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A violência na escola como um sintoma do mal-estar juvenil e ... - USP

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9UNIVERSIDADE DE BRASÍLIAFACULDADE DE EDUCAÇÃOPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃOA violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong> <strong>sintoma</strong> <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong><strong>juvenil</strong> e institucio<strong>na</strong>l <strong>na</strong> pós-modernidade:a voz <strong>do</strong>(c)enteMAURO GLEISSON DE CASTRO EVANGELISTABRASÍLIA2012


MAURO GLEISSON DE CASTRO EVANGELISTAA violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong> <strong>sintoma</strong> <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong><strong>juvenil</strong> e institucio<strong>na</strong>l <strong>na</strong> pós-modernidade:a voz <strong>do</strong>(c)enteDissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduaçãoda Faculdade de Educação, da Universidade de Brasília, <strong>como</strong>requisito parcial para a obtenção <strong>do</strong> título de mestre emEducação, <strong>na</strong> área de concentração Educação e EcologiaH<strong>um</strong>a<strong>na</strong>, sob orientação da Profª Drª. Inês Maria MarquesZanforlin Pires de Almeida.BRASÍLIA2012


iiiÀ VidaDEDICATÓRIA“Brilhan<strong>do</strong> por luz de Deus, ainda mesmo <strong>na</strong>s regiões em que a escuridadeaparentemente <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>, o amor regenera e aprimora sempre.”“Podem surgir grandes <strong>mal</strong>feitores, abalan<strong>do</strong> a ordem pública, mas, enquantoexistirem pais e mães responsáveis e devota<strong>do</strong>s, o lar fulgirá no mun<strong>do</strong>, cooperan<strong>do</strong>para que se dissolva a lama da delinquência <strong>na</strong> charrua <strong>do</strong> suor ou <strong>na</strong> fonte daslágrimas.”À minha mãe e ao meu pai e, em nome deles, a todas as pessoas que, ocupan<strong>do</strong>este lugar, independentemente das idealizações que constroem para estes papéis, anônimos aogrande público, abrem mão de parte significativa de suas vidas, para contribuir <strong>na</strong> lapidação<strong>do</strong> novo ser.“Podem surgir crianças-problemas e jovens transvia<strong>do</strong>s de to<strong>do</strong>s os matizes, mas,enquanto existirem professores dignos <strong>do</strong> nome bendito que carregam, erguer-se-á a<strong>escola</strong> por santuário da educação” (XAVIER, 1960, p. 169).À professora Carmem Lúcia e, em nome dela, a to<strong>do</strong>s os seres h<strong>um</strong>anos que,atuan<strong>do</strong> neste papel, não obstante todas as fragilidades da <strong>escola</strong>, veem as pessoas queocupam o lugar de aluno.


viABSTRACTThis research, with aid of the psychoa<strong>na</strong>lysis, Youth's and Education’s Sociology,discussed the violence in the School as symptom of <strong>mal</strong>aise’s <strong>juvenil</strong>e and institutio<strong>na</strong>l inpost-modernity through the teaching speech. We observed that the School committeeconditions for the encounter of these <strong>mal</strong>aises. The subject of this investigation were teachersof a public school that offers the Education of Youths and Adults modality of the day in DF.Their speeches were a<strong>na</strong>lyzed through the psychoa<strong>na</strong>lytical hermeneutics telling us of a deepsuffering as result of acts disruptive’s tee<strong>na</strong>gers and/young who has that occupy student'splace with clear difficult to adjusting to this paper. The teachers say that the Family is thefault is make responsible the Family is the guilty and they accuse the absence of support ofthe State, especially as for the continuous formation that and they say that when it happens, itis distant of their needs. We concluded that the School with a<strong>do</strong>lescent lives a crisis and aconflict with the law, that student's condition and of youth condition are more and moredistant, that the teacher lives a deep <strong>mal</strong>aise current this situations and that, in spite of theyrequest formations that help them to work with the new realities, they refuse the formations(initial and continuing) that they have been receiving. We believe that it’s necessary to build anew School for a new moment and for a new generations.Key words: a<strong>do</strong>lescence / youth, violence in the School, post-modernity, educatio<strong>na</strong>lindisposition and teacher's formation.


viiSUMÁRIOMemória educativa: marcas de <strong>um</strong>a caminhada que se projetam no meu agora ...................... 9Introdução ............................................................................................................................... 14Capítulo 1: Sintomas <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>na</strong> pós-modernidade ........................................................ 16Capítulo 2: Juventude desamparada ....................................................................................... 20A<strong>do</strong>lescência e ou juventude? ..................................................................................... 20A<strong>do</strong>lescência e tra<strong>um</strong>atismo ....................................................................................... 28Breve teoria sobre o tra<strong>um</strong>a ........................................................................................ 31Vulnerabilidades e fragilidades das mediações simbólicas ....................................... 34Fragilidade das mediações simbólicas ........................................................................ 35Capítulo 3: Violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> .............................................................................................. 46A organização e instituição <strong>escola</strong> .............................................................................. 46A <strong>escola</strong> de hoje é a <strong>escola</strong> de ontem ...........................................................................49A Pedagogia Institucio<strong>na</strong>l ........................................................................................... 51O <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>na</strong> e da <strong>escola</strong> decorrente da “expansão degradada”................................ 52O <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> da <strong>escola</strong>: novo tempo e velha <strong>escola</strong> - a <strong>escola</strong> e oa<strong>na</strong>cronismo <strong>na</strong> socialização das novas gerações ....................................................... 53A <strong>escola</strong> e a lei ............................................................................................................ 56Autoridade <strong>na</strong> <strong>escola</strong> (des)autorização ........................................................................ 59A democracia <strong>na</strong> <strong>escola</strong> ............................................................................................... 62Violência: bordean<strong>do</strong> o real ....................................................................................... 68Capítulo 4: Meto<strong>do</strong>logia ......................................................................................................... 72O porquê de <strong>um</strong>a pesquisa qualitativa ........................................................................ 78O lócus da pesquisa ..................................................................................................... 79Sujeitos da pesquisa .................................................................................................... 80Da coleta de da<strong>do</strong>s ....................................................................................................... 81Outras ações ................................................................................................................ 82Instr<strong>um</strong>entos ................................................................................................................ 82O processo de interpretação ........................................................................................ 85Capítulo 5: Análise de da<strong>do</strong>s .................................................................................................. 87


viiiA <strong>escola</strong> e o a<strong>do</strong>lescente em crise e ou conflito com a lei .......................................... 90O a<strong>do</strong>lescente e ou o jovem versus o aluno ................................................................ 99A voz <strong>do</strong>(c)ente ......................................................................................................... 107(In/de/trans)formação: <strong>um</strong> caminho? ........................................................................ 118Capítulo 6: Considerações fi<strong>na</strong>is ........................................................................................... 125Referências ............................................................................................................................ 130Apêndice: Termo de Consentimento Livre e Esclareci<strong>do</strong> ........................................... 146Anexo: autorização da Secretaria de Educação <strong>do</strong> DF para a pesquisa ...................... 148Notas ..................................................................................................................................... 149SUMÁRIO DE QUADROSQuadro 1: sujeitos de pesquisa ............................................................................................... 81Quadro 2: representações anunciadas pelos professores sobre os estudantes ....................... 100


11orientação de forma que eu pudesse fazer a prova em outro dia. Que insistência! Eu resolviestudar, não sei dizer o porquê. Teria si<strong>do</strong> pela insistência dela? Acredito que não. Insistênciamaior tinha minha mãe. Acho que pelo olhar de credibilidade, pelo cuida<strong>do</strong>, pela exigênciaque traduzia confiança. Somente quem acredita exige.Lembro-me de mim estudan<strong>do</strong>, <strong>do</strong> prazer que senti, ao perceber que eu estavacompreenden<strong>do</strong> o tal exemplo; fui fazen<strong>do</strong> exemplo a exemplo e fui entenden<strong>do</strong> a lógica <strong>do</strong>slivros de matemática. Não sei que nota tirei <strong>na</strong> prova. Não sei se passei por mérito próprio,mas sei que aprendi a matéria e o mais importante: aprendi que podia aprender.Já que podia aprender Matemática, poderia, também, aprender o tal <strong>do</strong> Português,ainda mais com <strong>um</strong>a professora que me ameaçava com nova reprovação. Algo me disse que aminha disfunção de escrita estava ligada à disfunção de fala. Sei que aprendi sozinho a <strong>do</strong>brara minha orelha, para escutar a minha própria voz e, assim, fui corrigin<strong>do</strong> a minha fala. Tenteicopiar a forma <strong>como</strong> as pessoas falavam o b, o d, o g, o v e o z, letras que não conseguiapronunciar, e, com esforço, fui conseguin<strong>do</strong>, repito, sozinho. Aprendi a falar e a escrevercorretamente. Passei de ano, entrei em férias, peguei <strong>um</strong>a gramática. Se não podia vencer omeu inimigo, a Língua Portuguesa, juntar-me-ia a ela. Li e entendi a gramática toda, de pontaa ponta. Eu tinha onze anos de idade.Na sexta série, fui para <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> bem próxima de minha casa, aquela <strong>na</strong> qualestudei no pré-<strong>escola</strong>r e <strong>na</strong> primeira série, então já não era mais <strong>um</strong> dalit da educação. Brilhei<strong>como</strong> aluno e, em consequência, <strong>como</strong>, cidadão, pessoa, a<strong>do</strong>lescente! Fiz amigos, formei <strong>um</strong>centro cívico. Daí para frente, minha relação com a <strong>escola</strong> foi outra. Achei ba<strong>na</strong>l tu<strong>do</strong> aquiloque os professores ensi<strong>na</strong>vam. Prestava atenção no discurso <strong>do</strong> professor e, depois, iaconversar. Passei a ensi<strong>na</strong>r meus amigos de classe. A<strong>do</strong>rava ir para a <strong>escola</strong>, mas não para asaulas. Gostava muito <strong>do</strong>s meus professores, inclusive os de Português. Que ironia!No Ensino Médio, nem caderno eu cost<strong>um</strong>ava ter. Captava o discurso <strong>do</strong>sprofessores e os reproduzia <strong>na</strong>s provas, e eles, é claro, me achavam o máximo. Gostava de serdesafia<strong>do</strong> pelo conhecimento e me esforçava até <strong>do</strong>miná-lo. Perdi meu pai no fim <strong>do</strong> EnsinoMédio. Tinha de trabalhar. Passei em História, n<strong>um</strong>a faculdade particular, a UnB não tinha operío<strong>do</strong> noturno. Minha mãe, sem receber a pensão, pediu que eu não fizesse a prova, pois euiria passar no vestibular, e não teríamos <strong>como</strong> pagar as mensalidades. Não a ouvi; meu desejoera maior. Um amigo emprestou o dinheiro, e minha mãe voltou atrás. Fui escolhi<strong>do</strong> peladireção <strong>do</strong> curso para dar aula <strong>na</strong> <strong>escola</strong> de Ensino Médio da Faculdade. No fim <strong>do</strong> curso,passei <strong>na</strong> Secretaria de Educação. Optei por trabalhar <strong>na</strong> periferia, larguei o emprego <strong>na</strong>


13autores de atos infracio<strong>na</strong>is, pois, lá, encontraria <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> além <strong>do</strong>s conteú<strong>do</strong>s. Le<strong>do</strong>engano. Assim, veio o desejo de buscar algo que chamamos <strong>escola</strong> e fui parar no curso deespecialização em Administração Escolar da UnB, em que conheci o professor RogérioCordóva com os seus autores. Eles diziam o que eu queria ouvir, mas à UnB não interessavadiscutir com eles. Afastei-me da academia com mágoa. Os acadêmicos eram alieníge<strong>na</strong>s quepousavam com suas <strong>na</strong>ves, em nossas <strong>escola</strong>s, para dizer-nos de nossa incompetência. Para<strong>um</strong> desses, rompi meu silêncio e falei de nossa realidade. A assistente pedagógica faloubaixinho ao meu ouvi<strong>do</strong>: “Para, porque ele vai chorar”.Contu<strong>do</strong>, por <strong>um</strong> conjunto de coincidências, reencontrei a professora Inês e,novamente, fui captura<strong>do</strong> pelos feitos da bruxa (psicanálise). Aqueles autores falavam a e pormim e, por vezes, contra mim. Levei anos len<strong>do</strong> e estudan<strong>do</strong> até que, intima<strong>do</strong>, inscrevi-mepara a seleção <strong>do</strong> mestra<strong>do</strong>. Olhan<strong>do</strong> a grade horária, vi <strong>um</strong>a discipli<strong>na</strong> cujo título me chamoua atenção: Juventude, Educação e Cultura. Meu Deus! Apaixonei-me pela Sociologia daEducação e da Juventude e pela professora. Quanta sabe<strong>do</strong>ria e simplicidade em <strong>um</strong>a sópessoa. Desta caminhada resultou a minha dissertação.Tenho comigo as histórias mais lindas a ser contadas, de alunos que amei e queme amaram e <strong>como</strong> este amor mu<strong>do</strong>u a trajetória de sofrimento que construíam para si. Mas,falta-me espaço. Até mesmo porque as palavras seriam insuficientes.


14INTRODUÇÃOE o espanto está nos olhosDe quem vê o grande monstro a se criar.Herbert Vian<strong>na</strong>A violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> ocupa espaço privilegia<strong>do</strong> nos meios de comunicação demassa, <strong>na</strong>s últimas décadas, em que se ass<strong>um</strong>e a posição de espetáculo com forte aderência dapopulação. Em resposta, há reações diversas, extremistas e a<strong>na</strong>crônicas, mesmo as oriundasde profissio<strong>na</strong>is da educação.A nossa opção por esta temática deu-se tanto pela relevância <strong>do</strong> tema quanto pelanossa experiência <strong>como</strong> estudante desadapta<strong>do</strong> aos padrões idealiza<strong>do</strong>s pela <strong>escola</strong> e da nossaexperiência <strong>como</strong> professor, que, conhecen<strong>do</strong> este lugar de desadaptação, aprimorou odiálogo com os estudantes que o ocupavam. Assim, surge a necessidade de juntarinteressantes compreensões sobre esta temática, o que não foi encontra<strong>do</strong> em nossas pesquisasa respeito <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> da arte 1 , sobre a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, <strong>como</strong> tentativa de dialogar sobre acaminhada, (re)pensá-la, (re)significá-la, redirecioná-la.Trata-se de pesquisa qualitativa, exploratória e descritiva, pela qual, com auxílioda análise hermenêutica, pretendemos dar voz às subjetividades de professores de <strong>um</strong>a <strong>escola</strong>que oferece a modalidade de Educação de Jovens e Adultos no perío<strong>do</strong> diurno e que apresentaalto índice de queixa com relação à indiscipli<strong>na</strong> e ou à violência 2 em seu cotidiano. Nossoobjetivo é investigar se a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> é <strong>um</strong> <strong>sintoma</strong> <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>juvenil</strong> e institucio<strong>na</strong>l<strong>na</strong> pós-modernidade.Almejamos compreender as concepções de <strong>sintoma</strong> e <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>na</strong> pósmodernidademediante <strong>um</strong>a leitura psica<strong>na</strong>lítica, identificar as possíveis interações entre osfenômenos da indiscipli<strong>na</strong> e ou da violência e o cotidiano <strong>escola</strong>r e verificar as implicações <strong>do</strong><strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> a<strong>do</strong>lescente e ou <strong>juvenil</strong> reforça<strong>do</strong> pelo contexto <strong>escola</strong>r pós-moderno no fenômenoda violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Apesar de nos sustentarmos em <strong>um</strong> aporte psica<strong>na</strong>lítico, atravessa<strong>do</strong>sque somos pelo paradigma da complexidade, buscamos dialogar com outras áreas <strong>do</strong>conhecimento, com especial ênfase <strong>na</strong> sociologia da educação e da juventude.No primeiro capítulo, apresentamos <strong>um</strong>a discussão sobre o conceito de juventude,com o auxílio da sociologia da juventude e da a<strong>do</strong>lescência, com base em recentes autores dapsicanálise, para, em terceiro momento, localizarmos estas categorias <strong>na</strong>s fragilidades desteinício de século, de forma a discutirmos os desafios de a<strong>do</strong>lescer <strong>na</strong> pós-modernidade e suasinterfaces com a violência. No segun<strong>do</strong> capítulo, exami<strong>na</strong>mos o conjunto destas discussões no


17conforme se fazia. Em 1905, a<strong>na</strong>lisan<strong>do</strong> o caso Dora, entendeu o <strong>sintoma</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong>a defesa<strong>do</strong> eu ante a censura <strong>do</strong> supereu, que impossibilitou sua realização (FREUD, 1905). Um<strong>sintoma</strong> é, portanto, "<strong>um</strong> si<strong>na</strong>l e <strong>um</strong> substituto de <strong>um</strong>a satisfação pulsio<strong>na</strong>l que permaneceuem esta<strong>do</strong> jacente: é <strong>um</strong>a consequência <strong>do</strong> processo de repressão” (FREUD, 1925, p. 2).Birman (2007) ajuda-nos a compreender os <strong>sintoma</strong>s <strong>como</strong> formas complexas de organizaçãopsíquica, por apresentar <strong>um</strong>a estrutura multifacetada e estratificada em que se a<strong>mal</strong>gamam, demo<strong>do</strong> quase indiscernível, os movimentos pulsio<strong>na</strong>is <strong>do</strong> sujeito e as formas <strong>do</strong>s interditos.Neste senti<strong>do</strong>, os <strong>sintoma</strong>s eram formações de compromisso <strong>do</strong> sujeito, em queprocurava negociar os impasses entre as volúpias e as interdições. Como formaçãode compromisso, o <strong>sintoma</strong> implicava <strong>um</strong>a operação quase impossível denegociação, pois se contrapunham em sua tessitura exigências inconciliáveis <strong>do</strong>sujeito (BIRMAN, 2007, p. 256).O <strong>sintoma</strong> adquire, em psicanálise, importância ímpar, ten<strong>do</strong> em vista ser a pistada história <strong>do</strong> sujeito conforme asseverou Lacan (1986). Em nosso caso, os <strong>sintoma</strong>s <strong>do</strong> <strong>mal</strong><strong>estar</strong>contemporâneo são as pistas para compreensão da caminhada sócio-histórica quefizemos enquanto mun<strong>do</strong> ocidental, enquanto <strong>escola</strong> e os lugares que se encontram coloca<strong>do</strong>spara a<strong>do</strong>lescência, aluno, jovem, professor.No que concerne à pós-modernidade, entendemo-la, <strong>como</strong> Birman (2007), <strong>como</strong>“<strong>um</strong> conceito genérico, capaz de dar conta das sociabilidades inéditas” (p. 187), que se teceem ruptura com o discurso da modernidade. Nesta obra, o autor busca fazer <strong>um</strong>a releitura <strong>do</strong>livro O <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>na</strong> civilização, para demonstrar que Freud colocara em questão muitomenos a antinomia entre pulsão e civilização e muito mais o estatuto <strong>do</strong> sujeito <strong>na</strong>modernidade, o que promoveu a psicanálise <strong>como</strong> “<strong>um</strong>a leitura da subjetividade e de seusimpasses <strong>na</strong> modernidade.” (p. 17), ou seja, <strong>um</strong>a crítica psica<strong>na</strong>lítica a esse momento.Hall (2006) compreende a pós-modernidade <strong>como</strong> <strong>um</strong> abalo <strong>na</strong>s referências quedavam <strong>um</strong>a ancoragem relativamente estável ao mun<strong>do</strong> social, o que se dá peladescentralização <strong>do</strong> sujeito e pela fragmentação <strong>do</strong>s enquadres culturais que, no passa<strong>do</strong>,ofereciam-nos as localizações <strong>como</strong> sujeitos sociais. A noção de sujeito il<strong>um</strong>inista, <strong>como</strong>pessoa centrada, unificada, racio<strong>na</strong>l, de consciência e de ação, e a concepção sociológica dareprodução, de que o sujeito não era autônomo nem tampouco autossuficiente — visto que eracompreendi<strong>do</strong> <strong>como</strong> continuamente reconstruí<strong>do</strong> por <strong>um</strong> diálogo com o mun<strong>do</strong> cultural que osuturava à estrutura — são modificadas pelo conceito pós-moderno, <strong>um</strong>a vez que estasestruturas se encontram fragmentadas e fluidas. Giddens (2002) demonstrará que as práticassociais <strong>na</strong> pós-modernidade são constantemente exami<strong>na</strong>das e reformadas à luz daininterrupta onda de informações novas recebidas, que ocorrem em nível planetário,


19temos assisti<strong>do</strong> à contratendência à homogeneização global, o que se tem revela<strong>do</strong>, entreoutras questões, pela fasci<strong>na</strong>ção à diferença paralela a <strong>um</strong>a ocidentalização <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.Estas são sucintas reflexões iniciais para que possamos discutir os efeitos <strong>do</strong> novotransfun<strong>do</strong> sociocultural para as subjetividades a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens e para assubjetividades <strong>do</strong> professor, bem <strong>como</strong> <strong>do</strong>s efeitos deste tempo para as ressonâncias <strong>na</strong>srelações que se estabelecem <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.


20CAPÍTULO 2 JUVENTUDE DESAMPARADAE há que se cuidar <strong>do</strong> broto.Pra que a vida nos dê florFlor e fruto.Milton Nascimento e Wagner TisoO título deste capítulo, além de nomear a temática que será apresentada, pretendefazer reverência a <strong>um</strong>a obra referência em nossos estu<strong>do</strong>s. Livro de mesmo nome, escrito pelopsiquiatra e psica<strong>na</strong>lista alemão August Aichhorn, prefacia<strong>do</strong> por Freud e edita<strong>do</strong> no ano de1925, mostra-se de <strong>um</strong>a atualidade e sensibilidade ímpar. Aichhorn (1925) descreve asatividades que desenvolvia junto a jovens “delinquentes”, utilizan<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> aporte psica<strong>na</strong>líticocom excelentes resulta<strong>do</strong>s para demonstrar que, <strong>na</strong> contramão <strong>do</strong> discurso de culpa e coerção,as novas gerações, para além da responsabilização, carecem de amparo e que, para tanto, nãoprecisamos, necessariamente, <strong>do</strong> setting circunscrito de <strong>um</strong> divã.A<strong>do</strong>lescência e ou juventude?Na América Lati<strong>na</strong> e no Brasil, há desencontro quanto ao uso <strong>do</strong>s termos empauta. Não temos visto esta distinção <strong>na</strong> bibliografia francesa da qual nos utilizamos. Tambémno Brasil, é com<strong>um</strong> que teóricos da área das psicologias transitem entre os termos sem muitadificuldade e prejuízo para nenh<strong>um</strong> deles, apesar <strong>do</strong> reconhecimento de suas especificidades.Há também imprecisão conforme observa Freitas (2005):Existe, hoje, no Brasil, <strong>um</strong> uso concomitante de <strong>do</strong>is termos, a<strong>do</strong>lescência ejuventude, que ora se superpõem, ora constituem campos distintos, mascomplementares, ora traduzem <strong>um</strong>a disputa por distintas abordagens. Contu<strong>do</strong>, asdiferenças e as conexões entre os <strong>do</strong>is termos não são claras, e, muitas vezes, asdisputas existentes restam escondidas <strong>na</strong> imprecisão <strong>do</strong>s termos. (p. 6).A<strong>do</strong>lescência tem si<strong>do</strong> <strong>um</strong>a categoria de uso mais com<strong>um</strong> das ciências da saúde,incluin<strong>do</strong> as psicologias, priorizan<strong>do</strong> o intrapsíquico — ainda que o considere <strong>como</strong>influência ou consequência. Juventude, por sua vez, é <strong>um</strong>a categoria de estu<strong>do</strong> com<strong>um</strong>enteusada pela sociologia, pela demografia e por alg<strong>um</strong>as ciências sociais, para estudar o mesmomomento <strong>do</strong> ciclo de vida h<strong>um</strong>a<strong>na</strong>, com <strong>um</strong>a diferenciação no recorte etário, pela ótica dasrelações que se estabelecem entre os seres h<strong>um</strong>anos. Todavia, <strong>na</strong> prática, esta distinção não étão clara e pacífica assim e apresenta prejuízos a estas populações, ten<strong>do</strong> em vista adificuldade para a promoção de políticas públicas, pois, segun<strong>do</strong> Dávila et. al. (2003), aspolíticas para qualquer população ancoram-se <strong>na</strong>s noções que se tenham <strong>do</strong>s sujeitos a quemse endereçam e <strong>na</strong> compreensão que se tenha de seus desafios.


21Fazen<strong>do</strong> <strong>um</strong> balanço <strong>do</strong> uso <strong>do</strong>s termos, Abramo (2005) constata que pre<strong>do</strong>minou,<strong>na</strong> década de 1990, o nome a<strong>do</strong>lescência, ten<strong>do</strong> em vista os avanços assegura<strong>do</strong>s em lei peloEstatuto da Criança e <strong>do</strong> A<strong>do</strong>lescente e os movimentos organiza<strong>do</strong>s que levantaram estabandeira, o que se deu paralelo a <strong>um</strong> contradiscurso a esta categoria encampa<strong>do</strong> por <strong>um</strong> setorespecífico da mídia de massa. No entanto, <strong>um</strong>a parcela significativa da juventude parece terfica<strong>do</strong> de fora desta discussão, a saber, os indivíduos entre dezenove e vinte e nove anos deidade.Em termos etários, apesar de sabermos que nenh<strong>um</strong>a das categorias se limite aeste critério, por extrapolá-los, a a<strong>do</strong>lescência é compreendida pela OMS <strong>como</strong> o perío<strong>do</strong> quese estende entre os 10 (dez) e os 19 (dezenove) anos de idade, o que não está de acor<strong>do</strong> com oestatuto legal — Lei n° 8069/90, artigo 2º (BRASIL, 1990). Juventude, de outro mo<strong>do</strong>, é, nocaso <strong>do</strong> Brasil, considerada pela Política Nacio<strong>na</strong>l de Juventude (CONJUVE, 2006) <strong>como</strong> operío<strong>do</strong> que vai <strong>do</strong>s 14 (quatorze) aos 29 (vinte e nove) anos de idade, apesar de muitosórgãos brasileiros, em desrespeito à respectiva política, continuarem trabalhan<strong>do</strong> com a faixaetária utilizada pela Organização das Nações Unidas, <strong>do</strong>s 14 (quatorze) aos 24 (vinte e quatro)anos de idade.É consenso, em ambas as contribuições teóricas, a relativização da idade e ocuida<strong>do</strong> de redução a ela (CONJUVE, 2006; MARGULIS, 2001; LAPASSADE, 1968;RASSIAL, 1997b). Porém, <strong>como</strong> assevera León (2005, p. 6), por mais que se opte porexpressões, <strong>como</strong> “faixa etária, <strong>um</strong> perío<strong>do</strong> da vida, <strong>um</strong> contingente populacio<strong>na</strong>l, <strong>um</strong>acategoria social, <strong>um</strong>a geração”, elas vinculam-se, de alg<strong>um</strong>a forma, à dimensão de <strong>um</strong>a fase<strong>do</strong> ciclo vital entre a infância e a maturidade. Portanto, há correspondência com a faixa deidade, ainda que não possa ser rigidamente definida.Ambos os termos são categorias que se ancoram no aspecto biológico, apesar denão se limitarem a ele, e ambos consideram a importância das dimensões intrapsíquica einterpsíquica, dan<strong>do</strong> cada área <strong>um</strong> valor maior ou menor a <strong>um</strong>a destas dimensões. Contu<strong>do</strong>,não nos sentimos contempla<strong>do</strong>s pelo termo a<strong>do</strong>lescência, razão pela qual nos utilizaremos deambas as categorias ainda que pese a utilização <strong>do</strong>s termos a<strong>do</strong>lescência e ou juventude.Destacamos que, por mais que se tenha mostra<strong>do</strong> <strong>um</strong>a tarefa complexa tanto parao mun<strong>do</strong> acadêmico quanto para os governos, conforme conclui relatório da CEPAL y OIJ(2004), fazem-se urgentes delimitações mais claras que nos permitam estabelecer limites aotempo em que se respeitem as especificidades pessoais e particularidades sócio-históricasdestas parcelas da população. Para tanto, julgamos procedente o cuida<strong>do</strong> sugeri<strong>do</strong> porReguillo Cruz (2000) <strong>como</strong> duas possíveis armadilhas: pensar estes conceitos pelo viés das


22estruturas em desconsideração <strong>do</strong>s sujeitos e pensar os sujeitos em desconsideração dasestruturas.Sugerimos que tais delimitações e contornos levem em consideração, segun<strong>do</strong>Léon (2005); os conceitos de geração e classes de idade, visto que a similaridade <strong>do</strong>scontextos sócio-históricos faz que o aspecto cronológico se converta no sociológico,conforme propõe Weller (2010a); os estilos de vida, destacan<strong>do</strong>, com Giddens (2002), o papel<strong>do</strong> cotidiano enquanto media<strong>do</strong>r constitutivo e ancoragem histórica das subjetividades; osritos que cost<strong>um</strong>am marcar as passagens, <strong>um</strong>a vez que, de acor<strong>do</strong> com Feixa (2006), atransição <strong>do</strong> infantil ao adulto requer <strong>um</strong> reconhecimento social; as trajetórias de vida, quePais (2005) traduz <strong>como</strong> as mudanças experimentadas nos modelos e nos processos de entrada<strong>na</strong> vida adulta por parte <strong>do</strong>s sujeitos jovens e as novas condições juvenis, dadas pelo contextotemporal em que a juventude se coloca.Devem-se, basean<strong>do</strong> <strong>na</strong>s reflexões de Abramo (2005), considerar asespecificidades entre os anos iniciais e fi<strong>na</strong>is desse momento da vida e respeitar as trajetóriasespecíficas sem as quais poderemos cair em reducionismos de categorizar, pejorativamente,quem não desenhe <strong>um</strong>a trajetória instituída. Pais (1990), discutin<strong>do</strong> esta questão, alerta-nospara o cuida<strong>do</strong> com a prevalência da busca de aspectos uniformes e homogêneos quecaracterizam esta fase da vida.A bibliografia da qual nos utilizamos leva-nos a crer que a dificuldade conceitualé maior para a categoria juventude, apesar de observarmos, de outro la<strong>do</strong>, muitos equívocospor universalização e rigidez da categoria a<strong>do</strong>lescência, sem consideração <strong>do</strong> percursoindividual inseri<strong>do</strong> em contexto sócio-histórico de cada sujeito (BOCK, 2004).No intuito de enfrentar o desafio de ensaiar <strong>um</strong> delineamento <strong>do</strong> conceito dejuventude, Margulis (2001) esboça alg<strong>um</strong>as reflexões, a começar pela complexidade de talempreitada, haja vista a sobreposição de significações e as múltiplas formas de expressãodesta condição, por construir-se <strong>na</strong>s relações de dada sociedade localizada em <strong>um</strong> tempo, poiscada época, setor e situações sociais e culturais específicas postulam diferentes maneiras deser jovem (MARGULIS e URRESTI, 1996). Em nome da diversidade de vivência dacondição <strong>juvenil</strong>, Abramovay (2009), Margulis (2001) e Pais (1993) preferem falar emjuventudes, <strong>do</strong> que Charlot (2007) discorda, haja vista considerar juventude <strong>como</strong> <strong>um</strong>acondição e juventudes <strong>como</strong> formas coletivas de ser jovem.Ten<strong>do</strong> em vista ser o corpo o primeiro lugar no qual a juventude se mostra,Margulis (2001) alerta para o cuida<strong>do</strong> com <strong>um</strong>a confusão com<strong>um</strong> que se cost<strong>um</strong>a fazer entrejuventude e jovialidade ou entre jovem e <strong>juvenil</strong>. Decorre daí a tendência em considerar


23jovens somente os que portem os signos das classes economicamente mais abastadas:esbelteza, atitude atlética e padrões de beleza nos quais pre<strong>do</strong>mi<strong>na</strong> o branco europeu, aaudácia, o romance, o erotismo, a inovação, o que é produtor de exclusões e inclusões, alémde destruir tradições e marcas próprias de cada cultura, tribos e grupos que ancoram asidentidades <strong>do</strong>s sujeitos que se encontram neste momento peculiar da construção desta. Estediscurso é reforça<strong>do</strong> pela cultura pós-moder<strong>na</strong> e pelos interesses de merca<strong>do</strong> com os seuspara<strong>do</strong>xos, conforme destaca Hall (2006), pois, ao tempo em que determi<strong>na</strong> a pluralidadecultural, impõe padrões rígi<strong>do</strong>s em nível planetário, conforme veremos no capítulo quarto.O conjunto de possíveis confusões tem ancora<strong>do</strong> representações idealizadas,estereotipadas, preconceituosas e discrimi<strong>na</strong>tórias em torno da juventude e da a<strong>do</strong>lescência.Essa posição vem-se repetin<strong>do</strong> ao longo da história, segun<strong>do</strong> Pámpols (2004), para o qual ajuventude tem si<strong>do</strong> vista <strong>como</strong> <strong>um</strong>:Jano de <strong>do</strong>is rostos: <strong>um</strong>a ameaça de presente obscuro e <strong>um</strong>a promessa de futuroradiante. Os jovens são anjos que nos desl<strong>um</strong>bram e monstros que nos assustam (ou,para dizê-lo no feminino, princesas que nos encantam ou víboras que nos devoram)(p. 257).Também Abramovay e Esteves (2009), ao destacarem a falta de identidade socialque é dada ao jovem, en<strong>do</strong>ssam esta percepção, ao afirmarem que, tanto no passa<strong>do</strong> quantoem nossos dias, prevalece <strong>um</strong>a visão “dualista” e “maniqueísta” (responsável-irresponsável,esperança-me<strong>do</strong>, futuro, irreverente), além da com<strong>um</strong> crimi<strong>na</strong>lização da figura <strong>do</strong> jovem, queé constantemente associada à ameaça social, à crimi<strong>na</strong>lidade. Charlot (2007, p. 205) observaque nossa sociedade “valoriza a juventude, mas não gosta <strong>do</strong> jovem”.Essas representações encontram suporte em divulgações estatísticas que associam,de forma simplista e reducionista, juventude à violência, o que tem marca<strong>do</strong> nossa sociedadepor <strong>um</strong> interesse cíclico com relação à temática da juventude, associa<strong>do</strong> ao estu<strong>do</strong> desituações-limites, conforme demonstra Gonçálves (2005). Essa atitude justifica esforçosdiscipli<strong>na</strong>res que acompanham as discussões sobre juventude e a associação com<strong>um</strong> entrejuventude e as grandes questões de cada tempo, <strong>como</strong> é o caso <strong>do</strong> individualismo, <strong>do</strong>cons<strong>um</strong>ismo e da violência, comuns à sociedade, mas imputa<strong>do</strong>s à juventude de <strong>um</strong>a formaespecial, <strong>como</strong> se ape<strong>na</strong>s eles se comportassem assim ou fossem responsáveis pelasdisfunções de nosso tempo. Também sobre esta questão, Rodriguez (2004) denuncia o quedenomi<strong>na</strong> <strong>como</strong> “populismo punitivo”, que se traduz pela a<strong>do</strong>ção de medidas de duraspunições que, apesar de aclamadas pelo senso com<strong>um</strong>, redundam inócuas no enfrentamento<strong>do</strong> fenômeno da violência.


24Estes estigmas e estereótipos que sustentam os cita<strong>do</strong>s preconceitos e oudiscrimi<strong>na</strong>ções para com o jovem mostram-se mais evidentes quan<strong>do</strong> eles moram em bairrosda periferia, invasões ou favelas; quan<strong>do</strong> sua aparência física e ou maneira de vestir-sereforçam estigmas da periferia e margi<strong>na</strong>lização; quan<strong>do</strong> têm dificuldades em encontraremprego; pela condição social; pela condição racial e pela orientação sexual (CASTRO et. al.,2001). Segun<strong>do</strong> Krauskopf (1998), <strong>um</strong>a das explicações para este fenômeno é oadultocentrismo: <strong>um</strong>a relação assimétrica e de tensão que norteia as interações entre adultos ejovens, própria das sociedades pré-moder<strong>na</strong>s e moder<strong>na</strong>s A autora busca este conceito emArévalo (1996, p. 44-46 apud KRAUSKOPF, 1998, p. 124):El adultocentrismo es la categoría premoder<strong>na</strong> y moder<strong>na</strong> que desig<strong>na</strong> em nuestrassociedades u<strong>na</strong> relación asimétrica y tensio<strong>na</strong>l de poder entre los adultos (+) y losjóvenes (-) [...] Esta visión del mun<strong>do</strong> está montada sobre un universo sim-bólico yun orden de valores propio de la concepción patriarcal.Para a autora, esta lógica ancora-se no aspecto biológico, para subordi<strong>na</strong>r e excluiras mulheres por razões de gênero e os jovens pela idade. Este conceito considera arepresentação <strong>do</strong>s adultos <strong>como</strong> <strong>um</strong> modelo acaba<strong>do</strong>, baseada em <strong>um</strong> universo simbólico e devalores que é característico da sociedade patriarcal e que conde<strong>na</strong> os jovens, <strong>na</strong>s palavras deSinger (2005), a <strong>um</strong>a situação de submissão aos mais velhos. Abromovay (2009),subscreven<strong>do</strong> Bourdieu (1998), considera as atitudes citadas <strong>como</strong> violências simbólicas,pelas quais há o abuso <strong>do</strong> poder no consentimento que se estabelece e impõe-se mediante ouso de símbolos de autoridade.Uma questão que também gostaríamos de apresentar com auxílio da sociologia dajuventude foi-nos provocada por Lapassade (1968), que, n<strong>um</strong>a reflexão sobre a rebeldia<strong>juvenil</strong>, escrita origi<strong>na</strong>lmente em 1963, a trata <strong>como</strong> revolta <strong>juvenil</strong>, <strong>sintoma</strong> de <strong>um</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong>que, mesmo não toman<strong>do</strong> formas espetaculares (<strong>como</strong> em casos de revoltas juvenis citadaspela História), não pode ser reduzida à conta de mera transgressão legal, parasitismo social ouclassificada <strong>como</strong> psicopatologia em desconsideração aos contextos que a produzem, oureforçam, ou intensificam. Para Lapassade (1968), a entrada no mun<strong>do</strong> adulto por parte dasnovas gerações é acompanhada por <strong>um</strong>a crise que respondem à cultura, ao gênero e aosistema econômico nos quais se encontram imersas.A “crise da a<strong>do</strong>lescência” pode ser o suporte de <strong>um</strong>a “crise da juventude” da mesmamaneira que a “crise da puberdade”, no senti<strong>do</strong> fisiológico <strong>do</strong> termo, é o suporte dacrise psicológica que ela degrada.Mas, permanece o fato de que a crise da a<strong>do</strong>lescência pode ser vivida <strong>na</strong> solidão, queela diz respeito, em to<strong>do</strong> o caso, ao indivíduo, enquanto a “crise da juventude” é <strong>um</strong>fenômeno social (p. 120).


25Além disso, manifesta-se em grupos que, voluntária ou involuntariamente,ameaçam a “ordem” pelo seu caráter agressivo para com o status quo que não encontrououtros meios de expressão. Essa revolta <strong>na</strong>sce <strong>do</strong> encontro entre o indivíduo em formação e omun<strong>do</strong> que se mostra frágil <strong>na</strong> continência e <strong>na</strong>s mediações simbólicas.O mesmo autor denuncia o caráter neurótico <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> capitalista, pois apregoa odiscurso de autonomia e responsabilidade ao tempo em que desconfia <strong>do</strong>s sujeitos que levem“muito longe” o espírito crítico e a iniciativa, <strong>um</strong>a vez que, para o discurso hegemônico, ajuventude só é possível pela adesão à sociedade da qual são membros, confundin<strong>do</strong>autonomia com iniciativa nos estatutos instituí<strong>do</strong>s. Discussão semelhante será trabalhadaconforme Vieira (2008).As reflexões de Lapassade (1968) são relevantes tanto ao nosso tempo quanto aosobjetivos deste estu<strong>do</strong>. O autor chama-nos à reflexão <strong>do</strong>s comportamentos aparentemente“minoritários”, ten<strong>do</strong> em vista poderem ensi<strong>na</strong>r mais sobre o indivíduo e a civilização <strong>do</strong> queas pesquisas estatísticas tão comuns em nossos dias.Outro autor que propõe discussão sobre as revoltas juvenis é Matza (1968),enquadran<strong>do</strong> entre estas a rebeldia, a delinquência e a boêmia. A rebeldia é compreendida<strong>como</strong> contestação ao estatuto demonstra<strong>do</strong> pelo mun<strong>do</strong> adulto a partir da infância <strong>do</strong>s que seapresentam jovens, o que pode ser acentua<strong>do</strong> em sociedade que se mostre dinâmica, <strong>como</strong> é anossa. Para Matza (op. cit.), essas “tradições ocultas da juventude (p. 81)” possuemsemelhanças: exercem maior atração à juventude <strong>do</strong> que à população em geral; têmimplicações distintas de anticivilidade; oferecem ameaças à estabilidade da “ordem”; sãoantiburguesas. O delinquente não se indispõe abertamente contra as disposições burguesassobre a propriedade, embora as transgrida; rejeita os sentimentos burgueses de méto<strong>do</strong> eroti<strong>na</strong> (sobretu<strong>do</strong> <strong>escola</strong>r). O boêmio mostra-se indiferente à propriedade; sua ira volta-secontra os elementos puritanos e os metódicos da ética burguesa. O radical é o que mais abertae conscientemente se coloca contra os valores burgueses mediante seus fundamentalismospolíticos, religiosos e ideológicos.De outro mo<strong>do</strong>, as modalidades de revoltas da juventude destacadas por Matza(op. cit.) possuem, também, diferenças: quanto à <strong>escola</strong>rização, a delinquência, por ser maiscom<strong>um</strong> em <strong>um</strong>a idade específica de vulnerabilidade, tem mais baixo grau de <strong>escola</strong>rização,enquanto a boêmia é mais com<strong>um</strong> entre jovens com maior grau de <strong>escola</strong>ridade, o mesmodan<strong>do</strong>-se com relação ao radicalismo. No que concerne ao grau de consciência de suascondutas, o radicalismo parece ser o que tem maior consciência de sua intelectualidade.


