI; e R$ 20bilhões, a título <strong>de</strong> incentivos e <strong>de</strong>sonerações tributárias (sobretudo dasexportações), assumidos pelo Ministério da Fazenda. A parte específica<strong>de</strong> financiamento à <strong>inovação</strong> na PDP, por intermédio do PACTI e comrecursos fundamentalmente do BNDES, compreen<strong>de</strong>rá as linhas “Capitalinovador”, “<strong>inovação</strong> tecnológica”, o FUNTEC/BNDES e recursos daFINEP, por meio <strong>de</strong> Fundos Setoriais e do programa não reembolsável“subvenção econômica à <strong>inovação</strong>”.A participação atribuída ao Itamaraty na PDP engloba sete áreasprincipais e dois projetos e iniciativas. As áreas são o complexoindustrial da saú<strong>de</strong> (fortalecer a cooperação inter<strong>nacional</strong> e aumentar asexportações <strong>de</strong> produtos e serviços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> a mercados emergentes);softwares e tecnologias da informação e da comunicação (TIC) (porintermédio do Programa <strong>de</strong> atração <strong>de</strong> investimentos estrangeirosem microeletrônica e do fortalecimento da marca “Brazil IT”);nanotecnologia (promoção comercial e acesso a mercados <strong>de</strong> paísesemergentes); complexo industrial <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa (celebração <strong>de</strong> acordose promoção comercial); bioetanol (“ajudar a criar um mercadointer<strong>nacional</strong> para o etanol” e promover iniciativas <strong>de</strong> cooperaçãotécnica); indústria aeronáutica (promoção comercial) e <strong>sistema</strong>agroindustrial (“reduzir as assimetrias das relações comerciais doagronegócio”, por meio <strong>de</strong> negociações internacionais para acesso eexpansão <strong>de</strong> mercados).Os dois projetos e iniciativas situam-se no marco da “integraçãoprodutiva da América Latina e Caribe” e integração com a África. Noprimeiro caso, a partir do diagnóstico <strong>de</strong> que as ca<strong>de</strong>ias produtivas sãopouco articuladas e o potencial <strong>de</strong> escala regional é subutilizado, aparticipação do MRE dar-se-á por meio <strong>de</strong> programas como o FOCEMe o PSCI (Programa <strong>de</strong> Substituição Competitiva <strong>de</strong> Importações) einiciativas como integração da infraestrutura logística e energética e118<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 118 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesimplementação do aludido “Observatório regional permanente sobreintegração produtiva do Mercosul” (ORPIP – ver pp. 82-83 supra); nocaso da integração produtiva com a África, o principal <strong>de</strong>safio seriano sentido <strong>de</strong> intensificar as iniciativas <strong>de</strong> cooperação técnica voltadaspara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do agronegócio e da indústria, mediante, porexemplo, o “<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> uma plataforma <strong>de</strong> apoio <strong>de</strong> umaindústria sustentável <strong>de</strong> biocombustíveis na África Austral” (MDIC/Ministério da Fazenda/ABDI/BNDES, pp. 223-239, 2008).O outro programa-chave para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológicobrasileiro, <strong>de</strong> interesse direto para este trabalho, é o PACTI, integrado<strong>sistema</strong>ticamente aos referidos planos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da saú<strong>de</strong> eda educação e à PDP. A meta primordial do PACTI – que não pô<strong>de</strong> sercumprida, em gran<strong>de</strong> medida <strong>de</strong>vido à crise financeira inter<strong>nacional</strong>– era ampliar a participação do investimento em P,D&I no PIB doatual cerca <strong>de</strong> 1% para 1,5% em 2010, assim como promover a firmearticulação da política <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico com apolítica industrial. A exemplo da PDP, a PITCE valeu-se <strong>de</strong> instrumentosfiscais diversos, da política <strong>de</strong> compras do Estado, do apoio técnico e<strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong> regulação, aplicáveis a todas as etapas do ciclo <strong>de</strong><strong>inovação</strong>, para promover a competitivida<strong>de</strong> da indústria e da produçãobrasileira em geral. Meta subsidiária do PACTI <strong>de</strong>rivada da primeiraenunciada acima, <strong>de</strong> elevação do investimento em P,D&I para 1,5% doPIB, foi o aumento da proporção do gasto privado em P,D&I, dos atuais0,51% para 0,65%, em 2010, proposta igualmente frustrada, conformedados indicados na nota 106 supra. O núcleo dinâmico do PACTI seriaa Promoção da <strong>inovação</strong> tecnológica nas empresas, no âmbito daqual se sobressai a estruturação do Sistema Brasileiro <strong>de</strong> Tecnologia(SIBRATEC), com re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> institutos fe<strong>de</strong>rais, estaduais e privados,com vistas ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico-industrial das empresas. OSIBRATEC viria a ser integrado, grosso modo, pelas 230 instituiçõesfiliadas à Associação Brasileira <strong>de</strong> Instituições <strong>de</strong> Pesquisa Tecnológica(ABIPTI) que, no entanto, operam <strong>de</strong> forma isolada e não articulada coma <strong>de</strong>manda tecnológica das empresas, da mesma forma que a oferta nemsempre é <strong>de</strong> proveito direto do setor empresarial.O projeto SIBRATEC é inspirado, em linhas gerais, em iniciativascomo a da Fraunhofer Gesellschaft alemã, voltada para a pesquisaaplicada <strong>de</strong> interesse direto para a indústria e os setores público e119<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 119 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>de</strong> serviços 108 . O projeto beneficiou-se inicialmente da experiência edo histórico <strong>de</strong> êxito da articulação empresa-centros <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong>parte dos institutos tecnológicos vinculados às empresas estatais, taiscomo o CENPES-Petrobras, CEPEL (Centro <strong>de</strong> Pesquisas <strong>de</strong> EnergiaElétrica)-Eletrobras e EMBRAPA. Tal como consta do PACTI (MCT,pp. 115-121, 2007), o SIBRATEC pretendia operar a partir <strong>de</strong> “centros<strong>de</strong> <strong>inovação</strong>” – cujo objetivo será o <strong>de</strong> produzir conhecimento comviabilida<strong>de</strong> comercial –, institutos <strong>de</strong> serviços tecnológicos encarregados<strong>de</strong> prover a tecnologia industrial básica (TIB) (por intermédio <strong>de</strong>entida<strong>de</strong>s como o INMETRO e a Re<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Metrologia Legale Qualida<strong>de</strong> – RBMLQ), e programas <strong>de</strong> extensão tecnológica paraauxílio e orientação <strong>de</strong> pequenas e médias empresas <strong>de</strong> base tecnológicapotencial ou efetiva. O extensionismo, nessa perspectiva, po<strong>de</strong>rá fazero SIBRATEC representar para a pequena e média indústria o que aEMBRAPA hoje representa para o pequeno e médio produtor rural emtermos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e impacto na produtivida<strong>de</strong>. Entre as metas para oSIBRATEC estipuladas no PACTI constam a implementação das re<strong>de</strong>s“centro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>” em onze diferentes ca<strong>de</strong>ias industriais até 2010,assim como “prestar atendimento <strong>de</strong> serviço ou consultoria tecnológica a,pelo menos, 10.000 MPEs, até <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2010” (MCT, p. 121, 2007).No capítulo da ação e da cooperação internacionais, o PACTI, emsintonia com o que dispõe a PDP, tem como uma <strong>de</strong> suas metas principaisaprofundar a cooperação com países africanos e sul-americanos, além<strong>de</strong> com Índia e China. Diferentemente da PDP, porém, está assinaladono PACTI o imperativo <strong>de</strong> “estruturar e ampliar” parcerias e iniciativas<strong>de</strong> cooperação <strong>de</strong> alto nível em C&T com os países europeus, Japão eEstados Unidos, com o intuito <strong>de</strong> absorver experiências <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>encetadas por esses países e <strong>de</strong> aplicação potencial ou direta naeconomia brasileira. Ainda no plano da cooperação inter<strong>nacional</strong>,foram consi<strong>de</strong>radas as áreas <strong>de</strong> biocombustíveis, biotecnologia, saú<strong>de</strong>animal, nanotecnologia, tecnologia espacial, nuclear e <strong>de</strong> interesseespecial para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da região amazônica como essenciaispara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico. Outro ponto saliente do PACTI,108A Fraunhofer conta com uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> 57 institutos tecnológicos em 40 cida<strong>de</strong>s alemãs.Desenvolve pesquisas em 26 áreas do conhecimento e conta com equipe <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 10.000engenheiros e cientistas, com orçamento anual <strong>de</strong> € 1,4 bilhão. Descrição pormenorizada dasativida<strong>de</strong>s da instituição (cujo lema é “Innovation durch Forschung” – <strong>inovação</strong> através dapesquisa) po<strong>de</strong> ser acessada em .120<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 120 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesque se coaduna integralmente com a Política Externa, é a ênfase, naagenda inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> C,T&I, em programas que permitam expandira produção <strong>de</strong> alimentos em países em <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e aju<strong>de</strong>m apromover a inclusão social em países <strong>de</strong> menor <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo,comparativamente ao Brasil (MCT, p. 70, 2007).De modo geral, há dois problemas básicos no PACTI que <strong>de</strong>vem serassinalados, por suas implicações para a consolidação da nova política <strong>de</strong>C,T&I. O primeiro refere-se à formação <strong>de</strong> recursos humanos, em que oPlano, em seu capítulo sobre a consolidação e expansão da capacida<strong>de</strong><strong>de</strong> pesquisa científico-tecnológica, assinala a meta do Plano Nacional <strong>de</strong>Pós-Graduação 2005-2010 <strong>de</strong> formar 16.000 doutores e 45.000 mestresem 2010, contra os 10.000 doutores titulados em 2007, número que oPlano estima como “insuficiente para as necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>do país” (MCT, pp. 37 e 48, 2007) – e que tampouco foi alcançado,conforme pretendido. Não obstante a evi<strong>de</strong>nte pertinência da avaliaçãoacima do próprio MCT, <strong>de</strong>ve-se ressaltar que a maioria dos 10.000novos doutores formados em 2007 vem basicamente da área <strong>de</strong> ciênciashumanas, com forte concentração na área <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong>s strictu senso 109 .Antes, o próprio programa salienta a construção <strong>de</strong> um complexo <strong>sistema</strong><strong>de</strong> C&T no Brasil, a partir <strong>de</strong> uma base <strong>de</strong> 85.000 engenheiros e cientistasformados nas quatro últimas décadas, reconhecendo, porém, que acapacida<strong>de</strong> das empresas <strong>de</strong> produzir inovações na mesma proporção eabsorver os profissionais qualificados brasileiros evoluiu em proporçãobastante inferior (MCT, p. 31, 2007).Tomado como fato isolado, portanto, <strong>de</strong>svinculado da capacida<strong>de</strong>do setor privado e da economia em geral <strong>de</strong> absorver os novos doutoresque se titulam a cada ano, a meta fixada no PACTI <strong>de</strong> expandirexponencialmente o número <strong>de</strong> pós-graduados po<strong>de</strong> ter-se reveladoinócua. Se é correto que o Brasil <strong>de</strong>ve ampliar sua base <strong>de</strong> físicos,engenheiros, matemáticos, geneticistas e químicos industriais, éigualmente certo que os programas <strong>de</strong> expansão <strong>de</strong> parques e incubadoras<strong>de</strong> empresas <strong>de</strong> base tecnológica não aten<strong>de</strong>rão à oferta do contingenteadicional <strong>de</strong> novos titulados, que seguirão vocacionados para a pesquisa109Dos 90.320 pesquisadores envolvidos em 403 grupos <strong>de</strong> pesquisa mantidos pelo CNPq em todoo Brasil, 36.290, ou 40% do total, são das áreas <strong>de</strong> ciências humanas, linguística, letras e artes.Cf. em , item “Perfil das gran<strong>de</strong>s áreas doconhecimento”. Além disso, ressalte-se que apenas 10,7% <strong>de</strong> todos os graduados brasileiros em2008 proce<strong>de</strong>m <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> ciências e engenharias em geral (OCDE, p. 164, 2008).121<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 121 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniore a docência superior, especialmente com a notável expansão da re<strong>de</strong> <strong>de</strong>Instituições Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong> Ensino Superior (IFES) no governo atual, queé on<strong>de</strong> tem havido verda<strong>de</strong>ira explosão da <strong>de</strong>manda por pesquisadorestitulados <strong>de</strong> alto nível. Nesse sentido, programas como o SIBRATEC eos diversos incluídos na PDP voltados para a ampliação da capacida<strong>de</strong>das empresas <strong>de</strong> inovar, <strong>de</strong>veriam ser objeto <strong>de</strong> atenção <strong>de</strong>terminada eobstinada por parte dos executores da estratégia geral <strong>de</strong> diversificaçãoe elevação do padrão produtivo do país, simultaneamente à política <strong>de</strong>reforço <strong>de</strong> qualificação dos recursos humanos brasileiros, que já se situa,conforme diversos indicadores, em patamar equivalente ou superior ao<strong>de</strong> muitos países da OCDE. Mais do que ampliar o número <strong>de</strong> bolsas,portanto, há <strong>de</strong> se atinar para as áreas prioritárias a que essa política <strong>de</strong>capacitação <strong>de</strong>va estar voltada, assim como para a forma precisa comose dará a incorporação <strong>de</strong>sses novos engenheiros e cientistas pelo setorprodutivo e pelo mercado 110 . Mais uma vez, trata-se <strong>de</strong> atentar para aa<strong>de</strong>quada coevolução dos fatores <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no âmbito <strong>de</strong> um SNI emvias <strong>de</strong> formação e consolidação, e não apenas consi<strong>de</strong>rar aspectos <strong>de</strong>oferta do <strong>sistema</strong>, como historicamente vem sendo feito e consoante omo<strong>de</strong>lo linear que tem caracterizado as políticas e programas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>no Brasil 111 .O segundo problema refere-se ao marco geral e à atuação do maisalto fórum <strong>de</strong> formulação e gestão estratégica da PCT brasileira, oConselho Nacional <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia (CCT) 112 . O próprio MCTe o PACTI têm dificulda<strong>de</strong> para avaliar precisamente o peso real que oórgão dispõe para o efetivo exercício <strong>de</strong> suas funções. De uma parte, aotratar da Priorida<strong>de</strong> Estratégica I (“Expansão e Consolidação do SistemaNacional <strong>de</strong> C,T&I”), Linha <strong>de</strong> Ação 1 (“Consolidação Institucional110O MCT e o CNPq reconheceram em parte essa dificulda<strong>de</strong> ao terem aprovado apenas seisprogramas da área <strong>de</strong> ciências humanas entre os 123 selecionados no edital nº 015/2008, voltadopara a constituição da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Institutos Nacionais <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia (INCT) no país. Arelação dos institutos aprovados (que reflete precisamente as priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> política científicae tecnológica do governo, a partir <strong>de</strong> critérios <strong>de</strong> mérito das propostas apresentadas) po<strong>de</strong> seracessada no portal .111O programa “Ciência sem Fronteiras”, lançado pelo Governo Fe<strong>de</strong>ral em 2011, e que consistena concessão <strong>de</strong> 75.000 bolsas para brasileiros estudarem e atuarem em centros <strong>de</strong> P&D noexterior, reconhece a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formar brasileiros prioritariamente em áreas <strong>de</strong> impactopara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico-social, embora não especifique como se dará a absorção<strong>de</strong>sse contingente pelo aparato produtivo e <strong>de</strong> pesquisa do país.112As ativida<strong>de</strong>s, composição e missão do Conselho Nacional <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia foramestabelecidos pela Lei nº 9.257, <strong>de</strong> 09/01/96.122<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 122 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesdo Sistema <strong>de</strong> C,T&I”), o PACTI anuncia que a priorida<strong>de</strong> essencialdo Plano é “constituir e consolidar fóruns <strong>de</strong> integração <strong>de</strong> políticas einiciativas <strong>de</strong> atores <strong>de</strong> C,T&I, com <strong>de</strong>staque para a revitalização e adinamização do Conselho Nacional <strong>de</strong> C&T (CCT) (MCT, p. 17, 2007,grifo meu). Na apresentação do Plano, entretanto, os autores afirmam que“a harmonização entre as políticas dos diversos ministérios que tambématuam [na área <strong>de</strong> C&T] tem sido assegurada pelo Conselho Nacional<strong>de</strong> Ciência e Tecnologia que, presidido pelo Presi<strong>de</strong>nte da República,teve sua atuação revigorada na gestão do Presi<strong>de</strong>nte Luiz Inácio Lula daSilva” (MCT, p. 07, 2007, i<strong>de</strong>m).Tal contradição po<strong>de</strong> ser melhor compreendida se a consi<strong>de</strong>rarmossob os prismas relativo e absoluto. No primeiro caso, certamente houveuma revitalização e maior dinamismo do CCT durante o Governo Lula,uma vez que foram realizadas ao menos <strong>de</strong>z reuniões do Conselho duranteo seu mandato, muitas das quais presididas pelo próprio Presi<strong>de</strong>nte, quesempre exortou, em suas intervenções, que as reuniões do Conselhoresultassem em diretrizes concretas e operacionais para o fortalecimentodo SNB. Na reunião <strong>de</strong> “reinstalação” do CCT, realizada em 11/09/2003,o Presi<strong>de</strong>nte criticou os “intervalos inoperantes” das reuniões (a últimahavia sido realizada em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2001, com participação reduzidae sem a presença <strong>de</strong> vários Ministros que o integram) e alertou, já nosprimeiros meses <strong>de</strong> seu mandato, para a <strong>de</strong>scoor<strong>de</strong>nação existente entregoverno, empresas, universida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong> pesquisa, que se mostracomo o gran<strong>de</strong> óbice para o êxito e a maturação das políticas <strong>de</strong> C,T&Ino país 113 .Em termos absolutos, porém, é certamente correta a avaliação <strong>de</strong> queo CCT tem <strong>de</strong> ser “revitalizado e redinamizado”. Uma das preocupaçõesa se levar em conta são os “intervalos inoperantes” assinalados peloPresi<strong>de</strong>nte Lula, especialmente quando o Conselho se esmera em produzirbons diagnósticos sobre as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológicodo setor privado, mas não discute ou apresenta indicadores harmônicosou sugestões <strong>de</strong> políticas que <strong>de</strong>vam ser firmemente assumidas pelo113O CCT foi instalado pelo Presi<strong>de</strong>nte da República, em reunião na Granja do Torto em 17/08/96.Um dos principais trabalhos do Conselho, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foi arealização do seminário “Estudos prospectivos em C&T: experiências internacionais”, focalizadoem painéis <strong>de</strong> estudos dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> Alemanha, Austrália, Coreia, França e Japão,valendo notar, nesse particular, a ausência <strong>de</strong> sessões específicas sobre Estados Unidos, China,Índia e Reino Unido.123<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 123 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorExecutivo, sobretudo em coor<strong>de</strong>nação entre os órgãos com assento noConselho. Normalmente, as participações são dominadas pelo próprioMinistro da Ciência e Tecnologia, por representantes da aca<strong>de</strong>mia e <strong>de</strong>usuários e produtores <strong>de</strong> C&T. Outro fator <strong>de</strong>sairoso para as ativida<strong>de</strong>s doCCT é o fato <strong>de</strong> não se ter reunido durante os anos <strong>de</strong> 2007 e 2008, épocajustamente em que se requereria maior estreitamento da coor<strong>de</strong>naçãointra e interministerial para a implementação das políticas e aplicaçãodas leis promotoras da <strong>inovação</strong> no país. A ausência <strong>de</strong> uma coor<strong>de</strong>naçãoclara e centralizada das políticas <strong>de</strong> C,T&I po<strong>de</strong> afetar seriamente –como efetivamente tem afetado – muitas das propostas e iniciativascontempladas nas leis e programas <strong>de</strong> fomento à <strong>inovação</strong> no Brasil.Trata-se <strong>de</strong> enfrentar o <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> elevar a importância da <strong>inovação</strong> nahierarquia das políticas públicas <strong>de</strong> modo geral.Cabe finalmente assinalar que a presença do Itamaraty tem sidodas mais discretas nas reuniões do Conselho, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua criação.Segundo as atas das reuniões (disponíveis em www.mct.gov.br/in<strong>de</strong>x.php/content/view/10125.html) já na reunião <strong>de</strong> instalação, realizada emagosto <strong>de</strong> 1996, o Itamaraty teria sido o único Ministério integrante doConselho que não participou. Nas diversas reuniões subsequentes, nãoconsta a presença do Ministro <strong>de</strong> Estado, sendo que na maioria <strong>de</strong>las oItamaraty sequer fez-se representar. Consta ainda que em apenas umareunião em 14 anos, a <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2004, o representante do Itamaratyteve uma participação mais <strong>de</strong>stacada e propositiva. Cabe, naturalmente,nessas condições, a redinamização do Conselho e uma participação mais<strong>de</strong>cidida do Itamaraty, diante da realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> plena inter<strong>nacional</strong>izaçãoda economia brasileira (em termos <strong>de</strong> investimento, ampliação ediversificação da participação <strong>de</strong> nossos produtos no mercado mundial);da inter<strong>nacional</strong>ização <strong>de</strong> nossas empresas; do potencial <strong>de</strong> crescimentoexponencial <strong>de</strong> pesquisadores brasileiros no exterior, por conta doprograma “Ciência sem Fronteiras”; e da influência crescente da pesquisabrasileira na comunida<strong>de</strong> científica inter<strong>nacional</strong>, em gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>vidoà qualificação <strong>de</strong> ponta <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s contingentes da diáspora radicadaem centros produtores <strong>de</strong> C,T&I em todo o mundo. Num conceito<strong>de</strong> SNB ampliado além-fronteiras, o Itamaraty é o órgão do Governoque forçosamente integrará a “hélice tripla” constitutiva <strong>de</strong> uma “re<strong>de</strong>trilateral <strong>de</strong> organizações híbridas [brasileiras no exterior]” (Etzkowitz& Ley<strong>de</strong>sdorff, p. 111, 2000).124<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 124 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesVale ainda ressaltar, no que se refere ao arcabouço legal-normativopara a promoção da <strong>inovação</strong> no Brasil, que este vem tardiamente aaten<strong>de</strong>r – com atraso <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> pelo menos <strong>de</strong>z anos – ao dispostonos artigos 218 e 219 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral, principalmente do § 2ºdo 218 (que trata do “<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do <strong>sistema</strong> produtivo <strong>nacional</strong>e regional”) e 219, que assinala o papel do mercado interno para aautonomia tecnológica do país. Neste caso, torna-se claro o espaço queas políticas <strong>de</strong> compras governamentais po<strong>de</strong>m assumir para a autonomiatecnológica; no caso do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do <strong>sistema</strong> produtivo regional,o Itamaraty po<strong>de</strong>rá ter papel prepon<strong>de</strong>rante nesse processo, consi<strong>de</strong>randoo fato <strong>de</strong> que amplas partes do território <strong>nacional</strong> situadas na faixa <strong>de</strong>fronteira po<strong>de</strong>m ser beneficiadas por políticas <strong>de</strong> integração produtivae <strong>de</strong> infraestrutura, ainda mais tendo presente a priorida<strong>de</strong> conferida àAmérica do Sul na agenda externa do país.Ainda no tocante ao processo <strong>de</strong> compras governamentais e seupapel indutor na capacitação tecnológica e no estímulo à expansãodas ativida<strong>de</strong>s inovadoras no Brasil, mormente no setor privado, cabeainda uma palavra sobre a citada Lei n o 12.349, <strong>de</strong> 15/12/2010, queestabelece a concessão <strong>de</strong> margens <strong>de</strong> preferência <strong>de</strong> até 25% emcompras governamentais <strong>de</strong> produtos ou serviços nacionais intensivosem tecnologia e conhecimento, em relação a similares estrangeiros.Uma das críticas formuladas em relação à Lei (que <strong>de</strong>verá ser objeto <strong>de</strong>regulamentação, a partir <strong>de</strong> projeto em trâmite na Casa Civil – agosto <strong>de</strong>2011) é que tanto esta quanto o Decreto que a <strong>de</strong>verá regulamentar nãocontemplam referências ao registro e <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> direitos <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>intelectual em território brasileiro, junto ao Instituto Nacional <strong>de</strong>Proprieda<strong>de</strong> Industrial (INPI). Recorrendo à experiência chinesa doPrograma Estratégico para a Ciência e Tecnologia 2006-2020 (a sermais exaustivamente discutido no próximo capítulo), o Governo daquelepaís instituiu, por Lei, como condição para a concessão <strong>de</strong> margens <strong>de</strong>preferência para as compras governamentais em setores consi<strong>de</strong>radosestratégicos, que as novas tecnologias <strong>de</strong>senvolvidas pelos beneficiáriossejam registradas no país. Segundo Ezell & Atkinson (p. 82, 2010):A China revelou o verda<strong>de</strong>iro objetivo <strong>de</strong> sua política <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> autóctone(“indigenous innovation”) em novembro <strong>de</strong> 2009, ao lançar seu esquema <strong>de</strong>habilitação <strong>de</strong> produtos e serviços no âmbito <strong>de</strong>ssa política: uma lista <strong>de</strong> produtos125<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 125 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorinventados e <strong>de</strong>senvolvidos na China terá preferência em programas <strong>de</strong> comprasgovernamentais no país.Vista a <strong>de</strong>scrição dos principais instrumentos institucionais do SNB(caberia ainda mencionar a Lei <strong>de</strong> Informática, nº 8.248/91, aprimoradapela 11.077/04, e a Lei nº 11.484, que dispõe sobre incentivos àsindústrias <strong>de</strong> equipamentos para TV digital), avaliada a atuação dassuas três vertentes básicas e mencionado o papel que o MRE ocupamas que, principalmente, po<strong>de</strong>rá vir a ocupar no <strong>sistema</strong>, caberá aindaneste capítulo sintetizar os principais trunfos e fraquezas do <strong>sistema</strong> eapresentar sugestões para seu aprimoramento, algumas específicas euma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m mais geral que, no entanto, se afiguraria como a maisimportante entre todas.3.3 – SNB: caminhos <strong>de</strong>finidos, <strong>de</strong>stino incertoEm termos gerais, po<strong>de</strong>-se dizer que o SNB tem experimentadoaprimoramentos incrementais e notáveis <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o final dos anos 90, e queo arcabouço institucional erigido para dinamizá-lo a partir <strong>de</strong> 2004 temrendido frutos viçosos e palpáveis (e ainda que seja difícil compartilhardo otimismo do então Secretário <strong>de</strong> Desenvolvimento Tecnológico eInovação do MCT, Guilherme Pereira, <strong>de</strong> queHoje, a maioria das empresas no Brasil já está consciente <strong>de</strong> que o investimentona <strong>inovação</strong> é estratégico, e que cortar recursos na área <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> po<strong>de</strong> serprejudicial, uma vez que elas precisam se manter no mercado 114 .Tal avanço é perfeitamente congruente com as hipótesescoevolucionistas que sugerem que a ação <strong>de</strong> uma das partes do <strong>sistema</strong>,no caso o governo, tem efeitos dinamizadores sobre a as <strong>de</strong>mais partes,assim como a pujança da ciência brasileira estimulou o governo aenvolver mais e melhor tal massa crítica no processo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Cabe,contudo, <strong>sistema</strong>tizar as principais <strong>de</strong>ficiências do <strong>sistema</strong>, algumas dasquais já sugeridas acima:114Cf. em “Inovação tecnológica é <strong>de</strong>staque em 2008”, Agência MCT, 29/12/08.126<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 126 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesa) Em primeiro lugar, <strong>de</strong>sponta a dificulda<strong>de</strong> em transformara extensa e importante base <strong>de</strong> conhecimento produzida nopaís em patentes. Ainda que o critério <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> patentesseja discutível e limitado como indicador <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, umavez que muitos processos produtivos criativos, que se valemda colaboração <strong>de</strong> institutos <strong>de</strong> pesquisa e <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>snão são patenteáveis (como o caso das expressões culturaisbrasileiras e <strong>de</strong> diversos Arranjos Produtivos Locais) é certoque a relação 20:1 entre produção científica inter<strong>nacional</strong>e <strong>de</strong>pósito <strong>de</strong> patentes exprime uma fraqueza sistêmica da<strong>inovação</strong> no Brasil. Embora haja relativo consenso <strong>de</strong> que aspolíticas estejam no rumo certo para abrandar esse hiato, e quea dinâmica econômico-social recente vinha favorecendo – aindaque não propriamente estimulando – a <strong>inovação</strong>, <strong>de</strong>ve haveruma mobilização permanente do Governo no sentido <strong>de</strong> que seincremente a <strong>de</strong>manda (e não somente a oferta) por <strong>inovação</strong>.O êxito das políticas fiscais <strong>de</strong> estímulo ao consumo ao final <strong>de</strong><strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2008, com o objetivo <strong>de</strong> contra-arrestar os efeitosda crise financeira global, ilustra o que po<strong>de</strong> ser feito para quese estimule uma <strong>de</strong>manda constante e crescente por produtos<strong>de</strong> maior valor agregado, conhecimento e base tecnológica. Omercado interno, com PIB per capita <strong>de</strong> US$ 6.938 – comparadoao da China, <strong>de</strong> US$ 2.483 (The Economist, p. 32, 2008) –, po<strong>de</strong>tornar-se uma ampla fonte <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda por <strong>inovação</strong>, reduzindoas vulnerabilida<strong>de</strong>s e a <strong>de</strong>pendência volátil do mercado global poresse tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda nos tempos atuais, e justamente nos termosdo que preceitua o §2º da Constituição 115 .b) Esse necessário fortalecimento do mercado interno não po<strong>de</strong> setornar pretexto, por outro lado, para que a motivação básica parainovar não provenha da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> competir no mercadoexterno. Historicamente, a preferência pelo mercado interno noBrasil jamais foi objeto <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rações acerca <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> doproduto, proteção ao consumidor e preços acessíveis, realida<strong>de</strong>115A baixa convergência operacional entre empresas e universida<strong>de</strong>s, e o fato <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>sem geral serem consi<strong>de</strong>radas rivais e não aliadas entre si seriam fatores prepon<strong>de</strong>rantes para obaixo <strong>de</strong>sempenho brasileiro em registros <strong>de</strong> patentes. Ver “Brasil <strong>de</strong>sperdiça tecnologia produzidaem universida<strong>de</strong>s e pólos científicos”, O Globo, 7/7/06, Economia, p. 2.127<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 127 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorque se vem alterando <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a era da estabilização monetáriae da mudança <strong>de</strong> mentalida<strong>de</strong> empresarial <strong>de</strong>corrente dainter<strong>nacional</strong>ização da economia brasileira (Arbix, p. 105, 2007).O fortalecimento do mercado interno só faz sentido, em termos<strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, se for para elevar o perfil da <strong>de</strong>mandapara aproximá-la do padrão dos países industrializados, comcrescimento e equida<strong>de</strong>.c) O tema da equida<strong>de</strong> remete ao problema das persistentes<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s concêntricas no Brasil, obstáculo <strong>de</strong> primeiraor<strong>de</strong>m para os esforços da <strong>inovação</strong>, e ao axioma <strong>de</strong> RagnarNurkse tratado no capítulo anterior. O caráter concêntrico das<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s projeta-se nas diferenças <strong>de</strong> renda e na privação <strong>de</strong>capacida<strong>de</strong>s dos indivíduos, nas diferenças <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>entre as diversas regiões do país e entre as áreas rural e urbana. Tais<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s projetam-se diretamente na produção industrial ecientífica, com o Estado <strong>de</strong> São Paulo açambarcando os primeiroslugares <strong>de</strong> todos os indicadores das áreas <strong>de</strong> pesquisa, produçãoe <strong>inovação</strong>. Tais <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s estão associadas a uma outra<strong>de</strong>ficiência marcante – e até certo ponto paradoxal – do <strong>sistema</strong>,que é o baixo <strong>de</strong>sempenho na área educacional, especialmenteo virtual “analfabetismo matemático” <strong>de</strong> amplas camadas dapopulação juvenil 116 , com os consequentes níveis insatisfatórios<strong>de</strong> qualificação, empregabilida<strong>de</strong> e competitivida<strong>de</strong> da mão <strong>de</strong>obra dos brasileiros. Esse paradoxo é tanto mais perverso quandose configura a partir <strong>de</strong> certo ponto <strong>de</strong>stacada posição assumidapela ciência brasileira no cenário inter<strong>nacional</strong>.d) Outro elemento que gera forte impacto adverso sobre a capacitaçãotecnológica das empresas é a estrutura tributária e as dificulda<strong>de</strong>sburocráticas acima da média que penalizam o ambiente <strong>de</strong> negóciosdo Brasil. Ainda que as Leis <strong>de</strong> Inovação e do Bem, e especialmenteesta última, estejam voltadas para <strong>de</strong>sonerar <strong>de</strong> forma seletiva oscustos da produção, favorecendo as empresas com maior propensãoa inovar, o quadro tributário geral é <strong>de</strong>sestimulador na medida116O Brasil foi consi<strong>de</strong>rado o país com o quarto pior nível <strong>de</strong> ensino <strong>de</strong> matemática, entre 57pesquisados pelo “Programa Inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> Avaliação <strong>de</strong> Alunos” (PISA) da OCDE, à frenteapenas da Tunísia, Catar e Quirguistão. Ver “Brasil é reprovado, <strong>de</strong> novo, em matemática eleitura” Folha <strong>de</strong> São Paulo, 05/12/07, p. B-1.128<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 128 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesem que os custos <strong>de</strong> operação nas ca<strong>de</strong>ias produtivas acabam poranular parte dos ganhos tributários auferidos com os incentivosfiscais, por conta do repasse dos impostos em cascata que inci<strong>de</strong>msobre outros elos da ca<strong>de</strong>ia e sobre os custos finais da produçãoalvoda <strong>inovação</strong>. Os gran<strong>de</strong>s efeitos das Leis da Inovação e doBem far-se-ão sentir, nesse aspecto, somente quando seu uso estejadisseminado por vários setores, escalas e ca<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> produção.A gravida<strong>de</strong> da questão tributária como elemento inibidor doinvestimento tecnológico no Brasil foi ressaltada por estudo doFórum Econômico Mundial, que classificou o Brasil nas pioresposições, num universo <strong>de</strong> 127 países analisados, em três das 68categorias em que o estudo foi baseado: tempo necessário paraabrir um negócio, peso da regulação e extensão e (in)eficiência do<strong>sistema</strong> tributário 117 . Ainda que estudos como tais apresentem umviés marcadamente antiestatal, não resta dúvida <strong>de</strong> que o excesso <strong>de</strong>regulação técnica e a proliferação <strong>de</strong> regulamentos e instrumentostributários funcionam como po<strong>de</strong>rosos bloqueadores das políticas<strong>de</strong> incentivo à <strong>inovação</strong>. Somente reformas no ambiente macropo<strong>de</strong>rão assegurar, <strong>de</strong>sse modo, a plena eficácia <strong>de</strong> instrumentoscomo as Leis do Bem, da Inovação, e <strong>de</strong> compras governamentais(12.349/10).e) Outra dimensão da <strong>de</strong>sarticulação das partes componentes do SNBassinalada no item “a” mencionado anteriormente é a dificulda<strong>de</strong>brasileira para atrair imigrantes <strong>de</strong> alta ou média qualificaçãoou manter contato sistemático com a diáspora brasileira atuanteem laboratórios, empresas e centros tecnológicos <strong>de</strong> paísesindustrializados. É natural que países com SNI maduros nãotenham o problema da diáspora, até mesmo porque são polos<strong>de</strong> atração permanente <strong>de</strong> pessoal qualificado. Nesse particular,países como Índia e China, e particularmente este último, têm tidomarcado êxito em conectar-se com seus cientistas, pesquisadorese gerentes no exterior (os chamados “tartarugas marinhas”, emmandarim), por conta <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> oferecimento <strong>de</strong> generosospacotes financeiros para sua reinstalação em laboratórios e centros<strong>de</strong> pesquisa do país (Bound, p. 45, 2008). Se a repatriação doscientistas brasileiros é consi<strong>de</strong>rada tarefa <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong>117“Tributos <strong>de</strong>rrubam Brasil em ranking <strong>de</strong> tecnologia”, Folha <strong>de</strong> São Paulo, 10/04/08, p. B-11.129<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 129 10/10/2011 14:15:43


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniore fora do horizonte dos próximos anos, não o é “repatriar” oconhecimento produzido por eles, tanto o codificado como otácito, para aproveitamento em políticas e processos domésticos<strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. O sentimento prevalecente entre parte significativados brasileiros <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque no exterior <strong>de</strong> que seu mérito seráreconhecido somente fora do país, tenha ou não base factual,é um elemento <strong>de</strong>sagregador da inteligência brasileira e daspossibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> seu emprego para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>nacional</strong> 118 .Uma questão final, que não correspon<strong>de</strong> propriamente a uma<strong>de</strong>bilida<strong>de</strong> do SNB, mas a uma percepção predominante que po<strong>de</strong> trazerconsequências in<strong>de</strong>sejadas (e in<strong>de</strong>sejáveis) para o seu amadurecimentoe expansão, é a ampla hegemonia que os recursos naturais, mormenteo petróleo e o agronegócio – na medida em que este passa a constituiruma base adicional para a convergência energética das matérias-primas(BTU convergence) 119 – ocupam na agenda da C,T&I no Brasil. É naturalque, pelas razões apontadas no capítulo II (trajetória <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência,vantagens comparativas cristalizadas, divisão inter<strong>nacional</strong> dotrabalho) o Brasil tenha assumido a eventual li<strong>de</strong>rança mundial – graçasfundamentalmente à EMBRAPA, Fapesp e CNPq – <strong>de</strong> áreas vinculadastecnologicamente à expansão do agronegócio, trajetória que remonta aoséculo XIX, com a criação, por exemplo, do Instituto Agronômico <strong>de</strong>Campinas (então “Imperial Estação Agronômica”) e que resultou nosdiversos e amplamente reconhecidos feitos do setor.A questão a se ter em conta é que, justamente pelo fato <strong>de</strong> oagronegócio, a agroenergia e os recursos energéticos <strong>de</strong> modo geral(com a exceção parcial da energia nuclear) serem áreas tecnologicamentemaduras no Brasil, <strong>de</strong> amplo reconhecimento científico e inserção nomercado inter<strong>nacional</strong>, a pauta da pesquisa científico-tecnológica <strong>de</strong>veriacontemplar um <strong>de</strong>cidido esforço pela diversificação e pelo aumento do118Estudo <strong>de</strong> Pochmann (2006) estima que entre 140.000 e 160.000 brasileiros graduados<strong>de</strong>ixariam anualmente o país, em caráter temporário ou permanente, em busca <strong>de</strong> melhoresoportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> qualificação ou inserção profissional.119O conceito <strong>de</strong>signa basicamente a possibilida<strong>de</strong> teórica – e crescentemente prática eeconomicamente significativa, no caso do Brasil – <strong>de</strong> conversão <strong>de</strong> qualquer commodity emenergia, a partir da competição no mercado entre combustíveis (intra ou inter-fuel competition,cogeração <strong>de</strong> energia) da mesma família ou <strong>de</strong> famílias diferentes, como os hidrocarbonetos eos biocombustíveis.130<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 130 10/10/2011 14:15:43


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partespeso relativo <strong>de</strong> outras áreas não diretamente conectadas ao agro (e apartir da suposição factível, e mais que razoável, <strong>de</strong> que não há cenário<strong>de</strong> comprometimento da oferta <strong>de</strong> alimentos e da segurança alimentar eagrícola brasileira). Das 21 linhas <strong>de</strong> ação incluídas no PACTI 2007-2010,por exemplo, sete seriam consi<strong>de</strong>radas ações “transversais” e estruturantesdo SNB, cinco correspon<strong>de</strong>riam a áreas <strong>de</strong> tecnologia avançada, <strong>de</strong> acessomais difícil aos países emergentes no mercado inter<strong>nacional</strong>, duas nãose enquadrariam nessa tipologia (<strong>de</strong>fesa <strong>nacional</strong> e segurança pública eincentivo à criação e consolidação <strong>de</strong> empresas intensivas em tecnologia)e sete seriam vinculadas diretamente ao agronegócio, à agroenergiaou a ativida<strong>de</strong>s intensivas em uso <strong>de</strong> commodities (biocombustíveis,energia elétrica, hidrogênio e energias renováveis, petróleo, gás e carvãomineral, agronegócio, biodiversida<strong>de</strong> e recursos naturais, amazônia esemiárido e meteorologia e mudanças climáticas). Por outro lado, oPACTI não faz menção a áreas avançadas altamente produtivas que<strong>de</strong>verão <strong>de</strong>finir no futuro próximo a competitivida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong> dospaíses, tais como novos materiais e cerâmicas <strong>de</strong> alto <strong>de</strong>sempenho;engenharia ótica (optoeletrônica e ótica quântica); telemedicina (ouE-saú<strong>de</strong>, <strong>de</strong>signação mais apropriada); bioengenharia e bioeletrônica;e engenharias mecatrônica e telemática. Apesar dos extraordináriosesforços e avanços brasileiros nas áreas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, TIC, biotecnologiae os programas espacial (com <strong>de</strong>staque para o programa CBERS, paracuja consecução a atuação do Itamaraty foi fundamental, como sesabe) 120 e nuclear, tais avanços, em termos <strong>de</strong> escala comparativa como padrão científico e produtivo-empresarial inter<strong>nacional</strong>, encontra-sebastante aquém, em termos agregados, em relação à posição ocupadapelo agronegócio e pelos biocombustíveis, por exemplo 121 . O mesmopo<strong>de</strong>r-se-ia dizer em relação a uma série <strong>de</strong> histórias empresariais etecnológicas bem-sucedidas no Brasil, como o Porto digital do Recife,Natura, Embraer, Petrobras, Inova-Campinas, etc.120O programa CBERS fez do Brasil o maior distribuidor <strong>de</strong> imagens satelitais do mundo,conforme MCT, p. 215, 2007.121O economista chileno Gabriel Palma, em entrevista recente, afirmou não haver, hoje, “umapolítica industrial verda<strong>de</strong>ira no Brasil”, mas tão somente “crédito para a indústria”, ao assinalaro que seria uma prepon<strong>de</strong>rância das matérias-primas nos indicadores brasileiros <strong>de</strong> produção, aolongo <strong>de</strong> toda sua história econômica. Ver “Brasil se acomodou como exportador <strong>de</strong> commodities”,Agência Brasil, 16/01/09.131<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 131 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorTrata-se, em síntese, <strong>de</strong> mitigar a carga do rótulo “economia doconhecimento natural” (natural knowledge economy) sobre os esforços<strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico do Brasil (Bound, 2008). Trata-se ainda<strong>de</strong> perguntar, como havia questionado a própria autora da expressão, aoreferir-se ao gran<strong>de</strong> êxito da “diplomacia do etanol”, se o Brasil “terácondições <strong>de</strong> convencer o mundo <strong>de</strong> que po<strong>de</strong> oferecer excelência emoutras áreas?” (p. 15, 2008).Um dos mais pronunciados inconvenientes da expressão “economiado conhecimento natural” é congelar vantagens comparativas e consolidartrajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência, quando os esforços <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> pressupõema capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>svencilhar criativamente <strong>de</strong>ssas trajetórias, sem<strong>de</strong>sprezá-las. É justamente essa cristalização <strong>de</strong> vantagens comparativasque propõe a autora ao afirmar que “a <strong>inovação</strong> brasileira encontraseu ápice quando aplica a engenhosida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua gente aos recursosnaturais 122 ” (p. 16).A alternativa para escapar <strong>de</strong> trajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência resi<strong>de</strong> emempenhar esforços para que o Brasil possa, conforme se reconhece, oferecerexcelência em outras áreas, com produtos <strong>de</strong> alto conteúdo tecnológico,valendo-se <strong>de</strong> padrões sociais justos <strong>de</strong> produção e incorporadores <strong>de</strong>conhecimento tácito que distinguiriam um “modo brasileiro” <strong>de</strong> produzir,a partir <strong>de</strong> valores como flexibilida<strong>de</strong>, versatilida<strong>de</strong>, criativida<strong>de</strong>, relaçãomenos impessoal consumidor-fornecedor-produtor, diversida<strong>de</strong> cultural,escala, qualida<strong>de</strong> e originalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produtos, entre outros fatores 123 .A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um SNI <strong>de</strong>dicar esforços também (e talvezpredominantemente) a outras áreas científicas e tecnológicas <strong>de</strong> pontada economia mundial tem na apreciação <strong>de</strong> Dosi (p. 43, 1988) uma <strong>de</strong>suas expressões mais eloquentes e magistrais:uma década após a II Guerra Mundial, nenhum economista ousaria preten<strong>de</strong>r quea eletrônica era uma das vantagens comparativas do Japão. Agora certamente o122“Brazilian innovation is at its best when applying the ingenuity of its people to its naturalassets”. Mais além, a autora (p. 30), ao comentar a superiorida<strong>de</strong> numérica das publicaçõesbrasileiras em ciências agrárias sobre as <strong>de</strong>mais áreas (com produção científica três vezes superiorà média mundial), assinala, em tom con<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte, que esse fato atesta a vantagem comparativabrasileira nas áreas da “economia do conhecimento natural”.123Um excelente exemplo <strong>de</strong> afastamento bem-sucedido <strong>de</strong> trajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência, <strong>de</strong>impacto sistêmico na economia brasileira, foi a criação, em 1967, da Zona Franca <strong>de</strong> Manaus,introduzindo a produção em massa <strong>de</strong> equipamentos eletroeletrônicos em ambiente fortementeinfluenciado pela presença <strong>de</strong> recursos naturais.132<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 132 10/10/2011 14:15:44


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partesé. Se alguém tivesse adotado trinta anos atrás a eficiência alocativa relativa dosdiferentes setores industriais como parâmetro para estabelecer regras normativas,provavelmente o Japão ainda estaria exportando gravatas <strong>de</strong> seda. Em certo sentido,o uso <strong>de</strong> critérios <strong>de</strong> vantagens comparativas como base única e final para regrasnormativas é um luxo ao qual somente países que estão na fronteira tecnológicapo<strong>de</strong>m se dar (...).Giovanni Dosi apresenta, nesse sentido, visão diametralmenteoposta à da autora inglesa e <strong>de</strong> um entrevistado seu, o Professor PauloFigueiredo, da FGV-RJ, que propõe uma visão que seria algo conformistaquanto à competitivida<strong>de</strong> brasileira:Os países asiáticos têm excelente <strong>de</strong>sempenho produtivo em volume e escala <strong>de</strong>produção, e o Brasil simplesmente não po<strong>de</strong> competir com eles. (...) Nossa visãopara o ano 2050 é <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> ponta em indústrias intensivas em recursosnaturais, tais como biotecnologia, biocombustíveis, aço e tecnologia <strong>de</strong> alimentos– um mo<strong>de</strong>lo bastante sofisticado para P&D em recursos naturais... não po<strong>de</strong>moscompetir com a Ásia em microeletrônica; logo temos <strong>de</strong> adotar um novo paradigmatecnológico (Bound, p. 43, 2008).A visão mais ousada, orientada à diversificação e à superação <strong>de</strong>trajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência do Professor das Universida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Manchestere Pisa é compartilhada, entretanto, por Guimarães (p. 140, 2006):Caso um esforço <strong>de</strong>terminado, pertinaz e urgente <strong>de</strong> preservação do <strong>sistema</strong><strong>de</strong> produção <strong>de</strong> tecnologia no país não ocorra, o Brasil estará fadado,nos mercados internacionais, a perpetuar sua condição <strong>de</strong> exportador <strong>de</strong>commodities agrícolas e industriais (aço, têxteis, carne, sapatos etc.) <strong>de</strong>baixas elasticida<strong>de</strong>s-preço e renda e <strong>de</strong> redução gradual <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda, taiscomo certos minérios, em mercados caracterizados por condições <strong>de</strong> livrecompetição, e importador <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> maior sofisticação tecnológica,bens <strong>de</strong> capital e produtos <strong>de</strong> alta tecnologia, que se caracterizam pela altaelasticida<strong>de</strong>-renda, em mercados <strong>de</strong> características oligopolistas, o quesignifica que, para cada unida<strong>de</strong> importada, necessitará fazer um esforçocrescente <strong>de</strong> exportação, aviltando cada vez mais os preços <strong>de</strong> seus produtosem benefício dos países que os importam, e transferindo recursos reais parao exterior. (grifo do autor)133<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 133 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorDimensão adicional dos riscos <strong>de</strong> orientar a ativida<strong>de</strong> científico--tecnológica para a produção e exportação <strong>de</strong> commodities em larga escalaseriam os efeitos associados à “doença holan<strong>de</strong>sa”, cujo argumento básicoé o <strong>de</strong> que a sustentação <strong>de</strong> superávits comerciais expressivos a partirda exportação <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> baixa intensida<strong>de</strong> tecnológica – o petróleoseria o exemplo clássico – acarretaria uma progressiva apreciação docâmbio, com uma <strong>de</strong>preciação correspon<strong>de</strong>nte da renda auferida comas próprias exportações, cenário que se torna potencialmente explosivopara as contas nacionais quando conjugado com uma situação <strong>de</strong> recuoou <strong>de</strong> estabilização dos preços <strong>de</strong>sses produtos básicos no mercadointer<strong>nacional</strong>, frente a outras mercadorias e serviços. A apreciação cambialconjugar-se-ia com o aumento da taxa <strong>de</strong> juros, criando <strong>de</strong>sincentivosadicionais para a expansão <strong>de</strong> setores industriais mais competitivos 124 .De todo modo, a forma como o Brasil vem explorando sua “economiado conhecimento natural”, em termos das condições atuais do mercadointer<strong>nacional</strong> (ao menos nos tempos imediatamente pré-crise financeira),tem-se mostrado a<strong>de</strong>quada na conjuntura, na medida em que mostrou sero esteio das balanças comercial e <strong>de</strong> pagamentos nos últimos anos. Trata-se,porém, <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alta sensibilida<strong>de</strong> a ciclos e <strong>de</strong> recuperação maislenta quando exposta a choques externos e <strong>de</strong> preços, não chegando acompensar as perdas registradas, como bem <strong>de</strong>monstram as receitas doagronegócio brasileiro dos anos 90 em relação à década <strong>de</strong> 70, e dosrendimentos atuais reais em relação à década <strong>de</strong> 90.Em síntese, as dificulda<strong>de</strong>s do setor <strong>de</strong> C,T&I no Brasil seriam a<strong>de</strong>sarticulação entre a aca<strong>de</strong>mia e o setor privado, a estrutura tributária<strong>de</strong>sestimuladora da <strong>inovação</strong>, as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s sociais, tecnológicas,econômicas e regionais, as severas e persistentes <strong>de</strong>ficiências do124No Brasil o <strong>de</strong>bate sobre se o país estaria pa<strong>de</strong>cendo da “doença holan<strong>de</strong>sa” divi<strong>de</strong> autorescomo Bresser-Pereira (2005) e Nakano (2007) – sustentando que haveria sinais <strong>de</strong> que teria seinstalado na economia – e, <strong>de</strong> outro lado, autores como Nassif (2008), que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m não haverevidências conclusivas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sindustrialização <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> tal fenômeno. De todo modo,a hipótese geral da “maldição dos recursos naturais” mobiliza ampla literatura acadêmica<strong>nacional</strong> e estrangeira, invariavelmente no sentido <strong>de</strong> que representa um obstáculo estruturalao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. Arezki & Van <strong>de</strong>r Ploeg (p. 07, 2007) sustentam, a partir <strong>de</strong> pesquisaempírica, que o crescimento econômico “(...) está negativamente co-relacionado à parcela <strong>de</strong>recursos naturais nas exportações.” (“growth performance <strong>de</strong>pends negatively on the share ofnatural resources in exports”). Demais autores que sustentam conclusões similares são Sachs &Warner (2001), Robinson, Torvik & Verdier (2006), Mehlum, Moene e Torvik (2005) e Ishamet al. (2003), além <strong>de</strong> Vial (2002 – citado no cap. II supra), entre vários outros.134<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 134 10/10/2011 14:15:44


