36 <strong>Jornal</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> 6 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2012ViverTesourosescondidosà vista <strong>de</strong> todosPatrimónio Os castelos grandiosos <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong>,Porto <strong>de</strong> Mós, Ourém e Pombal, os mosteirosPatrimónio da Humanida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Alcobaça e daBatalha são monumentos conhecidos por todosos portugueses e pelos habitantes da região emparticular. Contudo, na área geográfica da AltaEstremadura, há mais património menosespectacular mas não menos importante e ricoem significado que, por estar escondido à vista<strong>de</strong> todos ou ofuscado pelos gran<strong>de</strong>smonumentos, não costuma chamar atençõesJacinto Silva Durojacinto.duro@jornal<strong>de</strong>leiria.ptIgreja da Colegiada <strong>de</strong> OurémPor terras fora do distritoNo concelho <strong>de</strong> Ourém, fora dodistrito, mas ainda bem <strong>de</strong>ntroda região, a antiga Igreja daColegiada é testemunha daimportância que a antiga cida<strong>de</strong><strong>de</strong> Ourém, no monte do castelo,gozou durante séculos e queteve no tempo <strong>de</strong> D. Afonso, 4.ºCon<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ourém um período <strong>de</strong>gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, até1841, quando a se<strong>de</strong> do concelhopassou da zona histórica docastelo para o vale e para a “vilanova”.Dentro das muralhas do Paço doCon<strong>de</strong>s, ergue-se então a igrejaque começou a ser construídaem 1453, no local on<strong>de</strong> antesestava a Igreja <strong>de</strong> Santa Maria <strong>de</strong>Ourém. Depois dos estragosextensos provocados peloterramoto <strong>de</strong> 1755, foireconstruida em estilo barroco,que até hoje ainda ostenta.DR❚ O JORNAL DE LEIRIA embarcou numa viagem <strong>de</strong> <strong>de</strong>scoberta<strong>de</strong>ste valioso património e faz aqui uma sugestão<strong>de</strong> visitas no distrito, ainda a tempo <strong>de</strong> ir para fora cá <strong>de</strong>ntroe aproveitar o Verão que, por estes dias, ainda se faz sentir,sem pagar um cêntimo <strong>de</strong> bilhete. Muito mais haveriapara referir, ou não houvesse no distrito um manancialincalculável à espera <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>scoberto.Começando a norte do território, toda a vila <strong>de</strong> PedrógãoGran<strong>de</strong> é uma jóia que <strong>de</strong>ve ser visitada. Ao lado domagnífico ver<strong>de</strong> turquesa das águas da albufeira do Cabril,a se<strong>de</strong> <strong>de</strong> concelho mostra-se bonita, <strong>de</strong> arquitecturavalorizada e cuidada, que tem sido alvo <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong>esforço <strong>de</strong> recuperação nos últimos anos. Vale a pena palmilharas ruas dominadas por casas com traços <strong>de</strong> solarsenhorial.Mas é a poucos passos das ruínas romanas, que aindase erguem no centro da vila, no Largo da Devesa, que seencontra uma das mais belas jóias arquitectónicas do nortedo distrito. A igreja matriz da vila é um templo <strong>de</strong> origemromânica reconstruido durante a Renascença, entre1517 e 1539. Possui um interior <strong>de</strong> três naves e a capelamortem uma abóbada ricamente trabalhada. O retábulodo altar-mor é em cantaria do “Renascimento coimbrão”,bem como peças <strong>de</strong> escultura <strong>de</strong> João <strong>de</strong> Ruão, datadasdo século XVI. No conjunto, <strong>de</strong>staca-se, no conjunto, a torresineira que compõe o corpo principal da fachada.Também à vista <strong>de</strong> todos, a pouco mais dois minutosdo centro da vila, vale a pena visitar a velha ponte filipinada estrada romana para