40 <strong>Jornal</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> 6 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2012EntrevistaRICARDO GRAÇARealizador <strong>de</strong> clips“Primeiro filmecustou-me 80 euros”Nasceu na Marinha Gran<strong>de</strong> háquase 33 anos, e, ao longo dopercurso académico, mudou <strong>de</strong>orientação várias vezes até<strong>de</strong>scobrir o que pretendia fazer.Cursou Ciências da Comunicação,com o objectivo <strong>de</strong>, mais tar<strong>de</strong>,seguir uma vertente <strong>de</strong> cinema etelevisão. Contudo, o tipo <strong>de</strong>ensinamentos que tirou <strong>de</strong>ssapassagem pelo ensino superior eramuito “logístico” e pouco criativo.“Parei o curso um ano e fui estudarProdução. Naquele tempo ouviamuito uma banda da MarinhaGran<strong>de</strong> chamada Umpletrue esempre tive o sonho <strong>de</strong> fazer umvi<strong>de</strong>oclip com eles... até que mesurgiu uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fazer uma curtametragem, usando a sua música. Fiza curta e acabou por serseleccionada para um festival emNova Iorque. Custou-me 80 euros.Foi o dinheiro para fechar uma ruaperto do Campo Pequeno”, recorda.Depois, realizou vi<strong>de</strong>oclips para abanda A Caruma, Dapunksportif,Born a Lion e Slimmy, e há um anoestreou a longa metragem Até on<strong>de</strong>?Actualmente, à frente da produtoraLua Filmes, realiza ví<strong>de</strong>oscorporativos “fora da caixa”, muitomarcados pela originalida<strong>de</strong> e,muitas vezes, com música <strong>de</strong>bandas da Marinha Gran<strong>de</strong>.Carlos M. Barros cineasta“Não é novida<strong>de</strong> nenhuma termosfilmes que ganham festivais”Jacinto Silva durojacinto.duro@jornal<strong>de</strong>leiria.pt❚ Há um mês, as re<strong>de</strong>s sociais foram inundadas comreferências a uma série chamada The Guy Who WantsTo Be American (TGWWTBA). É um projecto com ocarimbo da sua Lua Filmes.É uma i<strong>de</strong>ia que nasceu no Verão passado e foi pensadopara entrar no mercado das séries na internet. Penso queeste será o futuro para as produtoras. Há uns anos, quandose tinha <strong>de</strong> promover uma série, apenas se po<strong>de</strong>ria fazê--lo na televisão, mas esse canal tem um uma grelha limitadaque já está ocupada por outras produtoras que estãohá muito no mercado. Com a opção online, é possível fazerum projecto com toda a criativida<strong>de</strong>, sem limitaçõese há vários canais, como o Youtube, que permitem quetodo o Mundo possa ver o trabalho. Não há melhor que istopara quem quer ter espectadores, com baixo custo. Filmámosa promo há um ano, mas <strong>de</strong>pois, <strong>de</strong>vido à quantida<strong>de</strong><strong>de</strong> trabalho que tivemos <strong>de</strong> seguida só agora conseguimosvoltar a pegar no projecto. Mas falando do projecto,é a história <strong>de</strong> Pablo Sam, um espanhol que vive em<strong>Leiria</strong>, que quer ser americano e vive num mundo on<strong>de</strong>tudo o que é “americano” é perfeito. Para todo o lado, éseguido por um cameraman que também está contagiadopor aquele sonho americano. Teremos episódios principaisquinzenais e a cada duas semanas um especial, maiscurto. Nos principais, saberemos um pouco mais da his-tória <strong>de</strong> vida do Pablo e os outros são episódios <strong>de</strong> coisasque lhe vão acontecendo.O seu filme, Até on<strong>de</strong>? vai passar no Canal Brasil, representandoPortugal. Para o fazer, teve <strong>de</strong> bater à porta <strong>de</strong>mais <strong>de</strong> 100 empresas e apenas uma o patrocinou...O filme foi filmado há seis anos. Se o tivesse lançado nesseano, teria sido o mais jovem realizador a estrear uma longametragem em Portugal, com actores e uma equipa profissional.No elenco, tinha Núria Madruga, Silvia Rizzo, RicardoPereira, a Patrícia André e o Ramón Martinez... Sefosse agora, provavelmente, aquele apoio que tive do GrupoLena, não seria possível. Eram outros tempos. A estreiafoi no ano passado no Teatro José Lúcio da Silva, em <strong>Leiria</strong>.Agora, sinto-me mais confiante pois tenho outra estruturae conhecimentos, embora o panorama em termos<strong>de</strong> apoios seja muito pior. Mesmo um filme low budgetcomo o Até On<strong>de</strong>? fica caro. É preciso alimentar e arranjarlocal para dormir para uma equipa <strong>de</strong> 20 pessoas, semfalar em <strong>de</strong>slocações, material e nos cachets dos actores.Tem em mãos uma nova