26Quanto às ambições, a delinquência parece ser a que menos apresenta planos para a sociedadee a que mais reproduz os valores instituí<strong>do</strong>s quanto às reivindicações <strong>do</strong>s valores morais.Entre as reflexões feitas por Matza (1968), centrar-nos-emos <strong>na</strong> delinquência, porser a que mais se aproxima <strong>do</strong>s objetivos deste estu<strong>do</strong> e <strong>do</strong> momento em que vivemos, nãoobstante ter o autor escrito, origi<strong>na</strong>lmente, em 1961. Referin<strong>do</strong> à delinquência, Matza (op. cit)destaca o culto da proeza e a busca constante de excitação, de “sensações” ou “emoções” pormeio de <strong>um</strong>a vida de aventura, <strong>um</strong> estilo de vida atravessa<strong>do</strong> por atividades que demonstremousadia.“O fato de <strong>um</strong>a atividade implicar desrespeito às leis é muitas vezes a razão de ser<strong>do</strong> seu aspecto atraente” (p. 89), pois fazer proezas é procurar e receber as recompensasmateriais da sociedade, evitan<strong>do</strong>, à moda da classe privilegiada, os cânones da <strong>escola</strong> e <strong>do</strong>trabalho e suas respectivas dedicações ao metodismo, à segurança e à roti<strong>na</strong>. Assim, osdelinquentes, com<strong>um</strong>ente, exteriorizam <strong>um</strong> desdém pelo “progresso” aos moldes da <strong>escola</strong> ou<strong>do</strong> trabalho. No seu lugar, existe <strong>um</strong>a espécie de movimentação errante ou sonhos grandiososde rápi<strong>do</strong> sucesso, apesar de o dinheiro não ser menospreza<strong>do</strong> no código <strong>do</strong> delinquente, nãopara fins a longo prazo, mas para o prazer imediato, o luxo, o supérfluo, a ostentação e ogozo.A delinquência demonstra versatilidade ímpar <strong>na</strong> manipulação emocio<strong>na</strong>l, <strong>um</strong>avirilidade agressiva que a aproxima <strong>do</strong> código <strong>do</strong> guerreiro. Os delinquentes apresentamdificuldade em receber infâmias sobre a sua honra e têm forte senso de territorialidade.Mostram-se machistas, sexistas e homofóbicos. A condição de delinquência é definida pelocódigo legal, mas dispõe sobre duas formas comuns: a vitimização <strong>do</strong> outro e a prática deações proibidas para os jovens, mas permitidas para os adultos, para os quais a sociedade tematitude de relativa aceitação, ainda mais se tratar-se de jovem pertencente a estratos maisabasta<strong>do</strong>s de nossa sociedade (MATZA, 1968).Não obstante a popularização das formas citadas por Matza (op. cit.) de revoltasjuvenis, a única expressão para a qual há <strong>um</strong>a intervenção institucio<strong>na</strong>l é a delinquência. Soba vertente marcadamente retributiva de justiça, que se traduz em programas ineficientes, compouco ou nenh<strong>um</strong> investimento, ainda que, no caso <strong>do</strong> Brasil, a Lei n°8.069/90 (ECA) e an°12.594/12 (SINASE) prescrevam nova concepção e encaminhamentos para este fim. Omesmo autor observa <strong>um</strong>a colagem da delinquência por considerável fração da juventude, oque é trata<strong>do</strong> <strong>como</strong> “cultura a<strong>do</strong>lescente” 4 : estímulo da<strong>do</strong> à diversão e à aventura, desdémpelo esforço escolástico, participação mais ou menos constante em delitos de status toleráveis,persistente interesse <strong>na</strong>s credenciais de masculinidade e feminilidade, o que tem leva<strong>do</strong>


27muitos de nossos jovens à a<strong>do</strong>ção de <strong>um</strong>a insígnia de a<strong>do</strong>lescência <strong>como</strong> <strong>um</strong>a espécie dedelinquência aceitável.Juntan<strong>do</strong> elementos para esta discussão, Mannheim (1961) 5 denuncia a tendência<strong>do</strong>s movimentos educacio<strong>na</strong>is modernos em exaltar demasiadamente as reivindicações <strong>do</strong>sjovens com pouca ou nenh<strong>um</strong>a atenção às reivindicações da sociedade para com eles. Talatitude coloca-nos em similaridade aos estilos parentais excessivamente protetivos que, nointuito de proporcio<strong>na</strong>r o melhor a seus filhos, reduzem as potencialidades de adaptaçãodestes às adversidades próprias da vida. Este contexto mostra <strong>um</strong>a oscilação extremista entrea educação autoritária, cega às necessidades vitais e psicológicas da criança e ou jovem, e olaissez-faire, que perturba o equilíbrio salutar entre o indivíduo e a sociedade 6 .O autor (op. cit.) pensa as novas gerações <strong>como</strong> grandes potencialidades derecursos que dependem também da orientação das gerações precedentes para o bom usodestas, o que não era viabiliza<strong>do</strong> pela educação dada às novas gerações no passa<strong>do</strong> próximo,fortemente marcada pela transferência da tradição, pautada em méto<strong>do</strong>s de ensino centra<strong>do</strong>s<strong>na</strong> lição seguida de cópia, memorização e repetição. Retiran<strong>do</strong> a forte transferência datradição, podemos perceber que, não obstante ter-se passa<strong>do</strong> 71 anos da publicação origi<strong>na</strong>ldeste texto, ainda não avançamos <strong>na</strong> superação desta característica da <strong>escola</strong>.Para Mannheim (op. cit.), muitas sociedades buscam a utilização <strong>do</strong>s recursosrevitalizantes da juventude, desconsideran<strong>do</strong> o caráter pulsio<strong>na</strong>l, entregan<strong>do</strong>-a a <strong>um</strong>a condiçãode aban<strong>do</strong>no em nome de <strong>um</strong> equívoco: a crença de que a juventude é, por ín<strong>do</strong>le,progressista, o que não significa ser conserva<strong>do</strong>ra, esquecen<strong>do</strong>-se da sua condição de sujeitonão suficientemente “enredada” <strong>na</strong> teia e <strong>na</strong> “ordem” social sob a efervescência <strong>do</strong> aspectobiológico.Saída de <strong>um</strong> universo (familiar) no qual as normas ensi<strong>na</strong>das diferem dascolocadas pelo mun<strong>do</strong> adulto, a juventude é compreendida por Mannheim (op. cit.) <strong>como</strong>potencialidade pronta para as oportunidades que lhe forem apresentadas, especialmente as quese assemelharem ao di<strong>na</strong>mismo próprio de sua condição, o que não pode ser confundi<strong>do</strong> comprogressividade predetermi<strong>na</strong>da. O autor chama-nos a atenção para o fato de que os interessesda juventude ainda são tênues e que é próprio desta condição o lugar margi<strong>na</strong>l, estranho,alieníge<strong>na</strong>, coloca<strong>do</strong> em sociedade, portanto de relativa dependência aos valores <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>que os recebe. Daí compar as reservas latentes da juventude com o merca<strong>do</strong>, no senti<strong>do</strong> delembrar que a posse privada de capitais e lucros é permitida n<strong>um</strong>a sociedade de merca<strong>do</strong>,desde que não se coloquem em risco os interesses coletivos.


28A <strong>escola</strong> pública é também objeto da reflexão de Mannhein (1961), que segun<strong>do</strong>ele, favorece a vida em coletividade por parte <strong>do</strong>s jovens. Contu<strong>do</strong>, ao invés de promoverexperiências autorreguláveis da vida espontânea em grupo,[...] parece ansiosa por impor regras de <strong>um</strong>a rigidez artificial ao equilíbrio <strong>na</strong>turalautomático, de molde a inculcar o espírito de hierarquia, submissão e outras virtudesde coesão social que são necessárias, sobretu<strong>do</strong>, para a perpetuação de <strong>um</strong>a minoria<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>nte (p.51-52).Defende, assim, para as <strong>escola</strong>s, <strong>um</strong> papel tanto de transmissor da cultura <strong>como</strong> depromotor da potencialidade <strong>juvenil</strong>, ou seja, que constrói o laço social ao tempo em queincentiva a especificidade.Por todas estas reflexões, percebemos a emergência de <strong>um</strong> avanço em definiçõesmais claras sobre o conceito de juventude e <strong>um</strong> olhar diferencia<strong>do</strong> para o que tem si<strong>do</strong> toma<strong>do</strong><strong>como</strong> rebeldia ou delinquência no senti<strong>do</strong> de que possamos melhor contribuir com odirecio<strong>na</strong>mento <strong>do</strong>s recursos que as novas gerações possuem em abundância. Marty (2006)nomeia esta importância <strong>do</strong> adulto às novas gerações, especialmente da <strong>escola</strong>, <strong>como</strong> apoio<strong>na</strong>rcísico parental.A a<strong>do</strong>lescência e tra<strong>um</strong>atismo 7Tor<strong>na</strong>r-se adulto é <strong>um</strong> trabalho que leva <strong>um</strong>a vida.François Marty, 2009.N<strong>um</strong> momento em que o senso com<strong>um</strong> afirma a a<strong>do</strong>lescência <strong>como</strong> sinônimo deviolência e desvio (HOUSSIER, 2010; TRASSI e MALVASI, 2010), consideramos comMarty (2006) a violência <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente <strong>como</strong> também consequência da violência da e paracom a a<strong>do</strong>lescência.Alguns cuida<strong>do</strong>s fazem-se necessários, ao trabalhar-se com os conceitosdifundi<strong>do</strong>s de a<strong>do</strong>lescência: a prevalência de <strong>um</strong>a concepção universalista que desconsidere asquestões <strong>do</strong> percurso individual localiza<strong>do</strong> em <strong>um</strong> contexto sócio-histórico (BOCK, 2004), oque passa pela ideia de ser este <strong>um</strong> momento com<strong>um</strong> n<strong>um</strong> processo de desenvolvimento parato<strong>do</strong>s os seres h<strong>um</strong>anos exatamente após a infância e antes da idade adulta, haja vista ser <strong>um</strong>processo muito mais lógico que cronológico (RASSIAL, 1997b; GUTTON, 1998); o risco deredução <strong>do</strong>s ciclos <strong>do</strong> desenvolvimento h<strong>um</strong>ano <strong>como</strong> processos <strong>na</strong>turais e estanques <strong>do</strong> quejá estava ali, no infantil, visto apresentar a dimensão de <strong>um</strong>a novidade radical que vai além <strong>do</strong>material herda<strong>do</strong> <strong>do</strong> infantil (RASSIAL 1997b, OUVRY, 2010, MARTY, 2008); a ideia detransição enquanto <strong>um</strong> tempo que se justifica e encontra valor ape<strong>na</strong>s em função de outrostempos (que o precedem ou procedem), mesmo porque a concepção de tempo em psicanálisenão obedece a <strong>um</strong>a linearidade estanque, pois, conforme visto em Lacan e ainda porque,


29transitivos são to<strong>do</strong>s os momentos <strong>do</strong> ciclo da vida h<strong>um</strong>a<strong>na</strong>. Apesar de Rassial (1997b)destacar o caráter transitivo da a<strong>do</strong>lescência, faz isso n<strong>um</strong> senti<strong>do</strong> distinto <strong>do</strong> que é feito porcorrentes desenvolvimentistas demasiadamente biologizantes, mesmo porque este momentocom<strong>um</strong> o qual a maioria <strong>do</strong>s h<strong>um</strong>anos vivenciam e que se inicia com a puberdade tem si<strong>do</strong>antecipa<strong>do</strong>, e o término tem-se alonga<strong>do</strong> conforme destaca Gomes (2010).Toma<strong>do</strong>s estes cuida<strong>do</strong>s, reforçamos que, em nossa compreensão, apesar deevocada e atravessada por <strong>um</strong> aspecto biológico, em muito influenciada pelo contexto culturale com significativas influências <strong>do</strong> quadro social <strong>do</strong>s sujeitos que a vivenciam, a a<strong>do</strong>lescênciaé <strong>um</strong> fenômeno intrapsíquico, em que se operam grandes transformações <strong>na</strong> subjetividade,especialmente <strong>na</strong> construção da identidade <strong>do</strong>s sujeitos que a vivenciam. É <strong>um</strong>a travessia derupturas tra<strong>um</strong>áticas, entre elas, as convocações <strong>do</strong> corpo, cujo enfrentamento e superaçãodemandam intenso trabalho de elaboração psíquica (SAVIETTO, 2010) quan<strong>do</strong> o ego semostra muito frágil para dar conta deste conjunto de modificações. Trata-se de momento derepetição de desamparos origi<strong>na</strong>is com reedição <strong>do</strong> Édipo, desinvestimento objetal, eleição denovos investimentos, necessidade de afirmação ou negação de <strong>um</strong>a identidade, constituição denovos ideais, além da elaboração <strong>do</strong>s lutos decorrentes da perda <strong>do</strong> corpo, <strong>do</strong> status infantil e<strong>do</strong>s pais imaginários da infância, o que lança o indivíduo ao laço social em busca <strong>do</strong> discurso<strong>do</strong> mestre ou da lei, o que equivale a dizer a reconstrução <strong>do</strong>s limites.Tão intenso é este conjunto de modificações que o a<strong>do</strong>lescente é compreendi<strong>do</strong>por Marty (2010) e Car<strong>do</strong>so (2010) <strong>como</strong> <strong>um</strong> estrangeiro em si mesmo, ao ponto em queMarty (2009) aproxima este estranhamento às características da esquizofrenia, por tratar-se de<strong>um</strong> momento-situação limite entre o infantil e o adulto, o corpo e o psiquismo, o outro externoe o outro interno, o eixo <strong>na</strong>rcísico e o alteritário. Daí, há o risco senti<strong>do</strong> pelo a<strong>do</strong>lescente defundir-se ao outro. Nesta mesma linha, Driew (2010) compara este momento à metamorfosede Kafka, despossuí<strong>do</strong> que é o a<strong>do</strong>lescente <strong>do</strong> próprio corpo.Apesar de não ter construí<strong>do</strong> <strong>um</strong>a teoria específica sobre a a<strong>do</strong>lescência, atéporque este conceito não possuía a relevância que ass<strong>um</strong>e em nossos dias, segun<strong>do</strong> Ouvry(2010), Freud pode ser considera<strong>do</strong> <strong>como</strong> o teórico <strong>do</strong> pubertário, pela decisiva, ainda queimplícita teorização sobre a temática, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> o primeiro a chamar a atenção para apuberdade <strong>como</strong> momento de troca objetal e as fragilidades egoicas decorrentes disso, dareedição <strong>do</strong> Édipo (FREUD, 1905; 1909; 1923) e <strong>do</strong> <strong>na</strong>rcisismo primário (FREUD, 1914;1930). Para Rassial (1997a; 1997b), a a<strong>do</strong>lescência é <strong>um</strong> momento singular <strong>na</strong> constituiçãopsíquica <strong>do</strong> sujeito, quan<strong>do</strong> a inscrição psíquica primeira (neurose, psicose ou perversão), quejá houvera si<strong>do</strong> considerada pela dissolução <strong>do</strong> Édipo, é colocada em causa por nova operação


30simbólica, poden<strong>do</strong> ser ratificada ou retificada, encontran<strong>do</strong>-se aí a ancoragem para os esta<strong>do</strong>slimites – especificidade com a qual o autor trabalha. Trata-se, <strong>na</strong>s palavras <strong>do</strong> autor, de <strong>um</strong>a“afecção imaginária <strong>do</strong> Eu, sob efeito <strong>do</strong> violento golpe <strong>do</strong> real — puberdade” (p. 187). Essegolpe convoca-o a <strong>um</strong>a reapropriação egoica <strong>do</strong> novo e compulsório corpo, ten<strong>do</strong> em vista a“perda <strong>do</strong> corpo, <strong>do</strong> status e <strong>do</strong>s pais imaginários da infância” (RASSIAL, 1997a, p. 76).Este conjunto de substanciais modificações vem acompanha<strong>do</strong> de <strong>um</strong>adesidealização <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> adulto, no qual, antes, acreditava-se porta<strong>do</strong>res <strong>do</strong> pleno gozo.Assim, a promessa de voltar a ser UM com o outro pelo gozo sexual, sistematicamentedefendida pelo discurso social, mostra-se <strong>um</strong>a farsa. Os pais passam a ser vistos <strong>como</strong> adultoscomuns, tão faltantes quanto o a<strong>do</strong>lescente, que também projetam o gozo para <strong>um</strong> só depois(RASSIAL, 1997a). As reflexões <strong>do</strong> autor falam-nos de <strong>um</strong>a especificidade própria daa<strong>do</strong>lescência, não poden<strong>do</strong>, pois, ser reduzida a prolongamento linear ou confirmação <strong>do</strong> quejá houvera si<strong>do</strong> apresenta<strong>do</strong>, mas <strong>um</strong>a reedição com possibilidades totalmente origi<strong>na</strong>is, ouseja, é <strong>um</strong>a vivência <strong>do</strong> que já havia si<strong>do</strong> da<strong>do</strong> em outro contexto, em novo corpo, com <strong>um</strong>desamparo que, apesar de rebuscar o arcaico, é potencializa<strong>do</strong> pela violência deste corpo e <strong>do</strong>contexto, o que o autor (1997b) denomi<strong>na</strong> <strong>como</strong> apropriação.Discutin<strong>do</strong> a questão das novas escolhas objetais, Rassial (1999) entende quedecorrem da evocação das operações funda<strong>do</strong>ras, <strong>na</strong>s quais o infantil é rebusca<strong>do</strong> e reedita<strong>do</strong>,geran<strong>do</strong> <strong>um</strong> hiato entre as identificações objetais primitivas e as novas (sociais), que podemser preenchidas por <strong>um</strong>a concordância imaginária, a <strong>um</strong>a relação genitalizada ao outro <strong>do</strong>outro sexo, retoman<strong>do</strong> <strong>do</strong>s cuida<strong>do</strong>res <strong>um</strong> olhar, e a <strong>um</strong>a fala, o que modifica o valor e afunção <strong>do</strong> <strong>sintoma</strong>. Essas explicações ajudam-nos a compreender a com<strong>um</strong> desqualificaçãoimaginária <strong>do</strong> outro que ocorre <strong>na</strong> a<strong>do</strong>lescência, pois os pais, que eram entendi<strong>do</strong>s <strong>como</strong> os<strong>do</strong>nos da lei, são percebi<strong>do</strong>s em sua condição de avatar (ancoragem <strong>do</strong> outro) e, tanto quantoele, faltantes, caben<strong>do</strong>-lhes ape<strong>na</strong>s a condição de perpetua<strong>do</strong>r da lei. Consequentemente, onome-<strong>do</strong>-pai é posto em xeque, e daí advém a necessidade de buscá-lo no social. Logo, afamília, qualquer que seja a sua configuração, é a condição para a presença da metáforapater<strong>na</strong>. Contu<strong>do</strong>, <strong>na</strong> a<strong>do</strong>lescência, pelo exposto, a metáfora pater<strong>na</strong> perde seu valor, o quecoloca o sujeito a<strong>do</strong>lescente n<strong>um</strong>a condição de desespero ante a vacuidade <strong>do</strong> lugar <strong>do</strong> outro,que passa, então, a ser busca<strong>do</strong> no social (RASSIAL, 1997a).Assim, para Rassial (1997b), a a<strong>do</strong>lescência é o momento em que a operaçãonome-<strong>do</strong>-pai deve surgir e sair da sua representação imaginária sustentada <strong>na</strong> família, paraencontrar o discurso <strong>do</strong> mestre 8 , que funda o laço social, permitin<strong>do</strong> a socialização. Todavia,o autor é <strong>do</strong>s que mais denuncia a dificuldade a mais deste processo em nossos dias: a


31vacuidade ou a perversão em que se encontra inscrito quem anuncia esta operação, visto queo declínio da função pater<strong>na</strong> não é só imaginário, poden<strong>do</strong> afetar a própria inscrição simbólica<strong>do</strong> sujeito.Breve teoria sobre o tra<strong>um</strong>aEtimologicamente, a palavra tra<strong>um</strong>a significa ferida, a consequência de <strong>um</strong>choque, a refração sobre o psiquismo <strong>do</strong> sujeito (LAPLANCHE e PONTALIS, 1998), acoincidência de duas histórias (inter<strong>na</strong> – fantasma; exter<strong>na</strong> – evento) com insuficientepotencialidade de regulação por parte <strong>do</strong> interno, que não consegue atuar <strong>como</strong> continente <strong>do</strong>que vem <strong>do</strong> exterior (GUTTON, 1998). O tra<strong>um</strong>atismo é, portanto, a ação <strong>do</strong> exterior sobre opsiquismo, e o tra<strong>um</strong>a, a consequência prejudicial que resulta da síntese possível feita pelosujeito. Nas palavras de Zorning e Levy (2006), é <strong>um</strong> vazio de simbolização que não foipassível de assimilação, integração e representação.A violência <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente é, portanto, atuação, expectoração, regurgito <strong>do</strong> quenão consegue ser conti<strong>do</strong>, digeri<strong>do</strong>, elabora<strong>do</strong>, liga<strong>do</strong> ao mun<strong>do</strong> interno, ultrapassa<strong>do</strong>, que seencontra pela intensidade das sensações impostas. Há, portanto, implicitamente nesta ação, atentativa de encontrar, no palco externo, o que não se consegue no palco interno. Trata-se,portanto, da para<strong>do</strong>xal relação de violação e convocação <strong>do</strong> outro (MARTY, 2006, 2010;CARDOSO, 2010; WINNICOTT, 2005; IMBERT, 1994).Referimo-nos a <strong>um</strong>a atuação, ou recurso à ação 9 , que Marty (2010, p. 61)considera <strong>como</strong> o “segun<strong>do</strong> tempo <strong>do</strong> tra<strong>um</strong>atismo”; a <strong>um</strong> só tempo, defesa contra a angústiae tentativa de elaboração disso; tentativa de colocar para fora objetos destrutivos (MARTY,2006; 2010). O ato é compreendi<strong>do</strong> por Nasio (apud MARTY, 2010) <strong>como</strong> curto-circuito <strong>do</strong>pensamento, oclusão e não simbolização de <strong>um</strong>a parte da realidade que faz retorno ao real.Segun<strong>do</strong> Cahn (1987, apud MARTY, 2010), o ato tenta preencher <strong>um</strong> vazio interior, devácuo, de <strong>na</strong>dificação ou vazio de simbolização; é a atualização de conteú<strong>do</strong>s inconscientes, adescarga ca<strong>na</strong>lizada para o corpo semelhante ao mo<strong>do</strong> primitivo de evacuação da tensão,liga<strong>do</strong> ao aparecimento da angústia tão com<strong>um</strong> nos bebês com sua agitação motora, que tendea diminuir à medida que é inseri<strong>do</strong> no mun<strong>do</strong> da simbolização (WINNICOTT, 2005).A fim de elucidar esta busca pelo outro <strong>como</strong> recurso, ainda que involuntário,para <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>r, suturar ou evacuar a angústia, Marty (2010) faz <strong>um</strong>a a<strong>na</strong>logia de <strong>como</strong> a aranhase utiliza de <strong>um</strong> “aparelho digestivo” externo para a digestão de elementos para os quais nãopossui recursos. Segun<strong>do</strong> o autor, “o ato é o equivalente ao processo de pré-digestão da


33clivam e recusam a parte da realidade que é tra<strong>um</strong>atogênica. Os primeiros buscam transformara realidade inter<strong>na</strong>, enquanto os segun<strong>do</strong>s a exter<strong>na</strong>. Conforme Marty (2010, p. 46-47),Para os psicopatas e a<strong>do</strong>lescentes presos <strong>na</strong>s problemáticas <strong>do</strong> agir e cuja estruturarepousa em bases <strong>na</strong>rcísicas frágeis, a gestão da angústia é feita através <strong>do</strong> recursoao ato. [...] O ato transforma a realidade, adaptan<strong>do</strong>-a às possibilidades inter<strong>na</strong>s <strong>do</strong>sujeito. É <strong>um</strong> agir que se coloca a serviço das exigências pulsio<strong>na</strong>is, para modificar aparte da realidade que não é compatível com essas exigências pulsio<strong>na</strong>is. A descargacontida no ato contribui para ca<strong>na</strong>lizar o afluxo de excitações para a descargamotora.Outra questão que se acrescenta é a discussão i<strong>na</strong>ugurada por Freud (1914 e 1930)<strong>do</strong> investimento libídico que o ego faz em si mesmo: <strong>na</strong>rcisismo, <strong>como</strong> reação à fragilidadedecorrente de to<strong>do</strong> o conjunto de mudanças citadas. Costa (1988) dedicará atenção especial aesta temática, segun<strong>do</strong> a qual o ego procura esquivar-se de mudanças e <strong>do</strong> desconheci<strong>do</strong>,tentan<strong>do</strong>, dessa forma, <strong>um</strong>a manutenção <strong>do</strong> status quo. Compreende, assim, a angústia <strong>como</strong><strong>um</strong>a sensação advinda das ameaças ao ego.Podemos, com isso, concluir que as passagens ao ato decorrem de <strong>um</strong> esta<strong>do</strong> dedesamparo intrapsíquico em razão da ativação de novos e violentos aspectos pulsio<strong>na</strong>is,desencadeada pela genitalização 10própria da puberdade. Contu<strong>do</strong>, <strong>como</strong> assevera Costa(2000), o desamparo é intrínseco à subjetividade h<strong>um</strong>a<strong>na</strong>, ten<strong>do</strong> em vista os limites <strong>do</strong>aparelho psíquico reforça<strong>do</strong>s pelo desaparelhamento com que <strong>na</strong>sce o filhote em nossaespécie, mas, <strong>na</strong> a<strong>do</strong>lescência, este desamparo é revivi<strong>do</strong>. Para<strong>do</strong>xalmente, a violência é,assim, <strong>um</strong>a tentativa de apaziguamento que comete o equívoco de ignorar o outro (MARTY,2010), que, enquanto ser diferencia<strong>do</strong>, é nega<strong>do</strong> por ser “<strong>na</strong>rcisicamente assimila<strong>do</strong> sempossibilidades de consideração da alteridade, a não ser a título de objeto.” (HOUSSIER, 2010,p.96).Discutin<strong>do</strong> a questão da transgressão, tão com<strong>um</strong> <strong>na</strong> a<strong>do</strong>lescência, Houssier(2010) rebusca An<strong>na</strong> Freud, para relembrar que o desinvestimento objetal se faz acompanhar<strong>do</strong> desinvestimento <strong>do</strong>s valores e <strong>do</strong>s interditos associa<strong>do</strong>s às figuras <strong>do</strong>s cuida<strong>do</strong>res, o queen<strong>do</strong>ssa sua tese de que to<strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente possui <strong>um</strong> potencial transgressor. O autorcompreende a transgressão <strong>como</strong> atos que transpõem as regras ou a lei, a efração da leisimbólica que implica, portanto, a falha de sua simbolização, o que permite compreender adelinquência <strong>como</strong> <strong>sintoma</strong>, ou seja, texto não manifesto de fala perdida, da qual tentamosdecifrar a dimensão latente jamais uniforme.Neste mesmo senti<strong>do</strong>, Freud (1913) já houvera aponta<strong>do</strong> que, toda vez que aidentificação com o pai e com suas funções simbólicas ameaçam desaparecer, o ato provoca ore<strong>na</strong>scimento de <strong>um</strong> processo identificatório possível pela retomada masoquista da punição


34pater<strong>na</strong>. O enfrentamento a este pai é preferível ao aban<strong>do</strong>no por parte dele. Para Houssier(2010), não é o aban<strong>do</strong>no da mãe com<strong>um</strong>ente associa<strong>do</strong> aos conflitos da a<strong>do</strong>lescência, mas oaban<strong>do</strong>no <strong>do</strong> pai, <strong>como</strong> no caso de Totem e Tabu e no mito de Édipo.Marty (2009), discutin<strong>do</strong> a questão da latência 11 <strong>como</strong> tempo de preparação para aa<strong>do</strong>lescência, adverte para a carência de estu<strong>do</strong>s sobre este tema e sobre a sublimação – queem nossa cultura é direcio<strong>na</strong>da pelo investimento <strong>na</strong> instrução e <strong>na</strong> educação – à qual, casonão ocorra com sucesso, há severo risco de que o pulsio<strong>na</strong>l se sobreponha. Daí vem aimportância de repensarmos as dificuldades que alg<strong>um</strong>as crianças e pré-a<strong>do</strong>lescentes possuemcom a <strong>escola</strong>, ten<strong>do</strong> em vista a relevância para o processo de sublimação da pulsão e depreparação da a<strong>do</strong>lescência.Acrescentan<strong>do</strong> elementos a esta discussão, Savietto e Car<strong>do</strong>so (2006) esclarecemque as trocas objetais fragilizam o modelo relacio<strong>na</strong>l basea<strong>do</strong> no <strong>na</strong>rcisismo primário, queancora o ego ideal, sen<strong>do</strong> gradualmente desinvesti<strong>do</strong>, abrin<strong>do</strong> espaço para o ideal de ego 12 ,que ancorará a subjetivação com novas referências e investimentos. Este processo de“transação <strong>na</strong>rcísica” situa o sujeito a<strong>do</strong>lescente, de forma vacilante, entre os registros<strong>na</strong>rcísico e edipiano com os quais terá de negociar para fazer a boa gestão desta travessia.Todavia, <strong>como</strong> reedição, este processo depende das bases <strong>na</strong>rcísicas arcaicas, colocan<strong>do</strong> emjogo a tensão entre dependência e autonomia. Alinhavan<strong>do</strong> estas compreensões, Costa (1998)refere-se ao ego ideal <strong>como</strong> a instância que remete ao futuro, ao devir <strong>do</strong> sujeito, portanto, àsua falta.Marty (2006) evocará Gutton, para quem este processo convoca o “apoio<strong>na</strong>rcísico parental”, visto que a renúncia <strong>do</strong>s objetos incestuosos solicita <strong>um</strong> remanejamento<strong>do</strong> referencial identificatório, no qual os objetos primitivos devem ser manti<strong>do</strong>s <strong>como</strong> apoio aidentificações secundárias que auxiliem a construção subjetiva. Deste conjunto de reflexõesemerge a <strong>escola</strong> <strong>como</strong> lugar potencialmente capaz e necessário ao acolhimento e ao suportedas demandas próprias da a<strong>do</strong>lescência. Desafio potencializa<strong>do</strong> pelas vulnerabilidadescontextuais e pelas fragilidades <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res culturais que acentuam as dificuldades <strong>do</strong>a<strong>do</strong>lescer <strong>na</strong> pós-modernidade.Vulnerabilidades e fragilidades das mediações simbólicasEm to<strong>do</strong>s os tempos, onde a juventude é desamparada, a vida perece.Francisco Cândi<strong>do</strong> Xavier/EmmanuelOs da<strong>do</strong>s estatísticos sobre a a<strong>do</strong>lescência e ou a juventude no Brasil falam-nos de<strong>um</strong> quadro de aban<strong>do</strong>no e vulnerabilidade, ainda que o estatuto legal (BRASIL, 1988; 1990)


35reconheça a esta parcela da população "prioridade absoluta" no atendimento pelas políticaspúblicas. Vulnerabilidade é aqui compreendida conforme Abramovay (2002), <strong>como</strong> carência<strong>na</strong> disponibilidade <strong>do</strong>s recursos materiais ou simbólicos aos atores e ou ao acesso àsoportunidades sociais, econômicas, culturais que provêm <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> e dasociedade.À agressividade das transformações pubertárias e seus des<strong>do</strong>bramentosintrapsíquicos associam-se agressões contextuais, amplificadas pelas fragilidades <strong>do</strong>smedia<strong>do</strong>res culturais (BIRMAN, 2007). A fragmentação <strong>do</strong>s enquadres culturais, queofereciam orientação aos sujeitos, com especial ênfase para a família, deixa as novas geraçõesà deriva (OBIOLS, 2002), o que coloca à <strong>escola</strong> <strong>um</strong> lugar especial neste processo, não pararetorno a <strong>um</strong> tempo que não mais apresenta as condições históricas para tal, mas quetampouco pode coadu<strong>na</strong>r com a condição de aban<strong>do</strong>no em que se encontra considerávelparcela de nossa juventude e ou a<strong>do</strong>lescência.O Brasil conta com 190.755.799 habitantes, entre os quais 35,91% sãoa<strong>do</strong>lescentes e ou jovens (IBGE, 2011), que, segun<strong>do</strong> Waiselfisz (2011) vivenciam <strong>um</strong> quadrode profunda vulnerabilidade e desamparo sem mudanças significativas nos últimos anos. Paracada 100 mulheres <strong>na</strong>scidas no Brasil, <strong>na</strong>scem 105 homens. No entanto, quan<strong>do</strong> observamos apopulação total, comprova-se que existem 3.941.819 mulheres a mais <strong>do</strong> que homens, em<strong>um</strong>a relação de 96,0 homens para cada 100 mulheres. A mudança <strong>na</strong> razão de gênero emnossa sociedade deve-se ao fato de nossos jovens morrerem em grande escala, sobretu<strong>do</strong> por“causas exter<strong>na</strong>s”: homicídios, acidentes de transporte e suicídio, sem considerarmos o uso dedrogas, as <strong>do</strong>enças sexualmente transmissíveis, a AIDS e os transtornos alimentares 13 .Os estu<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s estatísticos da população a<strong>do</strong>lescente e ou jovem revelam<strong>um</strong>a realidade que vai de encontro ao discurso midiático, ao associar jovens e ou a<strong>do</strong>lescentesà imagem de causa<strong>do</strong>res de problemas, o que nos remete à epígrafe precedente. Propomos,assim, a avaliação de outra forma de aban<strong>do</strong>no, que pode ser mais perversa, porque menosaparente e sobre a qual muito <strong>do</strong> que citamos encontra ancoragem.Fragilidades das mediações simbólicasÉ interessante perceber que, conforme alertou Palmade (2001), as característicasda pós-modernidade são as mesmas atribuídas à a<strong>do</strong>lescência e as atribuídas por Freud(1921), para referir-se a grupos vulneráveis, o que revela considerável parte <strong>do</strong> que éapresenta<strong>do</strong> pelo discurso midiático <strong>como</strong> características da a<strong>do</strong>lescência e ou da juventude ede <strong>um</strong> momento que influencia e é influencia<strong>do</strong> pelas novas gerações, haja vista a


37cons<strong>um</strong>ismo (COSTA, 2004), pela cultura <strong>do</strong> <strong>na</strong>rcisismo (LASCH, 1983) e pela sociedade <strong>do</strong>espetáculo (DEBORD, 2003). Esse autocentramento recebe, desde Freud, severas críticas dapsicanálise, haja vista o lugar de destaque conferi<strong>do</strong> à alteridade. Todavia, encontraressonância direta <strong>na</strong> reedição <strong>na</strong>rcísica <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente que deveria confirmar, no mun<strong>do</strong>adulto, a sua dispersão, segun<strong>do</strong> Pinheiro (2001), o que não ocorre em razão de os referentesculturais contemporâneos girarem em torno <strong>do</strong> espetáculo, <strong>do</strong> cons<strong>um</strong>o e, segun<strong>do</strong> Kehl(2005), da vacuidade colocada pelo mun<strong>do</strong> adulto.Ba<strong>um</strong>an (1998) lembra-nos que <strong>na</strong>scemos em <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> relativamente pronto,em <strong>um</strong>a rede de discursos anterior a nós e sobre a qual também construímos a nossasubjetividade. Todavia, esta tessitura é dificultada, sobretu<strong>do</strong>, às novas gerações, que assistemà fluidez desses modelos, visto que “nenh<strong>um</strong> de nós pode construir o mun<strong>do</strong> das significaçõese <strong>do</strong>s senti<strong>do</strong>s a partir <strong>do</strong> <strong>na</strong>da...” (p.17).A ordem simbólica ocupa <strong>um</strong> lugar de destaque, para Birman (2007), noaparelhamento <strong>do</strong> sujeito para a tessitura no social. Porém, não é difícil perceber a fragilidadeque esta ordem simbólica apresenta em nosso atual contexto, conforme destaca Ba<strong>um</strong>an(1998), com a demonstração de precariedade, instabilidade, vulnerabilidade, incerteza einsegurança. Costa (1998; 2004) destaca as defesas <strong>na</strong>rcísicas com especial ênfase para ofuncio<strong>na</strong>mento perverso, que são mobilizadas <strong>como</strong> resposta à fluidez das fragilidadesdecorrentes <strong>do</strong> momento atual.Freud (1905, 1923, 1924) define o funcio<strong>na</strong>mento perverso <strong>como</strong> o de <strong>um</strong> sujeitoque evita, a to<strong>do</strong> custo, a experiência da castração, manten<strong>do</strong>-se <strong>na</strong> posição aluci<strong>na</strong>da <strong>do</strong> euideal (<strong>na</strong>rcisismo primário), não passan<strong>do</strong>, assim, para a experiência da intersubjetividade, <strong>do</strong>reconhecimento <strong>do</strong> outro, o que explica os excessos <strong>do</strong> autoinvestimento <strong>na</strong>rcísico, próprio denossos dias. Neste processo, o outro ass<strong>um</strong>e o lugar de fetiche, de <strong>um</strong> corpo para serusufruí<strong>do</strong> e devasta<strong>do</strong> pela apropriação perversa, <strong>na</strong> qual o desejo <strong>do</strong> outro não pode serreconheci<strong>do</strong> e, quiçá, valoriza<strong>do</strong>.O mun<strong>do</strong> pós-moderno predispõe e promove o funcio<strong>na</strong>mento perverso, sen<strong>do</strong>,portanto, <strong>um</strong>a das principais ancoragens da violência em nossos dias (BIRMAN, 2007).Ten<strong>do</strong> em vista as lacu<strong>na</strong>s <strong>do</strong>s adultos, os a<strong>do</strong>lescentes e ou os jovens de nosso tempo nãoprecisam sair de suas casas, para construir a significação <strong>do</strong> outro enquanto objeto desatisfação de seus plenos desejos, visto que os próprios pais ou cuida<strong>do</strong>res se têm coloca<strong>do</strong>nesta condição de tu<strong>do</strong> satisfazer. Parafrasean<strong>do</strong> Lacan (apud FERRETTI, 2004), os adultosque desejam pouco, desejam <strong>mal</strong>, ou não desejam transformam os filhos em objeto de seusdesejos. Além disso, no funcio<strong>na</strong>mento perverso, não há desejo, colan<strong>do</strong>, assim, a lógica


38capitalista <strong>do</strong> imperativo <strong>do</strong> gozo pleno e ininterrupto que passa a ser ac<strong>um</strong>ula<strong>do</strong>. Paraconseguir este intento, o poder homogeneíza as massas, depauperan<strong>do</strong> os emblemassimbólicos por meio da racio<strong>na</strong>lização das práticas sociais e da burocratização dasinstituições, negan<strong>do</strong> aos sujeitos suas especificidades, <strong>do</strong>cilizan<strong>do</strong> os corpos e apassivan<strong>do</strong>as subjetividades (BIRMAN, 2007).No jogo da cultura <strong>na</strong>rcísica, <strong>do</strong> pleno gozo e da usufruição <strong>do</strong> outro, a lei e ajustiça perdem os significa<strong>do</strong>s propostos desde a revolução il<strong>um</strong>inista. Birman (2007),refletin<strong>do</strong> sobre esta questão, retoma a discussão freudia<strong>na</strong> <strong>do</strong> complexo de Édipo, paraapresentar o superego <strong>como</strong> o herdeiro disso e denunciar <strong>um</strong> contexto sócio-histórico queprivilegia as posições <strong>na</strong>rcísicas <strong>do</strong> ego ideal (<strong>na</strong>rcisismo primário) em detrimento <strong>do</strong> ideal deego (modelo ideal que o norteará, oriun<strong>do</strong> da ordem simbólica exter<strong>na</strong>) e <strong>do</strong> superego.A violência a que tanto temos referi<strong>do</strong>, assistimos e que temos presencia<strong>do</strong>,sofri<strong>do</strong> e pratica<strong>do</strong> é compreendida por Birman (2007) <strong>como</strong> resultante de contextos que“conduzem as subjetividades para o polo <strong>na</strong>rcísico de seu psiquismo, colocan<strong>do</strong>, entreparênteses, as relações alteritárias.” (p. 283). Pois, para o autor, as normas e os dispositivospresentes no espaço social possibilitam boa ou má circulação de bens e valores tanto quantointerferem <strong>na</strong> dinâmica das satisfações e no gozo pulsio<strong>na</strong>l. Esse processo mostra-se <strong>na</strong>estetização da existência e <strong>na</strong> violência.O autor denuncia a “ausência de mecanismos institucio<strong>na</strong>is e jurídicos capazes dedar lugar à esperança de que possa existir <strong>um</strong>a organização política legítima, isto é, capaz detransformar as regras <strong>do</strong> gozo predatório instituí<strong>do</strong>” (p. 285). Neste senti<strong>do</strong>, critica opsicologismo e o psica<strong>na</strong>lismo que marcam as explicações da violência ape<strong>na</strong>s pelointrapsíquico, mesmo quan<strong>do</strong> se busca o social:Não se trata, absolutamente, de interpretar os problemas sociais a partir de certascaracterísticas psíquicas <strong>do</strong>s agentes sociais, mas de procurar pensar em <strong>como</strong> aordem simbólica e política <strong>do</strong> social é a condição de possibilidade para a produçãode sujeitos que funcio<strong>na</strong>m segun<strong>do</strong> certas regularidades psíquicas e não conformeoutras, também possíveis (p. 295).O <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>na</strong> atualidade, para Birman (2007), é acentua<strong>do</strong> pela pobreza ou pelaausência de experiências alteritárias legítimas e de instâncias seguras que possam regular aperversidade pulsio<strong>na</strong>l <strong>do</strong>s corpos, o que tem reforça<strong>do</strong> atitudes autocentradas, particularistas,empurran<strong>do</strong> os sujeitos para o gozo solitário, para a estetização da vida e para a violência.A questão <strong>do</strong> <strong>na</strong>rcisismo nestes “tempos sombrios” é também discutida por Costa(1998), que rebusca o conceito freudiano de <strong>na</strong>rcisismo para aplicá-lo ao nosso contexto, oqual desig<strong>na</strong> <strong>como</strong> “cultura <strong>na</strong>rcísica da violência” por três características básicas. A primeiraé <strong>um</strong>a visão cínica <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, pela qual se busca fazer da realidade que temos a instância


39normativa de <strong>um</strong>a realidade ideal, utilizan<strong>do</strong>-se, para este fim, <strong>do</strong>s porta-vozes eruditos damoral <strong>do</strong> desespero. Um <strong>do</strong>s arg<strong>um</strong>entos que usa para justificar sua tese é a abordagemteórica sobre a violência.A segunda é a desmoralização da lei e <strong>do</strong>s ideais sociais decorrentes <strong>do</strong> elogioirresponsável da violência, encaminhan<strong>do</strong>-a para a cultura da delinquência n<strong>um</strong>a alternânciaambivalente entre onipotência e impotência. No lugar da autoridade, surgem as miragensmidiáticas <strong>do</strong>s egos ideais. A terceira é a arrogância onipotente em que a falência <strong>do</strong>s ideaisace<strong>na</strong> para o pânico <strong>na</strong>rcísico, desequilibran<strong>do</strong> a economia egoica e comprometen<strong>do</strong>,seriamente, o bem-<strong>estar</strong> <strong>do</strong> sujeito e de sua sociedade. Situação também discutida por Birman,2007.Na pós-modernidade, o que importa é a exaltação gloriosa <strong>do</strong> eu (LASCH, 1983).Todavia, <strong>como</strong> a autoexaltação não é bem aceita pelo social, é feita por meio de subterfúgios,entre os quais, estão a exaltação da estética e os autocuida<strong>do</strong>s excessivos, transforman<strong>do</strong> ocorpo em <strong>um</strong> espetáculo, cuida<strong>do</strong>s que Birman (2007) nomeia <strong>como</strong> “polimentosintermináveis para alcançar o brilho social” (p.167).Costa (2004) arg<strong>um</strong>enta que, ante a injusta estratificação social – com a suaacentuada concentração de renda, as dificuldades de mobilização social, as limitações deacesso ao modelo econômico hegemônico e as condições de status e prestígio das classes altas(constantemente reforçadas e vendidas pela mídia) – o corpo apresenta-se <strong>como</strong> possibilidadeviável de acesso, inclusive, para os oriun<strong>do</strong>s das classes baixas. Os padrões fortementemarca<strong>do</strong>s pela estética impõem a ideia de “corpo-espetáculo”, “corpo-vitrine” <strong>como</strong> modelode êxito, sujeito ao constante olhar e à avaliação <strong>do</strong> outro. O corpo ass<strong>um</strong>e, assim, <strong>um</strong> lugarprivilegia<strong>do</strong> e exclusivo <strong>na</strong>s atuais buscas objetais erotizadas, chegan<strong>do</strong> a ser confundi<strong>do</strong> coma subjetividade <strong>do</strong> sujeito <strong>como</strong> nunca outrora ocorrera, o que explica a hipervalorização dasensação em detrimento <strong>do</strong> sentimento. Nas palavras de Costa (2004), “o futuro <strong>do</strong> corpo écindi<strong>do</strong> <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e posto em suspenso, à espera da nova palavra de ordem da moda ou <strong>do</strong>smitos cientificistas” (p. 84). Ten<strong>do</strong> em vista as problemáticas <strong>do</strong> corpo para o a<strong>do</strong>lescente jádiscutidas, é possível compreender melhor o porquê de este signo da pós-modernidademarcar, tão profundamente, as novas gerações.No tempo pós-moderno, o sujeito vale pelo que parece ser, por <strong>como</strong> se apresentaem sua materialidade e corporeidade. No mun<strong>do</strong> regi<strong>do</strong> pela imagem, as pessoas passam aviver de maneira performática, teatral, inserin<strong>do</strong>-se no social <strong>como</strong> em <strong>um</strong>a ence<strong>na</strong>ção, <strong>na</strong>eter<strong>na</strong> busca <strong>do</strong>s holofotes e da ribalta, mobilizan<strong>do</strong> imensa energia psíquica no afã deaparecer, ser visto, sair da invisibilidade, ou seja, de viver pela exterioridade e não mais pela


40interioridade proposta pela modernidade (COSTA, 2004). Costa (op. cit.) enfatiza o lugarocupa<strong>do</strong> pelas mídias nesse contexto, ao ponto em que se tor<strong>na</strong> difícil diferenciar o origi<strong>na</strong>l dacópia. É assim que as novas gerações são ensi<strong>na</strong>das, desde tenra idade, à captura <strong>do</strong> outro deforma espetacular e <strong>na</strong>rcísica, inclusive pelos produtos que mobilizam o merca<strong>do</strong> de cons<strong>um</strong>o(DEBORD, 2003). Essas marcas também se mostram muito claras <strong>na</strong> a<strong>do</strong>lescência, ten<strong>do</strong> emvista a utilização da juventude pelo merca<strong>do</strong> de cons<strong>um</strong>o (ISLAS, 2009).No registro <strong>do</strong> sexual, o outro é percebi<strong>do</strong> <strong>como</strong> objeto <strong>do</strong> desejo e não <strong>como</strong>sujeito também desejante, reduzin<strong>do</strong> as relações a processos predatórios nos quais o afetocede ao gozo. Essa forma é utilizada em processos sedutores pelos quais o outro existe ape<strong>na</strong>sse contribuir com a atuação <strong>na</strong>rcísico-primária, em que o outro passa a ser visto <strong>como</strong> objetodescartável <strong>do</strong> qual nos utilizamos enquanto nos possibilite gozo. É <strong>um</strong> produto tal qual osque se encontram <strong>na</strong>s prateleiras <strong>do</strong>s supermerca<strong>do</strong>s, o que suscita profun<strong>do</strong> esvaziamento aque assistimos e que vivenciamos no laço social, <strong>na</strong> intersubjetividade e <strong>na</strong> alteridade(BIRMAN, 2007).A questão das drogas, tão presente em nossos dias, seja a que promove a ilusão daplenitude, seja a que anestesia as angústias, é discutida também por Birman (2007), para oqual é resposta de <strong>um</strong>a estrutura psíquica que não conseguiu transitar da condição de objeto<strong>do</strong> desejo <strong>do</strong> outro para <strong>um</strong> registro pre<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>ntemente de sujeito desejante. A busca nooutro e <strong>na</strong> droga é marca de <strong>um</strong> momento histórico que acentua a perversão <strong>como</strong> economiapsíquica e impõe o desamparo pelo desencantamento <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, seja pela causa <strong>do</strong>s valoresreligiosos, seja pela berlinda <strong>do</strong>s valores il<strong>um</strong>inistas.Costa (2004) aponta que a desvalorização <strong>do</strong> futuro <strong>como</strong> tempo de investimento,vendida pela mensagem midiática, reforça a vigência de <strong>um</strong>a lógica da instantaneidade,tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong> incômoda a espera pelo que falta ao sujeito, que busca não mais ape<strong>na</strong>s os objetos,mas que estes já estejam prontos para o uso. Nas palavras <strong>do</strong> autor:Em poucas palavras, no gozo com as sensações, o tempo de separação ideal é o quese congela e agluti<strong>na</strong> <strong>na</strong> atualidade; o objeto ideal é o objeto dócil, a coisa fácil deser achada e manipulada. Um desses objetos é o objeto-droga. O outro é o corpopróprio, tema deste estu<strong>do</strong>. Sem poder renunciar à criatividade e à corpolatria<strong>na</strong>rcísica, o eu tenta servir-se <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is senhores, usan<strong>do</strong> o próprio corpo <strong>como</strong> objetotransicio<strong>na</strong>l (p. 106).A droga, o corpo e ou o outro se colocam <strong>como</strong> objetos dóceis em <strong>um</strong> tempo noqual o prazer tem de ser fruí<strong>do</strong> no agora, pois, conforme assevera Ba<strong>um</strong>an (1998), há <strong>um</strong>discurso hegemônico que carrega consigo a marca da indetermi<strong>na</strong>ção e da <strong>mal</strong>eabilidade <strong>do</strong>mun<strong>do</strong>. É <strong>como</strong> se tu<strong>do</strong> pudesse ser feito, mas <strong>na</strong>da fosse para sempre, pois osacontecimentos não se anunciam nem se despedem.