<strong>sistema</strong> brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>: um todo menor que suas partes<strong>sistema</strong> educacional (com a consequente empregabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiente),propensão ainda baixa das empresas a competir no mercado inter<strong>nacional</strong>,inexistência <strong>de</strong> políticas específicas para galvanizar a experiência ea excelência da diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I e os riscos inerentes à“doença holan<strong>de</strong>sa”. Quanto aos conhecidos trunfos brasileiros para osetor, além da excelência, amplitu<strong>de</strong> e escala <strong>de</strong> seus setores energético eagropecuário, mencione-se a base crescente <strong>de</strong> capital humano, o marcoregulatório que tem na <strong>inovação</strong> uma meta explícita e bem concatenada,a estabilida<strong>de</strong> econômica (para não dizer política), a cultura algofavorecedora da <strong>inovação</strong>, da engenhosida<strong>de</strong> e do empreen<strong>de</strong>dorismo ea crescente multiplicação <strong>de</strong> histórias <strong>de</strong> êxito <strong>de</strong> práticas e experiênciasempresariais e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.Diante das dificulda<strong>de</strong>s mais acima apontadas, caberia conjugaras políticas <strong>de</strong> C,T&I com a tributária (as políticas industrial efiscal paulatinamente integram-se à <strong>de</strong> C&T) e favorecer regime <strong>de</strong><strong>de</strong>mocratização da proprieda<strong>de</strong> e da produção no campo, <strong>de</strong> modo apreservar práticas e conhecimentos produtivos tradicionais, além <strong>de</strong>ampliar exponencialmente a base dos agricultores e <strong>de</strong> suas famíliasbeneficiados pelo êxito do agronegócio. Caberia ainda, além <strong>de</strong> envolvera diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I no <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológicodo país (proposta a ser melhor trabalhada no capítulo VI infra), fortalecero CCT, no plano institucional, como organismo <strong>de</strong> efetiva formulação,acompanhamento avaliação, revisão, a<strong>de</strong>quação, coor<strong>de</strong>nação eimplementação das políticas públicas em C,T&I, sob a li<strong>de</strong>rança diretado Presi<strong>de</strong>nte da República. Embora em parte tal função pu<strong>de</strong>sse serexercida pela Agência Brasileira <strong>de</strong> Desenvolvimento Industrial – ABDI,tal como se previu à época <strong>de</strong> sua constituição, a cultura organizacionale administrativa brasileira ainda verticalizada requer uma coor<strong>de</strong>naçãopermanente e uma li<strong>de</strong>rança inconteste sobre as políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, peloque tal função <strong>de</strong>vesse ser exercida diretamente por um CCT revigorado.Dois outros aspectos fundamentais a serem mencionados, associados àadministração do processo brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, seriam uma maiorharmonização entre as várias políticas governamentais – notadamente aPDP, o PACTI, a PITCE e o próprio PAC – inclusive com a possibilida<strong>de</strong><strong>de</strong> que possam conjugar-se num mesmo e único programa, ampliado eunificado, e a produção maciça e regular, a intervalos bem <strong>de</strong>finidos,<strong>de</strong> indicadores <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Conhecer precisamente o <strong>de</strong>sempenho135<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 135 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniordos programas <strong>de</strong> governo, <strong>de</strong>sejavelmente em tempo real, é um passofundamental para que possa efetuar eventuais e necessárias correções<strong>de</strong> rumo na PCT e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e calibrar com mais rapi<strong>de</strong>z e acuida<strong>de</strong>as políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> modo geral.A trajetória brasileira <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> situar-se-ia hoje em estágiosemelhante ao que se encontravam, mutatis mutandis, diversos países <strong>de</strong>industrialização recente, na Europa e na Ásia (tigres asiáticos, Irlanda,Espanha, Itália, Portugal), e que em dado momento – notadamente duranteos anos 80 e início dos 90, quando o Brasil e os países latino-americanosforam enquadrados na categoria <strong>de</strong> late comers, ou retardatários –ultrapassaram o limiar que permitiu a seus SNI exibir comportamentosistêmico e sua economia passou a operar conforme padrões competitivosdinâmicos. A China terá sido um gran<strong>de</strong> exemplo <strong>de</strong> êxito nesse grupo <strong>de</strong>países, num processo cujo conhecimento torna-se mais necessário a partirdo peso do país no cenário inter<strong>nacional</strong>, do porte e do curto lapso <strong>de</strong>tempo em que se processou tal transformação. Passarei agora, no capítuloseguinte, a apresentar sucinta e esquematicamente as característicasgerais do <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> da China (SCI), assim como os elementosessenciais da transformação econômico-tecnológica verificada a partirdos anos 80.136<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 136 10/10/2011 14:15:44


Capítulo IV“Aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntalna aplicação”4.1 – Percepções do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>O espetacular crescimento do PIB da China em termos reais, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> asreformas empreendidas por Deng Xiaoping a partir <strong>de</strong> 1978 (a “política <strong>de</strong>portas abertas” e “as quatro mo<strong>de</strong>rnizações”), com níveis jamais inferioresa 10% nos últimos anos 125 , tornou-se o principal traço característico dai<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do país no exterior. Sua transformação produtiva e capacida<strong>de</strong><strong>de</strong> geração <strong>de</strong> riqueza em larga escala, no espaço <strong>de</strong> duas décadas, teriacomo paralelo, ainda que em menor dimensão, os Estados Unidos dasprimeiras décadas do século XX e a Inglaterra no início do século XIX,na sequência da Revolução Industrial. A i<strong>de</strong>ia do crescimento econômicocomo <strong>de</strong>finidor da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>nacional</strong>, quase um estereótipo da Chinacontemporânea, além <strong>de</strong> fator constitutivo da globalização e uma ban<strong>de</strong>irapolítica do governo chinês, correspon<strong>de</strong> a fenômeno em gran<strong>de</strong> medidaassimilado e compreendido pelo conjunto da socieda<strong>de</strong> chinesa, tanto nasáreas urbanas diretamente beneficiadas quanto no campo on<strong>de</strong>, <strong>de</strong> modogeral, seus efeitos ainda não se fizeram sentir.125Com as porcentagens <strong>de</strong> 10,1%, 10,4%, 10,7% e 10,4% para 2004, 2005, 2006 e 2007,respectivamente (OCDE: 2007). O Birô Nacional <strong>de</strong> Estatísticas da China (National Bureau ofStatistics) assinala números <strong>de</strong> 10,1%, 9,9%, 11.1% e 11.4%. O ritmo <strong>de</strong> crescimento no ano<strong>de</strong> 2010 foi <strong>de</strong> 10,7%,137<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 137 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorA i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a socieda<strong>de</strong> chinesa bem compreen<strong>de</strong> o fenômeno docrescimento é precisa na medida em que agora há convicção generalizadae aceitação inconteste <strong>de</strong> que a ciência e a tecnologia teriam sido asprincipais causas que operaram a transformação <strong>de</strong> um país pobre,atrasado, supersticioso 126 e introspectivo numa potência que cogitamissões tripuladas à lua e <strong>de</strong>senvolve terapias genéticas <strong>de</strong> ponta paraa cura do câncer. Não sem surpresa, a OCDE anunciou em <strong>de</strong>zembro<strong>de</strong> 2006 que a China havia ultrapassado o Japão e se tornado o segundomaior investidor em P&D no mundo, em termos absolutos, atrás dosEstados Unidos (OCDE, 2006). Somente o governo central <strong>de</strong>sembolsouem 2006 US$ 7,1 bilhões (o dobro, em linhas gerais, do orçamento geraldo MCT brasileiro para 2008) em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> P&D, US$ 2,3 bilhões amais que o governo britânico. Em termos percentuais relativos, a China<strong>de</strong>verá investir até 2012 uma proporção do seu PIB em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> P&Dainda maior que a da União Europeia, especialmente <strong>de</strong>vido à expansão<strong>de</strong> investimentos <strong>de</strong> empresas do Oci<strong>de</strong>nte, atraídas pela exponencialcapacitação tecnológica do país 127 , custos <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra, mercado eincentivos técnicos e fiscais.A percepção da socieda<strong>de</strong> chinesa <strong>de</strong> que a ciência e a tecnologia sãoas responsáveis diretas pelo crescimento e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> amplasregiões do país nas últimas décadas foi gerada a partir das reformas<strong>de</strong> Deng Xiaoping, que tinha no lema “A ciência é a primeira forçaprodutiva” a expressão-síntese para uma política <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>que obtivesse apoio unânime entre as alas do Partido Comunista (PCC)e preparasse uma cuidadosa inflexão em relação à era <strong>de</strong> Mao Tsé-Tunge, sobretudo, da “Revolução Cultural” 128 .126Até meados dos anos 80 se acreditava, em algumas províncias mais atrasadas da China, queo nascimento <strong>de</strong> uma menina era sinal <strong>de</strong> “insatisfação divina”, o que ensejava a prática doafogamento <strong>de</strong> bebês do sexo feminino ao nascer. Na província <strong>de</strong> Xiagan, em Hubei, havia nosanos 80 quase quatro vezes mais meninos que meninas. (Time, p. 08, 1984).127“Chinese poised to outstrip Europe on R&D”, Financial Times, 10/10/2005, p. 8.128Há evidências, contudo, <strong>de</strong> que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os tempos do Kuomintang <strong>de</strong> Chaing Kai-Shek seensaiaram políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico do país. Mesmo nos tempos <strong>de</strong> Mao, porém– e apesar da visão predominante <strong>de</strong> obscurantismo científico-tecnológico justamente legada dostempos da Revolução Cultural –, havia uma preocupação com a produção e a difusão da tecnologiapara a produção em massa. Um conhecido e insuspeito cartunista brasileiro, em viagem à Chinadurante os tempos <strong>de</strong> Hua Kuo-Feng, <strong>de</strong>screvia com certo entusiasmo a reação dos visitantes àFeira Industrial <strong>de</strong> Xangai: “(...) Todos se admirando <strong>de</strong> como a China é po<strong>de</strong>rosa. A linguagemaqui falada não era a que a gente via nas ruas até agora, não é a linguagem do povo chinês,não é o chinês. Aqui se fala a linguagem universal da tecnologia” (Souza Filho, p. 223, 1980).138<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 138 10/10/2011 14:15:44


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”Diversos autores e analistas da socieda<strong>de</strong> chinesa <strong>de</strong>screvem como olema <strong>de</strong> Deng Xiaoping dispunha <strong>de</strong> uma firme base cultural e enraizou-sediante dos êxitos do mo<strong>de</strong>lo econômico, após a fase da <strong>de</strong>scentralizaçãoe da implantação das reformas <strong>de</strong> mercado. Um cientista chinês radicadono Vale do Silício relatou que, em sua escola,(...) se você perguntasse a um grupo <strong>de</strong> garotos o que gostariam <strong>de</strong> ser, 95%diriam “cientista”. Havia todo tipo <strong>de</strong> slogans sobre como salvar a nação atravésda ciência. Assim, os melhores e mais brilhantes eram naturalmente atraídos paraa ciência e para a engenharia (apud Wilsdon & Keeley, p. 27, 2007).Também recentemente, entre <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2007 e fevereiro <strong>de</strong> 2008,foi realizada ampla pesquisa em toda a China, com cobertura <strong>de</strong> 31províncias, sobre a atitu<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong> em relação à C&T. A pesquisa,conduzida pela Associação Chinesa <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia, entrevistoumais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z mil pessoas sobre o prestígio <strong>de</strong> distintas profissões eativida<strong>de</strong>s profissionais na China, havendo concluído que professores,cientistas e pesquisadores figuram como os “mais respeitados” entretodos. Mais <strong>de</strong> 40% dos entrevistados <strong>de</strong>sejam que seus filhos sejamcientistas e, ainda mais importante, as entrevistas indicaram que asocieda<strong>de</strong> acalenta altas expectativas em relação ao papel da ciência parao futuro da China: 81,9% dos entrevistados <strong>de</strong>clararam que a ciênciamo<strong>de</strong>rna e a tecnologia trarão melhores condições <strong>de</strong> vida para seusfilhos e maiores oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> para o país 129 . Umaoutra manifestação da importância simbólica e social atribuída à C&Tna China foi a inauguração do “maior museu <strong>de</strong> ciência e tecnologia domundo”, o Centro da Ciência <strong>de</strong> Guangdong, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Guangzou,com uma área total <strong>de</strong> 450 km², a um custo <strong>de</strong> US$ 278 milhões (RMB1,9 bilhão) 130 .O dispêndio <strong>de</strong> esforços e energia para erigir um <strong>sistema</strong> econômicocom a marca da <strong>inovação</strong> tecnológica conta, <strong>de</strong>sse modo, com amplalegitimida<strong>de</strong> social e constitui a própria rationale do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>adotada pelas li<strong>de</strong>ranças e pelo governo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> ao menos o princípio129People’s Daily Online, edição <strong>de</strong> 17/11/2008, disponível em .130China Radio International, reportagem <strong>de</strong> 19/09/2008, disponível em .139<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 139 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniordos anos 80. Tal convicção ficou histórica e politicamente consagradana China a partir da <strong>de</strong>cisão do PCC, em março <strong>de</strong> 1985, <strong>de</strong> reformarradicalmente o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> gestão científico-tecnológica do país.Consi<strong>de</strong>rado um marco nas políticas públicas do setor no país, a reforma,sintetizada em nove pontos básicos, enunciava queA ciência e a tecnologia mo<strong>de</strong>rnas representam os fatores <strong>de</strong>cisivos e maisdinâmicos das novas forças produtivas... Devemos reformar resolutamente epasso-a-passo o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> C&T da China conforme o princípio estratégico <strong>de</strong>que a construção <strong>de</strong> nossa economia <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da ciência e da tecnologia e <strong>de</strong> quenossos esforços nesse campo <strong>de</strong>vem ser orientados para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (SSTC,1986, apud IRDC, p. 26, 1997, ênfase acrescentada).Além <strong>de</strong>sse ponto preambular do programa <strong>de</strong> reformas, o oitavopreconizava, numa clara alusão à política <strong>de</strong> “Portas Abertas” <strong>de</strong> DengXiaoping, o caráter imprescindível da formação <strong>de</strong> parcerias tecnológicasinternacionais para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>:Abrir-se ao mundo e estabelecer contato com outros países constitui uma políticabásica e <strong>de</strong> longo prazo para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico e tecnológico da China(i<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m).Neste capítulo será estudado, <strong>de</strong> maneira breve e um tantopanorâmica, o Sistema Chinês <strong>de</strong> Inovação (SCI). Uma necessáriaprecisão inicial é que a <strong>de</strong>finição do SCI e a <strong>de</strong>cisão política correspon<strong>de</strong>nte<strong>de</strong> consolidá-lo conforme os mecanismos <strong>de</strong> permanente interaçãopreconizados pela análise evolucionista só foram explicitamente adotadasem tempos recentes, a partir <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 2006 com o lançamento do“Programa Nacional 2006-2020 para o Desenvolvimento <strong>de</strong> Médio eLongo Prazos da Ciência e Tecnologia”. A incorporação da <strong>inovação</strong> aoprocesso <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> correspon<strong>de</strong> a uma lógica <strong>de</strong> afastamento<strong>de</strong> dois períodos antitéticos da história econômica do país: o primeiro,da Revolução <strong>de</strong> 1949 até a morte <strong>de</strong> Mao Tsé-Tung, calcado noplanejamento central absoluto e tentacular da ativida<strong>de</strong> econômica, portodos os poros da socieda<strong>de</strong>; o segundo correspon<strong>de</strong> aos tempos emque se praticou uma espécie <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>lo linear-liberal, segundo o qual adisponibilização da infraestrutura científica e tecnológica do Estado às140<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 140 10/10/2011 14:15:44


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”empresas e ao setor privado gerariam transbordamentos na economiae apropriação das inovações geradas pelas indústrias beneficiadas 131 . Ai<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> trazida explicitamente à baila pelo Programa 2006-2020correspon<strong>de</strong>ria, <strong>de</strong>ssa forma, a uma dupla tentativa <strong>de</strong> corrigir tanto osexcessos da política econômica <strong>de</strong> “Portas Abertas” (que não gerou ostransbordamentos tecnológicos esperados, com a <strong>inovação</strong> permanecendodiretamente sob controle das multinacionais) quanto o legado <strong>de</strong> baixaprodutivida<strong>de</strong> e competitivida<strong>de</strong> das empresas estatais. A partir <strong>de</strong>ssaestratégia básica, espera-se que, ao final <strong>de</strong> 2020,(...) a China tenha alcançado mais conquistas científicas e tecnológicas <strong>de</strong>gran<strong>de</strong> influência mundial, que a qualifique a ingressar no grupo dos países maisinovadores do mundo 132 .Na linha do estudo anterior sobre o SNB, este capítulo contémtrês subdivisões básicas: a primeira, a seguir, correspon<strong>de</strong> a um brevehistórico do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico e tecnológico da China, a partirdas características e do contraste entre a era do planejamento centralizadoe a subsequente <strong>de</strong> transição e abertura econômica (marcada pelo que seriaum “autoritarismo fragmentado” – ver nota 8 supra). Nesta parte inicialdo capítulo serão apresentados e avaliados brevemente os principaisprogramas e iniciativas governamentais para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>científico-tecnológico adotados após as reformas em 1979 até o início<strong>de</strong>ste século, assim como se estabelecerá uma correlação entre o avançodas reformas e o crescimento econômico do país. A segunda parte consistena <strong>de</strong>scrição dos atores componentes do SCI, assim como <strong>de</strong> suasfunções no <strong>sistema</strong>, notadamente as instituições estatais (com <strong>de</strong>staquepara os Ministérios das Finanças, da Ciência e Tecnologia – Ministry ofScience and Technology, MOST – e a Comissão Nacional <strong>de</strong> Reforma eDesenvolvimento, homóloga, com po<strong>de</strong>res substancialmente ampliados,131Essa i<strong>de</strong>ntificação com o mo<strong>de</strong>lo linear é apenas parcial, uma vez que, da perspectiva liberalseria o mercado quem <strong>de</strong>veria se encarregar da produção e disseminação tecnológicas entreos agentes econômicos. Os agentes “mais aptos” seriam selecionados a partir da intensida<strong>de</strong>tecnológica <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> e da incorporação <strong>de</strong> tecnologia a produtos crescentemente<strong>de</strong>mandados pelo mercado. O paradoxo <strong>de</strong>ssa acepção linear-liberal surgiria do fato <strong>de</strong> a C&Tserem consi<strong>de</strong>radas externalida<strong>de</strong>s, não cabendo ao Estado, <strong>de</strong>sse modo, estimular ou aindamenos produzí-las diretamente, conforme argumentaria essa corrente <strong>de</strong> pensamento.132Presi<strong>de</strong>nte Hu Jintao, discurso <strong>de</strong> abertura da IV Conferência Nacional <strong>de</strong> Ciência e Tecnologiada China, Pequim, 9 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2006.141<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 141 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniordo Ministério do Planejamento no Brasil), o <strong>sistema</strong> universitário,<strong>de</strong> P&D e a base produtiva do país. Nessa segunda parte será aindaapresentado, em suas linhas gerais, o aludido Programa 2006-2020,que almeja corrigir falhas estruturais do SCI não equacionadas pelosprogramas anteriores e ajustar os objetivos econômico-estratégicos daChina para a primeira meta<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste século. O item subsequente e finaltratará dos êxitos e problemas do SCI e do papel primordial que a aberturada China e a participação dos chineses no exterior – como também osregressados – tiveram para a expansão e consolidação do <strong>sistema</strong>, assimcomo para o crescimento e a prosperida<strong>de</strong> do país <strong>de</strong> modo geral, fatoresque se reforçam e se potencializam reciprocamente.4.2 – Da centralização econômica para a abertura e o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológicoO <strong>de</strong>sempenho da base produtiva da China a partir <strong>de</strong> 1979 parececonfirmar, por vias algo tortuosas, os argumentos evolucionistasreferentes ao processo <strong>de</strong> amadurecimento <strong>de</strong> um SNI. O ímpetoprimordial da evolução do <strong>sistema</strong> consiste em atenuar gradativamenteo controle do Estado sobre o processo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, hipertrofiado nostempos <strong>de</strong> Mao, ao mesmo tempo em que se busca fortalecer o papele assegurar a autonomia dos dois outros vértices do triângulo, o setorprivado e a infraestrutura <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> ciência e pesquisa. Esse processopaulatino foi caracterizado por dois choques, o primeiro o aludidoanúncio da política <strong>de</strong> “Portas Abertas”, em 1978, e o segundo aadoção do Programa 2006-2020 que, como se verá, prevê medidasradicais <strong>de</strong> <strong>de</strong>sregulamentação, abertura e autonomia dos atores queconstituem o SCI. Antes do período <strong>de</strong> reformas e da ruptura com aantiga União Soviética, em 1960, a China <strong>de</strong>senvolvera uma políticaindustrial baseada na importação <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s fabris acabadas, sobretudoda sua então ex-principal parceira inter<strong>nacional</strong>. Medida importanteque remontava ainda aos anos 50 foi o estabelecimento <strong>de</strong> centenas<strong>de</strong> centros <strong>de</strong> pesquisa em todo o país, voltados primordialmente paratarefas <strong>de</strong> engenharia reversa <strong>de</strong> máquinas e equipamentos soviéticose importados <strong>de</strong> outros poucos países. Duas características essenciais<strong>de</strong>sse período imediatamente anterior à Revolução Cultural foram oímpeto <strong>de</strong> autossuficiência (<strong>de</strong>corrência natural do fato <strong>de</strong> a China142<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 142 10/10/2011 14:15:44


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”não ser reconhecida pela maioria dos países <strong>de</strong> economia industrialavançada, num movimento <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> importações forçado) e aautoimposição <strong>de</strong> metas <strong>de</strong> produção e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> estabelecidasnos Planos Quinquenais. Também se verá que, a exemplo da primeirafase do regime maoísta, o Programa 2006-2020 é marcado pelo ímpetoda autonomia (agora sob a fórmula da “<strong>inovação</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte” (zizhuchuangxin). Na fase que antece<strong>de</strong> a Revolução Cultural a China adotaum Plano dirigido ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong>s industrial e <strong>de</strong>pesquisa em áreas como automação, foguetes, semicondutores e energianuclear, o que resultou na explosão das primeiras bombas atômica(outubro <strong>de</strong> 1964) e <strong>de</strong> hidrogênio (junho <strong>de</strong> 1967).Po<strong>de</strong>-se sintetizar como características básicas da PCT da China daera maoísta a rigi<strong>de</strong>z das rotinas e da divisão <strong>de</strong> tarefas entre os váriosórgãos governamentais e <strong>de</strong> pesquisa, em que a conexão entre as partesera apenas indireta e intermediada pelos “birôs industriais”. Não obstantea política <strong>de</strong> “autoritarismo fragmentado”, em que diversas organizações eunida<strong>de</strong>s supervisionavam metas <strong>de</strong> produção e tarefas industriais ditadaspor uma “Comissão <strong>de</strong> Planejamento Estatal”, as instruções da Comissãoeram verticalizadas e pouco receptivas às eventuais propostas vindas <strong>de</strong>instâncias inferiores. Tais instâncias eram completamente manietadaspela Comissão, que as impediam <strong>de</strong> se conectarem diagonal ou mesmohorizontalmente com as <strong>de</strong>mais. O critério <strong>de</strong> eficiência adotado pelaComissão era o <strong>de</strong> escala <strong>de</strong> produção, priorizando a quantida<strong>de</strong> em<strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> aspectos gerenciais, qualida<strong>de</strong> e diversificação.Durante a Revolução Cultural diversas universida<strong>de</strong>s foram fechadase milhares <strong>de</strong> pesquisadores e professores banidos ou enviados para aslavouras, o que <strong>de</strong>sarticulou o complexo <strong>de</strong> C&T do país (Serger &Breidne, p. 138, 2007). A verticalização e os <strong>de</strong>sincentivos para a interaçãoe avaliação crítica dos resultados das políticas, nas pontas executoras do<strong>sistema</strong>, bloqueavam por completo o surgimento <strong>de</strong> inovações do tipobottom-up. Em outro sentido, não havia igualmente como se falar eminovações diante das imposições <strong>de</strong> priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção a órgãosgovernamentais e atores sociais, com escassos estímulos para implementarcriativamente as tarefas assinaladas. Tal estrutura, caracterizada pelainflexibilida<strong>de</strong> ante às vicissitu<strong>de</strong>s da produção (adversida<strong>de</strong>s climáticasna agricultura, gargalos <strong>de</strong> infraestrutura, oscilações no suprimento <strong>de</strong>matérias-primas) levava a um comprometimento <strong>de</strong> muitos aspectos143<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 143 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniordos Planos Quinquenais, com crises <strong>de</strong> produção e seus reflexos sociaisimediatos 133 .Na visita do Premier Zhao Zyiang aos Estados Unidos, em janeiro<strong>de</strong> 1984, o mandatário assegurou a irreversibilida<strong>de</strong> das reformas entãoempreendidas para enfrentar o quadro <strong>de</strong> estagnação que ameaçava aeconomia do país: “a China abriu suas portas e nunca mais as fecharánovamente” (Time, p. 07, 1984). A materialização <strong>de</strong>ssa abertura foi acriação das Zonas Econômicas Especiais – ZEE em 1980, portos livresà entrada <strong>de</strong> investimentos produtivos e <strong>de</strong> capitais estrangeiros, sobcondições fiscais privilegiadas, ao estabelecimento <strong>de</strong> joint ventures e àimplantação <strong>de</strong> “plataformas <strong>de</strong> exportação” e <strong>de</strong> produção caracterizadapor relações <strong>de</strong> mercado. A criação das ZEE foi, portanto, fruto <strong>de</strong>uma estratégia governamental <strong>de</strong> introduzir gradativamente relaçõesprivadas e <strong>de</strong>scentralizadas <strong>de</strong> livre intercâmbio em espaços urbanos maisdinâmicos da costa do Mar da China. Das seis primeiras ZEE criadas em1980, duas situavam-se nas cercanias <strong>de</strong> Hong Kong (Shenzen e Zhuhai),o que indicava a intenção <strong>de</strong> que os transbordamentos produtivos etecnológicos do enclave britânico pu<strong>de</strong>ssem alcançar e disseminar-se pelaeconomia chinesa. A estratégia das ZEE <strong>de</strong> captação <strong>de</strong> investimentosprodutivos <strong>de</strong> maior valor agregado é essencial para compreen<strong>de</strong>rtoda a mudança posterior do perfil produtivo do país, uma vez que aexperiência prosseguiu durante todo os anos 80 e em parte da década<strong>de</strong> 90, culminando com o estabelecimento <strong>de</strong> um complexo adicional<strong>de</strong> 15 ZEE (ou zonas <strong>de</strong> livre-comércio), 32 zonas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>tecnológico e 53 zonas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> tecnologias industriaisavançadas, entre as quais se <strong>de</strong>stacam as do Delta do Rio Yang-Tsé, do“Triângulo Xiamen-Quanzhou-Zhangzhou”, na Província <strong>de</strong> Fujian, edo Delta do Rio Pérola, em Guangzhou 134 .As relações <strong>de</strong>scentralizadas <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>rivadas das reformasalcançaram um pilar essencial da economia socialista, a impossibilida<strong>de</strong>133Os anos essenciais da “Gran<strong>de</strong> Revolução Cultural Proletária” (1966-1968, terminada na práticacom a intervenção do Exército <strong>de</strong> Libertação Nacional nesse último ano) foram <strong>de</strong> recessão eestagnação. A partir <strong>de</strong> abertura em 1978, com o fim das comunas agrícolas e a restauração daagricultura familiar, o crescimento exponencial do PIB jamais foi interrompido, sendo 1990 oano <strong>de</strong> crescimento mais mo<strong>de</strong>sto, <strong>de</strong> 3,8%. (China Statistical Yearbook, vários anos, apud ChinaEconomic and Business News, .134Alguns autores chamam a atenção para as consequências sociais negativas da implantaçãodas ZEE e assemelhadas, como expulsão <strong>de</strong> camponeses, exploração do trabalho e especulaçãoimobiliária. Ver Gopalakrishnan, 2007 e Hari, 2007.144<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 144 10/10/2011 14:15:44


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”<strong>de</strong> assalariamento privado <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra, assim como foram quebrandogradativamente o monopólio das empresas estatais, o que permitiu osurgimento da concorrência – inicialmente em setores <strong>de</strong> componentetecnológico mais elevado – e, consequentemente, <strong>de</strong> um mercado<strong>de</strong>scentralizado. Sob o regime <strong>de</strong> planejamento centralizado, cientistas,pesquisadores e recém-graduados não gozavam <strong>de</strong> nenhuma mobilida<strong>de</strong>ou possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intercâmbio entre seus pares, no país e, sobretudo,no exterior. As vagas nas empresas estatais eram alocadas por um birô <strong>de</strong>empregos, que as atribuíam muitas vezes em função <strong>de</strong> favores políticosou mesmo do suborno puro e simples. Com as reformas, as funções dobirô também foram alteradas, <strong>de</strong> modo que se converteu em agência<strong>nacional</strong> e tradicional <strong>de</strong> empregos. Os institutos <strong>de</strong> pesquisa, <strong>de</strong> suaparte, ganharam consi<strong>de</strong>rável autonomia para licenciar livremente nomercado os produtos que <strong>de</strong>senvolvem, assim como pu<strong>de</strong>ram prestartrabalhos <strong>de</strong> consultoria e firmar contratos com organizações privadas,nacionais e estrangeiras. Como corolário <strong>de</strong>ssas reformas e da abertura,os gastos em P&D <strong>de</strong>verão chegar em 2012 a US$ 45 bilhões, ou 2% doPIB, conforme projeções do programa 2006-2020. De fato, quase 70%dos atuais gastos em P&D na China já são assumidos pelas empresas 135 .Paralelamente à expansão dos investimentos estrangeiros, houve umapreciável movimento <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> tecnologia, embora em suagran<strong>de</strong> parte – especialmente a que incorpora maior sofisticação – controladapelas multinacionais. De outra parte, o componente <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> dasempresas nacionais chinesas, em relação às estrangeiras, ainda épronunciadamente baixo, da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 10 para 1 (fator primordial quemotivou o Programa 2006-2020 a priorizar a “<strong>inovação</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte”).A transferência <strong>de</strong> tecnologia, nessa fase <strong>de</strong> transição, reconversãoindustrial e instalação <strong>de</strong> nova infraestrutura produtiva, <strong>de</strong>u-se porintermédio <strong>de</strong> compras <strong>de</strong> equipamentos (e com a prática, então aindamais sofisticada, da engenharia reversa...), contratos <strong>de</strong> licenciamento,criação <strong>de</strong> joint ventures e instalação <strong>de</strong> subsidiárias. Tal mo<strong>de</strong>rnizaçãodo aparato produtivo do país não engendrou, contudo, maior participaçãodas empresas chinesas nas exportações <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alto componentetecnológico, setor também amplamente dominado pelas multinacionais.Fator adicional que corrobora essa “armadilha tecnológica” da produção é135“China bets big on big science”, Science, nº 311, 17/03/2006.145<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 145 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junioro fato <strong>de</strong> apenas 0.03 das empresas nacionais chinesas serem proprietáriasdas tecnologias <strong>de</strong> ponta que utilizam (Wilsdon & Keeley, p. 09, 2007).Resultado sumamente positivo da autonomia outorgada àsuniversida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong> pesquisa foi a disseminação exponencial <strong>de</strong>empresas afiliadas (spin-offs) originárias da aca<strong>de</strong>mia. Liberda<strong>de</strong> paraa pesquisa, para o “empreen<strong>de</strong>dorismo” e para o consumo transformouas maiores universida<strong>de</strong>s da China em gran<strong>de</strong>s incubadoras <strong>de</strong> empresase parques tecnológicos. Mais <strong>de</strong> 10.000 empresas foram constituídas apartir <strong>de</strong> bases acadêmicas, assim como formados 83 parques até o final<strong>de</strong> 2010 136 . Em 1990, havia poucos <strong>de</strong>sses empreendimentos no país,com receita <strong>de</strong>sprezível e contando com menos <strong>de</strong> 150.000 funcionários,número que hoje ultrapassa cinco milhões. As receitas das incubadorase parques tecnológicos alcançaram, por sua vez, a cifra espetacular <strong>de</strong>US$ 560 bilhões em 2006. O primeiro e maior dos parques científicosda China, o Zhongguancun, em Pequim, teve receitas <strong>de</strong> US$ 80 bilhões(RMB 600 bilhões), o que equivale a duas vezes e meia o PIB realmedido em PPP do Uruguai. O Parque abriga 213 Institutos <strong>de</strong> Pesquisa,1.500 centros <strong>de</strong> P&D e mobiliza 37% dos pesquisadores da Aca<strong>de</strong>miaChinesa <strong>de</strong> Ciências (ACC) e da Aca<strong>de</strong>mia Chinesa <strong>de</strong> Engenharia.Zhongguancun beneficia-se da proximida<strong>de</strong> da própria ACC e dasUniversida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Pequim e Tsinghua, instituições situadas entre as cincomaiores e melhores do país e que integram a lista das cem melhoresuniversida<strong>de</strong>s do mundo 137 . A razão essencial imediata do crescimentoda China resi<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sse modo, na obtenção <strong>de</strong> preço-prêmio oriundo dasexportações e <strong>de</strong> fornecimento ao mercado interno <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> altocomponente tecnológico, providos pelas multinacionais e, em segundamedida, pelas empresas nacionais chinesas e estrangeiras surgidas <strong>de</strong>incubadores e parques científicos.Marco das reformas estruturais do <strong>sistema</strong> chinês <strong>de</strong> C&T duranteos anos 80 foi o lançamento do Programa Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e136Re<strong>de</strong> Science and Development Network, 19/06/2006, .137Cf. em Wilsdon & Keeley, (p. 09, 2007) e no portal do parque científico <strong>de</strong> Zhongguancun, (item “evolução e indicadores econômicos”). Critica-se, por outro lado, o funcionamentodos parques chineses <strong>de</strong>vido à baixa capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inovar e pelo insatisfatório número <strong>de</strong>patentes requeridas, cerca <strong>de</strong> apenas 6.000 em 2007, diante da escala da produção e das receitasenvolvidas. Cf. em Cyranoski, p. 346, 2008.146<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 146 10/10/2011 14:15:44


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”Desenvolvimento <strong>de</strong> Alta Tecnologia, ou “Programa 863”, númeroque alu<strong>de</strong> ao ano e ao mês em que foi criado. O programa mobilizouesforços e recursos para aprimorar a base <strong>de</strong> infraestrutura tecnológicado país, mormente em áreas <strong>de</strong> interesse social direto, como ciênciasbiológicas, produtos farmacêuticos e novas tecnologias agrícolas. Oprograma visa ainda reforçar a competitivida<strong>de</strong> das empresas do paíspor meio <strong>de</strong> incentivos à pesquisa nos campos da nanotecnologia e dosnovos materiais 138 . Ponto do programa que indica com clareza seus doisobjetivos primordiais – fortalecimento da competitivida<strong>de</strong> e integraçãoprodutiva – é o fomento ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ias produtivas,tanto no que se refere ao aumento da eficiência, em todas as etapas daprodução, quanto no que tange às conexões e interações entre diferentesunida<strong>de</strong>s fabris. Outra característica do “863” é a diminuição do peso daautorida<strong>de</strong> estatal na consecução <strong>de</strong> suas metas, em favor dos cientistasque passaram a gozar <strong>de</strong> autonomia para <strong>de</strong>finir a forma pelas quais<strong>de</strong>verão ser implementadas 139 . Pari passu a essa expressiva reformado <strong>sistema</strong> chinês <strong>de</strong> C&T, foi instituída a Lei Provisória <strong>de</strong> Falênciapara Empresas Estatais (1986), foi autorizada a abertura das bolsas <strong>de</strong>valores <strong>de</strong> Shenzen e Shangai (1990), promulgada a “Primeira Lei dasCompanhias” (1994, equivalente à lei das Socieda<strong>de</strong>s Anônimas noBrasil) 140 , reconhecido o direito à proprieda<strong>de</strong> privada (1999) e aprovada,finalmente, a a<strong>de</strong>são da China à OMC.138Estratégia paralela à da adoção <strong>de</strong> programas para a expansão e fortalecimento da infraestrutura<strong>de</strong> pesquisa foi a mobilização do Governo e da comunida<strong>de</strong> científica da China para atrair parao país gran<strong>de</strong>s Congressos internacionais, em diversas áreas do conhecimento. Registre-se, porexemplo, na área <strong>de</strong> nanotecnologia e materiais, a realização da “Conferência Inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong>Semicondutores”, já em 1992. Agra<strong>de</strong>ço ao Professor Adalberto Fazzio, do MCT, essa importanteinformação complementar.139O “863” é ainda consi<strong>de</strong>rado o mais importante da China na área <strong>de</strong> C&T, em termos <strong>de</strong>resultados e alcance (e diante do pouco tempo <strong>de</strong> maturação do Programa 2006-2020). Dois <strong>de</strong>ssesresultados mais emblemáticos têm sido o êxito <strong>de</strong> pesquisas com células-tronco e a expansãosem prece<strong>de</strong>ntes do número <strong>de</strong> autores, artigos e citações internacionais <strong>de</strong> cientistas chineses emrevistas in<strong>de</strong>xadas na área <strong>de</strong> física em geral e nanotecnologia em particular. Neste último caso, opaís ultrapassou recentemente o Japão em número <strong>de</strong> publicações e <strong>de</strong>verá, segundo estimativas,ultrapassar os próprios EUA nos próximos anos. Cf. em Youtie, Shapira & Porter, pp. 983-984,2008 e “China becomes physics powerhouse”, China Daily/Xinhua Net, 02/08/2008, disponívelem .140Durante reunião do Pleno do Comitê Central do PCC, em setembro <strong>de</strong> 1999, formalizou-seo reconhecimento da governança corporativa como uma “viga-mestra do <strong>sistema</strong> empresarial”.Não obstante os avanços propiciados pela nova lei, sobretudo no que tange à segurança dosinvestimentos estrangeiros na China, persistem distorções e privilégios como “Pouca fiscalização147<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 147 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorEspecificamente no plano da construção e consolidação do SCIa China adotou uma estrutura <strong>de</strong> apoio à C,T&I que contempla oconjunto dos atores integrantes do <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Além do “863”,o governo, sob a coor<strong>de</strong>nação do MOST, implantou e implementou oPrograma Nacional <strong>de</strong> Tecnologias-Chave <strong>de</strong> 1984, a Lei <strong>de</strong> Patentes(1984), o Programa Estatal <strong>de</strong> Laboratórios-Chave, também <strong>de</strong> 1984(<strong>de</strong>senhado para montar a infraestrutura básica <strong>de</strong> pesquisa científicado país, com recursos anuais <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> US$ 240 milhões), a reformauniversitária <strong>de</strong> 1985, a Fundação Nacional <strong>de</strong> Ciências Naturais da China(1985), o Programa “Fagulha” (Spark), <strong>de</strong> 1986 (<strong>de</strong>stinado a promoveravanços científicos para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> sustentável da agriculturae do meio rural) e o Programa “Tocha” (Torch), <strong>de</strong> 1988 (voltado parapromover e apoiar parques tecnológicos, bases industriais e plataformas<strong>de</strong> exportação, com o objetivo <strong>de</strong> expandir a produção e o capital dasempresas afiliadas, e com a perspectiva <strong>de</strong> virem a se tornar gran<strong>de</strong>scorporações e multinacionais chinesas). Na década <strong>de</strong> 90, os programase iniciativas mais <strong>de</strong>stacados seriam a adoção <strong>de</strong> Lei <strong>de</strong> Proteção daProprieda<strong>de</strong> Intelectual (1990), o programa <strong>de</strong> “revitalização do país porintermédio <strong>de</strong> uma estratégia científico-educacional” (1995), o programa“973” 141 , o programa <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do conhecimento da ACC, <strong>de</strong> 1998, ofundo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> para pequenas e médias empresas <strong>de</strong> base tecnológica(1999) e o plano <strong>de</strong> ação para a promoção do comércio <strong>de</strong> produtos eempresas <strong>de</strong> base tecnológica, do ano 2000.O balanço geral <strong>de</strong> duas décadas <strong>de</strong> reformas econômico-institucionaispara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico da China foi claramentepositivo, após o lançamento das “quatro mo<strong>de</strong>rnizações” <strong>de</strong> Deng<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> acionistas minoritários e influências do governo na nomeação <strong>de</strong> diretores e <strong>de</strong>cisõescorporativas. Muito po<strong>de</strong>r está concentrado nas mãos <strong>de</strong> poucos acionistas, havendo, emdiversas instâncias, falta <strong>de</strong> transparência e discricionarieda<strong>de</strong> (unaccountability) nas <strong>de</strong>cisõesempresariais” (Feinerman, pp. 592-593, 2007).141Lançado em março, o “Programa Nacional <strong>de</strong> Projetos-Chave <strong>de</strong> Pesquisa Básica” (“973”)foi concebido para realizar quatro objetivos essenciais: a) criar uma base teórica e metodológicaconsistente para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico da China, fundado na (b) trans emultidisciplinarieda<strong>de</strong>, por meio da criação dos centros correspon<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> pesquisa; c) fomentara qualificação e a capacitação <strong>de</strong> alto nível <strong>de</strong> seus cientistas e pesquisadores; e d) abrir linhas<strong>de</strong> pesquisa novas, nas quais o país não conta necessariamente com capacitação <strong>de</strong> alto nível.Entre os resultados mais importantes do “973”, registre-se a instituição <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 100 novoscentros <strong>de</strong> pesquisa em toda a China, nas áreas <strong>de</strong> agricultura, energia, tecnologias da informaçãoe da comunicação, recursos naturais e meio ambiente, saú<strong>de</strong>, estruturas elementares da matériae biologia molecular (síntese <strong>de</strong> proteínas). Ver .148<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 148 10/10/2011 14:15:44


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”Xiaoping (nos campos da agricultura, indústria, <strong>de</strong>fesa e C&T). Além daevolução notável e sustentada dos indicadores macroeconômicos do país,a China integrou-se plenamente aos fluxos dinâmicos da globalização eda economia inter<strong>nacional</strong>, sobretudo após o ingresso na OMC 142 , assimcomo houve uma expansão vertiginosa, no nível microeconômico, dacapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> comercialização <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong>rivados<strong>de</strong> pesquisas efetuadas pelas empresas e corporações privadas. O paísgerou uma base científica comparável a dos poucos e principais paísesindustrializados e um <strong>sistema</strong> produtivo francamente aberto à competição,com disposição <strong>de</strong> submeter-se ao conjunto das disciplinas econômicasmultilaterais e às práticas consagradas <strong>de</strong> mercado, tanto em níveldoméstico quanto inter<strong>nacional</strong>.Muitas das estatísticas e indicadores impressionantes do paísescon<strong>de</strong>m, contudo, uma gama <strong>de</strong> problemas <strong>de</strong> gestão, <strong>de</strong>sempenho,eficiência, qualida<strong>de</strong> e distribuição <strong>de</strong> recursos, herdados <strong>de</strong> práticas etrajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência formadas nos anos subsequentes à Revolução<strong>de</strong> 1949 e <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológicocalcado na experiência soviética (da qual, por exemplo, a própriaorganização institucional da ACC é ainda em parte tributária). Na partefinal do capítulo serão trabalhados com maior pormenor os trunfos efraquezas do SCI. Antes, porém, serão <strong>de</strong>scritos e <strong>de</strong>finidos os principaisatores integrantes do <strong>sistema</strong>, assim como apresentada e avaliada aestratégia chinesa para a superação dos gargalos estruturais <strong>de</strong> seu <strong>sistema</strong><strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, consubstanciada no Programa Nacional 2006-2020 parao Desenvolvimento <strong>de</strong> Médio e Longo Prazos da Ciência e Tecnologia.4.3 – Governo, socieda<strong>de</strong> e atores do SCI mobilizados pela “zizhuchuangxin”Conforme visto na seção anterior, gran<strong>de</strong> parte do êxito econômico daChina nos últimos anos resulta, na prática (e ainda que em gran<strong>de</strong> medidaesses resultados tenham sido produto <strong>de</strong> políticas governamentais), daprodução e exportação <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alto conteúdo tecnológico oriundospredominantemente <strong>de</strong> empresas multinacionais instaladas no país, <strong>de</strong>patentes e processos produtivos dominados por essas empresas e da P&D142Análise do processo, negociação e consequências econômicas domésticas e internacionais doingresso da China na OMC consta <strong>de</strong> Prazeres (2005).149<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 149 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorrealizados essencialmente por essas multinacionais. Persistem, a<strong>de</strong>mais,dificulda<strong>de</strong>s pronunciadas <strong>de</strong> transferência e <strong>de</strong> “transbordamento”<strong>de</strong> tecnologias operadas na China pelas multinacionais e problemas<strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> das empresas nacionais chinesas, notadamenteas estatais, que registram baixa capacida<strong>de</strong> relativa <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, emtermos agregados 143 . A gran<strong>de</strong> e complexa estrutura institucional do SCIprivilegiou a formação <strong>de</strong> uma das maiores bases <strong>de</strong> pesquisa científicae tecnológica do mundo, mas não foi ainda capaz <strong>de</strong> gerar um genuíno<strong>sistema</strong> autóctone <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. A rationale do Programa 2006-2020 é,<strong>de</strong>sse modo, gerar esse <strong>sistema</strong> com características “autênticas”, ao passoque o Governo, as universida<strong>de</strong>s, empresas e centros <strong>de</strong> pesquisa estãodoravante, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2006, orientados a perseguir esse objetivo estratégicoprimordial e base <strong>de</strong> uma política industrial, produtiva e <strong>de</strong> C&T <strong>de</strong>Estado, a “<strong>inovação</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte” (zizhu chuangxin) 144 .O MOST (criado em 1998 e sucedâneo da antiga ComissãoEstatal <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia) vinha sendo tradicionalmente o atorprimordial do SCI, enfeixando responsabilida<strong>de</strong>s para a implementaçãoe financiamento dos diversos programas em vigência indicados noitem anterior, notadamente os “863”, “973” e “Tocha”, bem como tema seu cargo os programas <strong>de</strong> cooperação e parcerias internacionais e asupervisão das 32 zonas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico e 53 zonas <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> tecnologias industriais avançadas anteriormentemencionadas, o que por si só já lhe asseguraria primazia e <strong>de</strong>staque nacoor<strong>de</strong>nação e supervisão do <strong>sistema</strong>.Na medida em que a responsabilida<strong>de</strong> pelos problemas <strong>de</strong> gestão,qualida<strong>de</strong> e eficiência indicados anteriormente vinha sendo, contudo, emgran<strong>de</strong> medida atribuída ao MOST, o Ministério veio a per<strong>de</strong>r posteriormente,com a adoção do Programa 2006-2020, amplas parcelas do po<strong>de</strong>r que<strong>de</strong>sfrutava, em favor da Comissão Nacional <strong>de</strong> Reforma e Desenvolvimento(National Development and Reform Commission – NDRC) e o Ministériodas Finanças, feitos responsáveis pela implementação da maior partedas 99 ações contempladas no Programa 145 . Além das críticas genéricas143Cf. em “SOEs have low innovation capacity: official”, China Daily/Xinghua News, 18/11/2005,disponível em .144“Dirigentes chineses, ansiosos por reduzir a <strong>de</strong>pendência da China em tecnologia estrangeirae planejamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>sign fizeram, nos últimos 25 anos, a construção <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>nacional</strong> <strong>de</strong>pesquisa e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> a pedra angular <strong>de</strong> sua política industrial” (Dickie, p. B-11, 2007).145 Tal perda <strong>de</strong> influência po<strong>de</strong> ser verificada quando se contrasta com os amplos po<strong>de</strong>res150<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 150 10/10/2011 14:15:44