Idanha-a-Velha, que liga PedrogãoGran<strong>de</strong> e Pedrógão Pequeno.A poucos quilómetros, no concelho mais a norte do distrito,os poços <strong>de</strong> neve, junto à capela <strong>de</strong> Santo Antóniodas Neves, são um dos ex-libris <strong>de</strong> Castanheira <strong>de</strong> Pera. Emplena Serra da Lousã, estas construções circulares e cobertaspor telhados <strong>de</strong> ardósia fazem lembrar aos mais <strong>de</strong>savisadosas casas da al<strong>de</strong>ia natal <strong>de</strong> Astérix e Obélix. Masapenas o aspecto é semelhante, já que o fim era muito diferente.Esquilos, veados e javalis vivem aqui, lado-a-lado,com uma das primeiras fábricas <strong>de</strong> gelo do País. Em temposidos, no Inverno, a neve da serra era recolhida e compactada<strong>de</strong>ntro das construções circulares, por entre camadas<strong>de</strong> palha seca, <strong>de</strong> modo a garantir que o gelo assimfabricado não <strong>de</strong>scongelasse.Mais tar<strong>de</strong>, os blocos <strong>de</strong> neve compactada <strong>de</strong>sciam atéao vizinho Zêzere e eram embarcados com <strong>de</strong>stino a Lisboae, eventualmente, à casa <strong>de</strong> ricos nobres e burgueses,e mesmo da Corte, on<strong>de</strong> eram usados na confecção <strong>de</strong> sorvetese outras iguarias.Malhoa passou por aqui“A igreja <strong>de</strong> São João Baptista, que congrega traços medievais,renascentistas, e barroca e conta ainda com compintura preciosa do mestre José Malhoa”, é a sugestão <strong>de</strong>visita <strong>de</strong> Saul António Gomes para Figueiró dos Vinhos.Além do conselho do historiador, docente da Faculda<strong>de</strong><strong>de</strong> Letras da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Coimbra, o JORNAL DE LEI-RIA sugere visitas à casa (casulo) on<strong>de</strong> Malhoa viveu os seusúltimos anos, e à antiga Torre da Ca<strong>de</strong>ia datada do séculoXVI e classificada como Imóvel <strong>de</strong> Interesse Público, aoconvento do Carmo, edificado no início do século XVII, <strong>de</strong>que apenas sobrevive a igreja, um pátio e parte do claustroseiscentista. Uma ida a Foz <strong>de</strong> Alge revela as ruínas romanasdas Reais Ferrarias, fundição <strong>de</strong> ferro na margemda Ribeira <strong>de</strong> Alge on<strong>de</strong> eram fabricadas balas e peças <strong>de</strong>artilharia nos séculos XVI e XVII, cuja exploração foi brevementereactivada no século XIX. Para terminar a rondapor este concelho é incontornável uma ida à requalificadae florida al<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> xisto <strong>de</strong> Casal <strong>de</strong> São Simão.Em direcção a Sul, a rota <strong>de</strong> visita ao património cruza--se com os Caminhos <strong>de</strong> Santiago, que rompem o territóriodo concelho <strong>de</strong> Alvaiázere e que, em Santiago da Guarda,já no município <strong>de</strong> Ansião, terá tido uma hospedaria oualbergue, no antigo castelo da localida<strong>de</strong>. As vieiras es-
<strong>Jornal</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> 6 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2012 37DRO retábulo doaltar-mor daigreja <strong>de</strong>PedrógãoGran<strong>de</strong> é emcantaria do“Renascimentocoimbrão”, oimóvel contacom peças <strong>de</strong>escultura <strong>de</strong>João <strong>de</strong> Ruão,datadas doséculo XVI.culpidas no calcário são um sinal <strong>de</strong>sta utilização da antigafortaleza que se encontra recuperada e que, nos ricamentetrabalhados mosaicos colocados a <strong>de</strong>scoberto por escavaçõesrecentes, revela a sua origem romana. Ali perto, noutralocalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste concelho, na igreja matriz <strong>de</strong> Chão <strong>de</strong>Couce, é possível admirar um retábulo <strong>de</strong> José Malhoa.