41As experiências sensíveis não permitem a fruição baseada <strong>na</strong> lembrança ou <strong>na</strong>imagi<strong>na</strong>ção, tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong> emocio<strong>na</strong>lmente obsoleta a sensação em outro tempo que não o <strong>do</strong>imediato <strong>do</strong> gozo, visto que sua evocação raramente ou pouco proporcio<strong>na</strong> prazer, fazen<strong>do</strong>,assim, que os sujeitos busquem, freneticamente, objetos que lhes permitam a felicidadesensorial de forma rápida e acessível, o outro e ou as drogas, que, apesar de marcarem asociedade, são atribuídas à juventude e ou à a<strong>do</strong>lescência <strong>como</strong> exclusiva destas faixas etárias(COSTA, 2004). Assim sen<strong>do</strong>, há consenso em torno da ideia de que, ante <strong>um</strong> horizonte detantas incertezas, viver o aqui e o agora parece ser o caminho mais sóli<strong>do</strong>, sobretu<strong>do</strong> para osa<strong>do</strong>lescentes e ou os jovens que, mais que os adultos, buscam referências para construir-sesocialmente. Sposito e Galvão (2004), realizan<strong>do</strong> <strong>um</strong>a pesquisa com alunos de Ensino Médio,perceberam que eles veem esse momento de suas vidas <strong>como</strong> a última oportunidade de gozálas.Uma das causas da ampliação da angústia e <strong>do</strong> desamparo apresentadasespecificamente pela modernidade é a perda <strong>do</strong> lugar ocupa<strong>do</strong> pela tradição com as suascartografias ancestrais muito claras e definidas. As mudanças trazidas pela modernidade eacentuadas pela pós-modernidade predispõem ao sujeito <strong>um</strong>a multiplicidade de possibilidadesque acentuam as angústias e as incertezas pelas imprecisões que rebuscam e reforçam odesamparo origi<strong>na</strong>l, “revelan<strong>do</strong>-se o tempo to<strong>do</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong>a ferida exposta e sangrenta.”(BIRMAN, 2007, p.79).Nesse senti<strong>do</strong>, Freud (1926) discutiu o desamparo <strong>como</strong> <strong>um</strong> esta<strong>do</strong> no qual osujeito se encontra imerso n<strong>um</strong> excesso excitatório que lhe ultrapassa as possibilidades deelaboração. Winnicott (2005) dá ênfase ao desaparelhamento <strong>do</strong> ambiente e não ao <strong>do</strong> sujeitopara com o meio. Além disso, ilustra a questão com os efeitos das depressões mater<strong>na</strong>s e seusefeitos no <strong>na</strong>scituro. Essa discussão é evocada por Costa (2000), para quem tais carênciasestancam as ações criativas <strong>do</strong> self, mediante (re)vivência da emoção primitiva.Segun<strong>do</strong> Costa (1998), <strong>na</strong> “cultura <strong>na</strong>rcísica da violência”, as representações <strong>do</strong>ideal <strong>do</strong> ego encontram-se fragilizadas pela insegurança à qual o futuro está vincula<strong>do</strong>, o quedificulta o investimento libídico neste tempo. Em lugar <strong>do</strong> ego ideal, as pessoas perseguem“miragens ego-ideais”, associadas a <strong>um</strong> prazer imediato característico da satisfação <strong>na</strong>rcísica.Desta fragilidade da mediação simbólica decorre a dificuldade <strong>do</strong> deslocamento <strong>do</strong> <strong>na</strong>rcisismoprimário ao secundário, que deveria encontrar sua síntese <strong>na</strong> a<strong>do</strong>lescência. Isso significa <strong>um</strong>deslocamento <strong>do</strong> lugar da onipotência (ego ideal) para o lugar da alteridade (ideal <strong>do</strong> ego).As celebridades representantes da moda ou da ciência, da<strong>do</strong> que ambas trabalhamcom o registro da transitoriedade e <strong>do</strong> obsoleto, vêm em substituição às figuras de autoridade


42que se apresentavam <strong>como</strong> referência para o ideal <strong>do</strong> ego quan<strong>do</strong> <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>vam o contextomoral e afetivo (COSTA, 2004). No rastro desta desvalorização por que passou, o momentoatual confunde tradição e conserva<strong>do</strong>rismo, o que é rechaça<strong>do</strong> por Arendt (2001), para quem aapropriação <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>, <strong>do</strong> lega<strong>do</strong> deixa<strong>do</strong> pelas gerações anteriores, é condição fundamentalpara a constituição <strong>do</strong> sujeito e a manutenção da pólis. Evocan<strong>do</strong> esta discussão, Costa (2004)defende que:Ciência e moda são práticas sociais que se alimentam da mesma fonte, a irrelevância<strong>do</strong> que passou. [...] Encolhida entre as duas, a autoridade parece minguar.Autoridade é sabe<strong>do</strong>ria fundada <strong>na</strong> história. Não se pode ‘ter ou ser autoridade’ noque ainda não aconteceu ou no que aconteceu, mas no que não resistiu à prova <strong>do</strong>tempo. (p. 169).Observa-se, porém, que os sujeitos de nosso tempo não mais cobiçam serautoridades, mas celebridades, pois são as únicas investidas de reverência, estan<strong>do</strong> o restanteconde<strong>na</strong><strong>do</strong> ao anonimato, o que tem gera<strong>do</strong> <strong>um</strong>a desagregação cultural.Consideramos com Justo (2004) que a fluidez <strong>do</strong>s lugares gera relaçõesextremamente distantes ou extremamente próximas, o que dificulta a função “mater<strong>na</strong>” e“pater<strong>na</strong>”. Em <strong>um</strong>a destas posições, percebemos a recusa <strong>do</strong>s vínculos decorrente <strong>do</strong>esvaecimento <strong>do</strong> outro. Na outra, percebemos lugares que se sobrepõem, a<strong>mal</strong>gamam-se a talponto que dificultam a diferenciação. Além disso, há <strong>um</strong> antagonismo exacerba<strong>do</strong> que cria<strong>um</strong>a dependência similar pela negação: “onde cada <strong>um</strong> se define, não por afirmar o que é epretende, mas por se afirmar em oposição ao outro [...].” (p. 97). Esta confusão <strong>do</strong>s papéis <strong>na</strong>família e, consequentemente da autoridade, invade, também, as relações entre professor ealuno, o que será discuti<strong>do</strong> no próximo capítulo.A interdição apresenta o outro especular e o outro simbólico, promoven<strong>do</strong> ainserção <strong>do</strong> sujeito no princípio da realidade com o superego e o ego ideal. As violências aque assistimos, portanto, não decorrem da aplicação da lei, <strong>como</strong> é defendi<strong>do</strong>, mas daausência dela, o que, segun<strong>do</strong> Justo (op. cit.), não deve ser confundi<strong>do</strong> com autoritarismo,mas <strong>como</strong> facilitação para as novas gerações da apresentação <strong>do</strong>s enquadres e <strong>do</strong>s lugaresconstituí<strong>do</strong>s <strong>na</strong>s redes de relação. Tampouco pode ser confundi<strong>do</strong> com excesso de for<strong>mal</strong>ismoou distanciamento, mas o contrário, “significa, exatamente, a promoção de contatos erelacio<strong>na</strong>mentos possibilita<strong>do</strong>s por <strong>um</strong> posicio<strong>na</strong>mento efetivo de cada <strong>um</strong> diante <strong>do</strong> ‘Outro’.”(p.98).Freud (1930) fez uso da expressão “pobreza psicológica <strong>do</strong>s grupos”, paraexpressar fenômeno com<strong>um</strong> às sociedades em que as figuras de autoridade não ass<strong>um</strong>iam suadevida importância, o que é considera<strong>do</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong> perigo. Na obra Psicologia de grupo e aanálise <strong>do</strong> ego, Freud (1921) articula a “pobreza psicológica <strong>do</strong>s grupos” a excesso


43emocio<strong>na</strong>l, impulsividade, violência, inconstância, presença de contradição e de extremismo<strong>na</strong>s ações, caráter rude das emoções, descui<strong>do</strong> <strong>na</strong>s deliberações, pressa nos julgamentos,formas de raciocínio simples e imperfeitas, ausência de autorrespeito e de senso deresponsabilidade, facilidade de influenciar tais grupos.Palmade (2001) faz uso desta discussão, para demonstrar que as característicasevocadas por Freud são as mesmas nor<strong>mal</strong>mente imputadas aos a<strong>do</strong>lescentes. A autoradenomi<strong>na</strong> a sociedade pós-moder<strong>na</strong> com a sua fragilidade identitária <strong>como</strong> “a<strong>do</strong>lescêntrica”,visto que os pais da atualidade, que deveriam apresentar os modelos de socialização frente àentrada de seus filhos <strong>na</strong> a<strong>do</strong>lescência, comportam-se, muitos deles, <strong>como</strong> a<strong>do</strong>lescentes.É neste senti<strong>do</strong> que Kehl (apud Haag, 2007, p. 2) afirma:O a<strong>do</strong>lescente “sem lei”, ou à margem da lei, é efeito de <strong>um</strong>a sociedade em queninguém quer ocupar o lugar <strong>do</strong> adulto, cuja principal função é ser representante dalei diante das novas gerações. Quan<strong>do</strong> os adultos se espelham em ideais teen, osa<strong>do</strong>lescentes ficam sem parâmetros para pensar o futuro. Como e por que ingressarno mun<strong>do</strong> adulto, onde nenh<strong>um</strong> adulto quer viver? O que os espera, então?Na ausência destas ofertas simbólicas, nossos jovens e ou a<strong>do</strong>lescentes buscamesta continência e suporte no crime organiza<strong>do</strong> (PEREIRA, 2008), <strong>na</strong> lei (SUDBRACK,1992; ARAÚJO, 2006), no fundamentalismo religioso (BIRMAN, 2009), no grupo (KEHL,2000).Sobre a importância <strong>do</strong>s grupos para o a<strong>do</strong>lescente, Garcia de Araújo (2001)compreende-os <strong>como</strong> constituí<strong>do</strong>s por <strong>um</strong>a vinculação entre iguais (horizontal) e por <strong>um</strong>avinculação que articula esses iguais a <strong>um</strong> desigual, o qual encar<strong>na</strong> a autoridade (vertical). Éneste senti<strong>do</strong> que Kehl (2000) defende a função frater<strong>na</strong> <strong>como</strong> possibilidade depreenchimento da vacuidade apresentada pela fragilidade <strong>do</strong>s media<strong>do</strong>res simbólicos. Driew(2010) destaca o risco de o a<strong>do</strong>lescente afogar-se no grupo e não mais sair, quan<strong>do</strong> hajadesencantamento com o mun<strong>do</strong>. Contu<strong>do</strong>, <strong>na</strong> pós-modernidade, ten<strong>do</strong> em vista a fragilidadeou a fluidez das referências, temos assisti<strong>do</strong> a <strong>um</strong>a priorização da vinculação horizontal, o queataca o laço social mais fragiliza<strong>do</strong>, pois, <strong>como</strong> afirmou Freud (1930), sem lei, ficamos àmercê da força bruta, afirmação en<strong>do</strong>ssada por Costa (2004, p. 175), para quem “onde não hátotem, não há tabu”.No contexto de passagens efêmeras e fluidas, Almeida e Tracy (2003) discutem osefeitos especialmente para o a<strong>do</strong>lescente, que já convive com tantas perdas decorrentes da suafase. Utilizam-se da noção de “não lugar”, para discutir a marca das relações afetivas <strong>na</strong> pósmodernidade,haja vista que, para Augè (2001), os não lugares são espaços marca<strong>do</strong>s pelapassagem, pelo efêmero e pelo transitório, portanto, da ordem <strong>do</strong> provisório. Logo, asrelações autênticas perdem espaços para contrato entre os passantes anônimos. Com esta


44noção, buscam demonstrar a marca <strong>do</strong> deslocamento <strong>na</strong>s relações que fogem a qualquer formade fixação.Outro elemento interessante a ser evoca<strong>do</strong> é o fenômeno <strong>do</strong>s pais adultosa<strong>do</strong>lescentes,que, a partir da década de 1960, com as transformação profundas <strong>na</strong>sconfigurações familiares, passam a pre<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>r <strong>como</strong> chefes de família, que, em resposta aospadrões excessivamente rígi<strong>do</strong>s em que foram cria<strong>do</strong>s, desenvolveram relações horizontaiscom seus filhos. Nas <strong>escola</strong>s, contu<strong>do</strong>, permanece <strong>um</strong> modelo basea<strong>do</strong> nos adultostradicio<strong>na</strong>is, marca<strong>do</strong>s pelo autoritarismo e pelo distanciamento afetivo (OBIOLS, 2002). Naspalavras de Birman (2006), temos <strong>um</strong> déficit afetivo gera<strong>do</strong> pela saída da mulher para omerca<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho sem que o homem, ou outro sujeito, ass<strong>um</strong>isse a lacu<strong>na</strong> deixada. Sãojustamente estas as crianças e os jovens que chegam às <strong>escola</strong>s, em busca de apoio parentalpara o qual muitos professores se encontram desprepara<strong>do</strong>s.O que temos chama<strong>do</strong> de pós-modernidade é também nova forma de subjetivaçãoconforme discute Birman (2007). A a<strong>do</strong>lescência e ou a juventude é o momento singular <strong>na</strong>construção da identidade, razão pela qual Erikson (1987) 14 dedica a este momentoimportância ímpar em sua teoria, por tratar-se de síntese <strong>do</strong> que passou e preparo <strong>do</strong> que virá.Os efeitos deste tempo “perturba<strong>do</strong> e conturba<strong>do</strong>” para os sujeitos sofre<strong>do</strong>res e os seusdes<strong>do</strong>bramentos <strong>na</strong>s novas formas de subjetivação apresentam implicações mais patentes eperversas para as novas gerações conforme destaca Birman (2007).O objetivo de termos prioriza<strong>do</strong> neste capítulo a dimensão da vulnerabilidade daa<strong>do</strong>lescência e ou juventude foi no senti<strong>do</strong> de fazer frente ao discurso com<strong>um</strong> de muitacobrança e pouca oferta. Contu<strong>do</strong>, é preciso relativizar com Kehl (2005), sintetizan<strong>do</strong> tantosoutros, a responsabilidade social <strong>na</strong> construção <strong>do</strong> que temos, pois o recurso ao ato é <strong>um</strong>a viapossível ao a<strong>do</strong>lescente, mesmo porque o mantém n<strong>um</strong>a condição de passividade ainda quebusque o contrário. Contu<strong>do</strong>, vale ressaltar as forças de resiliência, para as quais Duchert(2006 apud AMPARO, 2010) chama-nos a atenção enquanto possibilidade de dar senti<strong>do</strong> emetamorfosear o tra<strong>um</strong>a e Khan (1977) propõe a chamada <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente à condição ativapara que as passagens ao ato não se façam mais necessárias com os consequentes danospessoas e coletivo, destacan<strong>do</strong> a importância <strong>do</strong> espaço <strong>escola</strong>r <strong>como</strong> possível media<strong>do</strong>r esuporte para os processos aqui discuti<strong>do</strong>s. No capítulo que segue a<strong>na</strong>lisamos o lugar da <strong>escola</strong><strong>na</strong> pós-modernidade junto ao universo a<strong>do</strong>lescente e ou <strong>juvenil</strong>.Por fim, retomamos Aichhorn (1925) que já no início <strong>do</strong> século XX nosdenunciou com o seu trabalho a condição de aban<strong>do</strong>no e desamparo vivenciada pelos nossos


45a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens <strong>como</strong> ancora<strong>do</strong>res da delinquência e, mais que isto, nos comprovouo quanto o apoio <strong>na</strong>rcísico <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> adulto é capaz de reverter os quadros construí<strong>do</strong>s pelanossa sociedade. Apesar de prefacia<strong>do</strong> por Freud, o livro de Aichhorn nos demonstra que oprocesso terapêutico destes a<strong>do</strong>lescentes não se restringe aos enquadres <strong>do</strong> setting apresenta<strong>do</strong>pelo pai da psicanálise e que, mais que especialistas, precisam de adultos que acreditem ecompreendam os a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens. Todavia <strong>como</strong> ser o suporte, quan<strong>do</strong> também nóseduca<strong>do</strong>res (re)editamos desamparos e fragiliza<strong>do</strong>s? Quan<strong>do</strong> as idiossincrasias daorganização/instituição <strong>escola</strong> não oferecem este suporte.


46CAPÍTULO 3VIOLÊNCIA NA ESCOLADo rio que tu<strong>do</strong> arrasta se diz violento.Porém, ninguém diz violentas as margens que o comprimem.Berthold BrechtA organização e instituição <strong>escola</strong>A organização “<strong>escola</strong>” é <strong>um</strong>a instância geograficamente localizada com <strong>um</strong>conjunto de funções interdependentes e sistematizadas, <strong>na</strong> qual as vidas se orde<strong>na</strong>m em seuinterior (ARDOINO, 1998). Enquanto organização, é a materialização ou a encar<strong>na</strong>ção dainstituição (CASTORIADIS, 1982). É burocrática, ten<strong>do</strong> em vista seu caráter relativamenteestático (LAPASSADE, 1977 e LORAU, 1995). É, pois, objeto <strong>do</strong> olhar criterioso deEnriquèz (1997), que a afirma <strong>como</strong>, simultaneamente, <strong>um</strong> sistema cultural, simbólico eimaginário.Enquanto dimensão cultural, a organização é <strong>um</strong>a materialização <strong>do</strong> institucio<strong>na</strong>lque se des<strong>do</strong>bra em normas e regras n<strong>um</strong> modelo de apreensão e pensamento sobre o mun<strong>do</strong>.É <strong>um</strong>a “armadura estrutural” cristalizada, geran<strong>do</strong> expectativas de papéis, condutas e hábitos.Enquanto sistema simbólico, encontramos nela, de forma mais perceptível, a discursividade<strong>na</strong> qual damos senti<strong>do</strong> aos nossos atos e legitimamos nossas intervenções no mun<strong>do</strong>. Ten<strong>do</strong>em vista a força que imprimem no aparelho psíquico, Enriquèz propõe sete instânciasa<strong>na</strong>líticas das organizações: a mítica, a sócio-histórica, a institucio<strong>na</strong>l, a organizacio<strong>na</strong>l, agrupal, a individual e a pulsio<strong>na</strong>l (ENRIQUÈZ. 1997).A <strong>escola</strong> é também <strong>um</strong>a instituição. Ar<strong>do</strong>ino (1998) lembra que, mesmo <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> derelativa autonomia, o estabelecimento <strong>escola</strong>r é o corpo de <strong>um</strong>a alma: a instituição. Nessesenti<strong>do</strong>, a <strong>escola</strong> é a parte imaterial, não vista, de <strong>na</strong>tureza jurídica e simbólica. “Exprime-seatravés de <strong>um</strong> fazer social que postula <strong>um</strong>a dialética <strong>do</strong> instituí<strong>do</strong> e <strong>do</strong> instituinte” (p. 34).Para Castoriadis (1982, p. 159):A instituição é <strong>um</strong>a rede simbólica, socialmente sancio<strong>na</strong>da, onde se combi<strong>na</strong>m emproporções e em relações variáveis <strong>um</strong> componente funcio<strong>na</strong>l e <strong>um</strong> componenteimaginário. A alie<strong>na</strong>ção é a autonomização e a <strong>do</strong>minância <strong>do</strong> momento imaginário<strong>na</strong> instituição que propicia a autonomização e a <strong>do</strong>minância da instituiçãorelativamente à sociedade.Nas palavras de Cór<strong>do</strong>va (2004), a instituição é <strong>um</strong>a matriz, é esta instância que,continuamente, regula o efeito h<strong>um</strong>ano e autoriza, <strong>na</strong> sala de aula, <strong>na</strong> família, no bairro, <strong>na</strong>cidade, a experiência, a experimentação social. É este teci<strong>do</strong> de conjunção das relaçõesh<strong>um</strong>a<strong>na</strong>s, de articulação <strong>do</strong> cotidiano que autoriza ou não a tomada da palavra, a promoção ou


47a negação <strong>do</strong> sujeito, que faz da sala de aula <strong>um</strong> espaço de amparo ou desamparo e com que a<strong>escola</strong> tenha seu lugar n<strong>um</strong>a sociedade.Rodrigues e Souza (1987) compreendem a instituição <strong>como</strong> <strong>um</strong>a espécie deinconsciente político que busca instituir as realidades. Para Enriquèz (1997), a instituição, tal<strong>como</strong> o ego, é conserva<strong>do</strong>ra. É a representação <strong>do</strong> pai. Para<strong>do</strong>xalmente, expressa e mascaraconflitos e violências.A <strong>escola</strong> é também <strong>um</strong> lugar de vida, <strong>um</strong>a comunidade “que reúne <strong>um</strong> conjuntode pessoas e grupos em interações recíprocas” (ARDOINO, 1998, p.34). É <strong>um</strong>a teia derelações que tece histórias pessoais e a história coletiva. Em sua dimensão grupal, a <strong>escola</strong>representa <strong>um</strong> conjunto de dinâmicas interativas que não fazem parte de sua estrutura for<strong>mal</strong>.Barus-Michel, (2004, p. 179) compreende o grupo <strong>como</strong> “a unidade imaginária e simbólica.”Segun<strong>do</strong> Enriquèz (1997, p.103), o grupo é “[...] <strong>um</strong>a associação voluntária de pessoas queexperimentam, em com<strong>um</strong>, a necessidade de trabalharem juntos em conjunto ou de viveremjuntas [...], a fim de realizarem <strong>um</strong> ou diversos projetos”. Para Bleger (1991), os grupostendem a burocratizar-se <strong>como</strong> organização, tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong>-se antiterapêuticos, tal qual <strong>na</strong>organização, não ape<strong>na</strong>s para manter a repetição das normas ao nível da interação, mas,fundamentalmente, para manter a clivagem 15 .Por este conjunto de compreensões, o psicossociólogo Enriquèz (1994) destaca aimportância <strong>do</strong> estu<strong>do</strong> e da intervenção <strong>na</strong> dimensão grupal para a compreensão e aintervenção nos fenômenos coletivos, ao tempo em que critica a escassez destas análises, hajavista a imprescindibilidade destes grupos para o funcio<strong>na</strong>mento da organização. Para o autor,o grupo tem, em sua essência, a noção de comunidade:Uma associação voluntária de pessoas que experimentam em com<strong>um</strong> a necessidadede trabalharem juntos em conjunto ou de viverem juntas de maneira intensa, a fimde realizarem <strong>um</strong> ou diversos projetos que assi<strong>na</strong>lam sua razão de existir (p.103).O grupo é o espaço de organização para a resistência e a luta, visto que é nissoque a solidariedade se expressa (ou não), além de ser o espaço no qual as pessoas se juntam,para resolver seus problemas <strong>na</strong> organização.Enriquèz (op. cit.) defende a dimensão individual, critican<strong>do</strong> a pouca atenção demuitos sociólogos a ela, visto que, apesar de o sujeito <strong>na</strong>scer em <strong>um</strong>a sociedade com suarespectiva cultura e influência em sua constituição psíquica, não podemos negligenciar aautonomia <strong>do</strong> sujeito ante a este processo. Ar<strong>do</strong>ino (1998), além <strong>do</strong>s fatores já cita<strong>do</strong>s,defende que a pré-história <strong>do</strong>s sujeitos que se encontram no estabelecimento <strong>escola</strong>r exerceinfluência 16 <strong>na</strong>s relações que aí se estabelecem. A última dimensão evocada por Enriquèz(1997), mas não menos importante, é a pulsio<strong>na</strong>l, que perpassa todas as outras. Acessível


48ape<strong>na</strong>s pelos seus efeitos e ou representantes psíquicos, a pulsão é compreendida pelo autor<strong>como</strong> “<strong>um</strong> processo dinâmico, consistin<strong>do</strong> n<strong>um</strong> impulso que faz o organismo tender para <strong>um</strong>objetivo [...] e que favorece os elos sociais (p. 123)”.Nas organizações, a dimensão pulsio<strong>na</strong>l dá-se <strong>como</strong> busca de eficiência,di<strong>na</strong>mismo, mudança e criatividade, favorecen<strong>do</strong> a coesão e a harmonia, o que não pode serconfundi<strong>do</strong> com a ausência de conflito. Por sua vez, a pulsão de morte é <strong>um</strong>a compulsão àrepetição e <strong>um</strong>a tendência à redução das tensões ao esta<strong>do</strong> zero. Manifesta-se <strong>como</strong> <strong>um</strong>a forçaque tende à homogeneização <strong>do</strong> trabalho, à recusa da criatividade, à repetição e àburocratização.Além de Enriquèz (op. cit.; 1994 e 2001), Ar<strong>do</strong>ino (1998), Imbert (2001 e 1994),Colombier, Mangel e Perdriault (1989) e Pain (2003; 2009) destacam as pulsõesinconscientes, os processos transferenciais e contratransferenciais que atravessam estasrelações, o anseio pela autoria por parte <strong>do</strong>s atuantes no estabelecimento <strong>escola</strong>r e os conflitosinterpessoais que refletem, com frequência, os de ordem intrapsíquica. Percebemos, emconjunto com esta afiliação teórica, a <strong>escola</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong>a organização complexa, com adimensão material de <strong>um</strong>a alma (instituição) <strong>na</strong> qual convivem pessoas com papéis delinea<strong>do</strong>spara este espaço. Contu<strong>do</strong>, esses indivíduos atuam com as suas subjetividades, que sãoformadas pela dimensão intrapsíquica e interpsíquica, levan<strong>do</strong> em consideração questõesinconscientes de cada <strong>um</strong>a delas e <strong>do</strong>s campos psíquicos próprios das relações que seestabelecem nos grupos que nesta organização se constituem.Cega, surda, mas terrivelmente loquaz, a Instituição ignora as realidades incômodas,tanto quanto as tentativas pedagógicas <strong>do</strong>s professores primários. Ora, taisprofessores estão <strong>na</strong> ponta daquilo que, em 1979, eu denomi<strong>na</strong>ria o “institucio<strong>na</strong>l”(PAIN, 2009, p. 5).Acreditamos, assim, junto aos teóricos da Pedagogia Institucio<strong>na</strong>l, que a almadesta instituição fala pelos seus profissio<strong>na</strong>is sem que disto nos tenhamos da<strong>do</strong> conta e quequalquer trabalho de enfrentamento <strong>do</strong>s desafios da educação, em nossa compreensão,independente da afiliação teórica da qual façamos parte, precisa considerar a escuta <strong>do</strong>ssujeitos que atuam neste espaço. Barus-Michel (2004, p. 179), discutin<strong>do</strong> a questão, afirmaque “o grupo sujeito reapodera-se da instituição, tenta falá-la.” Vale destacar que, conformeesclarecem Imbert (2003) e Rodrigues e Souza (1987), não somos contra as instituições, masa favor de nova relação com elas, o mesmo caben<strong>do</strong> às estruturas, visto não acreditarmosn<strong>um</strong>a relação com <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> amorfo.


49“A <strong>escola</strong> de hoje é também a <strong>escola</strong> de ontem” 17As organizações e as instituições também possuem a sua historicidade, vistoserem construídas no mun<strong>do</strong> ocidental, desde as primeiras grandes civilizações, <strong>na</strong>s quais ossoberanos passaram a terceirizar alguns ensinos para seus filhos. Na Grécia, este espaçoganhará destaque ante o projeto educativo da polis de <strong>um</strong>a Paideia, com o seu modelo deconstrução <strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano enquanto <strong>um</strong>a ideia que se colocava entre o h<strong>um</strong>ano-rebanho e oh<strong>um</strong>ano autônomo. Este ideal de formação <strong>do</strong> espírito helênico conquistará o mun<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong>reedita<strong>do</strong> <strong>na</strong> Roma e <strong>na</strong> Europa medieval, de acor<strong>do</strong> com os interesses <strong>do</strong> cristianismonicênico (CAMBI, 1999).Na Idade Moder<strong>na</strong>, juntamente com a construção <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is, a <strong>escola</strong>ass<strong>um</strong>irá a difusão de <strong>um</strong> projeto educativo no âmbito <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, visto que:A modernidade <strong>na</strong>sce <strong>como</strong> <strong>um</strong>a projeção pedagógica que se dispõe, ambiguamente,<strong>na</strong> dimensão da libertação e <strong>na</strong> dimensão <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio, dan<strong>do</strong> vida a <strong>um</strong> projetocomplexo e dialético, também contraditório, anima<strong>do</strong> por <strong>um</strong> duplo desafio: o deemancipação e o de conformação, que permaneceram no centro da história moder<strong>na</strong>e contemporânea <strong>como</strong> <strong>um</strong>a antinomia constitutiva, talvez não superável, ao mesmotempo estrutural e caracterizante da abertura educativa <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> moderno (CAMBI,1999, p. 203).Graças a Foucault (1987; 2005), percebemos o complexo e minucioso projetoeducativo que é leva<strong>do</strong> a cabo por <strong>um</strong> conjunto de instituições educativas dirigidas peloEsta<strong>do</strong>, entre as quais se encontra a <strong>escola</strong>, que, segun<strong>do</strong> Cambi (1999, p. 202), “formamtodas as jovens gerações e as conformam a modelos de nor<strong>mal</strong>idade e deeficiência/produtividade social, além de <strong>do</strong>cilidade político-ideológica”. Foucault (1987)demonstrará que a prisão será o modelo de <strong>um</strong> controle minucioso e invisível (panopticon),<strong>um</strong>a organização racio<strong>na</strong>l e produtiva <strong>do</strong> corpo dócil, com horários e obrigações, a fim deformar <strong>um</strong> indivíduo nor<strong>mal</strong>iza<strong>do</strong> por meio da vigilância hierárquica, <strong>do</strong> controle interno econtínuo, da sanção nor<strong>mal</strong>iza<strong>do</strong>ra, com o aparato <strong>do</strong> exame ininterrupto. Segun<strong>do</strong> Cambi(1999), <strong>na</strong> Idade Moder<strong>na</strong>, a <strong>escola</strong> <strong>na</strong>sce com caráter discipli<strong>na</strong>r e autoritário, cujo principalobjetivo é a formação <strong>do</strong> súdito.Para a América, vem transporta<strong>do</strong> o catolicismo medieval, que já não encontravamais espaço <strong>na</strong> Europa renovada. Lembra-se que a Espanha é o baluarte da Contrarreformacatólica no século XVI, não permitin<strong>do</strong> a entrada para a Península Ibérica <strong>do</strong>s ventosrenova<strong>do</strong>res que sopravam da Europa (OLIVEIRA, 1987). A Companhia de Jesus, filha d<strong>estar</strong>eação da Igreja instituída, traz para as terras da América o modelo da <strong>escola</strong> ratio studior<strong>um</strong>,que constituirá a matriz desta organização ou instituição em nosso país (FERREIRA, 1966).


50Herdeira que era das <strong>escola</strong>s abaciais, catedrais e palacia<strong>na</strong>s <strong>do</strong> medievalismo, aratio studior<strong>um</strong> substituiu o espírito crítico grego pela memorização e pela repetição <strong>do</strong>sprincípios religiosos, em que o professor ocupava <strong>um</strong>a centralidade no processo de ensino eaprendizagem e era autoridade inquestionável, detentor <strong>do</strong> saber. Ao aluno eram permiti<strong>do</strong>sos castigos físicos, a subserviência e a subordi<strong>na</strong>ção aos mestres. Essa era a <strong>escola</strong> das elitesportuguesas e, depois, brasileiras que aqui havia. Somente com a vinda da família real para oBrasil, em 1808, é que surge a primeira <strong>escola</strong> pública (estatal) <strong>na</strong> colônia (FERREIRA,1966). Obviamente, parafrasean<strong>do</strong> Safiotti (2004), estamos falan<strong>do</strong> de <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> para omacho, heterossexual, branco, rico e cristão.Nem o despotismo esclareci<strong>do</strong> de Pombal foi capaz de destruir este modelo. Asgrandes mudanças ocorridas em nosso país, aos moldes das “modernizações conserva<strong>do</strong>ras”,pouco ou <strong>na</strong>da modificaram o modelo inicial, e é ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong> década de 1930 que as exigências<strong>do</strong> capital inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l estenderam a <strong>escola</strong> a <strong>um</strong>a peque<strong>na</strong> parcela da nossa população(CUNHA, 1974).Em termos gerais, a universalização <strong>do</strong> acesso à <strong>escola</strong> no Brasil é fenômenomuito recente. É ape<strong>na</strong>s em 1971, com a publicação da Lei n°5.692/71, a segunda LDB, empleno regime militar, que será proposta, de forma mais sistemática, segun<strong>do</strong> as exigências <strong>do</strong>Banco Mundial (SILVA, 2002), a extensão da <strong>escola</strong> para as massas, mas sem ainda nenh<strong>um</strong>dispositivo legal que responsabilize Esta<strong>do</strong>, família e sociedade pelo não c<strong>um</strong>primento destalei. A educação pública tor<strong>na</strong>-se obrigatória para o estu<strong>do</strong> de primeiro grau, <strong>do</strong>s sete aosquatorze anos de idade.O movimento de reabertura democrática traz consigo os anseios a <strong>um</strong>a <strong>escola</strong>pública, democrática e de qualidade, proposta negociada segun<strong>do</strong> os interesses <strong>do</strong>s defensoresda <strong>escola</strong> privada, das <strong>escola</strong>s confessio<strong>na</strong>is e das <strong>escola</strong>s públicas, culmi<strong>na</strong>n<strong>do</strong> no texto quefoi possível com a Constituição de 1988 (GRACINDO, 1994). Porém, o grande avanço legalde acesso e permanência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> virá com a Lei n° 8.069/90 – Estatuto da Criança e <strong>do</strong>A<strong>do</strong>lescente, pelo qual se definem dispositivos legais para que o Esta<strong>do</strong>, a família e asociedade garantam o acesso e a permanência das crianças e <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes <strong>na</strong> <strong>escola</strong>,responsabilizan<strong>do</strong> cada <strong>um</strong>a destas instâncias quan<strong>do</strong> contribuírem para o desc<strong>um</strong>primentodeste direito.Por fim, em se falan<strong>do</strong> <strong>do</strong> estatuto legal, a Lei de Diretrizes e Bases da EducaçãoNacio<strong>na</strong>l (Lei n°9.394/96) consolida este conjunto de modificações, garantin<strong>do</strong>, maissignificativamente, a oferta de vagas para setores sociais que não tiveram acesso anterior à<strong>escola</strong>. Utilizan<strong>do</strong>-se da fala de Colombier, Mangel e Perdriault:


51Só quan<strong>do</strong> se leva em conta a realidade em toda a sua dificuldade, com todas as suascontradições, podem-se articular proposições e elaborar projetos. A <strong>escola</strong> sonhadanão existe mais ou não existe ainda. Resta <strong>um</strong>a instituição e pessoas que aí sereúnem, para trabalhar to<strong>do</strong> <strong>um</strong> conjunto de forças que é possível desmassificar,reduzir, para que elas não fiquem mais mobilizadas e, nestas condutas, fracassadas(1989, p. 85).A Pedagogia Institucio<strong>na</strong>lVisto compreendermos a <strong>escola</strong> enquanto instituição e organização, destacamosque interessante caminho é aponta<strong>do</strong> para a crise da educação por parte da corrente francesada Pedagogia Institucio<strong>na</strong>l, que <strong>na</strong>sceu no rastro <strong>do</strong> institucio<strong>na</strong>lismo <strong>como</strong> resposta àeducação <strong>do</strong>s “delinquentes”, da violência e <strong>do</strong> fracasso <strong>escola</strong>r (PAIN, 2009) e teve Fer<strong>na</strong>ndOury <strong>como</strong> grande referência, professor primário que atuava <strong>na</strong> educação <strong>do</strong>s“irrecuperáveis” para o sistema <strong>na</strong>s periferias de Paris, com resulta<strong>do</strong>s surpreendentes,conforme comprovará, entre outros, Aïda Vasquez (OURY e VASQUEZ, 1988). Tal <strong>como</strong>ocorrera com Freud no estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> patológico que tanto luz lançou sobre o dito sadio(LAPASSADE, 1968), a educação <strong>do</strong> dito “anor<strong>mal</strong>” ajuda a (re)pensar a <strong>escola</strong> dita nor<strong>mal</strong>,ten<strong>do</strong> em vista tanto nos dizer dela. Oury (apud PAIN, 2009) denunciará, com sua prática, “o<strong>na</strong>zismo discreto das elites” de <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> (“caser<strong>na</strong>”) que tria (PAIN, 2006).A Pedagogia Institucio<strong>na</strong>l é psicossocial, psicossociológica e psica<strong>na</strong>lítica, quepensa dispositivos para atuar <strong>na</strong> psicossociologia e <strong>na</strong> microssociologia <strong>do</strong>s grupos, pelosquais se busca libertar a palavra e, por meio dela, desnudar, desvelar, revelar e pôr em causa ainstituição que nos habita e por nós fala, a qual é cega e surda à realidade, mas que éterrivelmente falante, que ignora as realidades incômodas, tanto quanto as tentativaspedagógicas <strong>do</strong>s professores em superá-las e que se utiliza <strong>do</strong>s atores pouco autores darealidade <strong>escola</strong>r <strong>como</strong> avatares de sua lógica (PAIN, 2009). Nas palavras <strong>do</strong> próprio Oury:A Instituição está coagulada, bloqueada, porque o para<strong>do</strong>xo está exatamente aí: pôrem causa a Instituição é refazer a Instituição, é restaurar a Instituição, é fazer oInstitucio<strong>na</strong>l. Ou seja, é pr<strong>estar</strong> atenção estritamente a essa dimensão quotidia<strong>na</strong> demediação das relações h<strong>um</strong>a<strong>na</strong>s que é a Instituição, (e que aparece quan<strong>do</strong> nosperguntamos): “em razão de quê? “, “por que estamos aqui ?” “Quem faz o quê ,onde, quan<strong>do</strong>, <strong>como</strong>? (OURY, apud PAIN, 2009, p. 9).De outro mo<strong>do</strong>, temos ciência de que estes espaços autênticos de fala seencontram escassos <strong>na</strong>s <strong>escola</strong>s, o que levou Oury a questio<strong>na</strong>r, <strong>na</strong> década de sessenta, se“<strong>estar</strong>ão os educa<strong>do</strong>res, <strong>como</strong> as crianças, conde<strong>na</strong><strong>do</strong>s ao silêncio?” (OURY, apud PAIN,2009). Todavia, não se pode ser ingênuo <strong>na</strong> condução destas questões, pois, segun<strong>do</strong> Oury(apud PAIN, 2009, p. 4): “O problema não é deixar a palavra (livre) – pois sabe-se que deixar


