168campo do trabalho em saúde. Um aspecto que chama a atenção, por exemplo, é opotencial de estimulador da autonomia dos sujeitos demandadores das práticas emsaúde, que a tecnologia pode favorecer. Quando aspectos do saber acerca da saúde eda doença, que antes restringiam-se ao trabalhador, passam a ser objetivados, seja emequipamentos, seja em sistematizações de saber, cresce a possibilidade de sujeitos nãotrabalhadores da saúde apropriarem-se desses elementos, ainda que parcial efragmentadamente (SCHRAIBER, 1993). Veja-se, por exemplo, o caso dos examesauto-explicativos, cujos laudos estão cada vez mais compreensíveis para os leigos. Ouequipamentos vários, como os glicosímetros, que contribuem para que os própriosdiabéticos façam autonomamente o monitoramento de seu nível glicêmico, podendoeles próprios reajustarem doses de fármacos, ou seja, decidirem condutas terapêuticas,a depender dos dados analisados. Também é o caso do desenvolvimento da indústriafarmacêutica, visto que as apresentações dos fármacos encontram-se cada vez maispadronizadas e com informações técnicas mais acessíveis aos usuários. Isso semfalarmos na disponibilidade de informações acerca das doenças, seus diagnósticos eterapêuticas, presentes em veículos de informação como a internet, a imprensa etc.Tudo isso, pensamos, pode contribuir para o estabelecimento de uma relação menosdesigual e, consequentemente, menos autoritária entre trabalhadores da saúde esujeitos demandadores dessas práticas. Uma conseqüência direta do processo dedesenvolvimento da medicina sob a égide da racionalidade científica foi o progressivodistanciamento dos saberes e práticas acerca do corpo da maioria da população. Se, atéo período feudal, fenômenos como nascimento, morte, doença, aconteciam no âmbitocomunitário, com a institucionalização da medicina essas práticas começam a ficarrestritas ao saber médico e cria-se um distanciamento cada vez maior entre as pessoase o saber acerca de seu corpo. Esse saber passa a ser propriedade dos trabalhadores dasaúde, principalmente o médico, criando uma relação de dependência e submissão dorestante da população em relação a esses sujeitos que, assim, consolidaram posição degrande autoridade na sociedade. Essa condição, como vimos, alçou os médicos àcondição de intelectuais orgânicos da classe dominante, assim como seusantepassados, os antigos físicos no período feudal. Estabelece-se uma relação entre
169médico e os setores populares como constituintes de diferentes classes sociais.Pensamos que, em um outro nível do espiral, a questão da apropriação pelas pessoasdo saber acerca de seus corpos volta a apresentar-se, em graus limitados, comopossibilidade, ainda que distante. Exemplo disso é que, com o acesso maior a parcelasdo saber acerca do corpo, aumenta a consciência da população sobre as possibilidadesde erros por trabalhadores da saúde levando a uma maior fiscalização e controlepúblico dessas práticas.Outro elemento importante, conseqüência do movimento anterior, é que vemossurgir no atual período histórico em relação ao trabalho em saúde a constantereferência à necessidade de desenvolvimento de novas formas de “vínculos” entretrabalhadores e usuários dos sistemas de saúde. São muitas, e de concepções diversas,as elaborações acerca dessa necessidade, mas, em geral, ressalta-se o fato de que a“tecnologização” cada vez maior do trabalho em saúde estaria sendo responsável poruma tendência a certa “impessoalidade” na relação entre trabalhadores e usuários.Expressões disso são as, cada vez mais freqüentes, experiências e elaborações acercade novas tecnologias de relação entre trabalhadores e usuários (AYRES, 2004;CECÌLIO & PUCCINI, 2004; CAMPOS, 2005). Entre a população também éfreqüente a referência a um tempo quando a relação entre trabalhadores da saúde,principalmente médicos, e usuários dos serviços era mais “humana”, “conversava-semais” durante as consultas, etc. Pensamos que é preciso analisar essa questão em duasdimensões. A primeira refere-se ao processo, em parte já descrito por nós, por meio doqual as inovações tecnológicas, de diagnóstico e terapêutica, transformam a consultaclínica tradicional. Um exame como a mamografia, por exemplo, consegue demonstrara existência de tumores de tamanho tão reduzido, a um grau que as mais habilidosasmãos nunca serão capazes de diagnosticar. Logo, o exame manual da mama passa,com o tempo a ser substituído pelo exame radiológico. Uma etapa da tradicionalconsulta clínica é abolida, ou melhor, substituída por outra, sob controle de outrostrabalhadores parcelares. Assim também acontece com os recursos tecnológicos decaráter “discursivo” ou “relacional”, como a clássica anamnese, a entrevista clínica.Essa pode ser descrita como a mediação através da qual o trabalhador apreende seu
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