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”formuladas contra o Ministério no tocante às suas responsabilida<strong>de</strong>s peloatraso relativo da evolução do SCI, falava-se <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> profissionalismo,transparência e eficiência na alocação <strong>de</strong> recursos para os programasmantidos sob sua égi<strong>de</strong>. A incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> os cientistas chineses<strong>de</strong>belarem o surto da Síndrome Respiratória Aguda <strong>de</strong>flagrada em 2003e as dificulda<strong>de</strong>s gerais <strong>de</strong> converter o excelente cabedal científico chinêsem <strong>inovação</strong> <strong>de</strong>sprestigiaram o MOST, relativamente a outros Ministériose agências estatais responsáveis pelo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico etecnológico em suas respectivas pastas.A substituição do então Ministro da Ciência e Tecnologia XuGuanhua pelo ex-reitor da Universida<strong>de</strong> Tongji <strong>de</strong> Xangai, Wan Gang, emabril <strong>de</strong> 2007, simboliza a até certo ponto radical mudança <strong>de</strong> orientaçãona política chinesa <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, <strong>de</strong>corrente da falta <strong>de</strong> avanços concretosregistrados em tempos recentes e diante dos objetivos essenciais doprograma 2006-2020. Wan Gang passou a ser o único membro doConselho <strong>de</strong> Estado e integrante do Gabinete chinês não filiado ao PCC,sendo oriundo das fileiras do Partido Zhi Gong. Mais relevante que amudança política simbólica suscitada pela indicação <strong>de</strong> Wan Gang foia efetiva mudança do perfil executivo e empreen<strong>de</strong>dor do MOST, apartir das conexões do novo Ministro com a indústria automobilísticamundial. Trabalhou e estudou por quinze anos na Alemanha, on<strong>de</strong> obteveseu doutorado e ocupou cargo <strong>de</strong> direção na Audi, além <strong>de</strong> integrar oConselho <strong>de</strong> Administração da Thyssenkrupp. O partido <strong>de</strong> Wan Gang, <strong>de</strong>poucos milhares <strong>de</strong> membros, é composto essencialmente por intelectuais,cientistas e ex-expatriados com ampla experiência <strong>de</strong> pesquisa e ativida<strong>de</strong>empresarial no exterior, o que indica que o Conselho <strong>de</strong> Estado tencionaconferir uma dinâmica nova ao processo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> na China, apartir da experiência dos “tartarugas marinhas”, cientistas regressadosessencialmente por conta dos incentivos governamentais instituídos apartir do final da década <strong>de</strong> 90, direcionados à sua (re)incorporação aoconferidos ao MOST para a supervisão do mais importante programa da PCT chinesa anteriorao “2006-2020”, o “863”. Das oito áreas prioritárias <strong>de</strong>ste último – automação, biotecnologia,energia, TIC, lasers, novos materiais e materiais avançados, tecnologia <strong>de</strong> oceanos e tecnologiaespacial – o MOST só não <strong>de</strong>tinha responsabilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> implementação <strong>de</strong>sses dois últimos eda área <strong>de</strong> lasers, atribuições da Comissão <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia e Indústria para a DefesaNacional (Commission on Science, Technology and Industry for National Defense – COSTIND)e da “Administração Oceânica Estatal”, em suas respectivas áreas (Walsh, p. 44, 2003). Orelatório da OCDE (OCDE, p. a:49, 2007) sobre políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> na China, talvez aindanão refletindo as mudanças <strong>de</strong> priorida<strong>de</strong> assinaladas, atribui ao MOST o principal papel no SCI.151<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 151 10/10/2011 14:15:44


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>sistema</strong> produtivo do país 146 . O regresso <strong>de</strong> Wan Gang à China <strong>de</strong>u-sejustamente no âmbito <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sses programas.O MOST vem tomando, <strong>de</strong>ssa forma, uma orientação executivamuito mais pronunciada, diferente da estrutura antes maishierarquizada, politizada e pouco integrada às <strong>de</strong>mais instânciase ramificações, públicas e privadas, do SCI. Condizentementecom sua experiência no setor automobilístico, o novo Ministrovem implementando uma política <strong>de</strong> expansão da indústria e dasexportações, a partir da produção <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los como o Panda, comcrescente participação no mercado inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> veículos, e do<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> veículos híbridos, <strong>de</strong> baixo consumo e voltadostanto para o mercado interno quanto para o inter<strong>nacional</strong>, com focoem consumidores <strong>de</strong> renda média ou baixa. Outro setor que vinculapesquisa científico-tecnológica avançada com amplo potencial <strong>de</strong>inserção no mercado inter<strong>nacional</strong> é a indústria aeronáutica, objeto<strong>de</strong> atenção especial do MOST. Recentemente o grupo industrialaeronáutico Xi’an lançou o mo<strong>de</strong>lo Xinzhou-600, jato para rotasregionais que apresentaria custos <strong>de</strong> manutenção, operação e consumo<strong>de</strong> combustível mais reduzidos que os mo<strong>de</strong>los congêneres, <strong>de</strong>empresas como a Bombardier e a Embraer 147 .Devido às conexões mais evi<strong>de</strong>ntes entre pesquisa científicae tecnológica, mercado e <strong>inovação</strong>, exemplificadas pela indústriaautomobilística, fica patente a nova missão do MOST <strong>de</strong> gerar“<strong>inovação</strong> autônoma” e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver uma multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong>setores industriais da China com potencial <strong>de</strong> incorporação <strong>de</strong>valor, diversificação e suprimento <strong>de</strong> novos mercados, a partir <strong>de</strong>capacida<strong>de</strong>s tecnológicas próprias, existentes e potenciais.As funções principais do MOST (OCDE, p. 54, 2007 e portal doMOST na internet, www.most.gov.cn) são:146O termo “tartarugas marinhas” atribuído aos retornados da diáspora chinesa <strong>de</strong> ciência etecnologia <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> uma homofonia do mandarim, haigui, que expressa tanto a condição <strong>de</strong>retornado quanto o referido quelônio. A análise biográfica do Ministro Wan Gang foi extraídada reportagem “China breaks mould for new minister”, Financial Times, 27/04/2007, p. 11 e“Who’s who in China’s lea<strong>de</strong>rship”, Xinghua News Agency, 27/04/2007, disponível em . Em agosto <strong>de</strong> 2011, o Ministro Wan Gangestava ainda à frente do MOST.147China Science and Technology Newsletter nº 515, 30/06/2008, disponível em .152<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 152 10/10/2011 14:15:45


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”- Formular estratégias, <strong>de</strong>finir áreas estratégicas e políticas(policies) e propor leis e regulamentos para a área <strong>de</strong> C&T;- promover a construção do SCI (para o que <strong>de</strong>verá “promoversinergias entre empresas, universida<strong>de</strong>s e institutos <strong>de</strong> pesquisa,promover a aplicação e a verificação <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobertas científicas eprocessos tecnológicos e aprimorar a capacida<strong>de</strong> inovadora dasempresas”);- conduzir pesquisas sobre temas fundamentais <strong>de</strong> C&T relacionadosao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico e social;- propor e implementar reformas do <strong>sistema</strong> científico-tecnológico;- formular políticas para fortalecer a base <strong>de</strong> pesquisa,<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e industrialização <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alto conteúdotecnológico (“high-tech”);- conceber e implementar programas <strong>de</strong> financiamento <strong>de</strong>pesquisa aplicada voltada para a criação <strong>de</strong> parques científicos eincubadoras e induzir as firmas a inovar;- i<strong>de</strong>alizar medidas para incrementar investimentos em C&T;- “encorajar talentos” para a ciência e tecnologia (minhas aspas)e alocar recursos humanos para a pesquisa e o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>científico-tecnológico; e- promover intercâmbio, parcerias e cooperação internacionais emC&T.O Ministério <strong>de</strong>senvolve ainda dois programas complementarese associados, o <strong>de</strong> “construção <strong>de</strong> infraestrutura <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> C&T”e “construção <strong>de</strong> ambiente favorável à industrialização em áreasintensivas em C&T”. Em sua estrutura organizacional <strong>de</strong>stacam-se umDepartamento <strong>de</strong> Pesquisa Básica, uma Diretoria para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>do SCI – tarefa hercúlea que recai sobre a repartição – e o Departamento<strong>de</strong> Cooperação Inter<strong>nacional</strong>. Cabe a este último, em coor<strong>de</strong>nação com oMinistério das Relações Exteriores – e com responsabilida<strong>de</strong>s e tarefasrelativamente bem mais mo<strong>de</strong>stas para este último, em termos <strong>de</strong> políticas<strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> C,T&I – manter, coor<strong>de</strong>nar e supervisionar a ação<strong>de</strong> “adidos científicos” presentes em cerca <strong>de</strong> 67 Embaixadas, Missõese Delegações da China no exterior 148 . Entre diversas outras entida<strong>de</strong>s,148Em rápidas conversas com o adido científico da Embaixada da China em Brasília, ConselheiroMo Hongjun, o autor foi informado <strong>de</strong> que os adidos chineses <strong>de</strong> C&T no exterior reportam-153<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 153 10/10/2011 14:15:45


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniororganizações e institutos subordinados, o MOST mantém um “Instituto <strong>de</strong>Informação Científico-Tecnológica da China” (encarregado da produção<strong>de</strong> indicadores e da edição do China Science and Technology StatisticsData Book), o “Centro <strong>de</strong> Cooperação Tecnológica Sino-Japonês”, o“Centro Nacional para o Desenvolvimento da Biotecnologia” e um“Centro Administrativo <strong>de</strong> Pesquisa Básica.”Acima do MOST, em termos <strong>de</strong> prestígio científico na China e noexterior, mas com competências funcionais e vínculos governamentaisdistintos, figura a Aca<strong>de</strong>mia Chinesa <strong>de</strong> Ciências, fundada em novembro<strong>de</strong> 1949, seguindo os mol<strong>de</strong>s exatos <strong>de</strong> sua então e igualmente prestigiosacongênere soviética. O então Presi<strong>de</strong>nte da Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Ciências daURSS, Sergei Vivalov, foi pessoalmente contactado pelo governo chinês,tão logo vitoriosa a Revolução <strong>de</strong> 1949, para mo<strong>de</strong>lar o que viria a sera gênese do atual SCI. Seu livro Trinta anos <strong>de</strong> ciência soviética 149 foitraduzido para o chinês e adotado como um manual para a constituiçãoda aca<strong>de</strong>mia chinesa. Para aferir o prestígio e a influência <strong>de</strong> que <strong>de</strong>sfrutaa Aca<strong>de</strong>mia na China e no mundo, vale ressaltar que figura como aquarta instituição <strong>de</strong> pesquisa mais citada no mundo em artigos sobrenanociência e nanotecnologia, atrás da Universida<strong>de</strong> da Califórniaem Berkeley, do MIT e do centro <strong>de</strong> pesquisas da IBM (Wilsdon &Keeley, p. 24, 2007). Outras conquistas expressivas registradas pelaAca<strong>de</strong>mia incluem o mapeamento e o sequenciamento genético do arroz;pesquisas <strong>de</strong> ponta em engenharia genética, com clonagem <strong>de</strong> plantas eanimais; <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 50 novos medicamentos; e suascontribuições para os programas nuclear, espacial e na área <strong>de</strong> ciênciasbásicas (especialmente física da estrutura básica da matéria).A ACC conta com re<strong>de</strong> <strong>de</strong> 89 institutos e 79 centros e unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>pesquisa (que geraram centenas <strong>de</strong> companhias e empreendimentosspin-off), com cerca <strong>de</strong> 40% <strong>de</strong>ssa estrutura sediada em Pequim, o queacentua o grave problema das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s regionais do país também nose ao MRE chinês, mas que as iniciativas <strong>de</strong> cooperação e as políticas <strong>de</strong> articulação dasMissões diplomáticas com a diáspora chinesa e com os SNI dos países on<strong>de</strong> estão acreditadossão concebidas primacialmente pelo MOST. Não foi possível, em três conversas telefônicascom a Embaixada em Brasília, acertar uma entrevista para tratar <strong>de</strong> questões mais específicas,empíricas, diplomáticas e operacionais, alusivas à atuação dos adidos científico-tecnológicoschineses no exterior.149O primeiro capítulo da obra foi republicado no jornal Synthese (1947), v. 6, nº 7-8, Springer,Haia, pp. 318-329.154<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 154 10/10/2011 14:15:45


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”que tange ao papel crucial do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico parao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, como conceito integrado e abrangente – e a <strong>de</strong>speito daAca<strong>de</strong>mia manter como um <strong>de</strong> seus programas o “Desenvolvimento da ChinaOci<strong>de</strong>ntal” (on<strong>de</strong> mantém, em toda a região, apenas 23 centros e institutos <strong>de</strong>pesquisa, basicamente na área <strong>de</strong> ciências naturais e com foco na “economianatural”: mapeamento <strong>de</strong> ecos<strong>sistema</strong>s e recursos naturais e territoriais,<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> fontes alternativas <strong>de</strong> energia, aproveitamento energético<strong>de</strong> hidrocarbonetos e agricultura ecológica sustentável).Edita vinte periódicos científicos in<strong>de</strong>xados e mantém, na sua estrutura<strong>de</strong> pesquisa, laboratórios <strong>de</strong> ponta multifuncionais, tais como um colisor<strong>de</strong> elétrons e pósitrons, um acelerador síncrotron (está em construção umnovo laboratório <strong>de</strong> radiação síncrotron em Xangai), equipamentos <strong>de</strong> fusãonuclear a laser e um “tokamak”. Como resultado do Programa Nacional<strong>de</strong> Inovação (National Knowledge Innovation Program – KIP, lançado em1998), foram acrescentados à estrutura da Aca<strong>de</strong>mia 61 novos institutos e21 museus (contabilizados na re<strong>de</strong> total <strong>de</strong> 168 centros e institutos) 150 , assimcomo programados sete novos “megaprojetos” e cinco novos “projetos” paraos próximos anos, entre os quais avultam a construção <strong>de</strong> um banco <strong>nacional</strong><strong>de</strong> germoplasma, coor<strong>de</strong>nado pelo Instituto <strong>de</strong> Botânica <strong>de</strong> Kunming, oCentro Magnético <strong>de</strong> Altas Energias <strong>de</strong> Hefei, um radiotelescópio <strong>de</strong> 500metros <strong>de</strong> disco 151 e a construção <strong>de</strong> fonte <strong>de</strong> fragmentação <strong>de</strong> nêutrons.Um dos problemas centrais do SCI, em que a ACC é uma das partesmais afetadas, é o fato já mencionado <strong>de</strong> a produção científica chinesa, por150As informações <strong>de</strong>sta seção foram extraídas majoritariamente do portal da ACC . A criação e a reformulação <strong>de</strong> novos institutos e centros <strong>de</strong> pesquisa na ACC(<strong>de</strong>stacada na seção “Achievements Notched by KIP Pilot Project over Past Four Years”) contrastacom a tendência mais geral <strong>de</strong> redução do número <strong>de</strong> institutos governamentais e do pessoal aeles filiado. Wilsdon & Keeley (p. 11, 2007) referem-se a uma “dramática redução” do número<strong>de</strong> Institutos nos últimos anos, informação corroborada por Serger & Breidne (p. 140, 2007),que precisam que o número global <strong>de</strong> institutos governamentais foi reduzido <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 6.000em 1991 para menos <strong>de</strong> 4.000 em 2004, e <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 1 milhão <strong>de</strong> funcionários para cerca <strong>de</strong>560.000. Os institutos recebem ainda o dobro dos recursos <strong>de</strong>stinados ao <strong>sistema</strong> universitário.Tal incremento <strong>de</strong> recursos proveio essencialmente do setor privado, que compensou largamenteos cortes orçamentários <strong>de</strong> verbas oficiais (Liu & White, p. 1106, 2001). Po<strong>de</strong>-se supor, a partir<strong>de</strong>sses dados e informações, que o volume <strong>de</strong> recursos estatais não é uma variável forte daativida<strong>de</strong> inovadora, mas sim os vínculos mantidos pelos centros <strong>de</strong> pesquisa com os diversospontos do <strong>sistema</strong>.151O radiotelescópio <strong>de</strong> Karst, na Província <strong>de</strong> Ghizou (Sudoeste) terá uma capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong>processamento <strong>de</strong> dados <strong>de</strong>z vezes superior à do maior radiotelescópio em operação, em Arecibo,Porto Rico.155<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 155 10/10/2011 14:15:45


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorestar muito além da <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (caracterizando, assim comono Brasil, um perfil “ofertista” do <strong>sistema</strong>), estar sendo em gran<strong>de</strong> partereconvertida para a produção tecnológica e gradualmente afastada dapesquisa básica, cada vez mais escassa no país em relação ao conjunto daP&D (cerca <strong>de</strong> 6%, ao passo que na Rússia e na Coreia este índice sobepara 14% e, nos Estados Unidos e Europa, a 25% – Serger & Breidne,p. 143, 2007). Tal movimento, em parte previsto no KIP e ponto centraldo Programa 2006-2020, tem sido recebido com restrições pela direçãocientífica da ACC. Em qualquer circunstância, porém, a Aca<strong>de</strong>miamanter-se-á como centro <strong>de</strong> pesquisa e referência inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> primeiraclasse. Conforme resumiram Suttmeier, Cao & Simon (p. 59, 2006),Poucas instituições incorporam em sua estrutura organizacional tantas ativida<strong>de</strong>se objetivos diferentes: pesquisa básica, P&D <strong>de</strong> ponta; programas <strong>de</strong> pesquisa<strong>de</strong> forte alcance social na área <strong>de</strong> agricultura, saú<strong>de</strong>, energia e meio ambiente;financiamento à pós-graduação; e operação <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 400 empresas, emcooperação com governos locais 152 .4.4 – Universida<strong>de</strong>s e <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> pesquisaNo que se refere à base <strong>de</strong> recursos humanos que alimenta o SCI, oprincipal ator é indubitavelmente o <strong>sistema</strong> universitário, com mais <strong>de</strong>seis milhões <strong>de</strong> estudantes <strong>de</strong> graduação, número cinco vezes superior aoregistrado em meados da década <strong>de</strong> 90 (com uma <strong>de</strong>manda anual <strong>de</strong> cerca<strong>de</strong> 16 milhões <strong>de</strong> candidatos). Mais impressionante nesse contingente <strong>de</strong>pesquisadores é o fato <strong>de</strong> 41% estarem <strong>de</strong>dicados a estudos <strong>de</strong> ciênciasbásicas e engenharias (contra cerca <strong>de</strong> 10% no Brasil). Outros 14% naChina estudam “literatura” 153 e apenas 6,7% medicina (MOST, p. 34, 2007e OCDE, p. 28, 2007a). 154 O <strong>sistema</strong> universitário da China compreen<strong>de</strong>152Outras instituições <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque comparável à ACC, embora em campos <strong>de</strong> atuação restritose específicos, são as Aca<strong>de</strong>mias Chinesas <strong>de</strong> Engenharia e <strong>de</strong> Ciências Sociais e a FundaçãoNacional <strong>de</strong> Ciências Naturais da China (FNCNC).153O Comitê Central do PCC mantém um “Comitê Editorial para o Estudo da Literatura doPartido”.154A revista Nature (“The Great Conten<strong>de</strong>r”, v. 454, 24/07/2008) estima em 672.000 o número <strong>de</strong>estudantes <strong>de</strong> engenharia no país, o que seria o maior contingente <strong>de</strong> todo o mundo, representandocerca <strong>de</strong> dois terços do total <strong>de</strong> formados no país a cada ano, conforme assinala a matéria. Aindaque os números absolutos sejam perfeitamente críveis, o percentual certamente <strong>de</strong>ve estarsuperestimado, à luz dos dados do MOST e da OCDE.156<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 156 10/10/2011 14:15:45


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”1.772 universida<strong>de</strong>s, 678 das quais com ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> P&D, abrigando87 laboratórios estatais estratégicos para o país (OCDE,p. 30, 2007a) 155 .Além <strong>de</strong> ter alçado o país à condição <strong>de</strong> segundo maior produtormundial <strong>de</strong> conhecimento na área <strong>de</strong> nanociência e nanotecnologia, o<strong>sistema</strong> universitário <strong>de</strong> pesquisa e pós-graduação respon<strong>de</strong> por 6,52%dos artigos científicos in<strong>de</strong>xados <strong>de</strong> todo o mundo (1,9% no Brasil, em2009) em todas as áreas, superior ao volume e ao percentual produzidopor países como França e Coreia (Zhou & Ley<strong>de</strong>sdorff, p. 8, 2006) 156 . Auniversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pequim está situada no primeiro percentil da elite mundial<strong>de</strong> instituições <strong>de</strong> pesquisa nas áreas <strong>de</strong> física, química, engenharias,novos materiais, matemática e medicina clínica, sendo que cinco outrasuniversida<strong>de</strong>s do país figuram nessa relação ao menos em uma daquelasáreas. O quadro abaixo indica a relação das <strong>de</strong>z mais produtivas eprestigiosas instituições <strong>de</strong> pesquisa da China, em termos <strong>de</strong> geração <strong>de</strong>conhecimento e publicações científicas. Ressalte-se a referência à direita,em que duas instituições, a ACC e a Universida<strong>de</strong> Tsinghua, figuramcomo a número um e quatro no mundo, respectivamente, em termos <strong>de</strong>quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> artigos publicados sobre nanociência e nanotecnologiaem periódicos internacionais in<strong>de</strong>xados:155O número <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>s chinesas foi informado ao autor pelo Professor Liu Xielin, doDepartamento <strong>de</strong> Estudos <strong>de</strong> Inovação da ACC, durante o seminário “Dez anos <strong>de</strong> arranjos e<strong>sistema</strong>s produtivos locais”, promovido pela REDESIST – UFRJ, Rio <strong>de</strong> Janeiro, 26 a 28/11/07.156Segundo outra fonte (Centre for Science & Technology Studies, da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lei<strong>de</strong>n,Holanda – apud Nature, p. 383, 2008), o índice da China estaria em 6,75% e já teria ultrapassadoJapão, Alemanha e Reino Unido, além da França.157<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 157 10/10/2011 14:15:45


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorQuadro 4.1 – Universida<strong>de</strong>s chinesas – ranking inter<strong>nacional</strong> eprodução científica, 1995-2005(Dados relativos a 2004-2005, extraídos <strong>de</strong> Kostoff et al. p. 74, 2006 e <strong>de</strong> OCDE,p. 39, 2007) 157Outro aspecto fundamental do <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> ensino, pesquisa epós-graduação da China (tema a ser retomado na parte final do capítulo)é o contingente <strong>de</strong> 347.000 pesquisadores chineses no exterior (cerca<strong>de</strong> 40.000 anuais, com crescente taxa <strong>de</strong> retorno ao país, da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong>25%) (OCDE: p. 28, 2007a), radicado principalmente nos EUA, EuropaOci<strong>de</strong>ntal, Japão, Austrália e Nova Zelândia. Mais <strong>de</strong> 1,2 milhões <strong>de</strong>chineses estudaram em universida<strong>de</strong>s estrangeiras <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início dasreformas e da política <strong>de</strong> “portas abertas”, com uma taxa geral <strong>de</strong> retorno<strong>de</strong> 320.000 estudantes/pesquisadores 158 . A comunida<strong>de</strong> acadêmicachinesa é amplamente majoritária no Japão, da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 2/3 do total <strong>de</strong>estudantes estrangeiros, e a segunda maior nos Estados Unidos, <strong>de</strong>poisda indiana. Dado que indica a qualida<strong>de</strong> crescente do <strong>sistema</strong> chinês <strong>de</strong>pesquisa é o fato <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 11.000 estudantes e pesquisadores norte--americanos estarem matriculados em universida<strong>de</strong>s chinesas, o queconfirma uma ainda discreta, mas significativa tendência <strong>de</strong> diminuição157O livro <strong>de</strong> Kostoff contém extensa e minuciosa análise bibliométrica da ciência chinesa, comprofusão <strong>de</strong> dados e indicadores. A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> artigos, porém, não se reflete necessariamenteem termos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, ou <strong>de</strong> impacto. De fato, <strong>de</strong> cada <strong>de</strong>z artigos <strong>de</strong> autores norte-americanos,quatro são citados em revistas in<strong>de</strong>xadas. No caso da China, a relação é <strong>de</strong> menos <strong>de</strong> um para <strong>de</strong>z.158People’s Daily, 10/10/2008.158<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 158 10/10/2011 14:15:45


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”das matrículas <strong>de</strong> chineses nos EUA, por conta das expectativas quantoà crescente qualida<strong>de</strong> do ensino doméstico da China 159 . Gera-se, <strong>de</strong>ssaforma, um círculo virtuoso no <strong>sistema</strong> universitário <strong>nacional</strong>, em que amelhoria da qualida<strong>de</strong> impele mais e mais estudantes a optar por seguirseus estudos no país.Tais aspectos positivos do <strong>sistema</strong> educacional da China não nos<strong>de</strong>vem distrair, no entanto, dos severos problemas que assolam o <strong>sistema</strong>educacional e as ainda mais graves distorções e abusos <strong>de</strong> sua realida<strong>de</strong>universitária. O primeiro problema, repisado em todos os textos <strong>de</strong> análisedo SCI, é a proverbial <strong>de</strong>sconexão entre oferta e <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> ciência econhecimento e o aparato produtivo chinês. Outro problema, praticamenteausente dos textos acadêmicos sobre <strong>inovação</strong> – <strong>de</strong>sta feita adstrito aoscampos da educação primária e secundária – é o pronunciado <strong>de</strong>clíniodas matrículas, <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 22% <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1996, cifra que acompanha aestagnação e reversão do crescimento vegetativo 160 .A estrutura do <strong>sistema</strong> educacional chinês era consi<strong>de</strong>rada “irracional”,ao menos até o fim da década <strong>de</strong> 90 (Liu & White, p. 1105, 2001). O quesuscitara essa avaliação – e ainda suscita, em gran<strong>de</strong> medida – são osmétodos pedagógicos ultrapassados ou mesmo fossilizados, baseadosem avaliações formais, aprendizado passivo e inibidores da crítica, dacriativida<strong>de</strong> e do individualismo. Tal diagnóstico é corroborado pelaOCDE (p. 17, 2007) e por Serger e Breidne (2007), que apontam ser umdos maiores <strong>de</strong>safios do SCIequacionar o conflito entre inventivida<strong>de</strong> e <strong>inovação</strong> – fortemente <strong>de</strong>terminadapela criativida<strong>de</strong>, pensamento crítico e disposição para assumir riscos e aceitarfracassos – e um <strong>sistema</strong> político e educacional e uma cultura organizacionalque <strong>de</strong>sencoraja o dissenso e o individualismo (Serger e Breidne, p. 160, 2007).Problema final a ser ressaltado e que chegou a se tornar epi<strong>de</strong>miana China é a frau<strong>de</strong> acadêmica, por meio <strong>de</strong> práticas como o plágio, oautoplágio, informações falsas em curricula, suborno e “encomenda”<strong>de</strong> publicações a terceiros, assim como – <strong>de</strong> modo menos escuso, mas159People’s Daily, 11/11/2008.160Birô Nacional <strong>de</strong> Estatísticas, China Statistical Yearbook 2006, apud Serger & Breidne,p. 140, 2007. Os pesquisadores ressaltam, porém, que esse déficit <strong>de</strong>mográfico/educacionalvem sendo em parte compensado pela expansão do ensino básico e secundário no meio rural.159<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 159 10/10/2011 14:15:45


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorigualmente reprovável do ponto <strong>de</strong> vista ético – oferecer recompensasfinanceiras a cientistas que emplacam artigos em publicações mundiais<strong>de</strong> primeira linha. A própria revista Nature <strong>de</strong>nunciou algumas vezesessa prática na China em editoriais (p. 1, 2001). Outros autores, comoWilsdon & Keeley (p. 47, 2007) reclamam que questões éticas sequersão mencionadas no programa 2006-2020. O caso <strong>de</strong> frau<strong>de</strong> mais notóriodos tempos atuais na China recaiu sobre o então Decano da Escola <strong>de</strong>Microeletrônica da Universida<strong>de</strong> Jiaotong <strong>de</strong> Shangai, Jin Chen, quefalsificou em 2006 dados e resultados <strong>de</strong> pesquisa sobre um microshippretensamente revolucionário (Wilsdon & Keeley, p. 49, 2007).Pressão <strong>de</strong>senfreada para publicar e incentivos financeirosdisponibilizados aos cientistas que publicam em revistas <strong>de</strong> prestígiotêm levado muitos pesquisadores a tais práticas, ou mesmo ao suicídio.O governo e a própria comunida<strong>de</strong> científica têm reagido à crise, coma proposição pelo MOST <strong>de</strong> punições mais duras aos fraudadores(Chong, 2006) e a divulgação <strong>de</strong> uma carta aberta <strong>de</strong> repúdio à práticapela comunida<strong>de</strong> científica chinesa no exterior, encabeçada peloDoutor Xin-Yuan Fu, catedrático do Departamento <strong>de</strong> Imunobiologia eMicrobiologia do Walther Oncology Center <strong>de</strong> Indiana, EUA, dirigidaa autorida<strong>de</strong>s científicas chinesas do MOST e da ACC 161 .Apesar, portanto, <strong>de</strong> os indicadores <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produçãocientífica estarem bastante acima dos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> (tipicamente asrevistas científicas oci<strong>de</strong>ntais in<strong>de</strong>xadas rejeitam 50% dos artigossubmetidos por pesquisadores norte-americanos, contra 80% <strong>de</strong> artigoschineses rejeitados), a consciência dos problemas do setor educacionale <strong>de</strong> pesquisa por parte do governo – que tem elevado gradativamenteexigências <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> como um atributo fundamental <strong>de</strong> sua própriapolítica <strong>de</strong> avaliação e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – e a expansão vertiginosa, emtermos absolutos, da produção acadêmica <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong> (nas ciênciasbiomédicas, formais e da natureza), cre<strong>de</strong>nciam justamente a ciênciachinesa a um plano <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque no cenário mundial. Muitos <strong>de</strong> seusproblemas repetem-se, porém, sob outras roupagens, junto ao terceiroelo do SCI, o setor empresarial.161A carta, assinada por 120 cientistas chineses no exterior, concita, em um <strong>de</strong> seustrechos, que se ministrem cursos sobre ética, ética na ciência, integrida<strong>de</strong> do trabalho<strong>de</strong> pesquisa e processo administrativo-penal sobre má conduta científica. A íntegra dodocumento está disponível em .160<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 160 10/10/2011 14:15:45


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”4.5 – Empresas multinacionais vs. “<strong>inovação</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte”Aspecto que bem assinala a marcante competitivida<strong>de</strong> dasexportações chinesas, em sua larga maioria <strong>de</strong>rivada, como vimos, dosetor privado doméstico mas, sobretudo, das multinacionais (estas últimascontrolam 88% do total – OCDE, p. 15, 2007b), é a participação dosprodutos <strong>de</strong> alto componente tecnológico na balança comercial. Amboslados da corrente <strong>de</strong> comércio registram participação equivalente a 30%do total, ou US$ 281,4 bilhões <strong>de</strong> exportações e US$ 247,3 bilhões <strong>de</strong>importações anuais (MOST, p. 36, 2007). O gráfico 4.2 abaixo (OCDE,p. 19, 2007a) <strong>de</strong>monstra o admirável crescimento das exportações nessesetor entre 1991 e 2005:Gráfico 4.2 – Crescimento das exportações <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> altoconteúdo tecnológico, 1991-2005161<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 161 10/10/2011 14:15:46


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorDo total <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alta tecnologia exportados, os equipamentose componentes eletrônicos para indústrias <strong>de</strong> telecomunicações einformação (TIC) somaram, em 2006, US$ 250 bilhões, fazendo daChina o maior exportador do setor do mundo (MOST, p. 38, 2007). Ográfico 4.3 abaixo (extraído <strong>de</strong> OCDE, p. 20 2007a) ilustra a explosãoda competitivida<strong>de</strong> chinesa no setor:Gráfico 4.3 – Volume <strong>de</strong> exportações <strong>de</strong> produtos do setor <strong>de</strong>TIC, quadro comparativo <strong>de</strong> países e regiões, 1996-2005Os gastos do setor privado em P&D crescem 20% ao ano, em ritmobastante superior ao das estatais chinesas. A participação do setor privadonos gastos <strong>de</strong> P&D, da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> 71,1% do total, supera a <strong>de</strong> todos ospaíses da OCDE, com exceção <strong>de</strong> Japão e Coreia (MOST, p. 43, 2007),ainda que a composição <strong>de</strong>sse esforço privado <strong>de</strong> pesquisa compreendafundamentalmente <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>s experimentais (mais <strong>de</strong> 70%), em<strong>de</strong>trimento das pesquisas básica e aplicada predominantes nos paísesindustrializados (OCDE, p. 24, 2007a).162<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 162 10/10/2011 14:15:46


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”Atente-se para o fato <strong>de</strong> que a participação do setor privado na P&Dpartiu <strong>de</strong> uma base <strong>de</strong> 30% em 1994, avançando em termos relativose absolutos em relação aos setores estatal e misto da economia. Damesma forma, o valor das exportações <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alto componentetecnológico partiu <strong>de</strong> uma base inexpressiva em 1990, <strong>de</strong>apenas US$ 2,9 bilhões, para os US$ 281,4 bilhões atuais. Do ladoespecificamente empresarial, 20 companhias chinesas constavam da listadas 500 maiores empresas do mundo em 2005 (contra seis do Brasil –OCDE, p. 31, 2007a). Delineia-se uma tendência <strong>de</strong> presença crescentedas gran<strong>de</strong>s empresas chinesas nos maiores mercados mundiais, gerandoaquisições e incorporações incomuns para países em <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>,como foram os casos da compra da divisão <strong>de</strong> computadores pessoais daIBM pela Lenovo, em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2004, ou a compra do grupo britânicoMG Rover pela Nanjing automotora, em 2005 (OCDE, p. 13, 2007b).A base <strong>de</strong> empreendimentos empresariais inovadores do SCIcompreen<strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 6.000 empresas médias e gran<strong>de</strong>s com laboratóriospróprios <strong>de</strong> P&D; 25.000 pequenas empresas que <strong>de</strong>senvolvem ativida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> C&T (<strong>de</strong> um total <strong>de</strong> 240.000 no país) 162 ; 3.500 empresas instaladasem parques científicos e tecnológicos; e mais <strong>de</strong> 30.000 empresas geradasem incubadoras, além da infraestrutura estatal <strong>de</strong> laboratórios e centros <strong>de</strong>pesquisa, funcional e legalmente disponíveis para utilização pelas empresasprivadas (OCDE, p. 30, 2007a 163 ). Como visto anteriormente, o PIB geradono parque <strong>de</strong> Zhongguancun supera o <strong>de</strong> países como Vietnã e Bangla<strong>de</strong>sh.Tais resultados gerados a partir <strong>de</strong> uma economia do conhecimento, escalae elevado valor agregado permitem antecipar que, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente damagnitu<strong>de</strong> dos problemas enfrentados pela economia industrial chinesa edas consequências da crise financeira inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong>flagrada em 2008,o SCI estaria muito próximo <strong>de</strong> exibir comportamento propriamentesistêmico, com seus três vértices começando a convergir para um patamar<strong>de</strong> complementarida<strong>de</strong>, sinergia e coor<strong>de</strong>nação, ainda que distante da“marca teórica” <strong>de</strong> 2,0% do PIB a serem investidos em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> P&D(a China está ainda na casa dos 1,4%) 164 (Park & Park, 2003).162Informação <strong>de</strong> Liu Xielin ao autor, ver nota 155 supra.163Torna-se difícil evitar uma comparação direta <strong>de</strong>sses números com a análise <strong>de</strong> Dagnino(p. A-3, 2008), <strong>de</strong>rivada dos dados divulgados pela Pesquisa PINTEC <strong>de</strong> 2005, <strong>de</strong> que, se correta,apenas 300 empresas brasileiras realmente inovaram com produtos novos no mercado.164O Birô <strong>de</strong> Estatísticas do Estado divulgou, em 10/01/09, que o nível <strong>de</strong> dispêndio em P&Dem 2007 alcançou a marca dos RMB 371 bilhões, ou US$ 54,3 bilhões, o que correspon<strong>de</strong> a um163<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 163 10/10/2011 14:15:46


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorSão extraordinárias, no entanto, as tarefas e etapas por superarpara que a China alcance um status <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> (entendido apartir do seu componente elementar <strong>de</strong> produzir maior equida<strong>de</strong> sociale generalização <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ascensão social) semelhante, porexemplo, ao japonês. Para ficarmos estritamente no ambiente empresarial,subsistem problemas <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> experiência e <strong>de</strong> especialistas treinadose qualificados em uma série <strong>de</strong> setores (sobretudo em biotecnologia,automotivo e aeroespacial); incertezas institucionais no tocante aocumprimento <strong>de</strong> contratos e proteção da proprieda<strong>de</strong> intelectual; amplasdificulda<strong>de</strong>s para que empresas <strong>de</strong> capital majoritariamente chinês seconsoli<strong>de</strong>m no mercado, diante da competição com as estrangeiras;aversão pronunciada ao risco; e baixa capacida<strong>de</strong> das empresas nacionais<strong>de</strong> absorverem tecnologia. O governo chinês tem granjeado importantereconhecimento inter<strong>nacional</strong> por haver promovido a expansão daP&D <strong>de</strong> parte <strong>de</strong> corporações multinacionais no país, favorecendosobremaneira a importação e, em muitos casos, a internalização <strong>de</strong>tecnologia e conhecimento <strong>de</strong>ssas empresas (OCDE, p. 34, 2007). Poroutro lado, tais investimentos acabaram por criar um monopólio dospadrões tecnológicos do país, herdados <strong>de</strong>ssas corporações, dificultandoou impedindo os transbordamentos para outros setores da produção eda economia. É para buscar superar os entraves acima indicados, entreoutros, que o governo lançou em 2006 seu mais ambicioso plano (foiadotado o termo “Programa”, para evitar as conotações i<strong>de</strong>ológicas<strong>de</strong> eras anteriores) <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico e <strong>inovação</strong> “comcaracterísticas chinesas” e centrado numa “<strong>inovação</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte”,zizhu chuangxin.4.6 – O programa 2006-2020 <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>O programa 2006-2020 está centrado em três pilares essenciais: elevaros gastos da China em P&D do atual patamar <strong>de</strong> 1,49% para 2,0% emaumento <strong>de</strong> 23,5% em relação a 2006, situando os níveis <strong>de</strong>sses gastos em 1,49% do PIB, novamarca histórica no país. Desse total, o setor privado arcou com RMB 268,2 bilhões, ou 72,3%,números que corroboram a hipótese, ceteris paribus, <strong>de</strong> que o SCI aproxima-se <strong>de</strong> cumprir as metasdo Programa 2006-2020 e exibe notáveis níveis <strong>de</strong> resposta aos estímulos governamentais e <strong>de</strong>mercado para interação entre os principais atores do <strong>sistema</strong>. Ver MOST (2009) “211.4 Billion S&TExpenditure in 2007” in Science and Technology Newsletter, nº 534, 10/01. O título da matériarefere-se ao volume <strong>de</strong> recursos <strong>de</strong>sembolsados somente pelo governo central em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> C&T.164<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 164 10/10/2011 14:15:46


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”2010 e 2,5% em 2020, cifra que correspon<strong>de</strong>ria, em valores brutos, a seisvezes o montante atual investido, em termos reais; reduzir a <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong>tecnologias importadas e a participação das exportações <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> altatecnologia a partir <strong>de</strong> empresas estrangeiras, em favor das nacionais. Emtermos concretos, o objetivo seria reduzir a participação das multinacionaise empresas estrangeiras no estoque geral <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do país (em termosrelativos, entenda-se), <strong>de</strong> 68% para 30% em 2020 (tal seria o verda<strong>de</strong>iroespírito da zizhu chuangxin, conforme se visualiza no gráfico 4.4 abaixo);e fazer das empresas privadas a força motriz da <strong>inovação</strong> no país. Talvezo aspecto político mais saliente do programa é o fato <strong>de</strong> não consistirem iniciativa do MOST ou <strong>de</strong> supervisão prioritária do Ministério, masuma política <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> geral do conjunto dos Ministérios eórgãos do Estado. Em termos comparativos, seria como se o PACTI fosseconsi<strong>de</strong>rado uma política <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> todo o Estado brasileiro,e não somente do MCT 165 .Gráfico 4.4 – exportações <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alta tecnologia, portipo <strong>de</strong> empresa(OCDE, p. 20, 2007a)165Diversos textos e pronunciamentos oficiais alusivos ao lançamento do programa, em9/1/2006, durante a realização da IV Conferência Nacional <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia, em Pequim,constam do portal oficial do governo chinês na internet, matéria “Innovation: ‘motive power’for <strong>de</strong>velopment”, Gov.cn – Chinese government’s official web portal, . Novas análises foram publicadas em 09/02/06 nomesmo portal, disponíveis em .165<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 165 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorNa conferência <strong>de</strong> lançamento do programa, o Premier Wen Jiabaoenumerou as áreas-chave que espera po<strong>de</strong>rão competir em pé <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong>com os SNI mais avançados do mundo: biotecnologia, tecnologiasespacial e aeronáutica, oceanografia, tecnologias da informação e daprodução, recursos aquáticos e proteção ambiental e fortalecimento daspesquisas básica e “estratégica”. A pompa e a solenida<strong>de</strong> do lançamentodo programa sugerem que se pretendia recuperar o clima do lançamentodo Plano <strong>de</strong> Desenvolvimento Científico-Tecnológico 1956-1967,coincidindo com seu cinquentenário, iniciativa pioneira que resultouna dominação do ciclo do urânio e no lançamento do primeiro satéliteespacial pela China. Novida<strong>de</strong>s do programa não contempladas eminiciativas anteriores incluem o estabelecimento <strong>de</strong> incentivos fiscaispara pequenas e médias empresas, <strong>de</strong> incentivos para que empresaschinesas instalem centros <strong>de</strong> P&D no exterior 166 e, principalmente, o fato<strong>de</strong> o programa instilar um sentido <strong>de</strong> “urgência e ambição” e afastar-se<strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico (área em que aChina exce<strong>de</strong> seguindo padrões internacionais) em prol <strong>de</strong> ações maisespecíficas no campo da <strong>inovação</strong> (Serger & Breidne, pp. 149 e 156,2007). Os mesmos autores sintetizaram com acuida<strong>de</strong>, citando matéria<strong>de</strong> jornal, a motivação básica para que o Estado passe a concentrar suaspolíticas tecnológicas, <strong>de</strong> comércio exterior, industrial e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, <strong>de</strong>maneira integrada, no programa 2006-2020:(...) <strong>de</strong>vido à indisponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tecnologias fundamentais, as empresasdomésticas não têm escolha senão pagar aos <strong>de</strong>tentores estrangeiros <strong>de</strong> patentes20% do valor <strong>de</strong> cada celular fabricado na China, 30% do preço <strong>de</strong> cada166Tal aspecto do programa po<strong>de</strong>ria suscitar maior estreitamento das relações comerciais ecientíficas entre Brasil e China, mediante a instalação <strong>de</strong> empresas chinesas com tecnologias<strong>de</strong> interesse direto para o Brasil, tais como produtos farmacêuticos, equipamentos <strong>de</strong>telecomunicações TIC e tecnologia <strong>de</strong> oceanos, aproveitando inclusive as possibilida<strong>de</strong>s,ampliadas para além do contexto sul-americano, do Programa <strong>de</strong> Substituição Competitiva<strong>de</strong> Importações. Além dos incentivos previstos no programa 2006-2020, o Governo da Chinaanunciou estar aberto a trabalhar com países interessados em cooperar no âmbito <strong>de</strong> seu programaespacial. O diretor da agência espacial do país, Sun Laiyan, durante o 59º Congresso AstronáuticoInter<strong>nacional</strong>, realizado em Glasgow, em 30/09/2008, mencionou o programa <strong>de</strong> cooperaçãocom o Brasil como exemplo <strong>de</strong> iniciativa bem-sucedida nesse campo. Ver “China calls on spaceco-op”, in China S&T Newsletter, nº 525, 10/10/2008, disponível em .166<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 166 10/10/2011 14:15:47


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”computador e entre 20% e 40% do preço <strong>de</strong> cada máquina <strong>de</strong> controle numéricocomputadorizado (Chinanews, 2006, apud Serger & Breidne, p. 147, 2007) 167 .São evi<strong>de</strong>ntes as vantagens <strong>de</strong> se reduzir a <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> tecnologiaestrangeira, sendo a principal <strong>de</strong>las obter maior controle sobre a políticaindustrial, modulando-a para as necessida<strong>de</strong>s do mercado interno e paramitigar os choques ou ciclos econômicos internacionais. Outro fatoressencial é que a capacitação tecnológica autóctone aumenta o po<strong>de</strong>r<strong>de</strong> barganha do Estado e das empresas para obter outras tecnologiasessenciais ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, permitindo à economia <strong>de</strong>senvolvernovos setores, diversificar produtos, áreas produtivas e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>,reduzir vulnerabilida<strong>de</strong>s e estabelecer padrões tecnológicos <strong>de</strong>competitivida<strong>de</strong> 168 .Conforme assinalado acima, o programa 2006-2020 <strong>de</strong>finiu 99ações políticas para assegurar sua implementação, com cronogramas eindicadores bem <strong>de</strong>finidos. Também conforme salientado, a ComissãoNacional <strong>de</strong> Reforma e Desenvolvimento, agência <strong>de</strong> gerenciamento ecoor<strong>de</strong>nação macroeconômica do Conselho <strong>de</strong> Estado, açambarcou amaior parte das responsabilida<strong>de</strong>s atinentes à execução do programae respectivas ações políticas. Entre essas responsabilida<strong>de</strong>s figuram acrucial tarefa nº 1, <strong>de</strong> “promover políticas para a industrialização <strong>de</strong>inovações in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente produzidas” e a 29, “<strong>de</strong>senvolver linhas<strong>de</strong> ação para a construção <strong>de</strong> laboratórios nacionais <strong>de</strong> engenharia”,atribuição que, em outros tempos, claramente recairia sob a alçada doMOST. Este ficou responsável, no entanto, pela articulação do SCI no quetange à disseminação <strong>de</strong> conhecimento e resultados da pesquisa científica(tarefa 59). O Ministério das Finanças ficou encarregado <strong>de</strong> programas<strong>de</strong> financiamento à <strong>inovação</strong> (62 e 72) e tarefas <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> novosindicadores e avaliação <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho da <strong>inovação</strong> tecnológica foramatribuídas à Comissão <strong>de</strong> Supervisão e Administração do Patrimônio doEstado (tarefa 98). O “Ministério do Pessoal” ficou com a tarefa crucial<strong>de</strong> <strong>de</strong>senhar novas políticas para o repatriamento da diáspora chinesa<strong>de</strong> C&T.167A matéria <strong>de</strong> referência é “China’s Depen<strong>de</strong>nce on Foreign Technology Exceeds 50%”,Chinanews, 26/05/2006, disponível em .168Outro fator que ilustra a <strong>de</strong>pendência chinesa <strong>de</strong> tecnologia estrangeira é o fato <strong>de</strong> ser o terceiropaís do mundo que mais paga direitos <strong>de</strong> royalties, em volume equivalente a 5% das exportações<strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alta intensida<strong>de</strong> tecnológica (Bensidoun, Lemoine & Unal-Kesenci, p. 07, 2008).167<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 167 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorChama a atenção no programa 2006-2020 a ausência doMinistério da Defesa na implementação <strong>de</strong> ações políticas ouno <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> áreas estratégicas, muito embora Serger& Breidne estimem (p. 149, 2007) que a menção no programa atecnologias espaciais e <strong>de</strong> laser indiquem uma intenção inequívoca<strong>de</strong> utilizá-las para propósitos militares, avaliação que soa um tantoalarmista, ao menos em curto e médio prazos. Por outro lado, oprograma prevê a coor<strong>de</strong>nação e articulação entre instituições <strong>de</strong>pesquisa militares (Comissão <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia e Indústriapara a Defesa Nacional – COSTIND) e civis, objetivo que jáconstava <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológicoanteriores.Força-Tarefa sobre po<strong>de</strong>r militar chinês convocada pelo Councilon Foreign Relations, <strong>de</strong> Nova York, <strong>de</strong>sestima completamente apossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a China <strong>de</strong>senvolver alguma tecnologia militarimportante que possa afetar o equilíbrio estratégico da Ásia, emcurto e médio prazos. Nesse sentido, indicar objetivos militaresno programa 2006-2020 seria contraproducente e <strong>de</strong>snecessário,diante <strong>de</strong> outras priorida<strong>de</strong>s e urgências no plano econômico,das novas realida<strong>de</strong>s políticas internacionais – on<strong>de</strong> não maissubsistem políticas confrontacionistas, ainda mais com a <strong>de</strong>rrotados Republicanos nas eleições presi<strong>de</strong>nciais norte-americanas <strong>de</strong>2008 –, e da incapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fato <strong>de</strong> a China gerar uma expansãotecnológico-militar notável nos próximos anos ou décadas. Orelatório final da Força-Tarefa sustenta esse entendimento, entreoutros argumentos, ao <strong>de</strong>stacar que a China(...) avança menos rapidamente no <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> tecnologias militares quena aplicação <strong>de</strong> certas tecnologias comerciais, uma vez que o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>e absorção tecnológica militar, diferentemente da economia civil, segue sendoum domínio restrito do Exército <strong>de</strong> Libertação Popular (ELP), da burocracia doestablishment militar e das estatais, cuja produtivida<strong>de</strong> se situa em níveis aindamais inferiores que a das empresas congêneres privadas e civis (Brown, Prueher& Segal, p. 61, 2003).A Força-Tarefa adverte, finalmente, contra alarmismos injustificadose superestimações da capacida<strong>de</strong> militar chinesa:168<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 168 10/10/2011 14:15:47