52a palavra, dar a palavra, é, exatamente, dá-la, deixá-la para a elite, (pois) é sempre a culturaque fala. Trata-se, antes de mais <strong>na</strong>da, de tomá-la.”Nos grupos, coloca-se em causa a função <strong>do</strong>s espaços, <strong>do</strong>s lugares, <strong>do</strong>s tempos eas relações que traçamos com eles. Oury utiliza-se de <strong>um</strong> conjunto de dispositivos por meio<strong>do</strong> qual busca o resgate de quatro L: o Lugar, o Limite, a Língua e a Lei (OURY eVASQUEZ, 1988). A Pedagogia Institucio<strong>na</strong>l é, portanto, profilática e terapêutica, visto que,no grupo, os sujeitos reconstroem-se em suas relações e <strong>na</strong> análise delas.Por este conjunto de características, Pain (2000) caracteriza a PedagogiaInstitucio<strong>na</strong>l <strong>como</strong> <strong>um</strong>a pesquisa-ação institucio<strong>na</strong>lizada <strong>na</strong> contramão da lógica damedicalização da educação 18 , tão em voga em nossos dias no Brasil, para defender <strong>um</strong>a lógicada h<strong>um</strong>anização. Esta pedagogia, a <strong>um</strong> só tempo, psicoterapia, é, exatamente, <strong>do</strong> que temosnecessidade em nossos dias, “[...] no alvorecer <strong>do</strong> século XXI: de <strong>um</strong>a pedagogia a<strong>na</strong>líticaque seja, em si mesma, <strong>um</strong>a psicoterapia da barbárie, que, a cada dia, novamente nos ronda,hoje <strong>como</strong> ontem” (PAIN, 2009, p. 252).O <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>na</strong> e da <strong>escola</strong> decorrente da “expansão degradada”Feita a caminhada conceitual e histórica, assi<strong>na</strong>lamos a primeira compreensão quedamos ao fenômeno da violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>: o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> institucio<strong>na</strong>l. Em nossa compreensão,<strong>como</strong> resposta à angústia decorrente <strong>do</strong> a<strong>na</strong>cronismo da instituição (conserva<strong>do</strong>ra poressência) com <strong>um</strong> tempo (a pós-modernidade) que carrega consigo a marca da mudança e <strong>do</strong><strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>como</strong> constitutivos de sua identidade, lidamos com sujeitos (a<strong>do</strong>lescentes e oujovens <strong>na</strong> condição de alunos) que se encontram em <strong>um</strong> momento <strong>do</strong> ciclo da vida, têm asmesmas marcas da pós-modernidade e que, pelo momento em que constituíram a suadiscursividade, questio<strong>na</strong>m a <strong>escola</strong>.O que os sociólogos da educação e da juventude nos têm ajuda<strong>do</strong> a perceber éque, não obstante o avanço no acesso, a <strong>escola</strong> não se reinventa para receber a nova parcela dasociedade (DAYRELL, 2007), transforman<strong>do</strong> esta onda de expansão, <strong>na</strong> compreensão deSposito (2008), em novo patamar no processo de reprodução das desigualdades sociais <strong>do</strong>país, conforme já houvera denuncia<strong>do</strong> Bourdieu (1998). A Lei obrigou a entrada e apermanência, mas a <strong>escola</strong> ainda não se abriu para seus novos estudantes.Ainda mais preocupante é o fato de os novos estudantes receber o veredito deculpada pelo atual esta<strong>do</strong> da educação no país, o que é critica<strong>do</strong> por Peregrino (2006), paraquem não se pode tratar deste momento de expansão da oferta da educação pública <strong>como</strong>“perda de qualidade”, <strong>um</strong>a vez que a expressão não é cabível à considerável camada de nossa


53população que tem acesso à <strong>escola</strong> pela primeira vez, não haven<strong>do</strong>, portanto, perda, masganho. A autora prefere denomi<strong>na</strong>r <strong>como</strong> <strong>um</strong>a “expansão degradada”, visto que se ampliou oque já não apresentava bons resulta<strong>do</strong>s sem que se fizessem mudanças <strong>na</strong> estrutura ou seinvestissem mais recursos.Ilustran<strong>do</strong> esta “expansão degradada” em números, Corti et. al. (2007), utilizan<strong>do</strong>se<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s oficiais <strong>do</strong> Ministério da Educação, demonstra-se o declínio nos índices <strong>na</strong>década de 1995 a 2005. Também nós nos debruçamos sobre os números da educação no país,para concluir <strong>um</strong>a estag<strong>na</strong>ção nesta queda que vinha ocorren<strong>do</strong>, mas sem grande melhora paraa maioria das modalidades de ensino. Indica<strong>do</strong>res, <strong>como</strong> evasão <strong>escola</strong>r, a<strong>na</strong>lfabetismo,distorção idade-série, são ainda preocupantes no país (MEC, 2011; IBGE, 2009a; IBGE,2010; KLEIN, 2003; Sampaio, 2009; OECD, 2010).Para ilustrar o crescimento vertiginoso das matrículas, o incremento relativo de1995 para 2001 foi de 65,1% para o Ensino Médio e de 88,7% para o Ensino Superior.Todavia, em 2001, cerca de 50% <strong>do</strong>s estudantes entre 15 e 17 anos de idade sofriam alg<strong>um</strong>grau de distorção idade-série. Para os autores, a “tardia ampliação de direitos” faz-se n<strong>um</strong>contexto complexo de <strong>um</strong>a sociedade desigual, injusta e perversa, no que concerne aosalarmantes índices de pobreza e violência (SAMPAIO, 2009).Sposito e Galvão (2004), exami<strong>na</strong>n<strong>do</strong> mais detidamente a crise desta expansão deoferta da <strong>escola</strong> pública, sobretu<strong>do</strong> de Ensino Médio, destacam o crescimento urbano <strong>como</strong> amaior exigência <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> de trabalho e <strong>do</strong>s textos legais cita<strong>do</strong>s, além de fatores internos,<strong>como</strong> é o caso <strong>do</strong>s programas de correção de fluxo. Dayrell (2007, p. 1117) conclui destaescalada histórica que, “se a <strong>escola</strong> se abriu para receber <strong>um</strong> novo público, ela ainda não seredefiniu inter<strong>na</strong>mente, não se reestruturou a ponto de criar pontos de diálogos com ossujeitos e sua realidade.”O <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> da <strong>escola</strong>: novo tempo e velha <strong>escola</strong> - a <strong>escola</strong> e o a<strong>na</strong>cronismo <strong>na</strong>socialização das novas geraçõesNossa educação é feita com <strong>escola</strong>s <strong>do</strong> século XIX, com professores <strong>do</strong> século XX ealunos <strong>do</strong> século XXI.Ricar<strong>do</strong> Padro (2010, p. 12)Todas as instituições <strong>do</strong> antigo modelo de sociedade complementar vêm sofren<strong>do</strong>rápidas e profundas transformações <strong>na</strong>s últimas décadas (EISENSTADT, 2007). Da<strong>do</strong> o seucaráter central <strong>na</strong> construção das subjetividades, a família e a <strong>escola</strong> encontraram-se no olho


54<strong>do</strong> furacão de mudanças e questio<strong>na</strong>mentos. Contu<strong>do</strong>, ao que pese a resistência da família aestas transformações e em decorrência disso, a <strong>escola</strong> ass<strong>um</strong>iu a condição de guardiã damodernidade (RENAULT, 2004). Ambas se encontram no foco das críticas, mas a famíliareinventa-se por força das circunstâncias (WALSH, 2005). Na <strong>escola</strong>, estas adaptações têmsi<strong>do</strong> tímidas (DUBET, 1994).Pela sua condição de resistência, a <strong>escola</strong> colocou-se <strong>na</strong> trincheira de defesacontra <strong>um</strong> conjunto de ataques: a desregulamentação pós-moder<strong>na</strong> e o seu novo papel <strong>na</strong>socialização das novas gerações, a vigência da incerteza com o desencantamento <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> eseus efeitos, as severas críticas <strong>do</strong> <strong>escola</strong>novismo, as críticas da corrente estruturalistafrancesa à <strong>escola</strong> enquanto estrutura discipli<strong>na</strong><strong>do</strong>ra, as críticas <strong>do</strong> institucio<strong>na</strong>lismo àsinstituições e suas formas de atuação sobre os sujeitos, as críticas de Illich por <strong>um</strong>a sociedadesem <strong>escola</strong>s, as críticas de Bourdieu à teoria da reprodução, as críticas decorrentes <strong>do</strong>s tími<strong>do</strong>sresulta<strong>do</strong>s que os alunos alcançam nos sistemas de avaliação da educação inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l(PISA) e <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is (SAEB - no caso <strong>do</strong> Brasil). Dubet, discutin<strong>do</strong> o papel social da <strong>escola</strong>junto às novas gerações, compreende que:O acor<strong>do</strong> latente que ligava a <strong>escola</strong> à sociedade se desestabilizou muito. Asexpectativas implícitas das famílias não são muito mais congruentes com os projetosda <strong>escola</strong>, provocan<strong>do</strong>, assim, <strong>um</strong> sentimento de crise de legitimidade da <strong>escola</strong>.Essa crise está relacio<strong>na</strong>da ao peso <strong>do</strong> fracasso <strong>escola</strong>r <strong>na</strong> experiência <strong>do</strong>s pais, àssuas expectativas desmesuradas, mas, sobretu<strong>do</strong>, à percepção de <strong>um</strong> declínio deutilidade social <strong>do</strong>s diplomas (Dubet, 2003, p. 6).Para o autor (1998), a socialização não pode mais ser percebida <strong>como</strong> aaprendizagem crescente de <strong>um</strong>a complexidade de novos e múltiplos papéis e jogos sociais, oque se mostra claramente, <strong>na</strong> relação que os alunos possuem com o imenso conjunto deorientações. O autor denomi<strong>na</strong> o novo momento <strong>como</strong> desinstitucio<strong>na</strong>lização <strong>do</strong> social, pois oque houvera si<strong>do</strong> de responsabilidade das instituições, passou a ser <strong>do</strong> indivíduo, o que oslança aos “perigos da autenticidade e da autonomia” e não a vê <strong>como</strong> <strong>um</strong>a crise, mas <strong>como</strong>processos reais de socialização e subjetivação, ten<strong>do</strong> o cuida<strong>do</strong> com o excesso deresponsabilizar, exclusivamente, o sujeito pela sua atuação social (1998, p. 6).De outro mo<strong>do</strong>, apesar de o aluno já haver percebi<strong>do</strong> esta nova situação, a <strong>escola</strong>reluta em querer ajustar as novas gerações a estes caducos papéis ou lugares sociais. Ante estea<strong>na</strong>cronismo, a <strong>escola</strong> perde a capacidade de promover a inserção <strong>do</strong>s alunos <strong>na</strong> sociedade,visto que trabalha com o para<strong>do</strong>xo de construir o ser social (ajustamento) e o sujeitoautônomo (DUBET, 1998). Para Vieira (2008), a <strong>escola</strong> ass<strong>um</strong>e, explicitamente, a função


55socializa<strong>do</strong>ra de transformar o indivíduo em sujeito. Contu<strong>do</strong>, faz isso, pressupon<strong>do</strong> aconstrução de <strong>um</strong>a autonomia que se dá pela aderência a <strong>um</strong> processo de assujeitamento.Consequentemente, algo fica opaco e i<strong>na</strong>caba<strong>do</strong> já que não há mais <strong>um</strong>a aderênciaajustada entre a subjetividade e os papéis que lhe são coloca<strong>do</strong>s pelas instituições, visto que aperso<strong>na</strong>lidade hoje tem mais peso que o papel (DUBET, 1994). “O problema central é adistância <strong>do</strong> papel em relação à perso<strong>na</strong>lidade, aos sentimentos e às emoções” (Dubet, 1998,p. 32). Conforme já vimos, o sociólogo localiza, aí, a crise da educação e o entendimento daviolência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.Seguin<strong>do</strong> esta mesma linha de raciocínio e promoven<strong>do</strong> <strong>um</strong>a conexão entre adiscussão já desenvolvida por nós sobre as novas formas de subjetivação ante os novoscontextos apresenta<strong>do</strong>s pela pós-modernidade, as fragilidades das mediações simbólicas, asvulnerabilidades <strong>do</strong> contexto, sobretu<strong>do</strong> o brasileiro, para o jovem e o a<strong>na</strong>cronismo da <strong>escola</strong>,Dayrell (2007) discutirá a atual tensão existente entre a juventude e a <strong>escola</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong> <strong>do</strong>s<strong>sintoma</strong>s mais comuns de <strong>um</strong>a crise da qual a juventude é ape<strong>na</strong>s a “ponta de <strong>um</strong> iceberg”.Para o autor, o a<strong>na</strong>cronismo mostra-se claramente, pelo descompasso existente entre aconcepção de <strong>escola</strong> <strong>do</strong>s professores (moder<strong>na</strong>) e a significação da realidade feita pelosjovens (pós-moder<strong>na</strong>). A <strong>escola</strong> ainda se vale de <strong>um</strong>a discursividade moder<strong>na</strong> <strong>na</strong> qual há claraseparação entre <strong>escola</strong> e sociedade, caben<strong>do</strong> ao jovem, quan<strong>do</strong> ali se encontra, desfazer-se desua realidade (ou, ao menos, simular que o fez), o que tor<strong>na</strong> mais distante a aproximação entreos estatutos de aluno e de jovem.Assim, ainda se trabalha com o papel social e o lugar de aluno <strong>como</strong> a idealização<strong>do</strong> aprendiz <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Para tanto, a instituição continua lidan<strong>do</strong> com a lógica <strong>do</strong>s ritmosmédios que excluem aqueles que não se enquadram aos padrões, conforme denuncia GonzálesArroyo (2007). As diversidades de todas as ordens e as culturas não são percebidas e ouconsideradas (GOMES, 2007) assim <strong>como</strong> as múltiplas culturas que advêm <strong>do</strong>s alunos, entreelas, as culturas juvenis (MOREIRA e CANDAU, 2007). Esta é <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> <strong>na</strong> qual ape<strong>na</strong>s asdiversidades de cognição são consideradas, a subjetividade <strong>do</strong> aluno é posta de la<strong>do</strong>, parasomente se avaliar sua “inteligência” e “esforço” (PATTO, 1999). Sintetizan<strong>do</strong> a discussão,Pain (2000, p. 4) observa: “Essa maneira de fazer <strong>escola</strong> que esquece a relação descamba parao ma<strong>na</strong>gement, põe entre parênteses o sujeito <strong>na</strong> abstração <strong>do</strong> aluno”.Em outro senti<strong>do</strong>, a <strong>escola</strong> de ontem encontra <strong>um</strong> aluno de hoje para o qual aidentidade <strong>do</strong> jovem se manifesta juntamente à sua identidade de aluno, o que desemboca emconflitos, sobretu<strong>do</strong> <strong>na</strong> sala de aula, onde a tensão é mais visível e por ser, também, oambiente onde ocorrem relações de alianças e estranhamentos. O aluno vê-se, então, entre o


56impasse de seguir as demandas exigidas pela instituição e a necessidade de afirmar suasubjetividade <strong>juvenil</strong> por meio de interações, atitudes e valores que orientam a ação <strong>do</strong> seugrupo (DAYRELL, 2007). Na nova discursividade, a autoridade <strong>do</strong> professor não é algoóbvio; o processo de ensino e desenvolvimento vem sen<strong>do</strong> severamente questio<strong>na</strong><strong>do</strong>; ocurrículo continua distante da realidade <strong>do</strong>s alunos, o que é percebi<strong>do</strong> e critica<strong>do</strong> por eles.Além disso, contribuem com este descompasso a ampliação <strong>do</strong>s acessos aos meiosculturais para os quais a <strong>escola</strong> se mantém relativamente fechada e a alteração significativa <strong>na</strong>condição infantil e <strong>juvenil</strong>, o que se dá pelos novos saberes das psicologias, com repercussões<strong>na</strong> lei para as quais a <strong>escola</strong> ainda não conseguiu adequar-se (VIEIRA, 2008). Vista pelaperspectiva <strong>do</strong> educan<strong>do</strong>, a <strong>escola</strong> vivencia <strong>um</strong>a ambiguidade: de <strong>um</strong> la<strong>do</strong>, a crença social 19que é copiada pelos agentes envolvi<strong>do</strong>s <strong>na</strong> educação de que a <strong>escola</strong> é capaz de transformar ocontexto de desigualdades e exploração; de outro, a percepção clara desta impossibilidade porparte <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s (DAYRELL, 2007; SPOSITO e GALVÃO, 2004). Kupfer (2004),discutin<strong>do</strong> esta questão, critica a ingenuidade da <strong>escola</strong> em querer acreditar que o aluno sejasur<strong>do</strong> a esta contradição, quan<strong>do</strong>, de fato, segun<strong>do</strong> Dubet e Martuccelli (1996), os alunospercebem-<strong>na</strong> <strong>como</strong> responsável pelo seu fracasso. Apesar de toda esta crise, a <strong>escola</strong> trabalhacom o discurso pedagógico hegemônico de “pureza”, o que equivale a lidar com a ideia de“ordem”, crian<strong>do</strong>, assim, o sujo, o polui<strong>do</strong>r, o “fora de lugar” (BAUMAN, 1998), o qual éimposto aos que se desviam <strong>do</strong>s modelos de “bons alunos”. Segun<strong>do</strong> Oliveira (2009), deve-seentender isso por atitudes de absoluto assujeitamento à imposição <strong>do</strong> silêncio <strong>como</strong>fundamento pedagógico hegemônico. Julgamos, assim, procedente discutir a lei <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.A <strong>escola</strong> e a leiFrancis Imbert (2001) diferencia a regra <strong>como</strong> lei-código ou lei institucio<strong>na</strong>l da leisimbólica,esta última <strong>como</strong> capaz de permitir aos seres h<strong>um</strong>anos separar-se e reconhecer-se<strong>na</strong> alteridade. Ao contrário da lei-código que iguala, destaca a importância da lei quediferencia, tal qual foi <strong>na</strong> interdição edipia<strong>na</strong>. O desafio da lei, portanto, é a ex-sistência <strong>do</strong>sujeito.Lastrea<strong>do</strong> por <strong>um</strong>a inquietude imaginária, o campo educativo tem busca<strong>do</strong> <strong>um</strong>aconformidade de orde<strong>na</strong>mento, o que se coloca <strong>na</strong> contramão da função da lei: odesligamento. Para Imbert,No campo educativo, muito particularmente, a regra permanece o alfa e o ômega, oorbe no qual a transgressão não poderia fazer senti<strong>do</strong>. Trata-se, aqui, de “discipli<strong>na</strong>r”o “irregular”, esse “incompleto moral” que anuncia o “a<strong>na</strong>rquista”. Convém“regularizá-lo” pela admoestação e pelo isolamento (idem, p. 122).


57Assim sen<strong>do</strong>, a regra, conforme tem si<strong>do</strong> pensada e implementada no contextoeducacio<strong>na</strong>l, não faz a lei, pois a sanção não serve àquele que a sofre, além de não lhe parecerrespeitável visto que lhe é imposta por <strong>um</strong> grupo em declínio de sua potência social, que o fazpela força da imposição ou da astúcia (MEIRIEU, 2002) ou da sedução (PAIN, 2003).A tentativa de restauração da autoridade da regra é levada a cabo pelo recurso <strong>do</strong>mestre 7 , tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong>-se <strong>um</strong> seu atributo, quan<strong>do</strong>, de fato, conforme já vimos em nossa discussãosobre a<strong>do</strong>lescência, a transgressão é <strong>um</strong> apelo ao outro/outro, ao terceiro (simbólico).Encar<strong>na</strong>da no mestre, a lei código, longe de indiferenciar, causa a revolta, a vergonha moral eo desgaste <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s, <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> e da função das regras, o que é também discuti<strong>do</strong> porPain (2003).Assim, apesar de poder restaurar a autoridade da regra, não visafundamentalmente, ao (re)estabelecimento de <strong>um</strong> campo simbólico de reciprocidade. Taiseventos localizam-se “n<strong>um</strong> campo de manipulação, de ‘pôr em forma’ e não no de pôr emprática a lei (ex-sistência <strong>do</strong> sujeito)” e reforça o ódio que buscava enfrentar.A saída para este impasse é a instauração de instituições (PAIN, 2003;COLOMBIER, MANGEL e PERDRIAULT, 1989; IMBERT, 2001), de dispositivos quepropiciam a interdição simbólica entre o mestre e o sujeito aluno, o que elimi<strong>na</strong> o tãoprejudicial face a face, permitin<strong>do</strong> ao último que liberte a palavra e possa elaborar, “semjanelas”, os elementos da interdição.São as técnicas que permitem ao professor não ser mais o centro único da classe, oponto para o qual convergem olhares, palavras e trabalhos. São as técnicas quepermitem aban<strong>do</strong><strong>na</strong>r a 'escolástica', a primazia <strong>do</strong> verbal em proveito de produçõesrealizadas pelas crianças e centradas sobre seus interesses (COLOMBIER,MANGEL e PERDRIAULT, 1989, p. 85).A violência ao outro, <strong>como</strong> passagem ao ato, já discutida por nós, cujo objetivo é<strong>um</strong>a tentativa de ligação da pulsão, encontra, <strong>na</strong> sanção desprovida <strong>do</strong> simbólico, acontinuidade da estranheza e <strong>do</strong> seu desconhecimento, o que reforçará o desligamento,promoven<strong>do</strong> a repetição.Imbert (2001) propõe a reparação-criação em lugar da reparação-patologizante, ouseja, que substitui o cenário <strong>do</strong> delito por <strong>um</strong> que simbolize a pulsão, traduzin<strong>do</strong>-a empalavras, nomean<strong>do</strong>-a, (re)significan<strong>do</strong>-a, (re)inscreven<strong>do</strong>-a n<strong>um</strong>a rede simbólica. Oeduca<strong>do</strong>r, mesmo sen<strong>do</strong> <strong>um</strong> representante da lei social, garanti<strong>do</strong>r de outra lei, não precisafigurá-la, poden<strong>do</strong> conservar sua face de sujeito:Nem guardião, nem repara<strong>do</strong>r; seu objetivo não consiste em <strong>um</strong>a instalação deconformidade ou em <strong>um</strong>a “regularização” <strong>na</strong> medida em que essas funções visam,exageradamente, ao recalque <strong>do</strong> sujeito (IMBERT, 2001, p.139).


58A função <strong>do</strong> educa<strong>do</strong>r é, portanto, a de fazer desaparecer toda a distância entre aregra e a lei. Apesar de opor-se à moralização, não o faz no senti<strong>do</strong> de abolir a lei, o queocasio<strong>na</strong>ria o apagamento das diferenças pela identificação imaginária com o outro.Quan<strong>do</strong> isto acontece,A afirmação da liberdade e da singularidade <strong>do</strong> sujeito constitui a única referência –de alg<strong>um</strong> mo<strong>do</strong>, a única lei – que possa subentender o projeto de <strong>um</strong>a práxiseducativa; ou seja, conduzir o pedagogo e o educa<strong>do</strong>r a reconhecer sua “vontadecega” (D. Vasse) de “fabricar” e enfileirar, de possuir e manipular, além de seinterdizer de se deixar arrastar pelo arrebatamento da pulsão (IMBERT, 2001p.142).[...] não há mais a ordem ou a desordem, dependen<strong>do</strong> <strong>do</strong> 'pulso' <strong>do</strong> professor e damaior ou menor <strong>do</strong>cilidade <strong>do</strong>s alunos, mas <strong>um</strong>a discipli<strong>na</strong> livremente consentida,porque <strong>na</strong>scida da organização <strong>do</strong> trabalho [...]. A partir de então, a classe não émais <strong>um</strong> lugar que se tem de colocar em ordem, mas lugar de vida onde aorganização das atividades e a elaboração das regras permitem a cooperação(COLOMBIER, MANGEL e PERDRIAULT, 1989, p. 88-89).Por este conjunto de reflexões, é também Imbert (1994) que nos ajudará a ver que,ao contrário <strong>do</strong> que se sustenta largamente, a violação <strong>do</strong> espaço <strong>do</strong> outro não é oriunda <strong>do</strong>desrespeito ao outro, mas da ignorância <strong>do</strong> outro, ten<strong>do</strong> em vista a fragilidade das interdiçõesedipia<strong>na</strong>s n<strong>um</strong> tempo em que, segun<strong>do</strong> Castoriadis (1982), a relativa desregulamentação dasociedade tem provoca<strong>do</strong> a desregulamentação correlativa <strong>na</strong>s novas formas de subjetivação,conforme já discuti<strong>do</strong> em capítulos anteriores, pois os valores propostos são “ocos ou rasos”.Os modelos de sucesso apresenta<strong>do</strong>s pela mídia não podem ser interioriza<strong>do</strong>s, por não sercapazes de responder à questão: o que devo fazer com o meu desejo? Essa questão já foidiscutida com o auxílio de Costa (2004) e Birman (2007).Lacan (2005) já se havia debruça<strong>do</strong> sobre esta deiscência <strong>do</strong> grupo familiar <strong>na</strong>sociedade, pela qual a autoridade que fora exercida pelo pai se mostrava cada vez maisinstável, “caduca”, apresentan<strong>do</strong> consequências para a função de pai, o que fragiliza o laçosocial. Como é a separação primitiva (edípica) que atribui a cada qual o seu lugar,proporcio<strong>na</strong>n<strong>do</strong> o encontro e a troca, <strong>na</strong> fragilidade da interdição da indiferenciação dafunção entre mãe e bebê, prevalecem posições <strong>na</strong>rcísicas, <strong>na</strong>s quais não há <strong>um</strong> <strong>na</strong>scimentosimbólico ou este é frágil. Isso também já foi discuti<strong>do</strong> com o auxílio de Justo (2004).Relembran<strong>do</strong>, <strong>na</strong>rciso é aquele que não compartilha. Diz-se <strong>do</strong> sujeitoindiferencia<strong>do</strong> para o qual o outro, <strong>na</strong>sci<strong>do</strong> <strong>como</strong> ele para o desejo, não existe. Na falta de serlhegaranti<strong>do</strong> este lugar, o sujeito permanece <strong>na</strong> posição de in-fans, da criança onipotente,perdida no gozo sem limite.Em outros termos, temos a concluir com a constatação de que os problemasvivencia<strong>do</strong>s pela <strong>escola</strong> com a lei são mais patentes em nosso tempo, reforça<strong>do</strong>s pelo


59momento específico da a<strong>do</strong>lescência, pelo histórico de fracasso <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s que ocupam olugar de aluno em <strong>um</strong>a <strong>escola</strong>, além da crise das instituições de nosso tempo, em especial afamília e a <strong>escola</strong>. Diante disso, adentramos em outra discussão, indissociável, mas distinta ecomplementar.Autoridade <strong>na</strong> <strong>escola</strong>: (des)autorizaçãoO adulto, assim <strong>como</strong> a criança, também é habita<strong>do</strong> por esta nostalgia <strong>do</strong> prazer dafusão e <strong>do</strong> poder total. Esta nostalgia toma para o professor a forma de duplailusão: a de ser ele investi<strong>do</strong> de to<strong>do</strong>s os poderes, de saber tu<strong>do</strong> em face de <strong>um</strong> sernovo, despossuí<strong>do</strong> e instala<strong>do</strong> n<strong>um</strong>a dependência total(COLOMBIER, MANGEL e PERDRIAULT, p.103)Pain (2003) compreende a autoridade <strong>como</strong> a coincidência entre <strong>um</strong> lugar, <strong>um</strong>papel e <strong>um</strong> status, ten<strong>do</strong> em vista que os jovens pedem provas da competência h<strong>um</strong>a<strong>na</strong> <strong>do</strong>educa<strong>do</strong>r, n<strong>um</strong>a espécie de contrato para a colonização. Dubet (1997) e Estêvão (2008)denomi<strong>na</strong>m-<strong>na</strong> <strong>como</strong> autoridade “consentida”.Ar<strong>do</strong>ino (1971) trata da questão <strong>do</strong> poder e da autoridade em diferentesperspectivas: <strong>na</strong> pessoa (potência), <strong>na</strong>s inter-relações (autoridade), no grupo (coman<strong>do</strong>,direção) e <strong>na</strong> instituição (poder). Para este autor, assim <strong>como</strong> Mendel (RUEFF-ESCOUBÈS,1997), a autoridade remete às experiências primitivas de poder que ocorreram <strong>na</strong> relação entrepais e filho.Apesar de não considerar a sociopsicanálise <strong>como</strong> <strong>um</strong>a aplicação da psicanálise àsociedade, Mendel entende-a <strong>como</strong> <strong>um</strong>a leitura complementar à perso<strong>na</strong>lidade quan<strong>do</strong> buscalocalizar os impactos <strong>do</strong>s fenômenos sociais <strong>na</strong> constituição psíquica e no desenvolvimentoh<strong>um</strong>ano. Para tanto, reforça duas dimensões: a psicofamiliar e a psicossocial. Mendeldiferencia o ato poder, que compreende <strong>como</strong> o ato que modifica a realidade exterior(diferente <strong>do</strong> fantasma). Neste senti<strong>do</strong>, distingue-o entre o poder sobre o ato e o poder <strong>do</strong> ato,sen<strong>do</strong> o primeiro a capacidade de <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>r, controlar o processo de realização <strong>do</strong> ato enquantotal, e o segun<strong>do</strong>, os efeitos <strong>do</strong> ato em si (RUEFF-ESCOUBÈS, 1997). Consoante Mendel, as<strong>escola</strong>s atuam no senti<strong>do</strong> de promover o poder <strong>do</strong>s alunos, visto que eles, <strong>na</strong> forma <strong>como</strong> a<strong>escola</strong> se encontra organizada, encontram-se totalmente desprovi<strong>do</strong>s de seu ato poder comconsequências para as relações <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Os efeitos de seu trabalho falam-nos dadesconstrução <strong>do</strong>s fantasmas que cost<strong>um</strong>am preencher as lacu<strong>na</strong>s das relações entreprofessores e alunos.


60Mendel entende a autoridade <strong>como</strong> a interiorização inconsciente da relação<strong>na</strong>turalmente desigual que mantém com seus pais, <strong>um</strong> modelo que é projeta<strong>do</strong> <strong>na</strong>s relaçõessociais. Portanto, os superiores hierárquicos evocarão, inconscientemente, as imagos parentais<strong>do</strong>s tempos primitivos da criança. Segue-se a esta relação arcaica <strong>um</strong>a clivagem primeira efundamental entre o ato e o poder <strong>do</strong> ato, visto que seu poder é exerci<strong>do</strong> por outro que não opróprio sujeito. Para Mendel, este é o princípio funda<strong>do</strong>r da autoridade (RUEFF-ESCOUBÈS,1997).A boa autoridade para Ar<strong>do</strong>ino (1971) é, portanto, a que autoriza e ajuda o sujeitoa ser autor de si mesmo. O autor defende, assim, que o poder que ocorre <strong>na</strong>s organizações(poder fazer e poder de fazer fazer) leve em consideração a negociação e a participação, aoreconhecer a realidade <strong>do</strong> poder no subordi<strong>na</strong><strong>do</strong>, o que implica reconhecer e aceitar aoposição, as contradições, a contestação, a legitimidade e sua inelutabilidade profundas, adignidade fundamental ligada à alteridade, o desejo de mediar e superar essas oposições ouessas contradições e aceitar a co-realidade e a coexistência.Outro estu<strong>do</strong> exemplar sobre a autoridade <strong>na</strong> <strong>escola</strong> é feito por Housseaye (1996),para quem a autoridade é o problema <strong>do</strong>s problemas de autoridade, pois surge <strong>como</strong> reação eresistência à instauração inicial <strong>do</strong> poder sobre os alunos. A autoridade <strong>do</strong> professor, para oautor, decorria <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio de <strong>um</strong> conteú<strong>do</strong> que, hoje, é apresenta<strong>do</strong> por outras fontes, o que afragilizou.O mestre a tal ponto sustentou a autoridade que foi absorvi<strong>do</strong> por ela. Assim, oque fora <strong>um</strong> auxílio ao méto<strong>do</strong> passou a ser o méto<strong>do</strong> de sustentação exter<strong>na</strong> à relação entre oaluno, o professor e o conhecimento. A obediência passou a ser a lei da <strong>escola</strong>. Da pessoa <strong>do</strong>mestre, a obediência passou a ser a regra. Os quadros de indiscipli<strong>na</strong> são, portanto, problemasque evocam relação, visto que não se pode dissolver o formar no ensi<strong>na</strong>r ou no aprender, poisa autoridade sustenta-se no formar (op. cit.).Housseaye defende duas formas possíveis de lidar com a base <strong>do</strong> triângulo:privilegian<strong>do</strong> o controle e, com ele, o conflito ou privilegian<strong>do</strong> a relação. Quan<strong>do</strong> se privilegiao primeiro, o vértice <strong>do</strong> ensi<strong>na</strong>r engloba os demais. Assim, ocorre a condensação entre o sabere a autoridade pessoal que desemboca <strong>na</strong> proposição artificial <strong>do</strong> contrato pedagógico, pelaqual o professor pensa poder resolver a questão da relação com o outro, unicamente por suarelação com o saber, que é de amor, e pelo encadeamento com o instruir que ele induz.Segun<strong>do</strong> o autor (1996), é aqui que o controle fracassa e afunda-se em problemascotidia<strong>na</strong>mente renova<strong>do</strong>s.


61Colombier, Mangel e Perdriault (1989, p. 85) consideram que, consoante asmediações simbólicas propostas pelos dispositivos da pedagogia institucio<strong>na</strong>l, “a <strong>escola</strong> não émais <strong>um</strong>a corrida de obstáculos em direção a <strong>um</strong>a vida futura, mas lugar de vida e trocas”.Privilegian<strong>do</strong> a relação, o professor reconhece que educar pressupõe que a questão <strong>do</strong> viverjuntosnão pode ser aludida ou evitada. Tal <strong>como</strong> Meirieu (2002), Housseaye (1996)compreende que a relação pedagógica se dá ape<strong>na</strong>s quan<strong>do</strong> a relação com o saber se mostraproblemática.Assim <strong>como</strong> Pain (2003), Housseaye (1996) observa que a ideia de <strong>um</strong>a relaçãomais simétrica <strong>na</strong> relação pedagógica alimenta, junto aos professores, <strong>um</strong> fantasma dedevoração pelo outro especular (o aluno), levan<strong>do</strong>-o a privilegiar a rigidez <strong>do</strong>s conteú<strong>do</strong>s, avalorizar a rigidez <strong>do</strong>s comportamentos, a endurecer a relação com os alunos, a fim de evitartoda negociação, o que significa tentar cristalizar a relação entre mestre e alunos <strong>na</strong>dependência da relação entre o mestre e o saber, hipervalorizan<strong>do</strong> a aquisição <strong>do</strong>s conteú<strong>do</strong>spor meio de regras que se dizem a serviço da relação entre o aluno e o saber. A autoridade é opreço a pagar, para manter à distância os me<strong>do</strong>s relativos aos outros. O fato é que o eixomestre-saber tem-se coloca<strong>do</strong> <strong>como</strong> o meio, o aluno-saber, <strong>como</strong> o fim, e ape<strong>na</strong>s quan<strong>do</strong> osconflitos no ambiente <strong>escola</strong>r denunciam a fragilidade <strong>do</strong> eixo mestre-aluno é que a questão<strong>do</strong> fazer e <strong>do</strong> viver juntos comparece (op. cit.), segun<strong>do</strong> Dubet (1997), Pain (2003), entreoutros, requeren<strong>do</strong> <strong>um</strong> enrijecimento das normas, <strong>na</strong> forma <strong>do</strong> que Rodriguez (2004) tratou<strong>como</strong> populismo punitivo.A autoridade <strong>na</strong> <strong>escola</strong> ancora-se n<strong>um</strong>a clássica fusão entre mestre, saber einstituição, que, colocada em causa, demonstra a sua fragilidade, visto que a autoridadetransborda a relação entre ensino e aprendizagem. No entanto, autoridade é confundida commoralização, com aculturação, que se restringe a dar acesso a <strong>um</strong> saber (razão) e a atitudessuperiores (vontade), excluin<strong>do</strong>-se, assim, a perso<strong>na</strong>lização e a individualização, <strong>como</strong> se osaber desse conta da socialização. Para Housseaye (1996), a violência a que assistimos <strong>na</strong><strong>escola</strong> é <strong>um</strong>a tentativa desesperada de socialização, causa e efeito desta dificuldade. Paratanto, defende a pedagogia <strong>na</strong> qual a autoridade se fundamente no amor, único caminho paraaceitar as frustrações inevitáveis de <strong>um</strong>a relação pedagógica.Segun<strong>do</strong> Imbert (2001), para Housseaye, faz-se necessário inflectir as pulsões edeslocar as metas, ao invés de repressão, com a certeza de que a educação <strong>do</strong> outro nos escapaao controle, caben<strong>do</strong>-nos <strong>um</strong>a aposta, ou, <strong>como</strong> afirmou Freud (1925), é da ordem <strong>do</strong>impossível. Apesar de o modelo clássico de <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> forte <strong>na</strong> constituição da socializaçãodas novas gerações ter ruí<strong>do</strong>, esta instituição resiste e renuncia à adaptação aos novos tempos.


62O grande desafio da <strong>escola</strong>, para Housseaye (1996), está no aprender a conviver, o que exigirádela a superação <strong>do</strong> eixo mestre-saber. Não será demais relembrar Pain (2003), para quem a<strong>escola</strong> <strong>do</strong> século XXI é a <strong>escola</strong> das relações.A democracia <strong>na</strong> <strong>escola</strong>A denúncia da violência seja talvez a nova imagem ass<strong>um</strong>ida pela conspiração <strong>do</strong>silêncio em torno da <strong>escola</strong>-caver<strong>na</strong>.(COLOMBIER, MANGEL e PERDRIAULT, p. 85)Mediante a lei e a autoridade, desembocamos em <strong>um</strong>a discussão indissociável,apontada por estudiosos da temática da violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> <strong>como</strong> o caminho mais eficaz parao enfrentamento deste fenômeno: a democracia <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. De acor<strong>do</strong> com as linhas teóricasdas quais nos utilizamos, há <strong>um</strong> consenso de que a democracia <strong>na</strong> <strong>escola</strong> permanece <strong>um</strong> mito(PAIN, 2006), <strong>um</strong> slogan 20 , especialmente para o aluno, que permanece o administra<strong>do</strong> <strong>do</strong>sistema, sem <strong>um</strong> lugar de palavra reconhecida <strong>na</strong> instituição (RUEFF-ESCOUBÈS, 1997).Para Dubet (1997), a <strong>escola</strong> pode ter-se tor<strong>na</strong><strong>do</strong> mais acessível, mas continuainjusta, visto que a desigualdade de acesso foi substituída pela desigualdade de sucesso. Pain(2009) considera-a, por esta questão, <strong>um</strong>a máqui<strong>na</strong> de triagem para o fascismo discreto daselites (OURY apud op. cit). Refletin<strong>do</strong> sobre esse tema, Colombier, Mangel e Perdriault(1989, p. 25) observam que:“Mas, sem acreditar que a <strong>escola</strong> vá apagar as dificuldades de cada <strong>um</strong> em suasrelações, em sua história pessoal, poderíamos desejar que ela não reproduzisse asmesmas situações de exclusão. Que ela não a<strong>um</strong>entasse o sofrimento de cada <strong>um</strong> eque, em to<strong>do</strong> caso, fosse possível falar sobre isso, o que é absolutamente raro”.Essas discussões, <strong>como</strong> sabemos, encontram, em Bordieu (1998), grande lastroteórico, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> esta <strong>um</strong>a de suas bandeiras de denúncia da <strong>escola</strong> <strong>como</strong> reprodutora dadesigualdade social. Ocorre que a democracia <strong>na</strong> <strong>escola</strong> é reduzida ao c<strong>um</strong>primento de rituaislegais e ou burocráticos: eleição para os gestores, composição e atuação <strong>do</strong> Conselho Escolare produção <strong>do</strong> Projeto Político-Pedagógico. Não somos contra estes importantes instr<strong>um</strong>entos,todavia a <strong>escola</strong> deseja o funcio<strong>na</strong>mento disso quan<strong>do</strong> a palavra, para além da transmissão deconhecimento e discussão de roti<strong>na</strong>s de funcio<strong>na</strong>mento, permanece negada em seu cotidiano.Consequentemente, a instituição continua deliberan<strong>do</strong> sobre a vida <strong>do</strong>s atoresautores sociais no espaço <strong>escola</strong>r, conforme denuncia Castoriadis (1982) e to<strong>do</strong>s os teóricos<strong>do</strong> institucio<strong>na</strong>lismo. Além disso, pretende-se a autonomia enquanto fim por caminhosheterônomos.


