22 <strong>Jornal</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> 6 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2012LeitoresA direcção do <strong>Jornal</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> recebe com agradopara publicação a correspondência dos leitores quetratem <strong>de</strong> questões do interesse público. Reserva-seo direito <strong>de</strong> seleccionar os trechos maisimportantes das Cartas ao Director <strong>de</strong>vidamentei<strong>de</strong>ntificadas, publicadas nesta secção.direccao@jornal<strong>de</strong>leiria.ptVariante daCaranguejeira:uma priorida<strong>de</strong>?Sair do rectângulo para ficarmosmenos quadradosRICARDO GRAÇAEstão já no terreno as obras dasegunda fase da variante daCaranguejeira, que <strong>de</strong>verãocustar perto <strong>de</strong> 700 mil euros.Trata-se <strong>de</strong> uma obra há muitoprometida pelos políticos, com oargumento <strong>de</strong> que é preciso darcontinuida<strong>de</strong> ao troço já feito efacilitar a ligação à EN113, nosCardosos. Isto porque, oobjectivo <strong>de</strong> retirar o trânsito docentro da vila, nomeadamente<strong>de</strong> camiões, já foi cumprido coma execução da primeira fase davariante.Em circunstâncias normais,concordaria com a obra. Masvivemos tempos extraordinário,que exigem muito cuidado naaplicação dos recursosfinanceiros, cada vez maisescassos. No contexto actual, emque todos os todos os tostõescontam, gastar quase 700 mileuros em alcatrão parece-se<strong>de</strong>spropositado, quando há, porexemplo, melhoramentos a fazerem escolas ou no centro<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>.Percebo que, tratando-se <strong>de</strong>uma obra comparticipada porfundos comunitários, essedinheiro não po<strong>de</strong> ser '<strong>de</strong>sviado'para outros projecto. No entanto,há uma parte da verba que terá<strong>de</strong> ser assegurada pela câmara.Será uma pequena parte dos 700mil euros – não sei precisar ovalor –,que po<strong>de</strong>ria ser canalizada paraoutras obras ou acções maisprioritária, nomeadamente aonível da educação ou do apoiosocial.Bem sei que, os “<strong>de</strong>fensores”da variante po<strong>de</strong>m semprealegar que, se não seaproveitassem agora os fundoscomunitários aprovados, talvez aobra nunca fosse feita. E se nãofosse, seria assim tão grave?O troço já feito veioefectivamente aliviar o trânsitodo centro da vila. A segunda fasevai encurtar o acesso daCaranguejeira à EN113, mastambém não vejo que venha malao mundo por ter se fazer maisuns quilómetros para ace<strong>de</strong>r àreferida estrada através docruzamento dos Olivais.Há ainda a questão política.Sei que a obra é uma promessaeleitoral, apregoada nasúltimas campanhas. Mas jáestamos tão habituados a que amaioria das promessas não passedisso mesmo, que mais uma porcumprir não faria gran<strong>de</strong>diferença. Até porque esta obrafoi prometida em tempo <strong>de</strong>“vacas gordas”e hoje as circunstâncias sãoradicalmente diferentes.António S.<strong>Leiria</strong>Em Plena “Silly Season” ou “la morte-saison”,como dizem anglo-saxónicos e francófonosrespectivamente, Portugal está longe <strong>de</strong> parar.Quando muitos estão <strong>de</strong> férias outros trabalhamainda mais afincadamente. Muitos espaços eactivida<strong>de</strong>s encerram ou cessam completamente,mas muitos outros funcionam a todo o vapor.O sector do turismo é um daqueles que tentanesta altura superar a crise. A propósito disso, foidito aos portugueses para passarem férias cá<strong>de</strong>ntro. A i<strong>de</strong>ia, à primeira vista, parece acertada econsensual, pois é evi<strong>de</strong>nte que estimula aeconomia interna, mantendo divisas no País. Mas,ao transmitir essa i<strong>de</strong>ia, arriscamos per<strong>de</strong>r algumasoportunida<strong>de</strong>s