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ELOQÜÊNCIA,SIGNIFICADO LEXICAL E ... - Celsul.org.br

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Anais do 5º Encontro do <strong>Celsul</strong>, Curitiba-PR, 2003 (913-918)ELOQÜÊNCIA,<strong>SIGNIFICADO</strong> <strong>LEXICAL</strong> E <strong>SIGNIFICADO</strong> TEXTUALMárcia Sipavicius SEIDE (UNIOESTE / PG-USP)ABSTRACT: This article presents a semic analysis of a persuasive journalistic text showing theconstant presence of semic repetition leads the reader to infer the meaning of it’s most importantwords. This result suggests that dictionary using seems not to be necessary to correctly interpreteloquents texts.KEYWORDS: lexicology; semantics; semic analysis; vocabulary.0-IntroduçãoAs últimas décadas do século XX foram marcadas pela proliferação de estudos voltados ao níveltextual ou discursivo de análise. A ascensão das pesquisas em Lingüística Textual, particularmente as quese referem à coerência e à coesão, tem transformado o ensino de Língua Portuguesa no Brasil: na décadade 50 o texto era visto como um produto a ser analisado, contemplado e imitado por ser exemplo de bomuso do idioma; no final da década de 90, nos Novos Parâmetros Curriculares para a Língua Portuguesa, otexto é considerado objeto de ensino primordial: tópicos de sintaxe, de morfologia e de lexicologia devemser ensinados a partir dos textos.No tocante ao trabalho com o léxico, tema do projeto “Para um enfoque textual de estudo e ensinodo vocabulário”, coordenado pela autora e apoiado pela Unioeste de Marechal Cândido Rondon, osPCN’s aconselham a inclusão da consulta instrumental ao dicionário e a consideração do uso que oeducando faz do idioma como índice de seu conhecimento lingüístico interiorizado. Para concretizar asugestão apresentada pelo Ministério da Educação, é necessário, antes de mais nada, esclarecer como equando o significado lexicográfico é necessário para a interpretação dos textos.O estudo exposto neste artigo propõe um critério lexicológico segundo o qual é possível saber,considerando-se alunos dos últimos ciclos do ensino fundamental, para que tipo de texto a consulta aodicionário é aconselhável e para que tipo de texto tal consulta não é necessária.1-Perspectiva teórica e metodológicaA análise apresentada a seguir enquadra-se na Lexicologia pois presta-se a estudar o conteúdo deum conjunto determinado de unidades léxicas do idioma – o vocabulário presente num texto jornalístico -, estudo que tem por fundamento a análise sêmica.A análise sêmica é um método baseado na noção saussureana de valor do signo, que decorre doprincípio de que na língua não há senão diferenças e no conceito de traço distintivo postulado porTrubetzkoy com vistas à análise das palavras em fonemas. A análise de uma palavra em semas nada maisé que a aplicação do método criado para a Fonética ao estudo do Léxico. Do ponto de vista fonético, oque distingue “pato” de “bato” é o fato de o fonema inicial da primeira palavra ser surdo e o fonemainicial da segunda palavra ser sonoro. De modo análogo, o que distingue os verbos “falar” e “latir” é osema +humano para o primeiro e –humano para o segundo. Se a comparação fosse feita entre os verbos“ranger” e “gemer” o sema – animado, para o primeiro, e + animado ,para o segundo, surgiriam comotraços distintivos.Quando a análise sêmica é aplicada à palavras de um texto, três tipos de fenômeno podem serdetectados : a progressão sêmica, que ocorre toda vez que, de um parágrafo para o seguinte, há introduçãode novos semas; a retomada sêmica, que é observada em trechos conclusivos e consiste na sintetizaçãodos semas utilizados ao longo do texto, e a repetição sêmica, processo resultante da projeção do semas deuma palavra em outra e que, com freqüência, é responsável pela criação da sinonímia textualcaracterizada por ser uma relação de equivalência entre palavras e/ou expressões válida apenas num textoe portanto, efêmera e relacionada ao nível da fala.Outra noção utilizada é a de campo lexical, assim definido por Vilela (1994: 33) :“O campo lexical é o paradigma constituído pela repartição de um contínuo de conteúdo (lexical)por diferentes unidades da língua – os lexemas- unidades que se opõem entre si por traçosmínimos de conteúdos – os semas(...).”