63Estêvão (2008) lembra que a <strong>escola</strong> é <strong>um</strong>a “are<strong>na</strong> política”, <strong>na</strong> qual se desenhamcoligações, confrontos, alianças, pactos, imperan<strong>do</strong> micropolíticas ante a escassez de recursos.Assim, Dubet (2004) defende que <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> democrática se mede pelos mecanismos de quelança mão, para garantir a permanência e o sucesso aos menos favoreci<strong>do</strong>s pelas condiçõessocioculturais e econômicas.Ten<strong>do</strong> em vista os equívocos da democracia <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, subscrevemos SantosGuerra (2002), ao qualificá-la <strong>como</strong> <strong>um</strong>a “organização perversa 21 ”. Para tanto, compara-a a<strong>um</strong> hospital que infecta seus pacientes quan<strong>do</strong> deveria curá-los. Lembra que, tanto quantoeduca, pode “deseducar-nos”. O autor aponta <strong>como</strong> caminho de superação deste quadro aformação para a convivência saudável.Especifican<strong>do</strong> as fontes desta perversidade, indica: o imobilismo que a <strong>escola</strong>coloca aos seus atores; a possibilidade de ascensão aos já favoreci<strong>do</strong>s, reforçan<strong>do</strong> asdesigualdades; o autoritarismo e o controle, que diminuem os direitos, sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s alunos;o corporativismo <strong>do</strong>s professores; a falta de transparência e a impunidade; a discrimi<strong>na</strong>ção eos privilégios <strong>do</strong>s “herdeiros”; a impermeabilidade à crítica; a roti<strong>na</strong> de discursos, atitudes epráticas; a discrepância entre os discursos e a ação; a sensualidade <strong>do</strong> poder que obriga a <strong>um</strong>aatitude submissa; a atenção de qualidade dispensada ape<strong>na</strong>s aos alunos mais brilhantes; oprocesso de avaliação <strong>como</strong> classifica<strong>do</strong>r, hierarquiza<strong>do</strong>r e de rotulagem <strong>do</strong>s alunos; a<strong>do</strong>mesticação e a formação bancária; a ocorrência de trabalho inútil e sem esperança. O fato éque, não bastasse o contexto de vulnerabilidade e desamparo real e simbólico no qual seencontram os a<strong>do</strong>lescentes e ou os jovens de nossos dias, a <strong>escola</strong> reservou-lhes <strong>um</strong> lugar deassujeitamento, passividade e dependência: o lugar de aluno, conforme já exposto em Vieira(2008) e Oliveira (2009).Merle (1996) comprova em suas pesquisas e estu<strong>do</strong>s sobre a condição deh<strong>um</strong>ilhação <strong>do</strong> aluno que o lugar ou o papel social construí<strong>do</strong> pela <strong>escola</strong> está longe de sercentral <strong>na</strong> sua dinâmica, visto que os direitos são com<strong>um</strong>ente desconheci<strong>do</strong>s, ignora<strong>do</strong>s ouridiculariza<strong>do</strong>s. O autor retifica a crença perigosa e difundida de que os problemasvivencia<strong>do</strong>s pela <strong>escola</strong> decorram <strong>do</strong> fato de o aluno <strong>estar</strong> no centro, quan<strong>do</strong> não está ou estáinsuficientemente.Pain (2003) compreende a sala de aula <strong>como</strong> o protótipo perfeito para a encubaçãoda violência, pois <strong>um</strong> sujeito que não foi escolhi<strong>do</strong> pelo grupo onde se encontra decidesozinho o que e <strong>como</strong> fazer, e, ante a fragilidade deste modelo em nossos dias, o professorfere, profundamente, seu <strong>na</strong>rcisismo, o que o leva a <strong>um</strong> desejo de desaparecimento oudestruição simbólica <strong>do</strong> aluno que causa problema. O espaço da sala de aula é o da lógica


64escolástica (CAMBI, 1999), bancária (FREIRE, 1987), pautada em ritmos médios deaprendizagem de <strong>um</strong> aluno idealiza<strong>do</strong> em <strong>um</strong>a concepção conteu<strong>do</strong>cêntrica (GONZÁLESARROYO, 2007), cujo sujeito que o sustenta é coloca<strong>do</strong> em parênteses (PAIN, 2000),pauta<strong>do</strong> em concepções rasas <strong>do</strong> desenvolvimentismo (LAJONQUIÈRE, 1992),desconsideran<strong>do</strong>-se o capital cultural <strong>do</strong>s alunos (BORDIEU, 1998), elementos constitutivos<strong>do</strong> fracasso <strong>escola</strong>r (PATO, 1996).Especialmente, gostaríamos de destacar a condição de <strong>um</strong> espaço desilenciamento, sobretu<strong>do</strong> para o aluno, mas não somente, pois também o professor não temsi<strong>do</strong> escuta<strong>do</strong> em suas angústias e inventividades, conforme já aponta<strong>do</strong> por Oury (apudPAIN, 2009). Nesse contexto, segun<strong>do</strong> Pain (2003), ao professor restam <strong>do</strong>is caminhos, asedução ou a imposição, e ao aluno, submeter-se, fugir ou lutar.Ante esse quadro, subscrevemos Robinson (2010) que, em se referin<strong>do</strong> àpsicopatologização e à medicalização da educação, afirma anestesiarmos nossas crianças, paradar conta da <strong>escola</strong> 22 . É nesta linha que Santos Guerra (2002) compreende a violência <strong>na</strong><strong>escola</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong>a recusa da imagem negativa que a instituição constrói sobre e para o aluno.Portanto, é <strong>um</strong>a tentativa de resgatar ou não deixar ser desfeito o que resta de dignidade.Dubet (2006) também compreende os atos disruptivos <strong>como</strong> tentativa de reduzir os efeitos daexclusão. Nesta mesma linha, pensam os teóricos que compreendem a violência <strong>como</strong> <strong>um</strong>atentativa equivocada de empoderamento (BRASIL, 2005), assim <strong>como</strong> a justiça restaurativa,que considera as violências <strong>como</strong> tentativas de restauração de <strong>um</strong> equilíbrio desfeito (ZHER,2008).Em res<strong>um</strong>o, a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> decorre da violência da <strong>escola</strong> (DUBET, 2003).Quan<strong>do</strong> atos indiscipli<strong>na</strong>res e ou violentos se voltam a seus pares, denotam <strong>um</strong>a falta dehomogeneidade <strong>do</strong> grupo-turma, a superlotação das <strong>escola</strong>s, a inexistência de condições deconvívio acolhe<strong>do</strong>ras e atrativas, além de conflitos de espaço e territorialidade, o que étambém compartilha<strong>do</strong> por Carrano (2007) 23 e Giddens (2002).Estêvão (2008), assim <strong>como</strong> Pain (2003 e 2006), lembra que a <strong>escola</strong> não existeno vácuo social. Todavia, “certos colégios que deveriam conviver com a violência não aconhecem, e outros, a priori protegi<strong>do</strong>s, são violentos. Dito de outra forma, a violência <strong>escola</strong>rnão é só produto da violência social” (DUBET, 1997, p. 228). Resta às <strong>escola</strong>s, portanto, <strong>na</strong>compreensão de Estêvão (2008), fechar-se a este contexto ou abrir-se no senti<strong>do</strong> de dialogarcom ele 24 .Não estamos, com este discurso, defenden<strong>do</strong> a ausência <strong>do</strong> lugar <strong>do</strong> professor,pois, conforme descobrem de suas práticas Colombier, Mangel e Perdriault (1989, p. 89),


65O desejo <strong>do</strong> professor é anterior ao <strong>do</strong>s alunos. Não impor <strong>um</strong> funcio<strong>na</strong>mentomagistral único, desenrolan<strong>do</strong>-se sempre da mesma maneira, não quer dizer deixarvago o lugar <strong>do</strong> professor. Se ele não ocupa o seu lugar, os alunos também nãoencontram o deles.Ou dito de outra maneira:Foram eles, os alunos da 5ª 3, que me ensi<strong>na</strong>ram que não há abertura para <strong>um</strong> espaçoda palavra, se antes não houver existi<strong>do</strong> <strong>um</strong> fechamento. E que a classe não pode semanter junta se este lugar, o lugar <strong>do</strong> professor, não estiver ocupa<strong>do</strong>(PERDRIAULT, In op. cit. p. 62).Tal <strong>como</strong> Pain (2003 e 2006), somos favoráveis a “estruturar” o que é entendi<strong>do</strong>pelo autor <strong>como</strong> lugar de demarcação, de balisamento, de explicitação de regras, <strong>do</strong> respeito.Também para Dubet (1997, p. 228), faz-se necessário <strong>um</strong> quadro normativo que garanta,paralelamente, <strong>um</strong> espaço de expressão <strong>do</strong>s alunos, visto que, quan<strong>do</strong> esta ação é sódiscipli<strong>na</strong>r, explode (acrescentamos: ou implode). De outro extremo, “quan<strong>do</strong> não hádiscipli<strong>na</strong>, é a rua que entra no colégio.” As relações <strong>escola</strong>res são “a priori desreguladas” (p.224), e a regulação dá aos alunos <strong>um</strong> sentimento de segurança e de afetividade.O autor ilustra seu pensamento com o relato <strong>do</strong> momento em que imergiu em <strong>um</strong>aexperiência <strong>como</strong> professor, n<strong>um</strong>a <strong>escola</strong> pública de Bordeaux, <strong>na</strong> França. Contrarian<strong>do</strong> suasexpectativas, ele comprovou que os professores não exageravam em seus relatos sobre aindiscipli<strong>na</strong> e ou violência e que somente conseguiu desenvolver alg<strong>um</strong> trabalho quan<strong>do</strong> deu<strong>um</strong> “golpe de esta<strong>do</strong>”:De fato, facilitou a minha vida e tenho a impressão de que esta “crise” deu aosalunos <strong>um</strong> sentimento de segurança, já que eles sabiam que havia regras, eles sabiamque nem tu<strong>do</strong> era permiti<strong>do</strong>. Depois, as relações se tor<strong>na</strong>ram bastante boas com osalunos e bastante afetuosas. É preciso reter desta história extremamente ba<strong>na</strong>l que ofato de ser sociólogo pode permitir explicar o que acontece, mas não de anteciparmelhor que a maioria das pessoas (p.224).Conectan<strong>do</strong> esta discussão com a já feita sobre a autoridade <strong>na</strong> <strong>escola</strong>,reconhecemos que a evocação desta temática por parte <strong>do</strong>s professores, além de ser constante,dá-se emoldurada por <strong>um</strong> sau<strong>do</strong>sismo que apoia <strong>um</strong> discurso de reinstaurá-la aos moldes de<strong>um</strong> passa<strong>do</strong> para o qual não possuímos mais as condições históricas. Re<strong>na</strong>ult (2004)demonstra que esta é <strong>um</strong>a queixa com<strong>um</strong> <strong>na</strong> França, país com forte tradição democrática.Pain (2003), desenvolven<strong>do</strong> discussão semelhante, observa o cuida<strong>do</strong> queprecisamos observar com os ventos <strong>do</strong> autoritarismo que cost<strong>um</strong>am rondar esta reação aolaissez-faire, ten<strong>do</strong> em vista a constante confusão de autoridade com força e poder quealimenta reações de defesa e violência por parte <strong>do</strong>s adultos, o que, segun<strong>do</strong> o autor, é<strong>sintoma</strong> da depressão <strong>do</strong>s últimos. Na compreensão <strong>do</strong> autor,Não é o espasmo autoritário que resolve o problema. Este desenvolve, <strong>como</strong> se sabe,ao fi<strong>na</strong>l das contas, as mesmas perturbações das relações, os mesmos efeitos deviolência e de loucura. A pe<strong>na</strong> de morte nunca foi dissuasiva. O que continua


66indica<strong>do</strong>, o que quer que aconteça é a democracia. Uma democracia dirigida,compartilhada, mas dirigida, desde a infância (PAIN, 20003, p. 120).Ao reconhecer a necessidade da regulação, Dubet (1997) relembra que seja feitacom base <strong>na</strong> democracia, o que é compreendi<strong>do</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong>a regulação mediante os direitos eos deveres, pois o autor tem observa<strong>do</strong> <strong>um</strong>a concepção para<strong>do</strong>xal <strong>na</strong> discussão <strong>do</strong>sprofessores:Porém, hoje em dia, <strong>na</strong> França, aquilo que se chama “retomada <strong>na</strong>s mãos” é adefinição <strong>do</strong> poder, mas não a definição <strong>do</strong> direito. E isto por <strong>um</strong>a razãoextremamente simples, é que esse quadro normativo deveria envolver tanto alunos<strong>como</strong> professores, é isso que me parece importante. Mas, o que os professorespedem, muitas vezes, é <strong>um</strong> quadro discipli<strong>na</strong>r que os proteja, sem obrigá-los acooperar. (DUBET, 1997, p. 227/228).Além disso, o autor denuncia a rigidez <strong>do</strong> sistema <strong>escola</strong>r, o que tem dificulta<strong>do</strong>ou impossibilita<strong>do</strong> a percepção da rica vida a<strong>do</strong>lescente em seu cotidiano e, quan<strong>do</strong> ocorre deperceber isso, o faz <strong>como</strong> <strong>um</strong> desvio. Os méto<strong>do</strong>s utiliza<strong>do</strong>s pela <strong>escola</strong> ainda são brutais paracom a a<strong>do</strong>lescência.As explicações para esta atitude da <strong>escola</strong> passa pela já discutida reedição(simbólica) que a criança e o a<strong>do</strong>lescente promovem no adulto, <strong>na</strong> convivência. Colombier,Mangel e Perdriault (1989) convocam ao cuida<strong>do</strong> com a dupla ilusão: o professor reprimir ocomportamento <strong>do</strong>s alunos, por não suportar a convocação <strong>do</strong>s desejos infantis insatisfeitospor eles provoca<strong>do</strong>s; reprimir neles o que calamos ou recusamos em nós, ou a complacênciade esforçar-se por tu<strong>do</strong> fazer, o que logo se esgotará, ten<strong>do</strong> em vista a impossibilidade depreenchimento desta falta.Convém, portanto, reconhecer em nós a criança que fomos ou gostaríamos de tersi<strong>do</strong> para que o la<strong>do</strong> infantil, que continua a reclamar tu<strong>do</strong> imediatamente, não nos leve aoassassi<strong>na</strong>to simbólico <strong>do</strong> aluno e ou de seu desejo. Renuncia-se, assim, ao anseio demodelagem <strong>do</strong> outro pelos moldes <strong>mal</strong> digeri<strong>do</strong>s em nós, o que equivale a abrir-se ao outroem toda a sua origi<strong>na</strong>lidade e especificidade.Semelhante tarefa de renúncia, de delimitação, de diferenciação jamais <strong>estar</strong>átermi<strong>na</strong>da. O lugar <strong>do</strong> Outro está sempre ameaça<strong>do</strong>. [...] Mas, a repetição espreitaaquele que deixa de talhar a pedra, a surdez espreita aquele que deixa de trabalhar aescuta e acredita rápi<strong>do</strong> demais ter descoberto o que se diz. [...] A quem falta <strong>um</strong>instante de atenção só percebe o que já é conheci<strong>do</strong> (COLOMBIER, MANGEL ePERDRIAULT, p. 104).Dubet (1997) compartilha alg<strong>um</strong>as surpresas de sua experiência <strong>como</strong> professor: apercepção extremamente negativa que tem <strong>do</strong>s alunos, diariamente reforçada nos diálogos dassalas <strong>do</strong>s professores, a ausência de espírito de grupo entre eles, o sofrimento decorrente <strong>do</strong>declínio da autoridade, o que perpassa seu status e imagem, a insegurança <strong>na</strong> transmissão <strong>do</strong>sconhecimentos e a autocupabilização pelo fracasso <strong>escola</strong>r. O sociólogo lembra que a <strong>escola</strong> é


67sempre <strong>um</strong>a instância socializa<strong>do</strong>ra, “mesmo quan<strong>do</strong> não funcio<strong>na</strong>” (p. 229). Contu<strong>do</strong>, muitoseduca<strong>do</strong>res têm defendi<strong>do</strong> esta socialização n<strong>um</strong>a concepção conserva<strong>do</strong>ra, moralista,discipli<strong>na</strong><strong>do</strong>ra, o que tor<strong>na</strong> o discurso perigoso e refratário por parte <strong>do</strong>s alunos. Para o autor,“o debate não é entre permissividade e autoridade, eu acho que isto é <strong>um</strong> falso debate. Épreciso ter, ao mesmo tempo, autoridade e liberdade.” (p. 229).Para Estêvão (2008), a discipli<strong>na</strong> democrática seria, assim, o fruto de <strong>um</strong>a <strong>escola</strong>que venha a conjugar a ética da crítica, a ética da justiça, e a ética <strong>do</strong> cuida<strong>do</strong>, que não sejaconfundida com <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> sem conflitos, mas seja <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> que aceite e trabalhe com ocurrículo implícito das relações interpessoais, (re)significan<strong>do</strong> o conflito <strong>como</strong>potencialmente criativo e a serviço disso. Sintetizan<strong>do</strong> o pensamento de outros teóricos quepensam o conflito <strong>na</strong> <strong>escola</strong> 25 , ela é compreendida <strong>como</strong> construtora de consensosarg<strong>um</strong>enta<strong>do</strong>s, mas sem desprezar o conflito ou o dissenso.O autor caracteriza esta instituição <strong>como</strong> comunicativa e convivencial. Aexperiência tem demonstra<strong>do</strong> que quadros clássicos de violência dura <strong>na</strong> <strong>escola</strong> possuem <strong>um</strong>histórico não media<strong>do</strong>. Quan<strong>do</strong> muito, ape<strong>na</strong>s acompanha<strong>do</strong> da sanção nos moldes jádiscuti<strong>do</strong>s. Pain (2003), coadu<strong>na</strong>n<strong>do</strong> com Housseaye (1996), defende que a <strong>escola</strong> <strong>do</strong> séculoXXI é a das relações interpessoais.Abramovay (2009), Ortega (1998), Bardisa e Viedma (2006) apostam em planosde convivência <strong>como</strong> potencialmente capazes de transformar o clima <strong>escola</strong>r, e Pain (2003 e2006) elenca alguns cuida<strong>do</strong>s para esta construção além <strong>do</strong>s já cita<strong>do</strong>s: tratar de to<strong>do</strong>s osproblemas, <strong>estar</strong> presente, multiplicar as mediações, dialogar, ensi<strong>na</strong>r de outra maneira, falar averdade, preservar os espaços de fala <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res e os constituírem os professores gruposcoletivos de fala e escuta, nos quais a palavra circule e a instituição possa ser colocada emcausa. Nas classes, periodicamente, os estudantes realizariam, mediante meto<strong>do</strong>logia, <strong>um</strong>conselho da classe no qual o os estudantes tenham a fala 26 .Como visto, são busca<strong>do</strong>s mecanismos para a mediação simbólica, nos quais afala é central. Também Housseaye (1996), discutin<strong>do</strong> a questão <strong>do</strong> uso da palavra pelosestudantes, apresenta a ausência dela <strong>como</strong> a principal causa da violência, defenden<strong>do</strong>,portanto, o uso pleno disso. Para este fim, não coadu<strong>na</strong> com o modelo liberal de dependência,irresponsabilidade e individualismo.De outro mo<strong>do</strong>, o que temos visto é a responsabilização <strong>do</strong> sujeito emdesconsideração aos contextos discuti<strong>do</strong>s. A democracia <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, passa pela democratização<strong>do</strong>s saberes, e, neste senti<strong>do</strong>, Patto (1999), a<strong>na</strong>lisan<strong>do</strong> o fracasso <strong>escola</strong>r, questio<strong>na</strong> e critica aatitude de reduzir e simplificar a falência de <strong>um</strong> projeto de pedagogia em vigor ao aluno que


68apresenta dificuldade em aderir ao estatuto de instituí<strong>do</strong>, haja vista a medicalização e apsicopatologização da educação a que estamos entregues. A prática é retirar o sujeito de seucontexto, para avaliá-lo em <strong>um</strong> gabinete estanque, rotulá-lo e devolvê-lo ao meio. Nestamesma linha de raciocínio, Lajonquière (1992) afirma que o discurso (psico)pedagógicohegemônico, ass<strong>um</strong>in<strong>do</strong> status científico, vende a ideia da psicopatologização da educaçãotoda vez que não responde de acor<strong>do</strong> com as crenças <strong>do</strong>s méto<strong>do</strong>s científicos <strong>do</strong> que é oh<strong>um</strong>ano e de <strong>como</strong> este deve aprender. Na contramão <strong>do</strong> que é vendi<strong>do</strong> pelos interesses <strong>do</strong>capital, a Pedagogia Institucio<strong>na</strong>l trabalha pela h<strong>um</strong>anização <strong>do</strong>s lugares e contra amedicalização (PAIN, 2009).Nosso intuito, ao fazer esta caminhada, foi o de demonstrar que o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> éconstitutivo da vida em sociedade, mas que o mun<strong>do</strong> pós-moderno parece colecio<strong>na</strong>relementos que o intensificam de forma inédita, <strong>na</strong> história <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> ocidental; que o <strong>mal</strong><strong>estar</strong>é constitutivo <strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano, mas que a a<strong>do</strong>lescência e a juventude no atual contextoparecem colecio<strong>na</strong>r elementos especiais para a vivência disso, coloca<strong>do</strong>s pela condiçãobiológica, pelo choque de gerações e pelo contexto de vulnerabilidade e desamparo; que o<strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> é constitutivo de qualquer organização, mas que a instituição ou a organização<strong>escola</strong>, ao apresentar-se de forma particular <strong>como</strong> a grande defensora da causa ediscursividade da modernidade, intensifica o seu <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong>, sobretu<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> os estudantestrazem outra discursividade a estas relações que dão-se <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.Violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>: bordean<strong>do</strong> o realViolência é mais <strong>um</strong>a dessas palavras que, dada a impossibilidade de nomeação<strong>do</strong> real (LACAN, 2005), é tomada de imensa polifonia, o que pode dificultar o estu<strong>do</strong> daquestão. Além disso, a reflexão sobre esta temática - e mais especificamente sobre a violência<strong>na</strong> <strong>escola</strong> -, conforme observam Ches<strong>na</strong>is (1999) e Debarbieux (2002a), é pautada paradiscussão <strong>na</strong> grande maioria das <strong>escola</strong>s e por setores da academia, ape<strong>na</strong>s quan<strong>do</strong> daocorrência de eventos que ganham contextos de espetáculo pelos meios de comunicação demassa.Tais condições fragilizam a discussão e o enfrentamento <strong>do</strong>s desafios coloca<strong>do</strong>spor este fenômeno, ten<strong>do</strong> em vista a inflação <strong>do</strong> conceito, a impreg<strong>na</strong>ção por apreensõesincoerentes, simplistas, reducionistas e, por vezes, reacionárias, estigmatizantes,preconceituosas e discrimi<strong>na</strong>tórias (DEBARBIEUX, 2002a). De acor<strong>do</strong> com este autor, entreestes perigos, está a redução <strong>do</strong> conceito à sua dimensão empírica: agressão física comintencio<strong>na</strong>lidade de causar <strong>do</strong>r ou sofrimento ao outro 27 , o que nos pode ofuscar a percepção e


69deixar-nos insensíveis às inúmeras microviolências que sustentam e fomentam as demais(DEBARBIEUX, 2002b).Outra consequência destes equívocos é o a<strong>um</strong>ento da sensação de me<strong>do</strong> einsegurança, <strong>como</strong> observam Teixeira e Porto (1998). Isso pode ser promotor de maisviolência (BRASIL, 2005), além de reforçar a crença equivocada de que caminhamos a passoslargos para a barbárie, o que alimenta a indústria da violência e da segurança(ABRAMOVAY, 2009; PINKER, 2011). Outro grande risco desta forma de abordagem datemática é o “populismo punitivo”, expressão utilizada por Rodriguez (2004), já mencio<strong>na</strong>daaqui, para desig<strong>na</strong>r medidas coercitivas severas, reacionárias, que cost<strong>um</strong>am seguir-se aosgrandes espetáculos de violência com apoio social que acredita <strong>na</strong> eficácia delas <strong>como</strong> formade restauração <strong>do</strong> controle e da ordem.O último equívoco decorrente desta polifonia e apreensão empírica é a colagem a<strong>um</strong> discurso <strong>do</strong> senso com<strong>um</strong>, reforça<strong>do</strong> pela mídia sensacio<strong>na</strong>lista. A título de ilustração,elencamos alguns equívocos que temos ouvi<strong>do</strong> de profissio<strong>na</strong>is da educação <strong>na</strong>s inúmeras<strong>escola</strong>s em que temos si<strong>do</strong> chama<strong>do</strong>s a discutir a questão: a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> é fato recente;a <strong>escola</strong> é <strong>um</strong> espaço por demais violento; caminhamos a passos largos para o caos social; aviolência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> decorre, exclusivamente, da invasão da violência que lhe é exter<strong>na</strong>; há <strong>um</strong>crescimento da violência por conta <strong>do</strong>s desvios da juventude que demonstra desrespeito aoespaço sacraliza<strong>do</strong> da <strong>escola</strong>; estes desvios devem-se à desestruturação, à negligência dasfamílias <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s e à falência <strong>do</strong>s valores morais que regularam a vida <strong>do</strong>s adultos; obullying nomeia todas as formas de violência presentes no ambiente <strong>escola</strong>r e é deresponsabilidade exclusiva de quem o pratica; o enfrentamento eficaz da questão dá-se peloresgate da autoridade <strong>do</strong> professor aos moldes de <strong>um</strong> passa<strong>do</strong>, pelo enrijecimento das normasdiscipli<strong>na</strong>res e pela ação da polícia; a <strong>escola</strong>, ante os quadros de violência <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e em seuinterior, deve ampliar seus muros, grades e sistemas de segurança; a <strong>escola</strong> encontra-seisolada, portanto deve enfrentar a violência sozinha; os conflitos não são saudáveis àconvivência, portanto não podem existir; a solução deve vir de experts 28 .Nenh<strong>um</strong>a das considerações citadas encontra sustentação <strong>na</strong> discussão que aacademia faz sobre a questão. Ao contrário, estu<strong>do</strong>s e pesquisas das diversas áreas <strong>do</strong>conhecimento apontam o senti<strong>do</strong> inverso destas falas. Apesar disto, este tem si<strong>do</strong> o tom dadiscussão <strong>na</strong> maioria das <strong>escola</strong>s <strong>na</strong>s quais estivemos para dialogar sobre a questão, o queratifica a necessidade de melhor discussão semântica <strong>do</strong> que consideramos violência.Refletin<strong>do</strong> sobre esta questão, Debarbieux (2002a) dicotomiza, de <strong>um</strong> la<strong>do</strong>, o uso<strong>do</strong> termo entre os que defendem a delimitação objetiva <strong>do</strong> que é ou não é violência,


70utilizan<strong>do</strong>-se, para tanto, <strong>do</strong> Código Pe<strong>na</strong>l e, de outro — <strong>do</strong>s quais Debarbieux é partidário —, os que defendem levar em consideração a voz das vítimas. O autor arg<strong>um</strong>enta com ahistoricidade <strong>do</strong>s códigos legais, pois muitos crimes hoje tipifica<strong>do</strong>s por estatutos legais são<strong>na</strong>da mais que a história da tomada de voz de vítimas que não eram ouvidas. São exemplosdeste arg<strong>um</strong>ento a violência contra a mulher ou o assédio sexual no ambiente de trabalho, poisa mulher não passou a ser vítima ape<strong>na</strong>s quan<strong>do</strong> os códigos pe<strong>na</strong>is assim reconheceram e noambiente profissio<strong>na</strong>l, pois o assédio não passou a existir quan<strong>do</strong> houve a qualificação dealg<strong>um</strong>as práticas. Sen<strong>do</strong> assim, foi preciso que as vítimas conseguissem emitir sua <strong>do</strong>r, parapodermos tipificar tais práticas <strong>como</strong> crimes.Por esta posição, que insere a esfera psicológica n<strong>um</strong>a discussão que consideravaape<strong>na</strong>s a política, o sociólogo francês recebe críticas de quem acredite que tal atitudeinflacio<strong>na</strong> o conceito de violência, o que poderia torná-lo impossível enquanto categoria deestu<strong>do</strong>. O autor reconhece este risco, mas apresenta muitos resulta<strong>do</strong>s de suas pesquisas,utilizan<strong>do</strong>-se desta concepção com efeitos positivos para o entendimento da questão.Na mesma linha <strong>do</strong> que Dubet (1998) apresenta <strong>como</strong> desinstitucio<strong>na</strong>lização <strong>do</strong>social (reduzir ape<strong>na</strong>s à pessoa os [de]mérito pelo seu sucesso/fracasso), Debarbieux (2002a)critica a abordagem que é dada ao racismo por parte <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, que, ao centrar no indivíduo aexplicação para a violência, desresponsabiliza-se de ações que façam frente à profundainjustiça social que marca nosso tempo. Localizamos nossa crítica à abordagem feita com atemática <strong>do</strong> bullying.Subscrevemos as reflexões de Debarbieux (2002a), reforçan<strong>do</strong> o cuida<strong>do</strong> deconstruir referências objetivas para a discussão da questão, o que também é defendi<strong>do</strong> peloautor. Neste senti<strong>do</strong>, muitas são as contribuições para esta difícil construção, haja vista ocaráter multifaceta<strong>do</strong> e histórico <strong>do</strong> fenômeno violência. Etimologicamente, a palavraviolência vem <strong>do</strong> radical latino vis: força, vigor, emprego da força, no senti<strong>do</strong> físico <strong>do</strong> termo,contra alguém, e <strong>do</strong> grego bia: força física contra a vontade de alguém (HOUAISS et. al.,2001).Pensan<strong>do</strong> a questão, Costa (1984) promove profícuo debate teórico com grandesexpoentes <strong>do</strong> pensamento ocidental que discutem tanto a questão da violência quanto temasafins, tais <strong>como</strong>, agressividade, violência simbólica, conflitos de interesse, autoridade e poder.O autor ass<strong>um</strong>e <strong>um</strong>a contramão no que é amplamente defendi<strong>do</strong>, mesmo com o aportepsica<strong>na</strong>lítico ao qual é afilia<strong>do</strong>. Para esse autor, a violência não é vista <strong>como</strong> <strong>um</strong>a forçaconstitutiva e inevitável <strong>do</strong> outro e ou outro sobre o psiquismo h<strong>um</strong>ano. Para tanto, diferenciaviolência de agressividade, entenden<strong>do</strong>-a <strong>como</strong> instinto básico, associa<strong>do</strong> à preservação da


71vida. Também diferencia violência de poder, buscan<strong>do</strong>, para tanto, <strong>um</strong> diálogo com WalterBenjamin e Han<strong>na</strong>h Arendt, no intuito de enfrentar a confusão que se cost<strong>um</strong>a fazer entreagressividade, poder e violência.Este tipo de ação destrutiva é irracio<strong>na</strong>l, mas porta a marca de <strong>um</strong> desejo. Violênciaé o emprego deseja<strong>do</strong> da agressividade, com fins destrutivos. Esse desejo pode servoluntário, delibera<strong>do</strong>, racio<strong>na</strong>l e consciente, ou pode ser inconsciente e irracio<strong>na</strong>l(COSTA, idem, p. 30).Assim, caso não haja o desejo 29 ou a percepção dele, não haverá violência. Apoiaseno conceito de ruthlessness, de Winnicott, para demonstrar que os atos agressivos <strong>do</strong> bebêcom a mãe não são interpreta<strong>do</strong>s <strong>como</strong> violência, mesmo porque não são ainda inscritos <strong>na</strong>cultura, portanto, <strong>na</strong> moral. Apesar de tratar-se de <strong>um</strong>a manifestação agressiva, não carregamo desejo de destruição, mesmo porque o bebê está sen<strong>do</strong> inscrito <strong>na</strong> ordem <strong>do</strong> desejo.Para sustentar sua tese, Costa (1984, p. 47) evoca Arendt, para quem há <strong>um</strong>atendência à <strong>na</strong>turalização da violência por <strong>um</strong>a colagem <strong>do</strong> discurso da etologia. A violênciaapresenta-se, assim, <strong>como</strong> “<strong>um</strong> artefato da cultura e não <strong>como</strong> seu artífice.” Sustentan<strong>do</strong>-seem Arendt, Costa entende a violência <strong>como</strong> <strong>um</strong>a possibilidade da vida social quan<strong>do</strong> se tenta,pelo uso da força ou da agressividade, definir caminhos que não foram alcança<strong>do</strong>s por meio<strong>do</strong> diálogo e da cooperação.Toma<strong>do</strong>s estes cuida<strong>do</strong>s de nomenclatura, resta claro que a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> é<strong>um</strong> <strong>sintoma</strong> <strong>do</strong> conjunto de <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong>es que se (des)encontram no seu cotidiano, para os quaisnão se têm consegui<strong>do</strong> respostas adequadas. Esses <strong>sintoma</strong>s vêm de fora e <strong>na</strong>scem de dentro eou são reforça<strong>do</strong>s no dia a dia, por meio de a<strong>na</strong>cronismos. Portanto, conforme a discussãoanterior, Dayrell (2007, p. 1121) compreende que “em meio à aparente desordem, eles (osjovens) podem <strong>estar</strong> anuncian<strong>do</strong> nova ordem que a instituição <strong>escola</strong>r ainda insiste em negar”


72CAPÍTULO 4 METODOLOGIAUm <strong>do</strong>s grandes equívocos da ciência é tentar sugar o oceano da realidade pelocanudinho da teoria.Morin (1993, apud BARBIER, 2004, p. 86).Até bem pouco tempo, o conhecimento científico era ti<strong>do</strong> <strong>como</strong> a reprodução fielda realidade. Foi no século XX que este paradigma hegemônico começou a ser maisdetidamente discuti<strong>do</strong>, com as importantes contribuições de Bachelard, Kuhn e Feyerebend(ALVEZ–MAZZOTTI e GEWANDSZNAJDER, 1998). Mas, é, sobretu<strong>do</strong>, com Morin(1998) que alg<strong>um</strong>as características deste paradigma que se apresentam <strong>como</strong> lacu<strong>na</strong>s, tais<strong>como</strong>, a busca pelo universal, o isomorfismo, a concepção de <strong>na</strong>tureza h<strong>um</strong>a<strong>na</strong> e patologia,serão amplamente denunciadas.Esse momento é compreendi<strong>do</strong> por Neubern (2004) <strong>como</strong> o resulta<strong>do</strong> da falha <strong>do</strong>imprinting (impressão da marca) <strong>do</strong> paradigma moderno de ciência, no qual se percebe <strong>um</strong>arelação maior com o futuro <strong>do</strong> que com o passa<strong>do</strong> e abre-se mão das ilusões de certezas tãocomuns no paradigma simplifica<strong>do</strong>r. Nas palavras desse autor, caminhar pela complexidade éass<strong>um</strong>ir “o olhar daquele que se sente pequeno diante dessa teia, mas que prefere se sentirassim a tatear pelo escuro” (p. 20).Este estu<strong>do</strong>, não obstante utilizar-se da psicanálise <strong>como</strong> teoria central <strong>na</strong> qual nosapoiamos para a interpretação da realidade, esforça-se por localizar-se no paradigma dacomplexidade, pois, tal <strong>como</strong> Morin (1996), considera os fenômenos bioantropossocias <strong>como</strong>hipercomplexos, opon<strong>do</strong>-se, assim, à pretensão simplifica<strong>do</strong>ra que vem <strong>do</strong> paradigmacartesiano. Acreditamos, juntamente com Ar<strong>do</strong>ino (1985), no caráter molar e holístico darealidade estudada e <strong>na</strong> impossibilidade de redução a elementos simples por corte ou pordecomposição. Assim agin<strong>do</strong>, a ciência moder<strong>na</strong> tentou expor sua concepção de ordem <strong>na</strong>aparente desordem <strong>do</strong> universo. Isso pode induzir-nos ao equívoco de separar o que estáliga<strong>do</strong> ou unir o que está desliga<strong>do</strong>, conforme assevera Morin (1996).Apesar de esta pesquisa inserir-se <strong>na</strong> ordem da racio<strong>na</strong>lidade acadêmicahegemônica, tentamos recusar os possíveis excessos oriun<strong>do</strong>s <strong>do</strong> academicismo, aceitan<strong>do</strong> <strong>um</strong>diálogo com o que lhe resiste: o real, de acor<strong>do</strong> com o desafio proposto por Barbier (2004, p.89) de que “a complexidade aceita a incerteza, o imprevisível, o não saber e a contradição”.Ao referirmo-nos a paradigma, compreendemo-lo com Morin (1996), <strong>como</strong> a grande matrizformada pelos conceitos fundamentais, pelas categorias mestras de inteligibilidade e pelostipos de relações entre eles. Essa dimensão <strong>do</strong> sistema de ideias não é facilmente percebida,


73por tratar-se da alma <strong>do</strong> corpo científico que escolhe o que pode ou não entrar em seu campode percepção e estu<strong>do</strong>, sem que percebamos.Além disso, buscamos o diálogo em nossa pesquisa. Assim, o que era ti<strong>do</strong> <strong>como</strong>inconciliável dialoga em complementaridade que, por vezes, poderia figurar <strong>como</strong> formaantagônica. Tal é o caso, por exemplo, da sociologia e das psicologias, <strong>do</strong> interno e <strong>do</strong>externo, <strong>do</strong> microaspecto e <strong>do</strong> macroaspecto. Isso se aplica ao que Morin (idem) trata derecursão organizacio<strong>na</strong>l, pelo qual o fenômeno complexo é simultaneamente produto eprodutor de sua existência. Em nosso estu<strong>do</strong>, ao discutirmos a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>,compreendemos que, assim <strong>como</strong> a sociedade é produzida pelas interações entre os sujeitos,retroage sobre eles, sen<strong>do</strong>, a <strong>um</strong> só tempo, produto e produtora deles. Por fim, há o princípiohologramático, pelo qual o autor considera que o to<strong>do</strong> está, de alg<strong>um</strong>a forma, presente emnós.A caminhada científica ocidental ofereceu a base para a constituição de <strong>um</strong>conjunto de sistemas de ideias, o que Morin (1998) compreende <strong>como</strong> “<strong>um</strong>a constelação deconceitos associa<strong>do</strong>s de maneira sólida, cujo agenciamento é estabeleci<strong>do</strong> por vínculoslógicos (ou com tal aparência) em virtude de axiomas postula<strong>do</strong>s e princípios de organizaçãosubjacentes” (p. 163).Neubern (2000) traduz esse sistema de ideias <strong>como</strong>:Um núcleo irrefutável (axiomas, regras fundamentais e ideias mestras), <strong>um</strong> conjuntode subsistemas interdependentes (em que podem ser incluídas teorias, meto<strong>do</strong>logias,certos conceitos) que permite certa relação com o real e <strong>um</strong> dispositivo imunológicode proteção que consiste nos procedimentos e <strong>na</strong>s táticas de proteção e refutaçãocontra os ataques ao sistema. Um conhecimento sobre o próprio conhecimento(epistemologia) que estude suas origens, pressupostos e cenários de surgimento éfundamental para o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong>s sistemas de ideias (p. 153).Percebemos os paradigmas <strong>como</strong> atravessa<strong>do</strong>res <strong>do</strong> sistema de ideias,inscreven<strong>do</strong>-se no núcleo destes sistemas e determi<strong>na</strong>n<strong>do</strong> a formação de ideias-chaves,conceitos, regras e formas de associação entre as ideias e os conceitos. Apesar de suainvisibilidade, o que o tor<strong>na</strong> i<strong>na</strong>tacável diretamente, favorece <strong>um</strong>a visão da realidade central edetermi<strong>na</strong>nte <strong>do</strong> que é ti<strong>do</strong> <strong>como</strong> certo (MORIN, 1998). Segun<strong>do</strong> Morin (1998) e Santos(1987), este poderoso transfun<strong>do</strong>, mediante o pensamento cartesiano, estabeleceu regrasrígidas, para separar o que era ciência <strong>do</strong> que não o era, legan<strong>do</strong> ao conhecimento referenda<strong>do</strong><strong>como</strong> ciência o status de superior graças à crença <strong>na</strong> capacidade de avançar, drasticamente, no<strong>do</strong>mínio da <strong>na</strong>tureza.Neubern (2004) ajuda-nos a compreender que esta crença promoveu e sustentounova caça às bruxas, às “impurezas” reais ou aos fantasmas medievais construí<strong>do</strong>s pelo


74H<strong>um</strong>anismo e pelo Il<strong>um</strong>inismo. Vem deste esforço de purificação a conde<strong>na</strong>ção dasubjetividade, assim <strong>como</strong> a chancela a méto<strong>do</strong>s e formas de dizer algo. Todavia, desteprocesso resulta a negligência e a negação de <strong>um</strong>a gama de fenômenos que tinham o h<strong>um</strong>ano- incluin<strong>do</strong> aí a sua subjetividade - <strong>como</strong> objeto, sobretu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> ousasse manif<strong>estar</strong>-se de<strong>um</strong>a forma mais patente. Além disso, há a preocupação com o principal inimigo <strong>do</strong> discursocientífico: o senso com<strong>um</strong>.A teoria é, assim, de acor<strong>do</strong> com Morin (1996; 1998), <strong>um</strong> <strong>do</strong>s poucos movimentosvisíveis <strong>do</strong>s sistemas de ideias e possui conexões para além da relação com o empírico,caben<strong>do</strong> ao real função desequilibrante que evoca constante equilíbrio por processosassimilatórios ou a<strong>como</strong>dativos 30 . É, portanto, segun<strong>do</strong> Santos (1989), <strong>um</strong> <strong>do</strong>s momentos quemarcam a ruptura entre o racio<strong>na</strong>l científico e o senso com<strong>um</strong>.Sabemos que, em nossa caminhada, privilegiamos determi<strong>na</strong>das percepções quenos foram apontadas, antes, pela teoria que nos sustenta, ainda que não tivéssemos distoclareza, <strong>como</strong> nos lembra Anderson (1997 apud NEUBERN, 2004), apesar de termo-nosesforça<strong>do</strong> por <strong>um</strong>a “admiração ingênua” (BORNHEIM, 1998) ou de suspensãofenomenológica o quanto possível. Conforme citação em epígrafe, acreditamos <strong>na</strong>multirreferencialidade de Ar<strong>do</strong>ino (1985) <strong>como</strong> caminho possível de apropriação, ainda queparcial, de fenômenos tão pluridimensio<strong>na</strong>is quanto os das ciências bioantropossociais.Buscamos a complementaridade para além da junção harmônica de simétricos e <strong>como</strong>coorde<strong>na</strong>ção de realidades heterogêneas, visto que:A complementaridade é, aqui, a <strong>do</strong>s conjuntos, profunda senão irredutivelmente,heterogêneos. O trabalho de análise consiste menos em tentar homogeneizá-los, àcusta de <strong>um</strong>a redução inevitável, <strong>do</strong> que em procurar articulá-los, senão em conjugálos(ARDOINO, 1985, p. 45).Em consonância com as compreensões desse autor, buscamos a diferenciação <strong>do</strong>solhares centra<strong>do</strong>s <strong>na</strong>s pessoas observadas em suas interações em seus grupos no trabalho,assim <strong>como</strong> <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Tentamos, portanto, a multirreferencialidade de compreensãointerpretativa e explicativa.Ao posicio<strong>na</strong>rmo-nos ao lugar <strong>do</strong> saber psica<strong>na</strong>lítico, portanto, não o fazemos<strong>como</strong> <strong>um</strong> “fundamentalista”, termo utiliza<strong>do</strong> por Birman (2007), para desig<strong>na</strong>r atitudes<strong>do</strong>gmáticas e cristalizadas que perdem a sua capacidade de dialogar e negociar com arealidade e as demais áreas de conhecimento. De forma semelhante, discute Zimerman(1999), Mezan (2002) e outros que conde<strong>na</strong>m a psicanálise que não privilegie a relaçãoterapêutica em toda a sua fecundidade, mas, antes, negue a realidade pela inflexibilidade deconceitos cristaliza<strong>do</strong>s que não aceitam o questio<strong>na</strong>mento <strong>do</strong> real. Discutin<strong>do</strong> os riscos de


75possível pensamento “egocêntrico” por parte de alguns psica<strong>na</strong>listas orto<strong>do</strong>xos, Zimerman(1999) aponta <strong>como</strong> <strong>um</strong> <strong>do</strong>s caminhos de superação deste equívoco, a aproximação necessáriada psicanálise com as demais áreas <strong>do</strong> conhecimento, o que já é feito por renoma<strong>do</strong>s nomesdeste sistema de ideias.Em síntese, ao anunciarmos nosso olhar por meio da psicanálise, fazemos <strong>como</strong> opoeta que afirma “Da minha aldeia, vejo quanto da terra se pode ver no universo.” (PESSOA,1986). Falamos de <strong>um</strong> sistema de ideias que não nega a sua historicidade; pelo contrário,ass<strong>um</strong>e-a e, com isso, aprende, renova-se ao ponto em que dialoga com as diferentes áreas deconhecimento de acor<strong>do</strong> com o que Ar<strong>do</strong>ino (1985) definiu <strong>como</strong> complementaridade. Assim,apoiamo-nos em <strong>um</strong>a psicanálise que busca o social e a cultura <strong>como</strong> o fez seu funda<strong>do</strong>r, queresponde, coerentemente, às críticas (pós) estruturalistas e reconhece as novas formas desubjetivação e sua consequente necessidade de acompanhá-las, para não correr o risco detor<strong>na</strong>r-se obsoleta, crítica embasada por Birman (2007).É importante perceber que a constituição da psicanálise enquanto sistema deideias deu-se justamente pelo fato de a ciência moder<strong>na</strong>, em sua acepção positivista rígida daera vitoria<strong>na</strong>, não possuir elementos conceituais para a compreensão e o tratamento <strong>do</strong> que sedenomi<strong>na</strong> histeria. Freud tornou-se célebre, por não negar o real em função <strong>do</strong> que a ciência<strong>do</strong> momento dava conta de interpretar. Antes, (re)inventou o conhecimento, para dar conta <strong>do</strong>que não houvera si<strong>do</strong> codifica<strong>do</strong> pelo paradigma científico em voga, em sua vã presunção detu<strong>do</strong> saber, ao ponto em que negava as suas limitações de tradução da realidade juntamentecom os fenômenos que não conseguia nomear. É esta caminhada que, ao ferir, <strong>na</strong>rcisicamente,a epistemologia moder<strong>na</strong>, contribuiu para o questio<strong>na</strong>mento deste paradigma conformedemonstra Plastino (2001).O termo complexidade, reinventa<strong>do</strong> por Morin de acor<strong>do</strong> com o termo latinocomplexus, refere-se ao que é teci<strong>do</strong> em conjunto (MORIN, 1996). Traduz-se por nova formade consideração das partes em suas interações com o to<strong>do</strong>, <strong>como</strong> já se pensava tanto <strong>na</strong>steorias da Gestalt quanto pelos teóricos de Palo Alto 31 . A complexidade é parte <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>pós-moderno que se apresenta nos meios acadêmicos, e os epistemólogos discutem-<strong>na</strong> mais<strong>como</strong> intérpretes <strong>do</strong> momento <strong>do</strong> que <strong>como</strong> provoca<strong>do</strong>res <strong>do</strong> novo.Ten<strong>do</strong> em vista que este estu<strong>do</strong> é atravessa<strong>do</strong> pela pós-modernidade e reforça ocuida<strong>do</strong> de não fazermos <strong>um</strong>a abordagem maniqueísta da questão, destacamos que oconhecimento tem sofri<strong>do</strong> os efeitos deste tempo. Contu<strong>do</strong>, ao contrário das críticas à pósmodernidade,Neubern (2004, p. 221) percebe-a <strong>como</strong> “<strong>um</strong> movimento em que o


76conhecimento é múltiplo, construí<strong>do</strong> e contextualiza<strong>do</strong>, principalmente devi<strong>do</strong> às múltiplasrealidades de senti<strong>do</strong> construídas <strong>na</strong>s relações sociais em que os sujeitos tomam parte”.Também Plastino (2001) procura localizar a psicanálise no contexto maior <strong>do</strong>paradigma moderno, interligan<strong>do</strong>-a à complexidade. Para tanto, define-o <strong>como</strong> <strong>um</strong> conjuntode perspectivas <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>ntes sobre o ser e o conhecer, com des<strong>do</strong>bramentos para o fazer que se<strong>na</strong>turalizam, adquirin<strong>do</strong> <strong>um</strong>a autoridade inquestionável, mesmo porque não é visível.Ao tempo em que organiza a produção <strong>do</strong> conhecimento — ao qual devemosmuitos avanços a que chegamos — o paradigma limita, e é a esta dimensão que a teoria dacomplexidade endereça suas críticas. Castoriadis (1987) pondera que o saber <strong>do</strong> paradigmacartesiano foi de <strong>um</strong>a eficácia ilimitada em certos aspectos, apesar de pouco ou <strong>na</strong>da servirem outras áreas mais importantes, <strong>como</strong> é o caso da impotência ante os desafios daconvivência coletiva e a miséria de <strong>do</strong>is terços da população mundial. Santos (2000) lembraque esta é <strong>um</strong>a construção inseparável <strong>do</strong> contexto social e histórico no qual o paradigma seencontra inseri<strong>do</strong>. Não poderíamos, assim, pensar o paradigma hegemônico dissocia<strong>do</strong> dasconstruções próprias da consolidação da ordem burguesa no mun<strong>do</strong> Ocidental.O <strong>na</strong>scimento da psicanálise, segun<strong>do</strong> Plastino (2001), dá-se <strong>na</strong> contramão de <strong>um</strong>paradigma que busca simplificar elementos <strong>do</strong> real, para estudá-los e, assim, conhecê-los.Trata-se, portanto, de <strong>um</strong>a meto<strong>do</strong>logia que promove redução e disjunção com vistas aocontrole, pois, sobre estes conhecimentos, elaboram-se leis que permitem prever, controlar e<strong>do</strong>mi<strong>na</strong>r a <strong>na</strong>tureza e, mais à frente, o h<strong>um</strong>ano, a sociedade e a cultura.O ideal de <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>ção é reforça<strong>do</strong> pela ideologia burguesa da Era das Revoluçõese a Física mecanicista de Newton (fisicalismo), o cartesianismo, a lógica matemática(quantificação) e o positivismo, que dão o tom inquestionável desta caminhada. Oconhecimento é ti<strong>do</strong>, então, <strong>como</strong> a transcrição de <strong>um</strong>a realidade homogênea, portanto, da<strong>do</strong>,acaba<strong>do</strong>, fecha<strong>do</strong>. Para tanto, estabelecem-se dualismos: corpo versus psiquismo, <strong>na</strong>turezaversus h<strong>um</strong>ano, sujeito versus objeto, <strong>na</strong>tural versus cultural. Este conjunto de característicasconsidera o paradigma “totalitário”, haja vista que valorizava o conhecimento objetivo eexplicativo em detrimento <strong>do</strong> conhecimento intersubjetivo, descritivo e compreensivo(PLASTINO, 2001).No que denomi<strong>na</strong> <strong>como</strong> “prima<strong>do</strong> da afetividade”, Plastino (2001) demonstra queFreud rompe com esta lógica dualista, ao propor a ideia da pulsão, e com a ideia deinconsciente anárquico e não passível de controle. Assim, o conhecimento emerge da clínicae, <strong>como</strong> tal, é aberto, não há separação entre sujeito e objeto, visto que esta construção se dá<strong>na</strong> intersubjetividade <strong>do</strong> processo clínico (transferência, contratransferência e resistência).