longa metragem intituladaP.I.D.E. Pequenos Inci<strong>de</strong>ntes Da Existência, como está esseprojecto?Está num intervalo. No último ano, fiz mais <strong>de</strong> 45 produções,muitas <strong>de</strong>las no estrangeiro. Apostei muito na áreados ví<strong>de</strong>os corporativos e promocionais... O projectoestá preparado para avançar, mas é preciso esperar pelomomento certo. Filmar uma longa é algo que <strong>de</strong>mora bastantetempo. No mínimo um mês, se toda a gente estiverNunca mepreocupei emestar agarradoa subsídios oua perceberque contactosposso ter paradivulgar osmeustrabalhos natelevisão.Nestemomento,acredito que ainternet é ocaminho dofuturo para adivulgação.Os meusprojectos nãoestãopensadospara seremlançados pelaRTP2 ou pelo“serviçopúblico”disponível. Depois mais dois meses para a edição... estamosa falar <strong>de</strong> perto <strong>de</strong> seis meses para executar a tarefa.Quem não pertence ao grupo <strong>de</strong> realizadores “consagrados”tem muita dificulda<strong>de</strong> em conseguir entrar nomundo da sétima arte...Até os consagrados estão com dificulda<strong>de</strong>s. Começam aperceber que, se não houver subsídios, eles não terão trabalho.Para o meu filme, bati à porta <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 100 empresas...não estou a ver os tais realizadores a ir bater a portas.A verda<strong>de</strong> é que é assim que funciona noutros países.Nos EUA, os produtores conseguem um bom projecto eum bom actor e <strong>de</strong>pois é preciso convencer os bancos ouinvestidores a darem dinheiro para a sua conclusão.Enquanto não houver um realizador português consagrado,como foram Almodóvar, Alejandro Amenábarou Guillermo <strong>de</strong>l Toro, o cinema português dificilmenteserá reconhecido no estrangeiro?Sim. Tal como aconteceu no Brasil, México ou Argentina.Com uma boa i<strong>de</strong>ia e bons técnicos já é possível avançarpara uma longa metragem, que po<strong>de</strong> vencer festivais noestrangeiro. Contudo, é muito importante que os projectossejam pensados para serem vendidos lá fora. Não precisam<strong>de</strong> ser em inglês, mas o marketing e a estrutura <strong>de</strong>vemser pensados. Não po<strong>de</strong> ser apenas para agradar aosrealizadores. Não é novida<strong>de</strong> nenhuma termos filmes queganham festivais, mas isso não chega. Precisam <strong>de</strong> ser interessantespara serem comprados e passados no circuitocomercial <strong>de</strong> cinema ou na televisão.
<strong>Jornal</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> 6 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2012 41OlharRICARDO GRAÇAUrbanida<strong>de</strong> Espaço público <strong>de</strong>ve se versátilAndar na ruaPedro Lemos Cor<strong>de</strong>iropedrolcor<strong>de</strong>iro@hotmail.com❚ Pensar o tema da cida<strong>de</strong> pressupõe um inevitável po<strong>de</strong>r<strong>de</strong> abstracção, pois à semelhança <strong>de</strong> qualquer organismovivo o seu conjunto parece ascen<strong>de</strong>r a umacerta autonomia ou até personalida<strong>de</strong>. Esta é uma condiçãoque não permite enten<strong>de</strong>r a cida<strong>de</strong> objectivamente,como por exemplo através da estatística, masque obriga a perspectivar uma estrutura que pelo seutodo consiga <strong>de</strong>linear um certo carácter <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>,complexo (como todas as cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>vem ser), com <strong>de</strong>feitose virtu<strong>de</strong>s (como todas sempre terão).O resultado, em modo <strong>de</strong> síntese, <strong>de</strong>verá ser consequentecom a experiência mais alargada do viajante,comparada q.b. para melhor se po<strong>de</strong>r situar e reconhecerperante as outras urbes e assim encontrar na sua naturezasocial, organizativa e material, vocações a<strong>de</strong>quadasàs legitimas projecções e <strong>de</strong>sejos.Visar a compreensão da urbanida<strong>de</strong> a uma escala maisalargada obriga inevitavelmente a i<strong>de</strong>ntificar os váriosanéis <strong>de</strong> influência entre a cida<strong>de</strong> e a sua envolvente territorial(trocas comerciais, tecido industrial, competênciashumanas, cientificas, tecnológicas, outras urbanida<strong>de</strong>sconcorrentes, infraestruturas, transportes,etc.), com vista a uma maior consciência dos seus valoresdiferenciadores e das oportunida<strong>de</strong>s imanentes.Irei no entanto continuar a fixar-me na dimensão centro-urbanada cida<strong>de</strong>, aplicada a <strong>Leiria</strong>, e em sugestões<strong>de</strong> menor escala orientadas para uma urbanida<strong>de</strong> maisviva e possível <strong>de</strong> accionar.