ROGÉRIO MIRANDA GOMES AS MUDANÇAS NO MUNDO DO ...

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12.07.2015 Views

84para se conseguir identificar seus correspondentes padrões de normalidade sobre oqual incidirá o trabalho em saúde.Uma excelente elaboração acerca de como o corpo extrapola sua dimensãobiológica encontra-se descrita nos Manuscritos Econômico-Filosóficos. Ali, Marxdemonstra como o corpo se encontra imerso no mar das determinações sociais. Aquientendida a esfera social em seu sentido mais amplo, como sendo aquela explicativadas ações do homem sobre a natureza para a produção da sua existência material.Vejamos o que nos diz o autor sobre os órgãos dos sentidos, aqueles mesmos formadospor justaposições anatomofisiológicas naturais...O olho tornou-se um olho humano, no momento em que o seu objeto se transformou emobjeto humano, social, criado pelo homem para o homem. (...) A necessidade ou o prazerperderam portanto o caráter egoísta e a natureza perdeu a sua mera utilidade, na medida emque a sua utilização se tornou utilização humana.(...) Consequentemente, além dos órgãosdiretos, constituem-se órgãos sociais, na forma da sociedade, por exemplo, a atividade emdireta associação com os outros se tornou um órgão da manifestação de vida e um modo daassimilação da vida humana.(...). A formação dos cinco sentidos é a obra de toda a históriamundial anterior. (MARX, 2004: 142-144)Mesmo as mais “ingênuas” estruturas biológicas – os órgãos dos sentidos - nãoescapam impunes à existência humana. Existência esta que ao ser social subverte ocorpo anatomofisiológico à utilidade que a sociabilidade exige. Essa sociabilidade,inclusive, exige usos do corpo que extrapolam sua capacidade biológica, fazendo comque o corpo seja expandido a fim de corresponder a esses usos. Essa “expansão” podese dar, por exemplo, pela criação de objetos que ampliem determinadas capacidadeshumanas. O microscópio amplia a capacidade de visão a um nível inalcançável para asestruturas anatomofisiológicas constituintes das retinas. Mas essa expansão pode sedar também a partir de outros elementos, não necessariamente materiais. Veja-se, porexemplo, o caso da cooperação. Os corpos anatomofisiológicos possuem umadeterminada capacidade de trabalho, porém quando colocados juntos a trabalhar sobdeterminada forma de organização conseguem multiplicar várias vezes sua capacidadeinicial de realização da mesma tarefa, a partir da constituição de um corpo social.O que pensamos ser fundamental ressaltar é que o corpo só existeconcretamente como corpo humano inserido em determinadas relações que os seres

85humanos estabelecem entre si e com a natureza a fim de garantir sua existênciamaterial. É condicionado por essas relações “que o corpo se elabora e reelabora, demaneira tal a só realizar-se, mesmo como estrutura anatômica e fisiológica, através dasqualificações ou determinações que adquire no plano da existência material e social.”(DONNANGELO, 1979: 24-5).Portanto, os critérios de normalidade estão necessariamente determinados pelouso atribuído ao corpo por essas relações e tomam a forma de normas, mas também desaberes e práticas, consubstancializados no que alguns autores denominam comonormatividade social (CANGUILHEM, 1995). E o papel principal que cabe ao corponesse processo de garantia da existência material dos homens é o de ser o elementofundamental que viabiliza a ação humana sobre a natureza. Portanto “o corpo sedispõe, antes de mais nada, como agente de trabalho”(DONNANGELO, op. cit.: 25).Como a representação do corpo e seus diversos padrões de normalidade sãodeterminados pelo papel do corpo no trabalho, ou seja, na produção da vida material,serão diferentes essas representações na dependência das diferentes formas de seorganizar essa produção. Além disso, dentro de um mesmo modo de organizar aprodução há diferentes usos e significados atribuídos ao corpo, a depender de como sedá a inserção dos corpos nos diferentes espaços da estrutura da produção social.Podemos inclusive perceber como os diferentes modos de produção forjam concepçõese representações do corpo e de sua normalidade diferentes, justamente por inseri-lo noprocesso de trabalho de maneira diferenciada.Ao analisar, por exemplo, a compreensão/apreensão do corpo pelas diferentesclasses sociais sob o capitalismo, Boltanski pôde perceber queO interesse e a atenção que os indivíduos concedem ao próprio corpo, ou seja, à sua aparência,agradável ou desagradável e, por outro lado, às suas sensações físicas, de prazer ou desprazer,cresce quando eles se elevam na hierarquia social (...) ou seja, quando diminui a resistênciafísica dos indivíduos, que não é outra senão a resistência que são capazes de opor ao própriocorpo e sua força física, ou seja, o partido que podem tirar do corpo. (BOLTANSKI, op. cit.:135) 1010 Recorreremos nesse tema específico – o corpo e sua inserção social – à algumas elaborações de LucBoltanki em sua obra “As classes sociais e o corpo” (vide referências bibliográficas), por entendermosque o autor conseguiu reunir um dos mais ricos materiais empíricos acerca das representações dossujeitos acerca seu corpo. Embora Boltanski não tenha apreendido com tanta profundidade o papel das

84para se conseguir identificar seus correspondentes padrões de normalidade sobre oqual incidirá o trabalho em saúde.Uma excelente elaboração acerca de como o corpo extrapola sua dimensãobiológica encontra-se descrita nos Manuscritos Econômico-Filosóficos. Ali, Marxdemonstra como o corpo se encontra imerso no mar das determinações sociais. Aquientendida a esfera social em seu sentido mais amplo, como sendo aquela explicativadas ações do homem sobre a natureza para a produção da sua existência material.Vejamos o que nos diz o autor sobre os órgãos dos sentidos, aqueles mesmos formadospor justaposições anatomofisiológicas naturais...O olho tornou-se um olho humano, no momento em que o seu objeto se transformou emobjeto humano, social, criado pelo homem para o homem. (...) A necessidade ou o prazerperderam portanto o caráter egoísta e a natureza perdeu a sua mera utilidade, na medida emque a sua utilização se tornou utilização humana.(...) Consequentemente, além dos órgãosdiretos, constituem-se órgãos sociais, na forma da sociedade, por exemplo, a atividade emdireta associação com os outros se tornou um órgão da manifestação de vida e um modo daassimilação da vida humana.(...). A formação dos cinco sentidos é a obra de toda a históriamundial anterior. (MARX, 2004: 142-144)Mesmo as mais “ingênuas” estruturas biológicas – os órgãos dos sentidos - nãoescapam impunes à existência humana. Existência esta que ao ser social subverte ocorpo anatomofisiológico à utilidade que a sociabilidade exige. Essa sociabilidade,inclusive, exige usos do corpo que extrapolam sua capacidade biológica, fazendo comque o corpo seja expandido a fim de corresponder a esses usos. Essa “expansão” podese dar, por exemplo, pela criação de objetos que ampliem determinadas capacidadeshumanas. O microscópio amplia a capacidade de visão a um nível inalcançável para asestruturas anatomofisiológicas constituintes das retinas. Mas essa expansão pode sedar também a partir de outros elementos, não necessariamente materiais. Veja-se, porexemplo, o caso da cooperação. Os corpos anatomofisiológicos possuem umadeterminada capacidade de trabalho, porém quando colocados juntos a trabalhar sobdeterminada forma de organização conseguem multiplicar várias vezes sua capacidadeinicial de realização da mesma tarefa, a partir da constituição de um corpo social.O que pensamos ser fundamental ressaltar é que o corpo só existeconcretamente como corpo humano inserido em determinadas relações que os seres

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