77Para este autor, a psicanálise contesta o paradigma hegemônico nos três registros: <strong>do</strong> real, <strong>do</strong>h<strong>um</strong>ano e <strong>do</strong> conhecimento. Discutin<strong>do</strong> esta questão, Castoriadis (1982, p. 374) lembra-nosque “muito mais <strong>do</strong> que a ordem moral da sociedade, é sua ordem lógica e ontológica que apsicanálise põe em causa”.Nesse senti<strong>do</strong>, Plastino (2001) demonstra que a psicanálise representou <strong>um</strong>aruptura epistemológica no paradigma moderno onde <strong>na</strong>sceu, o que contribuiu para o atualesta<strong>do</strong> de questio<strong>na</strong>mento em que este se encontra. A caminhada de Freud não foi outra senão<strong>um</strong>a ousada luta por vencer os meandros deste paradigma no corpo <strong>do</strong>utrinário da psicologiaprofunda, o que se dará <strong>na</strong>s etapas de sua construção epistemológica. Plastino (idem) defendea continuidade da obra freudia<strong>na</strong> no senti<strong>do</strong> de privilegiar o diálogo com as teorias e asexperiências <strong>do</strong> pensamento que compartilham da crítica ao paradigma moderno.O porquê de <strong>um</strong>a pesquisa qualitativaOnde foram parar os excluí<strong>do</strong>s? Os que nunca falam? — deve ser o estribilho desua intervenção.Barbier (2004, p. 120).Ar<strong>do</strong>ino (1985) ajudará a localizar-nos <strong>na</strong> pesquisa qualitativa, pois, apesar detanto a pesquisa quantitativa quanto a qualitativa evocarem a necessidade de justificativa <strong>do</strong>senuncia<strong>do</strong>s de conhecimento e <strong>do</strong>s meios de produção e de ambas (re)estabelecerem odistanciamento entre o pesquisa<strong>do</strong>r e o objeto, em nosso caso, a midiatização ocorreu aposteriori, pela análise de implicação ou da contratransferência (BARUS-MICHEL, 2004).Utilizamos a linguagem <strong>como</strong> matéria-prima inevitavelmente multívoca, com todas as suas“impurezas”. Não a<strong>na</strong>lisamos a generalidade ou a universalidade <strong>do</strong>s enuncia<strong>do</strong>s <strong>como</strong>imediata, pois só foi obtida em segun<strong>do</strong> momento, mediante o retratamento <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s(ARDOINO, 1985)Nosso objeto nesta pesquisa é compreendi<strong>do</strong> <strong>como</strong> objeto-sujeito com suasnegações, opacidades legítimas e constantemente recriadas, portanto não transparentes. Nossaimplicação não foi ignorada, tampouco negada, visto sentirmo-nos parte <strong>do</strong> processo deanálise que fizemos (ARDOINO, 1985; BARUS-MICHEL, 2004). Em nosso estu<strong>do</strong>,preocupamo-nos com a singularidade ou a parcialidade, ainda que voltemos ao universalmidiatiza<strong>do</strong> por <strong>um</strong> distanciamento <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s a que chegamos. Privilegiamos, assim, deacor<strong>do</strong> com <strong>um</strong>a construção complexa, a heterogeneidade da realidade cujo senti<strong>do</strong> esignificação buscamos conhecer, a fim de evitar a coerência a priori, o isomorfismo, a


78regularidade com fins de controle. Buscamos a “im-plicação” e evitamos a “ex-plicação”(ARDOINO, 1985, p. 58).Esforçamo-nos no senti<strong>do</strong> de exami<strong>na</strong>r determi<strong>na</strong><strong>do</strong> fenômeno mediante assubjetividades <strong>do</strong>s professores envolvi<strong>do</strong>s, por isso as condições objetivas que cercam osfenômenos tor<strong>na</strong>ram-se relevantes por meio de significa<strong>do</strong>s subjetivos. Para tanto, a<strong>do</strong>tamos<strong>um</strong>a atitude indutiva dentro <strong>do</strong> possível 32 . Apesar de possuirmos nossas afiliações teóricas jáanunciadas, esta foi (re)construída no processo, sempre aberto. Evidenciamos assubjetividades pela análise interpretativa. Por este conjunto de características, também emCreswell (2007) localizamo-nos <strong>na</strong> abordagem qualitativa.Nossa incursão ocorreu tanto no senti<strong>do</strong> de explorar o fenômeno quanto no detentar descrevê-lo, da<strong>do</strong> que esta compreensão poderá contribuir para novas percepções <strong>do</strong>que seja violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, assim <strong>como</strong> as ações que forem levadas a curso para oenfrentamento da questão. Buscamos dar voz às subjetividades atravessadas pela <strong>do</strong>pesquisa<strong>do</strong>r, além de reconhecer <strong>como</strong> complexos os fenômenos tão inextrincáveis esubjetivos quanto são violência e juventude e seus atravessamentos com a <strong>escola</strong>.O lócus da pesquisaNosso campo de pesquisa é <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> pública <strong>do</strong> DF que oferta Ensino Médiono matutino e EJA (I, II e III segmentos) 33 no perío<strong>do</strong> vespertino e noturno. A Escola foiconstruída no ano de 1973, entregue à comunidade e criada no ano de 1974. A partir <strong>do</strong> anode 1999 a <strong>escola</strong> começou a se destacar pela implementa de <strong>um</strong> projeto diversifica<strong>do</strong> queaborda a questão da sexualidade. Este projeto sofreu alterações ao longo <strong>do</strong>s anos. Teve aindareconhecimento de outros órgãos <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>. A <strong>escola</strong> possuía <strong>um</strong>a imagem muito conceituada<strong>na</strong> região administrativa onde se localiza. O bairro onde fica foi cria<strong>do</strong> para recebertrabalha<strong>do</strong>res de classe baixa.A <strong>escola</strong> é composta por 20 (vinte) salas de aula, 2 (duas) salas de vídeo, <strong>um</strong>laboratório de ciências exatas, 02 (duas) salas de recursos: <strong>um</strong>a desti<strong>na</strong>da ao atendimento dealunos com deficiência auditiva e outra para atendimento de alunos que possuem outrasdeficiências e TGD, 3 (três) salas desti<strong>na</strong>das às dependências administrativas (direção,supervisão administrativa e secretaria <strong>escola</strong>r), <strong>um</strong>a sala de prevenção DST-AIDS, <strong>um</strong>a sala<strong>do</strong> Serviço de Orientação Escolar, <strong>na</strong> qual atuam duas orienta<strong>do</strong>ras educacio<strong>na</strong>is, <strong>um</strong>a salapara a coorde<strong>na</strong>ção pedagógica, <strong>um</strong>a sala para os professores, <strong>um</strong>a auditório com 400(quatrocentos) lugares, <strong>um</strong>a sala de espelho multifuncio<strong>na</strong>l, duas quadras de esporte


79poliesportivas, <strong>um</strong>a peque<strong>na</strong> sala de leitura (que não consta no PPP da <strong>escola</strong>), <strong>um</strong> pátiocoberto, <strong>um</strong>a canti<strong>na</strong>, ampla área verde, <strong>um</strong> refeitório, quatro conjunto de banheiros paraalunos, <strong>um</strong> banheiro para deficientes, além <strong>do</strong>s banheiros para professores e muitas gradesfechan<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os corre<strong>do</strong>res e acessos. Há ainda <strong>um</strong> estacio<strong>na</strong>mento para professores e outraárea verde entre o portão de entrada e o portão <strong>do</strong> prédio.A <strong>escola</strong> é atendida por segurança terceirizada e ten<strong>do</strong> em vista o alto índice deocorrências é <strong>um</strong>a das poucas <strong>escola</strong>s da cidade que possui policiamento fixo <strong>do</strong> BatalhãoEscolar.A modalidade de ensino ofertada no turno vespertino era com<strong>um</strong> ape<strong>na</strong>s no turnonoturno. Todavia, os últimos anos vêm assistin<strong>do</strong> a <strong>um</strong>a <strong>juvenil</strong>ização <strong>do</strong>s estudantes da EJA,o que tem leva<strong>do</strong> o Esta<strong>do</strong> a oferecer esta modalidade de ensino também no diurno. Uma dasgrandes explicações é dada pelos altos índices de distorção idade série: conforme o CensoEscolar 2010 (MEC, 2011), 18,5% <strong>do</strong>s estudantes das séries iniciais <strong>do</strong> EF; 29,6% <strong>do</strong>sestudantes das séries fi<strong>na</strong>is <strong>do</strong> EF e 34,5% <strong>do</strong>s estudantes <strong>do</strong> EM encontram-se defasa<strong>do</strong>s emrelação idade-série. Ape<strong>na</strong>s quatro outras <strong>escola</strong>s <strong>do</strong> DF oferecem esta modalidade no diurno.A imersão no campo ocorreu por meio de reuniões com a Coorde<strong>na</strong>ção Regio<strong>na</strong>lde Ensino – CRE 34 que culminou com <strong>um</strong>a reunião juntamente à equipe gestora, em março de2011, para apresentar-nos e expor a proposta de <strong>um</strong>a pesquisa <strong>na</strong>quele espaço. Por ocasiãodesse encontro, éramos acompanha<strong>do</strong>s de <strong>do</strong>is profissio<strong>na</strong>is da CRE à qual a <strong>escola</strong> eravinculada. A equipe gestora solicitou-nos que pudéssemos oferecer nossas contribuições<strong>como</strong> estudiosos da área, no que consentimos, com a ressalva de que tais procedimentosocorressem após a coleta das falas <strong>do</strong>s professores sobre a questão.Compreendemos com Barus-Michel (2004) que toda presença exter<strong>na</strong> àinstituição, ao aproximar-se dela, por mais que busque a discrição, interfere <strong>na</strong> sua dinâmica.Além disso, consideraríamos utilitarismo não tentar contribuir com possíveis reflexões sobreos desafios que nos eram apresenta<strong>do</strong>s.Sujeitos da pesquisa 35Esta pesquisa utilizou-se da fala de dezoito sujeitos, to<strong>do</strong>s professores atuantesn<strong>um</strong>a <strong>escola</strong> que oferta a modalidade de Educação de Jovens e Adultos no turno diurno em<strong>um</strong>a <strong>escola</strong> pública <strong>do</strong> DF, conforme da<strong>do</strong>s que se encontram no quadro que segue.Estes sujeitos foram escolhi<strong>do</strong>s para os processos de escuta, por serem osprofessores que atuam <strong>na</strong> regência no perío<strong>do</strong> vespertino, que apresenta maior frequência eintensidade de queixas relativas à indiscipli<strong>na</strong> e ou à violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.


80Quadro 1: Professores regentes <strong>do</strong> turno vespertino que participaram <strong>do</strong>s grupos de escuta.SujeitoDia dareuniãoIdadeSexoTempo deSEDF (emanos)Tempo deEscola(em anos)Discipli<strong>na</strong>que lecio<strong>na</strong> 361 28/04/2011 42 Feminino 21 1Português/supervisorapedagógica2 28/04/2011 53 Masculino 26 10 Artes3 28/04/2011 54 Feminino 234 28/04/2011 33 Feminino 12Menos de 1anoMenos de 1anoPortuguêsInglês/coorde<strong>na</strong><strong>do</strong>ra5 28/04/2011 44 Feminino 22 1 Português6 28/04/2011 44 Feminino 227 28/04/2011 26 Feminino Cont. Temp 37 .8 28/04/2011 27 Feminino Cont. Temp.9 28/04/2011 54 Masculino 25Menos de 1anoMenos de 1anoMenos de 1anoMenos de 1anoArtesInglêsE.F.Português10 28/04/2011 44 Feminino 14 3 Português11 29/04/2011 38 Feminino Cont. Temp.Menos de 1anoHistória12 29/04/2011 41 Masculino 12 1 História1329/04/201140 Masculino 11Menos de 1anoGeografia14 29/04/2011 52 Masculino 19 3 História15 3/03/2011 50 Masculino 14 0 Ciências16 3/03/2011 41 Feminino 12 1 Ciências17 3/03/2011 41 Masculino 13 1 Ciências18 3/03/2011 45 Feminino 17 1 CiênciasExcluin<strong>do</strong> os professores em regime de contratação temporária, da<strong>do</strong> a suarotatividade no sistema, a média de idade destes professores é de 45,5 anos, o que aproximase<strong>do</strong> perfil da Secretaria de Educação <strong>como</strong> <strong>um</strong> to<strong>do</strong>, segun<strong>do</strong> pesquisa organizada por


81Abramovay (2009), <strong>na</strong> qual ape<strong>na</strong>s 25% <strong>do</strong>s professores possuíam mais de 45 anos. Tambémestá de acor<strong>do</strong> com esta pesquisa a pre<strong>do</strong>minância <strong>do</strong> gênero feminino <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, quadro quese observa também no Brasil 38 .Também excetuan<strong>do</strong> os professores em regime de contratação temporária,observa-se que o tempo médio de Secretaria de Educação é de 17,5 anos. Tempo considera<strong>do</strong>alto em comparação à Secretaria <strong>como</strong> <strong>um</strong> to<strong>do</strong>, pois emerge <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s que o sujeito commenos tempo de Secretaria possui 11 anos, ao la<strong>do</strong> de seis sujeitos com mais de 20 anos decasa.Percebe-se <strong>do</strong> quadro que, ao tempo em que são professores com <strong>um</strong>a maiormaturidade pessoal e profissio<strong>na</strong>l, possuem pouco tempo de EJA diurno, sobretu<strong>do</strong> porqueesta modalidade no diurno é nova <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.Da coleta de da<strong>do</strong>sAs falas <strong>do</strong>s sujeitos foram gravadas em três reuniões por áreas de conhecimento,obedecen<strong>do</strong> aos dias de coorde<strong>na</strong>ção pedagógica, em 3 de março, 28 e 29 de abril de 2011.Não obstante a complexidade que representa a EJA, os professores não dispõem de <strong>um</strong> dia emque possam discutir em conjunto.Nas referidas reuniões, apresentamo-nos aos professores <strong>como</strong> pesquisa<strong>do</strong>r daFaculdade de Educação da Universidade de Brasília, servi<strong>do</strong>r da Secretaria de Esta<strong>do</strong> deEducação com licença para estu<strong>do</strong>s e, com auxílio da Coorde<strong>na</strong><strong>do</strong>ria Regio<strong>na</strong>l de Ensino,escolhemos aquela instituição de ensino para realizar pesquisa exploratória sobre a violência<strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Solicitamos ao grupo de profissio<strong>na</strong>is que se apresentassem, dizen<strong>do</strong> o nome, adiscipli<strong>na</strong> que ministravam <strong>na</strong>quele turno, o tempo que tinham de Secretaria de Educação, otempo de EJA, o tempo <strong>na</strong>quela <strong>escola</strong> e <strong>como</strong> se sentiam, sen<strong>do</strong> professores <strong>na</strong>quele turno e<strong>na</strong>quele momento.Os processos de escuta seguiram a orientação psica<strong>na</strong>lítica da associação livre 39(FREUD, 1904), enquanto nós buscamos manter <strong>um</strong>a atenção flutuante 40 (FREUD, 1912) deforma a não intervirmos com as nossas expressões no processo de fala. Atravessou-nos aindaa compreensão e postura de <strong>um</strong>a “escuta sensível” (BARBIER, 2004). Sugestão semelhantede não intervenção é dada por Weller (2010c) para o início <strong>do</strong>s grupos de discussão. Com oconsentimento <strong>do</strong>s sujeitos, todas as falas foram gravadas com auxílio de <strong>um</strong> grava<strong>do</strong>r digitale degravadas, constituin<strong>do</strong> sessenta e nove pági<strong>na</strong>s de degravação, conforme termos deconsentimento livre-esclareci<strong>do</strong> (apêndice).


82As falas são quase sempre muito longas. As reuniões demoraram, em média, duashoras. To<strong>do</strong>s os sujeitos apresentaram-se e falaram de suas angústias, ainda que não tenhamospedi<strong>do</strong> que tratassem deste tema. Após a apresentação de to<strong>do</strong>s, retomaram a palavra, parapontuar as falas <strong>do</strong>s colegas. Na reunião <strong>do</strong> dia 3 de março, no entanto, as falas foramconstantemente interrompidas por <strong>um</strong> <strong>do</strong>s sujeitos desta pesquisa, que de forma muitoincisiva fazia comentários reacionários, ainda que os próprios colegas o advertissem de queaguardasse a sua vez.Fomos à <strong>escola</strong> trinta e oito vezes ao longo de <strong>um</strong> ano, momento em quetransitamos entre os alunos e observamos o funcio<strong>na</strong>mento <strong>do</strong> turno. Também solicitamos <strong>um</strong>conjunto de <strong>do</strong>c<strong>um</strong>entos da <strong>escola</strong> e <strong>do</strong>s alunos para que pudéssemos a<strong>na</strong>lisá-los: o ProjetoPolítico Pedagógico - PPP, a listagem <strong>do</strong>s alunos <strong>do</strong> turno com da<strong>do</strong>s básicos, o livro deocorrências diárias, o livro ata de reuniões, a pasta de alguns alunos que apresentaram maiordificuldade de adaptação, a ficha funcio<strong>na</strong>l <strong>do</strong>s professores <strong>do</strong> turno vespertino etc.Vivenciamos dificuldade com <strong>um</strong> membro da equipe que, não obstante o memoran<strong>do</strong> daSEDF autorizan<strong>do</strong> a pesquisa, relutou em oferecer-nos da<strong>do</strong>s de professores. Ainda assim osobtivemos por meio de <strong>um</strong>a intervenção da CRE.Outras açõesA pedi<strong>do</strong> da direção da <strong>escola</strong> e de alguns professores, sentamo-nos com o grupo,para falar a eles das primeiras impressões que tínhamos de nosso processo de escuta.A direção da <strong>escola</strong> solicitou <strong>um</strong>a fala com os professores, sobre a temática daviolência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, o que fizemos com to<strong>do</strong>s os professores <strong>do</strong> diurno <strong>na</strong> segunda sema<strong>na</strong> deaula <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> semestre, com boa receptividade. Fizemos <strong>um</strong>a fala aos pais <strong>um</strong>a sema<strong>na</strong>após o retorno das aulas no segun<strong>do</strong> semestre, porém, com adesão muito peque<strong>na</strong>, o queacreditamos ter ocorri<strong>do</strong> em razão <strong>do</strong> dia, <strong>do</strong>s horários (<strong>um</strong>a quarta-feira à tarde), sobretu<strong>do</strong>,pelas representações que os pais já possuem sobre a <strong>escola</strong> e <strong>como</strong> trata das dificuldades deseus filhos.Também realizamos <strong>um</strong> grupo focal com seis alunos <strong>do</strong> sexo masculinoescolhi<strong>do</strong>s pela <strong>escola</strong> e conversamos muito com alguns deles, apesar de não termos feito usomais específico desta fonte de da<strong>do</strong>s.Instr<strong>um</strong>entosLevan<strong>do</strong> em consideração os objetivos desta pesquisa, utilizamo-nos de trêsinstr<strong>um</strong>entos de forma direta: grupos de fala e escuta entre os professores <strong>do</strong> turno vespertino,


83análise <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental e observação participante 41 . O processo foi atravessa<strong>do</strong> pela escutasensível, aos moldes <strong>do</strong> que propõe Barbier (2004), e pela observação participante durante<strong>do</strong>is semestres letivos, segun<strong>do</strong> o que Barus–Michel (2004) denomi<strong>na</strong> <strong>como</strong> homotesia(observa<strong>do</strong>r e observa<strong>do</strong>s são da mesma <strong>na</strong>tureza). Trata-se de <strong>um</strong>a relação especular <strong>na</strong> qual“o clínico não é estranho àquilo que busca compreender e talvez não esteja senão à procura desi mesmo e de se surpreender através <strong>do</strong> que supõe diferente” (p. 69). Além disso, aindaancoran<strong>do</strong>-se nesta autora, levou-se em consideração a dessemelhança e a dissimetria 42 d<strong>estar</strong>elação.Tal <strong>como</strong> Barus–Michel (idem), subscrevemos Freud no que nomeou <strong>como</strong>“inquietante estranheza”, para definir aquilo que o observa<strong>do</strong>r busca no outro, evitan<strong>do</strong>reconhecer-se nele. Também subscrevemos esta autora quan<strong>do</strong> defende que o olhar queemprestamos para a observação de alg<strong>um</strong>a forma interfere nos olhares já encontra<strong>do</strong>s.Tivemos o cuida<strong>do</strong> de, seguin<strong>do</strong> as orientações da autora, cuidar, para não servirmo-nos <strong>do</strong>“campo institucio<strong>na</strong>l <strong>como</strong> de <strong>um</strong> palco para representar seu poder e seu saber, verificar suasteorias, agenciar os atores sociais e criar <strong>um</strong>a dinâmica” (p. 178).Para a análise <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental, nos utilizamos de <strong>um</strong>a leitura flutuante <strong>do</strong>s<strong>do</strong>c<strong>um</strong>entos, com atenção especial em <strong>um</strong> da<strong>do</strong> momento à <strong>do</strong>c<strong>um</strong>entação <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s deforma a percebermos <strong>como</strong> foi a caminhada <strong>na</strong> educação <strong>do</strong>s indica<strong>do</strong>s pela <strong>escola</strong> ou queapresentaram problemas sérios de indiscipli<strong>na</strong> e ou violência durante o tempo em que láestivemos. Deste material consta o histórico <strong>escola</strong>r com notas e resulta<strong>do</strong>s fi<strong>na</strong>is de cada anoletivo, ficha de acompanhamento de saúde (ape<strong>na</strong>s para alguns) e histórico das <strong>escola</strong>s pelasquais passaram ao longo de sua caminhada <strong>escola</strong>r.Além da palavra livre para o momento inicial da escuta, importamos para o nossoprocesso de escuta a compreensão de Weller (2010c) quan<strong>do</strong>, subscreven<strong>do</strong> alguns autores,afirma que as “opiniões de grupo não são formuladas, mas ape<strong>na</strong>s atualizadas [...]” e que“estas posições refletem, acima de tu<strong>do</strong>, as orientações coletivas ou as visões de mun<strong>do</strong> <strong>do</strong>grupo social ao qual o entrevista<strong>do</strong> pertence” (p.56), resultantes de “<strong>um</strong>a série de vivências oude experiências ligadas à mesma estrutura que, por sua vez, constitui-se <strong>como</strong> <strong>um</strong>a basecom<strong>um</strong> das experiências que perpassam a vida de múltiplos indivíduos” (p. 57). Portanto,trata-se, mais <strong>do</strong> que buscar conhecer as experiências e as opiniões <strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s, detentar perceber as vivências coletivas de <strong>um</strong> grupo, independentemente <strong>do</strong> que (des)conhecemde si. Bohnsack é <strong>um</strong> <strong>do</strong>s autores evoca<strong>do</strong>s por Weller (op. cit.), para apresentar as opiniões<strong>do</strong> grupo <strong>como</strong> condizentes ao contexto social <strong>do</strong>s sujeitos que participam dele <strong>como</strong>representantes <strong>do</strong> meio social <strong>do</strong> qual são oriun<strong>do</strong>s.


84Entendemos a escuta sensível <strong>como</strong>: “<strong>um</strong> escutar/ver”, <strong>um</strong> esforço por tentarperceber o universo afetivo, imaginário e cognitivo <strong>do</strong> outro, a existencialidade inter<strong>na</strong> <strong>do</strong>outro. Esta escuta pressupõe <strong>um</strong>a aceitação incondicio<strong>na</strong>l <strong>do</strong> outro segun<strong>do</strong> ele, ou seja, <strong>na</strong>spalavras de Barbier, “ass<strong>um</strong>ir <strong>um</strong> ‘vazio cria<strong>do</strong>r’ <strong>na</strong> complexidade <strong>do</strong> objeto” (BARBIER,2004, p.94). Para ajudar-nos a compreender este conceito, Barbier (2004), rebusca Bordieu,com a teoria <strong>do</strong> habitus, Enriquez e Pagès, com suas teorias <strong>do</strong> desconhecimento e da pulsãode morte, para podermos “apreciar o ‘lugar’ diferencial de cada <strong>um</strong> no campo das relaçõessociais, para poder escutar sua palavra ou sua capacidade ‘cria<strong>do</strong>ra’” (BARBIER, 2004, p.97).Antes de perceber a pessoa em seu status, a escuta sensível busca percebê-la emseu ser. Como derivação da escuta psica<strong>na</strong>lítica, a escuta sensível não é <strong>um</strong>a projeção denossas angústias ou desejos; não se trata de interpretação <strong>do</strong>s fatos segun<strong>do</strong> <strong>um</strong>a teoria,aproximan<strong>do</strong>-se da “admiração ingênua” (BORNHEIM, 1998) ou de <strong>um</strong>a tentativa desuspensão fenomenológica.As interpretações são possíveis quan<strong>do</strong> de aproximação e estabelecimento de <strong>um</strong>arelação (contra)transferencial (BARUS–MICHEL, 2004), mas, desde que não seja projeção<strong>do</strong> desejo <strong>do</strong> a<strong>na</strong>lisa<strong>do</strong>r/pesquisa<strong>do</strong>r. Nas palavras de Ar<strong>do</strong>ino (1985), trata-se de propor e nãode impor interpretações, pois cada experiência é única e não redutível a nenh<strong>um</strong> modelo.Quan<strong>do</strong> isto ocorre, “tu<strong>do</strong> é continuamente retraduzi<strong>do</strong> em função <strong>do</strong> contexto.” (p. 98).Apoia-se sobre a totalidade complexa da pessoa e, para tanto, utiliza-se de to<strong>do</strong>s os senti<strong>do</strong>s,inclusive da sensibilidade <strong>do</strong> pesquisa<strong>do</strong>r. A escuta sensível é <strong>um</strong>a presença meditativa, o queBarbier (2004) traduz <strong>como</strong> <strong>um</strong>a epoke para além da teoria, <strong>um</strong>a hipervalorização.Especificamente para a análise da fala <strong>do</strong>s sujeitos, utilizamo-nos da hermenêutica ancorada<strong>na</strong> compreensão de Weller (2007), Barus-Michel (2004), Bornheim (1998), Laplanche (1992e 1999) e de Belo (2003).O processo de interpretaçãoEntender <strong>um</strong> texto é integrá-lo nos horizontes de inteligibilidade pelos quaisestruturamos nosso mun<strong>do</strong>.HeideggerAlém das contribuições já citadas, especialmente Barus-Michel (2004),compreendemos a interpretação <strong>como</strong> processo semelhante à investigação a<strong>na</strong>lítica que buscao discurso latente das palavras (LAPLANCHE e PONTALIS, 1998) e que se iniciou já <strong>na</strong>leitura, influencia<strong>do</strong>s que somos pela comunidade interpretativa à qual nos afiliamos. Logo,aceitamos que os significa<strong>do</strong>s não pertencem ape<strong>na</strong>s aos textos, mas passam às nossas


tradição.” 44 Ten<strong>do</strong> em vista nossas afiliações à psicanálise e à complexidade, compreendemos85construções (BELO, 2003). Para este autor, tal qual para Weller (2010c), “o que produzentendimento entre as pessoas não é o fato de saberem o significa<strong>do</strong> das palavras, mas o fatode compartilharem <strong>um</strong>a forma de vida” (p. 197). Por forma de vida, o autor compreende oentrelaçamento entre <strong>um</strong>a cultura, <strong>um</strong>a visão de mun<strong>do</strong> e <strong>um</strong>a linguagem. Sen<strong>do</strong> assim, ocontexto foi o pano de fun<strong>do</strong> para esta interpretação.A partir das leituras das falas de nossos sujeitos, privilegiamos e ignoramossignifica<strong>do</strong>s 43 . Mas, esforçamo-nos no senti<strong>do</strong> de que nossa comunidade interpretativa enossas compreensões fossem colocadas o quanto possível em suspenso, <strong>como</strong> propõeBornheim (1998), de forma que fizéssemos “<strong>um</strong>a hermenêutica que privilegia a <strong>na</strong>rrativadaquele que a constrói e que pode, em qualquer tempo, refazer os senti<strong>do</strong>s” (MAZARGÃO,1996, p. 91). Mas, não nos iludimos quanto ao que o pragmatismo tem chama<strong>do</strong> de objetivo,pois, conforme defende Rorty (1991, p. 266): “O termo ‘objetivo’ é defini<strong>do</strong> pelospragmáticos não <strong>como</strong> <strong>um</strong>a relação com as características intrínsecas de objetos, mas, antes,por referência à facilidade relativa de atingir consenso entre investiga<strong>do</strong>res”. SubscrevemosGadamer (1997, p. 407), para quem, apesar <strong>do</strong> fato de pertencer a <strong>um</strong>a comunidadeinterpretativa equivaler a possuir preconceitos, “o preconceito básico da Aufklärung é opreconceito contra os preconceitos, enquanto tais, e, com isso, a despotencialização dacom Belo (2003, p. 2012-213) que, “interpretação não é a arte de a<strong>na</strong>lisar (partir em pedaços),até que se alcance o que ‘realmente é’ o objeto em estu<strong>do</strong>, mas a arte de construir (adicio<strong>na</strong>rpedaços a) esse objeto”. Pretendemos, assim, expor e não impor nossas percepções, movi<strong>do</strong>sque somos por dupla motivação: vontade de suspeita e vontade de escuta, visto que a fala nosé endereçada à maneira de <strong>um</strong>a mensagem cifrada.Desta forma, para além <strong>do</strong> texto manifesto, tentamos buscar o latente, sem <strong>na</strong>daomitir nem privilegiar a priori. Orienta<strong>do</strong>s por Laplanche (1992, p.26), para quem:Interpretar é se segurar, sem [se] deixar preso às margens <strong>do</strong> discurso, aceitan<strong>do</strong> nãover mais longe que o passo seguinte, anima<strong>do</strong> somente pela certeza de que os traços<strong>do</strong> caça<strong>do</strong>r acabarão por desenhar, pela retomada de seus inúmeros entrelaços, osnós significativos que determi<strong>na</strong>m certa sequência inconsciente.Apesar de nos utilizamos de <strong>um</strong>a hermenêutica psica<strong>na</strong>lítica, reconhecemos queesta seria mais rica e mais a<strong>na</strong>lítica se pudéssemos construí-la com a confrontação junto aossujeitos da pesquisa, o que não foi possível pelas limitações de tempo <strong>do</strong> mestra<strong>do</strong>.No primeiro momento, degravamos todas as falas, obten<strong>do</strong> <strong>um</strong> vol<strong>um</strong>e desessenta e nove pági<strong>na</strong>s de textos transcritos. Em seguida, lemos exaustiva e reiteradamente


86os da<strong>do</strong>s. A cada nova leitura, novas impressões vinham-nos à percepção. Esta leitura semprenos causou <strong>um</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> que se manifestava no corpo, semelhante ao que sentimos quan<strong>do</strong><strong>do</strong>s processos de escuta.Para a organização inicial <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s, separamos por núcleos de senti<strong>do</strong>. Paratanto, imprimimos e recortamos as falas degravadas pelo que entendíamos aproximavam-seem senti<strong>do</strong>. Colamos estas aproximações <strong>na</strong>s paredes de nosso escritório residencial. Ficouvisualmente claro que o sofrimento no trabalho era o principal núcleo de senti<strong>do</strong>, visto queagremiava o maior número de recortes, além da multiplicidade de ligações que possuía <strong>como</strong>s demais núcleos. O segun<strong>do</strong> núcleo de senti<strong>do</strong> dizia respeito à indiscipli<strong>na</strong> e ou à violência<strong>na</strong> <strong>escola</strong>, o que passava pela discussão da autoridade, da democracia e da lei <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.Outros núcleos menores formaram-se, mas sempre atravessa<strong>do</strong>s ou <strong>na</strong> órbita <strong>do</strong>s já cita<strong>do</strong>s.Dialogamos com cada <strong>um</strong>a destes temas de forma escrita, produzin<strong>do</strong> <strong>um</strong>a grandequantidade de texto escrito, o que nos pareceu <strong>um</strong>a análise mais literal e superficial <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s.Assim, percebemos três grandes unidades de senti<strong>do</strong> que se ligavam aos objetivos destapesquisa: 1: a <strong>escola</strong> e ou o a<strong>do</strong>lescente em crise e ou conflito com a lei, 2: as distintaspercepções que o sujeito-professor tem <strong>do</strong> aluno e da a<strong>do</strong>lescência e ou da juventude e 3: osofrimento psíquico no trabalho. Como proposta de enfrentamento e ten<strong>do</strong> em vista aemergência das falas <strong>do</strong>s sujeitos, refletimos sobre a formação profissio<strong>na</strong>l ante os desafiosque se apresentam pela prática. Realizamos, então, o registro <strong>do</strong> diálogo entre o pesquisa<strong>do</strong>r,as falas <strong>do</strong>s sujeitos de pesquisa e os teóricos que embasaram nossa caminhada. O resulta<strong>do</strong>desta conversa encontra-se registra<strong>do</strong> no capítulo que segue.


87CAPÍTULO 5ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOSA educação é o ponto em que decidimos se amamos o mun<strong>do</strong> o bastante para ass<strong>um</strong>irmos aresponsabilidade por ele, e, com tal gesto, salvá-lo da ruí<strong>na</strong> que seria inevitável não fosse arenovação e a vinda <strong>do</strong>s novos e <strong>do</strong>s jovens. A educação é, também, onde decidimos se amamosnossas crianças o bastante para não expulsá-las de nosso mun<strong>do</strong> e aban<strong>do</strong>ná-las aos seuspróprios recursos e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alg<strong>um</strong>acoisa nova e imprevista para nós, preparan<strong>do</strong>-as em vez disso com antecedência para a tarefa derenovar o mun<strong>do</strong> com<strong>um</strong>.(ARENDT, 2001, p. 247).Os sujeitos desta pesquisa falam-nos de sofrimentos em ressonância, de <strong>um</strong>profun<strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>do</strong>cente, que, para além das nossas hipóteses iniciais e <strong>do</strong> que jáindicavam outras pesquisas e discussões feitas pela academia, revelou-se no movimento(contra)transferencial no ambiente da pesquisa, quan<strong>do</strong> de nossa imersão e em to<strong>do</strong>s osmomentos em que lidamos com as falas ao longo da análise. Como não poderia deixar de ser,as causas e as formas de manifestação deste <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> variam de acor<strong>do</strong> com as peculiaridadesde cada subjetividade, mas <strong>do</strong>is eixos entrecortam-se e confundem-se <strong>na</strong>s falas da quasetotalidade <strong>do</strong>s sujeitos: o sofrimento coloca<strong>do</strong> pelos novos contextos de trabalho, que estáassocia<strong>do</strong>, muito de perto, à questão da indiscipli<strong>na</strong> e ou da violência e da não aprendizagem.Dos dezoito sujeitos escuta<strong>do</strong>s, ape<strong>na</strong>s <strong>do</strong>is afirmaram não ter problema com a indiscipli<strong>na</strong> eou a violência no cotidiano de seu trabalho.Das falas emerge que, para este coletivo de sujeitos, tanto a indiscipli<strong>na</strong> e ou aviolência quanto a não aprendizagem colocam em xeque a competência <strong>do</strong> professor, o querecai para a sua autoridade e o seu valor. Esse aspecto já é aponta<strong>do</strong> por várias abordagensque se têm debruça<strong>do</strong> sobre a questão, conforme já visto em nossa fundamentação teórica, emPain (2003) e Dubet (1997) e que se mostrará <strong>na</strong>s falas <strong>do</strong>s sujeitos.Apesar de percebermos o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>do</strong>cente antes e durante esta imersão,iniciamos esta caminhada mais focaliza<strong>do</strong>s no <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>juvenil</strong>, ten<strong>do</strong> em vista a condição desilenciamento e assujeitamento no ambiente <strong>escola</strong>r 45 . Todavia, a imersão e os da<strong>do</strong>scolocaram-nos defronte a <strong>um</strong> sofrimento <strong>do</strong>cente cujas proporções ignorávamos. Tanto éassim que não dispúnhamos de <strong>um</strong> capítulo no referencial teórico que tratasse da questão, oque teve de ser elabora<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> e <strong>na</strong> análise <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s.Outras questões comparecem às falas sempre associadas às anteriores: amodalidade de Educação de Jovens e Adultos e da gestão da <strong>escola</strong>, o conflito geracio<strong>na</strong>l, asfragilidades da formação <strong>do</strong>cente, a maneira <strong>como</strong> se percebe a diversidade presente <strong>na</strong>s salasde aula, a família <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s, as drogas <strong>na</strong> <strong>escola</strong> etc.