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”(...) [não se <strong>de</strong>ve superestimar] o alcance dos esforços <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização e aquisição(sob qualquer forma) <strong>de</strong> qualquer tecnologia isolada. A questão mais crítica éa capacida<strong>de</strong> chinesa <strong>de</strong> administrar <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>sistema</strong>s [bastante reduzida,segundo o relatório], não a aquisição <strong>de</strong> componentes individuais (Brown, Prueher& Segal, p. 62, 2003).Antes <strong>de</strong> concluir o capítulo, vale sintetizar, em linhas breves – aexemplo do que foi feito no capítulo prece<strong>de</strong>nte, sobre o Brasil –, ostrunfos e fraquezas do SCI, assim como discorrer sobre o papel dacooperação inter<strong>nacional</strong> e, mais importante, da contribuição singulardo “SCI plus”, ou as ramificações do <strong>sistema</strong> ampliado no exterior, paraa capacitação científico-tecnológica e para o programa <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>exitosamente empreendido pela China nas três últimas décadas.4.7 – Meio cheia, meio vazia – trunfos e fraquezas do SCITorna-se difícil escapar do lugar-comum dos arquétipos yin eyang para expressar as dualida<strong>de</strong>s e contradições que perpassam aimpressionante história do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico recente daChina (ainda que corresponda a uma metáfora parcial e imperfeita<strong>de</strong>sse complexo <strong>sistema</strong> filosófico). No caso do SCI, é muito comumcelebrar-se um êxito qualquer do <strong>sistema</strong> – como a li<strong>de</strong>rança mundial daspublicações científicas, em diversas áreas – para logo nos <strong>de</strong>pararmos comestatísticas vinculadas que ressaltam a <strong>de</strong>svantagem subjacente (no caso,os ainda reduzidos impacto e <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> epistemológica relativa <strong>de</strong>ssaspublicações). Da mesma forma, o fenômeno dos níveis surpreen<strong>de</strong>ntes<strong>de</strong> exportações <strong>de</strong> alto conteúdo tecnológico vê-se obumbrado pelo fato<strong>de</strong> serem compostas essencialmente <strong>de</strong> produtos manufaturados comtecnologia predominantemente estrangeira. O próprio conceito genérico<strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> na China apresenta-se acompanhado <strong>de</strong> gravesproblemas ambientais, cuja atenuação passou a ser uma precondiçãonecessária para a vali<strong>de</strong>z lógica e operacional do conceito. O crescimentoeconômico recor<strong>de</strong> parece não ter sido ofuscado nem pelas façanhasesportivas do país nem pela crise financeira inter<strong>nacional</strong> 169 . Já o yang169O Birô Nacional <strong>de</strong> Estatísticas da China reviu recentemente os níveis <strong>de</strong> crescimento do PIBrelativos a 2007, corrigidos para 13,0, em vez dos 11,4% anteriormente divulgados. A China,assim, ultrapassou a Alemanha e posiciona-se como a terceira maior economia do mundo,seguindo <strong>de</strong> perto o Japão, <strong>de</strong>vendo ainda em 2010 ou 2011 alcançar esse segundo lugar.169<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 169 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorcorrespon<strong>de</strong>nte do crescimento seria a <strong>de</strong>terioração ano a ano do índice <strong>de</strong>Gini do país. O programa 2006-2020 preten<strong>de</strong>ria, <strong>de</strong>ssa forma, simbolizaro Tao supremo que po<strong>de</strong>rá trazer o equilíbrio e a prosperida<strong>de</strong>, atenuandoou finalmente superando essas contradições.Po<strong>de</strong>-se, <strong>de</strong>sse modo, realizar uma apresentação sintética e esquemáticados principais trunfos e fraquezas do SCI, elementos que assumem umatripla importância neste trabalho: compreen<strong>de</strong>r melhor, por si mesmas,as vicissitu<strong>de</strong>s do SCI no presente; recuperar experiências que possamser <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> para a construção do próprio SNB (dadas ainda as muitassemelhanças entre as realida<strong>de</strong>s econômico-sociais entre Brasil e China);e <strong>de</strong>scortinar oportunida<strong>de</strong>s para o aprofundamento da cooperação e dasparcerias econômicas, tecnológicas e empresariais em C,T&I entre Brasile China, assim como experiências específicas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Inicialmente,os pontos mais fortes e proeminentes do SCI seriam:- A China tem uma visão sumamente clara do papel da C,T&I no<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>nacional</strong>, assim como das inter-relações sutisentre globalização econômica e <strong>inovação</strong> que moldaram o <strong>sistema</strong>econômico inter<strong>nacional</strong>, nos termos propostos por Drucker (1986).O país mobiliza com <strong>de</strong>terminação e tenacida<strong>de</strong> seus recursos comum claro objetivo <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> superar atrasos e <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s,com uma autoconfiança do papel que tem a cumprir para o avançotécnico-científico-econômico <strong>nacional</strong> e global. Tal disposição eambições estão claramente enunciadas no programa 2006-2020,que a quase totalida<strong>de</strong> dos analistas reconhece estar imbuído <strong>de</strong>meios e fins concretos para a consecução <strong>de</strong> seus objetivos;- o crescimento da produção científica chinesa em menos <strong>de</strong> 30 anos,<strong>de</strong> uma das mais atrasadas entre as potências mundiais para umadas mais profícuas (<strong>de</strong> 0,2% do total mundial em 1980 para 7,4%em 2006) 170 – consi<strong>de</strong>rando ainda a pouca difusão do mandarim nacomunida<strong>de</strong> científica mundial – atesta a disposição com que governo,socieda<strong>de</strong>, universida<strong>de</strong>s e empresas lançaram-se no <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> fazerda China uma potência mundial “pelas razões certas”, por meio docomércio, do conhecimento e da prosperida<strong>de</strong> 171 . Em 2007, foram170“The Great Conten<strong>de</strong>r”, Nature, v. 454, 24/07/08, p. 383.171A China assumiria assim o papel da “nação mercantil” por excelência, nos termos <strong>de</strong>finidospor Rosecrance (1986).170<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 170 10/10/2011 14:15:47


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”registrados no Science Citation In<strong>de</strong>x 94.800 artigos <strong>de</strong> autoreschineses, resultado 33,5% superior a 2006, elevando a China ao3º lugar na classificação mundial da produção científica, atrásdos EUA e do Reino Unido. O Engineering In<strong>de</strong>x registrou, porsua vez, 78.200 artigos em 2007, situando a China em primeirolugar, ultrapassando os Estados Unidos. Finalmente, o In<strong>de</strong>xto Scientific & Technical Proceedings (ISTP) recebeu 45.331artigos <strong>de</strong> autores chineses, consolidando o 2º lugar do país (atrásdos EUA) nesse prestigioso órgão científico inter<strong>nacional</strong> 172 .Tal massa <strong>de</strong> conhecimento científico tem por base um <strong>sistema</strong>universitário que ultrapassa os seis milhões <strong>de</strong> estudantes e <strong>de</strong>pesquisa com mais <strong>de</strong> meio milhão <strong>de</strong> pós-graduados, somentena área <strong>de</strong> ciências formais, biomédicas e da natureza. A Chinatornou-se o exemplo conspícuo <strong>de</strong> que tecnologia <strong>de</strong> ponta eciência <strong>de</strong> nível mundial não são mais prerrogativas dos paísesindustrializados;- um dos mais importantes trunfos do SCI é a percepção disseminadana economia e na opinião pública mundiais <strong>de</strong> que é questão <strong>de</strong>tempo para que a ciência chinesa se afirme como ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>classe mundial. Tal percepção tem o condão <strong>de</strong> gerar um círculovirtuoso em que(...) mais multinacionais virão investir em P&D, mais cientistas emigradosregressarão ao país e os estudantes mais brilhantes <strong>de</strong>dicar-se-ão a carreirascientíficas. Embora haja problemas em diversas partes do <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>,previsões disseminadas <strong>de</strong> que a China logo se converterá em superpotênciacientífica po<strong>de</strong>rão tornar-se profecias auto-cumpridas (Wilsdon & Keeley,p. 62, 2007).- o fato (mais funcional e pragmático do que ético e político) <strong>de</strong> queo país vive sob <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> partido único assegura a continuida<strong>de</strong>dos diversos planos e programas, facilitando a concatenação <strong>de</strong>uma política <strong>de</strong> Estado e na verda<strong>de</strong> fazendo com que não hajadistinções significativas entre políticas <strong>de</strong> Partido, <strong>de</strong> Estado172MOST, Science and Technology Newsletter nº 531 (Edição especial), 10/10/2008, disponívelem .171<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 171 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniore <strong>de</strong> governo 173 . Desse modo, as autorida<strong>de</strong>s chinesas sabemexatamente o que querem dizer quando se referem a metas aserem alcançadas em 2020;- outro fator dos mais positivos que aponta para o fortalecimentoe consolidação do SCI nos próximos anos é a mobilização doGoverno para que C,T&I sejam temas disseminados por todaa socieda<strong>de</strong>, na forma <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s educacionais e campanhaspublicitárias. Se já nos tempos <strong>de</strong> Hua Kuo-Feng havia umacerta percepção <strong>de</strong> que na China “se falava a língua da ciênciae da tecnologia” (Souza Filho, p. 223, 1980), nos tempos atuaiso tema tornou-se um mantra sinônimo <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>,crescimento e prosperida<strong>de</strong>. As inúmeras e constantes iniciativas<strong>de</strong> popularização da ciência, a instituição <strong>de</strong> um dia <strong>nacional</strong>da ciência (4 <strong>de</strong> julho) e feitos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> impacto simbólico nasocieda<strong>de</strong>, como o mapeamento completo da superfície lunar 174 ea preparação <strong>de</strong> sondas <strong>de</strong> terreno para a Lua e Marte, no futuropróximo, são exemplos <strong>de</strong> como uma percepção da China comopotência científica logo se enraizará até mesmo nos rincõesmais remotos do país. A inauguração do Museu da Ciência <strong>de</strong>Guangdong confirma a priorida<strong>de</strong> conferida à divulgação e àpopularização científicas na China;- como o Brasil, a China acumula casos <strong>de</strong> empreendimentosempresariais bem-sucedidos <strong>de</strong> projeção e <strong>de</strong>staque internacionais(Lenovo, Haier, Huawei, a gigante energética CNOOC),histórias construídas a partir <strong>de</strong> métodos <strong>de</strong> aprendizadointerativo, absorção <strong>de</strong> tecnologia, parcerias público-privadas,aprendizado em gerenciamento executivo e atração <strong>de</strong> talentos.Gastos em P&D têm dobrado em intervalos ininterruptos <strong>de</strong> trêsanos, com participação crescente do setor privado, por meio173Tal circunstância é jurídica e institucionalmente corroborada pelo fato <strong>de</strong> a China não teruma, mas sim duas Constituições: a do Estado e a do PCC. “Emendas à Constituição do Estadoten<strong>de</strong>m a seguir alterações na Constituição do Partido. Esta foi emendada em novembro <strong>de</strong>2002 para estabelecer que ‘o PCC é a vanguarda da classe operária chinesa, do povo e da naçãochinesas’” (EIU, p. 08, 2008).174O MOST anunciou com indisfarçável ufanismo que se trata do primeiro mapeamentoefetivamente completo do satélite: “A sonda orbital Chang’e I obteve pela primeira vez dados <strong>de</strong>terreno em alta resolução <strong>de</strong> ambos polos lunares, havendo produzido o primeiro mapa completodo terreno lunar na história da humanida<strong>de</strong>. (...) O mapa do terreno lunar produzido pelos EstadosUnidos não tem os polos norte e sul” (China S&T Newsletter, nº 531, 10/12/2008).172<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 172 10/10/2011 14:15:47


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”<strong>de</strong> uma política <strong>de</strong> incentivos que não hesitou inclusive emtransferir infraestruturas inteiras <strong>de</strong> pesquisa – caso <strong>de</strong> muitosinstitutos – para as empresas, algo que somente agora passa a serparcialmente disponibilizado no Brasil por mecanismos como aLei <strong>de</strong> Inovação. De outra parte, a China logrou estabelecer umnotável equilíbrio entre os setores público e privado na promoçãoda <strong>inovação</strong>, em que, <strong>de</strong> um lado, o Estado abriu mão <strong>de</strong> suafaculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> intervir no domínio microeconômico, ace<strong>de</strong>u atodas as regras internacionais para proteção <strong>de</strong> investimentos– inclusive o regime <strong>de</strong> proteção à proprieda<strong>de</strong> intelectual –, ecercou esses investimentos <strong>de</strong> garantias, na proporção direta <strong>de</strong>sua associação a projetos <strong>de</strong> P&D. O processo <strong>de</strong> industrializaçãoda China foi claramente influenciado por um “padrão asiático” queatribui ao Estado papel proeminente na formulação <strong>de</strong> políticasindustriais (Japão, Coreia, Taiwan e Cingapura) e mobilizaçãodos organismos e agências estatais para a implementação <strong>de</strong>ssaspolíticas industriais. Ainda que a avaliação <strong>de</strong> Kynge (p. 12, 2006)<strong>de</strong> que muitas das condições que permitiram o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>do capitalismo na China fossem “não planejadas, não pretendidasou completamente aci<strong>de</strong>ntais”, torna-se difícil conceber que oplanejamento não tenha tido também um papel central ao elevaro PIB chinês, num espaço <strong>de</strong> 25 anos, <strong>de</strong> apenas 1/3 da França,para hoje 50% superior ao daquele país.São muito pronunciados, no entanto, os problemas que impe<strong>de</strong>m quese reconheça na China um padrão <strong>de</strong> industrialização e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>(entendido como uma combinação <strong>de</strong> crescimento sustentado, sustentávele equida<strong>de</strong> social) compatível com sua nova condição <strong>de</strong> terceira (eproximamente a segunda) maior economia do mundo:- em primeiro lugar, há <strong>de</strong> se enfatizar as profundas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>se disparida<strong>de</strong>s sociais no país. Enquanto as regiões quefloresceram a partir das antigas Zonas Econômicas Especiaisapresentam níveis <strong>de</strong> renda e <strong>de</strong> consumo comparáveis aos dasregiões economicamente mais pujantes da Europa e dos EstadosUnidos, partes da região oci<strong>de</strong>ntal da China exibem indicadorescomparáveis aos da África Subsaariana. Cerca <strong>de</strong> 600 milhões173<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 173 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>de</strong> pessoas sobrevivem com cerca <strong>de</strong> U$ 1 por dia (Serger &Breidne, p. 156, 2007) e o Índice <strong>de</strong> Gini do país tem piorado anoapós ano, <strong>de</strong> 0,30 em 1982 para 0,45 em 2002 e 0,47 em 2005(UNDP, 2005, “China by numbers”) 175 . Como subproduto <strong>de</strong>ssas<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, prevalecem em muitos setores e regiões, sobretudono complexo mineral da extração <strong>de</strong> carvão, condições <strong>de</strong> trabalho“manchesterianas”. Numa outra dimensão, as três regiões maisinovadoras da China, os <strong>de</strong>ltas dos rios Yang-tsé e Pérola e a baía<strong>de</strong> Bo Hai concentram 70% <strong>de</strong> todo o investimento e o comérciointer<strong>nacional</strong> do país (Wilsdon & Keeley, p. 36, 2007);- o aumento das <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> sua percepção pelos excluídosdo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> na China tem suscitado <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> milhares<strong>de</strong> protestos a cada ano, em diversas Províncias do interior. Oinchaço das gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s tem ao mesmo tempo mitigado acrise social do campo e a exportado para as gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s.Exemplo dramático <strong>de</strong>sse fenômeno é a hipertrofia da conurbação<strong>de</strong> Chongqing, cuja população em poucos anos superou a do Peruou do Iraque (Watts, 2006);- a principal fraqueza estrutural do SCI é sua baixa taxa <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>endógena (<strong>nacional</strong>), fato reconhecido pelo governo, que passoua agir com certa rapi<strong>de</strong>z, ao propor as reformas e incentivoscontemplados no Programa 2006-2020. Com a porcentagem <strong>de</strong>88% das exportações <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alto componente tecnológicoprovêm <strong>de</strong> empresas estrangeiras. A produção industrial nessacategoria também se concentra nas estrangeiras, ao passo quesetores tradicionais <strong>de</strong> baixo valor agregado, tais como plásticos,têxteis e vestuário são predominantemente nacionais chineses. Emtermos <strong>de</strong> valor, além disso, produtos chineses <strong>de</strong> alta tecnologianormalmente obtêm preços inferiores por unida<strong>de</strong> em relação aossimilares proce<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> países industrializados;- como <strong>de</strong>corrência das <strong>de</strong>ficiências anteriores, o SCI é consi<strong>de</strong>radofragmentado e pontilhado <strong>de</strong> experiências isoladas – por maiseficientes que sejam –, conformando um “arquipélago <strong>de</strong> ilhas175A situação da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> na China configuraria um instigante estudo <strong>de</strong> caso para testar o“Princípio da Diferença” <strong>de</strong> John Rawls (cap. 13, 1971), segundo o qual um país com altos níveis<strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> po<strong>de</strong> em tese ser socialmente mais justo que um país mais igualitário, porémeconomicamente estagnado, questão que mereceria pesquisas posteriores à parte.174<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 174 10/10/2011 14:15:47


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> conexões insuficientes”. Além disso, os padrõesutilizados para a P,D&I, concentrados em poucos parques ouempresas <strong>de</strong> alto coeficiente tecnológico, “(...) geram gran<strong>de</strong>separação física entre produtores <strong>de</strong> conhecimento e usuáriospotenciais” 176 , com a P&D realizada pelas multinacionaisproduzindo escassos transbordamentos sobre o conjuntodo <strong>sistema</strong>. As empresas estatais e privadas <strong>de</strong> capitalmajoritariamente chinês inovam pouco e quase não geram patentescomercializáveis, especialmente no que tange a produtos novos;- o problema da qualida<strong>de</strong>: enquanto o volume das publicaçõesin<strong>de</strong>xadas chinesas aproxima-se e mesmo supera o padrãodas principais potências científicas mundiais, o impacto <strong>de</strong>ssaprodução é ainda muito mo<strong>de</strong>sto, em níveis <strong>de</strong> apenas uma citaçãopara cada <strong>de</strong>z artigos publicados. A China possui um escol <strong>de</strong>universida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong> pesquisa, entre os quais <strong>de</strong>spontaa ACC, que passou a integrar o grupo <strong>de</strong> elite das instituiçõesmundiais <strong>de</strong> pesquisa. Das 1.772 universida<strong>de</strong>s chinesas,entretanto, mais <strong>de</strong> 90% teriam <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> pesquisa abaixoda crítica ou simplesmente não <strong>de</strong>senvolvem nenhuma ativida<strong>de</strong><strong>de</strong> pesquisa. No nível básico, o ensino é centrado em rotinasque <strong>de</strong>sestimulam a criativida<strong>de</strong>, baseiam-se na reprodução <strong>de</strong>fórmulas e inibem o pensamento crítico e as visões transgressorase alternativas, base <strong>de</strong> toda <strong>inovação</strong>;- o contraste entre a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ponta da ciência chinesa e amediocrida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> suas instituições <strong>de</strong> ensinoconvive com o grave problema correlato da frau<strong>de</strong> e do plágiocomo fenômeno relativamente recorrente no meio acadêmicochinês. Há profusão <strong>de</strong> casos <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> transparência, favoritismo,nepotismo, suborno e troca <strong>de</strong> favores para influenciar adistribuição <strong>de</strong> recursos e a nomeação para posições-chave naburocracia acadêmica (Serger & Breidne, p. 144, 2007), além doprocedimento eticamente duvidoso <strong>de</strong> se atribuir recompensasfinanceiras aos que logram publicar artigos em revistas científicas<strong>de</strong> primeira linha do Oci<strong>de</strong>nte (Nature, p. 01, 2001; Wilsdon &Keeley, pp. 49-50, 2007).176“China innovation ‘too isolated’”, Science and Development Network, 23/09/2008, .175<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 175 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior4.8 – A presença fundamental dos “tartarugas marinhas”Uma palavra final sobre a diáspora chinesa <strong>de</strong> C,T&I no exterior.Os problemas enunciados acima e os trunfos mais salientes do SCItêm nos seus mais <strong>de</strong> 1,2 milhão <strong>de</strong> chineses graduados no exterior nasúltimas décadas um valioso instrumento para sua superação, num caso,e um inestimável ponto <strong>de</strong> apoio para a sua expansão e reprodução, emoutro 177 . Os “tartarugas marinhas” são normalmente atraídos por vínculosfamiliares, ofertas <strong>de</strong> melhores empregos na China, lealda<strong>de</strong> <strong>nacional</strong>e/ou saturação das oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> emprego <strong>de</strong> alto nível nos paísesem que se radicaram, optando pelas melhores oportunida<strong>de</strong>s oferecidaspor uma economia em franca expansão.Mais importante <strong>de</strong> tudo, o governo chinês, ao dispor <strong>de</strong> plenaconsciência da contribuição <strong>de</strong> seus expatriados altamente qualificadospara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do país, <strong>de</strong>senvolveu uma série <strong>de</strong> programaspara estimular o seu regresso e plena (re)integração ao SCI. O governoestá ciente, além disso, <strong>de</strong> que essa diáspora consiste essencialmente numbraço estendido do SCI no exterior, consistindo, em última análise, emum mecanismo <strong>de</strong> transferência direta <strong>de</strong> alta ciência e tecnologia doexterior para o país, a custos relativamente reduzidos e com alto impactotransformador do perfil produtivo e para a mitigação dos problemas maisagudos do <strong>sistema</strong>. A participação dos expatriados eleva o nível geral<strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> da pesquisa e do <strong>sistema</strong> universitário, gerando um efeitoimitação dos exemplos das instituições estrangeiras mais bem-sucedidas;fortalece os vínculos entre as pontas do SCI; ajuda a superar os problemaséticos que ainda proliferam na pesquisa acadêmica chinesa, por meioda transplantação <strong>de</strong> outras práticas e valores para o <strong>sistema</strong> chinês; efortalece a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção tecnológica doméstica. Ao reconheceresse valor e potencial, o governo instituiu uma série <strong>de</strong> iniciativas parafortalecer a coesão da diáspora com o <strong>sistema</strong>, por meio <strong>de</strong> programascomo o “100 talentos”, no âmbito do “Programa Nacional <strong>de</strong> Inovação”(KIP), que tem por objetivo atrair <strong>de</strong> regresso à China 100 <strong>de</strong>stacadoscientistas chineses no exterior por ano, <strong>de</strong> menos <strong>de</strong> 45 anos, por meio<strong>de</strong> pagamento <strong>de</strong> incentivos financeiros diretos (até US$ 240.000 por177Em 1978, havia 860 pesquisadores e pós-graduandos chineses no exterior, número que seelevou a quase 145.000 em 2007. “Over 1.2 million Chinese studying abroad during 30 years”,People’s Daily, 10/10/2008, disponível em .176<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 176 10/10/2011 14:15:47


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”indivíduo) e outros benefícios. O programa atraiu 899 cientistas entre1998 e 2005.Além do “100 talentos”, <strong>de</strong>spontam outros programas como umsimilar oferecido especificamente pela Fundação <strong>de</strong> Ciências Naturaisda China (NSFC) e o Jiangzuo, que preten<strong>de</strong> atrair cientistas parainstituições <strong>de</strong> pesquisa na China por breves períodos <strong>de</strong> dois ou trêsmeses, durante os quais repassariam aos seus colegas radicados nopaís o cabedal científico-tecnológico amealhado em suas ativida<strong>de</strong>sdocentes e <strong>de</strong> pesquisa no exterior. Muitos pesquisadores da ACC foramrecrutados nos últimos anos por meio <strong>de</strong>sses mecanismos e programas.Paralelamente aos incentivos financeiros, o Estado chinês, por meio<strong>de</strong> órgãos como a Secretaria do Conselho <strong>de</strong> Estado para Chineses noExterior (Overseas Chinese Affairs Office) e a Comissão para Chinesesno Exterior do Parlamento da China (Congresso Nacional do Povo)têm aprovado leis e regulamentos que esten<strong>de</strong>m plenos direitos civisà diáspora chinesa no exterior, inclusive com benefícios adicionais àsfamílias, isenções e exonerações fiscais e ofertas <strong>de</strong> emprego quando setrata <strong>de</strong> pesquisadores qualificados. Uma importante distinção efetuadapelo governo chinês é entre chineses expatriados que po<strong>de</strong>rão “servir aopaís”, e os que “retornam para servir ao país”. No primeiro caso, que sevincula ao programa Jiangzuo, o governo simplesmente premia aquelesque, mesmo do exterior, contribuem <strong>de</strong> alguma forma palpável para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e o aprimoramento do SCI (Kunz & Zhang, p. 64, 2006).A diáspora chinesa <strong>de</strong> C,T&I tem, portanto, um papel <strong>de</strong> relevo naconstituição e fortalecimento do SCI e na criação <strong>de</strong> condições para a“<strong>inovação</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte” no país, a ser alcançada, conforme preconizao Vice-Presi<strong>de</strong>nte da ACC, Bai Chunli, “quando 70% do crescimentoeconômico da China pu<strong>de</strong>r ser atribuído diretamente ao fator ciência etecnologia” 178 .A China consiste claramente no exemplo mais característico e <strong>de</strong>larga escala <strong>de</strong> inserção recente e exitosa na economia global, a partirdas regras <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> que se impuseram quando da passagem damacroeconomia do Estado-nação para a macroeconomia inter<strong>nacional</strong> eda passagem <strong>de</strong> uma economia intensiva em produtos primários para uma178“Pool efforts to build up a national innovation system”, in Chinese Aca<strong>de</strong>my of SciencesNews, 23/01/2006, disponível em .177<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 177 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junioroutra intensiva em conhecimento. Não havendo a China experimentadoum processo <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> importações na acepção técnica doconceito, ou produzido quaisquer teorias que se assemelhassem aosprogramas cepalinos, impressiona a antevisão <strong>de</strong> Deng Xiaoping <strong>de</strong>vislumbrar em suas “portas abertas” a plena integração da economiachinesa à globalização 179 , ainda mais em se consi<strong>de</strong>rando que tal entradaocorreu em contexto <strong>de</strong> dois gran<strong>de</strong>s choques mundiais (energético e dadívida). Esses choques geraram, contudo, disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> crédito e <strong>de</strong>investimentos <strong>de</strong>correntes dos petrodólares e dos eurodólares dos anos80, do mesmo modo que as reformas econômicas nos “tigres asiáticos”atraíram fluxo <strong>de</strong> vultosos investimentos para a região da Ásia-Pacífico.Nesse sentido, a dinâmica “isolamento-abertura” Mao Tsé-Tung /Deng Xiaoping veio a resultar num contraste súbito e pronunciado quegerou uma clara opção <strong>de</strong> política econômica, industrial e tecnológica,experimentada por poucos países da época, se é que por algum outro:Por meio da a<strong>de</strong>são à globalização, a China tornou-se a economia mais abertaentre os países em <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. Em certos aspectos, a China hoje é maisaberta que um número significativo <strong>de</strong> economias <strong>de</strong>senvolvidas <strong>de</strong> mercado.(OCDE, p. 11, 2007b).Embora os <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> estejam em constante evolução, nãohavendo um “ponto <strong>de</strong> chegada” ótimo ou i<strong>de</strong>al, o exemplo do ReinoUnido talvez seja o que mais se aproximaria <strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> totalmentemaduro, a partir <strong>de</strong> uma economia quase que integralmente voltada para osetor <strong>de</strong> serviços, marcada por décadas <strong>de</strong> experiência <strong>de</strong> interação internae inter<strong>nacional</strong> e que se beneficiou amplamente do fato <strong>de</strong> o Reino Unidoser o precursor em adotar o conceito <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> como premissa para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e a prosperida<strong>de</strong>. Suas preocupações hoje são mais nosentido <strong>de</strong> como manter viva a dinâmica da “<strong>de</strong>struição criadora” na era179A importância da visão política <strong>de</strong> Deng Xiaoping para a aguda transformação do perfileconômico da China foi ressaltada por Zweig (p. 28, 2000): “Acreditando que a China <strong>de</strong>vessedominar as técnicas internacionais <strong>de</strong> gestão e a ciência e tecnologia para expandir o po<strong>de</strong>r<strong>nacional</strong> e o bem-estar do país, Deng virou o santo padroeiro da abertura da China para a ciência,a tecnologia e a educação superior”. Sobre as i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> Deng Xiaoping sobre a abertura, ver“Why China has Opened Its Doors” Foreign Broadcast Information Service, Daily Report:China, 12/02/1980, LI-5, “China cannot advance without science” e “China must take its placein the field of high technology”, in Xiaoping (pp. 184 e 273, 1994).178<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 178 10/10/2011 14:15:47


“aprendizagem chinesa na essência, oci<strong>de</strong>ntal na aplicação”da globalização, quando os países centrais tiveram <strong>de</strong> passar a competirno cenário da multipolarida<strong>de</strong> econômica intensiva em conhecimentocaracterística dos tempos atuais. É neste exemplo que o presente estudose fixará no próximo e penúltimo capítulo.179<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 179 10/10/2011 14:15:47


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Capítulo VReino Unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>”e “economia impon<strong>de</strong>rável”Em meados do século XIX, o físico britânico Michael Faradayfoi visitado por sua monarca, a Rainha Vitória. Entre as diversas<strong>de</strong>scobertas <strong>de</strong> Faraday – a maioria das quais <strong>de</strong> benefício práticoimediato – constavam algumas <strong>de</strong>scobertas no campo da eletricida<strong>de</strong> edo magnetismo, então pouco mais que curiosida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> laboratório. Notradicional diálogo entre Chefes <strong>de</strong> Estado e Chefes <strong>de</strong> Laboratório,a Rainha perguntou a Faraday sobre a utilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tais estudos, aoque ele teria respondido com outra pergunta: Senhora, para que serveum bebê?(Carl Sagan, in “In praise of science and technology”, p. 46, 2005).O <strong>sistema</strong> britânico <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (SBI) constitui um intrincadoemaranhado <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> conhecimento, indústrias, serviços,firmas, órgãos governamentais (do Executivo britânico, o Whitehall,até cida<strong>de</strong>s e regiões mais afastadas da Escócia), setor privado e açãointer<strong>nacional</strong>, do Governo e das empresas, voltados para a criação<strong>de</strong> novos processos e produtos direcionados para o mercado. Umaimpressão inicial prevalecente é que a obsessão britânica com o temada <strong>inovação</strong> – superada, talvez, apenas pela dos EUA – nos levaria aquestionar se haveria algum setor da economia e da socieda<strong>de</strong> que não181<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 181 10/10/2011 14:15:47