914 ELOQÜÊNCIA,<strong>SIGNIFICADO</strong> <strong>LEXICAL</strong> E <strong>SIGNIFICADO</strong> TEXTUALTanto a aplicação da análise sêmica para o estudo de um conjunto vocabular, quanto a daexistência de uma sinonímia textual distinta da sinonímia lexical partem da premissa de que há dois tiposdistintos de significado: o lexical e o textual. Segundo Bello (1991), o primeiro é essencial e o segundo éconcreto. A análise em nível lexical refere-se ao valor da palavra isolada, ao seu significado essencial, já,no nível textual, considera-se o significado concreto da palavra no interior de um texto. O estudo dosignificado essencial da palavra é feito no nível da língua enquanto o do significado concreto realiza-seno nível da fala.Qualquer falante nativo de Língua Portuguesa tem, a seu dispor, um inventário de palavras esignificados atribuídos a cada uma das palavras desse inventário. A este conjunto de informaçõeslexicológicas, dá-se o nome de Memória Lexical . Enquanto o significado que é associado a uma palavra,pelo falante-ouvinte, de acordo com sua Memória Lexical, constitui o significado lexical dessa palavra, osignificado que uma palavra apresenta num texto constitui o seu significado textual.A leitura de um texto ativa a Memória Lexical do leitor. Se um vocábulo do texto também fazparte do repertório lexical do leitor, há um ajuste entre o significado lexical e o significado textual quepromove a interpretação textual. Caso trate-se de uma palavra desconhecida, o leitor pode inferi-la atravésdo contexto, ou, se o contexto não é suficiente para que se descu<strong>br</strong>a o significado do vocábulo, resta-lhe apossibilidade de consultar um dicionário. Muitas vezes, não é preciso conhecer todos os vocábulos dotexto para entendê-lo, freqüentemente, a correta interpretação dos vocábulos mais importantes ésuficiente.A propósito, quando se trata do ensino do vocabulário através de textos, usar ou não o dicionárionão deveria ser uma questão de preferência metodológica, mas sim uma decisão tomada de acordo com ascaracterísticas do texto a ser trabalhado em sala de aula. De fato, é possível distinguir dos tipos de texto:aquele que fornece informações suficientes acerca de seus vocábulos mais importantes e aquele cujoentendimento pressupõe o conhecimento prévio de algumas palavras. As frases abaixo são exemplos deum e outro tipo de texto :a) O menino bebe aquaquivil.b) Agora a viúva nada em dinheiro.Se o significado de beber é conhecido, a frase “a” é totalmente interpretável, pois não énecessário saber o que é “aquaquivil” para entendê-la. Isto ocorre em decorrência do fenômenoconhecido por projeção sêmica: os semas presentes em “beber” projetam-se na palavra “aquaquivil”, essaprojeção preenche a palavra desconhecida por semas, o que permite que o leitor “adivinhe” o significadodo vocábulo.Faz parte do significado do verbo “beber” exigir, como complemento, algo líquido que possa serbebido, isto mostra que os o verbo apresenta os semas + líquido e +potável. Esses semas projetam-se em“aquaquivil” , vocábulo que passa a ser interpretado como sendo, provavelmente, uma bebida:O menino bebe aquaquivil = algo + líquido e +potável uma bebida+ líquido+ potável Projeção sêmicaSe o item lexical fosse conhecido, haveria uma duplicação sêmica , o que ocorreria, por exemplo,se a frase fosse “O menino bebe suco” :O menino bebe suco = + liqu., +liqu. , +pot., + pot, + feito de fruta+ líqu. + líqu.+ pot. + pot. Repetição sêmica+ feito de frutaEnquanto na frase “a”, a palavra desconhecida pode ser inferida pelo contexto, em virtude daprojeção sêmica; na frase “b”, a projeção sêmica não é suficiente para fazer com que o significado dapalavra “dinheiro” seja previsível. O verbo “nadar” apresenta os semas + locomoção e +em meio líquido.Sua projeção em “dinheiro” leva a crer que este vocábulo é um meio líquido no qual alguém pode selocomover como é o caso do mar ou de um rio, interpretação que não condiz com o significado da frase:Agora a viúva nada em dinheiro = meio líquido onde é possível a locomoção+meio líquido+ locomoção