88Conforme já discuti<strong>do</strong> <strong>na</strong> meto<strong>do</strong>logia, elegemos, então, três destes temas, ten<strong>do</strong>em vista a relevância demonstrada pela quantidade de vezes que emergem <strong>do</strong>s discursos <strong>do</strong>s<strong>do</strong>centes, os objetivos desta pesquisa e as limitações de tempo e espaço próprias <strong>do</strong> mestra<strong>do</strong>.Foram eles: a <strong>escola</strong> e o a<strong>do</strong>lescente em crise e ou conflito com a lei, o olhar sobre o lugar ouo papel de aluno versus a condição <strong>juvenil</strong> e o sofrimento psíquico <strong>do</strong> professor, quenomeamos <strong>como</strong> discurso <strong>do</strong>(c)ente. No intuito de contribuir com as políticas públicas daEducação, fizemos breves reflexões sobre a formação <strong>do</strong>cente, visto a força com que estatemática compareceu <strong>na</strong>s falas e alguns equívocos que, de nossos lugares de professor epesquisa<strong>do</strong>r, por vezes, temos assisti<strong>do</strong> em torno da questão. A modalidade de EJA e a gestãoda <strong>escola</strong> estão presentes <strong>na</strong> temática <strong>do</strong> olhar <strong>do</strong>cente sobre o discente.Assim, se pudéssemos construir <strong>um</strong>a única fala <strong>do</strong> sujeito coletivo (BARBIER,2004), diríamos que os nossos sujeitos nos falam de sua longa experiência <strong>na</strong> educação, quenão vem dan<strong>do</strong> conta <strong>do</strong>s atos disruptivos, provoca<strong>do</strong>s pelos alunos-jovens, que recusam-se àautoridade, o que lhes tem provoca<strong>do</strong> estratégias de enfrentamento entre a submissão, a fuga ea luta. Tu<strong>do</strong> isto graças à omissão da família. Como forma de ilustrar a dimensão desteconflito, vejamos o que nos diz <strong>um</strong> <strong>do</strong>s sujeitos:Eu não posso dar porrada nele. Apesar que eu digo sempre, se <strong>um</strong> aluno desse... eunão vou brigar com ele, mas se ele partir para cima de mim, pode ter certeza, eu vouquebrar ele no pau. O que eu puder quebrar nele, o braço, a per<strong>na</strong>, a cara, eu vouquebrar. Porque eu vou ser preso de qualquer maneira, porque ele vai me dar <strong>um</strong>tapa, eu vou dar outro nele. Só que eu não vou dar <strong>um</strong> tapa nele. Eu vou quebrar acara dele, porque ele vai ter que respeitar. Ou ele me respeita <strong>como</strong> professor, ouentão vai respeitar <strong>como</strong> <strong>um</strong> troglodita. Porque eu não vou admitir que <strong>um</strong> aluno mebata. Eu não vou permitir! Pode ser que ele me bata, mas o que eu puder quebrarnele, eu vou quebrar nele (SUJEITO 14-M 46 ).Por questão de curiosidade científica, muito adequada para a nossa condição demestran<strong>do</strong>, após termos feito a análise hermenêutica, exami<strong>na</strong>mos os da<strong>do</strong>s de nossos sujeitoscom o auxílio <strong>do</strong> programa ALCESTE, e qual foi a nossa surpresa, ao perceber que parte dacitação em epígrafe (em itálico) foi escolhida pelo programa <strong>como</strong> a que apresentava o maiorKhi2 (45) entre todas as falas recortadas, pertencen<strong>do</strong> à unidade de senti<strong>do</strong> que, entre asquatro encontradas pelo software, apresentava a maior porcentagem no conjunto: 34,6%.Michel Extertier (apud COLOMBIER, MANGEL e PERDRIAULT, 1989, p.101) nos se “a primeira coisa - senão a única - a fazer fosse conseguir exorcizar esta vontadede poder total, esta negação de outro autônomo que o ideal pedagógico esconde tão bem”.Jacques Pain (2003), discutin<strong>do</strong> o espaço da sala de aula <strong>como</strong> tem se hegemonicamentecoloca<strong>do</strong>, fala-nos de <strong>do</strong>is caminhos para o professor: a sedução ou a imposição. Ao aluno,


89restam três possibilidades: submeter-se, fugir ou lutar. A fala <strong>do</strong> sujeito 14-M anuncia <strong>um</strong>misto fragilidade e defesa, de luta e permite-nos retocar o pensamento de Jacques Pain nosenti<strong>do</strong> de reconhecer que não é mais prerrogativa <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s submeter-se, fugir ou lutar.A submissão fala-nos de <strong>um</strong>a condição transitória, da desistência direcio<strong>na</strong>da pelapulsão de morte 47 , que tenta negar o conflito enquanto o sujeito não se aniquile. A fuga ocorrepor múltiplos caminhos de negação <strong>do</strong> confronto e <strong>do</strong> conflito, e a luta tanto pode ocorrer porestratégias criativas, quanto destrutivas. Lutar pela profissão, promoven<strong>do</strong> <strong>um</strong> diálogosaudável com a realidade é <strong>um</strong> caminho criativo; tentar a morte simbólica <strong>do</strong> estudante é <strong>um</strong>caminho destrutivo e gera<strong>do</strong>r de mais sofrimento.O sujeito 14-M expressa <strong>um</strong>a luta que antes de materializar-se no aluno que não ovê <strong>como</strong> merece<strong>do</strong>r de respeito, trava-se em seu psiquismo, conforme emerge da fala que sesegue:Estão deixan<strong>do</strong> a nossa situação calamitosa. É... e <strong>um</strong>a das coisas que eu estouindig<strong>na</strong><strong>do</strong> e a vontade de deixar... se eu pudesse... assim...mais idade eu ia deixar aSecretaria de Educação [...] Eu fiz concurso para dar aula.[...] E às vezes eu pego... eu fico pensan<strong>do</strong> assim, será que... às vezes eu ficopensan<strong>do</strong> assim: eu vou pedir para sair da <strong>escola</strong>, [...]. Me deixa muito... é...entristeci<strong>do</strong>. Magoa<strong>do</strong> é... (o professor embola a voz e não dá para entender). Mas eufico muito triste. Às vezes, chego em casa, e minha mulher não entende que eu tôassim, cabisbaixo, e ela pensa: “Não, o que aconteceu... meio triste? Você d... “Nadanão”. É porque você não consegue produzir e <strong>um</strong> cidadão que pensa que ele nãoproduz <strong>na</strong>da, se ele não for medíocre, ele fica triste. E eu ainda não faço parte <strong>do</strong>smedíocres ainda (SUJEITO 14-M).A agressividade, <strong>na</strong> fala <strong>do</strong> sujeito 14-14 anteriormente citada, é claramentefocalizada no aluno; nesta última, mostra-se voltada contra seu próprio psiquismo, n<strong>um</strong>processo de sofrimento que será trabalha<strong>do</strong> no terceiro núcleo de senti<strong>do</strong>, aqui recorta<strong>do</strong>.As falas revelam-nos a <strong>escola</strong> <strong>como</strong> <strong>um</strong> espaço de conflito, que entendemos <strong>como</strong>o conflito com o outro, com a lei, real ou simbólica e que se denunciou a tal ponto que foiescolhi<strong>do</strong> pelo software <strong>como</strong> o que melhor expressava a fala <strong>do</strong> conjunto. Inúmeros são osestu<strong>do</strong>s que chegaram a conclusões semelhantes. 26Contu<strong>do</strong>, ao contrário <strong>do</strong> que possatransparecer a <strong>um</strong> olhar menos atento, este conflito decorre da pulsão de vida e não da pulsãode morte. Fala-nos de <strong>um</strong>a luta. De <strong>um</strong>a crise da esperança.Também ouvimos os ecos <strong>do</strong>s conflitos quan<strong>do</strong> realizamos com os alunos o grupofocal. Eles referiram-se a alg<strong>um</strong>as aulas <strong>como</strong> boas, porque os professores são bons, e a aulasruins, porque os professores não são bons. Questio<strong>na</strong><strong>do</strong>s quanto ao que era <strong>um</strong> professor bome <strong>um</strong> professor ruim, declararam que o primeiro os vê além da condição de aluno e o segun<strong>do</strong>os julga e diminui-os. Além disso, referiram-se, com admiração, aos colegas que agrediram osprofessores que chamam de “folga<strong>do</strong>s”.


90Vemos o conflito nos olhos arregala<strong>do</strong>s de alguns professores quan<strong>do</strong> é notifica<strong>do</strong><strong>um</strong> caso de agressão de professor por parte de <strong>um</strong> aluno. Como nos diz o sujeito 7-F:Então, eu tenho me<strong>do</strong>! [...] É... <strong>como</strong> foi discuti<strong>do</strong> ontem: abraçar esse aluno. E...eu... pessoalmente, eu ainda tenho me<strong>do</strong>, né? Quan<strong>do</strong> eu saio de casa, eu saioarmada, preparada, tentan<strong>do</strong> me preparar para o que eu possa encontrar. É... <strong>como</strong> eufalei, são situações que eu nunca imaginei encontrar.Conforme vimos (BRASIL, 2005; TEIXEIRA e PORTO, 1998), me<strong>do</strong> geraviolência. Este clima (PAIN, 2003) alimenta fantasmas que ancoram as percepções <strong>do</strong>s atoresque se alistam ou são alista<strong>do</strong>s para esta “batalha”. As origens deste conflito ficaramclaramente demarcadas em nossa fundamentação teórica: o a<strong>na</strong>cronismo da <strong>escola</strong>, seufuncio<strong>na</strong>mento perverso, o que acentua o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> de seus atores (pouco autores), sobretu<strong>do</strong><strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente e ou <strong>do</strong> jovem pelo seu momento no ciclo de vida e pelas condições culturaisda pós-modernidade; o silenciamento, o autoritarismo, a desregulamentação etc.A <strong>escola</strong> e o a<strong>do</strong>lescente em crise e ou conflito com a leiSó que, depois da aplicação da lei 8.069, toda mãe de delinquente e os própriosdelinquentes sabem, de cor e saltea<strong>do</strong>, to<strong>do</strong>s os direitos. Só que eles esquecem osdeveres, e esses deveres estão deixan<strong>do</strong> a nossa situação calamitosa. [...] É que nóstemos alunos que não têm limites(SUJEITO 14-M).Os professores sujeitos desta pesquisa apresentam, claramente, os atos disruptivos<strong>do</strong>s alunos, de indiscipli<strong>na</strong> e ou violência, <strong>como</strong> a fala mais com<strong>um</strong>, e a causa da situação de<strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> que vivenciam. O contexto relata<strong>do</strong> por eles e percebi<strong>do</strong> por nós é de crise. Eles aassociam à perda da autoridade <strong>do</strong>cente, à falta de respeito que os alunos apresentam comrelação aos professores, à falta de limites e à falta de princípios e ou de educação por parte<strong>do</strong>s alunos. De to<strong>do</strong>s os sujeitos que verbalizaram quadros de sofrimento no trabalho, ape<strong>na</strong>s<strong>um</strong> não o associou às questões citadas. Selecio<strong>na</strong>mos <strong>um</strong>a das falas:Me sinto completamente incapaz em lidar com esse...essa situação de... de... dedesrespeito... a... Pra mim, a principal palavra é falta de respeito! Não é? Com oprofessor. Falta de respeito com o professor, a falta de limite que eles não têm. Elesnão sabem o que é limite, eles não sabem o que são regras, o direito de <strong>um</strong> termi<strong>na</strong>quan<strong>do</strong> começa o direito <strong>do</strong> outro... eles não sabem disso. Eles não têm a noçãobásica <strong>do</strong> direito. Não tem! É <strong>um</strong>a coisa que eu nunca vi isso ... (SUJEITO 13-M).A <strong>escola</strong>, por falta de <strong>um</strong>a regulação, traz para dentro de si a norma (desregulada)da rua, tal qual observou Dubet (1997). Chegamos a dizer aos professores, por solicitação de<strong>um</strong> parecer provisório da impressão inicial que tivemos, que eles estavam reféns <strong>do</strong>s alunos.Eles, claramente, não gostaram, pois a grande maioria gostaria ter ouvi<strong>do</strong> o discurso <strong>do</strong>


91mestre ou o <strong>do</strong> universitário, mas de preferência que os desresponsabilizassem eresponsabilizasse, culpasse, poden<strong>do</strong> até psicopatologizar e medicalizar, alguém ou algo;tínhamos a impressão de que queriam ouvir que os alunos não prestam, que caminhamos parao caos, que a solução <strong>estar</strong>ia em transferir estes alunos, que os alunos em c<strong>um</strong>primento demedida socioeducativa deveriam estudar no PROEM ou <strong>na</strong> EMMP 48 , que eles sãocoitadinhos, que precisam <strong>do</strong> colo da mãe que tu<strong>do</strong> pode contra a madrasta Secretaria deEducação, corresponsável pelo quadro que vivenciam etc. Postura regressiva 49 muito com<strong>um</strong>quan<strong>do</strong> em contextos nos quais o ego é ameaça<strong>do</strong>.Em outro senti<strong>do</strong>, declaramos a necessidade de estruturar (PAIN, 2003), deregular (DUBET, 1997), de construir a lei-símbolo e não se restringir à lei-código que seancora n<strong>um</strong>a sanção vazia (IMBERT, 2001), de estabelecer <strong>um</strong>a relação democrática(ESTÊVÃO, 2008; SANTOS GUERRA, 2002), de avançar para além <strong>do</strong> eixo professorconhecimento(HOUSSEAYE, 1996), de considerar a condição <strong>juvenil</strong> <strong>do</strong>s alunos(DAYRELL, 2007; DUBET, 1997), de reconhecer a corresponsabilidade da <strong>escola</strong> <strong>na</strong>produção <strong>do</strong> fracasso (PATTO, 1999; GONZÁLES ARROYO, 2007). Contu<strong>do</strong>, esta não foi<strong>um</strong>a postura de to<strong>do</strong> o grupo, <strong>como</strong> bem expressão o sujeito 7-F:Então, eu acho que a gente não está conseguin<strong>do</strong>... é... eu acho que a gente estámuito mais inserida <strong>na</strong> realidade deles <strong>do</strong> que a gente está conseguin<strong>do</strong> trazer essesmeninos para a nossa realidade. Sabe?Assim, a “realidade deles” é a regra (desregulada) da rua (DUBET, 1997), é afragilidade da regra das gangues (PEREIRA, 2008), o que também foi discuti<strong>do</strong> por Kehl(2000) e por Driew (2010) ao abordarem a função <strong>do</strong> grupo para o a<strong>do</strong>lescente. É com<strong>um</strong> afala de que os alunos entram e saem de sala continuamente, o que observamos peloscorre<strong>do</strong>res da <strong>escola</strong>, usam telefone celular e aparelhos de som em sala de aula, passeiamconstantemente pelas portas e pelas janelas das salas em que há aula, usam termos de baixocalão, inclusive, para com os professores, agridem-se mutuamente, faltam a muitas aulas,usam drogas dentro da sala de aula, enfrentam os professores. Houve casos de agressão: aqueima <strong>do</strong> cabelo da professora, o murro em <strong>um</strong> professor e a ameaça a professores.Apesar de parecer caricatura<strong>do</strong>, os sujeitos 7-F, 13-M, 14-M e 16-F relataramsituações em que viram o aluno usan<strong>do</strong> maconha ou cocaí<strong>na</strong> em sala de aula. Dois destessujeitos relataram <strong>um</strong> esta<strong>do</strong> de choque, por ser a primeira vez que viram, diretamente, <strong>um</strong>adroga ilícita, sen<strong>do</strong> que <strong>um</strong> deles pegou em <strong>um</strong>a droga ilícita pela primeira vez. Vejamosalg<strong>um</strong>as das falas que denunciam a fragilidade da lei <strong>na</strong> <strong>escola</strong>:


92Eu fiquei assustadíssimo com <strong>um</strong>a alu<strong>na</strong>... com alu<strong>na</strong>... Eu não soube <strong>como</strong> lidarcom ela. A alu<strong>na</strong>, desculpe a palavra, ela era <strong>um</strong>a maníaca sexual. Eu fiqueicompletamente constrangi<strong>do</strong> dentro da sala de aula. Não vou nem repetir o que elafalou. (Os colegas pedem que ele fale, e ele, por várias vezes nos pergunta se podefalar, no que orientamos que ficasse à vontade). “Professor, eu <strong>do</strong>u <strong>um</strong>a chupadagostosa, quer experimentar?” [...] E voltan<strong>do</strong> à questão da... da violência mesmotrabalhan<strong>do</strong> em lugares ditos perigosos, em noturnos, à noite, eu nunca vi <strong>um</strong>asituação <strong>como</strong> esta! Uma situação de... de desrespeito, de... assim: completo...profes... Nós... eu me sinto <strong>um</strong>... <strong>um</strong>... igual eu coloquei pro aluno <strong>um</strong> dia: eu mesinto <strong>um</strong> idiota em sala de aula (SUJEITO 13-M).Esta desregulação é percebida e anunciada por muitos deles:Nós estamos n<strong>um</strong>a situação incontrolável, que eu não consigo dar aula. [...] Porquenós não estamos conseguin<strong>do</strong> dar a aula. Os alunos não respeitam nós, osprofessores, e essa é a nossa grande angústia (SUJEITO 14-M).Inúmeros foram os relatos que ouvimos com situações tão sérias quanto as cita<strong>do</strong>sacima. A observação ancorada <strong>na</strong> teoria comprovou-nos que esta não é a única causa da criseda <strong>escola</strong>. Contu<strong>do</strong>, apesar de não se referirem, de forma direta, à crise ampla, os professoresapontam r<strong>um</strong>os que nos levam a ela, quan<strong>do</strong>, sobretu<strong>do</strong>, responsabilizam a família pela causa<strong>do</strong> momento que vivenciam.Mas, à tarde, estes meninos vêm de <strong>um</strong>a... é... <strong>um</strong>a desestrutura familiar terrível(SUJEITO 6-F).São os alunos que... São os alunos que vêm de casa, que não têm princípio. Eles nãotêm princípios. Então, o que acontece? Vem de casa e chega <strong>na</strong> sala de aula e pensaque nós somos igual os pais dele, que ele manda o pai tomar no toba, e quer mandara gente. Como manda! Como outro dia <strong>um</strong> man<strong>do</strong>u o diretor tomar, e o diretor nãotomou nenh<strong>um</strong>a atitude (SUJEITO 14-M).É compreensível que as falas de nossos sujeitos se centrem nestas duasinstituições, a família e a <strong>escola</strong>, ten<strong>do</strong> em vista o lugar de destaque que ocupavam no modelode sociedade complementar e os ataques que sofrem desde mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século XX (DUBET,1996; EISENSTADT, 2007). No caso da família, podemos, com auxílio de Walsh (2005),perceber que o professor continua com a percepção idealizada de <strong>um</strong>a família nuclear,machista e patriarcal. Para estes sujeitos, as famílias de nossos educan<strong>do</strong>s não têm a figura <strong>do</strong>pai, <strong>como</strong> nos revela o sujeito 5-F:É <strong>como</strong> o sujeito 6 fala: a autoestima da... da mãe. Geralmente é da mãe. Não temnem pai. É <strong>um</strong>a família mais de mãe, de avó e de tio (SUJEITO 5-F).Mesmo assim, essa percepção não encontra sustentação em inúmeras pesquisasestatísticas realizadas nos últimos anos (IBGE, 2010; IBGE, 2011; IBGE, 2009b;ABRAMOVAY, 2009). Walsh (2005) demonstra que esta instabilidade alegada à família jáfoi maior quan<strong>do</strong> não havia os méto<strong>do</strong>s anticonceptivos, a mortalidade infantil era mais alta,era mais com<strong>um</strong> a presença de agrega<strong>do</strong>s, os valores de castidade eram mais impositivos, aideia de que a mulher ocupava <strong>um</strong> lugar ti<strong>do</strong> <strong>como</strong> de menor valor no lar era mais<strong>na</strong>turalizada, e a expectativa de vida era menor.


93Nesse senti<strong>do</strong>, a saída da mulher para o merca<strong>do</strong> é feita com prejuízo para ela,ten<strong>do</strong> em vista que o homem não ocupou lugares que foram deixa<strong>do</strong>s por elas. Isso temgera<strong>do</strong> a segunda jor<strong>na</strong>da de trabalho e a culpabilização, <strong>como</strong> fica claro <strong>na</strong>s falas <strong>do</strong>s sujeitosdesta pesquisa.Eles colocam o aluno aqui e nós... Deus e nós tomamos conta. Deus e nós tomamosconta. É o que está acontecen<strong>do</strong>. Então, a gente precisa trazer a família para aresponsabilidade. Dizer pro pai: seu filho tem só 15 anos, pai. Você é responsável.Se você não é, o Conselho Tutelar vai dizer quem é (SUJEITO 1-F).A fala <strong>do</strong> sujeito 1 revela o desconhecimento que a <strong>escola</strong> tem da situação dafamília, pois tem-se a impressão de que a família sabe e pode fazer algo que, por decisão,resolveu não fazer.Discutimos com Obiols (2002) as novas configurações familiares - formadas porpais adultos-a<strong>do</strong>lescentes, n<strong>um</strong>a nova configuração da a<strong>do</strong>lescência - no processo dereabertura democrática, redesenharam a relação com os filhos baseada em relações de podermais flexíveis e de mais expressões de afeto, o que não é encontra<strong>do</strong> <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Birman (2006)esclareceu-nos sobre o déficit afetivo que os jovens têm leva<strong>do</strong> <strong>na</strong> mochila para as <strong>escola</strong>s,sobre o qual nos confirma <strong>um</strong> de nossos sujeitos:Já outros, a gente vê que é mais <strong>um</strong>a questão de carência mesmo, que eles escorrempara onde tem alguém de braços abertos, e, às vezes, quem está de braços abertos é otraficante. [...] eles acabam enxergan<strong>do</strong> <strong>na</strong> gente figuras mater<strong>na</strong>s, pater<strong>na</strong>s, é...irmãos, é,... esperam da gente o tratamento que eles não têm em casa, muitos seapegam demais às professoras (SUJEITO 7-F).O conjunto destas falas aponta-nos <strong>um</strong>a explicação ampla para o contexto relata<strong>do</strong>pelos sujeitos de pesquisa: a desregulamentação apresentada pelo mun<strong>do</strong> pós-moderno.Saímos <strong>do</strong> contexto de <strong>um</strong>a sociedade complementar <strong>na</strong> qual havia forte interdependênciaentre as instituições responsáveis pela socialização das novas gerações (EISENSTADT, 2007)para o que Dubet (1998) chama de “desinstitucio<strong>na</strong>lização <strong>do</strong> social”, <strong>na</strong> qual assubjetividades não são mais orientadas por pautas estáveis, ten<strong>do</strong> em vista a variedade depluralidade de lógicas de ação que organizam a experiência social <strong>do</strong>s sujeitos. Além disso,Ba<strong>um</strong>an (1998) aponta a fluidez da teia social que é apresentada para que os sujeitos seenredem.Ante este contexto, a crise com a lei é ape<strong>na</strong>s <strong>um</strong> <strong>do</strong>s elementos-<strong>sintoma</strong>sprovoca<strong>do</strong>res <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>do</strong>cente. Por esta breve caminhada, podemos concluir que a <strong>escola</strong>se encontra a<strong>na</strong>crônica, e desta relação com a família derivam duas consequências: oacirramento da resistência da <strong>escola</strong> ante a percepção de rendição da família e o declínio <strong>do</strong>nome-<strong>do</strong>-pai. Eisenstadt (2007) defende que a discrepância entre a família e o restante social é<strong>um</strong>a estrutura universal <strong>na</strong> pós-modernidade, caben<strong>do</strong> à <strong>escola</strong> e ao grupo <strong>juvenil</strong> cimentar


94este hiato, o que, segun<strong>do</strong> Re<strong>na</strong>ult (2004), coloca a <strong>escola</strong> <strong>como</strong> menos suscetível a aceitar odeclínio da autoridade ao tempo em que não consegue impedir o que se dá no seu exterior.Em outros termos, ante <strong>um</strong>a percepção da deserção da família ao projeto damodernidade e às críticas citadas, a <strong>escola</strong> acirra sua condição de resistência, levantan<strong>do</strong>barricadas e cavan<strong>do</strong> trincheiras em defesa de <strong>um</strong> modelo de autoridade que não maisencontra respal<strong>do</strong> em nossos dias (RENAULT, 2004). Essa atitude mostra-se mais claramentequan<strong>do</strong> os sujeitos desta pesquisa defendem a autoridade com o acirramento das normasdiscipli<strong>na</strong>res <strong>como</strong> o caminho e, para tanto, estabelecem comparações com o modelo deautoridade <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> se referem à família com <strong>um</strong>a mágoa implícita e <strong>um</strong>aculpabilização por esta deserção, conforme emerge das falas citadas anteriormente. Éinteressante pensar que o professor é membro desta família, mas parece ter dificuldade emtransitar entre os papéis de professor ou professora e de pai ou mãe.Apesar de a <strong>escola</strong> tentar fechar-se ao externo, o aluno, forja<strong>do</strong> n<strong>um</strong>adiscursividade pós-moder<strong>na</strong>, faz o link entre este e o mun<strong>do</strong> interno no qual pre<strong>do</strong>mi<strong>na</strong> <strong>um</strong>ainstituição pré-moder<strong>na</strong>, cujos avatares (professores) são sujeitos forma<strong>do</strong>s <strong>na</strong> discursividademoder<strong>na</strong>. Coexistem, assim, três discursividades: <strong>um</strong>a instituição que se ancora <strong>na</strong> escolásticamedieval, que fala por <strong>um</strong> professor forja<strong>do</strong> <strong>na</strong> esteira <strong>do</strong> il<strong>um</strong>inismo, atravessa<strong>do</strong> pelos ideais<strong>do</strong> liberalismo econômico e <strong>do</strong> positivismo, cuja função é afiliar à polis as novas gerações(entendida esta <strong>como</strong> assujeitamento), perdidas ante a desregulamentação pós-moder<strong>na</strong>.A segunda conexão que se faz entre a <strong>escola</strong> e a família decorrente da anterior é oque Freud (1930) e, depois, Lacan (2005) denomi<strong>na</strong>ram <strong>como</strong> declínio da função pater<strong>na</strong> 50 .No processo de reconfigurações familiares, vimos, com destaque, o enfraquecimento <strong>do</strong>nome-<strong>do</strong>-pai <strong>na</strong> família, o que fragiliza a inscrição simbólica <strong>na</strong> lei e o laço social (LACAN,2005; RASSIAL, 1997a e 1997b; JUSTO, 2004), favorecen<strong>do</strong> mo<strong>do</strong>s de funcio<strong>na</strong>mentoperversos nos quais a posição <strong>na</strong>rcísico-primária <strong>do</strong> in-fans de gozo sem limite (emborasolitário) dificulta o (re)conhecimento ou a consideração <strong>do</strong> outro/Outro em relaçõespredatórias <strong>na</strong>s quais o outro é reduzi<strong>do</strong> à condição de objeto descartável (LASH, 1983;COSTA, 1998 e 2004; BIRMAN, 2007 e 2009). Esses mo<strong>do</strong>s de funcio<strong>na</strong>mento sãoretroalimenta<strong>do</strong>s pelos media<strong>do</strong>res da pós-modernidade com a cultura ao <strong>na</strong>rcisismo (LASH,1983). Vejamos o que nos diz o sujeito 7 sobre isso:Então, parece que eles chegam ao extremo para chamar a atenção de alguém, que... agente sabe que, infelizmente, as coisas...é... porque era ruim <strong>na</strong> nossa época: aquestão de aban<strong>do</strong>no, a ausência pater<strong>na</strong>, mater<strong>na</strong>, hoje, está pior. Mas, eu acho queesses alunos estão muito... estes jovens, não são só os alunos daqui. Eu acho que elesestão muito sem direcio<strong>na</strong>mento (SUJEITO 7-F).


95Assim, ao contrário <strong>do</strong> que sugerem as falas, não se trata, simplesmente, daatitude de <strong>um</strong>a família em específico, mas da família em nosso tempo, que precisa, tantoquanto a <strong>escola</strong>, de apoio e não de exclusiva cobrança. A segunda questão é que a inscrição <strong>na</strong>lei não é exclusiva das famílias.É preciso lembrar o contexto de <strong>um</strong>a sociedade que se nega a amadurecer,convocan<strong>do</strong> os jovens a <strong>um</strong> lugar o qual os adultos se recusam a ocupar (KEHL, 2005). Freud(1921; 1930) já considera que a pobreza psicológica <strong>do</strong>s grupos decorre da ausência da lei,favorecen<strong>do</strong> os excessos pulsio<strong>na</strong>is, pois, sem lei, ficamos a mercê da força bruta, visto que,“onde não há totem, não há tabu.” (COSTA, 2004, p. 175). Discutin<strong>do</strong> o lugar da <strong>escola</strong> nestecontexto e a ética no espaço educativo, Imbert (2001), alinha<strong>do</strong> à teoria psica<strong>na</strong>lítica,questio<strong>na</strong> o atual papel da lei-código e da sanção no espaço educativo, propon<strong>do</strong> caminhospara a construção da lei-simbólica, que contribuirá para o processo de ex-sistência <strong>do</strong> sujeito.Percebemos em nossa imersão que a sanção nesta <strong>escola</strong> obedece a <strong>um</strong>a lógicaretributiva de justiça (ZHER, 2008) e, tal qual propôs Imbert (2001), é “o alfa e o ômega” dalei <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, colocan<strong>do</strong>-se <strong>como</strong> o discurso <strong>do</strong> mestre, sem construir, mediante a regra, a lei,o que a desgasta e reforça o que se buscava enfrentar (PAIN, 2003). A título de ilustração,durante a nossa estada <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, muitos a<strong>do</strong>lescentes foram transferi<strong>do</strong>s compulsoriamente, oque reforça a ideia já apresentada por Rodriguez (2004) <strong>como</strong> <strong>um</strong> “populismo punitivo”, <strong>um</strong>aoscilação entre a ausência da norma e a norma excessiva. Conforme já discutimos com Costa(2004), ten<strong>do</strong> em vista a tenuidade <strong>do</strong> papel de professor, <strong>na</strong> ausência <strong>do</strong> totem, o tabutambém se fragiliza. Discutimos, em nossa fundamentação teórica, a importância de oprofessor ocupar o seu lugar no senti<strong>do</strong> de que o aluno também saiba e ocupe o seu o queinclusive lhe dará condições para reinventá-lo com criatividade (COLOMBIER, MANGEL ePERDRIAULT, 1989; PAIN, 2003; IMBERT, 2001; DUBET, 1997) 51 .Outra questão que convém rebuscarmos refere-se à a<strong>do</strong>lescência, momento daconstituição psíquica <strong>na</strong> qual a relação com a lei é colocada em causa, em decorrência <strong>do</strong>arrombamento pubertário e de todas as consequências advindas disso. Nesse momento, ante apercepção <strong>do</strong>s pais <strong>como</strong> “meros” ancora<strong>do</strong>res da lei, o púbero vai ao social, em busca da lei(RASSIAL, 1997a e 1997b; MARTY, 2010). Além disso, considere-se o caráter transgressor<strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes e ou <strong>do</strong>s jovens (MATZA, 1968; HOUSSIER, 2010).Também estas explicações colocam a <strong>escola</strong> em lugar de destaque para o auxílioaos a<strong>do</strong>lescentes e ou aos jovens no processo de construção <strong>do</strong> laço social. Marty (2006)destaca a necessidade e a importância <strong>do</strong> “apoio <strong>na</strong>rcísico parental” para o a<strong>do</strong>lescente, ten<strong>do</strong>


96em vista seu momento ímpar de vulnerabilidade, principalmente, conforme assevera Freud,pelas perdas objetais primitivas.N<strong>um</strong> esforço de síntese, Marty (2006, p. 123-124) o apoio <strong>na</strong>rcísico parental<strong>como</strong>: “dar-se <strong>como</strong> adulto ao a<strong>do</strong>lescente [...]”; “oferecer limites, <strong>como</strong> quem oferece <strong>um</strong>presente, resistir à destrutividade da violência a<strong>do</strong>lescente, sem por isso contra-reagir [...]”;confiar no processo da a<strong>do</strong>lescência e no processo de saída desta; dar nomes às coisas, povoarde marcos que façam senti<strong>do</strong> o mun<strong>do</strong> de relações entre as gerações; conversar, sem seconfundirem com eles nem o ignorarem; proporcio<strong>na</strong>r apoio ao a<strong>do</strong>lescente que esteja emsituação de fragilidade <strong>na</strong>rcísica; e em caso de dificuldade, ou impotência, aceitar o auxílio de<strong>um</strong> terceiro; proteger o a<strong>do</strong>lescente contra si mesmo, quan<strong>do</strong> for o caso; perceber o tor<strong>na</strong>r-seadulto no ser a<strong>do</strong>lescente, com tu<strong>do</strong> o que este esta<strong>do</strong> comporta de incerteza, talvez mesmo dedestrutividade potencial; lembrar que a violência comporta em si mesma a força da vida, masencontra sua via de resolução no crédito que se dê ao a<strong>do</strong>lescente quanto a poder ligá-la aosobjetos e orientá-la em direção a alg<strong>um</strong>a significação; oferecer objetos aos a<strong>do</strong>lescentes paraque eles prendam aí a sua violência: a oferta de cultura, de objetos culturais, é essencial ecompete aos adultos; permanecer <strong>na</strong> ligação com o a<strong>do</strong>lescente, ligação de palavra, ligação deinteresse. “Ajudar o a<strong>do</strong>lescente a manter <strong>um</strong>a atividade de ligação em seus investimentos,ajudá-lo para que não sobrevenha o risco da ruptura”.Esta concepção emerge da fala <strong>do</strong> sujeito 6, <strong>um</strong> <strong>do</strong>s poucos sujeitos que não sereferiram a problemas com os alunos:São meninos que, eu acho, que a linguagem da porrada não vai surtir efeito nenh<strong>um</strong>,porque essa linguagem ele já conhece muito bem. Ele já <strong>na</strong>sceu nela. [...] Mas, euainda acho que a linguagem <strong>do</strong> amor, a linguagem que puxa pra junto, a linguagemque acredita... ainda acho que surte mais efeito. [...] Mas, eu gosto de mostrar queeles podem, que são capazes, que eles precisam se ver de maneira diferente... Então,assim eu tô sempre acreditan<strong>do</strong> nele. Eu gosto de deixar isto muito claro (SUJEITO6-F).Em outro senti<strong>do</strong>, não tem si<strong>do</strong> esta a percepção que norteia o trabalho <strong>do</strong>sprofessores com os alunos-a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens. A fala da professora apresenta-se <strong>como</strong>única exceção ante as falas <strong>do</strong>s demais colegas. Na fragilidade da lei, que é traduzida peloprofessor <strong>como</strong> ausência de autoridade, a maioria absoluta <strong>do</strong>s profissio<strong>na</strong>is da educação têmdefendi<strong>do</strong> o retorno da autoridade, e, conforme vimos, esta não é <strong>um</strong>a situação específica <strong>do</strong>Brasil (RENAULT, 2004).Vimos com Dubet (1997), Colombier, Mangel e Perdriault (1989), Pain (2003),Rodriguez (2004) e Derbabieux (2002a) as representações reacionárias, autoritárias e, porvezes, estigmatizantes, preconceituosas e discrimi<strong>na</strong>tórias que ancoram o discurso <strong>do</strong>


97professor de “retomada <strong>na</strong>s mãos”. Também nós observamos das falas <strong>do</strong>s sujeitos, salvoraríssimas exceções, a defesa <strong>do</strong> enrijecimento da norma e a transferência compulsória dealunos autores de atos incivilizatórios, indiscipli<strong>na</strong>res e ou violentos, o que ocorreu inúmerasvezes, durante o perío<strong>do</strong> em que lá estivemos.A título de ilustração, o sujeito 14-M defende que estes alunos sejam transferi<strong>do</strong>spara <strong>escola</strong>s especializadas (cita o PROEM e a EMMP), e o sujeito 9 defende que sejamatendi<strong>do</strong>s de forma indireta pela <strong>escola</strong>. O sujeito 15-M sugere que a Constituição Federalseja revista no senti<strong>do</strong> de retirar a vaga de alunos que reprovem mais de <strong>um</strong>a vez:Em 88, quan<strong>do</strong> eu fazia... tava ainda estudan<strong>do</strong> DISCIPLINA X, eu tinha muitosalunos de aula particular em casa, e a grande preocupação <strong>do</strong>s pais, da família, <strong>na</strong>época, é quan<strong>do</strong> o filho já tava duas, ou era duas vezes reprova<strong>do</strong>, e não podiareprovar a terceira... <strong>na</strong> Secretaria de Educação... perdia a vaga. Então, elesprocuravam. A família tinha essa preocupação. Porque o aluno... ou então tinha quepagar <strong>escola</strong> particular, que era cara ou ele não tinha mais a vaga <strong>na</strong> Secretaria. Euacho que hoje o sistema da Secretaria de Educação só terá <strong>um</strong>a melhora se voltasse apassar por isso. Mas aí teria que mexer <strong>na</strong> Constituição, mas eu acho que o caminhoera pela aí. Porque o aluno, às vezes, ele tem... é... reprova quatro, cinco vezes, sei láquantas, e a vaga dele tá garantida. Tinha que ter <strong>um</strong>a maneira de cobrar (SUJEITO15-M).Assim, os sujeitos desta pesquisa, representan<strong>do</strong> tantos outros com os quais jáestivemos em processos semelhantes de escuta, ao enunciarem <strong>um</strong> discurso reacionário esau<strong>do</strong>sista que, de forma maniqueísta, apresentam o passa<strong>do</strong> <strong>como</strong> bom e o presente <strong>como</strong>ruim, caminham <strong>na</strong> contramão <strong>do</strong> que é discuti<strong>do</strong> pela academia e implementa<strong>do</strong>, com êxito,pelos ditos “estabelecimentos sensíveis” (PAIN, 2000; 2003; 2006).A segunda explicação para este contexto dá-se com a massificação <strong>do</strong> acesso à<strong>escola</strong> ou, conforme vimos, a “expansão degradada” (PEREGRINO, 2006) que foiproporcio<strong>na</strong>da pela abertura da <strong>escola</strong> por força de instr<strong>um</strong>entos legais (a Lei n° 5.692/71; aConstituição Federal, 1988; a Lei n°8.069/90; a Lei n°9.394/96). Conforme discutimos com oauxílio de Dayrell (2007), Sposito e Galvão (2004), entre outros, a <strong>escola</strong> foi aberta para asmassas, mas parece não se ter reinventa<strong>do</strong> para elas, o que, segun<strong>do</strong> Sposito (2008), reexclui egera novo patamar no processo de reprodução das desigualdades sociais <strong>do</strong> país. Osestudantes da Educação de Jovens e Adultos é bem o protótipo desta situação conformediscutiremos no próximo tema.Referin<strong>do</strong> a Cambi (1999) e Ferreira (1966), percorremos o histórico da <strong>escola</strong>,para constatarmos que ela sempre foi seletiva, mas, <strong>como</strong> ape<strong>na</strong>s os “herdeiros” tinhamacesso a esta filtragem, produzia poucos resíduos, seja porque traziam consigo o capitalcultural necessário, seja porque eram <strong>um</strong>a minoria n<strong>um</strong>érica. Contu<strong>do</strong>, com a massificação,este resíduo a<strong>um</strong>entou drasticamente, seja pela quantidade de alunos, seja, principalmente,


98pela carência <strong>do</strong> capital cultural <strong>do</strong>s novos atores. Sem que tivesse o bilhete de ingresso, estanova parcela da população reforçou a sua condição de “máqui<strong>na</strong> de triagem” (PAIN, 2009) aserviço <strong>do</strong> “<strong>na</strong>zismo discreto das elites” 52 (OURY, apud PAIN, 2009). Consequentemente,ante os números <strong>do</strong> fracasso ou da estag<strong>na</strong>ção - também discuti<strong>do</strong>s por nós com o auxílio deBrasil, 2011; IBGE, 2009a; IBGE, 2009b; IBGE, 2010; KLEIN, 2003; Sampaio, 2009;OECD, 2010 – a <strong>escola</strong> viu-se exposta e <strong>na</strong> berlinda <strong>do</strong>s questio<strong>na</strong>mentos de múltiplossetores, entre os quais a sua comunidade, que, segun<strong>do</strong> Dubet (2003), focaliza nela a causa deseu fracasso.Como não bastassem estas críticas, a <strong>escola</strong> sofreu severos questio<strong>na</strong>mentos dacorrente estruturalista que denunciou o lugar desta instituição no projeto <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> modernode educação das massas (FOUCAULT, 1987 e 2005); <strong>do</strong>s institucio<strong>na</strong>listas, apontan<strong>do</strong> seucaráter burocrático e conserva<strong>do</strong>r (CASTORIADIS, 1982; LAPASSADE, 1977; LOURAU,1995; BLEGER, 1984); <strong>do</strong> <strong>escola</strong>novismo; de Ivan Ilich e de Pierre de Bordieu, cujos efeitosainda reverberam no ambiente <strong>escola</strong>r. Ante este conjunto de críticas e as críticas àautoridade, reforçadas pelas vivências que os sujeitos-professores tiveram com a autoridade, a<strong>escola</strong> não sabe <strong>como</strong> lidar com a questão, conforme se constata, claramente, da fala <strong>do</strong>sujeito 9:Eu acho que é questão de discipli<strong>na</strong>. Primeiro, sempre fui contra, por questõesideológicas, a arbitrariedade, mas sempre lutei contra arbitrariedade. Quan<strong>do</strong> eu vejocoisa <strong>do</strong> regime militar <strong>do</strong>... da tortura. Aquilo me dá vontade de encontrar otortura<strong>do</strong>r e matar o cara. De tanta raiva que eu sinto lá. Em função disso, meucaráter não é de tratar com arbitrariedade. É tentar <strong>na</strong> conversa, sempre <strong>na</strong> conversa,no diálogo. Nunca acreditei. [...]é... <strong>na</strong>turalmente tenho dificuldade de tratar comdiscipli<strong>na</strong>, tenho dificuldade. Não sei tratar com discipli<strong>na</strong>. [...]Então, eu tô mesenti<strong>do</strong> sem moral. [...]Eu não quero essa coisa <strong>do</strong> respeito, da moral, <strong>do</strong>autoritarismo (SUJEITO 9-M).Este breve recorte de falas e comentários já nos é suficiente para demonstrar oquanto a <strong>escola</strong> tem <strong>um</strong>a atitude reativa às suas fragilidades. A culpa <strong>do</strong> contexto é claramenteimputada à indiscipli<strong>na</strong> e ou à violência <strong>do</strong> aluno a<strong>do</strong>lescente e ou jovem, e a granderesponsável é a família, que não dá educação, e o Esta<strong>do</strong>, que obriga a presença deste tipo dealunos <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Em seguia, a <strong>escola</strong> debate a morte <strong>do</strong> modelo que não mais alcança asnovas gerações, especialmente o público que é composto pelos estudantes <strong>do</strong> diurno da EJA.O a<strong>do</strong>lescente e ou o jovem versus o alunoA <strong>escola</strong> [...], cada vez mais, tem dificuldade em administrar as relações entre ointerior e o exterior, entre o mun<strong>do</strong> <strong>escola</strong>r e o mun<strong>do</strong> <strong>juvenil</strong>. [...] A tensão entre oaluno e o a<strong>do</strong>lescente está no centro da experiência <strong>escola</strong>r (DUBET, 1998, p. 28).