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorpraticasse, não estivesse envolvidos em algum processo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> ounão fosse alvo <strong>de</strong> políticas explícitas nesse sentido, na maior parte dasvezes conduzido e estimulado pelo governo, mas em gran<strong>de</strong> medida apartir da necessida<strong>de</strong> própria e espontânea do setor privado. Tal obsessãorecente com o tema – basicamente a partir <strong>de</strong> meados dos anos 90 e aindamais <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a gestão do Primeiro-Ministro Gordon Brown – transpareceem distintas políticas <strong>de</strong> governo: profundas mudanças no Executivopara que o tema esteja na pauta <strong>de</strong> todos os Ministérios (Departments);aplicação <strong>de</strong> princípios <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> às práticas <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> todos osórgãos; multiplicação <strong>de</strong> indicadores, órgãos, programas e políticas <strong>de</strong>apoio à <strong>inovação</strong>; estrutura institucional relativamente <strong>de</strong>scentralizada(com uma importante centralização recente, fruto da criação do Ministériodos Negócios, Inovação e Capacitação Profissional – Department forBusiness, Innovation and Skills, BIS); e também recente instituição <strong>de</strong>programas <strong>de</strong> meta-<strong>inovação</strong>, ou seja, voltados para inovar as própriaspráticas e políticas <strong>de</strong> fomento à <strong>inovação</strong>, como a criação <strong>de</strong> um novoCentro <strong>de</strong> Pesquisas <strong>de</strong> Inovação e a instituição <strong>de</strong> um “cupom-<strong>inovação</strong>”(innovation voucher) para as pequenas e médias empresas (PME).Fator distintivo do SBI é o fato <strong>de</strong> estar orientado para a disseminaçãoda <strong>inovação</strong> propriamente dita por toda a economia, não havendo umapreocupação específica com a promoção e avanço da C&T, uma vezque as universida<strong>de</strong>s e o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> pesquisa científica já alcançaram,há tempos, nível <strong>de</strong> avanço que situa a ciência britânica na condição <strong>de</strong>segunda maior produtora <strong>de</strong> conhecimento científico do mundo (tambémcertamente em termos qualitativos), atrás apenas dos EUA. Ouve-se noReino Unido que o Trinity College <strong>de</strong> Cambridge obteve mais prêmiosNobel para seus cientistas que a França inteira (Nickell & Van Reenen,p. 188, 2002). De fato, os mais <strong>de</strong> setenta prêmios Nobel concedidosnas áreas científicas a cidadãos britânicos (114 no total) correspon<strong>de</strong>m afeitos tais como o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> terapias genéticas, exame <strong>de</strong> DNApara i<strong>de</strong>ntificação individual, o primeiro transplante triplo, a criação daInternet, o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da linguagem HTML, do protocolo HTTPe do localizador URL, a criação da Universida<strong>de</strong> Aberta e do ensino adistância, a terapia <strong>de</strong> anticorpos monoclonais, a <strong>de</strong>scoberta da penicilina,da estrutura do DNA e a invenção do método para o seu sequenciamento.O grau <strong>de</strong> envolvimento e <strong>de</strong> “planejamento total” do governobritânico para a <strong>inovação</strong> abarca sutilezas e pormenores tais como182<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 182 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”iniciativa do Ministério da Criança, Escolas e Família (Children, Schoolsand Families – DCSF) <strong>de</strong> inovar na concepção e <strong>de</strong>sign <strong>de</strong> espaçosrecreativos para crianças, como também programa interdisciplinar doentão Ministério da Inovação, Universida<strong>de</strong>s e Capacitação Profissional(Department for Innovation, Business and Skills – DIUS) <strong>de</strong> redução da<strong>de</strong>pendência física e social do idoso (DIUS, pp. 45 e 47, 2008). No ReinoUnido, po<strong>de</strong>-se dizer que o tema da <strong>inovação</strong> – e, consequentemente,o do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico – há muito não configuraum tema específico, à parte, na estrutura do governo e da economia,representando agora um tema amplamente transversal, <strong>de</strong> interesse eaplicação por todas as esferas e áreas governamentais. Torna-se difícil,ou mesmo <strong>de</strong>snecessário, saber os limites precisos da competência doBIS perante as outras áreas do governo, especialmente os Ministérios daSaú<strong>de</strong>, Cultura Mídia e Esporte (DCMS), Energia e Mudança Climática.A atitu<strong>de</strong> geral do governo britânico é a <strong>de</strong> que a <strong>inovação</strong> transcen<strong>de</strong>a esfera da formulação <strong>de</strong> políticas para constituir-se antes em práticae conceito estreitamente vinculados ao próprio ato <strong>de</strong> governar. O BIS,<strong>de</strong>ssa forma, com poucos meses <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua criação (em junho <strong>de</strong> 2009),tem gerado altas expectativas no Gabinete e já se apresenta como umdos Ministérios politicamente mais influentes, ao lado da Saú<strong>de</strong> e doTesouro (Fazenda).A questão, portanto, da produção <strong>de</strong> C&T já seria uma questãosuperada no SBI, até mesmo pelo fato significativo <strong>de</strong> o país não contarcom um Ministério da Ciência e Tecnologia ou qualquer outro órgão<strong>de</strong> expressão semelhante. Com cerca <strong>de</strong> 1% da população mundial, oReino Unido <strong>de</strong>sponta com uma produção bibliométrica que conta com12% das citações internacionais e 13,4% das citações <strong>de</strong> maior impactona comunida<strong>de</strong> científica inter<strong>nacional</strong> (FCO, p. 08, 2007; DIUS/HMTREASURY/DSCF, p. 07, 2008). O número <strong>de</strong> doutores formados noReino Unido em ciências formais, biológicas e da natureza (conjuntoconhecido pelo acrônimo STEM – science, technology, engineering &mathematics) tem aumentado consistentemente nesta década, chegandoa 12.000 em 2007 (5.000 dos quais estrangeiros – DIUS, p. 46, 2008b) eo número <strong>de</strong> doutores por mil habitantes ultrapassa 2.0, o segundo nívelmais alto no mundo, <strong>de</strong>pois da Alemanha (DIUS, p. 47, 2008b). Em março<strong>de</strong> 2008 foi realizada a “Semana Nacional <strong>de</strong> Ciência e Engenharia” doReino Unido, com 3.500 eventos em <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>s do país, com183<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 183 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorpresença <strong>de</strong> 1,4 milhão <strong>de</strong> visitantes, o que confirma a capilarida<strong>de</strong> e ointeresse por ciência <strong>de</strong> parte da socieda<strong>de</strong> britânica. Como exemplo <strong>de</strong>inserção britânica nos mais importantes projetos científicos <strong>de</strong> nossostempos ressalte-se sua coli<strong>de</strong>rança no consórcio “Gran<strong>de</strong> Colisor <strong>de</strong>Hádrons”, do Centro Europeu <strong>de</strong> Pesquisas Nucleares (CERN) 180 .Naturalmente que o êxito da base científico-tecnológica do SBI<strong>de</strong>corre <strong>de</strong> séculos <strong>de</strong> observação, experimentação e extrapolação <strong>de</strong>hipóteses científicas que <strong>de</strong>ram ao país a primazia, juntamente compoucas outras potências europeias, do controle <strong>de</strong> diversos processosfísicos e naturais que resultaram em gran<strong>de</strong>s contribuições para ahumanida<strong>de</strong>. A reflexão sistemática sobre as bases metodológicas eepistemológicas da ciência no Oci<strong>de</strong>nte remonta a pelo menos 1620,com a publicação, por Francis Bacon, <strong>de</strong> seu Novum Organum. Maisque uma curiosida<strong>de</strong> científica, a referência à obra remete às basesanalíticas, experimentais, indutivas e pragmáticas da ciência britânica,que por meio do pensamento <strong>de</strong> Bacon rompeu, <strong>de</strong> maneira radical, coma tradição científica especulativa herdada do pensamento <strong>de</strong> Aristótelesaté então predominante na Europa. Ou seja, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo do séculoXVII a ciência britânica já havia incorporado rudimentos teóricos da<strong>inovação</strong>; adotado o método indutivo que assinala tanto a necessida<strong>de</strong> daexperimentação quanto a função prática – para não dizer utilitária – daciência; e assimilado o mo<strong>de</strong>lo baconiano <strong>de</strong> financiamento público daciência para a geração <strong>de</strong> tecnologia e <strong>de</strong> promoção do conhecimentocomo condição para a eficiência econômica e a prosperida<strong>de</strong>.Num trabalho sobre o SBI não se po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> mencionar abase experimental legada por pioneiros como Hooke, Newton, Darwin eFaraday, iniciadores <strong>de</strong> revoluções científicas e fundadores <strong>de</strong> paradigmas,cada qual em seus respectivos campos, com profundo impacto nas formas<strong>de</strong> produção científica e mesmo capitalista do Oci<strong>de</strong>nte. O princípio <strong>de</strong>que, no Reino Unido e, antes, na Inglaterra, o progresso da ciência estevesempre orientado ao mundo da produção e à disponibilização <strong>de</strong> bens eserviços em larga escala (ou seja, que o progresso da ciência e o avançodo capitalismo eram fenômenos indissociáveis e complementares) foiassim resumido por Soares (p. 10, 2002):180Os britânicos contribuiriam com 17% do orçamento total, estimado em US$ 10 bilhões, assimcomo com o trabalho <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 800 físicos e cientistas (“Land of Big Science”, Newsweek,15/09/2008, p. 33).184<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 184 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”na segunda meta<strong>de</strong> do século XVIII, a concepção mecanicista <strong>de</strong> mundo –fundamentada, sobretudo, no mecanicismo newtoniano (...) tornou-se uma daspo<strong>de</strong>rosas alavancas intelectuais da gran<strong>de</strong> transformação técnico-produtiva esocial que se verificou na Inglaterra, a partir dos anos 1780 – a Revolução Industrial.A disseminação do mecanicismo nos meios técnicos e industriais, por sua vez,fundamentou a idéia <strong>de</strong> que o mundo da produção, e em particular, da produçãoindustrial, po<strong>de</strong>ria também se submeter à lógica da mecanização 181 .Dessa forma, é certo que essa concepção empírica e pragmática doconhecimento é um dos traços distintivos da ciência britânica, assimcomo a i<strong>de</strong>ia da formação do indivíduo orientada historicamente paraa produção. Tal perspectiva está claramente presente, por exemplo,no lugar ocupado pelas políticas educacionais na estrutura do Estadobritânico em tempos recentes. Nos anos 90 havia o Department forEducation and Employment (DFEE), substituído no início <strong>de</strong>sta décadapor um Department for Education and Skills (DFES), então extintopara dar lugar ao DIUS e agora ao BIS 182 . Essa concepção difere muito,por exemplo, da brasileira, on<strong>de</strong> Ministérios <strong>de</strong> Educação, Produção eTrabalho e Emprego sempre ocuparam esferas separadas e, até muitorecentemente, estanques 183 .Neste capítulo, a exemplo dos dois anteriores, farei uma sucintaapresentação das principais características econômicas, institucionais eprogramáticas do SBI. Serão abordados os marcos e elementos essenciaisdo <strong>sistema</strong> nas décadas <strong>de</strong> 70 a 90, indicando as vicissitu<strong>de</strong>s do conceito<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no SBI a partir <strong>de</strong> suas diversas inflexões que culminaram nacriação do BIS, na adoção do programa Innovation Nation (DIUS, 2008)181Também ao final do século XVIII expandiram-se pela Inglaterra numerosas socieda<strong>de</strong>scientíficas voltadas para a reflexão sobre o aproveitamento prático-econômico das diversas<strong>de</strong>scobertas realizadas. A mais importante <strong>de</strong>ssas socieda<strong>de</strong>s, que contou com a contribuição <strong>de</strong>pensadores da estirpe <strong>de</strong> Newton e Benjamin Franklin, foi a “Socieda<strong>de</strong> Lunar <strong>de</strong> Birmingham”.Para a história da Socieda<strong>de</strong>, ver Schofield (1963). Gran<strong>de</strong> estudo sobre os vínculos entre aprodução científica e industrial do século XVIII na Inglaterra e suas consequências para aformação econômica do Oci<strong>de</strong>nte é o <strong>de</strong> Jacob (1997).182Nos anos 80 o Departamento correspon<strong>de</strong>nte era o <strong>de</strong> “Educação e Ciência”, o que evi<strong>de</strong>nciaa mudança <strong>de</strong> foco já no período final da era conservadora.183Outra importante diferença entre os casos brasileiro e britânico é que, enquanto seríamos uma“natural knowledge economy”, conforme a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> Bound (2008), o Reino Unido po<strong>de</strong>riaser <strong>de</strong>scrito como uma “nature knowledge economy”, ou seja, economia que tira proveito dadomesticação e controle da natureza, em todas as suas formas, áreas e níveis, dos fenômenosmicro ao macro.185<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 185 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniore na política <strong>de</strong> “<strong>inovação</strong> total” adotada pelo governo, assim comoas distintas transformações institucionais correspon<strong>de</strong>ntes e recentes.Em seguida apresentarei os principais atores e respectivas funçõesno SBI, elevado pelos britânicos à categoria <strong>de</strong> um “ecos<strong>sistema</strong>” <strong>de</strong><strong>inovação</strong> 184 . Veremos ainda como a economia britânica se distingue<strong>de</strong> todas as <strong>de</strong>mais entre as economias avançadas – e sempre coma exceção dos Estados Unidos – pelo amplo domínio do setor <strong>de</strong>serviços, <strong>de</strong> <strong>de</strong>sign e <strong>de</strong> elementos intangíveis na composição <strong>de</strong> seu<strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.Na seção subsequente será estudado mais pormenorizadamenteo programa do governo britânico para a <strong>inovação</strong>, o InnovationNation, que contempla – com a licença do pleonasmo – uma série<strong>de</strong> mecanismos inovadores para a promoção da própria <strong>inovação</strong>,ou mecanismos meta-inovadores. Embora não haja condições parauma comparação pormenorizada entre o Innovation Nation, o PACTIbrasileiro e o programa <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico2006-2020 da China neste estudo, procurarei apontar algumassemelhanças e diferenças gerais entre os três <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> aofinal <strong>de</strong>ste capítulo e na conclusão. Posteriormente, tratarei em seção àparte da presença do FCO e do seu papel na articulação inter<strong>nacional</strong>no SBI, especialmente por intermédio <strong>de</strong> dois programas cruciais, oScience Innovation Network (cuja gestão em parte passou do FCOpara o DIUS, em 2008, e <strong>de</strong>pois, consequentemente, para o BIS)e o Global Science and Innovation Forum (GSIF). A última seçãodo capítulo contemplará, <strong>de</strong> forma resumida, os pontos fortes e as<strong>de</strong>ficiências do <strong>sistema</strong>, agora submetido a dura prova com a atualrecessão, após 17 anos <strong>de</strong> crescimento ininterrupto.184A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> “ecos<strong>sistema</strong>” ao invés <strong>de</strong> “<strong>sistema</strong>” é para assinalar a pretensão do governobritânico <strong>de</strong> que a <strong>inovação</strong> venha a se tornar uma prática <strong>de</strong> todo o conjunto da socieda<strong>de</strong> e<strong>de</strong> sua multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interconexões, em <strong>de</strong>trimento da concepção tradicional universida<strong>de</strong>governo-indústria,que não daria conta da complexida<strong>de</strong> do fenômeno da <strong>inovação</strong> nas economiasavançadas. Em parte, esse conceito aplicar-se-ia também ao Brasil, diante do fenômeno culturalcomo fator <strong>de</strong> importância crescente na <strong>de</strong>finição do SNB. O tipo <strong>de</strong> interação favorecida pelanoção <strong>de</strong> ecos<strong>sistema</strong> abarca conceitos abstratos e <strong>de</strong> operacionalização mais difícil, tais quaiscoesão social e comunitária, confiança, intangibilida<strong>de</strong> e meta-<strong>inovação</strong>. Os dois primeirosconceitos são reiteradamente mencionados no Livro Branco “Innovation Nation” (DIUS, pp. 9, 65,67 e 78; 2008, por exemplo), como parte constitutiva <strong>de</strong> um “ecos<strong>sistema</strong>” britânico <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.186<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 186 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”5.1 – De “doente da Europa” a “nação inovadora”Em entrevista concedida ao canal público norte-americano PBS,em 14/09/2000 185 , o ex-Ministro britânico da Indústria e Comércio,Lord Cecil Parkinson – artífice do programa <strong>de</strong> privatizações maciçasdo governo Thatcher, sobretudo das companhias <strong>de</strong> serviços públicos –relatou um diálogo que mantivera com seu homólogo soviético em 1981,em que este (que <strong>de</strong>sfrutava da simpatia e da amiza<strong>de</strong> do colega britânico)afirmou, com serieda<strong>de</strong>: “Cecil, não queremos aumentar nosso comérciocom vocês. Seus produtos não são confiáveis; vocês estão sempre emgreve, vocês nunca cumprem o prometido. A verda<strong>de</strong> é que vocês são odoente da Europa”. Um jornalista americano que testemunhara o encontrosintetizaria <strong>de</strong>pois o espírito da intervenção do Ministro soviético, emmatéria publicada em seu diário: “Reino Unido oferece lição <strong>de</strong> comoarruinar um gran<strong>de</strong> país”.A década <strong>de</strong> 70 e o início dos anos 80, após os dois choques dopetróleo, foram <strong>de</strong> estancamento e <strong>de</strong>scontrole da economia britânica,então marcada por longas interrupções <strong>de</strong> serviços públicos essenciais,cortes no fornecimento <strong>de</strong> energia, violentos conflitos trabalhistas esindicais, racionamentos e <strong>de</strong>sindustrialização. O <strong>de</strong>semprego campeava,a inflação vinha crescendo <strong>de</strong> maneira ininterrupta 186 , o PIB per capitahavia caído aos seus piores níveis <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 30 e o Reino Unidohavia sido ultrapassado pelos países da OCDE em termos <strong>de</strong> crescimentodo PIB e produtivida<strong>de</strong> do trabalho. Na órbita política, o ExércitoRepublicano Irlandês (IRA) perpetrava diversos ataques a bomba a alvosmilitares e civis no Reino Unido.Esse quadro seria mitigado com a entrada do país no Mercado ÚnicoEuropeu, com a aceleração das privatizações – que reduziu o po<strong>de</strong>r dossindicatos, aumentou a taxa <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego e impôs uma trégua forçadanos enfrentamentos sindicais – e com a intensificação da concorrênciaentre as empresas recém-privatizadas.A <strong>de</strong>rrocada britânica da época teve dois momentos emblemáticos:o “pacote” <strong>de</strong> resgate do FMI, em setembro <strong>de</strong> 1976, que conce<strong>de</strong>u185Programa “Commanding Heights”, disponível em , item “The Sick Man of Europe”.186A inflação avançou 25% em 1974 e o valor das principais ações da bolsa <strong>de</strong> Londres recuoua níveis <strong>de</strong> 1920 (Nickel & Van Reenen, p. 03, 2001).187<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 187 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorempréstimo em troca <strong>de</strong> políticas anti-inflacionárias e <strong>de</strong> cortes <strong>de</strong><strong>de</strong>spesas públicas, e o apogeu da crise com o “inverno dos <strong>de</strong>scontentes”(“Winter of discontent”) quando uma greve geral nos serviços públicostornou o país praticamente ingovernável 187 . Tais contratempos, aliados aofracasso das políticas anti-inflacionárias dos trabalhistas, acabaram porlevá-los à <strong>de</strong>rrota nas eleições gerais <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1979. As concepçõestrabalhistas <strong>de</strong> maior proteção industrial contra o avanço da Comunida<strong>de</strong>Europeia (e mesmo <strong>de</strong> retirada do Bloco) levaram os conservadores esuas propostas monetaristas e anti-intervencionistas à vitória. Apesardo aprofundamento subsequente da recessão e do <strong>de</strong>semprego – queultrapassou a casa dos três milhões – o <strong>de</strong>smantelamento do movimentosindical britânico e as profundas divisões no Partido Trabalhista levaramMargaret Thatcher a nova e, <strong>de</strong>sta vez, acachapante vitória em junho <strong>de</strong>1983.Um dos motivos críticos mencionados à época para o <strong>de</strong>scontroleda economia britânica, ainda que <strong>de</strong> importância secundária diante doquadro geral <strong>de</strong> instabilida<strong>de</strong> macroeconômica, era a barreira que seantepunha entre sua já então excelente base científica e a produçãoindustrial, ainda muito intensiva em fatores tradicionais. No início dosanos 80 o Reino Unido estava à frente inclusive dos EUA em termos<strong>de</strong> citações em periódicos in<strong>de</strong>xados. O governo britânico financiavaa P&D em níveis três vezes maiores, em termos relativos, do queas taxas hoje verificadas (Nickel & Van Raanen, pp. 13-15, 2001).Os baixos índices relativos <strong>de</strong> investimento privado em P&D (aindaque em termos absolutos os investimentos privados já superassem osgovernamentais) geravam escassa absorção das inovações, acentuandoum círculo vicioso <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconexão entre conhecimento e produção e <strong>de</strong><strong>de</strong>sestímulos persistentes para inovar, uma vez que transformações <strong>de</strong>padrões produtivos e <strong>de</strong> perfis industriais requerem investimentos emlarga medida indisponíveis em tempos <strong>de</strong> crise e estagnação. Ainda naconjuntura dos anos 70, esse quadro era agravado pelo fato <strong>de</strong> não haverconhecimento ou consciência – diferentemente <strong>de</strong> hoje, ainda que sejaum conhecimento imperfeito e parcial – dos mecanismos que conectamconhecimento, produtivida<strong>de</strong>, valor, <strong>inovação</strong> e competitivida<strong>de</strong>. Nãoseria <strong>de</strong> admirar, portanto, que o problema relativamente recorrente187A situação econômico-social do Reino Unido nos anos 70 teve uma aguda análise em artigosugestivamente intitulado “Britain as an un<strong>de</strong>r<strong>de</strong>veloped country” (Sharpston, 1974).188<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 188 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”da economia britânica – que ganhou força a partir das gravesconsequências sociais da Revolução Industrial –, <strong>de</strong> separação entreprodução e pesquisa científica institucionalizada se repetisse durante oscríticos anos 1970-1985.Apesar do impacto negativo dos anos 70 e 80 para a formação econsolidação do SBI, dois princípios essenciais do <strong>sistema</strong>, que remontamao pós-Primeira Guerra, permaneceram relativamente inalterados,o segundo sujeito às restrições <strong>de</strong>correntes da crise fiscal originadado <strong>de</strong>scontrole dos anos 70. O primeiro é o “Princípio Haldane”,<strong>de</strong>nominado a partir <strong>de</strong> Richard Haldane (cofundador da London Schoolof Economics), que em 1918 coor<strong>de</strong>nou relatório sobre a política científicado Reino Unido recomendando o financiamento público <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong>pesquisa <strong>de</strong>finidos e conduzidos pela própria comunida<strong>de</strong> científica, enão por funcionários <strong>de</strong> governo. Essa visão conduziria à criação dosConselhos <strong>de</strong> Pesquisa do Reino Unido (Research Councils – RC),entida<strong>de</strong>s administradas por pares acadêmicos que financiam a maioriados projetos <strong>de</strong> pesquisa no país 188 . O Relatório Dainton, <strong>de</strong> 1971,que contém extensa avaliação do papel dos RC na ciência britânica,reafirmava os termos do “Princípio Haldane”:É uma característica essencial da ciência que tanto a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> programas <strong>de</strong>trabalho quanto o estabelecimento <strong>de</strong> priorida<strong>de</strong>s estratégicas estejam a cargodos próprios cientistas. (...) No entanto, é <strong>de</strong> importância crucial que aqueles queestabelecem tais priorida<strong>de</strong>s estejam permanentemente conscientes dos objetivose necessida<strong>de</strong>s nacionais. De outra forma, erguer-se-ão perigosas e corruptíveis“torres <strong>de</strong> marfim” em torno <strong>de</strong>les, que irão impedir o uso prático e efetivo <strong>de</strong>idéias e <strong>de</strong>scobertas científicas (Dainton, § 37 p. 13, 1971).O segundo princípio que seguiu inalterado é o do “mecanismo dual<strong>de</strong> financiamento”, que combina o financiamento <strong>de</strong> pesquisa pelosConselhos (sete, no total, tendo o Medical Research Council sido opioneiro entre eles, criado em 1913), sobretudo da infraestrutura <strong>de</strong>pesquisa, com os aportes <strong>de</strong>rivados do “Comitê <strong>de</strong> Financiamento dasUniversida<strong>de</strong>s” (Universities Funding Committee), órgão que seria188Tal princípio da política acadêmica britânica é integralmente observado no Brasil, por meiodos mecanismos inter pares <strong>de</strong> avaliação e financiamento <strong>de</strong> projetos via CAPES, CNPq eFundações estaduais.189<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 189 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorposteriormente objeto <strong>de</strong> sucessivas reformas, mas mantendo a função<strong>de</strong> cofinanciador em paralelo da ciência e da pesquisa britânicas, hojeexercida pelo sucedâneo “Conselho <strong>de</strong> Financiamento da EducaçãoSuperior” (Higher Education Funding Council – HEFC).O Relatório Rothschild <strong>de</strong> 1972 veio a alterar por poucos anos,até fevereiro <strong>de</strong> 1974, com a recondução dos trabalhistas ao po<strong>de</strong>r, oprincípio da ampla autonomia da comunida<strong>de</strong> científica <strong>de</strong> formular eimplementar políticas científicas para o país. O relatório preconizava avinculação da pesquisa aplicada ao interesse direto dos contratistas e atransferência <strong>de</strong> parte dos recursos dos RC para os Ministérios, orientaçãoque gerou, como seria <strong>de</strong> se esperar, gran<strong>de</strong> resistência dos Conselhose, particularmente, do Conselho <strong>de</strong> Pesquisa <strong>de</strong> Medicina. A ulteriorreversão dos princípios adotados no Relatório levou o mais po<strong>de</strong>roso RC<strong>de</strong> então, o Conselho <strong>de</strong> Pesquisa para as Ciências (Science ResearchCouncil) a adotar, a título compensatório, o princípio da vinculação dapesquisa científica a “benefícios econômicos e sociais concretos”. A criseeconômica da década veio, no entanto, a comprimir o financiamento dosRC e inviabilizou, em gran<strong>de</strong> medida, a recomendação <strong>de</strong> Lord Rothschild<strong>de</strong> atrelar a pesquisa aplicada à indústria.A administração Thatcher buscou reincorporar as teses centrais doRelatório Rothschild em suas políticas <strong>de</strong> vinculação <strong>de</strong> fundos paraa pesquisa com projetos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> industrial, com vistas aoprogressivo afastamento do Estado da manutenção e financiamentoda pesquisa aplicada. Outra característica essencial do período para aC&T no país foi a introdução dos “exercícios <strong>de</strong> avaliação <strong>de</strong> pesquisa”(Research Assessment Exercises – RAE), que levavam em consi<strong>de</strong>raçãopráticas gerenciais <strong>de</strong> administração da pesquisa e novamente geraramprotestos na comunida<strong>de</strong> científica, uma vez que <strong>de</strong>terminavam aalocação <strong>de</strong> recursos <strong>de</strong> acordo com os conceitos obtidos pelas instituiçõesuniversitárias. Os RAE consolidaram-se, entretanto, ao longo do tempo,condicionando agora a quase totalida<strong>de</strong> dos recursos disponibilizadospelo HEFC – contra apenas 15% vinculados aos resultados do RAEquando do lançamento do exercício, em 1986. Na medida em que asavaliações afetavam apenas as pesquisas, e não o ensino, as instituiçõespassaram a dar total ênfase àquelas (Martin, p. 04, 1999).A administração John Major <strong>de</strong>flagrou importantes <strong>de</strong>sdobramentosinstitucionais na política britânica <strong>de</strong> C&T, a partir da criação <strong>de</strong>190<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 190 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”um Departamento <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia (Office of Science andTechnology – OST), diretamente vinculado ao Gabinete, embora aindasem o status <strong>de</strong> Ministério. Na mesma época, o Parlamento instituiuuma Subcomissão (Select Committee) <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia, quemais tar<strong>de</strong> evoluiu e ganhou importância crescente, com novo status <strong>de</strong>Comissão Plena e produzindo diversos <strong>de</strong>bates e relatórios sobre temascomo política espacial, estudos oceanográficos, financiamento dos RC,política inter<strong>nacional</strong> para a S,T&I e pesquisas com células-tronco 189 .Em 1993 foi publicado o relatório Realizing our Potential: Strategy forScience, Technology and Engineering, a primeira avaliação do estado daC&T britânica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os relatórios Dainton e Rotschild, <strong>de</strong> 1971 e 1972,quando se tornou mais explícita a orientação <strong>de</strong> vincular os resultadosda pesquisa científica às necessida<strong>de</strong>s da indústria. Por esse relatório,os RC foram reestruturados, ampliados (passando <strong>de</strong> cinco para seis,o novo na área <strong>de</strong> biotecnologia e ciências biológicas) e impelidos a<strong>de</strong>stinar mais recursos e a realizar mais pesquisas <strong>de</strong> interesse direto paraa indústria. O Realizing our Potential gerou ainda o programa “Visão<strong>de</strong> Futuro” (Technology Foresight), que busca integrar os esforços dosatores do SBI para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> áreas científicas estratégicas,numa escala temporal <strong>de</strong> 20 anos. A primeira rodada <strong>de</strong> pesquisas enegociações do Foresight abarcou 15 painéis temáticos e gerou mais <strong>de</strong>360 recomendações <strong>de</strong> políticas 190 .Em 1995 o OST foi transferido para o Department of Tra<strong>de</strong> andIndustry – DTI, sob a justificativa <strong>de</strong> reforçar as políticas <strong>de</strong> integraçãoentre pesquisa e produção industrial e o setor <strong>de</strong> serviços. O ConselheiroCientífico-Chefe do DTI acumularia as funções <strong>de</strong> Conselheiro Científico--Chefe do Gabinete (Government Chief Scientific Advisor – GCSA),que teria como atribuições essenciais a coor<strong>de</strong>nação-geral da políticacientífica do governo, tanto em nível doméstico quanto inter<strong>nacional</strong>,assim como a <strong>de</strong>finição e a alocação <strong>de</strong> recursos orçamentários para osRC (agora em número <strong>de</strong> sete, com a criação, em abril daquele ano, doConselho para o Laboratório Central dos Centros <strong>de</strong> Pesquisa – Councilfor the Central Laboratory of the Research Councils, CCLRC). Ainda189Relação dos relatórios mais recentes produzidos pela Comissão <strong>de</strong> C&T encontram-sedisponíveis em sua página da Câmara dos Comuns, .190Página do programa na web, .191<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 191 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorque a passagem para o DTI correspon<strong>de</strong>sse a uma clara mensagem doGabinete <strong>de</strong> vincular a pesquisa científica à produção, esse movimentona verda<strong>de</strong> teria enfraquecido a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação da políticacientífica pelo OST, que enfrentava gran<strong>de</strong>s dificulda<strong>de</strong>s para envolveroutros Ministérios – que não o próprio DTI – na formulação e execuçãoarticuladas da PCTI britânica 191 .Outras modificações do <strong>sistema</strong> público <strong>de</strong> apoio à C,T&I noReino Unido durante os anos 90 compreen<strong>de</strong>ram a instituição dosprogramas Smart e Link, o primeiro <strong>de</strong> apoio às PME, com provisão<strong>de</strong> estudos <strong>de</strong> mercado a empresas com menos <strong>de</strong> 50 funcionáriose instituição <strong>de</strong> créditos, <strong>de</strong> até £ 150.000, a empresas com entre50 e 250 empregados; o segundo programa previa a <strong>de</strong>stinação <strong>de</strong>recursos para projetos conjuntos <strong>de</strong> P&D entre empresas e centros <strong>de</strong>pesquisa 192 . Os anos 80 e 90 foram <strong>de</strong> criação e expansão <strong>de</strong> parquescientíficos e incubadoras <strong>de</strong> empresas em diversas universida<strong>de</strong>sdo Reino Unido, a partir da experiência pioneira <strong>de</strong> instalação doprimeiro parque na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cambridge, em 1970 (Universityof Cambridge, pp. 2-3, 1999). Em 1997, <strong>de</strong>satou-se gran<strong>de</strong> polêmicanos meios estudantis britânicos com a divulgação, pouco após ainvestidura do Premier Tony Blair em Downing Street, do DearingReport, preparado pelo Reitor (Vice Chancellor) da Universida<strong>de</strong><strong>de</strong> Nottingham, Sir Ronald Dearing, que basicamente propunha acobrança <strong>de</strong> matrículas e mensalida<strong>de</strong>s subsidiadas aos alunos <strong>de</strong>graduação do país, terminando com a política <strong>de</strong> gratuida<strong>de</strong> doensino, assim como propunha a ampliação das vagas no <strong>sistema</strong>universitário para aten<strong>de</strong>r ao que seria uma crescente <strong>de</strong>manda <strong>de</strong>pessoal qualificado pela indústria e setor <strong>de</strong> serviços britânicos 193 .Ainda na década <strong>de</strong> 90, foi lançado o programa New Deal – a marcaregistrada da gestão Tony Blair no campo social – em que, a partir <strong>de</strong>diagnóstico básico <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> um milhão <strong>de</strong> postos191O anexo 5.1 reproduz a vertente governamental da estrutura do SBI à época da chegada doPartido Trabalhista ao po<strong>de</strong>r, em abril <strong>de</strong> 1997.192Estudo da OCDE (OCDE, pp. 21-22, 2006b) apontou que, muito embora a aplicação dosprogramas não tenha gerado diretamente novos produtos ou processos, aqueles acabaram pordotar a maioria das empresas participantes <strong>de</strong> infraestrutura produtiva mais mo<strong>de</strong>rna, o que porsua vez elevou sua competitivida<strong>de</strong> e teria estimulado a mo<strong>de</strong>rnização tecnológica dos anossubsequentes.193A íntegra do Dearing Report, cujo título oficial é “National Committee of Inquiry into theHigher Education” está disponível em .192<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 192 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”<strong>de</strong> trabalho na economia em 1997 (ano <strong>de</strong> lançamento do programa)que requeressem algum tipo <strong>de</strong> qualificação, e <strong>de</strong> também um milhão<strong>de</strong> <strong>de</strong>sempregados no país, sobretudo jovens – o governo ofereceriatreinamento e qualificação profissionalizante para reinserir, com o apoiodo Ministério do Trabalho e Previdência – Department of Work andPensions –, os <strong>de</strong>sempregados no mercado. Cerca <strong>de</strong> meta<strong>de</strong> das 2,4milhões <strong>de</strong> pessoas que passaram pelo programa foram empregadas.Característica polêmica da medida foi a instituição <strong>de</strong> um impostoextraordinário (“Windfall tax”) sobre o lucro das estatais privatizadasdurante a era conservadora, que arrecadou £ 5 bilhões (cerca <strong>de</strong> US$ 8bilhões) para financiar o New Deal 194 . Ainda em 1997 o DfEE anunciouo programa “Apren<strong>de</strong>ndo e trabalhando juntos para o futuro” (Learningand Working Together for the Future) e, no ano seguinte, o DTI lançouo “Nosso Futuro Competitivo” (Our Competitive Future: Building theKnowledge Driven Economy), que preconizava uma estratégia agressivapara a comercialização dos resultados das pesquisas <strong>de</strong>senvolvidas nasuniversida<strong>de</strong>s, introduziu pela primeira vez o tema da <strong>inovação</strong> naspróprias agências e órgãos governamentais e criou um fundo <strong>de</strong> capital<strong>de</strong> risco (Venture Capital), formado a partir <strong>de</strong> alocações voluntáriasdas seis maiores instituições financeiras do país, para financiamento <strong>de</strong>ativida<strong>de</strong>s inovadoras nas PME (DTI, 1998).Finalmente, em 1998, o Gabinete trabalhista instituiu o Conselho<strong>de</strong> Ciência e Tecnologia (Council for Science and Technology – CST),principal órgão assessor <strong>de</strong> PCT do governo britânico, que se reportadireta e periodicamente ao Primeiro-Ministro, presidido pelo GCSA.Des<strong>de</strong> sua criação, o Conselho publicou <strong>de</strong>zesseis relatórios <strong>de</strong> trabalhosobre temas como código <strong>de</strong> conduta para cientistas, planejamentoestratégico da PCT, política para nanociência e nanotecnologia, comprasgovernamentais e <strong>inovação</strong> para a expansão do setor <strong>de</strong> serviços 195 .O CST é formado por <strong>de</strong>zesseis membros, diretamente indicados194Finn (p. 397, 2000) concorda que o programa terá sido um dos gran<strong>de</strong>s êxitos da gestão TonyBlair, muito embora haja apontado um problema crucial que afetaria a apreciação a<strong>de</strong>quada dasestatísticas, o da “porta giratória”, segundo o qual jovens beneficiados mantinham-se empregadospor pouco tempo e logo retornavam às fileiras dos programas sociais, reapresentando-se noscentros <strong>de</strong> recrutamento do New Deal. Tal hipótese parece confirmar-se pela discrepância entre ocontingente <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempregados admitido pelo governo e o número <strong>de</strong> trabalhadores “reciclados”pelo programa.195A íntegra dos relatórios está disponível em .193<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 193 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorpelo Primeiro-Ministro, sendo o atual Conselho integrado por noveProfessores Titulares <strong>de</strong> renomadas universida<strong>de</strong>s britânicas, cincoacadêmicos com atuação em gran<strong>de</strong>s corporações britânicas e os diretoresdo Instituto Nacional <strong>de</strong> Pesquisas Médicas e do Instituto <strong>de</strong> PesquisasOncológicas do Reino Unido (Cancer Research UK) 196 .Esse gran<strong>de</strong> acúmulo <strong>de</strong> estudos e reflexões oficiais sobre a <strong>inovação</strong>no Reino Unido, timidamente iniciados nos anos 70, alcançou os anos 90com a firme convicção <strong>de</strong> que a pesquisa realizada com recursos públicosteria por obrigação i<strong>de</strong>ntificar usuários finais, na socieda<strong>de</strong> e/ou nasempresas, que pu<strong>de</strong>ssem absorver essa produção científica na forma <strong>de</strong>produtos, serviços e benefícios traduzíveis em elevação da qualida<strong>de</strong> e dopadrão <strong>de</strong> vida da socieda<strong>de</strong>. O relatório Realizing our Potential inaugurou,por sua vez, um estilo mais abrangente <strong>de</strong> reflexão sobre <strong>inovação</strong> queperpassaria as iniciativas e programas da década subsequente, a partir <strong>de</strong>um conceito <strong>de</strong> “ecos<strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>” que culminaria com os preceitose postulados insculpidos no Innovation Nation, <strong>de</strong> 2008. Passemos agora àcaracterização <strong>de</strong>sse “ecos<strong>sistema</strong>”, com uma breve <strong>de</strong>scrição das funçõese posição estratégica dos atores que o constituem.5.2 – O (Eco)<strong>sistema</strong> britânico <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>Diversos outros textos e relatórios foram publicados pelo governobritânico a partir do ano 2000, cada qual enfocando aspectos da <strong>inovação</strong> emáreas-chave do Executivo, tais como indústria, saú<strong>de</strong>, educação, serviços,<strong>de</strong>sign, ação inter<strong>nacional</strong>, orçamento, financiamento e incentivos fiscais,formação profissional e ensino profissionalizante, entre muitas outras, acargo dos Ministérios correspon<strong>de</strong>ntes, dos RC, do STC, do DIUS/BIS edo GCSA. Entre esses estudos, sobressaem-se dois <strong>de</strong> corte mais genéricoque procuraram <strong>sistema</strong>tizar os esforços dos agentes do SBI para suprirdiversas falhas que comprometiam sua eficácia e o rebaixavam, em certosindicadores fundamentais (como investimento total em P&D), perantecompetidores como Alemanha, China, Japão e Estados Unidos. O primeirodocumento, produzido conjuntamente pelo Ministério da Fazenda (HMTreasury), pelo então DTI e pelo DfES procurou estabelecer um programa-196Comunicado à imprensa com o perfil biográfico dos integrantes do CST britânico,à época <strong>de</strong> sua criação, está disponível em .194<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 194 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”-quadro <strong>de</strong> investimentos em ciência e <strong>inovação</strong> para o período 2004-2014(Science & Innovation Investment Framework 2004-2014 – SIIF).O SIIF foi concebido para dotar o governo britânico <strong>de</strong> um roteiropara superar uma pletora <strong>de</strong> problemas que afetam o pleno <strong>de</strong>sempenhodo SBI e comprometem a eficiência <strong>de</strong> pontos-chave do processo <strong>de</strong><strong>inovação</strong>. O objetivo primordial seria o <strong>de</strong> elevar os gastos do PIBem C&T dos atuais 1,9% para 2,5% em 2014 (o que correspon<strong>de</strong>ria aUS$ 70 bilhões <strong>de</strong> gastos em P&D em 2014, contra os atuais US$ 40bilhões) – embora o programa do Partido Trabalhista para as eleições<strong>de</strong> 1997 já houvesse fixado essa meta para o ano <strong>de</strong> 2010 (Smith &Bagchi-Sen, p. 376, 2006). O nível <strong>de</strong> 1,9% está abaixo da média daOCDE e <strong>de</strong>ixaria o SBI especialmente vulnerável a choques externos,como o da atual crise financeira inter<strong>nacional</strong>, e po<strong>de</strong>ria comprometer oefeito sistêmico da <strong>inovação</strong> no Reino Unido, conforme os parâmetrosassinalados no estudo <strong>de</strong> Park & Park (2003) referido na nota 52 acima.O documento assinala diversas <strong>de</strong>ficiências para a conexão entre apesquisa e a produção, refletidas nos índices <strong>de</strong> P&D do setor privado,que enfrentam dificulda<strong>de</strong>s para superar a casa dos 1,25% do PIB 197 .Apesar da incontestável li<strong>de</strong>rança britânica em indicadores quantitativose qualitativos <strong>de</strong> produção científica (em que, nesses casos, chega mesmoa superar os EUA), essa produção enfrenta dificulda<strong>de</strong>s, em termosagregados, <strong>de</strong> ser empregada fora dos laboratórios. Problema conspícuoseria o da escassez <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra qualificada e técnica em setores--chave da economia, como software e semicondutores, saú<strong>de</strong>, educação,turismo e serviços <strong>de</strong> modo geral. Outros temas como construção <strong>de</strong>indicadores, avaliação do ensino e da pesquisa, interação e <strong>inovação</strong> entreórgãos governamentais também constam como propostas prioritárias aproduzirem resultados no <strong>de</strong>cênio 2004-2014.O segundo documento consiste em avaliação das políticasgovernamentais <strong>de</strong> ciência e <strong>inovação</strong> encomendadas pelo entãoChanceler do Erário (Ministro da Fazenda) Gordon Brown ao ex-titular doDepartamento <strong>de</strong> Ciência e Inovação do Gabinete (Office of Science andInnovation) 198 , Lord Sainsbury, que havia <strong>de</strong>ixado o cargo em novembro197Investimentos em P&D efetuados por empresas <strong>de</strong> energia no Reino Unido <strong>de</strong>caíram <strong>de</strong>£ 280 milhões em 1989 para £ 120 milhões em 2002 <strong>de</strong>vido, fundamentalmente à liberalizaçãoeconômica e às privatizações (Turville, p. 124, 2007).198O OSI foi constituído em fevereiro <strong>de</strong> 2006, como resultado da fusão do OST e do “Grupo <strong>de</strong>Inovação” (Innovation Group) do DTI. Este havia sido criado em 2002, com três responsabilida<strong>de</strong>s195<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 195 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>de</strong> 2006, <strong>de</strong> modo que o documento consiste essencialmente numaavaliação <strong>de</strong> seu longo mandato <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> sete anos à frente do OST/OSI. O relatório “Corrida para o Topo” (A Race to the Top) foi publicadoem outubro <strong>de</strong> 2007, quatro meses após a investidura <strong>de</strong> Gordon Brownno cargo <strong>de</strong> Primeiro-Ministro.Entre as recomendações do A Race to the Top constamresponsabilida<strong>de</strong>s ampliadas para o “Fundo <strong>de</strong> Inovação do EnsinoSuperior” (Higher Education Innovation Fund – HEIF), voltado para ofinanciamento (orçamento <strong>de</strong> £ 238 milhões no ano acadêmico 2006/2007)<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> conhecimento das universida<strong>de</strong>s inglesas(as das administrações autônomas da Escócia, Irlanda do Norte e País<strong>de</strong> Gales contam com mecanismos próprios) para empresas e outrasinstituições <strong>de</strong> pesquisa. O HEIF, nos termos do documento, seriaorientado a financiar transferência <strong>de</strong> conhecimento sobretudo a PME<strong>de</strong> base tecnológica, assim como fornecer o financiamento essencial aempresas <strong>de</strong> base altamente tecnológica em fase preliminar <strong>de</strong> formação.Outras priorida<strong>de</strong>s assinaladas incluem a realização <strong>de</strong> esforço <strong>nacional</strong>para incrementar o número <strong>de</strong> alunos e capacitar professores das áreas<strong>de</strong> ciências básicas na re<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino fundamental e secundária do país;ampliar e mo<strong>de</strong>rnizar o programa britânico <strong>de</strong> apoio às PME, a Iniciativa<strong>de</strong> Pesquisa para as Pequenas Empresas (Small Business ResearchInitiative – SBRI); fortalecer as parcerias universida<strong>de</strong>-empresa paratransferência <strong>de</strong> conhecimento (Knowledge Transfer Partnerships –KTP), por intermédio do HEIF, das Agências <strong>de</strong> Desenvolvimentoessenciais: supervisão dos programas Smart e Link; supervisão do Escritório <strong>de</strong> Patentes e dosórgãos nacionais <strong>de</strong> normalização e metrologia; e promoção <strong>de</strong> novas tecnologias em áreascomo engenharia genética, softwares e tecnologia básica na área <strong>de</strong> engenharias. A justificativaapresentada à Comissão <strong>de</strong> C&T do Parlamento para a extinção do OST e criação do OSI baseavaseem três fatores: baixo <strong>de</strong>sempenho do “Innovation Group”; a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reposicionaras políticas britânicas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> fora da alçada exclusiva do DTI; e o avultamento dos temas<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Gabinete em relação ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico puro e simples, tarefamenos ambiciosa e insuficiente per se para a transformação da economia pretendida peloGabinete. Os pormenores alusivos à conversão do OST em OSI constam dos anais do ParlamentoBritânico (Hansard Archives), disponíveis em House of Commons – Science and Technology– Sixth Report (28/03/2007), . Diante da importância crescente do tema da <strong>inovação</strong>, o Parlamentorecomendara na ocasião “(...) que o governo [consi<strong>de</strong>rasse] a criação <strong>de</strong> um Ministério da Ciência(sic) à parte numa futura reforma institucional.” Posteriormente, com a criação do DIUS, a própriaComissão da Câmara dos Comuns foi rebatizada para Comissão <strong>de</strong> Inovação, Universida<strong>de</strong>s,Ciência e Qualificação Profissional (Skills).196<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 196 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”Regional (Regional Development Agencies – RDA) e do ConselhoEstratégico <strong>de</strong> Tecnologia (Technology Strategy Board – TSB) 199 ; eo aprofundamento da cooperação e das parcerias com universida<strong>de</strong>se centros <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> diversos países, priorida<strong>de</strong> à qual têm <strong>de</strong> selançar, conforme consta do documento, todas as agências governamentaisparticipantes do SBI, notadamente o FCO, a partir da expansão <strong>de</strong> suaRe<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciência e Inovação (Turville, p. 154-156, 2007).O Race to the Top recomenda que se prepare um relatório anualsobre o <strong>de</strong>sempenho da <strong>inovação</strong> no Reino Unido, em seus três setoresbásicos, e que se acompanhe o estado <strong>de</strong> sua implementação. Nos termosdo relatório anual 2007-2008 (Annual Innovation Report), das 72 metase recomendações constantes do relatório, mais <strong>de</strong> 20 já haviam sidointegralmente cumpridas (estabelecimento <strong>de</strong> vínculos formais entre oTSB, os Research Councils e as RDA; produção, pelo DIUS, <strong>de</strong> umaestratégia <strong>de</strong> fortalecimento do ensino profissionalizante; e estimularas escolas primárias e secundárias britânicas a adotar estratégias paraincentivar o ensino <strong>de</strong> ciências e matemática, entre outras metas) e as<strong>de</strong>mais estariam em fase <strong>de</strong> implementação.A tría<strong>de</strong> da estrutura <strong>de</strong>cisória governamental <strong>de</strong> alto nível do SBIé composta pelo CST, pelo GCSA (cargo assumido em outubro <strong>de</strong> 2007pelo Professor John Beddington, Titular <strong>de</strong> aproveitamento sustentável<strong>de</strong> recursos naturais do Imperial College) e agora pelo próprio BIS, sendoque os dois primeiros reportam-se ao Primeiro-Ministro essencialmente,mas não exclusivamente, em temas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da pesquisacientífico-tecnológica. Nesse aspecto, o BIS, na época o DIUS, <strong>de</strong>spontano Sistema primeiro por ter sido a <strong>inovação</strong> alçada à condição <strong>de</strong>Ministério, no Gabinete Gordon Brown, e por ser investido <strong>de</strong> po<strong>de</strong>respara coor<strong>de</strong>nar as políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> formuladas em todo o Whitehall.O primeiro orçamento do DIUS, <strong>de</strong> 2007 (combinado com o do primeirosemestre, ainda à época do OSI) foi <strong>de</strong> £ 18,8 bilhões (cerca <strong>de</strong> US$ 32bilhões), maior que o <strong>de</strong> Ministérios como Transportes, Justiça, Home199Ao manter os programas SBRI, KTP, KTN (Knowledge Transfer Networks) e as “Plataformas<strong>de</strong> Inovação” (<strong>de</strong>dicadas ao aprimoramento dos serviços e <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> transporte público,<strong>de</strong>senho <strong>de</strong> edifícios inteligentes <strong>de</strong> baixo impacto ambiental, projetos <strong>de</strong> veículos não poluentese diagnóstico <strong>de</strong> microorganismos infecciosos) o TSB apoiou a constituição <strong>de</strong> diversas empresas<strong>de</strong> base <strong>de</strong> alta tecnologia e ambientalmente sustentáveis. Exemplos <strong>de</strong> resultados da ação doTSB – que po<strong>de</strong>ria ser comparado a um Research Council das empresas – po<strong>de</strong>m ser consultadosem .197<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 197 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorOffice (mescla <strong>de</strong> Justiça e Interior) e o FCO, este último com orçamento<strong>de</strong>z vezes menor, <strong>de</strong> £ 1,9 bilhão (DIUS, pp. 54-55, 2008b) 200 . Em termoscomparativos, o orçamento do DIUS é cinco vezes superior ao do MCTbrasileiro – e ainda maior ao se consi<strong>de</strong>rar o que vinha sendo (antes dacrise econômica) efetivamente executado 201 .O DIUS era composto por sete gran<strong>de</strong>s Departamentos, entre osquais se <strong>de</strong>stacavam três mais propriamente operacionais: ciência e<strong>inovação</strong>, capacitação e qualificação profissionais (Further Educationand Skills) e educação superior. O centro gestor das políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>estava situado no primeiro Departamento, que por sua vez abrigava o“Grupo <strong>de</strong> Ciência e Inovação” (Science and Innovation Group – SIG),responsável pelo Centro Espacial Britânico (British National SpaceCentre), pelo Escritório <strong>de</strong> Proprieda<strong>de</strong> Intelectual (UK-IPO) e peloLaboratório Nacional <strong>de</strong> Pesos e Medidas. A política <strong>de</strong> implementaçãoe disseminação <strong>de</strong> pesos e medidas entre o setor privado não estava,entretanto, a cargo do Laboratório, mas sim do Departamento <strong>de</strong> Inovaçãodo SIG. Uma última unida<strong>de</strong> do Departamento <strong>de</strong> Ciência e Inovaçãodo DIUS seria a que coor<strong>de</strong>nava e apoiava a base <strong>de</strong> pesquisas doExecutivo britânico, sobretudo os Research Councils 202 . Já o sucedâneoBIS reformulou pontualmente a antiga estrutura <strong>de</strong>partamental do BIS,rebatizando o primeiro Departamento para “Conhecimento e Inovação”e o segundo para “Empresas e Qualificação” (Business and Skills). ODepartamento <strong>de</strong> Educação (DfE) trabalha em coor<strong>de</strong>nação com o BIS,atuando nas áreas <strong>de</strong> educação superior, ciência, capacitação e formaçãocontinuada, ainda que a responsabilida<strong>de</strong> pelo planejamento e formulação<strong>de</strong> políticas nessas áreas tenha sido enfeixada pelo BIS, do mesmo modocomo antes se passava com o DIUS.Os sete Conselhos <strong>de</strong> Pesquisa do Reino Unido recebem anualmenteentre £ 2,8 e £ 3 bilhões (tendo seu orçamento sido aumentado nobiênio 2011-2012) 203 , capacitando-se como os principais financiadores200O anexo 5.2 reproduz gráfico extraído do Annual Innovation Report 2008 (DIUS, 2008b)com o orçamento completo do Gabinete britânico relativo a 2007.201Para o ano fiscal 2011-2012 o orçamento do BIS, <strong>de</strong>vido à crise financeira inter<strong>nacional</strong>,<strong>de</strong>caiu cerca <strong>de</strong> 7%, situando-se em £ 17,7 bilhões. (consi<strong>de</strong>rando-se a inflação, o corte teráchegado a 10%).202O anexo 5.3 correspon<strong>de</strong> aos organogramas do DIUS e do SIG.203O anexo 5.4 correspon<strong>de</strong> à distribuição do orçamento do BIS para o biênio 2011-2012, entreseus diversos programas e agências.198<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 198 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”governamentais da pesquisa básica, em priorida<strong>de</strong>s escalonadaspela comunida<strong>de</strong> científica, ainda que haja uma orientação geral,consubstanciada nos diversos documentos recentes <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, <strong>de</strong> queo repasse <strong>de</strong> verbas leve em conta o potencial <strong>de</strong> <strong>de</strong>rivação (spinoff)das pesquisas para o setor produtivo. Tais recursos são alocados nãosomente para pesquisa básica in situ, ou seja, nas universida<strong>de</strong>s e centros<strong>de</strong> pesquisa britânicos, mas abarca programas <strong>de</strong> treinamento <strong>de</strong> pessoaldo ensino superior e financiamento <strong>de</strong> parcerias internacionais <strong>de</strong> P&D.Dos sete Conselhos <strong>de</strong> Pesquisa, quatro foram criados a partir <strong>de</strong> 1994: omencionado CCLRC, o Conselho <strong>de</strong> Engenharias e Ciências da Natureza(Engineering and Physical Sciences), Astronomia e Física <strong>de</strong> Partículas(esses três havendo-se <strong>de</strong>sdobrado do antigo Conselho <strong>de</strong> Ciência eEngenharia, assinalando a tendência à especialização das ciências danatureza na aca<strong>de</strong>mia e no governo) e o Conselho <strong>de</strong> Biotecnologiae Ciências Biológicas (este último <strong>de</strong>rivado do antigo Conselho <strong>de</strong>Agricultura e Tecnologia <strong>de</strong> Alimentos, Food Research). Os três outrosConselhos que mantiveram sua <strong>de</strong>nominação e estrutura relativamenteinalteradas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o período entreguerras são o referido Conselho <strong>de</strong>Pesquisas Médicas, o Conselho Econômico Social e o Conselho <strong>de</strong>“Meio Ambiente Natural” (Natural Environment). (Cunningham &Hin<strong>de</strong>r, p. 26, 1998).Os Conselhos financiam a pesquisa em forma muito semelhanteà operada pelo CNPq, por meio <strong>de</strong> bolsas individuais, institucionaise financiamento a projetos integrados <strong>de</strong> pesquisa. Uma diferençaimportante seria a existência <strong>de</strong> uma vasta re<strong>de</strong> <strong>de</strong> laboratórios geridospelos RC e disponibilizados aos cientistas e pesquisadores, adicionalmenteà estrutura oferecida pelas próprias Universida<strong>de</strong>s. Tipicamente,portanto, a pesquisa (e o pesquisador ou pesquisadora) britânica receberecursos <strong>de</strong> três fontes públicas principais: o já mencionado Conselho<strong>de</strong> Financiamento da Educação Superior (Higher Education FundingCouncil – HEFC, que são na verda<strong>de</strong> quatro, um para cada administraçãoautônoma do Reino Unido), o HEIF (também administrado pelo BIS)e os próprios RC 204 . Há, na verda<strong>de</strong>, uma vasta gama <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s204O critério para alocação <strong>de</strong> recursos dos Funding Councils às universida<strong>de</strong>s britânicas<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da avaliação recebida pela instituição nos Research Assessment Exercises, efetuadospor representantes da própria aca<strong>de</strong>mia. Já o critério para alocação <strong>de</strong> verbas para a pesquisa<strong>de</strong> parte dos RC relaciona-se ao interesse do projeto para as linhas e priorida<strong>de</strong>s mantidas pelorespectivo Conselho temático. Ver OCDE, p. 134, 2005.199<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 199 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorentrecruzadas <strong>de</strong> financiamento à pesquisa no país, em níveis privado,governamental e do terceiro setor, como por exemplo o caso da WellcomeTrust, maior financiadora individual <strong>de</strong> pesquisa médica no Reino Unido,com orçamento anual superior ao do MCT, <strong>de</strong> £ 4 bilhões 205 (que chegouinclusive a cofinanciar seminários <strong>de</strong> caráter científico promovidos peloItamaraty) 206 .Cada RC dispõe <strong>de</strong> uma intrincada re<strong>de</strong> institucional, administrativae <strong>de</strong> infraestrutura <strong>de</strong> extensão <strong>nacional</strong> para apoio à pesquisa em suasdiversas áreas, estágios e necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> financiamento. Um dosConselhos, por exemplo, o <strong>de</strong> Biotecnologia e Ciências Biológicas(BBSRC), mantém 21 laboratórios <strong>de</strong> alta tecnologia localizados emdiversas cida<strong>de</strong>s e universida<strong>de</strong>s britânicas, com pesquisas sobre estruturadas proteínas, nanotecnologia, testes e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> novosmedicamentos, genética <strong>de</strong> mecanismos patogênicos, sequenciamentogenético, clonagem animal e vegetal, pesquisas com células-tronco,biossíntese e farmacodinâmica <strong>de</strong> antibióticos e epigenética, entre outrasáreas. Pesquisas financiadas e mantidas pelo BBRSC geraram produtostais como novas vacinas, cosméticos medicinais e terapias genéticasinovadoras. O Conselho dispõe <strong>de</strong> orçamento anual <strong>de</strong> £ 400 milhões(US$ 650 milhões, equivalentes ao orçamento da EMBRAPA) e mantémuma ampla carteira <strong>de</strong> projetos integrados <strong>de</strong> pesquisa com instituições <strong>de</strong>diversos países, como da União Europeia, Japão, China e Índia 207 . Como Brasil, ressalte-se a abertura do laboratório no exterior (LABEX) daEMBRAPA no centro <strong>de</strong> pesquisas <strong>de</strong> Rothamsted, integrado à estruturado BBSRC, corolário dos projetos <strong>de</strong> cooperação entabulados em 2007,ano da parceria científica Brasil-Reino Unido 208 . A partir do exposto, emrelação ao alcance dos projetos mantidos pelos RC, vale notar que aspossibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cooperação do Brasil com o Reino Unido na área <strong>de</strong>C,T&I estão claramente subaproveitadas.205Organograma simplificado da complexa re<strong>de</strong> <strong>de</strong> financiamento à pesquisa no Reino Unidointegra o anexo 5.5 <strong>de</strong>ste trabalho.206Brazil-UK Dialogues on Health and Inequality, realizado na Chancelaria da Embaixadaem Londres nos dias 29 e 30/09/1999, copromovido pela Embaixada e pela London School ofHygiene and Tropical Medicine, e Seminário Brasil-Reino Unido, CNPq/FINEP/MRE-IPRI/Glaxo Wellcome, Rio <strong>de</strong> Janeiro, 18 e 19/11/97.207Informações extraídas da página do BBSRC, .208BBSRC Business, Swindon, janeiro <strong>de</strong> 2009, p. 12.200<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 200 10/10/2011 14:15:48


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”Entre os diversos resultados alcançados com o financiamento dapesquisa <strong>de</strong> parte dos RC, po<strong>de</strong>-se mencionar, entre outros (e não apenasna área biológica), as seguintes <strong>de</strong>scobertas e avanços: i) <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>do antineoplásico temozolamida, para tratamento <strong>de</strong> tumores;ii) tecnologia <strong>de</strong> “livros digitais” da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cambridge, a partir<strong>de</strong> folhas plásticas flexíveis <strong>de</strong> plasma, com carregamento <strong>de</strong> páginas porvia eletrônica; iii) <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> anticorpos sintéticos (CambridgeAntibody Technology e Conselho <strong>de</strong> Pesquisa em Medicina, MRC);iv) <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> catalisadores <strong>de</strong> baixo custo pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong>Oxford, o que permitirá avanço significativo das pesquisas para utilizaçãocomercial do hidrogênio e da célula <strong>de</strong> combustível; v) <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong><strong>de</strong> tecnologia <strong>de</strong> sensoriamento <strong>de</strong> dutos para localização <strong>de</strong> vazamentos,Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> East Anglia; vi) mecanismo externo não invasivo<strong>de</strong> monitoramento da ativida<strong>de</strong> cardíaca, que reduz em até doze diastempos <strong>de</strong> internação, <strong>de</strong>senvolvido pelo King’s College <strong>de</strong> Londres;vii) aperfeiçoamento da quimioluminescência para diagnósticoslaboratoriais, Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cardiff; e até viii) projetos mais prosaicoscomo um talonário digital <strong>de</strong> multas a ser empregado por policiaisbritânicos, <strong>de</strong>senvolvido pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Glasgow, e uma barraca<strong>de</strong> acampamento <strong>de</strong> montagem instantânea, projeto da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong>Bournemouth 209 .Além do complexo <strong>de</strong> pesquisa universitária do país, que reúne 17entre as 100 melhores universida<strong>de</strong>s do mundo e quatro entre as <strong>de</strong>zlí<strong>de</strong>res 210 , o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> pesquisa abriga ainda instituições tradicionaiscomo a Royal Society e a Real Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Engenharia, além <strong>de</strong> amplaestrutura <strong>de</strong> metrologia, normalização e qualida<strong>de</strong> (UK-IPO, LaboratórioNacional <strong>de</strong> Física – NPL e British Standards Institute – BSI), a Fundaçãopara a Ciência e Tecnologia 211 e, especialmente, o National Endowment209Repertório dos avanços científicos da ciência britânica financiada pelos RC consta dapublicação Impacts – successes from UK research, 2007, disponível em .210Times Higher Education Supplement – Word Universities Ranking 2008, disponível em . O índice Shangai Jiao Tong é menos generoso e reduz àmeta<strong>de</strong> o impacto qualitativo da participação das universida<strong>de</strong>s britânicas na lista das melhoresinstituições do mundo (OCDE, p. 130, 2005b).211A Fundação é uma socieda<strong>de</strong> civil sem fins lucrativos que reúne especialistas e representantesdas principais instituições <strong>de</strong> pesquisa do Reino Unido, como os RC, a Royal Society e a Aca<strong>de</strong>miaBritânica <strong>de</strong> Medicina. Mantém publicação com centenas <strong>de</strong> artigos sobre C,T&I (http://www.foundaition.org.uk/).201<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 201 10/10/2011 14:15:48


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorfor Technology, Science and the Arts – NESTA, organização privadasem fins lucrativos, criada em 1998 para apoiar a <strong>inovação</strong> em empresas<strong>de</strong>s<strong>de</strong> suas primeiras fases <strong>de</strong> implantação. Com orçamento anual <strong>de</strong>£ 300 milhões, a entida<strong>de</strong> financia projetos e parcerias para a <strong>inovação</strong>especialmente em setores da “economia criativa” (creative economy), taiscomo jovens empreen<strong>de</strong>dores, <strong>inovação</strong> social e mecanismos financeirosinovadores. Sua carteira <strong>de</strong> programas inclui ações nas áreas culturale <strong>de</strong> patrimônio histórico, <strong>de</strong>sign, convergência digital, saú<strong>de</strong> mental,popularização da ciência, proteção ambiental e indústria cinematográfica.A ativida<strong>de</strong> crucial do NESTA é formar re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho interativoentre tais “setores criativos” e as empresas, <strong>de</strong> diversos portes e áreas<strong>de</strong> atuação. A eficácia <strong>de</strong>sse esquema po<strong>de</strong> ser comprovada pelo nível<strong>de</strong> investimentos privados gerados a partir das dotações da entida<strong>de</strong>, quecapta £ 5 para cada £ 1 investida a título <strong>de</strong> apoio a empreendimentosinovadores (DIUS, p. 36, 2008). O NESTA distingue-se do TechnologyStrategy Board – TSB fundamentalmente por este último ser um órgãogovernamental autônomo (Non-Departamental Public Body), vinculadofuncionalmente ao BIS, voltado para a formação <strong>de</strong> núcleos estratégicos<strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> conhecimento e <strong>de</strong> práticas gerenciais entre o governo,setor privado e centros <strong>de</strong> pesquisa. Além <strong>de</strong> manter as Plataformas <strong>de</strong>Inovação mencionadas acima, o TSB atua em esferas mais “duras” daprodução industrial e do conhecimento científico, fornecendo assessoriae apoio estratégico, financeiro e gerencial para áreas como produçãoavançada, materiais <strong>de</strong> ponta, TIC, eletrônica, fotônica e biociências 212 .Essa vasta gama <strong>de</strong> recursos, apoio técnico, incentivos fiscais,programas e esquemas <strong>de</strong> interação “produção-centros <strong>de</strong> pesquisa”<strong>de</strong>ixaria transparecer, em princípio, uma situação invejável <strong>de</strong> que a<strong>inovação</strong> perpassaria todos os poros do governo e do setor privado e<strong>de</strong> que toda a ativida<strong>de</strong> econômica do país seria enquadrável em algumprograma <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Essa perspectiva é parcialmente correta, na medidaem que há uma gran<strong>de</strong> movimentação <strong>de</strong> amplos setores <strong>de</strong> governo paraalcançar essa meta. Uma falha fundamental <strong>de</strong>ssa estrutura, no entanto,é que seria ainda <strong>de</strong>masiadamente calcada em aspectos <strong>de</strong> oferta, nãocontemplando genuínas <strong>de</strong>mandas do setor privado ou gerando ofertaspara as quais a <strong>de</strong>manda é <strong>de</strong>sinteressada ou inexistente. Essa avaliaçãoé respaldada por outra fraqueza estrutural do SBI, a <strong>de</strong> que a excelência212Ver .202<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 202 10/10/2011 14:15:49