<strong>Leiria</strong> tem um centro natural – todas as ruas vão darà praça Rodrigues Lobo – uma centralida<strong>de</strong> intuitiva dolazer, da estadia, da memória e enquadramento urbano(vistas para o castelo), da suave proporção geométrica(na relação entre a sua dimensão e as dos edifíciosque a configuram), pela tranquilida<strong>de</strong> pedonal, pelos cafése esplanadas, pela sol e pela sombra, por toda umacomplexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> valores que a tornam no ponto capitalda cida<strong>de</strong>.Encaremos então a praça com esse carácter centrifugadorda dinâmica urbana e facilmente enten<strong>de</strong>remosa relevância e oportunida<strong>de</strong> dos seus acessos (ruas)como espaços <strong>de</strong> prolongamento pedonal, comercial e<strong>de</strong> circunstância lúdica. Deste modo, imaginemos quea praça esten<strong>de</strong>ria os seus tentáculos <strong>de</strong> conforto afectando(privilegiando) a activida<strong>de</strong> comercial e <strong>de</strong>senhourbano com o intuito <strong>de</strong> fomentar o hábito <strong>de</strong> “andarna rua” e viver a cida<strong>de</strong>, com todas as vantagens sociais,económicas e culturais a que isso conduziria.Po<strong>de</strong>r-se-á reclamar esta mesma vonta<strong>de</strong>, no âmbitodo programa Polis <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong>, em intervenções do espaçopúblico envolvente à praça como são os exemplosda reestruturação do jardim Camões e prolongamentoao Largo da Republica 5 <strong>de</strong> Outubro ou na reestruturaçãoda fonte luminosa e articulação pedonal envolvente.No entanto, na minha opinião, estas são intervençõespenalizadas ou por um <strong>de</strong>senho formal pouco alinhadocom uma intenção clara da sua utilização, resultante<strong>de</strong> uma qualquer qualida<strong>de</strong> gráfica que não se traduzEncaremosentão a praçacom essecaráctercentrifugadorda dinâmicaurbana efacilmenteenten<strong>de</strong>remosa relevância eoportunida<strong>de</strong>dos seusacessos (ruas)como espaços<strong>de</strong>prolongamentopedonal,comercial e <strong>de</strong>circunstâncialúdicana experiência do espaço, ou por outro lado, na insipiência<strong>de</strong> um <strong>de</strong>senho que <strong>de</strong>ixa em aberto todo e qualqueracontecimento – o que po<strong>de</strong>ria ser positivo mas nãoo é pela sua susceptível materialida<strong>de</strong> entre outras ina<strong>de</strong>quadascaracterísticas.O que se preten<strong>de</strong> nesta abordagem, muito mais doque apontar falhas, é encontrar potencialida<strong>de</strong>s na estruturaurbana existente da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> e releválaspara pequenas intervenções que reforcem o potencialcarácter do local, tornando-o mais sugestivo parauso dos cidadãos e visitantes, por forma a construirmosuma cida<strong>de</strong> que nos faz “andar na rua”, experimentare participar conjuntamente na sua contínua construção.Neste sentido, pequenas propostas que possam <strong>de</strong>finirnovos lugares <strong>de</strong> estadia como sombreamentos, lugaressentados, mobiliário urbano (mais versátil e menosformal) <strong>de</strong>verão pressupor uma convergência <strong>de</strong>usos para a generalida<strong>de</strong> do contexto urbano Leiriense,por forma a que as experiências e activida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> jovense graúdos se possam aproximar, misturar.Essa urbanida<strong>de</strong>, sobretudo para uma cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pequenadimensão como <strong>Leiria</strong> on<strong>de</strong> as competências espaciaisnão necessitam <strong>de</strong> se <strong>de</strong>sdobrar, exige uma gran<strong>de</strong>versatilida<strong>de</strong> nas propostas para o espaço público epor conseguinte uma consciência pragmática para reconhecerque um pavimento urbano polido serve a ca<strong>de</strong>ira<strong>de</strong> rodas como o Skate, e que um muro com 40 cm<strong>de</strong> altura serve o contorno do canteiro como vários lugaressentados ou ainda para plataforma <strong>de</strong> “avarias radicais”,entre outras normais activida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> rua…