indirectas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Porexemplo, seria interessante <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r também que:viajar para o estrangeiro po<strong>de</strong>rá trazer mais-valiasao País. Sair da realida<strong>de</strong> nacional, carregada <strong>de</strong>um manto <strong>de</strong> cinzentismo, po<strong>de</strong>rá ajudar aconhecer novas realida<strong>de</strong>s e i<strong>de</strong>ias. Nessanovida<strong>de</strong> existe a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recolher boasi<strong>de</strong>ias e exemplos, tal como reconhecer os maus <strong>de</strong>modo a evitá-los e continuar a apostar naquilo quenos distingue e em que somos bons. Ficarmosfechados sobre nós mesmos pouco ou nadaajudará. Boas i<strong>de</strong>ias e exemplos inspiradores nãotêm preço. Conhecer o mundo é essencial parapo<strong>de</strong>rmos mudar a aparente e imutável realida<strong>de</strong>em que vivemos. Pena é o acesso a viagensinstrutivas ser restrito, pois, ao contrário das boasi<strong>de</strong>ias, viajar tem um preço alto.Assim, parece-me completamente errada a i<strong>de</strong>ia<strong>de</strong> “quase obrigar” também todos os membros doGoverno a fazer a totalida<strong>de</strong> das suas férias porPortugal. Se alguém precisa urgentemente <strong>de</strong>novas i<strong>de</strong>ias e <strong>de</strong> procurar novos exemplos são osnossos governantes. Que pena não aproveitaremalguns dias <strong>de</strong> férias lá fora, aten<strong>de</strong>ndo a que a suasituação financeira é ten<strong>de</strong>ncialmente mais<strong>de</strong>safogada que a da maioria dos portugueses, paraviajar e procurar boas i<strong>de</strong>ias – mesmo que nãosejam somente turísticas – para o País. Também <strong>de</strong>férias se po<strong>de</strong> trabalhar, ainda que <strong>de</strong> um mododiferente.Este texto, tal como a época em que é escrito,tem muito <strong>de</strong> “silly” - ou, em português, <strong>de</strong>parvo(a). Tem também algo <strong>de</strong> esperançoso,tentando reforçar para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> procurarbons exemplos, “saindo da caixa” ou, neste caso,do “rectângulo” para voltarmos menos“quadrados”.Micael Sousa, <strong>Leiria</strong>DRGenerosida<strong>de</strong>Nos últimos dias, o drama dosincêndios voltou à região, com oconcelho <strong>de</strong> Ourém a ser o maisfustigado. As chamas <strong>de</strong>ixaramum rasto <strong>de</strong> <strong>de</strong>struição,queimando floresta, uma fábricae duas casas, havendo ainda alamentar a perda <strong>de</strong> uma vida,com a morte <strong>de</strong> um homem quefoi apanhado pelas chamasquando tentava proteger umaviário.Mas o drama dos fogos veio,mais uma vez, evi<strong>de</strong>nciar o que<strong>de</strong> melhor há na naturezahumana: a solidarieda<strong>de</strong>. Nashoras <strong>de</strong> aflição, em que osbombeiros não po<strong>de</strong>m chegar atodo o lado, aparecemvoluntários que sedisponibilizam a ajudar aproteger os bens alheios. Isso foivisível, bem visível nos incêndios<strong>de</strong> Ourém. On<strong>de</strong>, muitas vezesnão se viam bombeiros, láestavam carrinhas ou tractorestransportando água, que osbraços voluntariosos iam<strong>de</strong>spejar para cima das chamas. Éverda<strong>de</strong> que, muitas vezes, essaintervenção <strong>de</strong> pouco valeperante a dimensão das chamas,mas não tenho dúvidas que senão fosse essa gente generosaque, em muitos casos nemconhece o proprietários dos bensque tenta proteger, os estragosseriam bem maiores, não só emOurém como noutras zonasfustigadas pelos fogos.Uma palavra <strong>de</strong> apreço e <strong>de</strong>gratidão também às centenas <strong>de</strong>bombeiros que, nestas horas <strong>de</strong>aflição, não têm poupadoesforços na luta contra aschamas, uma batalha tantasvezes <strong>de</strong>sigual. É verda<strong>de</strong> quenem tudo corre bem e que hásempre falhas, nomeadamente<strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação, mas os soldadosda paz merecem o maior respeitoe gratidão.Natália Costa, Ourém