Márcia Sipavicius SEIDE 915Para entender o que a frase significa, é necessário conhecer o significado de “dinheiro”, perceber aincompatibilidade sêmica presente na frase para, então, interpretá-la metaforicamente, isto é ,neutralizando a incompatibilidade: para nadar é preciso estar no meio de muita água, se a viúva nada emdinheiro, é porque ela tem tanto dinheiro como há água à disposição de quem nada:Agora a viúva nada em dinheiro : - sólido, + sólido, (...)+meio líquido + sólido- meio sólido Incompatibilidade sêmicaA análise apresentada a seguir tem por base a projeção sêmica ora exemplificada. Antes de darinício à análise, porém, cabe esclarecer que, em todos os textos maiores que uma frase, a projeção sêmicatambém ocorre entre parágrafos, o que permite que os semas introduzidos num parágrafo possam serretomados, sintetizados ou desenvolvidos em outros não necessariamente contíguos àquele.É necessário explicitar, também, que a análise sêmica do texto baseou-se nas informaçõeslexicográficas do Novo Dicionário da Língua Portuguesa (FERREIRA ,1986). O uso do dicionário, comofonte de informação lexicológica, teve por propósito diminuir o subjetivismo – que se tornaria excessivocaso a análise se baseasse meramente na Memória Lexical do sujeito da pesquisa -, aumentando, assim,objetividade da análise.2- Análise sêmica do artigo No reino das semelhanças.O texto do jornalista de O Estado de São Paulo tem por objetivo mostrar ao leitor argumentossuficientes para que se conclua haver identidade política, ideológica e de personalidade entre Ciro Gomes,candidato à presidência em 2002 e Fernando Collor de Melo, candidato à governador de Alagoas nomesmo pleito, e ex-presidente cujo mandato foi caçado em decorrência do processo de impeachment.No primeiro parágrafo, há uma descrição física e psicológica dos candidatos, a quem se fazreferência, de maneira vaga, pelo pronome pessoal “eles”. Os semas descritivos, presentes nos adjetivosusados no começo desse parágrafo - +juventude, + provenientes do nordeste, + altura -, são pistas arespeito de quem são as pessoas a quem o pronome se refere pois restringem a extensão do significado dopronome. A seguir, são utilizados adjetivos e expressões com função adjetiva que são formadores deséries vocabulares que se entrelaçam.A primeira série é constituída por adjetivos que se incluem num campo lexical no qualcaracterísticas físicas mesclam-se a características psicológicas :“bem apessoados – ou estampados – eretos, empertigados” ( Pp. 1 Li.2).O primeiro e o segundo adjetivos contém os semas +aparência, + físico e +bom; o segundotermo, entretanto, apresenta um sema adicional : +que se mostra. Percebe-se que, nesta enumeração deadjetivos, há uma repetição que enfatiza os semas +bom e +aparente. O uso da conjunção alternativa entreeles, aliás, aponta a existência de uma sinonímia textual, o que reforça ainda mais os semas apontados.Linhas adiante, os semas são sintetizados por uma expressão, a seguir esses semas são desenvolvidos noperíodo que encerra o parágrafo:“ aparente precisão” (Pp.1 Li.4)“Quem não se dispuser a checar seus discursos com os dados da realidade ficará, realmente,impressionado” (Pp.1 Li.5)O terceiro adjetivo utilizado, “eretos”, apresenta um sema de descrição física, +em linha reta, quetambém está presente no adjetivo que lhe segue: “empertigados”. Nesse último adjetivo, estão im<strong>br</strong>icadossemas de descrição psicológica: +no<strong>br</strong>eza, +arrogância, + <strong>org</strong>ulho. O sema +arrogância é retomado, maisadiante, pela oração“ demonstram boa cultura geral – embora a superestimem” (Pp.1Li.3)A segunda série é constituída pelas seguintes expressões :“bem articulados”, “falam português correto”, “tem raciocínio rápido”, “se dispõem a discorrer,fluentemente, so<strong>br</strong>e qualquer assunto”, “falam economês sem ser economista” (Pp.1 Li. 2 e 3)