“Não po<strong>de</strong>mos esquecer o interior gótico-renascentistada capela do Senhor dos Aflitos, da Golpilheira, na Batalha,ou a formosíssima igreja barroca do Mosteiro <strong>de</strong> Cós,em Alcobaça”, sublinha o historiador. E convém não falharuma vista à Sacristia Nova e à Capela Barroca dos Relicáriosdo Mosteiro <strong>de</strong> Alcobaça, separadas da visita normalao monumento por um bilhete extra, mas que valebem a pena.Juntamos à lista a rendilhada e curiosa ponte do Boutaca,ainda com as guaritas para pagamento da portagempara atravessar o rio, a apenas algumas centenas <strong>de</strong> metrosdo Mosteiro da Batalha, monumento que, pela sua imponênciaacaba por fazer sombra a esta construção e à igrejamatriz da vila.As primeiras teorias sobre a igreja <strong>de</strong> São Gião, na Nazaré,referem que teve as suas origens no século VII, no localantes ocupado por um templo romano <strong>de</strong>dicado a Neptuno.Contudo esta i<strong>de</strong>ia tem sido posta em causa após estudosrecentes e trabalhos <strong>de</strong> escavação. São Gião passoua ser consi<strong>de</strong>rada como um dos poucos exemplares <strong>de</strong> templosasturianos conhecidos no nosso País, o que a dataria<strong>de</strong> uma época posterior. Ainda assim, o templo que, em1702 era usado como curral <strong>de</strong> gado, está associado à sacralizaçãoda costa da Nazaré e terá sido mesmo a utilizaçãocomo apoio à agro-pecuária que o terá salvo da ruína total.Hoje, este monumento nacional <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1986, permanece“encaixotado” num abrigo <strong>de</strong> zinco, à espera <strong>de</strong> melhoresdias.Antes <strong>de</strong> sair do concelho é impossível não visitar o Santuárioda Virgem da Nazaré, no Sítio. No seu interior, guarda-seuma Virgem Negra, que representa a Senhora da Nazaré,esculpida em ma<strong>de</strong>ira, e que terá sido levada <strong>de</strong> Méridapara o Sítio, em 711, por frei Romano, monge do convento<strong>de</strong> Cauliniana, após a <strong>de</strong>rrota do exército cristão nabatalha <strong>de</strong> Guadalete contra as forças mouras invasoras.Sempre para sul, eis que nos <strong>de</strong>paramos com a igreja <strong>de</strong>Nossa Senhora do Pópulo, em Caldas da Rainha. A igrejamatriz da cida<strong>de</strong>, integra o conjunto do Hospital TermalRainha D. Leonor e é possível que seja um dos mais antigosedifícios <strong>de</strong> Caldas da Rainha, existindo ainda antesdo estabelecimento da povoação à volta da nascente termal.A torre sineira, construída em 1505, foi consi<strong>de</strong>radacomo uma das mais belas do País. Já junto à vila muralhada<strong>de</strong> Óbidos, Saul Gomes aponta o aqueduto da Rainha D.Catarina, consorte do rei D. João III. “Que ninguém ou quaseninguém valoriza”, lamenta.O ponto mais meridionalCom a viagem quase a chegar ao fim, há ainda tempo paravisitar aquela que é, na actualida<strong>de</strong>, uma das mais famosasestâncias <strong>de</strong> surf do Mundo. Em Peniche, além do tristementefamoso memorial à ignobilida<strong>de</strong> humana que éo seu forte, on<strong>de</strong> o Estado Novo pren<strong>de</strong>u e torturou quema ele se opunha, é incontornável uma visita aos antigos Paços<strong>de</strong> Atouguia da Baleia, antigo palácio régio on<strong>de</strong> viverampor exemplo os reis D. Fernando I, D. Afonso V, D.Pedro I e D. Inês.No extremo sul do distrito, entre vinhedos e paisagemsaloia ergue-se a vila do Bombarral e o Teatro Eduardo Brazão,restaurado em 2008. Foi construído no início do séculoXX e inaugurado em 1921, na presença do actor EduardoBrazão, que lhe <strong>de</strong>u o nome. Uma pérola da Art Nouveau.Este e outro património <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância, maspouco conhecido do gran<strong>de</strong> público, embora “escondido”<strong>de</strong>baixo dos olhares quotidianos, encontra-se <strong>de</strong>scrito naobra Inventário Artístico <strong>de</strong> Portugal. 