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”inter<strong>nacional</strong> da pesquisa básica não é acompanhada pelo atendimento<strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>s mais elementares <strong>de</strong> formação profissionalizante nempor atitu<strong>de</strong>s das empresas <strong>de</strong> introduzirem em suas rotinas inovações <strong>de</strong>maior impacto e não apenas incrementais (situação oposta à da China,cujo <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> se ressente da baixa intensida<strong>de</strong> da pesquisabásica). Conforme resumiu Peter Nolan, Diretor do Programa “Futurodo Trabalho”, do Conselho <strong>de</strong> Pesquisa Econômico Social,As barreiras para a construção <strong>de</strong> uma força <strong>de</strong> trabalho vibrante, tecnologicamenteavançada e intensiva em conhecimento continuam intransponíveis.O autor acrescenta ainda queMuito da atual abordagem sobre <strong>inovação</strong> é <strong>de</strong> cima para baixo (top-down), adhoc e fragmentada. É centralizada, controladora e voltada primordialmente paraa implementação <strong>de</strong> políticas ofertistas para o mercado <strong>de</strong> trabalho.Ainda segundo ele, faltariam políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> “voltadas para areestruturação das relações e do ambiente <strong>de</strong> trabalho” 213 . Tal avaliaçãoseria ainda corroborada pelo fato <strong>de</strong> o Reino Unido ter ainda 1/3 <strong>de</strong>empresas que não investem em qualquer tipo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, e <strong>de</strong> quegran<strong>de</strong> parte da baixa competitivida<strong>de</strong> relativa da economia britânica(ao menos para padrões da OCDE) <strong>de</strong>ve-se a problemas <strong>de</strong> qualificaçãoda força <strong>de</strong> trabalho.Embora parcela significativa da vertente empresarial doSBI (e também governamental, em certa medida) exerça importanteinfluência negativa sobre os esforços gerais <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> uma “naçãoinovadora”, a economia é marcadamente caracterizada por fundamentosdinâmicos que se refletem em diversos indicadores: as exportações<strong>de</strong> serviços intensivos em conhecimento representaram em 2007 £ 75bilhões – quase o triplo dos valores alcançados em 1997 –, constituindo25% do total das exportações britânicas. Alentado pelo crescimento dasexportações <strong>de</strong> serviços, o superávit comercial alcançou em 2005 3,3%do PIB em 2005, contra 1,8% em 1995 (DIUS, p. 14, 2008). O setor <strong>de</strong>213Nolan, P. & Slater, G. (2003). The Labour Market: History, Structure and Prospects inIndustrial Relations – Theory and Practice, Oxford, Blackwel, apud Taylor, R. (pp. 19-20, 2003).203<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 203 10/10/2011 14:15:49


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior“negócios e indústrias criativas” 214 contribui com cerca <strong>de</strong> £ 60 bilhõesem receitas anuais para a formação do PIB, crescendo em ritmo duasvezes mais rápido que o dos <strong>de</strong>mais setores e empregando 2 milhões <strong>de</strong>trabalhadores (DIUS, p. 32, 2008). Empresas britânicas que investiramem produtos com incorporação <strong>de</strong> novos <strong>de</strong>signs cogitaram obter umataxa <strong>de</strong> retorno <strong>de</strong> 50% <strong>de</strong>sses investimentos em 2004, quando ao final seconfirmou que esse retorno foi <strong>de</strong> 75% (DIUS, p. 33, 2008b). Indicadorescomo patentes, contratos <strong>de</strong> licenciamento, proprieda<strong>de</strong> intelectual,consultorias e contratos <strong>de</strong> pesquisa tiveram crescimento exponencial,conforme indicado no quadro 5.1 a seguir:Quadro 5.1 – indicadores <strong>de</strong> interação universida<strong>de</strong>-empresa noReino Unido (DIUS, p. 26, 2008b)A força da economia britânica situa-se, portanto, em ativida<strong>de</strong>sultraintensivas em conhecimento e pouco ou nada intensivas em matérias--primas e trabalho não qualificado, concentrando-se nos setores <strong>de</strong>serviços, indústrias criativas e alta tecnologia, entre os quais <strong>de</strong>spontama indústria farmacêutica/biotecnológica e a aeroespacial que, juntas,respon<strong>de</strong>m por mais <strong>de</strong> 30% das taxas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong> investimentosprivados em R&D. Desse montante, a indústria farmacêutica é a gran<strong>de</strong>214Compreen<strong>de</strong> setores como propaganda e marketing, arte e antiguida<strong>de</strong>s, moda e <strong>de</strong>sign,indústrias cinematográfica e fonográfica, softwares interativos, artes cênicas, publicida<strong>de</strong>, rádioe TV e mesmo o “circo” da Fórmula 1 (DIUS, p. 95, 2008). Estudo <strong>de</strong> impacto e profundida<strong>de</strong>sobre o estado da economia criativa nos países do Sul é o UNDP/UNCTAD: 2010, em que sãoabordadas 46 <strong>de</strong> suas manifestações, em distintos países, <strong>de</strong> modo mais completo e pormenorizado.204<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 204 10/10/2011 14:15:49


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”estrela da “economia impon<strong>de</strong>rável britânica” (weightless economy),com 25% da <strong>inovação</strong> industrial privada e dos investimentos em P&D(Business Expenditure on Research and Development – BERD) (OCDE,p. 116, 2005b). Duas indicações da pujança da indústria biotecnológicabritânica são os aludidos £ 4 bilhões anuais do orçamento da WellcomeTrust para ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> P&D e a <strong>de</strong>stinação pelo então DIUS <strong>de</strong> £ 200milhões para a reconstrução e remo<strong>de</strong>lamento do Laboratório <strong>de</strong> BiologiaMolecular da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cambridge, do qual saíram mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>zgran<strong>de</strong>s empresas do setor 215 .Ao final <strong>de</strong> 2003, o Reino Unido possuía 455 companhiasfarmacêuticas e <strong>de</strong> biotecnologia, empregando 22.400 pessoas eabsorvendo 10% <strong>de</strong> toda a P&D mundial do setor (Nickel & Van Reenen,p. 33, 2001 e Smith & Bagchi-Sen, p. 380, 2006), consistindo no segundomaior complexo industrial <strong>de</strong> todo o mundo, ainda que bastante atrásdos Estados Unidos. Nesse setor,(...) o Reino Unido apresenta um mo<strong>de</strong>lo altamente competitivo, cujos elementoscompreen<strong>de</strong>m um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> que abriga uma elite científica mundial,um <strong>sistema</strong> universitário empreen<strong>de</strong>dor (an entrepreneurial university system) eum <strong>sistema</strong> regulatório pragmático, que abarca simultaneamente aspectos legais,comerciais e éticos (Smith & Bagchi-Sen, p. 372, 2006) 216 .Subsiste, no entanto, uma gran<strong>de</strong> contradição no SBI que não secoaduna com os indicadores <strong>de</strong> crescimento e <strong>inovação</strong> dos setoresfarmacêutico, aeroespacial (aos quais se po<strong>de</strong>ria agregar toda a área<strong>de</strong> informática e computação aplicada aos setores industriais <strong>de</strong> altatecnologia), serviços e indústrias criativas. Apesar <strong>de</strong> esses setoresocuparem a maior e mais dinâmica parcela do PIB britânico – que porsua vez vinha experimentando expansão ininterrupta até a eclosão dacrise financeira mundial no quarto trimestre <strong>de</strong> 2008 – e <strong>de</strong> geraremcrescentes investimentos em P&D, o nível geral <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>caiu<strong>de</strong> 2.4% em 1981 para os atuais 1,9%, enquanto os níveis <strong>de</strong> Japão, EUA,215O Laboratory of Molecular Biology produziu treze prêmios Nobel, o último <strong>de</strong>les em 2002,tendo sido ainda a instituição on<strong>de</strong> a estrutura e o sequenciamento do DNA foram <strong>de</strong>scobertos.No mesmo LMB foi <strong>de</strong>senvolvido o antineoplásico Herceptin e <strong>de</strong>senvolvidas pesquisas comanticorpos monoclonais para o tratamento da asma (DIUS/HMT/DSCF, p. 13, 2008).216O anexo 5.5 correspon<strong>de</strong> a mapa do setor <strong>de</strong> biotecnologia e da indústria farmacêutica noReino Unido, extraído <strong>de</strong> New Scientist, nº 2576, edição <strong>de</strong> 04/11/2006.205<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 205 10/10/2011 14:15:49


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorOCDE e UE cresceram no mesmo período, conforme se po<strong>de</strong> verificarno gráfico 5.2 abaixo:Gráfico 5.2 – Evolução do investimento bruto em P&D <strong>de</strong> paísese blocos econômicos, 1981-2003 (OCDE, p. 110, 2005b)Hipótese mais propalada para esse <strong>de</strong>sempenho contraditório apontajustamente para a concentração das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> nos setoresmencionados acima, que por terem <strong>de</strong>sempenho excepcional a partir <strong>de</strong>variáveis intangíveis e <strong>de</strong> difícil mensuração/operacionalização, geramuma ativida<strong>de</strong> inovadora “oculta” que não vem a ser apreendida pelosindicadores tradicionais. A P&D realizada nesses setores inovadoresaparenta ser <strong>de</strong>sproporcionalmente menor que o PIB gerado pelaexpansão <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s.Hipótese complementar à anterior é a heterogeneida<strong>de</strong> dos setorese estruturas industriais no Reino Unido no que tange à relação entreinvestimentos em P&D e participação <strong>de</strong>sses setores nas exportações(industrial mix): enquanto os gastos em P&D na indústria farmacêuticarepresentam 25% do total do setor privado, a proporção <strong>de</strong> suasexportações na pauta britânica correspon<strong>de</strong> a menos <strong>de</strong> 10%, sendo quesetores industriais <strong>de</strong> menor intensida<strong>de</strong> tecnológica (tabaco, vestuário,papel, petróleo) ocupam parcela expressiva das exportações industriais(sempre recordando que os serviços e os manufaturados <strong>de</strong> alto valoragregado dominam amplamente as exportações) 217 . Desse modo, os217O anexo 5.6 traz o gráfico das exportações britânicas em 2007. Tabelas pormenorizadas como <strong>de</strong>sempenho da balança comercial do Reino Unido (assim como os resultados consolidados206<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 206 10/10/2011 14:15:49


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”elevados percentuais <strong>de</strong> investimento em P&D em setores <strong>de</strong> pontaacabam sub-representados no quadro geral dos investimentos em P&D<strong>de</strong> todo o país. Fator adicional a ser consi<strong>de</strong>rado para o nível maisbaixo <strong>de</strong> 1,9% <strong>de</strong> investimento geral <strong>de</strong>corre do recuo do financiamentogovernamental (próprio e dirigido ao setor privado), especialmente dapesquisa para o setor <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa, que teve a queda mais pronunciada noperíodo 1980-2000 entre os países do G-8 (OCDE, p. 114, 2005b) 218 .Vista sob o ângulo da “<strong>inovação</strong> oculta”, a competitivida<strong>de</strong> daeconomia britânica po<strong>de</strong> ser ainda mais expressiva, uma vez que haveriauma vasta gama <strong>de</strong> investimentos em setores mais tradicionais que nãopo<strong>de</strong>m ser contabilizados ou <strong>de</strong>finidos como P&D inovadoras, conformeestipulado nos mo<strong>de</strong>los e manuais oficiais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (Oslo e Frascati).Exemplos <strong>de</strong>ssa distorção metodológica incomensurável po<strong>de</strong>riam sera recombinação <strong>de</strong> novas e antigas tecnologias em ativida<strong>de</strong>s comoprospecção <strong>de</strong> petróleo e o transbordamento <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s inovadoras <strong>de</strong>indústrias criativas sobre os setores tradicionais da economia, gerandoefeito multiplicador e sub-representando o efeito da <strong>inovação</strong> nessasativida<strong>de</strong>s 219 (um exemplo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> oculta no Brasil seriam os longose intensivos investimentos em pesquisa agropecuária, cujo produtonão po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado inovador, mas cujos resultados e ativida<strong>de</strong>sgeram impactos cumulativos e <strong>de</strong> longo prazo em outros elos da ca<strong>de</strong>iaprodutiva, especialmente em setores como saú<strong>de</strong> e biotecnologia).O fato é que expressões como “industrial mix”, “<strong>inovação</strong> oculta”,“indústrias criativas” e “economia impon<strong>de</strong>rável” correspon<strong>de</strong>m acategorias econômicas tipicamente britânicas e que remetem a formasheterodoxas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> que ajudam, por sua vez, a elucidar certosparadoxos, como o aparentemente baixo investimento em P&D, ado balanço <strong>de</strong> pagamentos) constam <strong>de</strong> Bun<strong>de</strong>y/Office for National Statistics, pp. 33 e 43,2008 (“Livro Rosa” do balanço <strong>de</strong> pagamentos, http://www.statistics.gov.uk/downloads/theme_economy_PinkBook_2008_final.pdf).218O mesmo texto da OCDE (p. 115) estima que entre 60% e 80% da diferença <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenhoinovador entre o Reino Unido e os <strong>de</strong>mais países da Organização (com exceção dos EUA) <strong>de</strong>ve-sea efeitos <strong>de</strong> misturas estatísticas (industrial mix) entre setores industriais.219Documento do NESTA (p. 20, 2007) estabeleceu uma tipologia da “<strong>inovação</strong> oculta” queprivilegia a <strong>inovação</strong> em processos e em escala micro, em quatro modalida<strong>de</strong>s: a) <strong>inovação</strong> ocultabaseada em C&T e excluída <strong>de</strong> indicadores tradicionais; b) <strong>inovação</strong> não científico-tecnológicabaseada em novas formas e processos organizacionais; c) <strong>inovação</strong> baseada na recombinação <strong>de</strong>novas tecnologias e processos (“<strong>inovação</strong> arquitetônica”); e d) inovações <strong>de</strong>tectáveis somenteapós um longo período <strong>de</strong> acúmulo incremental em organizações ou setores da economia, comoo aprimoramento <strong>de</strong> técnicas pedagógicas <strong>de</strong> ensino, por exemplo.207<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 207 10/10/2011 14:15:49


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorainda insatisfatória (para padrões da OCDE) interação entre pesquisa eprodução, a relativamente baixa qualificação em setores intermediáriosda escala <strong>de</strong> qualificação profissional, a profusão <strong>de</strong> programas, reformasinstitucionais e políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (algumas vezes conflitantes) e adificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> o setor privado transpor o nível <strong>de</strong> 1,25% do PIB parainvestimentos em <strong>inovação</strong>. Apesar das teorias evolucionistas teremna intangibilida<strong>de</strong> um ponto-chave para a caracterização dos <strong>sistema</strong>s<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (mais calcada em fatores <strong>de</strong> aprendizado e <strong>de</strong> absorçãotecnológica), os britânicos costumam exacerbar essa intangibilida<strong>de</strong>ao atribuir caráter central a aspectos da <strong>inovação</strong> ainda inexploradosna literatura econômica e que mais se relacionariam a processoscognitivos: pensamento crítico e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte; incentivo aos <strong>de</strong>bates eà iniciativa para a solução <strong>de</strong> problemas; transmissão <strong>de</strong> conhecimentotácito por mecanismos informais; formação <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s internacionais<strong>de</strong> conhecimento; trabalho em equipe; habilida<strong>de</strong>s analíticas; erelacionamentos pessoais com colegas, clientes e fornecedores (DIUS,pp. 65-66, 2008). Não representa, <strong>de</strong>ssa forma, nenhuma coincidênciaque o percentual da força <strong>de</strong> trabalho empregada em ativida<strong>de</strong>s intensivasem conhecimento no Reino Unido supere inclusive o dos EUA 220 . Trata-se,em suma, <strong>de</strong> uma economia em que predomina amplamente o setor <strong>de</strong>serviços – conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> do Quadro 5.6 abaixo – altamenteintensiva em conhecimento, caracterizada por interconexões criativas –em gran<strong>de</strong> medida impon<strong>de</strong>ráveis – entre seus elementos componentese que aprimora regularmente a forma e as modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> geração <strong>de</strong>riqueza 221 .220“Making Innovation Flourish”, Conferência da Secretária <strong>de</strong> Estado (Ministra) <strong>de</strong> Cultura,Mídia e Esportes, Tessa Jowell, Londres, 26/10/06, disponível em .221Quah (pp. 1-2, 1999) <strong>de</strong>fine “economia impon<strong>de</strong>rável” pela forte presença <strong>de</strong> ao menos quatroativida<strong>de</strong>s essenciais do setor <strong>de</strong> serviços: a) TIC; b) proprieda<strong>de</strong> intelectual, patentes, direitos <strong>de</strong>autor, marcas <strong>de</strong> comércio, propaganda, serviços <strong>de</strong> consultoria, educação e serviços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>;c) bancos <strong>de</strong> dados e bibliotecas eletrônicas, mídia, entretenimento e produção televisiva;e d) biotecnologia, bancos <strong>de</strong> DNA e processos farmacêuticos. Não fica claro no texto o porquêda indispensabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssas duas últimas categorias, em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> possíveis outras.208<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 208 10/10/2011 14:15:49


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”Quadro 5.3 – PIB real por setor (% do PIB) (EIU, p. 17, 2008)Antes <strong>de</strong> passar para uma breve análise dos mecanismos (meta)inovadores <strong>de</strong> estímulo da expansão sustentável e sustentada da economiabritânica, tal como formulados no documento Innovation Nation, e antes<strong>de</strong> encerrar esta breve caracterização do SBI em sua vertente econômico--empresarial, cabe um comentário sobre uma ativida<strong>de</strong> crucial para o setor<strong>de</strong> serviços e, consequentemente, para a economia britânica e para aspolíticas e a economia da <strong>inovação</strong>. Um tanto estranhamente, o setor <strong>de</strong>turismo não é citado uma única vez sequer em documentos primordiais<strong>de</strong> formulação <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Reino Unido, tais como ocitado Innovation Nation, o A Race to the Top, preparado pelo ex-GCSAdo país, e o Annual Innovation Report 2008. De fato, trata-se <strong>de</strong> setorque gerou £ 86,5 bilhões em divisas em 2007, com 123,5 milhões <strong>de</strong>visitantes domésticos e 32.6 milhões <strong>de</strong> outros países, respon<strong>de</strong>ndo pormais <strong>de</strong> 10% das receitas <strong>de</strong> serviços gerada no país e mais <strong>de</strong> 2 milhões<strong>de</strong> empregos 222 . Uma possível explicação para tais omissões – ainda assimpouco convincente –seriam os seguidos cortes no orçamento da agênciaoficial <strong>de</strong> promoção do turismo no país, a Visit Britain.A exploração econômica do turismo no Reino Unido representaria, naverda<strong>de</strong>, o aspecto mais evi<strong>de</strong>nte e <strong>de</strong> impacto imediato sobre o cidadãocomum quanto à capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do país, uma vez que abarcainúmeras ativida<strong>de</strong>s e conceitos enquadráveis na <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>.Basta comparar, sob uma outra perspectiva, <strong>de</strong> como é insatisfatório oaproveitamento econômico do turismo em culturas tão ou até mais ricasque a britânica, como a peruana, a colombiana ou a mexicana, somentepara ficarmos nos exemplos latino-americanos 223 . A capacida<strong>de</strong> britânica<strong>de</strong> investir e <strong>de</strong> inovar na indústria do turismo, a partir do remo<strong>de</strong>lamento222UK’s Tourism Alliance – Facts & Figures, Londres, Tourism Alliance, 2008, .223O Brasil possui, juntos, mais reservas da biosfera na região da Mata Atlântica e monumentos dopatrimônio mundial da UNESCO que o Reino Unido, embora atraia vinte vezes menos visitantesdomésticos e sete vezes menos estrangeiros a cada ano, em relação àquele país.209<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 209 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorcompleto e periódico e da geração incessante <strong>de</strong> novas atrações, constituimo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> gerenciamento que mereceria ser estudado mais <strong>de</strong>tidamente.5.3 – “Nação Inovadora”, meta-<strong>inovação</strong> e “<strong>inovação</strong> total”O incessante re<strong>de</strong>senho das funções e instituições <strong>de</strong> gestão e apoioà <strong>inovação</strong> no Governo britânico culminou com a criação, em junho<strong>de</strong> 2009, do BIS, sendo que o então Primeiro-Ministro Gordon Brownpromovera ampla e profunda reforma estrutural do Gabinete logo após suachegada a Downing Street, em junho <strong>de</strong> 2007. Fora extinto o Departmentof Tra<strong>de</strong> and Industry – DTI e gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> suas funções transferidapara o DIUS, que também havia enfeixado uma série <strong>de</strong> competênciasantes da alçada do também extinto Department for Education and Skills(DfEE), substituído, por sua vez, pelo Department for Children, Schoolsand Families. A outra parte das competências do DTI foi assumida peloDepartment for Business, Enterprise and Regulatory Reform (BERR),que passou a trabalhar em estreita coor<strong>de</strong>nação e, até certo ponto, soba orientação do DIUS, consi<strong>de</strong>rando a inversão <strong>de</strong> políticas promovidapela reforma: se antes o OSI era uma unida<strong>de</strong> do DTI, agora o DIUS,por força <strong>de</strong> seu orçamento substancialmente ampliado e maior queo do BERR, passou em gran<strong>de</strong> medida a comandar a política <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> empresarial do Reino Unido. Com o advento do BIS,essa equação novamente tornou-se a inverter, com a política <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>agora subordinada à política produtiva. Num país marcado pela amplaparticipação do setor <strong>de</strong> serviços na economia, a política <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>passou a confundir-se com a própria política <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>,com maior impacto que as políticas industrial, <strong>de</strong> crescimento,<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico e educacional juntas. Nessesentido, a política <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> converteu-se mais propriamente numapolítica <strong>de</strong> meta-<strong>inovação</strong>, orientada basicamente a instruir os setoresda economia e os órgãos <strong>de</strong> Estado a continuamente promoverem a<strong>inovação</strong>. O notável pragmatismo britânico <strong>de</strong> remo<strong>de</strong>lar suas instituiçõessem nenhuma hesitação representa manifestação do ímpeto inovador noe do setor público e contrasta com a falsa imagem <strong>de</strong> tradicionalismoe <strong>de</strong> arcaísmo que caracterizam muitos <strong>de</strong> seus estereótipos culturais.Des<strong>de</strong> a divulgação do relatório do DTI Our Competitive Future, <strong>de</strong>1998, o governo trabalhista vinha montando um argumento para mobilizar210<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 210 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”o aparato <strong>de</strong> Estado com vistas à disseminação <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>,projeto que alcançava resultados limitados por conta da estruturainstitucional que não propiciava ascendência tanto do OST, quanto <strong>de</strong>poisdo OSI, sobre o Whitehall. A criação <strong>de</strong> um DIUS munido <strong>de</strong> maiorespo<strong>de</strong>res que seus pre<strong>de</strong>cessores indicou que o Gabinete operaria commaior coor<strong>de</strong>nação e que o <strong>de</strong>sempenho da economia e o bem-estarda socieda<strong>de</strong> teriam <strong>de</strong> ser medidos por novos conceitos, indicadores,políticas e fórmulas <strong>de</strong> prosperida<strong>de</strong>. Tal revolução conceitual nãosignificou, no entanto, que se proce<strong>de</strong>ria a uma transformação radical nasocieda<strong>de</strong> e na economia – método incongruente com o estilo e a culturabritânicas – mas antes representaria uma tradução, <strong>sistema</strong>tização ea<strong>de</strong>quação <strong>de</strong>sses novos argumentos à realida<strong>de</strong> do país, diante dos novos<strong>de</strong>safios do cenário inter<strong>nacional</strong>, antepostos sobretudo pela crescenteinfluência econômica dos países emergentes, tal como expressamenteconsignado no preâmbulo do relatório “A Race to the Top” (Turville,pp. 3-14, 2007).O documento Innovation Nation do DIUS representaria assim umroteiro e um breviário <strong>de</strong> como essa nova visão <strong>de</strong>veria ser assumidapelo governo e pela socieda<strong>de</strong>, em sua condição <strong>de</strong> agentes da <strong>inovação</strong>.Enquanto textos prece<strong>de</strong>ntes consistiam em recomendações, diretrizes,diagnósticos e estudos comparados, o novo documento correspon<strong>de</strong> antesa um manifesto político mobilizador, com metas e tarefas <strong>de</strong>lineadas paraos diversos componentes do SBI.O “Livro Branco” britânico da <strong>inovação</strong>, como também éconhecido o Innovation Nation, foi fruto <strong>de</strong> amplo e <strong>de</strong>moradoprocesso <strong>de</strong> consultas a inúmeros segmentos da socieda<strong>de</strong>britânica, que consistiu <strong>de</strong> nove gran<strong>de</strong>s seminários promovidospela Confe<strong>de</strong>ração Britânica <strong>de</strong> Indústrias (CBI), Design Council,Instituto Demos (o mesmo que publicou os diversos volumes do Atlasof I<strong>de</strong>as sobre <strong>inovação</strong> em países emergentes, inclusive o Brasil),NESTA, Fundação <strong>de</strong> Estudos sobre o Trabalho (Work Foundation),entre outros. Foi aberto um blog para discussão <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias formuladaspela socieda<strong>de</strong> civil, tendo sido elaboradas e submetidas ao DIUS280 propostas formais <strong>de</strong> políticas para a elaboração do documento.O NESTA celebrou esse processo como “uma política <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>produzida <strong>de</strong> maneira inovadora” (an innovation policy producedin an innovative way) (NESTA, p. 01, 2008).211<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 211 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorO documento aprofundou e transformou, <strong>de</strong>ssa forma, o conceitoconsagrado <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> ao transpor as fronteiras tradicionais que<strong>de</strong>limitam as responsabilida<strong>de</strong>s e competências <strong>de</strong> cada setor: o Governopassa a ser responsável direto pela produção <strong>de</strong> pesquisa e conhecimento,inclusive na Administração Direta fora das Universida<strong>de</strong>s; passa a utilizarestratégias e indicadores <strong>de</strong> eficiência próprios da iniciativa privada(inclusive introduzindo empresários e especialistas do setor privado nogoverno – DIUS, 2008:05); as universida<strong>de</strong>s começam a operar e a atuarsegundo a lógica do setor privado 224 ; e as empresas realizam ativida<strong>de</strong>scientíficas, inclusive ciência básica <strong>de</strong> ponta, retroalimentando programas<strong>de</strong> pesquisa e políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> para o governo e as universida<strong>de</strong>s.Esse novo <strong>sistema</strong> po<strong>de</strong>ria, portanto, ser <strong>de</strong>finido como <strong>de</strong> meta-<strong>inovação</strong>,com o governo estabelecendo políticas e programas inovadores paraórgãos e entida<strong>de</strong>s incumbidas <strong>de</strong> promover a <strong>inovação</strong> na indústria,nos serviços, nos centros <strong>de</strong> pesquisa e na universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> modo geral.O livro branco “Innovation Nation” buscou introduzir uma série <strong>de</strong>iniciativas meta-inovadoras do SBI, po<strong>de</strong>ndo-se indicar, entre as maisimportantes:i) Criação <strong>de</strong> um novo indicador <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, montado em 2009e adotado a partir <strong>de</strong> 2010, sob a coor<strong>de</strong>nação do NESTA,com o propósito <strong>de</strong> abarcar uma série <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s sociais eeconômicas inovadoras difíceis <strong>de</strong> serem capturadas com ouso dos indicadores tradicionais, normalmente utilizados pororganizações multilaterais como a UE, a OCDE e as NaçõesUnidas. Esse ponto somente em aparência é <strong>de</strong> natureza maistécnica ou estatística, comprovando a obsessão britânica com oemprego e o aperfeiçoamento sistemático <strong>de</strong> indicadores parasuas diversas ativida<strong>de</strong>s econômicas. Tal preocupação reflete oentendimento <strong>de</strong> que políticas <strong>de</strong> governo somente po<strong>de</strong>rão sereficazes caso haja pleno conhecimento empírico dos problemas aserem enfrentados e das soluções a serem implementadas (DIUS,pp. 49-89, 2008);224A Embaixada da França em Londres parafraseou trecho do Innovation Nation no qual afirmaque o governo operou “(...) uma mudança <strong>de</strong> cultura no âmago das universida<strong>de</strong>s britânicas nosúltimos anos: a integração da pesquisa e da cooperação com as empresas tornou-se elementoconstitutivo integral da missão universitária” (Ambassa<strong>de</strong> <strong>de</strong> France au Royaume Uni – ServiceScience et Technologie, p. 09, 2008).212<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 212 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”ii) As principais meta-inovações referem-se a um esforço <strong>de</strong>disseminação <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> entre os setores <strong>de</strong>governo e da iniciativa privada encarregados <strong>de</strong> promover a<strong>inovação</strong>, propostas que se consubstanciaram na criação <strong>de</strong>instituições e centros <strong>de</strong> pesquisa específicos sobre o tema,sobretudo na própria esfera governamental. Seriam quatro asiniciativas nesse plano contempladas no Innovation Nation:- Criação <strong>de</strong> um núcleo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Whitehall (WhitehallInnovation Hub), com vistas a manter um banco <strong>de</strong> boaspráticas inovadoras no governo que possam ser transplantadasa diversos órgãos da administração, por intermédio <strong>de</strong> esquemas<strong>de</strong> envolvimento <strong>de</strong> usuários e provedores e <strong>de</strong> reformaincremental e constante dos <strong>sistema</strong>s <strong>de</strong> gerenciamento doserviço público. A implementação do núcleo esteve a cargodo Instituto Sunningdale, da Escola Nacional <strong>de</strong> Governo doReino Unido (National School of Government). Paralelamenteà implantação do núcleo, o Gabinete estabeleceu uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong>li<strong>de</strong>ranças inovadoras no serviço público para a troca diretae inter<strong>de</strong>partamental (Interministerial) <strong>de</strong> experiências nasrespectivas áreas, servindo <strong>de</strong> grupo assessor e consultivopara práticas inovadoras no governo e elaboração <strong>de</strong> subsídiose compilação <strong>de</strong> dados para constar nos relatórios anuais <strong>de</strong><strong>inovação</strong> (Annual Innovation Report) 225 . Além <strong>de</strong>ssas duasiniciativas no campo governamental, o NESTA foi encarregado<strong>de</strong> estruturar um “Laboratório <strong>de</strong> Inovação para o Setor Público”que, além <strong>de</strong> estimular a interação entre órgãos <strong>de</strong> governo,a partir <strong>de</strong> um recorte bottom-up <strong>de</strong> práticas, programas econteúdos convergentes, tem a missão <strong>de</strong> acompanhar e testarsugestões para o serviço público produzidas na aca<strong>de</strong>mia eorganismos multilaterais <strong>de</strong> acompanhamento da <strong>inovação</strong>,especialmente a OCDE (DIUS, pp. 74-75, 2008);- talvez a iniciativa mais ousada para o estudo sistemáticodas condições para o florescimento da <strong>inovação</strong> no governo225O “Annual Innovation Report” 2010 foi divulgado em 25/01/2011 pelo BIS, e está disponível(assim como seu sumário executivo) no portal .É publicado regularmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2007, ano da divulgação do relatório “ARace to the Top”, encomendado por Lord Sainsbury.213<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 213 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniore na socieda<strong>de</strong> seja a criação do Centro <strong>de</strong> Pesquisassobre Inovação (Innovation Research Centre), unida<strong>de</strong>in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte que reúne a pesquisa da aca<strong>de</strong>mia com arealizada especificamente pelo governo para o atendimento<strong>de</strong> suas necessida<strong>de</strong>s específicas no campo da <strong>inovação</strong>. Ocentro, conjuntamente mantido pelo BIS, NESTA, TSB eConselho <strong>de</strong> Pesquisa Econômico-Social (ESRC) preten<strong>de</strong>converter-se numa unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> ponta sobre otema, privilegiando, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o princípio, extensa cooperação erealização <strong>de</strong> pesquisas com entida<strong>de</strong>s congêneres <strong>de</strong> outrospaíses. No Brasil, a Escola Nacional <strong>de</strong> Administração Pública– ENAP e o Instituto Nacional <strong>de</strong> Pesquisas EconômicasAplicadas – IPEA po<strong>de</strong>riam, mutatis mutandis, <strong>de</strong>senvolverprojetos conjuntos <strong>de</strong> pesquisa para a incubação <strong>de</strong> práticasinovadoras na Administração Pública e futuramente vir acooperar com esse Centro britânico <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (DIUS, p.49, 2008; e página web www.ukirc.ac.uk/);- o BERR e o DIUS mantiveram tratativas com a “FundaçãoPeter Jones” (voltada para o oferecimento <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>se treinamento <strong>de</strong> jovens para o “empreen<strong>de</strong>dorismo”) para acriação <strong>de</strong> uma “Aca<strong>de</strong>mia Nacional da Empresa” (NationalEnterprise Aca<strong>de</strong>my), lançada em setembro <strong>de</strong> 2009 e cujafunção é a <strong>de</strong> formar jovens em situação <strong>de</strong> risco social parao aprendizado, em nível técnico, <strong>de</strong> práticas gerenciais e <strong>de</strong>administração necessárias ao ambiente empresarial do país.Trata-se, como <strong>de</strong>finiu o responsável pela sua implementaçãoe diretor da Fundação, <strong>de</strong> “levar o ambiente das reuniões<strong>de</strong> Conselho <strong>de</strong> Administração <strong>de</strong> Empresas para a sala <strong>de</strong>aula” 226 . Paralelamente a essa iniciativa, o governo vinhainvestindo (antes da eclosão da crise <strong>de</strong> 2008) mais <strong>de</strong> £ 1bilhão anuais no programa “Treinar para Ganhar” (Train toGain), que consiste em promover a qualificação profissional<strong>de</strong> jovens e a introdução <strong>de</strong> técnicas <strong>de</strong> aprimoramento dagestão empresarial, sobretudo em PME (entre <strong>de</strong>z e 250empregados), a partir <strong>de</strong> estatísticas que assinalam que226National Enterprise Aca<strong>de</strong>my – Fundação Peter Jones (www.peterjonesfoundation.org/nea.html) e DIUS, p. 61, 2008.214<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 214 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”meta<strong>de</strong> dos prejuízos em linhas <strong>de</strong> produção e processos <strong>de</strong>criação e <strong>de</strong>sign são causados por funcionários com escassoou nenhum tipo <strong>de</strong> treinamento profissional/gerencial (DIUS,pp. 63-64, 2008); e- a quarta medida no campo da aprendizagem para a <strong>inovação</strong>contemplada no Innovation Nation é a instituição <strong>de</strong> 17novas especializações (“Diplomas”) como alternativas àformação universitária, voltadas especificamente para incutiro tema da <strong>inovação</strong> empresarial em jovens egressos doensino secundário. Essas especializações passam a oferecerdisciplinas obrigatórias como “Empresa e <strong>de</strong>sign inovador”e “Estudos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> aplicados à engenharia, à empresa eaos avanços tecnológicos” (DIUS, p. 68, 2008).iii) A proposta que causou maior <strong>de</strong>bate e interesse na imprensae entre os analistas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Reino Unido, citada nocomeço do capítulo, foi a adoção do “Cupom-<strong>inovação</strong>”(Innovation Voucher), por meio do qual uma PME po<strong>de</strong>ráadquirir serviços <strong>de</strong> consultoria e apoio para a realização <strong>de</strong>reformas em seu <strong>sistema</strong> produtivo e <strong>de</strong> serviços ou em suastécnicas <strong>de</strong> gerenciamento e administração. De valor variável(situam-se entre £ 3.500 e £ 5.000), os cupons po<strong>de</strong>m serapresentados a instituições <strong>de</strong> pesquisa em universida<strong>de</strong>s ouinstitutos <strong>de</strong> formação profissionalizante (Further Education).O governo espera que os cupons, emitidos pelo BIS (antes,pelo DIUS e pelo BERR), em associação com o TSB e as“Agências <strong>de</strong> Desenvolvimento Regional” (RDA), superem atimi<strong>de</strong>z e a hesitação <strong>de</strong> pequenos empresários com potencialinovador e <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico <strong>de</strong> adotaremmecanismos inovadores <strong>de</strong> produto e <strong>de</strong> processo em suasfirmas. Os cupons visam ainda a reduzir os custos <strong>de</strong> aquisição<strong>de</strong> novas tecnologias, a intensificar o fluxo <strong>de</strong> conhecimentosentre universida<strong>de</strong> e empresa e a estimular a utilização <strong>de</strong>programas governamentais <strong>de</strong> fomento à <strong>inovação</strong> por parte<strong>de</strong>ssas empresas. Conforme explicita o Livro Branco,(...) na Inglaterra, cerca <strong>de</strong> 500 empresas receberão o cupom para trabalhar comuma entida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisa e produção <strong>de</strong> conhecimento <strong>de</strong> sua livre escolha,215<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 215 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorcom a meta <strong>de</strong> ampliação do esquema para ao menos 1.000 cupons/ano até2011, na medida em que o programa se mostre útil e eficiente para as empresas(DIUS, pp. 36-37, 2008) 227 .iv) A mais ousada medida meta-inovadora constante do InnovationNation é certamente o “po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> inovar” (Power to Innovate),que permite ao Ministério da Criança, Escolas e Famílias (DSCF)suspen<strong>de</strong>r ou modificar legislação que esteja atravancandomedidas inovadoras para elevar os padrões educacionais nasescolas. Diretores <strong>de</strong> estabelecimentos <strong>de</strong> ensino da alçada doDSCF po<strong>de</strong>rão pleitear a suspensão por um tempo limitado <strong>de</strong>regulamentos que obstaculizem a aplicação <strong>de</strong> medidas inovadorasno ensino fundamental, secundário e profissionalizante, ou ainda oteste, por intermédio <strong>de</strong> projetos-piloto, <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias inovadoras compotencial <strong>de</strong> aprimorar o <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> alunos ou aprendizes.Diante da aplicação bem-sucedida do princípio <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2002pelo DSCF, o Gabinete <strong>de</strong>verá ampliar a experiência a outrosMinistérios e programas, permitindo que funcionários quetrabalham na linha <strong>de</strong> frente da prestação dos serviços públicospossam experimentar formas novas e mais eficientes <strong>de</strong> realizarseu trabalho (DIUS, p. 76, 2008). A i<strong>de</strong>ia subjacente à medida,além <strong>de</strong> estimular o serviço público a introjetar valores epráticas inerentes à <strong>inovação</strong>, é o <strong>de</strong> superar forças inerciais naadministraçãoconcebidas não para criar os incentivos, espaços e iniciativas para a <strong>inovação</strong>,[forças que] freqüentemente geram barreiras e pronunciada aversão ao risco(DIUS, p. 73, 2008).Ainda segundo o Livro Branco, a abordagem tradicional <strong>de</strong> prestaçãodo serviço público britânico, baseada numa concepção mecanicistaestímulo-resposta, ou <strong>de</strong>manda-resultado (input-output focus) estaria<strong>de</strong>fasada em relação às exigências <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização, agilida<strong>de</strong> e imposição227O Innovation Nation reconhece que o esquema já vem sendo adotado em outros paísese administrações regionais britânicas. Um exemplo seria a Irlanda, on<strong>de</strong> o projeto funcionahá anos, financiado por fundos estruturais da UE e pela Enterprise Ireland, com o valor <strong>de</strong>Є 5.000,00 por cupom. Ver o folheto do programa em .216<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 216 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”<strong>de</strong> padrões <strong>de</strong> eficiência e <strong>de</strong> “<strong>inovação</strong> total” na administração. Talenfoque rígido, ao invés <strong>de</strong> privilegiar estratégias mais eficientes,(...) po<strong>de</strong>m criar incentivos perversos para que o serviço público e os funcionáriospúblicos busquem antes cumprir com a letra estrita da lei que atinar para seuverda<strong>de</strong>iro espírito (i<strong>de</strong>m).Dois projetos adicionais do Livro Branco que não se enquadrariamexatamente na categoria da meta-<strong>inovação</strong> seriam a ênfase na formaçãoprofissionalizante para a <strong>inovação</strong> (vimos que o SBI exce<strong>de</strong> em termos<strong>de</strong> formação científica e melhorou substancialmente na educação básica,sobretudo nas disciplinas que conformam o conjunto STEM) e a elevaçãoda priorida<strong>de</strong> do ensino e do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do <strong>de</strong>sign para a <strong>inovação</strong>como núcleo da competitivida<strong>de</strong> econômica do país. No primeiro caso, oentão DIUS e o Conselho <strong>de</strong> Aprendizagem e Qualificação Profissional(Learning and Skills Council – LSC) acordaram a criação <strong>de</strong> doze“Aca<strong>de</strong>mias Nacionais <strong>de</strong> Qualificação Profissional” (National SkillAca<strong>de</strong>mies) nos setores <strong>de</strong> construção, produção, serviços financeiros,indústria alimentícia, energia nuclear, processamento industrial (as seisjá em operação), hotéis e restaurantes (hospitality), indústrias criativas ecultural, esportes e lazer, comércio varejista, vidros, serviços editoriais,moda e joalheria (DIUS, p. 61, 2008).O outro caso é o da criação da Dyson School of Design Innovation,inspirada no trabalho <strong>de</strong> um dos maiores <strong>de</strong>signers industriais do país,Sir James Dyson (que introduziu uma ampla gama <strong>de</strong> aperfeiçoamentosem produtos e utensílios domésticos e meios <strong>de</strong> transporte particulares e<strong>de</strong> massa). A escola, que <strong>de</strong>verá iniciar suas ativida<strong>de</strong>s em setembro <strong>de</strong>2010, será <strong>de</strong> nível técnico e <strong>de</strong>verá contar em seu quadro docente comengenheiros <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> e <strong>de</strong>sign das principais corporações britânicase europeias, como a Rolls-Royce e o consórcio Airbus.O Livro Branco traz ainda uma série <strong>de</strong> recomendações e <strong>de</strong>procedimentos para a <strong>inovação</strong> em áreas cruciais da economia compotencial <strong>de</strong> elevar a competitivida<strong>de</strong> britânica, com gran<strong>de</strong> ênfaseconferida à inclusão <strong>de</strong> claros parâmetros <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> em procedimentos<strong>de</strong> compras governamentais. Busca privilegiar práticas inovadoras<strong>de</strong> baixo para cima, com priorida<strong>de</strong> para a <strong>de</strong>manda e para ativida<strong>de</strong>se interações que envolvam ativamente os consumidores e usuários217<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 217 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>de</strong> serviços. Destaca a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contínuo aprimoramento <strong>de</strong>indicadores e serviços públicos <strong>de</strong> metrologia, qualida<strong>de</strong> e normalização;<strong>de</strong>dica atenção especial às PME e a mecanismos <strong>de</strong> financiamento da<strong>inovação</strong>, especialmente por meio <strong>de</strong> instrumentos financeiros e fiscais,com ênfase para os capitais <strong>de</strong> risco (venture capital). Aspecto salientedo Livro Branco e do SBI <strong>de</strong> modo geral é, no entanto, sua gran<strong>de</strong>permeabilida<strong>de</strong> e abertura a processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> encetados em outrospaíses e <strong>sistema</strong>s, <strong>de</strong> modo que a ação inter<strong>nacional</strong> configura um aspectoprimordial da caracterização do Sistema Britânico <strong>de</strong> Inovação.5.4 – O sol nunca se põe – ação inter<strong>nacional</strong> para a <strong>inovação</strong>A ampla experiência colonialista britânica, do século XVIII a meadosdo XX, teve por subproduto uma vasta capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assimilaçãocultural e <strong>de</strong> abertura para diversas práticas produtivas e experiências<strong>de</strong> organização social ao redor do mundo. O advento da globalizaçãopolítica e econômica foi recebido não só com gran<strong>de</strong> naturalida<strong>de</strong>, masteve no Reino Unido um <strong>de</strong> seus principais impulsionadores 228 , aten<strong>de</strong>ndoa suas pressões e <strong>de</strong>safios com mais <strong>de</strong>senvoltura e facilida<strong>de</strong> do que amaioria dos países do mundo, mesmo no âmbito da OCDE. Vimos nocapítulo anterior que a China também se adapta sem gran<strong>de</strong>s sobressaltosao novo <strong>sistema</strong> econômico inter<strong>nacional</strong> advindo da globalização,graças a enormes esforços governamentais realizados no prazo <strong>de</strong> duasdécadas. A adaptação britânica foi, <strong>de</strong> sua parte, mais gradual e sem anecessida<strong>de</strong> das reformas estruturantes observadas em diversas outraspartes do mundo. Não obstante a inflexão representada pela passagemdo “inverno dos <strong>de</strong>scontentes” para o governo <strong>de</strong> “Mrs. T.I.N.A.” (Thereis no alternative) – bordão pelo qual ficou conhecido o governo daPrimeira-Ministra Margaret Thatcher –, tal mudança não se comparaem termos <strong>de</strong> intensida<strong>de</strong> e profundida<strong>de</strong> com a transformação da Chinamaoísta para a China das “portas abertas”, e nem mesmo talvez com aguinada do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> substituição <strong>de</strong> importações para o do Consenso<strong>de</strong> Washington na América Latina.228Cabe lembrar, a propósito, uma <strong>inovação</strong> política essencialmente britânica, a ONG, cujaprimeira no mundo terá sido a Anti-Slavery Society, criada em 1839, precursora da contemporâneaAnti-Slavery International.218<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 218 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”A ação inter<strong>nacional</strong> britânica para a <strong>inovação</strong> é, <strong>de</strong>sse modo,um elemento constitutivo intrínseco e essencial do <strong>sistema</strong>, na formada interação científica inter<strong>nacional</strong> (40% dos doutorandos nas áreasSTEM no Reino Unido são pesquisadores não britânicos, e cerca<strong>de</strong> 40% dos artigos científicos britânicos contam com ao menos umcoautor não britânico) 229 , <strong>de</strong> extensas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cooperação acadêmicae <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong> pesquisa com cientistas da gran<strong>de</strong> maioria dos paísese, sobretudo, da observação e acompanhamento da <strong>inovação</strong>, <strong>de</strong> suasre<strong>de</strong>s e manifestações nos <strong>sistema</strong>s consi<strong>de</strong>rados prioritários para o país.Essa ação, além <strong>de</strong> operar <strong>de</strong> forma intensa na modalida<strong>de</strong> bottom-up,por intermédio das conexões acadêmicas internacionais e da presençadas empresas britânicas no exterior, também recebe do governo atenção<strong>de</strong>stacada por meio da ação do Conselho Britânico (British Council), dare<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> científica (Science and Innovation Network) do BIS/FCO e do Fórum Global Britânico para a Ciência e a Inovação (UKGlobal and Science Innovation Forum – GSIF).Detendo-me mais no caso da Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Inovação do Foreign Office,consiste basicamente <strong>de</strong> 39 escritórios e repartições, em 24 países (oescritório no Brasil está situado no prédio do Consulado Britânico emSão Paulo), com mais <strong>de</strong> 100 funcionários permanentes, subordinadosao Science and Innovation Group da Chancelaria em Londres 230 . ARe<strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenha inúmeras funções como braço auxiliar no exteriordas políticas britânicas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, tais como promover semináriosnos países on<strong>de</strong> está situada sobre temas prioritários para o SBI;realizar o enlace com a comunida<strong>de</strong> britânica da ciência e da <strong>inovação</strong>(pesquisadores, cientistas e executivos <strong>de</strong> empresas) e mantê-losenvolvidos em ativida<strong>de</strong>s e ações <strong>de</strong> interesse comum para sua área epara o governo britânico; acompanhar e observar o <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>dos países e regiões <strong>de</strong> sua jurisdição; reportar ao DIUS e ao FCO 231 o229Dados apresentados pelo Ministro britânico da Inovação, Universida<strong>de</strong>s e Qualificação (DIUS),John Denham, na American Association for the Advancement of Science (AAAS), Washington,22/04/2008, discurso disponível em .230Lista completa dos funcionários britânicos lotados no Escritório <strong>de</strong> Ciência e Inovação nos24 países consta em FCO/DIUS, pp. 32-41, 2008.231A Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciência e Inovação do FCO foi criada no ano 2000 e gerida exclusivamente peloMinistério até março <strong>de</strong> 2008, quando então o DIUS anunciou, por meio do Innovation Nation(DIUS, p. 55, 2008) que a Re<strong>de</strong> passaria para sua alçada, tendo o programa sido subsequentementeabsorvido pelo sucedâneo BIS. Des<strong>de</strong> então a formulação da política <strong>de</strong> C,T&I britânica para219<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 219 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorprogresso <strong>de</strong> seu trabalho e políticas, iniciativas e práticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> emoutros países <strong>de</strong> interesse para a política britânica <strong>de</strong> C,T&I; propor aosResearch Councils britânicos o (co)financiamento <strong>de</strong> linhas e ativida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> interesse bilateral comum; sugerir, preparar e organizarvisitas e iniciativas <strong>de</strong> parcerias e <strong>de</strong> cooperação entre o país em que estãoacreditados e o governo britânico, por intermédio do BIS, do FCO e doGCSA; organizar visitas <strong>de</strong> autorida<strong>de</strong>s locais a centros <strong>de</strong> excelênciacientífica no Reino Unido; promover a ciência britânica por meio dasvisitas internacionais <strong>de</strong> cientistas britânicos <strong>de</strong> renome mundial 232 ; fazercom que o Reino Unido seja consi<strong>de</strong>rado como parceiro prioritário empolíticas e ações <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> nos países e cida<strong>de</strong>s sob sua jurisdição;obter fundos para cooperação em C,T&I junto a governos e entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>pesquisa dos países junto aos quais estão acreditados 233 ; apoiar a diásporabritânica <strong>de</strong> C,T&I, assim como cientistas e pesquisadores nacionais dopaís on<strong>de</strong> servem, para fortalecer seus laços com a C,T&I britânica, pormeio dos diversos programas internacionais existentes e da concessão<strong>de</strong> bolsas e apoio a programas <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> parte <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s comoo Conselho Britânico, os RC e Universida<strong>de</strong>s britânicas.Um dos <strong>de</strong>sdobramentos institucionais mais importantes daação inter<strong>nacional</strong> britânica em C,T&I foi a abertura <strong>de</strong> escritóriospermanentes do Research Councils UK (entida<strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nadora da açãodos sete RC), na China e nos EUA, em 2007 e em Mumbai, em 2008. Oobjetivo principal <strong>de</strong>sses escritórios é o <strong>de</strong> integrar a pesquisa científica<strong>de</strong>sses países com a realizada no Reino Unido. A Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Inovação doFCO tem atuação reforçada nesses países, <strong>de</strong> forma a facilitar a execuçãodos projetos acordados entre as partes. Ainda no tocante à ação daRe<strong>de</strong>, teve papel primordial para a concretização <strong>de</strong> certos esquemaso exterior foi assumida por este Departamento, cabendo ao FCO executá-la e coor<strong>de</strong>nar a açãodos attachés científicos para implementação das diretrizes estipuladas por diversos órgãos soba coor<strong>de</strong>nação do BIS. O FCO dispõe <strong>de</strong> orçamento anual da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> £ 10,5 milhões (cerca<strong>de</strong> R$ 24 milhões) para operar a Re<strong>de</strong>.232O FCO tem contado com a colaboração do celebrado físico e cosmólogo Stephen Hawkingpara divulgar a ciência britânica em diversos países, da mesma forma que o Itamaraty chegoua apoiar visitas do educador Paulo Freire ao exterior, muito contribuindo para a difusão dasciências sociais brasileiras durante os anos 90.233Como um entre muitos exemplos, em setembro <strong>de</strong> 2006 o Instituto Nacional <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> dosEUA (U.S. National Institutes of Health) <strong>de</strong>stinou US$ 23 milhões para um projeto conjuntobritânico-norte-americano <strong>de</strong> constituição <strong>de</strong> uma biblioteca sobre o genoma do mus musculus,o rato comum.220<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 220 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”colaborativos em C&T, <strong>de</strong> importância crucial para o Reino Unido,como na facilitação das pesquisas conjuntas EUA-Reino Unido sobrecélulas-tronco embrionárias; com os Países Baixos e a China, a Re<strong>de</strong>atuou no <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> pesquisas na área <strong>de</strong> tecnologia celularpara a regeneração <strong>de</strong> válvulas cardíacas; com o Japão foi montado umsupercomputador em Yokohama para mo<strong>de</strong>lagem climática da terra;organizou seminário sobre energias renováveis com 150 empresasnorte-americanas do setor energético, em Los Angeles; na Índia apoiou aprodução do documentário Future Living 2020, sobre os trunfos e impactofuturo da ciência britânica; e forjou a iniciativa UK-China Partners inScience, voltada para a criação <strong>de</strong> um laboratório espacial, pesquisassobre a gripe aviária e a realização <strong>de</strong> um Foro permanente <strong>de</strong> diálogosobre saú<strong>de</strong> pública 234 .A cooperação e a ação conjunta com o Reino Unido em C&T,sobretudo a promovida em anos recentes (e ainda que haja muito poucoou quase nada em <strong>inovação</strong>), elevou o Brasil à condição <strong>de</strong> um dosseus parceiros preferenciais 235 . O Brasil situa-se entre os países maisimportantes e entre os parceiros preferenciais do Reino Unido paraa Ciência e Inovação, ao lado dos EUA, China, Índia, UE (Françae Alemanha), Austrália e Rússia. Em diversos documentos sobre aação inter<strong>nacional</strong> britânica para a C,T&I (DIUS, 2008; FCO, 2007;GSIF, 2006) o Brasil é invariavelmente o único país latino-americanomencionado, quando não a única economia emergente ao lado <strong>de</strong> Chinae Índia. O ano da parceria Brasil-Reino Unido para a ciência foi recebidocom respeito e admiração por importantes segmentos da comunida<strong>de</strong>científica e acadêmica britânicas, tendo merecido uma ampla exposiçãona Comissão <strong>de</strong> C&T do Parlamento Britânico pelo então GCSA, SirDavid King.Nessa apresentação, realizada em 5 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 2007, o GCSAenalteceu o rápido <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico brasileiro dosúltimos anos, especialmente os avanços das pesquisas na área energéticae o fato <strong>de</strong> o país respon<strong>de</strong>r por quase 2% das publicações científicas234Ver Nota 206 supra.235Extensa pesquisa sobre a cooperação Brasil-Reino Unido no <strong>de</strong>cênio 1994-2004 foi realizadapor Fortuna, 2005. Para tempos mais recentes, especialmente o Ano da Parceria Brasil-ReinoUnido para a Ciência (2007-2008) e o Brazil Day organizado pela Royal Society, ver Ribeiro,2008 e os avisos MCT 229 (30/10/06) e MRE/DCTEC 009 (31/10/06), assinados pelos respectivosMinistros <strong>de</strong> Estado.221<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 221 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniormundiais, cifra que atingia apenas 0,4% em meados da década <strong>de</strong> 90(conforme visto no capítulo III supra). Cobrou um aprofundamento dasrelações bilaterais em C&T (notadamente em ciências da vida, pesquisamédica e farmacêutica) e ressaltou o forte interesse pela ciência no Brasil,incluindo o país num “eixo estratégico do Reino Unido para C&T”,especialmente por conta da influência brasileira no campo do bioetanol.Acentuou seus laços afetivo-profissionais com o país e encerrou seu<strong>de</strong>poimento com uma exortação ao aprofundamento da parceria bilateral:Gostaria <strong>de</strong> concluir dizendo que vejo no Brasil uma oportunida<strong>de</strong> extraordinária.Gostaria <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar uma nota positiva ao dizer que, tendo em conta essaoportunida<strong>de</strong> que o Brasil representa – não apenas em termos <strong>de</strong> recursos e <strong>de</strong> suaimportância estratégica para nós, mas também em termos da base científica quetem a oferecer – torço (I very much hope) para que nosso patamar <strong>de</strong> colaboraçãoe interação com o Brasil se eleve substancialmente durante o Ano da Ciência queestamos inaugurando 236 .A priorida<strong>de</strong> da cooperação com o Brasil também está assinaladano relatório Innovation Nation, no qual estão mencionados os clusters<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> em São Paulo e região metropolitana e no Recife, on<strong>de</strong> estásituado o Porto Digital. O relatório, ao indicar que 40% da produçãocientífica britânica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2003 envolveram algum tipo <strong>de</strong> parceriainter<strong>nacional</strong>, enfatiza a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aproximação do Reino Unido comos “núcleos emergentes <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>”, como é o caso do Recife (DIUS,p. 16, 2008). No que se refere ao estreitamento da parceria científicaentre Brasil e Reino Unido, Professor do Departamento <strong>de</strong> Física daUniversida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Pernambuco (UFPE) mencionou a importância<strong>de</strong> seminário realizado na Escócia em 1998, por iniciativa do Itamaraty,para o estreitamento da cooperação com o Reino Unido no campo daopto e da microeletrônica 237 . Outra importante iniciativa posterior <strong>de</strong>236Vale a pena a leitura das seis páginas da audiência <strong>de</strong> David King na Câmara dos Comuns,House of Commons, pp. Ev40-Ev46, 2007.237Informação prestada durante o II Curso sobre C,T&I, MRE/DCTEC, Recife, pelo ProfessorAn<strong>de</strong>rson Gomes, que se referia ao seminário “Prospects for Brazil-Scotland Co-operation inMicroeloectronics Research”, organizado <strong>de</strong>z anos antes (setembro <strong>de</strong> 1998) em Glasgow eEdimburgo, pela Embaixada em Londres. Participaram do evento cientistas do LaboratórioNacional <strong>de</strong> Luz Síncrotron (LNLS), da UFPE, Unicamp, FAPESP, Socieda<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong>Microeletrônica, UFGRS e o então Diretor do CNPq, João Evangelista Steiner. Do lado britânicocompareceram representantes e pesquisadores das universida<strong>de</strong>s Heriot-Watt, Strathcly<strong>de</strong>,222<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 222 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”cooperação foram as conversações com autorida<strong>de</strong>s brasileiras da área <strong>de</strong>saú<strong>de</strong> com vistas à construção <strong>de</strong> fábrica <strong>de</strong> fracionamento <strong>de</strong> plasma (queviria a se consubstanciar em projeto da Hemobras, ainda não operativo,como se viu no capítulo III supra).Paralelamente ao Science and Innovation Network do FCO, ogoverno britânico promove notável ação inter<strong>nacional</strong> por meio doGSIF, que tem por missão reforçar e coor<strong>de</strong>nar a ação dos diversosprogramas e instituições britânicas com interesse e responsabilida<strong>de</strong>sna implementação da política inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> C,T&I. O foro é dirigidopelo GCSA que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a criação do DIUS, articula as áreas internacionaisdos diversos Ministérios (Departments) britânicos para promoverema <strong>inovação</strong> e o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico por meio <strong>de</strong>parcerias e da ação inter<strong>nacional</strong>. O Livro Branco “Innovation Nation”estabeleceu quatro novas ações prioritárias para o GSIF, a saber: atrairos mais <strong>de</strong>stacados cientistas e pesquisadores do mundo para o ReinoUnido, por meio do fortalecimento das parcerias internacionais; atrairinvestimento direto estrangeiro para a área <strong>de</strong> P&D e facilitar o acessodas empresas britânicas à ciência produzida fora do Reino Unido (missãona qual o FCO <strong>de</strong>sempenharia papel primordial); utilizar a reputação e ostrunfos da ciência britânica como forma <strong>de</strong> promover a política externa dopaís e <strong>de</strong>senvolver parcerias bilaterais; e empregar a pesquisa e a <strong>inovação</strong>como instrumentos para atingir as metas globais <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.Também nesse diapasão, o relatório menciona explicitamente o Brasil,a Índia e a China como exemplos <strong>de</strong> cooperação inter<strong>nacional</strong> para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> em que o Reino Unido figura como foco, por meio <strong>de</strong>programas como a aludida parceria para a ciência com o Brasil, a parceriacom a China para a <strong>inovação</strong> e a criação do Conselho Índia-Reino Unido<strong>de</strong> Ciência e Inovação (DIUS, p. 53, 2008) 238 .5.5 – SBI: conquistas e <strong>de</strong>safiosConforme se viu até aqui, o governo britânico estabeleceu nos últimostempos uma gran<strong>de</strong> força-tarefa <strong>nacional</strong>, a maior <strong>de</strong> sua história, para oEdimburgo, Glasgow e representantes <strong>de</strong> empresas da área <strong>de</strong> microeletrônica, Conselhos <strong>de</strong>Pesquisa e associações profissionais da Escócia e do Reino Unido em geral.238Em documento anterior, o GSIF havia indicado o Brasil como um dos três países prioritáriosfora do G-8 e da UE com quem estreitar parcerias bilaterais na área <strong>de</strong> ciência e <strong>inovação</strong> (GSIF,pp. 39-40, 2006).223<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 223 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorespraiamento da <strong>inovação</strong> por todos os poros da socieda<strong>de</strong>, mobilizandoseus setores empresarial, <strong>de</strong> pesquisa, educacional, profissionalizante,universitário e ONG, a partir <strong>de</strong> uma forte presença inter<strong>nacional</strong>. Pelaprimeira vez, reconheceu-se institucionalmente o caráter holístico,transdisciplinar e transgovernamental da <strong>inovação</strong>, por intermédioinclusive <strong>de</strong> ações que visam a reforçar e a infundir o espírito da <strong>inovação</strong>nos próprios mecanismos e instituições com a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>promovê-la. Nesse sentido, talvez o principal trunfo do <strong>sistema</strong> sejaa inequívoca <strong>de</strong>terminação do governo britânico <strong>de</strong> fazer da <strong>inovação</strong>um aspecto central <strong>de</strong> sua estratégia política geral para os tempos <strong>de</strong>globalização e para o século XXI. Um outro trunfo, <strong>de</strong>corrente do anterior,seria a leitura bem calibrada <strong>de</strong>senvolvida no país das forças que mo<strong>de</strong>lama competitivida<strong>de</strong> econômica inter<strong>nacional</strong> dos países, elemento que<strong>de</strong>verá se mostrar <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> valia no momento atual (segundo semestre<strong>de</strong> 2011) <strong>de</strong> enfrentamento da crise financeira inter<strong>nacional</strong>. Não obstantea severida<strong>de</strong> da crise e a particular vulnerabilida<strong>de</strong> britânica, por conta<strong>de</strong> sua <strong>de</strong>pendência econômica em serviços bancários e financeiros aindamaior que a dos EUA, os fundamentos <strong>de</strong> sua economia “real” e <strong>de</strong> seumo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> gestão macroeconômica dificilmente farão o país retornar ao“inverno dos <strong>de</strong>scontentes” <strong>de</strong> 1979 (Kaletsky, 2008).Para esse prognóstico mais otimista contribuem fatores comogran<strong>de</strong>s níveis <strong>de</strong> investimento público e privado em sua base<strong>de</strong> pesquisa (que não <strong>de</strong>verão sofrer cortes comprometedores naconjuntura da crise); o fato <strong>de</strong> ser uma das maiores praças financeirase comerciais do mundo; <strong>de</strong> a <strong>inovação</strong> estar disseminada em umaampla gama <strong>de</strong> serviços e setores da economia; sua dispersãosetorial, geográfica, horizontal (entre estágios produtivos e etapas<strong>de</strong> aprendizagem) e vertical (nos três níveis <strong>de</strong> governo, na forma <strong>de</strong>investimentos estrangeiros em P&D e nas políticas <strong>de</strong> capacitaçãodas PME); a qualida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> suas universida<strong>de</strong>s e bases<strong>de</strong> pesquisa; a flexibilida<strong>de</strong> e adaptabilida<strong>de</strong> à mudança; as políticas<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> empreendidas no próprio setor público, que passarama assumir parâmetros <strong>de</strong> exigência comparáveis aos da iniciativaprivada; o caráter aberto <strong>de</strong> sua economia e socieda<strong>de</strong>; a extensão<strong>de</strong> sua base <strong>de</strong> cooperação inter<strong>nacional</strong> para a C,T&I; a existência<strong>de</strong> um ambiente regulatório altamente satisfatório para investidoresestrangeiros; e uma trajetória <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência fomentadora da224<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 224 10/10/2011 14:15:50