916 ELOQÜÊNCIA,<strong>SIGNIFICADO</strong> <strong>LEXICAL</strong> E <strong>SIGNIFICADO</strong> TEXTUALNa primeira expressão, está subentendido o termo raciocínio: ser articulado é ter um raciocínioarticulado. De uma expressão a outra, os semas são explicitados e enfatizados por sinonímias textuais: serarticulado é ter um raciocínio rápido, fluente e aplicável a vários assuntos.O segundo parágrafo aponta que ambos os políticos provém de uma mesma “classe política” eapresenta comportamento idêntico no que se refere ao tratamento dado às mulheres:“Eles tem indiscutível sucesso com as mulheres ...vêm de famílias que há muito estão napolítica”(Pp.2 Li. 1 e 2) .Há, aí, uma progressão sêmica: a ambos são atribuídos os semas +origem política e +agradam aosexo feminino. A sinonímia textual também se faz presente por meio da enumeração :“Seus pais e avós exerceram cargos públicos de maior ou menor importância, regional oufederal” (Pp.2 Li. 3 e 4)No fim do parágrafo, há a inserção de mais uma informação que retoma o sema +origem políticadesenvolvendo-o: a carreira política de ambos deve por base as conquistas políticas de antepassados.Há, ainda, nesse segundo parágrafo, outro tipo de repetição sêmica: aquele que ocorre entreparágrafos: a oração transcrita a seguir, por fazer referência ao que é artificial, recupera a contraposiçãosêmica +aparente, - real que finalizara o primeiro parágrafo:“ exibem porte e jeito de manequim”. (Pp.2 Li.2)A repetição e a progressão sêmica observadas são fenômenos que se repetem do primeiro aodécimo parágrafo do texto. No parágrafo décimo, os semas do primeiro e do oitavo parágrafos sãoexplicitamente retomados, encaminhando o texto para a conclusão.No parágrafo seguinte, o décimo segundo, há retomada de todos os semas desenvolvidos ao longodo texto, com ênfase nos semas presentes no segundo parágrafo. Ainda so<strong>br</strong>e o penúltimo parágrafo,cumpre notar que ele é finalizado por perguntas retóricas, isto é, perguntas que se distinguem deperguntas autênticas pelo fato de quem a formula saber, de antemão, a resposta para seu questionamento.Este tipo de pergunta, aliás, forja uma relação de cumplicidade com o leitor pois a ausência das respostaspressupõe que há, entre autor e leitor, um conhecimento partilhado que justamente por ser comum aambos não precisa ser explicitado. É exatamente esta a função do parágrafo seguinte, o último do texto,no qual as perguntas retóricas encaminham o leitor à conclusão do texto.De fato, em cada um dos treze parágrafos da coluna de Mauro Chaves, percebeu-se que osvocábulos do texto formam séries vocabulares caracterizadas pela sinonímia textual. Constatou-se,também, que os termos de cada série vocabular se definem mutuamente e que pelo menos um sema deuma série vocabular é repetido na série seguinte. A progressão sêmica também foi verificada. Outrofenômeno observado foi a retomada sêmica que indica que o texto está prestes a ser concluído.A natureza definitória que o texto adquire e a forte coesão interna produzida pela escolha precisados vocábulos o caracteriza como um texto eloqüente. Assim como em outros textos caracterizados pelaeloqüência, salta aos olhos um recurso que os retóricos clássicos chamavam de multiplicatio e que, doponto de vista lexicológico e semântico, nada mais é do que a repetição sêmica.Dentre os fenômenos sêmicos observados, o mais importante, para a caracterização do texto, foijustamente o da repetição sêmica. A presença marcante desse fenômeno indica que o texto, como umtodo, apresenta as características da frase “Ele bebeu aquaquivil” na qual a projeção sêmica preenche ovocábulo desconhecido de significado tornando desnecessária a consulta ao dicionário.Apresenta-se a seguir, para evidenciar como o fenômeno ocorre no texto, uma aplicação daprojeção sêmica a alguns vocábulos hipoteticamente desconhecidos por um leitor – aprendiz dos últimosciclos do ensino fundamental.Supondo-se que, no primeiro parágrafo, a expressão “ser bem apessoado” é conhecida, mas não aexpressão “ser bem estampado” a leitura do texto é processada por uma projeção sêmica da expressãoconhecida para a desconhecida. Como esta projeção ocorre de maneira automatizada, o leitor-aprendizentenderá a frase quase automaticamente e sequer perceberá que o vocábulo não lhe era conhecido.Na hipótese de, nesse mesmo parágrafo, ambas as expressões serem desconhecidas, as expressõesque estão em relação de sinonímia textual com elas, em parágrafos posteriores (Pp2,Li2; Pp6, Li 1 a Li 4), podem esclarecer qual o significado de “bem apessoado” e “bem estampado”; neste caso, trata-se deuma projeção sêmica de efeito retardado :Bem apessoado= bem estampado : exibem porte e jeito de manequim