Opinião<strong>Jornal</strong> <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> 6 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 2012 23Crónica <strong>de</strong> um Verão austeroTeorias ruraisAntónioLacerdaSalesO medoÉseguro dizer-se neste momento, que o período<strong>de</strong> férias já passou e ao contrário <strong>de</strong> anosanteriores este foi particularmente pleno emactivida<strong>de</strong> política. Em <strong>Leiria</strong> foram vários osassuntos que tiveram <strong>de</strong>staque junto da opiniãopública. O exemplo da discussão em torno da passagempelo concelho da Volta a Portugal, é o paradigma <strong>de</strong>algo que se discute com precipitação e sem se estar emposse da informação correta. Muita ausência <strong>de</strong>informação! Também o dossier relativo à Leirisport tevefortes repercussões, inclusivamente no ExecutivoCamarário e, não me querendo alongar nesta questão,gostaria apenas <strong>de</strong> dizer que a conclusão <strong>de</strong>ste processoé o ponto mais <strong>de</strong>stacado <strong>de</strong> uma profundaintervenção que visa o saneamento orçamental daCâmara <strong>de</strong> <strong>Leiria</strong> que neste capítulo fez o que lhecompetia, abordando o <strong>de</strong>bate com serieda<strong>de</strong> contrauma Oposição que trata este assunto como arma <strong>de</strong>arremesso político. Porque será que se calaram após a<strong>de</strong>cisão governamental? Mas talvez a matéria maisfracturante neste Verão “quente” seja a situação maisrecente, em que a Câmara se vê obrigada a romper coma Lei dos Compromissos para conseguir respon<strong>de</strong>r àsnecessida<strong>de</strong>s inalienáveis <strong>de</strong> fornecer alimentação,transporte e activida<strong>de</strong>s extra-curriculares às criançasdo Pré-Escolar e 1º ciclo no Concelho. Num ambiente<strong>de</strong> rigor orçamental, cumprir esta obrigação representair contra as <strong>de</strong>terminações ditadas pelo governo. Noentanto é sem dúvida a <strong>de</strong>fesa do interesse público quenorteia este tour <strong>de</strong> force, <strong>de</strong>ixando antever um cenárioincómodo em que no nosso país as Câmaras se vêmobrigadas a trabalhar como únicos <strong>de</strong>fensores doscidadãos em matérias que <strong>de</strong>viam permanecerpriorida<strong>de</strong>s, mesmo em clima <strong>de</strong> contenção. Aeducação pública e livre constitui uma priorida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssegénero e julgo que os governos <strong>de</strong>viam chamar a si aresponsabilida<strong>de</strong> e a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong>ste <strong>de</strong>sígnio. No entanto,o <strong>de</strong>sígnio governamental ou a ausência <strong>de</strong>le é claro:austerida<strong>de</strong> tem sido o caminho e é uma realida<strong>de</strong> navida dos portugueses. Mas com que rumo? Com quePara mim ser professora é ter uma das profissõesmais bonitas do mundo. É ter por obrigação, agostosa possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> permanentemente meenvolver em atos criativos <strong>de</strong> uma beleza quaseinimaginável. Ser professor é afinal ser um criador, umfazedor <strong>de</strong> obras nascidas da combinação entre aintuição e a razão, tendo sempre em mente um objetivomuito claro e imprescindível à humanida<strong>de</strong>: o <strong>de</strong>contribuir para formar, através do conhecimento,pessoas livres e responsáveis! Talvez por pensar assim,no início <strong>de</strong> cada ano letivo, o reencontro com a escolae com os alunos foi sempre na minha vida ummomento <strong>de</strong> festa e <strong>de</strong> celebração! Não houve, até hoje,ministro algum, homem ou mulher, que me tivessebeliscado esta gostosa sensação. Como se os alunosfossem os fios coloridos e vivos <strong>de</strong> uma tela pronta a serpintada, jamais algum ministro ousou <strong>de</strong>struí-la.Apesar da insuficiência ou da má qualida<strong>de</strong> das tintas,dos pincéis, dos cavaletes, fornecidos aos criadores(alunos e professores) a tela intacta, toda ela cheia <strong>de</strong>luz, continuou lá! Mas eis que chega uma angustiante emaléfica sombra negra que me <strong>de</strong>sconcentra e me tira aluz <strong>de</strong> que necessito para trabalhar, partes da tela vãoficar quase invisíveis … e eu fico sem paz para criar.Crianças <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos vão po<strong>de</strong>r ser encaminhadas paravias alternativas <strong>de</strong> ensino, que dizem, as prepararãopara o mundo do trabalho. Com apenas <strong>de</strong>z anos,po<strong>de</strong>m tomar elas próprias essa <strong>de</strong>cisão (pasme-se!),perante as incapacida<strong>de</strong>s dos alunos, po<strong>de</strong>m ser osprofessores a tomá-la ou, pura e simplesmente, esseAméliado Valeobjetivo? Os dados do Eurostat do segundo trimestreconfirmam a retracção do PIB face ao períodohomólogo <strong>de</strong> 2011, (-3.3%). O quadro não melhoratendo em conta a crise espanhola que afectadirectamente a nossa balança comercial. A taxa <strong>de</strong><strong>de</strong>semprego (15%) atinge o seu maior nível <strong>de</strong> sempre.Sabemos hoje também, que a meta estipulada pelogoverno para o valor do défice (4,5%) vai mais uma vezsofrer <strong>de</strong>rrapagem (situar-se-á no final do ano, semmanobras <strong>de</strong> engenharia financeira, entre os 5 e os6%)… Esta sim uma <strong>de</strong>rrapagem Colossal. Todos estesfatores foram notícia durante o Verão, po<strong>de</strong>ndo assimconcluir que este clima <strong>de</strong> crise profunda não parou paraférias. Po<strong>de</strong>mos somar a este cenário a clara falta <strong>de</strong>vonta<strong>de</strong> em discutir o Orçamento <strong>de</strong> Estado para 2013,<strong>de</strong>ixando antever neste processo uma distribuição <strong>de</strong>medidas pré-eleitorais? Ou apenas mais austerida<strong>de</strong>…. Asprivatizações continuam, e a pressão sobre sectoresestratégicos torna-se insustentável, parecendo cada vezmais certo o panorama <strong>de</strong> alienação total <strong>de</strong> sectoresimportantes como a TAP ou a RTP <strong>de</strong> maneira aremendar as contas do Estado, significando maisencargos para as famílias portuguesas a longo prazo.Com este cenário a resposta das instituiçõesgovernamentais é uma política <strong>de</strong> “corte a direito”, umapolítica que não contempla estratégia, uma política emque o governo dita um rumo legitimado por umprograma não sufragado. Falta um <strong>de</strong>sígnio nacional. Asinstituições <strong>de</strong>mocráticas estão mais frágeis. Olhamoshoje para a Assembleia da República e vemos o seu po<strong>de</strong>rlimitado pelas exigências <strong>de</strong> cumprimento autista quenão <strong>de</strong>ixam antever solução. Na “Casa Presi<strong>de</strong>ncial” oscidadãos mais uma vez encontram uma resposta que nãocondiz com o cenário que parece fatalmente traçado.Falta uma i<strong>de</strong>ia estratégica! Quem <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> hoje ointeresse do cidadão português numa U.E. que quandocresce, nós ficamos na cauda e quando retrai, estamos nopelotão da frente? ….Presi<strong>de</strong>nte da C. Política Concelhia do PS-<strong>Leiria</strong>encaminhamento po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>cidido como um castigopara os alunos que não cumprem os seus <strong>de</strong>veres.Curiosamente esses alunos (na sombra) po<strong>de</strong>m voltar àvia normal (à luz) no final do 9º ano, se tiveremaprovação em exames feitos às disciplinas em queobtiveram o insucesso responsável pelo seu ingressonas vias alternativas <strong>de</strong> ensino! Estas viasprecocemente introduzidas, na vida <strong>de</strong> cada aluno, têma intenção criminosa <strong>de</strong> direcionar as crianças, pobres,<strong>de</strong> famílias com problemas ou, as crianças comdificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aprendizagem, para o trabalho braçal“purificando” o grupo dos outros, a elite!