eino unido: “<strong>inovação</strong> oculta”, “meta-<strong>inovação</strong>” e “economia impon<strong>de</strong>rável”tecnologia, da pesquisa científica e da <strong>inovação</strong>, que remonta aosséculos XVII e XVIII e ao alvorecer da Revolução Industrial.No balanço entre os trunfos e fraquezas do SBI, aqueles certamenteprepon<strong>de</strong>ram, não pelo fato <strong>de</strong> tais fraquezas não serem severas ouameaçadoras para o <strong>de</strong>sempenho e a própria estabilida<strong>de</strong> do <strong>sistema</strong>. Obalanço mais favorável justifica-se pelo fato <strong>de</strong> os problemas estaremsendo corretamente diagnosticados e enfrentados e <strong>de</strong> as atuais políticasterem sido formuladas para lidar com cada caso isoladamente, com aprovisão <strong>de</strong> recursos, energia e mobilização social correspon<strong>de</strong>ntes. Entreos principais problemas que se enquadram nessa categoria situam-se:uma certa letargia na <strong>de</strong>manda por <strong>inovação</strong> no processo <strong>de</strong> comprasgovernamentais e no marco regulatório; a existência <strong>de</strong> uma aindaimportante minoria, na casa <strong>de</strong> 33%, <strong>de</strong> firmas que não realizam nenhumtipo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>; uma taxa <strong>de</strong> crescimento da <strong>inovação</strong> nas PME inferiora <strong>de</strong> vários países da OCDE e muito inferior a dos EUA; heterogeneida<strong>de</strong>no nível e intensida<strong>de</strong> da adoção <strong>de</strong> práticas inovadoras entre firmas eentre certas regiões do país (assimetrias que afetam relativamente a regiãoNor<strong>de</strong>ste do país, a Irlanda do Norte e a periferia <strong>de</strong> Londres); nívelrelativamente baixo <strong>de</strong> P&D (<strong>de</strong>vido possivelmente à heterogeneida<strong>de</strong> <strong>de</strong>setores e estruturas industriais, o industrial mix); a relativa obsolescência<strong>de</strong> práticas gerenciais, que respon<strong>de</strong>riam por entre 10% a 15% do hiato<strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> entre a economia britânica e a dos EUA (DIUS,p. 59, 2008); e o principal obstáculo i<strong>de</strong>ntificado em todas as pesquisas erelatórios sobre <strong>inovação</strong> no Reino Unido, que consiste no ainda elevadonúmero <strong>de</strong> jovens que ingressam no mercado <strong>de</strong> trabalho sem aptidõesmínimas e com baixo coeficiente <strong>de</strong> empregabilida<strong>de</strong> 239 .O padrão <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> três economias diferentes, com seusrespectivos <strong>de</strong>safios – o governo e as empresas brasileiras com anecessida<strong>de</strong> imperiosa <strong>de</strong> absorver a tecnologia e a ciência <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>produzida em suas universida<strong>de</strong>s, a China mobilizada pela “<strong>inovação</strong><strong>nacional</strong>/endógena” e o Reino Unido na etapa da “meta-<strong>inovação</strong>” e239O Leitch Review of Skills (2006) e o relatório subsequente com o balanço <strong>de</strong> sua implementação,publicado no ano seguinte (DIUS, 2007), não escon<strong>de</strong>m a severida<strong>de</strong> do problema para a economiae a socieda<strong>de</strong> britânicas: mais <strong>de</strong> um terço dos adultos não contam com formação secundária eapesar dos mais <strong>de</strong> 40% que têm formação universitária, 6,8 milhões <strong>de</strong> pessoas são <strong>de</strong>sprovidas<strong>de</strong> aptidões mínimas para a matemática e cinco milhões são consi<strong>de</strong>radas analfabetas funcionais,incapazes <strong>de</strong> interpretar textos escritos elementares (DIUS, pp. 6-7, 2007). Ambos documentosformulam estratégias e metas para superar esses obstáculos até 2020.225<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 225 10/10/2011 14:15:50


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorda expansão da base <strong>de</strong> sua economia criativa – representam mo<strong>de</strong>losdistintos, com experiências históricas (especialmente <strong>de</strong> históriaeconômica) altamente diferenciadas e dispondo <strong>de</strong> base <strong>de</strong> recursos efundamentos macroeconômicos significativamente diversos. Os trêspaíses são, por sua vez, representativos <strong>de</strong> amplas bases geográficase nacionais que fornecem a chave para a compreensão do fenômenoda <strong>inovação</strong> na era da globalização. O Brasil possui diversos pontos<strong>de</strong> contato com seus vizinhos latino-americanos, embora claramentedisponha <strong>de</strong> elementos e indicadores que o fazem único no Continente;a China, embora imbuída <strong>de</strong> um padrão <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> distinto <strong>de</strong> seusvizinhos asiáticos, com eles compartilha a circunstância histórica <strong>de</strong>haver traçado políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> fortemente ancoradas empráticas <strong>de</strong> assimilação tecnológica calcadas na imitação; e o Reino Unido<strong>de</strong>sponta como exemplo conspícuo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> a partir <strong>de</strong> uma economiaimpon<strong>de</strong>rável e <strong>de</strong> serviços que conforma a realida<strong>de</strong> predominantena OCDE. Um estudo comparativo mais minucioso, porém, escapa àspretensões <strong>de</strong>ste trabalho, <strong>de</strong>vendo ficar como uma necessária sugestão<strong>de</strong> pesquisa empírica futura. Interessa mais, no momento, extrair algumasrápidas lições finais e experiências dos dois exemplos anteriores quepo<strong>de</strong>rão ser <strong>de</strong> proveito para os esforços brasileiros <strong>de</strong> constituição<strong>de</strong> um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> à altura do extraordinário potencial <strong>de</strong> suaeconomia e da excelência <strong>de</strong> sua base científica. É a que será <strong>de</strong>dicadoo capítulo final e conclusivo a seguir.226<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 226 10/10/2011 14:15:50


ConclusõesO papel do MRE num <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>“autocontido”Conforme visto nos capítulos II e III, o SNB apresenta sinais <strong>de</strong>amadurecimento e <strong>de</strong> que logo po<strong>de</strong>ria, graças à sua comprovadacapacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> assimilação e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> novas tecnologias,galgar mais uma etapa em sua escala produtiva e evolutiva na direção <strong>de</strong>uma economia do conhecimento. O Brasil experimentou uma rápida eextraordinária diversificação produtiva em pouco mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos e suabase científica logra respeito e admiração crescentes em todo o mundo,especialmente em áreas como energias renováveis, medicina, algumasengenharias e biotecnologia (ou seja, além das humanida<strong>de</strong>s, on<strong>de</strong> o paísdispõe <strong>de</strong> um reconhecido cabedal inter<strong>nacional</strong>, mormente em áreascomo filosofia, lógica, sociologia e antropologia). Vimos também que oproblema mais can<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> todo o <strong>sistema</strong> não <strong>de</strong>riva da indisponibilida<strong>de</strong><strong>de</strong> tecnologias ou da ausência <strong>de</strong> apoio governamental para a <strong>inovação</strong>,mas da sofrível articulação entre seus elementos componentes. Diversosfatores <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m histórica e política e o êxito relativo <strong>de</strong> um padrãoprodutivo pouco intensivo em <strong>inovação</strong>, que somente há poucos anosteve <strong>de</strong> lançar-se à competição inter<strong>nacional</strong> – <strong>de</strong> maneira um tantobem-sucedida, cabe assinalar –, <strong>de</strong>ixaram o Brasil confortavelmenteacomodado com seu mercado doméstico e regional mais intensivo emtrabalho e matérias-primas. Este, historicamente menos exigente emtermos <strong>de</strong> produtos e serviços, com quem (basicamente todos os vizinhos227<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 227 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorsul-americanos) o Brasil mantém expressivos e seguidos superávitscomerciais.É certo, porém, que o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico e social brasileirorequererá uma forte transformação <strong>de</strong> seu padrão produtivo, com ocrescimento <strong>de</strong> setores intensivos em tecnologia e em serviços <strong>de</strong> altovalor agregado e <strong>de</strong> custos <strong>de</strong> produção, distribuição e infraestrutura<strong>de</strong>crescentes. Juntamente com reformas no ambiente macroeconômico(sobretudo a reforma tributária), a melhoria da infraestrutura e daqualida<strong>de</strong> dos produtos e serviços, públicos e privados, e o aumentoda empregabilida<strong>de</strong>, o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> brasileiro exigirá a ampliaçãosignificativa <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> alto conteúdo tecnológico em seu PIB eexportações, além da casa <strong>de</strong> um dígito registrada nas estatísticas. Nessesentido, Ministérios como Educação, Ciência e Tecnologia, Saú<strong>de</strong>, MDICe Itamaraty – este, com tarefas específicas e primordiais – terão um papel--chave nessa transformação do perfil produtivo do país.Diante das lições e experiências <strong>de</strong> outros países emergentes quelograram essa transformação em relativamente curto espaço <strong>de</strong> tempo –são notórios os casos <strong>de</strong> Índia e China – há <strong>de</strong> se assinalar a participaçãofundamental do setor externo dos SNI <strong>de</strong>sses países para o resultadoalcançado. Ainda que, diferentemente do Reino Unido, como vimos, emque o FCO <strong>de</strong>sempenha papel prepon<strong>de</strong>rante no fortalecimento do SBI,China e Índia <strong>de</strong>vem muito do que conseguiram em termos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>nas duas últimas décadas aos enlaces internacionais <strong>de</strong>senvolvidos emantidos a partir <strong>de</strong> uma ativa, dinâmica e altamente qualificada diásporalocalizada basicamente no Japão (caso específico da China), Inglaterra eEUA. Coincidências históricas felizes, a <strong>de</strong>terminada automobilização dadiáspora e políticas e instituições governamentais altamente receptivase estimuladoras <strong>de</strong>sses movimentos vindos do exterior tiveram porconsequência transformar uma circunstância inicialmente negativa, ouseja, a evasão <strong>de</strong> cérebros, em fator positivo para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e aconsolidação dos respectivos SNI, a partir <strong>de</strong> uma extensão inter<strong>nacional</strong>da mais alta envergadura.Dos mais <strong>de</strong> dois milhões <strong>de</strong> brasileiros que vivem no exterior 240 ,perto <strong>de</strong> 100.000 po<strong>de</strong>riam estar <strong>de</strong>sempenhando ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interessedireto para a <strong>inovação</strong> no Brasil, notadamente a partir <strong>de</strong> bases científicas,acadêmicas, governamentais, produtivas e empresariais nos países240Dossiê Migrações, Revista do IEA-USP, nº 57, editorial, p. 5, 2006.228<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 228 10/10/2011 14:15:51


conclusõesindustrializados. Muito embora o perfil predominante da emigraçãobrasileira seja <strong>de</strong> trabalhadores sem qualificação formal – o que nãoafasta a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que muitos entre esses emigrantes possam estar<strong>de</strong>sempenhando ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> interesse e importância para a <strong>inovação</strong>no Brasil –, há um expressivo contingente que trabalha em empresas <strong>de</strong>alta tecnologia, ocupam posições no meio acadêmico inter<strong>nacional</strong> e<strong>de</strong>stacam-se em ativida<strong>de</strong>s no setor <strong>de</strong> serviços e <strong>de</strong> indústrias criativas 241 .Por que po<strong>de</strong>rão ser esses brasileiros no exterior tão importantes parao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do país como o foram as diásporas chinesa e indiananos anos 90 e nesta década para os crescimentos <strong>de</strong> seus respectivospaíses? 242 O que os distingue das centenas <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> brasileiros jábem qualificados e que atuam no próprio país? O fato é que os expatriadosbrasileiros representam um tipo especial <strong>de</strong> capital humano, forjado noconhecimento tácito das condições sociais e produtivas dos países on<strong>de</strong>estão radicados, ao qual brasileiros inseridos no <strong>sistema</strong> econômico<strong>nacional</strong> não têm acesso. Trata-se <strong>de</strong> brasileiros expostos a uma variadagama <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, em níveismicro e macrossociais, experiências que po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>sperdiçadasou reaproveitadas “antropofagicamente” (conforme a filosofia domo<strong>de</strong>rnismo brasileiro) para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e consolidação <strong>de</strong> seu<strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. A importância dos expatriados atuantes em setoresinovadores torna-se ainda mais relevante ao se consi<strong>de</strong>rar as dificulda<strong>de</strong>sno Brasil para a articulação das pontas <strong>de</strong> seu próprio <strong>sistema</strong> – nãoraro <strong>de</strong> elementos, processos e rotinas <strong>de</strong> um mesmo setor industrial ougovernamental. A coor<strong>de</strong>nação entre entida<strong>de</strong>s brasileiras e estrangeiras<strong>de</strong> modo geral é historicamente ainda mais longínqua, com o Itamaratyocupando um papel, pelo menos até meados dos anos 90, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>, paranão dizer a única, “antena sensível” do Brasil no exterior 243 .241Segundo o Professor Eduardo do Couto e Silva, da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Stanford, seriam mais<strong>de</strong> mil os professores brasileiros com posições em universida<strong>de</strong>s norte-americanas. Informaçãoprestada no “II Curso sobre Cooperação Inter<strong>nacional</strong> em Ciência, Tecnologia e Inovação”,Brasília, DCT/DCTEC, 20/08/08.242Segundo Kuznetsov & Sabel (p. 03, 2006) 70% do IDE na China entre 1985 e 2000 <strong>de</strong>veu-seà ação dos chineses no exterior.243Essa, entre outras características, teriam feito do SNB um <strong>sistema</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> “autocontido”(self contained), na avaliação <strong>de</strong> Kuznetsov (p. 235, 2006b). Setores da aca<strong>de</strong>mia alegavam que,até há pouco tempo, o Itamaraty dispunha do virtual monopólio das relações externas do Brasil.Ver, entre diversos autores, Merke (p. 02, 2008); Braga (p. 03, 2007) e Chagas (p. 03, 2008).229<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 229 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorConectando e mobilizando a diáspora <strong>de</strong> C,T&I brasileira – opapel do ItamaratyDiante da contribuição dos “tartarugas marinhas” para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> da China e do FCO para a transferência <strong>de</strong> tecnologiae assimilação <strong>de</strong> processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> gerados em outros países,entre possíveis exemplos a partir <strong>de</strong> diversas outras experiências,caberia ao Itamaraty assumir papel <strong>de</strong> maior relevo na mobilizaçãoda diáspora brasileira <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> para apoiar as priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> industrial e científico-tecnológico assinaladas, porexemplo, em programas como a PITCE, a PDP e o “Plano Brasil Maior”,lançado em agosto <strong>de</strong> 2011 (os quais, inci<strong>de</strong>ntalmente, não atribuemresponsabilida<strong>de</strong> alguma à diáspora brasileira na constituição do SNB).Em artigo publicado em 08/11/2006 (Agência C&T, Notícias MCT) oentão Secretário-Executivo do MCT, Luiz Antonio Barreto <strong>de</strong> Castro,reconhece a importância da diáspora para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico--tecnológico do país e salienta a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer o perfil doscientistas brasileiros atuantes no exterior. O Itamaraty teria condições,mormente a partir <strong>de</strong> sua re<strong>de</strong> consular, <strong>de</strong> montar e gerenciar um cadastro<strong>de</strong> brasileiros com atuação <strong>de</strong> interesse para a <strong>inovação</strong> no Brasil, apartir <strong>de</strong> pequenas modificações no formulário <strong>de</strong> matrícula consular.Sob essa perspectiva, seria indispensável po<strong>de</strong>r contar com informaçãoacurada sobre os brasileiros que exercem ativida<strong>de</strong>s em empresas lí<strong>de</strong>rese/ou <strong>de</strong> ponta em seus respectivos setores no exterior, e ainda as linhas<strong>de</strong> pesquisa a que estão <strong>de</strong>dicados os acadêmicos atuantes na jurisdiçãoda respectiva repartição consular. Malgrado a baixa propensão dosbrasileiros no exterior a matricularem-se em seus Consulados, essecontingente específico <strong>de</strong> “brasileiros da <strong>inovação</strong>” teria mais facilida<strong>de</strong>e predisposição para fazê-lo, sobretudo se ficar claramente indicado,junto à comunida<strong>de</strong> brasileira correspon<strong>de</strong>nte, o objetivo do exercício<strong>de</strong> reunir dados fi<strong>de</strong>dignos sobre a diáspora <strong>de</strong> C,T&I, como forma <strong>de</strong>iniciar um processo <strong>de</strong> sua gradativa mobilização para a implementação<strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico do país.Não que a mobilização da diáspora <strong>de</strong>va ser uma função precípuado governo ou do Itamaraty, mas é essencial para a eficácia <strong>de</strong>sseexercício <strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> brasileiros qualificados no exterior que umare<strong>de</strong> a ser montada pelos próprios expatriados tenha uma clara referência230<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 230 10/10/2011 14:15:51


conclusõesinstitucional no Brasil. A SERE e as Embaixadas e Consulados emcida<strong>de</strong>s com importante presença da diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I (asque integram, em linhas gerais, o SICTEX) <strong>de</strong>vem facilitar, da melhormaneira possível, a formação <strong>de</strong>ssas re<strong>de</strong>s, sem no entanto intervirem sua gestão ou operação. A presença <strong>de</strong> acadêmicos e executivosbrasileiros em posições <strong>de</strong> li<strong>de</strong>rança nos EUA, por exemplo, po<strong>de</strong>ráfacilitar a superação <strong>de</strong> muitos gargalos tecnológicos que afetam certossetores produtivos brasileiros, por meio da disseminação <strong>de</strong> contatos,re<strong>de</strong>s e informações cuja disponibilida<strong>de</strong> e acesso hoje é apenas parcial,mesmo para as Embaixadas e repartições consulares brasileiras, <strong>de</strong>vidobasicamente à barreira fundamental do acesso ao conhecimento tácito.Entre as ações que po<strong>de</strong>riam ser facilitadas por intermédio dadiáspora, mencione-se a prospecção para investimentos estrangeirosprodutivos no Brasil (a cargo <strong>de</strong> ex-pesquisadores ou executivosbrasileiros em companhias estrangeiras); a facilitação para a inserçãono exterior <strong>de</strong> nascentes empresas brasileiras <strong>de</strong> base tecnológica; ointercâmbio <strong>de</strong> conhecimento tácito e know-how para a proposição <strong>de</strong>contratos <strong>de</strong> licenciamento (elementos <strong>de</strong> confiança pessoal e uma amplare<strong>de</strong> <strong>de</strong> contatos são essenciais nesses casos); formação <strong>de</strong> consórcios <strong>de</strong>capital <strong>de</strong> risco (venture capital); e a obtenção <strong>de</strong> informações essenciaissobre como obter tecnologias-chave para o aprimoramento <strong>de</strong> processosprodutivos no Brasil, entre outras possibilida<strong>de</strong>s.Em termos i<strong>de</strong>ais, um pesquisador brasileiro <strong>de</strong> alta qualificação noexterior terá participado <strong>de</strong> processo pioneiro <strong>de</strong> incubação <strong>de</strong> empresa<strong>de</strong> base tecnológica, a partir da conclusão <strong>de</strong> seus estudos e, após amaturação e êxito do empreendimento, formará uma parceria com umacongênere brasileira, para ampliação do mercado <strong>de</strong>ssa empresa <strong>nacional</strong>e para a elevação <strong>de</strong> seu perfil tecnológico. Na maioria dos casos, porém,o que é factível e <strong>de</strong>sejável é que a diáspora brasileira possa participarda solução <strong>de</strong> problemas produtivos no Brasil e auxiliar na formulaçãoe implementação <strong>de</strong> políticas governamentais <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, i<strong>de</strong>ntificandoparcerias potenciais e entida<strong>de</strong>s públicas e privadas no exterior compossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ajudar a concretizar essas políticas, seja diretamente,por meio <strong>de</strong> investimentos, negócios e consultorias, ou indiretamente,na forma <strong>de</strong> compilação e difusão <strong>de</strong> experiências.A par da vantagem <strong>de</strong> estar a diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I atuandodiretamente nos gran<strong>de</strong>s centros <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do mundo (basta lembrar,231<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 231 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniornum paralelo que ressalta a importância <strong>de</strong> recorrer à diáspora, o fato <strong>de</strong>o MRE dispor <strong>de</strong> poucas <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> diplomatas e funcionários lotadosem diversos SECTEC, sendo raros lidando com temas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, esempre por prazos inferiores a três anos e meio), há <strong>de</strong> se ter em contao fato <strong>de</strong> que, diferentemente do caso dos “tartarugas marinhas”, nãoseria realista contar com o repatriamento da maioria <strong>de</strong>sses brasileiros. AChina teve um êxito parcial (taxa <strong>de</strong> retorno <strong>de</strong> 25% do contingente <strong>de</strong>emigrantes qualificados) por conta da saturação do mercado <strong>de</strong> trabalhopara os próprios chineses no exterior e por conta das oportunida<strong>de</strong>screscentes oferecidas em seu país <strong>de</strong> origem. As políticas encetadaspelo CNPq <strong>de</strong> recompensas aos regressados e <strong>de</strong> penalida<strong>de</strong>s aosque não retornam ao país não são suficientes para reverter o déficitmigratório que atinge o contingente <strong>de</strong> brasileiros <strong>de</strong> alta qualificação.O governo brasileiro e o Itamaraty <strong>de</strong>vem adotar, <strong>de</strong>sse modo, políticas(ou mais mo<strong>de</strong>stamente, experiências) para incentivar a mobilizaçãodos brasileiros no exterior e seu envolvimento em projetos e políticas<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Brasil.Um ponto <strong>de</strong> partida natural seria o apoio à re<strong>de</strong> “Integra Brazil”,formada na região <strong>de</strong> Stanford, na Baía <strong>de</strong> São Francisco, que estábuscando conectar a diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I, inicialmente naCosta Oeste dos EUA e, <strong>de</strong>pois, no restante do país e no mundo. A“Integra Brazil”, apesar <strong>de</strong> formada recentemente, assumiu a missão <strong>de</strong>galvanizar a diáspora brasileira científica e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> para inseri-la emprogramas e iniciativas – <strong>de</strong> escala inicial e necessariamente mo<strong>de</strong>sta – <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do país. Um outro ponto <strong>de</strong> apoio, mais experiente eque conta com uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> 600 associados, em sua gran<strong>de</strong> maioria nosEstados Unidos, é a Brazilian Studies Association – BRASA, sediada naUniversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Van<strong>de</strong>rbilt, Tennessee. Fator que reduziria a importânciarelativa da BRASA para a mobilização da diáspora brasileira, a <strong>de</strong>speito<strong>de</strong> sua gran<strong>de</strong> capilarida<strong>de</strong> nos EUA, seria a concentração <strong>de</strong> seus estudose pesquisas quase sempre na área <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong>s. À medida, porém, quese <strong>de</strong>lineie uma articulação entre a diáspora brasileira no exterior e que seformem canais institucionais facilitadores e receptivos da ação da diásporapelo governo brasileiro, a BRASA po<strong>de</strong>rá ser também mobilizada paraapoiar os esforços <strong>de</strong> prospecção <strong>de</strong> parcerias tecnológicas e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>nas instituições a que pertencem seus 600 filiados. Uma parceria inicialentre a “Integra Brazil” e a BRASA po<strong>de</strong>rá, portanto, ser benéfica para232<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 232 10/10/2011 14:15:51


conclusõesambas e para a diplomacia brasileira <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> nos Estados Unidos,país que correspon<strong>de</strong> à mais importante base inter<strong>nacional</strong> da diásporae da <strong>inovação</strong> brasileira no exterior 244 .Apesar da necessária cautela <strong>de</strong> que <strong>de</strong>vem se revestir iniciativasgovernamentais <strong>de</strong> mobilização social <strong>de</strong> modo geral – cujos resultadossempre vêm imbuídos <strong>de</strong> alto componente <strong>de</strong> incerteza, ainda mais emse tratando <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cidadãos que po<strong>de</strong>riam prescindir perfeitamente<strong>de</strong> incentivos governamentais para suas carreiras e ativida<strong>de</strong>s diretas –,é absolutamente certo que o Itamaraty po<strong>de</strong> fazer ainda mais em termos<strong>de</strong> diplomacia da <strong>inovação</strong> no que se refere à mobilização da diáspora.Se na área <strong>de</strong> cooperação e parcerias tecnológicas intergovernamentaiso Ministério amealhou importantes conquistas e formou uma carteira <strong>de</strong>projetos bem-sucedidos, uma ação mais contun<strong>de</strong>nte para a mobilizaçãoda diáspora e para a articulação entre indivíduos e instituições <strong>de</strong>dicadosa ativida<strong>de</strong>s inovadoras no exterior (especialmente na modalida<strong>de</strong> “<strong>de</strong>baixo para cima”, bottom-up) po<strong>de</strong>ria alavancar <strong>de</strong> modo <strong>de</strong>cisivo umagama <strong>de</strong> projetos estratégicos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> em C,T&I no Brasil,que passariam a contar <strong>de</strong> forma sistemática com a massa crítica brasileirano exterior, hoje subaproveitada e em gran<strong>de</strong> medida ainda <strong>de</strong>sconhecidados agentes brasileiros <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>. Um aproveitamento a<strong>de</strong>quado <strong>de</strong>ssamassa crítica <strong>de</strong>ve po<strong>de</strong>r contar com a moldura institucional a<strong>de</strong>quada ereceptiva às <strong>de</strong>mandas e contribuições da diáspora no exterior. SegundoKuznetzov,A qualida<strong>de</strong> das instituições do país <strong>de</strong> origem parece ser o fator individual<strong>de</strong>terminante para o êxito das iniciativas da diáspora. Mesmo quando as diásporassão numerosas, empreen<strong>de</strong>doras e contem com generosos recursos (...) elas sempretêm <strong>de</strong> <strong>de</strong>parar-se com constrangimentos <strong>de</strong>sencorajadores <strong>de</strong> instituições do país<strong>de</strong> origem (Kuznetsov, p. 230, 2006).Uma primeira questão a ser consi<strong>de</strong>rada, <strong>de</strong>sse modo, para uma<strong>de</strong>quado apoio e mobilização da diáspora brasileira no exterior, nolado que vier a caber ao Itamaraty (sobretudo no âmbito da DCTEC), éestabelecer uma clara distinção entre políticas <strong>de</strong> cooperação e políticas <strong>de</strong><strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico. No primeiro caso, conforme se salientou,o Brasil dispõe <strong>de</strong> uma importante carteira <strong>de</strong> projetos bem-sucedidos,244Os programas e objetivos da “Integra Brazil” constam <strong>de</strong> Couto e Silva & Souza (2008).233<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 233 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniortanto na cooperação recebida quanto, principalmente, na prestada.Projetos nas áreas <strong>de</strong> energia nuclear, setor aeroespacial, biotecnologiae informática inscrevem-se entre tais programas bem-sucedidos geradosou cogerados pelo Itamaraty. Além da extensa e necessária agenda <strong>de</strong>programas bilaterais e multilaterais <strong>de</strong> cooperação, o Brasil po<strong>de</strong>riaassumir uma agenda mais propositiva, por meio do SICTEX, junto asetores empresariais e acadêmicos <strong>de</strong> diversos países com potencial <strong>de</strong>contribuir para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> brasileiro, sempre com o apoio dadiáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I. Para esse trabalho, po<strong>de</strong>riam ser adotadosos seguintes passos principais:- Mobilizar a re<strong>de</strong> consular e <strong>de</strong> associações <strong>de</strong> brasileiros noexterior (“Integra Brazil”, associações <strong>de</strong> bolsistas e pesquisadoresna Espanha e Reino Unido, Câmaras binacionais <strong>de</strong> comércio)para i<strong>de</strong>ntificar acuradamente a diáspora C,T&I brasileira em suasrespectivas jurisdições;- aparelhar os SECTEC das Embaixadas e Consulados para melhorvoluntariarem-se a contactar a comunida<strong>de</strong> brasileira <strong>de</strong> C,T&I(aca<strong>de</strong>mia, empresas, governo e terceiro setor), com o objetivoinicial <strong>de</strong> auscultá-la e com vistas a: i) conhecer as tendências<strong>de</strong> aplicação industrial e em serviços <strong>de</strong> tecnologias <strong>de</strong> pontagerada em pesquisas e processos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> em diversas áreascientíficas, especialmente aquelas que revelaram ou po<strong>de</strong>m revelarelevado impacto <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong>, valor e transbordamento(spillover) sobre ca<strong>de</strong>ias produtivas, notadamente nos campos dabiotecnologia, indústria farmacêutica, engenharia genética, novosmateriais, engenharia <strong>de</strong> produção, optoeletrônica, indústriascriativas, indústria aeroespacial e TIC, entre outras; ii) <strong>sistema</strong>tizar,processar e repassar a informação correspon<strong>de</strong>nte à SERE, aoMCT, ao MDIC e à comunida<strong>de</strong> científica no Brasil, que avaliarãoa aplicabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses dados, processos e informações para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> setores-chave da produção e dos serviçosno Brasil. Os SECTEC <strong>de</strong>verão ser encorajados a promoverseminários e reuniões com representantes <strong>de</strong> áreas científicase <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, com o propósito <strong>de</strong> <strong>sistema</strong>tizar as informaçõescoligidas e aproximar a diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I local eas comunida<strong>de</strong>s acadêmicas local e brasileira, nas respectivas234<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 234 10/10/2011 14:15:51


conclusõesáreas; e iii) coor<strong>de</strong>nar com os respectivos órgãos governamentaislocais <strong>de</strong> C,T&I a prestação <strong>de</strong> cooperação em áreas-chave parao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> brasileiro, não a partir <strong>de</strong> programas pontuaise <strong>de</strong> ciclo <strong>de</strong> execução limitado, mas na forma <strong>de</strong> parceriasestratégicas para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> longo prazo <strong>de</strong>ssa áreachaveda economia do conhecimento. Novamente, impõe-se oexemplo da cooperação espacial com a China, muito embora oêxito do programa CBERS possa ser atribuído primacialmenteao fato <strong>de</strong> a área espacial ser conduzida por atores estatais emambos países, mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> difícil replicação com outros países eem outras áreas.Um problema a ser <strong>de</strong>stacado com a proposta acima seria seucomponente notadamente calcado em elementos <strong>de</strong> oferta tecnológicado exterior para o Brasil (a partir do mapeamento da diáspora, porexemplo). Produz-se um levantamento das capacida<strong>de</strong>s no exterior(o que é <strong>de</strong>sejável e necessário) sem, no entanto, se ter segurançasobre como essas contribuições po<strong>de</strong>m ser assimiladas pelo setorprodutivo <strong>nacional</strong>. Um antídoto contra essa <strong>de</strong>sconexão potencial– e manifesta, em muitos casos práticos, que leva iniciativas <strong>de</strong><strong>inovação</strong> vindas do exterior a não alcançarem o aparato produtivobrasileiro – seria a produção sistemática <strong>de</strong> indicadores e a realização<strong>de</strong> estudos <strong>de</strong> mercado em setores <strong>de</strong> maior intensida<strong>de</strong> tecnológica,que permitam indicar os gargalos e hiatos <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> em todoo circuito produtivo. Somente com essa análise será possível conectara oferta qualificada brasileira <strong>de</strong> conhecimento no exterior com asnecessida<strong>de</strong>s reais expressas em <strong>de</strong>mandas dos setores industriale <strong>de</strong> serviços no Brasil. Outra dificulda<strong>de</strong>, advinda da verificaçãoacima, é a <strong>de</strong> que muitos setores econômicos no Brasil – sem entrarno nível microeconômico das firmas – não dispõem <strong>de</strong> planejamentoestratégico setorial para ampliar sua participação na economia emelhor competirem nos exigentes mercados globais. A acomodaçãocom a produção para o mercado doméstico – ainda mais em tempos <strong>de</strong>aquecimento do consumo –, consiste em fator <strong>de</strong>sestimulador adicionalpara a mobilização da diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&I. Em uma palavra,trata-se <strong>de</strong> evitar que as políticas brasileiras <strong>de</strong> atração da diásporatenham um caráter voluntarista, <strong>de</strong>vendo, ao contrário, ser planejadas235<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 235 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorestrategicamente conforme forem i<strong>de</strong>ntificadas as <strong>de</strong>mandas internascorrespon<strong>de</strong>ntes.De outra parte, programas “tradicionais” <strong>de</strong> cooperação inter<strong>nacional</strong>em C,T&I promovidos pelo Itamaraty <strong>de</strong>vem ser mais focalizados eespecíficos, envolvendo diretamente, sempre que possível, atores nãoestatais que correspondam aos vértices do triângulo da <strong>inovação</strong>, o quecertamente trará resultados mais rápidos e <strong>de</strong> impacto mais contun<strong>de</strong>nte.Esse formato seria aplicável notadamente a programas <strong>de</strong> cooperaçãoque envolvam setores tecnológicos <strong>de</strong> ponta da maioria dos paísesindustrializados. Nesses casos, empresas, universida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong>pesquisa in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes costumam assumir, ao invés do governo, papel<strong>de</strong>terminante e <strong>de</strong> li<strong>de</strong>rança na produção da <strong>inovação</strong> tecnológica e no<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> do setor econômico-industrial em questão (exemplosem polos opostos seriam a indústria farmacêutica no Brasil e no ReinoUnido e nos EUA). Nesse aspecto, países como EUA, Inglaterra,França, Alemanha e Japão, para citar algumas das principais e maisinovadoras economias do mundo, terão dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> engajar seussetores produtivos, acadêmicos e <strong>de</strong> serviços em projetos <strong>de</strong> cooperaçãotecnológica se não tiverem sido previamente conectados com seussetores-espelho no Brasil ou com os brasileiros no exterior atuantes nosetor correspon<strong>de</strong>nte. Visto <strong>de</strong> outro ângulo, é mais fácil concretizar <strong>de</strong>maneira bem-sucedida um programa <strong>de</strong> cooperação (talvez a expressão“ação conjunta” seja mais apropriada) quando os atores encarregados <strong>de</strong>executar esse programa em suas pontas finais são previamente envolvidospelas instâncias governamentais interessadas em sua implementação(abordagem bottom up). O contrário se dá quando organizações autônomas– e ciosas <strong>de</strong> tal autonomia, como a aca<strong>de</strong>mia, o empresariado, o terceirosetor e a socieda<strong>de</strong> civil – são conectados e contactados somente ex post(perspectiva top down). Essa seria justamente uma das razões pelas quaismuitos compromissos <strong>de</strong>rivados <strong>de</strong> Comissões Mistas bilaterais ou <strong>de</strong>acordos genéricos <strong>de</strong> cooperação acabem não sendo implementados ouexecutados <strong>de</strong> forma insatisfatória ou limitada.Há <strong>de</strong> se assinalar, no tocante à contribuição do Itamaraty para o<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico do país, que as ações <strong>de</strong> formação<strong>de</strong> parcerias tecnológicas <strong>de</strong>vem estar claramente dissociadas <strong>de</strong> ações<strong>de</strong> cooperação, sobretudo na modalida<strong>de</strong> prestada, em C,T&I. Não restadúvida quanto à alta relevância da cooperação técnica e tecnológica236<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 236 10/10/2011 14:15:51