Márcia Sipavicius SEIDE 917são fotogênicosnão costumam olhar nos olhos de seu interlocutorfalam num tête-à-tête, como se estivessem pregand para uma multidão.sabem tirar .partido.de sua imagem na televisãoproduzir.efeitos.desenhados por seus marketeiros ou suas intuiçõesNo quinto parágrafo, só para citar mais um exemplo de projeção sêmica retardada, há o uso dovocábulo “impropérios” muito possivelmente desconhecido por um aluno de 6 ª ou 7 ª série: a oraçãoprocedida pela conjunção “como” explicita o sentido do vocábulo em questão:“Quando criticados eles.. têm respondido com impropérios, como se sentissem um estranhoprazer na ofensa” (Pp.5 Li 1 e 2 )Quem lê o texto atentamente, com olhos voltados à projeção sêmica, detecta muitos outrosexemplos como os apontados acima. De fato, pode-se dizer que quase todos os vocábulos utilizadospodem ser deduzidos do contexto, as únicas exceções são os seguintes vocábulos e expressões, osprimeiros fazem parte do campo lexical da política e o último, do campo lexical da economia,respectivamente :“oligárquias” (Pp3, Li3) ; “coligação” (Pp.12 Li5); “aliança eleitoral” (Pp.12 Li6); “confisco”(Pp.11 Li 6)3- ConclusãoO predomínio de vocábulos cujo significado pode ser resconstituído pelo próprio contexto mostraque o artigo No reino das semelhanças, de Mauro Chaves apresenta realmente as mesmas característicassêmicas da frase “a” pois há, neste texto jornalístico, a repetição sêmica que resulta numa interpretaçãocompatível mesmo por parte de um leitor que desconheça alguns de seus vocábulos constitutivos. Estacaracterística do texto sugere que, do ponto de vista didático, textos como o aqui analisado sãoespecialmente adequados para motivar o aluno a inferir significado do contexto.RESUMO: Neste artigo, apresenta-se uma análise sêmica de um texto jornalístico para evidenciar que apresença constante de repetição sêmica, em textos eloqüentes, possibilita que o significado dosvocábulos mais importantes sejam inferidos pelo leitor sem que haja necessidade de se consultar odicionário para o texto ser corretamente interpretado.PALAVRAS-CHAVES: lexicologia; semântica; análise sêmica; vocabulário.ANEXONo reino das semelhançasEles não são apenas jovens e nordestinos. Eles são jovens, nordestinos, altos, bem apessoados – ouestampados – eretos, empertigados, bem articulados, falam português correto, praticam o economês semser economistas, têm raciocínio rápido, demonstram boa cultura geral – embora a superestimem- e sedispõem a discorrer, fluentemente, so<strong>br</strong>e qualquer assunto, com aparente precisão. Quem não se dispusera checar seus discursos com os dados da realidade ficará, realmente, impressionado.Eles têm indiscutível sucesso com as mulheres – e sabem utilizá-las politicamente -, exibem portee jeito de manequins, vêm de famílias que há muito tempo estão na política, com poder de influênciaso<strong>br</strong>e regiões po<strong>br</strong>es e atrasadas. Seus pais e avós exerceram cargos públicos – de maior ou menorimportância, regional ou federal – de onde obtiveram as primeiras bases eleitorais para o início de suascarreiras políticas.Por terem nascido e iniciado suas carreiras políticas inseridos em suas oligarquias regionais – demaior ou menor tamanho -, ambos sempre souberam obter apoio das estruturas oligárquicas e manipular,com destreza, todos os seus códigos, na busca do poder.Ambos já foram parlamentares, prefeitos e os governadores mais jovens de seus Estados e do País.Ambos souberam exercer sua autoridade quando governaram. Mas ambos já demonstraram sertemperamentais, impulsivos, com baixo nível de tolerância a críticas e contrariedades. Os dois parecemsentir-se como se donos – ou posseiros – fossem da verdade, pelo que sempre transmitiram um ar dearrogância natural.