“Decididamente, o futuro da Nação, não resi<strong>de</strong>apenas em elites fechadas e diminutas” disse VeigaSimão, dois anos antes do 25 <strong>de</strong> Abril. Sendo aindahoje consensual esta afirmação, não entendo comopo<strong>de</strong>m os futuros eletricistas ou agricultoresentendidos aos 10 anos como incapazes, vir a serelite no futuro. Não duvido que esta exclusão dosalunos-problema das turmas seja apreciada poralguns pais e professores. É um facto que todo otrabalho <strong>de</strong> transmissão dos conhecimentos setornará mais fácil, assim como mais fácil se tornaráouvir as preleções dos “mestres”... E à repulsa que jásinto vem juntar-se o medo. Um medo atroz que me<strong>de</strong>ixa triste e revoltada. Um medo que me vaiimpedir <strong>de</strong> sorrir quando <strong>de</strong> novo regressar à escola ereencontrar o futuro em todos os meus alunos.ProfessoraFranciscoFreireAterra ficou cheia e alegreoutra vez, passaram osemigrantes! Toda a honrae toda a glória, lá vãoelas, e ninguém lhes passacartão. É disto que a casa gasta.Custa a acreditar, mas ouvidizer que viver aqui na serraainda é pior do que andar naSuíça a trabalhar. E <strong>de</strong> facto,quem os ouve imagina que sãoturistas brasileiros, que andampor lá a ver monumentos e acomprar vinho.Uma região com tantascatedrais, museus com quadrospintados. Coisas lindas,provavelmente.Os patrões não <strong>de</strong>vem sermaus, e até me contaram quealguns são melhores do que nós.Quem sabe? Mas porque é quehavemos <strong>de</strong> ser piores? Temos obacalhau, o arroz doce e asbananas. Temos muitas coisasboas, não sabemos é dar-lhes o<strong>de</strong>vido valor. É verda<strong>de</strong> que ovinho <strong>de</strong>les é fraco. Um brancoque não enche nada, sabe a geloe a rio. Só por causa disso, jámuitas vezes consi<strong>de</strong>rei pôr-mea andar dali para baixo. Há trintaanos que não vejo uma vindimacomo <strong>de</strong>ve ser. Punha-mesossegado a trabalhar numapedreira ou num barracão eaproveitava melhor a vida. Masquem me mandou para láavisou-me <strong>de</strong>stes perigos. Afome ia apertar, e eu <strong>de</strong>viamanter-me calado naquelasparagens. Lá estamos, no meioda neve e das vacas. Os senhoresnão olham sequer para nós, enós repetimos comiserados ogesto. Eles imaginam que opessoal não percebe, mas agente sabe tudo, e alguns atétêm conta no banco. Fazemos asnossas festas para eles pensaremque andamos contentes. Não seise sabem, mas eles lá têm amania das festas, e nósimitamos.Andam bem enganados, esomos nós que os enganamos.Se é verda<strong>de</strong> que as nossasmulheres não são gran<strong>de</strong>espingarda, as louras não <strong>de</strong>vemser melhores. Aquilo não <strong>de</strong>veprestar para nada. Um tipo quecasou com uma, anda cada vezmais esquisito. Até dizem que amulher lhe faz mal. Ele andapela Europa <strong>de</strong> camião, e pensaque é comandante <strong>de</strong> umtrirreme no mediterrâneocentral, a escrever versos solarese a pescar cavalas. Passados osPirenéus nunca há chatices.Depois <strong>de</strong> feitas as visitas,executa-se uma <strong>de</strong>licadamanobra circular e recolhe-separa nor<strong>de</strong>ste, sempre a direito.A<strong>de</strong>us silvas, a<strong>de</strong>us caneiros.Antropólogo, CRIA/FCSH-UNL