conclusõesprestada pelo Brasil a países <strong>de</strong> menor <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo,sobretudo porque o Brasil <strong>de</strong>ve e quer beneficiar-se <strong>de</strong>ssa modalida<strong>de</strong><strong>de</strong> cooperação em sua condição <strong>de</strong> país emergente ou potência médiano quadro das relações internacionais (Soares <strong>de</strong> Lima, p. 07, 1990).Ressalte-se o profundo impacto <strong>de</strong>ssa modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cooperação parao prestígio e influência globais do Brasil, notadamente em momentosem que assume autorida<strong>de</strong> crescente entre os países emergentes e em<strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. Ao inscrever, contudo, essas políticas <strong>de</strong> cooperaçãono mesmo programa <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> busca <strong>de</strong> capacitação tecnológicapara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> econômico <strong>nacional</strong>, este último po<strong>de</strong> per<strong>de</strong>r seufoco e impacto estratégico, na medida em que as políticas tradicionais<strong>de</strong> cooperação (isto é, basicamente <strong>de</strong> governo a governo) ten<strong>de</strong>m a teruma abordagem mais difusa; são voltadas prioritariamente para ações<strong>de</strong> emergência social, sem necessariamente envolver consi<strong>de</strong>raçõesestratégicas <strong>de</strong> longo prazo; não pressupõem intervenção em processosprodutivos; dispõem normalmente <strong>de</strong> menores agilida<strong>de</strong> e flexibilida<strong>de</strong>,por conta do aspecto mais formalizado, <strong>de</strong>codificado e que não incorporamaspectos tácitos do <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico e da <strong>inovação</strong>; nãoalcançam, <strong>de</strong> modo geral, o conjunto da economia ou da socieda<strong>de</strong>,mas apenas alguns <strong>de</strong> seus segmentos, em termos geográficos e sociais.Como corolário <strong>de</strong>ssa necessária separação conceitual entrecooperação prestada e formação <strong>de</strong> parcerias para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>científico-tecnológico, caberia promover o fortalecimento do DCTpor meio <strong>de</strong> uma maior especialização e focalização <strong>de</strong> suas funções.Importante avanço foi a criação, no âmbito do Departamento, da Divisãoda Socieda<strong>de</strong> da Informação (DI), que possibilitará tratar das múltiplasnegociações multilaterais sobre Socieda<strong>de</strong> da Informação e TIC em canaisseparados da DCTEC, com ganhos evi<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho e eficiênciapara ambas Divisões. No entanto, uma nova separação/Divisão po<strong>de</strong>riamostrar-se necessária, <strong>de</strong>sta feita para aprimorar tanto as tarefas maisamplas <strong>de</strong> cooperação em C&T quanto <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológicostrictu senso (mais que o científico, que já possui canais universitáriosbem estruturados para a difusão e intercâmbio <strong>de</strong> conhecimento).Mesmo no plano geral da cooperação, há <strong>de</strong> se ter claramente em contauma taxonomia básica <strong>de</strong> três categorias <strong>de</strong> ações: i) junto a paísescom os quais o Brasil po<strong>de</strong>ria ampliar programas <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong>tecnologia, em ações mais no formato adotado pela Agência Brasileira237<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 237 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior<strong>de</strong> Cooperação (ABC – e que, em certa medida, há tempos vêm sendopromovidas junto a países <strong>de</strong> menor <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo); ii) emrelação a países com os quais po<strong>de</strong>ria haver uma troca mais comutativa<strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> intercâmbio científico-tecnológico, categoria naqual se enquadraria a gran<strong>de</strong> maioria dos emergentes; e iii) em relaçãoa países dos quais o Brasil é ou po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong>mandante frequente <strong>de</strong>programas <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> tecnologia, capacitação industrial eserviços para a <strong>inovação</strong>. No caso específico da América do Sul, duasmedidas necessárias para aprofundar a cooperação para a <strong>inovação</strong>seriam revitalizar o ORPIP e dar pleno seguimento ao programa-marco<strong>de</strong> C,T&I do Mercosul 2008-2012, assim como consi<strong>de</strong>rar o lançamento<strong>de</strong> uma nova rodada <strong>de</strong> negociações diplomáticas com vistas à adoção daproposta peruana <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> virtual <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> tecnológica,temas tratados no capítulo II supra. Ações simples e baratas na linha<strong>de</strong>ssa proposta incluiriam a criação <strong>de</strong> um instrumento semelhante aoda Plataforma Lattes em âmbito sul-americano; a disponibilização parauniversida<strong>de</strong>s e centros <strong>de</strong> pesquisa dos países do Continente, medianteacordos entre bases <strong>de</strong> periódicos científicos na Europa e nos EUA e aUNASUL, do portal <strong>de</strong> periódicos da CAPES; e a formação <strong>de</strong> um banco<strong>de</strong> dados <strong>de</strong> boas práticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Continente.No tocante à tipologia tripartite para a cooperação e ação tecnológicasapresentada acima, os SECTEC no exterior teriam <strong>de</strong> ser orientados aatuar <strong>de</strong> acordo com o enquadramento do respectivo país nessa política <strong>de</strong>cooperação ou <strong>de</strong> ação para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> em C,T&I. No caso dospaíses da primeira categoria, em que o Brasil é prestador da cooperaçãocientífico-tecnológica (a cooperação em <strong>inovação</strong>, prestada ou recebida,é ainda inexpressiva) o i<strong>de</strong>al seria que o DCT pu<strong>de</strong>sse contar com umaDivisão à parte, uma vez que a cooperação seria sempre acompanhada<strong>de</strong> um movimento <strong>de</strong> capacitação em C,T&I e <strong>de</strong> fotalecimento dainfraestrutura <strong>de</strong> pesquisa para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> local, em primeiraanálise do próprio <strong>sistema</strong> universitário (notadamente nos países <strong>de</strong>língua portuguesa). Uma alternativa seria a ABC dispor <strong>de</strong> uma seçãoespecífica sobre cooperação em C,T&I, além das <strong>de</strong>mais relacionadasà cooperação técnica. Em todo caso, no tocante à cooperação prestadapelo Brasil aos países <strong>de</strong> menor <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> relativo, é essencialuma estreita coor<strong>de</strong>nação entre o DCT e a ABC, assim como no tocanteao apoio à formação e fortalecimento <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> da diáspora brasileira238<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 238 10/10/2011 14:15:51


conclusõesem C,T&I será imperiosa uma articulação fluida e ágil entre o DCT e oDCB, e entre ambos e o MCT.O importante, nesse aspecto, é que a DCTEC seja essencialmenteum polo facilitador <strong>de</strong> transferência e absorção <strong>de</strong> C,T&I produzida noexterior, sempre com o apoio da diáspora, que seria ainda <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>valia – além dos diversos argumentos alinhavados – para a negociaçãodos sempre espinhosos aspectos relativos à proprieda<strong>de</strong> intelectual. Paratanto, <strong>de</strong>verá haver um duplo movimento <strong>de</strong> capacitação institucional:no exterior, os SECTEC em países do segundo ou terceiro grupos acima<strong>de</strong>lineados (Argentina, México, Estados Unidos, Espanha, França, ReinoUnido, Alemanha, Irlanda, Japão, Índia, China – inclusive Taiwan –,Coreia, Cingapura e Austrália) <strong>de</strong>veriam instituir “observatórios <strong>de</strong><strong>inovação</strong>”, sempre com a organização e envolvimento da diáspora emC,T&I, quando possível 245 . No caso <strong>de</strong> países com pequeno contingentebrasileiro <strong>de</strong> “agentes <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>” (como Irlanda, Cingapura e Índia,por exemplo), po<strong>de</strong>-se, conforme o caso, recorrer a re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> diásporamais organizadas <strong>de</strong> outros países, ou o próprio SECTEC po<strong>de</strong>riaassumir – como já estaria fazendo, em alguns casos – os contatos diretoscom Departamentos universitários, associações e empresas <strong>de</strong> <strong>de</strong>staqueno país, com vistas a criar canais <strong>de</strong> apoio para o acompanhamentoda <strong>inovação</strong>. Em certa medida, esse trabalho ampliado do SECTEC,por meio do funcionamento dos observatórios <strong>de</strong> acompanhamento,assemelhar-se-ia ao do <strong>sistema</strong> SIPRI, dos SECOM/DPR 246 .245O governo peruano anunciou, em agosto <strong>de</strong> 2008, a criação <strong>de</strong> “adidâncias científicas etecnológicas no exterior”, que seriam ocupadas por pesquisadores e cientistas da diáspora peruana.As novas repartições <strong>de</strong>verão funcionar, em princípio, em postos nos EUA, França, Alemanha,Espanha, Coreia e Japão.246O Sistema <strong>de</strong> Promoção <strong>de</strong> Investimentos e Transferência <strong>de</strong> Tecnologia para Empresas(SIPRI) tem por objetivo facilitar a transferência <strong>de</strong> tecnologia para empresas brasileiras, a partir<strong>de</strong> informações prestadas por uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> pontos focais no Brasil, que congregam Associações eFe<strong>de</strong>rações empresariais <strong>de</strong> diversos Estados brasileiros. A ausência <strong>de</strong> um foco mais específicoem <strong>inovação</strong> e em <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico <strong>de</strong> longo prazo tem levado este excelenteprograma, entretanto, a não diferenciar-se das ações típicas <strong>de</strong> promoção comercial (<strong>de</strong> firmasbrasileiras no exterior) e <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> investimentos (<strong>de</strong> empresasestrangeiras no Brasil). Talvez a melhor estratégia, no caso dos laboratórios <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> – econtrariamente à recomendação estipulada para as relações entre a diáspora e o setor produtivobrasileiro –, não seja aten<strong>de</strong>r a <strong>de</strong>mandas específicas das empresas brasileiras (por conta <strong>de</strong> umasérie <strong>de</strong> fatores históricos e econômicos assinalados no capítulo III), mas sim disponibilizar umaoferta <strong>de</strong> tecnologia e <strong>inovação</strong> do exterior que seria concentrada em um banco alimentado pelosSECTEC/SICTEX e SECOM, para uso potencial pelas empresas brasileiras (especialmente as239<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 239 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorA gran<strong>de</strong> pergunta <strong>de</strong>ste exercício normativo – consi<strong>de</strong>rando que sepossa efetivamente formar uma base <strong>de</strong> dados e <strong>de</strong> experiências recentes(preferentemente em tempo real) <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> nos países assinalados –é qual o <strong>de</strong>stino das informações recolhidas? Nesse ponto, a SEREpo<strong>de</strong>ria contar com um núcleo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, preferentemente adstrito àDCTEC, que facilitaria e disponibilizaria os dados e contatos reunidospara os setores produtivos brasileiros <strong>de</strong> base tecnológica e intensivosem serviços, sobretudo nas indústrias criativas, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> potencial <strong>de</strong>expansão inter<strong>nacional</strong> (basta atinar para o êxito das telenovelas e daparaliteratura brasileira no exterior). O levantamento <strong>de</strong>sses dados econtatos consistiria na atribuição essencial <strong>de</strong> um hipotético núcleo <strong>de</strong><strong>inovação</strong>, informação que assumiria a forma <strong>de</strong> tecnologias maduras ou<strong>de</strong> partes ou etapas <strong>de</strong> processos tecnológicos ainda indisponíveis ouinacessíveis para os setores produtivos e <strong>de</strong> serviços brasileiros. Issonão significa, naturalmente, que os núcleos <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> po<strong>de</strong>rão teracesso a toda e qualquer tecnologia (basta mencionar as complicaçõesenvolvidas na obtenção <strong>de</strong> informações relativas a tecnologias <strong>de</strong> uso duale a proteção <strong>de</strong> produtos e processos industriais por patentes e segredosempresariais). Longe <strong>de</strong>ssas situações mais extremas, no entanto, tambémé natural que um ponto <strong>de</strong> observação institucionalizado no exterior,com amplas conexões no meio local <strong>de</strong> C,T&I, po<strong>de</strong>rá atuar como elofacilitador <strong>de</strong> aquisição, assimilação e absorção <strong>de</strong> tecnologias paraempresas e entida<strong>de</strong>s brasileiras <strong>de</strong> P&D, a partir do exterior.O núcleo da SERE – que seria o espelho e ponto focal dos observatórios<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> situados no âmbito dos SECTEC/SICTEX – <strong>de</strong>verá aindamanter, por sua vez, banco <strong>de</strong> dados dinâmico sobre os setores <strong>de</strong>ponta da economia brasileira, com apoio do MDIC (Departamentos <strong>de</strong>Competitivida<strong>de</strong> Industrial e <strong>de</strong> Articulação Tecnológica) e do MCT(Secretarias <strong>de</strong> Desenvolvimento Tecnológico e Inovação e CNPq) edisseminar, entre esses setores, informações referentes a oportunida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> investimento, licenciamento, processos produtivos inovadores epossibilida<strong>de</strong>s e requisitos para a formação <strong>de</strong> parcerias ou mesmo <strong>de</strong>joint ventures com empresas estrangeiras no exterior. Os SECTEC/SICTEX <strong>de</strong>veriam, nesse caso, po<strong>de</strong>r contar com o apoio <strong>de</strong> consultorese especialistas em tecnologia industrial e economia da <strong>inovação</strong>, para apequenas e médias). Agra<strong>de</strong>ço ao Secretário Benhur Viana, à época (novembro <strong>de</strong> 2007) lotadona DPG, por ter prestado valiosas informações sobre a operação do SIPRI.240<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 240 10/10/2011 14:15:51


conclusõeselaboração <strong>de</strong> estudos e disseminação das informações já processadas,na forma <strong>de</strong> pré-projetos <strong>de</strong> factibilida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> termos <strong>de</strong> referência.Tal esforço naturalmente requererá um substancial incremento <strong>de</strong>meios, orçamento e condições operativas dos SECTEC, po<strong>de</strong>ndo umaexperiência-piloto ser lançada na Embaixada em Washington, a única,ao que consta, com um setor <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> mais estruturado e que mantémestreita coor<strong>de</strong>nação com entida<strong>de</strong>s como as citadas BRASA e “IntegraBrazil”.Tal ampliação das tarefas dos SECTEC exigirá ainda mais recursosà medida que os Setores po<strong>de</strong>riam assumir muitas das funções adicionaistípicas do Science and Innovation Network do BIS/FCO britânicos(ver capítulo V), tais como: promoção <strong>de</strong> seminários científicos e naárea <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> (os exemplos da Embaixada em Londres são bastanteprofícuos); gestão dos novos observatórios <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>; apresentação<strong>de</strong> propostas <strong>de</strong> financiamento (mediante consulta ao MCT e àsFundações Estaduais) <strong>de</strong> projetos conjuntos <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> interessedireto para a política brasileira <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>, preferencialmente – mas nãoobrigatoriamente – na linha das priorida<strong>de</strong>s estipuladas pela PDP e pelo“Brasil Maior”; divulgação dos feitos da ciência brasileira (com atuação eapoio direto da comunida<strong>de</strong> acadêmica no Brasil e da diáspora em C,T&I)nos <strong>de</strong>partamentos acadêmicos e centros <strong>de</strong> pesquisa locais, com vistasà formação <strong>de</strong> parcerias e <strong>de</strong> projetos integrados 247 ; e estabelecimento<strong>de</strong> contatos para o cofinanciamento local <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s. Em suma,trata-se <strong>de</strong> conferir aos SECTEC um perfil muito mais propositivo,<strong>de</strong> buscar a <strong>inovação</strong> on<strong>de</strong> ela se encontra, para disponibilizá-la, nasmelhores condições possíveis, para a economia brasileira, antes <strong>de</strong> reagiràs priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cooperação estabelecidas pelo país on<strong>de</strong> estão situadose <strong>de</strong> envolverem-se com a gran<strong>de</strong> e inevitável <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> cooperação e<strong>de</strong> programas localizados que constituem o dia a dia das Embaixadas eConsulados. Nessa nova perspectiva, os SECTEC seriam responsáveispela provisão <strong>de</strong> informações precisas sobre a oferta local <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>,a serem processadas e disseminadas pelos órgãos e agentes incumbidos<strong>de</strong> implementar políticas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no Brasil.247Uma outra possibilida<strong>de</strong> seria propor a estações locais <strong>de</strong> TV a coprodução <strong>de</strong> documentáriossobre a ciência e a tecnologia brasileiras, para difusão <strong>de</strong> seus feitos e <strong>de</strong> sua elevadacompetitivida<strong>de</strong> inter<strong>nacional</strong>. Cabe, vale ressaltar, mudar a imagem prepon<strong>de</strong>rante brasileira<strong>de</strong> <strong>de</strong>stino turístico para uma <strong>de</strong> país em plena construção <strong>de</strong> uma economia do conhecimento(ainda que as duas realida<strong>de</strong>s não sejam necessariamente exclu<strong>de</strong>ntes).241<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 241 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorTrata-se ainda <strong>de</strong> ampliar a diplomacia da <strong>inovação</strong> para além da esferagovernamental, assumindo os SECTEX tarefas <strong>de</strong> meta-<strong>inovação</strong>, taiscomo observar e registrar políticas públicas <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>adasnos países on<strong>de</strong> estão situados e manter contatos com os pontos nacionaisdas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> diáspora em C,T&I <strong>de</strong> países como México, Escócia, Chile,China, Índia, Irlanda, Colômbia e África do Sul 248 , re<strong>de</strong>s que funcionammelhor e há mais tempo que as congêneres brasileiras.Importante elemento a ser <strong>de</strong>stacado é que o acompanhamento da<strong>inovação</strong> no exterior <strong>de</strong>ve abarcar o pleno sentido do conceito, isto é, não<strong>de</strong>ve se cingir ao acompanhamento das indústrias <strong>de</strong> ponta tecnológica,mas incluir experiências bem-sucedidas (assim como as que eventualmentefracassem) <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> no próprio governo, mormente em áreas comosaú<strong>de</strong>, trabalho e emprego e educação. A <strong>inovação</strong> <strong>de</strong> interesse nãocorrespon<strong>de</strong> somente a novos produtos e processos, mas à recombinação<strong>de</strong> processos existentes, à sua aplicação a contextos diferenciados e sobbases e perspectivas não tradicionais. Como exemplos a consi<strong>de</strong>rar, oSECTEC Londres po<strong>de</strong>ria produzir estudo sobre a aplicação do <strong>sistema</strong>Power to Innovate na educação britânica; Washington ou um Consuladonos EUA po<strong>de</strong>ria prover informações sintéticas, mas com <strong>de</strong>scriçãominuciosa <strong>de</strong> exemplos concretos, sobre o funcionamento do muitobem-sucedido programa Small Business Innovation Research – SBIR;a Embaixada em Pequim po<strong>de</strong>ria propor estudo sobre o papel da ACCem sua interação com o setor privado e a geração e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong><strong>de</strong> empresas <strong>de</strong> base tecnológica; e a Embaixada em Tóquio estaria emcondições <strong>de</strong> reunir informações sobre as ativida<strong>de</strong>s profissionais elaborais dos <strong>de</strong>casséguis semiqualificados, sobretudo no que tange ao seuaprendizado da cultura gerencial e produtiva japonesa, conhecimento quepo<strong>de</strong> ser <strong>de</strong> valia para a indústria brasileira e para uma futura recolocação<strong>de</strong>sses profissionais no mercado <strong>de</strong> trabalho brasileiro, agora mais emtempos <strong>de</strong> reversão do fluxo migratório a partir dos efeitos da crisefinanceira inter<strong>nacional</strong>.No âmbito da SERE, a DCTEC po<strong>de</strong>ria promover reuniõesespecializadas, temáticas e <strong>de</strong> corte horizontal entre setores específicos248A África do Sul dispõe <strong>de</strong> duas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> diápora, cuja organização e criação <strong>de</strong>rivaram <strong>de</strong>iniciativas da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cape Town: a South African Network of Skills Abroad (SANSA),criada em 1998, e a South African Diaspora Network, fundada em 2001. A <strong>de</strong>scrição da operaçãoe resultados alcançados por ambas entida<strong>de</strong>s consta <strong>de</strong> Kuznetzov & Sabel (pp. 17-19, 2006).242<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 242 10/10/2011 14:15:51


conclusõesda economia da <strong>inovação</strong>, não exatamente para <strong>de</strong>tectar <strong>de</strong>mandas, maspara prospectá-las. Quer dizer, a reunião funcionaria como um catalisadorpara estimular setores essenciais para o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, ainda poucoexplorados ou mesmo praticamente inexistentes, para alçar o patamar<strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses setores a partir da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> apoios formadapelos SECTEC redimensionados e pela diáspora brasileira <strong>de</strong> C,T&Ino exterior. Um exemplo seria a ainda incipiente indústria brasileira <strong>de</strong>biomateriais. Trata-se <strong>de</strong> setor cujo <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> gera amplo impactona economia, em termos <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong>, valor e cuja substituição <strong>de</strong>importações, e posteriormente capacitação para as exportações, po<strong>de</strong>rátrazer expressivos resultados para o comércio exterior do país 249 . Dessemodo, a DCTEC po<strong>de</strong>ria promover reunião conjunta com Associaçõesprofissionais da área médica e odontológica brasileiras (tais como a“Associação Brasileira da Indústria <strong>de</strong> Artigos e Equipamentos Médicos,Odontológicos, Hospitalares e <strong>de</strong> Laboratórios” – ABIMO), empresas,indústrias e usuários, além <strong>de</strong> com as unida<strong>de</strong>s acadêmicas mais<strong>de</strong>stacadas no Brasil sobre o tema (Unicamp, Estadual <strong>de</strong> São Carlose Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> São Carlos, por exemplo) para estudar, prospectivamente,on<strong>de</strong> residiriam os principais gargalos <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> produtiva e<strong>de</strong> pesquisa, com vistas a buscar meios no exterior – e com base eminformações prestadas pelo próprio setor, em conjunção com as pontasrepresentadas pelos SECTEC, seus observatórios e pela diáspora –para suprir tais <strong>de</strong>ficiências. Outras áreas a serem consi<strong>de</strong>radas, porexemplo, seriam fotônica e optoeletrônica, bioengenharia, bioeletrônicae biodispositivos, nanotecnologia e nanobiotecnologia, economia dohidrogênio e engenharia mecatrônica, áreas em que o Brasil dispõe<strong>de</strong> importante massa crítica, mas <strong>de</strong> ainda incipiente aproveitamentoindustrial. O seminário realizado em Glasgow sobre optoeletrônica,objeto da nota 237 supra, terá rendido, entre diversas realizações, aabertura e posterior <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> uma linha <strong>de</strong> pesquisa sobrenanomotores em <strong>de</strong>partamentos acadêmicos <strong>de</strong> física <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>sbrasileiras.Da mesma forma, no setor <strong>de</strong> serviços, um possível núcleo <strong>de</strong><strong>inovação</strong> da DCTEC, em conjunção com os SECTEC ampliados, <strong>de</strong>veráprospectar iniciativas como fortalecimento <strong>de</strong> engenharia telemática;modalida<strong>de</strong>s organizacionais e administrativas <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s,249Estima-se em US$ 4,4 bilhões o déficit da balança comercial brasileira no setor <strong>de</strong> biomateriais.243<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 243 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorserviços <strong>de</strong> telemedicina e ensino a distância; formar, a partir dosSECTEC/SICTEX, um banco <strong>de</strong> boas práticas em exploração sustentávele competitiva do turismo; i<strong>de</strong>ntificar as motivações e instrumentos<strong>de</strong> que dispõem certas indústrias criativas lí<strong>de</strong>res em todo o mundo,sobretudo em setores em que o Brasil po<strong>de</strong> ampliar exponencialmente suapresença inter<strong>nacional</strong>, tais como propaganda, televisão, moda e <strong>de</strong>sign(móveis, têxteis, arquitetura, artesanato – sobretudo indígena 250 , etc.).Como se po<strong>de</strong> ver, trata-se <strong>de</strong> um programa <strong>de</strong> certa ambição, voltadopara <strong>de</strong>scondicionar atitu<strong>de</strong>s e programas mais reflexivos que associama C,T&I brasileira – e o próprio trabalho do DCT – essencialmente aprogramas <strong>de</strong> cooperação <strong>de</strong> base tecnológica industrial e tangível. Essanova perspectiva em muito se assemelharia à do DIUS/BIS britânicos,que <strong>de</strong>ixaram as portas abertas para apoiar a <strong>inovação</strong> em quaisquer <strong>de</strong>suas manifestações, ativida<strong>de</strong>s ou setores.Dois outros <strong>de</strong>scondicionamentos importantes para os quaispo<strong>de</strong> contribuir o Itamaraty, através <strong>de</strong> uma atuação redimensionadada DCTEC e dos SECTEC (o epíteto redimensionamento tem sidoempregado para indicar que não se cogita uma alteração profunda domodus operandi da Divisão, mas a incorporação <strong>de</strong> novas e atualizadasresponsabilida<strong>de</strong>s), seriam adotar atitu<strong>de</strong>s e perspectivas <strong>de</strong> trabalhoclaramente orientadas a apoiar o setor produtivo e a iniciativa privadabrasileira com programas <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> tecnológica e <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>inter<strong>nacional</strong>, além <strong>de</strong> transcen<strong>de</strong>r o conceito <strong>de</strong> “economia doconhecimento natural” para apoiar o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> <strong>de</strong> setores em queo Brasil não possui vantagens comparativas e que estejam mesmo pouco<strong>de</strong>senvolvidos no país. O pressuposto, nesse caso, é <strong>de</strong> que o agronegóciobrasileiro, justamente por ter alcançado estágio notável <strong>de</strong> expansãoprodutiva e <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> científico-tecnológico – e por já contarcom instrumentos <strong>de</strong> apoio e trajetórias <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência que sempre osituarão na fronteira produtiva mundial –, requer menos apoio que osoutros nascentes setores das indústrias criativas e <strong>de</strong> base tecnológicapara posicionar-se no mercado inter<strong>nacional</strong>. O meio e a comunida<strong>de</strong>brasileiras <strong>de</strong> C,T&I <strong>de</strong>verão resistir a posições que situam o futuroda competitivida<strong>de</strong> brasileira quase que exclusivamente na “economia250O potencial <strong>de</strong> exportação <strong>de</strong> artesanato indígena foi objeto da matéria “Amazônia tem <strong>de</strong>zmil plantas com potencial econômico”, Agência CT, Notícias MCT, 26/12/2008, disponível em.244<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 244 10/10/2011 14:15:51


conclusõesnatural”, fechando a porta para promissores setores inovadores <strong>de</strong> ponta(e ainda que a <strong>inovação</strong> também possa ser aplicada ao agro, mediante, porexemplo, a diversificação e maior equilíbrio na produção e exportação<strong>de</strong> produtos agropecuários).No tocante ao argumento do apoio às empresas brasileiras, não setrata <strong>de</strong> enunciado óbvio ou banal: há <strong>de</strong> se ter em conta, com gran<strong>de</strong>respeito, argumentos <strong>de</strong> setores minoritários, mas bastante influentes dopensamento brasileiro sobre C,T&I (refiro-me particularmente a Dagnino,2002 e 2008, e a Dagnino & Dias, 2007) <strong>de</strong> que o Estado <strong>de</strong>ve eximir-se<strong>de</strong> apoiar o setor privado como estratégia <strong>de</strong> construção e consolidação<strong>de</strong> um SNB. Na medida, porém, em que o Estado brasileiro consagrou(inclusive no art. 170 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral) o princípio da livreiniciativa como fundamento da or<strong>de</strong>m econômica, não caberia hesitaçõesquanto ao uso legítimo da sua estrutura para fortalecer a competitivida<strong>de</strong>inter<strong>nacional</strong> e tecnológica do setor privado. Tais hesitações não rarolevam a meias medidas, meios programas, insegurança jurídica e baixaeficácia <strong>de</strong> programas e projetos <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>. Uma das gran<strong>de</strong>sbarreiras mentais ao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico e à <strong>inovação</strong> noBrasil (que nada têm a ver com o âmbito e a orientação da discussãoproposta pelos autores acima) é o sentimento inconsciente <strong>de</strong> culpa queacompanha nossa histórica condição <strong>de</strong> país entre os mais <strong>de</strong>siguais domundo. Há <strong>de</strong> se ter, igualmente clara, a diferença entre o apoio legítimoao <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> tecnológico e da <strong>inovação</strong> no setor privado brasileiroe os favores políticos, o cartorialismo e o patrimonialismo que vicejaramna época da substituição <strong>de</strong> importações.A <strong>de</strong>speito da razoabilida<strong>de</strong> prima facie das sugestões apresentadasacima – ainda que não perfeitamente alinhavadas – é incongruente como conceito <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> querer ter a pretensão <strong>de</strong> que certas fórmulaspo<strong>de</strong>rão ser bem-sucedidas e repetidas em contextos distintos das queforam inicialmente concebidas e observadas. Nesse aspecto, todo processo<strong>de</strong> <strong>inovação</strong> é, em última análise, único e ad hoc. Alguns ingredientesgenéricos são, porém, comuns a todas as experiências exitosas <strong>de</strong><strong>inovação</strong>: a existência <strong>de</strong> instituições sociais facilitadoras e receptivas anovas i<strong>de</strong>ias e perspectivas; o investimento em capital humano, em todasas formas e etapas da aprendizagem; a existência <strong>de</strong> ambientes <strong>de</strong> trabalhoestimuladores do pensamento crítico e da livre circulação <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias; acoexistência <strong>de</strong> setores privados e públicos fortes e complementares,245<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 245 10/10/2011 14:15:51


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorconsoante padrões neo<strong>de</strong>senvolvimentistas; a correta leitura e antecipação<strong>de</strong> tendências econômicas e sociais internacionais; o reconhecimento<strong>de</strong> que a <strong>inovação</strong> po<strong>de</strong> brotar <strong>de</strong> setores econômicos variados e nãonecessariamente <strong>de</strong> ponta; a transversalida<strong>de</strong> temática, geográfica esetorial <strong>de</strong>sses processos; e um grau importante <strong>de</strong> aceitação do risco(diante <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s investimentos que po<strong>de</strong>m gerar resultados pífios) e<strong>de</strong> reconhecimento do papel que <strong>de</strong>sempenha o acaso (como quando,por exemplo, floresceu a indústria <strong>de</strong> software na Índia, justamenteno momento em que o país contava com uma multidão <strong>de</strong> cientistas epesquisadores da área no exterior, sobretudo nos EUA que, por sua vez,inaugurava a revolução na informação e nas comunicações do começoda década <strong>de</strong> 90). O Brasil possui bases e fundamentos econômicospara o <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>, com a presente crise po<strong>de</strong>ndo ser vista comomomento <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> sacrifícios para uma nova etapa da suaeconomia. Talvez jamais tenha havido tempos mais oportunos e maisurgentes para que a <strong>inovação</strong> venha a se tornar um projeto <strong>nacional</strong>, <strong>de</strong>Estado, do governo e da socieda<strong>de</strong>.246<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 246 10/10/2011 14:15:51


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ibliografiaIII – Jornais, periódicos impressos e eletrônicos mencionadosno texto:Agência CT – Notícias MCTBBSRC BusinessCenário Econômico – MacroanáliseChina DailyChina Economic and Business NewsChina NewsChina Radio InternationalChina S&T NewsletterChinese Aca<strong>de</strong>my of Science NewsConjuntura EconômicaFinancial TimesFolha <strong>de</strong> S. PauloForeign Broadcast Information ServiceGazeta MercantilGov.cn – Chinese government’s official web portalJornal da UnicampNatureO GloboPeople’s Daily (China)Radiobras – Agência BrasilScienceScience and Development Network (SciDev)Science and Technology NewsletterTempo Real CEBRIThe GuardianThe In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntThe TimesTime MaganizeTimes Higher Education SupplementValor EconômicoWashington PostXinghua News269<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 269 10/10/2011 14:15:52


<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 270 10/10/2011 14:15:52


Anexos1.1 – Glossário <strong>de</strong> siglas e acrônimosABCABDIABIMOABIPTIABTLuSACCAEBAEBAIRBBSRCBERDBERRBISAgência Brasileira <strong>de</strong> CooperaçãoAgência Brasileira <strong>de</strong> Desenvolvimento IndustrialAssociação Brasileira da Indústria <strong>de</strong> Artigose Equipamentos Médicos, Odontológicos,Hospitalares e <strong>de</strong> LaboratóriosAssociação Brasileira <strong>de</strong> Instituições <strong>de</strong> PesquisaTecnológicaAssociação Brasileira <strong>de</strong> Tecnologia Luz SíncrotonAca<strong>de</strong>mia Chinesa <strong>de</strong> CiênciasAgência Espacial BrasileiraAssociação dos Exportadores BrasileirosAnnual Innovation ReportBiotechnology and Biological Sciences ResearchCouncilBusiness expenditure in research and <strong>de</strong>velopmentDepartment of Business, Enterprise and RegulatoryReformDepartment for Business, Innovation and Skills271<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 271 10/10/2011 14:15:52


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorBNDEBNDESBRASABSIC&TC,T&ICAECAPESCBERSCBICBPFCCLRCCCTCEBRICENPESCEPALCEPEA/USPCEPELCEPLACCETExCFRCGEECISCMCCNENCNOOCCNPqCOPPE/UFRJBanco Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento EconômicoBanco Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Econômico eSocialBrazilian Studies Association (Estados Unidos)British Standards InstituteCiência e tecnologiaCiência, tecnologia e <strong>inovação</strong>Curso <strong>de</strong> Altos EstudosCoor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal doEnsino SuperiorChina-Brazil Earth Resource SatelliteConfe<strong>de</strong>ration of British IndustriesCentro Brasileiro <strong>de</strong> Pesquisas FísicasCouncil for the Central Laboratory of the ResearchCouncilsConselho Nacional <strong>de</strong> Ciência e TecnologiaCentro Brasileiro <strong>de</strong> Relações InternacionaisCentro <strong>de</strong> Pesquisas e Desenvolvimento da PetrobrasComissão Econômica para a América Latina e oCaribeCentro <strong>de</strong> Estudos Avançados em EconomiaAplicada da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São PauloCentro <strong>de</strong> Pesquisas <strong>de</strong> Energia Elétrica doMinistério das Minas e EnergiaComissão Executiva do Plano da Lavoura CacaueiraCentro Tecnológico do ExércitoCouncil on Foreign Relations (Nova York)Centro <strong>de</strong> Gestão e Estudos EstratégicosCommunity Innovation Survey (União Europeia)Conselho do Mercado ComumComissão Nacional <strong>de</strong> Energia NuclearChina National Offshore Oil CorporationConselho Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Científicoe TecnológicoCoor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-Graduação emEngenharia da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong>Janeiro272<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 272 10/10/2011 14:15:52


anexosCOSTIND Commission on Science, Technology and Industryfor National Defense (China)CPCChina’s People’s CongressCRIATEC Fundo <strong>de</strong> investimentos <strong>de</strong> “capital semente”CSAChief Scientific AdviserCSTCouncil for Science and TechnologyDCBDepartamento Consular e <strong>de</strong> Brasileiros no ExteriorDCMSDepartment of Culture, Media and SportDCSFDepartment for Children Schools and FamilesDCTDepartamento <strong>de</strong> Ciência e TecnologiaDCTEC Divisão <strong>de</strong> Ciência e TecnologiaDCTEC Divisão <strong>de</strong> Ciência e TecnologiaDDSDivisão <strong>de</strong> Desarmamento e Tecnologias SensíveisDFEEDepartment for Education and EmploymentDFESDepartment for Education and SkillsDfIDDepartment for International DevelopmentDIDivisão da Socieda<strong>de</strong> da InformaçãoDIPIDivisão <strong>de</strong> Proprieda<strong>de</strong> IntelectualDIUSDepartment for Innovation Universities and SkillsDPCTDepartamento <strong>de</strong> Política Científica e Tecnológicado Instituto <strong>de</strong> Geografia da Universida<strong>de</strong> Estadual<strong>de</strong> CampinasDPGDivisão <strong>de</strong> Programas <strong>de</strong> Promoção Comercial(MRE)DPRDepartamento <strong>de</strong> Promoção ComercialDTIDepartment of Tra<strong>de</strong> and Industry (Reino Unido)DUIDoing, using and interactingEmbraer Empresa Brasileira <strong>de</strong> Aeronáutica S. A.EMBRAPA Empresa Brasileira <strong>de</strong> Pesquisa AgropecuáriaENAPEscola Nacional <strong>de</strong> Administração PúblicaEPSRCEngineering and Physical Sciences ResearchCouncilESRCEconomic and Social Research CouncilFAPESP Fundação <strong>de</strong> Amparo à Pesquisa do Estado <strong>de</strong> SãoPauloFAPESP Fundação <strong>de</strong> Amparo à Pesquisa do Estado <strong>de</strong> SãoPaulo273<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 273 10/10/2011 14:15:53


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorFCOFCOFEFINEPFIOCRUZFNCNCFNDCTFOCEMFP7FUNTECGCSAGERDGO-ScienceGSIFHEFCHEFCEHEIFHMTIBGEICTIDEIDHIDRCIEA-USPIFESIMEIMPAINBINCTForeign & Commonwealth OfficeForeign and Commonwealth OfficeFurther EducationFinanciadora <strong>de</strong> Estudos e ProjetosFundação Osvaldo CruzFundação Nacional <strong>de</strong> Ciências Naturais da ChinaFundo Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Científico eTecnológicoFundo <strong>de</strong> Convergência Estrutural do MercosulSeventh Framework Programme for Research andTechnological Development (União Europeia)Fundo tecnológico e, antes, Fundo <strong>de</strong> <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>técnico-científicoGovernment Chief Scientific Adviser (Reino Unido)Gross expenditure in research and <strong>de</strong>velopmentGovernment Office for ScienceGlobal Science and Innovation Forum (ReinoUnido)Higher Education Funding CouncilsHigher Education Funding Council for EnglandHigher Education Innovation FundHer Majesty’s TreasuryInstituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e EstatísticaInstitutos <strong>de</strong> Ciência e TecnologiaInvestimento direto estrangeiroÍndice <strong>de</strong> Desenvolvimenbto Humanos (NaçõesUnidas)International Development Research Centre(Canadá)Instituto <strong>de</strong> Estudos Avançados da Universida<strong>de</strong><strong>de</strong> São PauloInstituições Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong> Ensino SuperiorInstituto Militar <strong>de</strong> EngenhariaInstituto Nacional <strong>de</strong> Matemática Pura e AplicadaIndústrias Nucleares do BrasilInstitutos Nacionais <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia274<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 274 10/10/2011 14:15:53


anexosINMETROINPAINPEIPEAIRAISTPITAKIPKTNKTPLABEXLHCLNALNCCLNLSLSCMAPAMCTMDICMECMercosulMMEMOSTMPEMRCMRENDRCNEIT/UnicampNESTANHSNICInstituto Nacional <strong>de</strong> Metrologia, Normalização eQualida<strong>de</strong> Industrial INPI Instituto Nacional daProprieda<strong>de</strong> IndustrialInstituto Nacional <strong>de</strong> Pesquisas da AmazôniaInstituto Nacional <strong>de</strong> Pesquisas EspaciaisInstituto <strong>de</strong> Pesquisas Econômicas AplicadasIrish Republican ArmyIn<strong>de</strong>x to Scientific & Technical ProceedingsInstituto Tecnológico da AeronáuticaNational Knowledge Innovation Program (China)Knowledge Transfer NetworkKnowledge Transfer PartnershipLaboratório no exterior EMBRAPALarge Hadron Colli<strong>de</strong>rLaboratório Nacional <strong>de</strong> AstrofísicaLaboratório Nacional <strong>de</strong> Computação CientíficaLaboratório Nacional <strong>de</strong> Luz SíncrotronLearning and Skills Council (Reino Unido)Ministério da Agricultura, Pecuária e AbastecimentoMinistério da Ciência e Tecnologia (Brasil)Ministério do Desenvolvimento, Integração eComércio ExteriorMinistério da Educação (Brasil)Mercado Comum do SulMinistério das Minas e Energia (Brasil)Ministry of Science and Technology (China)Micro e pequenas empresasMedical Research CouncilMinistério das Relações Exteriores (Brasil)National Development and Reform Commission(China)Núcleo <strong>de</strong> Economia Industrial e da Tecnologia daUniversida<strong>de</strong> Estadual <strong>de</strong> CampinasNational Endowment for Science Technology andthe ArtsNational Health ServiceNational Innovation Centre275<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 275 10/10/2011 14:15:53


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorNICNewly industrialized countriesNPLNational Physics Laboratory (Reino Unido)NSANational Skills Aca<strong>de</strong>myNSFCNational Natural Science Foundation of ChinaOCDEOrganização para a Cooperação e DesenvolvimentoEconômicoOECDOrganization of Economic Cooperation andDevelopmentOMCOrganização Mundial do ComércioONObservatório NacionalONSOffice for National Statistics (Reino Unido)ONSA/FAPESP Organization for Nucleoti<strong>de</strong> Sequencing andAnalysis Instituto <strong>de</strong> Genômica VirtualORPIPObservatório regional permanente sobre integraçãoprodutiva no MercosulOSIOffice for Science and InnovationOSTOffice for Science and Technology (Reino Unido)OTCAOrganização do Tratado <strong>de</strong> Cooperação AmazônicaP&DPesquisa e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>P,D&IPesquisa, <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong> e <strong>inovação</strong>PACPrograma <strong>de</strong> aceleração do crescimentoPACTIPlano <strong>de</strong> Ação <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia para aIndústria (Brasil)PACTIPlano <strong>de</strong> Ação <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia e Inovaçãopara o Desenvolvimento NacionalPCCPartido Comunista da ChinaPCTPolítica científico-tecnológicaPCTIPolítica <strong>de</strong> ciência, tecnologia e <strong>inovação</strong>PDPPolítica <strong>de</strong> Desenvolvimento ProdutivoPDTAPrograma <strong>de</strong> Desenvolvimento Técnico Agropecuário(Brasil)PDTIPrograma <strong>de</strong> Desenvolvimento Técnico Industrial(Brasil)Petrobras Petróleo Brasileiro S. A.PIBProduto Interno BrutoPINTEC Pesquisa <strong>de</strong> Inovação Tecnológica276<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 276 10/10/2011 14:15:53


anexosPISA-OCDEPITCEPPPPSCIRAERALRBMLQRCRCUKRDARECyTPrograma Inter<strong>nacional</strong> <strong>de</strong> Avaliação <strong>de</strong> Alunos daOrganização para a Cooperação e DesenvolvimentoEconômicoPolítica Industrial, Tecnológica e <strong>de</strong> ComércioExteriorPurchasing Power ParityPrograma <strong>de</strong> Substituição Competitiva <strong>de</strong>ImportaçõesResearch Assessment Exercise (Reino Unido)Rutherford Appleton LaboratoryRe<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Metrologia Legal e Qualida<strong>de</strong>Research Councils (Reino Unido)Research Councils United KingdomRegional Development Agency (Reino Unido)Reunião Especializada <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia doMercosulREDESIST/UFRJ Re<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pesquisas em Sistemas Produtivos eInovativos Locais / Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio<strong>de</strong> Janeiro UFRJRMBRNPSANSASBISBIRSBRISCTIESECEXSECOMSECTECSERESGISISIBRATECRenminbi (“Dinheiro do Povo”)Re<strong>de</strong> Nacional <strong>de</strong> PesquisaSouth African Network of Skills AbroadSistema britânico <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>Small Business Innovation Research (EUA)Small Business Research Initiative (Reino Unido)Secretaria <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia e InsumosEstratégicos do Ministério da Saú<strong>de</strong> (Brasil)Secretaria <strong>de</strong> Comércio Exterior do Ministério doDesenvovimento, Indústria e Comércio ExteriorSetores <strong>de</strong> promoção comercial dos postos noexteriorSetores <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia dos postos noexteriorSecretaria <strong>de</strong> Estado das Relações ExterioresScience and Innovation Group (FCO, Reino Unido)Substituição <strong>de</strong> importaçõesSistema Brasileiro <strong>de</strong> Tecnologia277<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 277 10/10/2011 14:15:53


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorSICTEX Sistema <strong>de</strong> informações em ciência e tecnologia noexteriorSIIF Science & Innovation Investment Framework 2004-2014 (Reino Unido)SINSIPRISNBSNISOESSTCSTCSTEMSTFCSTISTITIBTICTSBUEUFPEUFRGSUFRJUK-IPOUNASULUNCTADUNDPUNICAMPUSPZEEScience and Innovation Network (Reino Unido)Sistema <strong>de</strong> Promoção <strong>de</strong> Investimentos eTransferência <strong>de</strong> Tecnologia para Empresas (DPR/MRE)Sistema brasileiro <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>Sistema <strong>nacional</strong> <strong>de</strong> <strong>inovação</strong>State-owned enterprisesState Science and Technology Commission of ChinaHouse of Commons Science and Technology SelectCommitteeScience Technology, Engineering and MathematicsScience and Technology Facilities CouncilScience, technology, innovationSecretaria <strong>de</strong> Tecnologia Industrial do Ministériodo Desenvovimento, Indústria e Comércio ExteriorTecnologia Industrial BásicaTecnologias da Informação e da ComunicaçãoTechnology Strategy BoardUnião EuropeiaUniversida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> PernambucoUniversida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do SulUniversida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong> JaneiroUK Intellectual Property OfficeUnião Sul-americanaUnited Nations Conference on Tra<strong>de</strong> andDevelopmentUnited Nations Development ProgramUniversida<strong>de</strong> Estadual <strong>de</strong> CampinasUniversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São PauloZonas Econômicas Exclusivas278<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 278 10/10/2011 14:15:53


anexos3.1 – Relação e caracterização dos fundos setoriais no Brasil(Pereira, pp. 10-11, 2005)Definições:CTAero Programa <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia para o SetorAeronáuticoCTAgro Programa <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia para o AgronegócioCTBiotec (Bio) Fundo Setorial <strong>de</strong> BiotecnologiaCTEnerg Fundo Setorial <strong>de</strong> EnergiaCTEspacial Programa <strong>de</strong> Desenvolvimento Científico e Tecnológicodo Setor Espacial279<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 279 10/10/2011 14:15:53


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz juniorCTHidroCTInfoCTInfraCTMineralCTPetroCTSaú<strong>de</strong>CTTranspoFundo Setorial <strong>de</strong> Recursos HídricosFundo Setorial <strong>de</strong> Tecnologia da InformaçãoFundo <strong>de</strong> InfraestruturaFundo Setorial MineralPlano Nacional <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia do SetorPetróleo e Gás NaturalFundo Setorial <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>Fundo <strong>de</strong> Programas e Projetos <strong>de</strong> Pesquisa Científica eDesenvolvimento Tecnológico do Setor <strong>de</strong> TransportesTerrestres e Hidroviários280<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 280 10/10/2011 14:15:53


anexos5.1 – Organograma do SBI do governo trabalhista britânico, atéjunho <strong>de</strong> 2007 (vertente governamental)281<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 281 10/10/2011 14:15:54


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior282<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 282 10/10/2011 14:15:54


anexos5.2 – Orçamento do governo britânico para 2006/2007 – gráficocomparativo(DIUS, pp. 54-55, 2008b)283<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 283 10/10/2011 14:15:55


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior5.3 – Diagramas do DIUS, Go-Science e Science InnovationGroup (SIG/FCO)Department for Innovation, Universities and Skills (DIUS)Government Office for Science & Science Innovation Group(British Council, pp. 1-3, 2008)284<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 284 10/10/2011 14:15:56


anexos5.4 – Orçamento do BIS para o biênio 2011-2012: programas eagências(Gui<strong>de</strong> to BIS – 2011-2012, p. 7)285<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 285 10/10/2011 14:15:56


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior5.5 – Quadro do financiamento público à ciência e à pesquisano Reino Unido (Orçamento executado [Comprehensive SpendingReview – CSR] e projetado, 2007-2011, em milhares <strong>de</strong> libras)** Não inclui financiamento direto às universida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> competência dos HEFC (DIUS,p. 29, 2007b)(British Council, p. 1-A, 2008)286<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 286 10/10/2011 14:15:57


anexos5.6 – Mapa das instalações do complexo <strong>de</strong> <strong>inovação</strong> do setor <strong>de</strong>biotecnologia no Reino Unido(New Scientist, nº 2576, edição <strong>de</strong> 04/11/2006)287<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 287 10/10/2011 14:15:57


a<strong>de</strong>mar seabra da cruz junior5.7 – Quadro das exportações britânicas em 2007Fonte: Platypus Innovation, www.platypusinnovation.com/view?textId=2060288<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 288 10/10/2011 14:15:58


<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 289 10/10/2011 14:15:58


<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 290 10/10/2011 14:15:58


<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 291 10/10/2011 14:15:58


FormatoMancha gráficaPapelFontes15,5 x 22,5 cm12 x 18,3cmpólen soft 80g (miolo), cartão supremo 250g (capa)Times New Roman 17/20,4 (títulos),12/14 (textos)<strong>Diplomacia</strong> e <strong><strong>de</strong>senvolvimento</strong>.indd 292 10/10/2011 14:15:58

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