918 ELOQÜÊNCIA,<strong>SIGNIFICADO</strong> <strong>LEXICAL</strong> E <strong>SIGNIFICADO</strong> TEXTUALQuando criticados, eles quase sempre têm respondido com insultos, às vezes não medindo bem aextensão e o grau dos impropérios, como se sentissem um estranho prazer na própria ofensa. Porcoincidência, ambos parecem ter um gosto todo especial em dar uma conotação muito agressiva aochamar alguém, com mais idade do que eles, de “idoso” ou “velho” – como um fez com um jornalista eoutro com um adversário político -, o que revela um esquisito e extemporâneo “preconceito etário”, arefletir desprezo pela experiência dos mais velhos, independentemente do valor que possam ter, assimcomo valorização incondicional dos mais moços, independentemente das qualidades que deixem de ter.Eles não costumam olhar nos olhos do interlocutor e falam, mesmo num tête-à-tête, como seestivessem pregando para uma multidão. Eles são fotogênicos e sabem tirar o melhor partidomercadológico de sua imagem na televisão, usando a fluência verbal para produzir determinados efeitos etrucagens, previamente desenhados por seus marqueteiros ou, simplesmente, emanados de suassuperauto-avaliadas intuições.Apesar de terem passado por partidos grandes, ambos preferiram, para dar seguimento a seusprojetos eleitorais, partidos pequenos, nos quais não tivessem de disputar legenda – para os postos maiselevados que ambicionavam – com outras mais antigas ou fortes lideranças.Ambos se têm julgado detentores de uma portentosa capacidade de mobilização popular, apta asubstituir – pela pressão direta nas ruas, so<strong>br</strong>e o Congresso Nacional – quaisquer bases de apoio ousistemas partidários de sustentação governamental.Acreditando nos poderes ilimitados do próprio carisma, ambos jamais deram muita importância aoexercício árduo, exaustivo e penoso da negociação, que é uma das marcas mais características de umaautêntica democracia, substituindo tal prática pela tentativa de imposição do voluntarismo messiânico ,próprio dos autonomeados salvadores da Pátria. Só que, no Brasil, essa substituição nunca deu certo enunca conduziu a bom porto os governantes que a praticaram. Quando não geraram crises políticasagudas, fatais para mandatos de governo, ocasionaram paralisias político - administrativas que facilmentese transformaram em crises crônicas de governabilidade.Eles têm em comum personalidades agressivas, emocionalmente pouco equili<strong>br</strong>adas, que sãodisfarçadas – com certeza, graças a rígidos controles de berço - , mas que de repente, sem aviso, podemeclodir como um vulcão, ao mais simples dos pretextos. Eles têm em comum – como revelam suasreações intempestivas e desproporcionais à contrariedade sofrida – alguns mecanismos psicológicos malresolvidos, que sempre escapam pela válvula da afronta.Talvez por não terem tido a oportunidade de alicerçar sua formação educacional, intelectual eprofissional em padrões acadêmicos de alta qualidade, ambos têm em comum uma certa vulnerabilidadecognitiva, que os torna facilmente receptivos a idéias aparentemente originais, de exóticos mentores ougurus. Dessa forma, sem respaldo teórico, crítico ou doutrinário que lhes forneça melhores condiçõesintelectuais de resistir a propostas experimentalistas violadoras de direitos – como são, no campoeconômico, as idéias de “alongamento da dívida pública”, o asset-liability management ou o confisco dapoupança dos cidadãos (que, no fundo, dão no mesmo) - , ambos sucumbem facilmente à tentação dassoluções tão milagrosas quanto arbitrárias, e, às vezes, retiradas do fundo de obsoletas cartolas.Agora, convenhamos: com tantas semelhanças, afinidades, simetrias de comportamento,identidades de visão de mundo, similitudes na maneira de fazer política, proximidades de característicasentre companheiros – os que integravam a “ tropa de choque” de um já estão com o outro, as oligarquiasque apoiavam um apoiam o outro - , por que agora tanta timidez, tanta hesitação, tanto recuo naaproximação eleitoral? O que levou a sacramentar-se uma coligação natural de perfis para, depois, tentaranular, confusamente, uma legítima aliança eleitoral, com antipáticas “intervenções <strong>br</strong>ancas” ou que outronome tenha a exibição desse doce constrangimento?Enfim, com tantas notórias semelhanças e afinidades, por que cargas d’água um deles tem tantavergonha de aparecer junto com o outro no palanque?CHAVES, Mauro. O Estado de São Paulo, 20 de julho de 2002.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASBELLO, Fernando. Epistemologia do sentido. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1991.CHAVES, Mauro. No Reino das Semelhanças. O Estado de São Paulo, São Paulo, 20 de jul.2002.FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.[Ed.] Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:Nova Fronteira, 1986.LEECH, Geofrey. Semantics (The study of meaning).[ S.l.] : Penguin, 1981.VILELA, Mário. Estudos de Lexicologia do Português. Coim<strong>br</strong>a: Almedina, 1994.

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