5 - Distrito <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong>,Lisboa, da Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Belas Artes, publicada em 1955.Embora com quase 60 anos, este volume contém um registoimportante do imenso valor arquitectónico e artísticoque existe na região.DROs neveiros oupoços <strong>de</strong> neve<strong>de</strong> Castanheira<strong>de</strong> Pera são umponto <strong>de</strong> visitaobrigatório doconcelho,especialmenteno Outono eInverno.O Mosteiro daBatalha, apoucascentenas <strong>de</strong>metros daPonte doBoutaca,quase ofuscaa beleza dorendilhadocalcário daestruturaO bilheteextra paravisitar aSacristia Novae a CapelaRelicário doMosteiro <strong>de</strong>Alcobaça valecada cêntimoNa rota para o SulA mais antiga praça<strong>de</strong> touros, asClarissas e aspinturas góticasA seguir, a nossa viagem leva--nos ao território <strong>de</strong> Pombal e àSerra <strong>de</strong> Sicó on<strong>de</strong>, na vila <strong>de</strong>Abiul, se po<strong>de</strong> visitar a praça <strong>de</strong>touros local, referenciada comose não a mais antiga, uma dasmais antigas em territórionacional <strong>de</strong>dicada à artetaurina. Foi construída na eraseiscentista e substituída poroutra estrutura mais recente nofinal do século XIX. “Aindanesse concelho, há que visitar oConvento da vila do Louriçal.Magnífico”, consi<strong>de</strong>ra SaulAntónio Gomes.Habitado até hoje pelas IrmãsClarissas do Desagravo, foifundado em 1630 por sororMaria do Lado, mas as obras <strong>de</strong>construção só terão começadoem 1690. A igreja, o altar-mor,altares colaterais e laterais sãovisitáveis e sobressaem pelosseus retábulos setecentistas,trabalhados em mármoresprovenientes <strong>de</strong> Lisboa, <strong>de</strong>diferentes tonalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>branco, negro, rosa e amarelo,sem esquecer os seus preciososazulejos. E, claro, não se <strong>de</strong>veesquecer a gastronomia edoçaria locais.O conjunto arquitectónicocriado pelos solares, igreja eponte românica da vila daRedinha é mais um ponto <strong>de</strong>visita obrigatório nesteconcelho.No centro do distrito <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong>, e<strong>de</strong> uma assentada, Saul Gomesaponta as pinturas góticasrecuperada igreja do convento<strong>de</strong> São Francisco em <strong>Leiria</strong>, umdos tesouros da pinturamedieval portuguesa,<strong>de</strong>scobertas durante as obras <strong>de</strong>recuperação do templo e que<strong>de</strong>veriam ser um dos cartões <strong>de</strong>visita da cida<strong>de</strong> e da região.Seguem-se as pinturas dos anjosda abóbada da sacristia doMosteiro da Batalha, o Santuárioda Virgem <strong>de</strong> Nossa Senhora doFètal, no alto daquela localida<strong>de</strong>e que, tal como a Nazaré, já foium dos gran<strong>de</strong>s pontos <strong>de</strong>romaria da região, antes dofenómeno <strong>de</strong> Fátima.Na capital do distrito, são visitaobrigatória a Sé Catedral,construída entre 1550 e 1574,<strong>de</strong>pois da criação da diocese,cinco anos antes. É um dosgran<strong>de</strong>s edifícios doRenascimento tardio do nossoPaís. A Igreja da Misericórdia ea sua torre invulgar, localizadano local on<strong>de</strong> existiu a sinagoga<strong>de</strong> <strong>Leiria</strong>, o Santuários <strong>de</strong> NossaSenhora da Encarnação e, fora<strong>de</strong> <strong>Leiria</strong>, o barroco Santuáriodos Milagres não po<strong>de</strong>m ficar<strong>de</strong> fora <strong>de</strong> uma visita.