99Do conjunto das falas ficou claro para nós que os professores sujeitos destapesquisa representam o aluno com o papel de pr<strong>estar</strong> a atenção <strong>na</strong> aula, demonstrar interesse eesforço para a aprendizagem e respeitar o professor. Nas compreensões de Perrenoud (1995),Vieira (2008), Oliveira (2009), Santos Guerra (2002), o ofício de aluno é pauta<strong>do</strong> n<strong>um</strong>modelo de assujeitamento. Quan<strong>do</strong> se ajusta a este lugar, o professor se sente feliz em seuofício: “Porque os adultos, parece que me dá mais autoestima” (SUJEITO 9-M), ou <strong>como</strong> dizo sujeito 10: “Quan<strong>do</strong> eu <strong>do</strong>u aula à noite, eu me sinto <strong>um</strong>a rainha”. O sujeito 13-M diz:Ontem, eu dei <strong>um</strong>a aula de Segunda Guerra Mundial, de Guerra Fria para <strong>um</strong>a turmade terceiro ano à noite, foi assim... sabe, saí da sal... saí da <strong>escola</strong> realiza<strong>do</strong>, né?Realiza<strong>do</strong>! Eu saí, cheguei em casa... assim: <strong>do</strong>rmi, assim: você chega (o professorsopra <strong>um</strong>a grande quantidade de ar <strong>como</strong> quem estivesse liberan<strong>do</strong> grande carga),você vê que a turma toda tava ligada, prestan<strong>do</strong> atenção, perguntaram, questio<strong>na</strong>ram.Agora, você sai daqui... acabei de sair de <strong>um</strong>a quinta B ali, pelo amor de Deus! Agente... a gente... (embarga a voz novamente) sabe... chega triste, né? Olha quesituação. (o professor faz <strong>um</strong> silêncio para controlar o choro que aflora). Só isso.(Sorri de forma muito discreta) Minhas angústias (SUJEITO 13-M).O olhar para o a<strong>do</strong>lescente e ou o jovem que ocupa o lugar de aluno só é evoca<strong>do</strong><strong>na</strong>s falas <strong>do</strong>s sujeitos, para referir-se ao desvio deste lugar, o que também é percebi<strong>do</strong> porDayrell (2007). Essa situação também se dá fora da <strong>escola</strong>, conforme demostraramAbramovay e Esteves (2009), Charlot (2007), Houssier (2010), Abramovay (2009), Trassi eMalvasi (2010).A atenção sobre o desvio <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente e ou <strong>do</strong> jovem que ocupa o lugar/papelde aluno por parte <strong>do</strong>s nossos sujeitos de pesquisa refere-se a estes <strong>como</strong> extremamenteindiscipli<strong>na</strong><strong>do</strong>s e que não querem estudar. Destacamos alg<strong>um</strong>as expressões usadas pelossujeitos, em se referin<strong>do</strong> aos alunos:Quadro 2: repreentações que os professores anunciam sobre os estudantes.ExpressõesSujeitosVêm obriga<strong>do</strong>s pelos pais e ou pela justiça 3-F, 13-M, 15-M, 16-F, 17-M e 18-FNão querem <strong>na</strong>da 9-M, 13-M, 15-M, 17-MSão sem princípios e sem limites 3-F, 13-M, 14-M e 15-MPerigosos 5-F, 14-MFaltosos3-M, 5-F, 8-F, 9-M, 12-M, 14-M, 15-M,16-F, 17-M e 18-FUsuários de drogas 1-F, 7-F, 14-M, 15-M e 16-FSão burros 17-MCom dificuldade de aprendizagem 3-F, 15-M, 16-F, 17-M e 18-FDecadentes 15-M


100Carentes 5-F, 6-F, 7-F, 16-FA<strong>na</strong>lfabetos 13-M, 16-FDesrespeitosos com o professor 3-F, 9-M, 13-M, 14-MPerdi<strong>do</strong>s, sem r<strong>um</strong>o 5-F, 6-F, 7-F, 10-F, 15-MMuito (a)diversos 3-F, 4-F, 10-F, 12-M, 13-M, 16-F, 17-MEsse é quadro extremamente preocupante, pois, <strong>como</strong> observa Gonzáles Arroyo(2007), a nossa concepção de aluno direcio<strong>na</strong> a nossa prática. Sen<strong>do</strong> a condição dea<strong>do</strong>lescente e ou jovem muito recente (CAMBI, 1999; AIRÈS, 1981), são conceitosatravessa<strong>do</strong>s por <strong>um</strong>a percepção universalista, que desconsidera os contextos, o momento <strong>do</strong>ciclo vital, assim <strong>como</strong> as idiossincrasias pessoais (BOCK, 2004).Convém retomarmos a discussão realizada no primeiro capítulo, de que tanto aa<strong>do</strong>lescência (n<strong>um</strong>a dimensão individual) quanto a juventude (n<strong>um</strong>a dimensão social)questio<strong>na</strong>m o mun<strong>do</strong> adulto (MATZA, 1968; LAPASSADE, 1968; MARTY, 2006; 2008,2009, 2010; RASSIAL, 1997a, 1997b e 1999 etc) e, segun<strong>do</strong> Freud, “o desligamento daautoridade <strong>do</strong>s pais, unicamente através <strong>do</strong> qual se cria a oposição, tão importante para oprogresso da cultura, entre a nova e a velha gerações.” (1909, p. 243). Outra discussão quejulgamos necessária é a concepção de <strong>um</strong>a sociedade “adultocêntrica”, no que concerne àdistribuição de poder (KRAUSKOPF, 1998) e, “a<strong>do</strong>lescêntrica”, no que tange à recusa aoamadurecimento (PALMADE, 2001; KEHL, 2005; HAAG, 2007). Isso nos coloca <strong>na</strong>condição de cobra<strong>do</strong>res <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente e ou <strong>do</strong> jovem <strong>do</strong> que o mun<strong>do</strong> adulto não lhe oferta,geran<strong>do</strong>, assim, <strong>um</strong>a vacuidade para a qual Marty (2006) propõe o apoio <strong>na</strong>rcísico parental <strong>do</strong>adulto.Outra questão que convém ser colocada sobre a crise da <strong>escola</strong> com aa<strong>do</strong>lescência e ou a juventude é dada por Colombier, Mangel e Perdriault (1989), aoapresentar-nos o cuida<strong>do</strong> que devemos ter com a convocação que o a<strong>do</strong>lescente externo faz <strong>do</strong>a<strong>do</strong>lescente que fomos ou não, ou que gostaríamos de ter si<strong>do</strong>, o que nos tor<strong>na</strong>rá míopes àpercepção <strong>do</strong> outro em sua origi<strong>na</strong>lidade e com respeito a <strong>um</strong> tempo que não é mais aqueleem que fomos a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens. As autoras destacam o risco de tentarmos matar fora(no aluno) o que não está elabora<strong>do</strong> dentro (no universo psíquico <strong>do</strong> professor). Nas palavrasde Winnicott (1969, p. 266 apud MEZAN, 2002): “a ameaça representada pela a<strong>do</strong>lescênciase dirige àquela parte de nós que, <strong>na</strong> verdade, não a pôde viver: isso faz com que detestemosaqueles que podem vivenciar tal passagem.”


101Os sujeitos deixam claro em vários momentos que o problema que os aflige não éa EJA, mas o tipo de estudantes que têm recebi<strong>do</strong>. As dificuldades <strong>do</strong>s sujeitos desta pesquisasão claramente relacio<strong>na</strong>das aos a<strong>do</strong>lescentes e ou aos jovens que ocupam o papel de aluno <strong>na</strong>modalidade de ensino de Educação de Jovens e Adultos. Eles fazem questão de pontuar quenão têm dificuldade com a modalidade de EJA:O supletivo, para mim, é a coisa mais justa que existe <strong>na</strong> educação, porque vai, <strong>na</strong>verdade, dar oportunidade, o princípio constitucio<strong>na</strong>l <strong>do</strong> direito daqueles que nãotiveram direito, que foram excluí<strong>do</strong>s. [...] Então, sempre a<strong>do</strong>rei EJA e vou continuarsen<strong>do</strong> professor de EJA (SUJEITO 9-M).Falas semelhantes são enunciadas por dez <strong>do</strong>s dezoito sujeitos de pesquisas, sen<strong>do</strong>todas elas acompanhadas de <strong>um</strong>a crítica às modificações impostas pela Secretaria deEducação, à revelia <strong>do</strong>s contextos e sem que eles tenham si<strong>do</strong> consulta<strong>do</strong>s, mesmo ten<strong>do</strong>-secomprova<strong>do</strong> que a maioria <strong>do</strong>s sujeitos desta pesquisa possuem muitos anos de experiêncianesta modalidad, que, segun<strong>do</strong> eles, é tratada pelo governo <strong>como</strong> <strong>um</strong> Ensino Regulardisfarça<strong>do</strong>. Ape<strong>na</strong>s o sujeito 17-M chamará de aceleração disfarçada:Contra o EJA. [...] Isso aqui não é pra mim... é... o EJA. É o regular disfarça<strong>do</strong> <strong>como</strong> nome de EJA (SUJEITO 15-M).O EJA, o professor falou que o EJA é <strong>um</strong> regular disfarça<strong>do</strong>. Eu acho que é <strong>um</strong>...que é <strong>um</strong>a aceleração disfarçada. Na verdade, ele não é <strong>um</strong> regular porque é muitofraco (SUJEITO 17-M).As falas <strong>do</strong>s sujeitos quanto a esta modalidade de ensino são para<strong>do</strong>xais, pois, aotempo em que a defendem, <strong>como</strong> a fala citada <strong>do</strong> sujeito 9, desqualificam-<strong>na</strong> <strong>como</strong> fraca(conforme citação acima) e, em muitos momentos, referem-se a <strong>um</strong> receio de que alunos quetêm capacidade estejam nesta modalidade de ensino. O sujeito 16 afirma referir-se ao pesarem ver alunos tão novos <strong>na</strong> EJA, pois, segun<strong>do</strong> ele: “Para mim, só em <strong>estar</strong> <strong>na</strong> EJA eles jáestão perden<strong>do</strong>” (SUJEITO 16-F).Três destes sujeitos falaram em vantagens em <strong>estar</strong> <strong>na</strong> EJA: há menor cargahorária em sala, e o público mais é maduro. O sujeito 18-F apresentará <strong>como</strong> vantagem o fatode a EJA possibilitar que os professores não atuem <strong>na</strong> jor<strong>na</strong>da ampliada 53 . Os problemas a quese referem não são, segun<strong>do</strong> percepção deles, decorrentes das localidades mais vulneráveis àviolência:Quan<strong>do</strong> trabalhei no PERIFERIA DA CIDADE C... nos lugares mais violentos quetem, né? [...]. Pela primeira vez, <strong>na</strong> Fundação, <strong>na</strong> Secretaria de Educação, em onzeanos, eu me sinto incapaz, totalmente incapaz de passar conhecimento para estesalunos. Pela primeira vez que eu me sinto completamente incapaz. […] Trabalheicinco anos com o supletivo 54 : primeiro, segun<strong>do</strong> e terceiro ano supletivo. Ah... emeus alunos eram muito melhor (SUJEITO 13-M).


102Por mais que se refiram aos problemas no turno vespertino 55 , não é <strong>um</strong>a questão<strong>do</strong> perío<strong>do</strong> de trabalho, mas <strong>do</strong>s sujeitos que ocupam o lugar de aluno que são a<strong>do</strong>lescentes eou jovens:Aliás, eu não sei de nenh<strong>um</strong>a <strong>escola</strong> que reclame, que tenha EJA à noite, de EnsinoMédio que tenha reclama<strong>do</strong>. Porque, eu trabalhei lá no ESCOLA B, trabalho aqui, eto<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> que trabalha aqui diz que é <strong>um</strong> sonho à noite, que não quer largar.Porque... é que é Ensino Médio... e, quan<strong>do</strong> eu comecei a dar aula, eu dei aula noESCOLA B, para o... o EJA à tarde, só que só tinha Ensino Médio e eu não tinhaproblema. Os meus alunos eram mais velhos.[...] Mas, o que eu vi de grande dificuldade foi ser Ensino Fundamental em que oaluno não está aqui porque ele quer. Ele é obriga<strong>do</strong> a <strong>estar</strong>. Então, assim... a melhorturma que eu tive ainda foi a de quan<strong>do</strong> eu entrei, porque tinha mais senhoras, essaseram mais interessadas, essas faziam to<strong>do</strong>s os trabalhos... (SUJEITO 16-F).Com essa clientela que a gente tem no turno vespertino. Eu tô te falan<strong>do</strong> <strong>do</strong> turnovespertino. No noturno, eu trabalho em outra <strong>escola</strong> e... e é <strong>um</strong>a outra... e eu a<strong>do</strong>rotrabalhar lá. Porque, assim, eu vou pra descansar. A minha aula <strong>do</strong> noturno é pradescansar. (Há manifestações de concordância geral por parte <strong>do</strong>s professores dasala) Você dá aula, to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> quieto, to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> dedica<strong>do</strong>. “Professora, mas eunão entendi...” aqueles alunos que são os alunos mais velhos, quan<strong>do</strong> você falaalg<strong>um</strong>a coisa, eles brilham com o que você tá falan<strong>do</strong>. Eles ficam assim...é... é...maravilha<strong>do</strong>s. (Novamente, há manifestação geral <strong>do</strong>s colegas da sala com frasesque en<strong>do</strong>ssam a afirmação da professora). Então, assim, eu vou-te falar a verdade:eu prefiro trabalhar <strong>na</strong> EJA (SUJEITO 18-F).A <strong>juvenil</strong>ização da EJA também é mencio<strong>na</strong>da por outros sujeitos desta pesquisa,inclusive utilizan<strong>do</strong>-se desta expressão, <strong>como</strong> faz o sujeito 16-F. De fato, segun<strong>do</strong> o quepodemos observar, os alunos desta <strong>escola</strong> são, em sua maioria absoluta, por a<strong>do</strong>lescentes,conforme já se apontava pelas estatísticas (IBGE, 2007 e 2009a) e por estudiosos daquestão 56 , comparecen<strong>do</strong> <strong>na</strong> fala de inúmeros sujeitos. Segun<strong>do</strong> o levantamento <strong>do</strong>c<strong>um</strong>entalque fizemos no primeiro semestre <strong>do</strong> ano de 2011, estavam matricula<strong>do</strong>s, no turno vespertino,698 alunos, sen<strong>do</strong> cinquenta e nove no I segmento, 457 no II segmento e 173 no terceirosegmento. Destes, 88% possuem entre 15 e 29 anos. Especificamente a<strong>do</strong>lescentes, segun<strong>do</strong>OMS, são 71% <strong>do</strong> alu<strong>na</strong><strong>do</strong> <strong>do</strong> turno.Reiteran<strong>do</strong> que a dificuldade é com os alunos que são a<strong>do</strong>lescentes e ou jovem, osujeito 9-M chega a relatar-nos que teve <strong>um</strong>a experiência com o Ensino Regular muitofrustrante, dada a imaturidade <strong>do</strong>s alunos, o que o levou a pensar em deixar a Secretaria deEducação. Foi, então, que, <strong>na</strong> necessidade de ampliar sua carga horária para quarenta horassema<strong>na</strong>is, veio trabalhar com a EJA, no perío<strong>do</strong> diurno, espaço no qual tem senti<strong>do</strong> muitadificuldade:A partir de 2010, no ano passa<strong>do</strong>, eu trabalhei à tarde com... No ano passa<strong>do</strong>, noregular, e tive <strong>um</strong> problema de adaptação. A criançada... […] porque era <strong>na</strong> época <strong>do</strong>supletivo. Ainda era supletivo, onde a clientela era adulta. Era tu<strong>do</strong> adulto. Então,isso aí, eu tinha <strong>um</strong>a relação que eu a<strong>do</strong>rava. [...] A partir <strong>do</strong>s últimos anos,começou a entrar o aluno novo. [...] A turma que… é... tem muito aluno adulto, é amelhor turma que eu acho. A<strong>do</strong>ro! Mesmo ten<strong>do</strong> os moleques que são... é... queperturbam lá, mas... <strong>na</strong> minha aula, dá pra conviver com isso lá. Porque os adultos...


103parece que me dá mais autoestima. Mas, a turma é melhor, o rendimento é melhor.A que eu tenho só, eu diria a molecada, [...] aí eu quero falar com to<strong>do</strong>s os colegas,os colegas já colocaram aí já <strong>na</strong> questão da frustração. Eu também não estouconseguin<strong>do</strong>, estou conseguin<strong>do</strong> ser inútil. Porque eles não querem mesmo. Eu tentode <strong>um</strong>a forma e de outra. Já perdi... não tenho mais qualificação. De vinte e três anosda sala de aula, lá, de chamar a atenção para eles se interessarem. Não tem nenh<strong>um</strong>interesse lá. E aí, a frustração é igual à de to<strong>do</strong>s (SUJEITO 9-M).Aí foi o que o SUJEITO 17-M falou, a gente começa com os quarenta alunos. Se elativer dez mais i<strong>do</strong>sos, vão ser estes dez, mais maduros, que vão ficar. Os outrosestão aqui, ou obriga<strong>do</strong> pelos pais, ou obriga<strong>do</strong>s pela lei. Então, eles não queremmesmo (SUJEITO 16-F).O conjunto das falas precedentes ratifica nossa afirmação inicial, e tanto estas<strong>como</strong> outras não citadas referem-se a <strong>um</strong> professor que buscou <strong>um</strong> aluno mais madura e, anteas mudanças no sistema, depara com alunos a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens com <strong>um</strong> agravante: sãoos excluí<strong>do</strong>s <strong>do</strong> sistema regular de ensino. A <strong>escola</strong> é vítima de sua própria filtragem.Antigamente, eles iam pro noturno, você lembra? É por isso que, no EJA, eles estãocada dia, cada dia mais jovens. Não tinha... aluno que reprova muito, ia pro noturno.Hoje, não! É obriga<strong>do</strong> a ir para o EJA. É por isso que, no EJA, está-se agravan<strong>do</strong>,cada dia que passa... você esqueceu de colocar, cada dia que passa, estão maisjovens, mais jovens. E o EJA não foi cria<strong>do</strong> para isto (SUJEITO 17-M).Só que a questão que eles fizeram, que foi <strong>um</strong>a coisa errada, é de botar o aluno queestá fora da idade... de faixa etária e colocar <strong>como</strong> correção de fluxo, e não é isso,não é EJA (SUJEITO 14-M).Assim, <strong>do</strong>is são os problemas: trata-se de <strong>um</strong> aluno a<strong>do</strong>lescente e ou jovem e que,especialmente, tem <strong>um</strong> histórico de i<strong>na</strong>daptabilidade ao estatuto de aluno. A concepção de queo sistema “empurra” para a EJA os alunos problemas será compartilhada por outros sujeitosda pesquisa, tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong>-se <strong>um</strong> consenso, ou seja, as <strong>escola</strong>s que oferecem a modalidade de EJAno perío<strong>do</strong> diurno, <strong>como</strong> é o caso de nosso espaço de pesquisa, recebem os resíduos datriagem que o sistema faz. Digno de nota é que, conforme podemos observar <strong>do</strong>s sujeitos,com exceção de duas professoras (que se mostravam mais adaptadas a esta realidade) e quevinham de <strong>um</strong>a outra <strong>escola</strong> que oferecia esta modalidade, to<strong>do</strong>s os demais professores estãolidan<strong>do</strong> com a realidade de EJA diurno há <strong>um</strong> ano em média.Realmente, semelhante às demais <strong>escola</strong>s nestas condições, os estudantes destamodalidade no diurno, em sua ampla maioria, ac<strong>um</strong>ulam históricos de fracasso e conflito coma <strong>escola</strong> e ou com a sociedade. Este contexto acentua, consideravelmente, <strong>um</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> quetambém há <strong>na</strong> <strong>escola</strong> regular, mas que, <strong>na</strong> EJA diurno, é hiperdimensio<strong>na</strong><strong>do</strong>: a crise entre oaluno enquanto <strong>um</strong>a abstração de <strong>um</strong> ideal construí<strong>do</strong> pela instituição e o a<strong>do</strong>lescente e ou ojovem que é convoca<strong>do</strong> a ass<strong>um</strong>ir este lugar. Consequentemente, há <strong>um</strong> ataque simbólico <strong>do</strong>aluno:Que o aluno <strong>do</strong> EJA está chegan<strong>do</strong> cada dia mais burro. Cada dia que passa, táfican<strong>do</strong> mais burro. A Secretaria, antigamente, tinha o... aluno que não conseguiaaprovação. Ele era reprova<strong>do</strong> várias vezes, ele iria pro noturno. Hoje em dia, agora,tem que ir pro EJA. É obrigatório ir pro EJA. […] Que mais? É... que o objetivo <strong>do</strong>


104EJA é dar o diploma, que, durante o dia, ele tá in<strong>como</strong>dan<strong>do</strong>. É. São esses alu... nósestamos ten<strong>do</strong> problema aqui, no corre<strong>do</strong>r, porque a maioria <strong>do</strong>s alunos são osalunos problemáticos <strong>do</strong> regular, que estão no EJA. A maioria, 99%, entendeu?Tiran<strong>do</strong> essas, essas senhoras mais velhas que tão procuran<strong>do</strong> alg<strong>um</strong>a coisa, o restosão os alunos que não conseguiram <strong>na</strong>da no regular. Então f... foi empurra<strong>do</strong> proEJA, pra termi<strong>na</strong>r e receber o diploma. Pra ter o diploma (SUJEITO 17-M).A quase totalidade <strong>do</strong>s casos de violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> relata<strong>do</strong>s pela mídia nestesúltimos anos que tivemos a oportunidade de acompanhar envolvem alunos com grandedistorção entre idade e série, matricula<strong>do</strong>s ou em <strong>escola</strong>s de EJA, ou em turmas da chamada“aceleração”. Digno de nota é que, <strong>na</strong> condição de estudiosos da temática, já fomosconvida<strong>do</strong>s a <strong>estar</strong> em quatro 57 das cinco <strong>escola</strong>s que oferecem a modalidade de EJA noperío<strong>do</strong> diurno, no DF, e, em todas elas, os relatos são muito semelhantes. A sexta <strong>escola</strong> queoferecia esta modalidade de ensino no diurno fechou suas turmas desta modalidade, ten<strong>do</strong> emvista a gravidade das ocorrências que lá foram registradas.Além disso, a estas <strong>escola</strong>s que oferecem EJA no diurno são encaminha<strong>do</strong>s osa<strong>do</strong>lescentes autores de atos infracio<strong>na</strong>is em c<strong>um</strong>primento de medidas socioeducativas deliberdade assistida e de semiliberdade, conforme pudemos comprovar, visitan<strong>do</strong> os núcleosque executam estas medidas <strong>na</strong> cidade em que a <strong>escola</strong> está localizada, ten<strong>do</strong> em vista aqueixa com<strong>um</strong> <strong>do</strong>s professores com relação a estes estudantes. O mesmo percebemos <strong>na</strong>soutras cidades.Também comprovamos a presença de muitos a<strong>do</strong>lescentes que vivenciammedidas protetivas de acolhimento institucio<strong>na</strong>l (abrigamento), o que se explica pela distorçãoentre idade e série e <strong>um</strong>a expectativa de flexibilidade por parte <strong>do</strong>s órgãos gover<strong>na</strong>mentais, oque é <strong>um</strong> mito. Quase to<strong>do</strong>s os sujeitos, com especial ênfase para os sujeitos 3-F, 9-M, 13-M,14-M, 15-M e 17-M, nos falam que há <strong>um</strong> número considerável de educan<strong>do</strong>s com históricode reprovação e de transferências compulsórias.No momento em que estivemos <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, tivemos contato mais de perto com <strong>um</strong>educan<strong>do</strong> que houvera ameaça<strong>do</strong> <strong>um</strong> professor e, por conta dessa situação, foicompulsoriamente transferi<strong>do</strong>. Pesquisan<strong>do</strong> sua <strong>do</strong>c<strong>um</strong>entação, descobrimos que ele possuía<strong>um</strong> histórico de três outras transferências compulsórias anteriores a essa. Também os seisalunos que solicitamos à <strong>escola</strong> para realização de <strong>um</strong> grupo focal possuíam histórico detransferência compulsória, reprovação ou de momentos de evasão da <strong>escola</strong>, <strong>do</strong>is eramabriga<strong>do</strong>s, e <strong>um</strong> c<strong>um</strong>pria medida socioeducativa de semiliberdade.Por esse conjunto de fatores, trata-se, consequentemente, de <strong>um</strong>a modalidadecujos estudantes em seu conjunto demonstram aos professores maior diversidade, conforme asfalas deles. Além das diversidades já citadas, os sujeitos citam a diversidade etária,


105geracio<strong>na</strong>l, de gênero, de graus de deficiência, de adaptabilidade social e à <strong>escola</strong>, entreoutras. Vejamos <strong>um</strong>a dessas falas:Então, a minha sala de aula, ficou assim ampla, né? Então, por exemplo: tem oBatista, né? Às vezes, eu estou dan<strong>do</strong> aula, e ele começa a cantar, ele a DM, né? Aí,tenho <strong>um</strong> homossexual, que é o Ariel, né? E ele tá faltan<strong>do</strong>, e ele é alcoólatra...então, assim, as dificuldades elas são mais concentradas... eu tenho senhoras...(SUJEITO 5-F).Tem <strong>um</strong>a turma que são três, quatro alunos. E aí, eu tenho essa dificuldade detrabalhar com eles. Ou seja, qual o conteú<strong>do</strong> que eu vou trabalhar com eles?(SUJEITO 12-M)Aqui... concor<strong>do</strong> exatamente com o que o SUJEITO 12-M abor<strong>do</strong>u, nós temosquatro ou cinco realidades diferentes aqui dentro de <strong>um</strong>a sala. Você tem quatroalunos <strong>na</strong> sala. Esses quatro alunos têm <strong>um</strong>a realidade diferente <strong>um</strong>a da outra. Nóstemos <strong>um</strong>a quinta B, onde nós temos <strong>um</strong>a deficiente... <strong>um</strong>a deficiente... <strong>um</strong>a DM,nós temos <strong>um</strong>a DM; nós temos <strong>um</strong> a<strong>na</strong>lfabeto; nós temos <strong>um</strong>a... <strong>um</strong>a... <strong>um</strong>..., <strong>como</strong>é que fala? Na liberdade... <strong>na</strong> casa de... (outro professor responde: LA) LA,(respon<strong>do</strong>: semiliberdade) semiliberdade; e nós temos <strong>um</strong>... <strong>um</strong>... <strong>um</strong> outro lá,... não,o Davi é da outra turma, não é? Eu não... eu não tô lembra<strong>do</strong> <strong>do</strong> outro. Falta demais.Mas são alunos que tão paradas. Tipo, Davi, tá para<strong>do</strong> há... cinco anos (outroprofessor corrige: oito anos) oito anos e volta e cai n<strong>um</strong>a turma de meninos de 14anos [...] (SUJEITO 13-M).De acor<strong>do</strong> com Gomes (2007, p. 18), “há <strong>um</strong>a relação estreita entre o olhar e otrato pedagógico da diversidade e a concepção de educação que informa as práticaseducativas.” Apesar de a diversidade ser própria da condição h<strong>um</strong>a<strong>na</strong>, a <strong>escola</strong> tende a sermíope a isso, ten<strong>do</strong> em vista o modelo de homogeneidade que regula a relação pedagógica.A construção da identidade faz-se por meio da percepção <strong>do</strong> outro enquanto tal.Contu<strong>do</strong>, a história da h<strong>um</strong>anidade tem demonstra<strong>do</strong> o quanto transformamos o outro eminimigo e inferior. O outro foi inimigo <strong>na</strong> Antiguidade; o menor e os bárbaros, <strong>na</strong> AntiguidadeClássica; o infiel, <strong>na</strong> Europa Ocidental medieval; o primitivo (inciviliza<strong>do</strong>), <strong>na</strong> IdadeModer<strong>na</strong>; o subdesenvolvi<strong>do</strong>, <strong>na</strong> Idade Contemporânea. Hoje, com a globalização, os outroscomungam de nossos espaços, o que representa <strong>um</strong>a ameaça para o ego, que é, por <strong>na</strong>tureza,conserva<strong>do</strong>r e defensor da identidade.A <strong>escola</strong>, segun<strong>do</strong> Gomes (2007), enquanto instituição, tem senti<strong>do</strong> dificuldadeem lidar com a diversidade. Todavia, os educan<strong>do</strong>s trazem, “a fórceps”, essa discussão para ocotidiano <strong>escola</strong>r. A convivência com a diferença reeduca o nosso olhar, e a modalidade deEJA diurno é <strong>um</strong> caldeirão em que a diversidade se mostra de forma mais patente.O conjunto das falas expõe que, enquanto se acredita que, no Ensino Regular, adiversidade seja <strong>um</strong>a exceção, <strong>na</strong> EJA, mostra-se <strong>como</strong> regra, o que enriquece este estu<strong>do</strong>,haja vista que Jacques Pain (2009), apresentan<strong>do</strong> a Pedagogia Institucio<strong>na</strong>l, indica que foiconstruída mediante as experiências com “estabelecimentos sensíveis” nos quais os estudantesdiferiam, em muito, das idealizações construídas pelo sistema: os alunos “delinquentes” e osque não aprendiam. Como tal, lançou preciosas luzes novas à <strong>escola</strong> <strong>do</strong>s ditos “normais”.


106Discussão semelhante foi desenvolvida também por Lapassade (1968), para quem, estudan<strong>do</strong>o patológico, Freud esclareceu o nor<strong>mal</strong>.Especialmente em <strong>um</strong> estabelecimento com as características citadas, osprofissio<strong>na</strong>is da educação têm vivi<strong>do</strong>, de forma dimensio<strong>na</strong>da, a fragilidade <strong>do</strong>s modelosatuais de socialização, ten<strong>do</strong> em vista que as formas de ser não são mais orientadas por pautasestáveis, mas por <strong>um</strong>a combi<strong>na</strong>ção variada e heterogênea de lógicas de ação que organizam aexperiência social <strong>do</strong>s indivíduos (DUBET e MARTUCCELLI, 1996). Especialmente estesprofissio<strong>na</strong>is percebem que as perso<strong>na</strong>lidades se colocam à frente <strong>do</strong>s papéis, o que deixa algode opaco e i<strong>na</strong>caba<strong>do</strong> no processo de socialização e dificulta a aderência <strong>do</strong> sujeito aosestatutos ou aos papéis sociais de aluno (DUBET, 1998), sobretu<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> a condição<strong>juvenil</strong> exige caminhos tão distintos (DAYRELL, 2007). Logo, a educação que pretendaenfrentar estes desafios precisa aproximar-se da rica vida <strong>juvenil</strong> (DUBET, 1998). É esseautor quem afirma precisarmos “ver, no caso <strong>do</strong> colégio, o lugar da a<strong>do</strong>lescência, pois, hojeem dia, o colégio é defini<strong>do</strong> por <strong>um</strong> tipo de guerra fria entre os a<strong>do</strong>lescentes e a <strong>escola</strong>”(DUBET, 1997, p. 227). Dayrell (2007) tratará dessa discussão, para demonstrar que a <strong>escola</strong>continua valen<strong>do</strong>-se da concepção de aluno da sociedade moder<strong>na</strong>, pois permanecedefenden<strong>do</strong> a clara separação entre <strong>escola</strong> e sociedade, negligencian<strong>do</strong> ou exigin<strong>do</strong> que,quan<strong>do</strong>, ali, o jovem se encontre, desvincule-se de sua realidade.Conforme vimos com Gonzáles Arroyo (2007), ainda se defende a concepçãohomogeneizada de aluno ou, <strong>como</strong> afirmou Pain (2003), a pessoa é colocada entre parêntese<strong>na</strong> abstração <strong>do</strong> aluno, mesmo n<strong>um</strong> contexto que tanto se afasta das idealizações da instituição<strong>escola</strong>. Os professores sujeitos desta pesquisa, em sua ampla maioria, não se relacio<strong>na</strong>ram àconvivência <strong>como</strong>, também, fi<strong>na</strong>lidade da <strong>escola</strong>, mas ape<strong>na</strong>s enquanto limite <strong>do</strong> quecompreendem <strong>como</strong> fim: o que consideram <strong>como</strong> aprendizagem.Os sujeitos 9-M, 10-F, 13, 16-F e 18-F citam situações <strong>na</strong>s quais a aprendizagemé comprometida pelas limitações <strong>do</strong>s estudantes, mas, se houve respeito à sua figura evalorização <strong>do</strong> seu espaço de aula, se o aluno demonstra esforço <strong>na</strong> realização das tarefas,<strong>como</strong> disse o sujeito 9-M, isso ajuda a sua autoestima, pois, de fato, é o que mais importa paraesses professores. Segun<strong>do</strong> Dayrell (2007) e Housseaye (1996), a subjetividade <strong>do</strong> alunoainda é posta de la<strong>do</strong>, para somente se avaliar sua “inteligência” e “esforço”. Digno de nota éque, justamente, o sujeito 6-F, que se referiu a esta subjetividade e à consideração dela emsuas aulas, declarou não ter problema com os alunos.Precisamos repensar a <strong>escola</strong> para que atenda às necessidades <strong>do</strong>s alunosa<strong>do</strong>lescentese ou jovens, pois, subscreven<strong>do</strong> Bleger (1984), as instituições foram criadas,


107para servir ao h<strong>um</strong>ano e não o contrário. Desse mo<strong>do</strong>, precisamos colocar em causa estainstituição, falar esta instituição, permitir-se o novo com <strong>um</strong>a ousadia responsável, lapidarpara nós a afirmação de Dayrell (2007) de que, em meio a esta aparente desordem, os jovensanunciam a necessidade da nova <strong>escola</strong>, apesar de continuarmos sur<strong>do</strong>s a este clamor.Assim, convém pensar <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> para o a<strong>do</strong>lescente e ou o jovem e, maisespecificamente, pensar <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> que atenda às necessidades específicas de a<strong>do</strong>lescentes eou jovens que tiveram sua autoimagem abalada pelo histórico de fracasso <strong>escola</strong>r e conflitocom a <strong>escola</strong> dita regular, pois, <strong>como</strong> observou Oury (apud PAIN): “ou vamos mudar essaprofissão, ou vamos mudar de profissão”. Ousamos acrescentar mais <strong>um</strong>a possibilidade: ouvamos a<strong>do</strong>ecer, razão pela qual trataremos de nova unidade de senti<strong>do</strong>, o a<strong>do</strong>ecimento notrabalho. Melhor dizen<strong>do</strong>, precisamos pensar <strong>um</strong>a <strong>escola</strong> para as pessoas, além e aquém <strong>do</strong>spapéis/lugares.A voz <strong>do</strong>(c)ente: sofrimentos em ressonânciaA gente começa a pensar assim: gente, será que você tá perden<strong>do</strong> a... aquelacapacidade que você tem de poder... Porque eu imagino assim, que, quan<strong>do</strong> você vaifican<strong>do</strong> mais experiente, mais velho de Secretaria, que as experiências pudessemajudar no decorrer <strong>do</strong> dia a dia. E aí, eu tô ainda fazen<strong>do</strong> esta reflexão. Mas,chegan<strong>do</strong> aqui... teve até... as primeiras sema<strong>na</strong>s que a gente começou a... atrabalhar, e eu fiquei assim, sem graça de levantar, sabe? Lá <strong>na</strong> sala <strong>do</strong>s professores,e comentar: gente, olha, eu não tô conseguin<strong>do</strong> trabalhar. Eu fiquei com vergonha deser o primeiro a falar (risos). Porque to<strong>do</strong>s nós estávamos sentin<strong>do</strong> a mesma coisa(SUJEITO 12-M).Procuramos fazer <strong>um</strong> estu<strong>do</strong> sobre o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>juvenil</strong> e deparamos com <strong>um</strong>a dasconsequências que o retroalimenta: o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>do</strong>cente, o que nos habilita a falar <strong>na</strong> <strong>escola</strong><strong>como</strong> <strong>um</strong> espaço de sofrimentos em ressonância. Nós sabíamos de sua existência, poisconvivemos com ele la<strong>do</strong> a la<strong>do</strong>, nestes vinte anos de <strong>do</strong>cência, mas a nossa proximidade nãonos permitia o dimensio<strong>na</strong>mento de sua extensão que tivemos com esta pesquisa, eassustamo-nos com o que vimos.Ao falar de profun<strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> associa<strong>do</strong> ao exercício da profissão n<strong>um</strong> contextode indiscipli<strong>na</strong> e ou violência praticada por a<strong>do</strong>lescente e ou jovens que ocupam o papel dealuno, os sujeitos desta pesquisa não estão sozinhos, visto que, conforme demonstraremos nosda<strong>do</strong>s que se seguem, inúmeras são as pesquisas que comprovam o sofrimento no trabalho porparte de professores.Em que pesem to<strong>do</strong>s os outros fatores, a impotência foi a grande tônica das falasde nossos sujeitos de pesquisa. A palavra mais usada para expressar este sentimento foi


108incapacidade (usada sete vezes), o que o remete a profun<strong>do</strong> sentimento de inutilidade(palavra evocada quatro vezes), que é acompanha<strong>do</strong> de tristeza, ten<strong>do</strong> si<strong>do</strong> esta palavraevocada cinco vezes. Além disso, ouvimos, por três vezes, a expressão: eu me sintofrustra<strong>do</strong>(a).É árdua a tarefa de separar <strong>um</strong>a dessas frases, ten<strong>do</strong> em vista a eloquência detantas delas e a forma ímpar <strong>como</strong> cada <strong>um</strong> enunciou sua <strong>do</strong>r. Comecemos por recortes da falade <strong>um</strong> sujeito que muito nos tocou no momento da escuta, haja vista tratar-se de <strong>um</strong> professorde pouca idade e que carrega consigo to<strong>do</strong> o arquétipo <strong>do</strong> masculino sisu<strong>do</strong> que pouco fala deseus sentimentos:E, pela primeira... e... pela primeira vez, <strong>na</strong> Fundação, <strong>na</strong> Secretaria de Educação,em onze anos, eu me sinto incapaz. Totalmente incapaz de passar conhecimento paraestes alunos. Pela primeira vez que eu me sinto completamente incapaz. [...] Essa é aminha... a minha situação, assim... eu n<strong>um</strong>... Isso aí, <strong>na</strong> verdade, começa a afetar étu<strong>do</strong> mesmo (o professor embola muito a voz e dificulta o entendimento da frase),afetar a gente mesmo, né? Você não tem vontade. [...] a gente anda no corre<strong>do</strong>r coma cabeça baixa, para não chamar a atenção. Nós... eu me sinto <strong>um</strong>... <strong>um</strong>... igual eucoloquei pro aluno <strong>um</strong> dia: eu me sinto <strong>um</strong> idiota em sala de aula. [...] Agora, vocêsai daqui... acabei de sair de <strong>um</strong>a quinta B ali, pelo amor de Deus! A gente... agente... (embarga a voz novamente) sabe... chega triste, né? (O professor seemocio<strong>na</strong>) Olha que situação. (o professor faz <strong>um</strong> silêncio). Só isso. Sorri e diz:minhas angústias (SUJEITO 13-M).Apesar de nossas reservas juntamente com Birman (2009) com a medicalização ea psicopatologização <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, faremos <strong>um</strong>a aproximação da corrente nosográfica que vemestudan<strong>do</strong> o a<strong>do</strong>ecimento <strong>do</strong> professor por meio da síndrome de burnout, por reconhecermos asua importância <strong>como</strong> esforço de categorização que muito pode ajudar a análise. Isso ocorrecom a síndrome de Burnout: <strong>um</strong>a forma de a<strong>do</strong>ecimento decorrente <strong>do</strong> contínuo estresseocupacio<strong>na</strong>l que acomete profissio<strong>na</strong>is envolvi<strong>do</strong>s com qualquer tipo de relação trabalhistaem que o cuida<strong>do</strong> se coloque <strong>como</strong> próprio <strong>do</strong> ofício e em que haja <strong>um</strong>a relação de atençãodireta, contínua e altamente atravessada pela dimensão emocio<strong>na</strong>l (MASLACH, SCHAUFELIe LEITER 2001).Segun<strong>do</strong> estes autores, referências nesta discussão, a síndrome caracteriza-se porexaustão emocio<strong>na</strong>l, que se manifesta <strong>como</strong> falta ou carência de energia, perda de entusiasmo,sensação de esgotamento de recursos e perda de senti<strong>do</strong> de realização pessoal no trabalho,levan<strong>do</strong> o trabalha<strong>do</strong>r a autoavaliar-se de forma depreciativa. É com<strong>um</strong> <strong>um</strong> processo dedesperso<strong>na</strong>lização pelo qual se passa a tratar os receptores <strong>do</strong> serviço presta<strong>do</strong>, os colegas e aorganização <strong>como</strong> objetos.Apesar de alguns excessos de inclusão de a<strong>do</strong>ecimentos nesta síndrome, muitocom<strong>um</strong> <strong>na</strong>s abordagens psicopatologizantes, os teóricos desta vertente pontuam que, para ser


109configurada, deve existir a pre<strong>do</strong>minância <strong>do</strong>s <strong>sintoma</strong>s: exaustão mental e emocio<strong>na</strong>l; fadigae depressão; ausência de histórico pessoal de psicopatologias; diminuição da afetividade e <strong>do</strong>desempenho no trabalho; pre<strong>do</strong>minância de atitudes e comportamentos negativos; <strong>sintoma</strong>srelacio<strong>na</strong><strong>do</strong>s ao trabalho. O conjunto destas características aproxima-se, consideravelmente,das falas <strong>do</strong>s sujeitos desta pesquisa. A título de ilustração, pontuaremos alg<strong>um</strong>as das<strong>sintoma</strong>tologias desta síndrome destacadas por Carlotto (2002), a fim de comparar-se com asfalas <strong>do</strong>s sujeitos: Exaustão física e emocio<strong>na</strong>l:Semestre passa<strong>do</strong>, quan<strong>do</strong> cheguei aqui, logo depois dela, eu me assustei com <strong>estar</strong>ealidade. E não demorou muito. Eu nunca tinha tira<strong>do</strong> <strong>um</strong>a licença médica (algunsprofessores manifestam que também tiraram licença no ano que passou), eu tireilicença por voz, eu nunca tinha tira<strong>do</strong>. Eu tenho problema de voz? Tenho. Descobrijá tem <strong>um</strong> tempo, mas a... a... o trabalho da gente é tão desgastante, foi tãodesgastante no semestre passa<strong>do</strong> aqui, que eu não aguentei (SUJEITO 18-F). Irritabilidade: além da frase em epígrafe nesta análise de da<strong>do</strong>s, a questão aparecemais nos diálogos que tivemos com os alunos, nos quais eles diferenciam as aulasboas das ruins, sen<strong>do</strong> as primeiras <strong>do</strong>s professores que são “legais” com eles, e assegundas, de professores irritadiços que (sic) os “tiram de tempo”. A fala que seguepertence a <strong>um</strong> sujeito cujos alunos referiram-se a ele <strong>como</strong> irritadiço.O SUJEITO 16-F é a professora mãe. Eu que sou o professor padastro, sabe? (risos)porque, realmente, eu não gosto... [...] é muito difícil justificar comigo. [...] Então,os alunos acham que eu sou <strong>um</strong> professor muito durão. Mas, <strong>na</strong> realidade, não sou.Mas, sou daqueles la... é difícil me convencer, né? (SUJEITO 15-M). Ansiedade e tristeza: conforme vimos, o sentimento de tristeza foi expresso com oauxílio desta palavra cinco vezes. Isso fica claro <strong>na</strong> fala que segue e que é a <strong>do</strong> mesmosujeito que enunciou a fala agressiva da epígrafe desta análise de da<strong>do</strong>s:Me deixa muito... é... entristeci<strong>do</strong>, magoa<strong>do</strong> é... (o professor embarga a voz e não dápara entender). Mas, eu fico muito triste. Às vezes chego em casa, e minha mulhernão entende que eu tô assim cabisbaixo, e ela pensa: “Não, o que aconteceu... meiotriste? Você d... “Nada, não”. É porque você não consegue produzir, e <strong>um</strong> cidadãoque pensa que ele não produz <strong>na</strong>da, se ele não for medíocre, ele fica triste. E euainda não faço parte <strong>do</strong>s medíocres, ainda (SUJEITO 14-M). Prejuízos no desempenho profissio<strong>na</strong>l, perda de entusiasmo e criatividade: entretantas falas, destacamos a que segue:Eu me sinto frustrada. Porque, assim, eu não tenho mais recursos. Eu não sei o queutilizar pra chamar a atenção, assim, para utilizar pra aula desse aluno (SUJEITO16-F). Diminuição da simpatia e distanciamento <strong>do</strong>s alunos:Mas, a questão é que há muito tempo. Não tenho tanto tempo... onze anos deFundação. Há <strong>um</strong> tempo... havia outra realidade. No médio quatro, nós trabalhamosjuntos no médio quatro há <strong>do</strong>is anos atrás. A gente saía da sala de aula, e a sala <strong>do</strong>sprofessores era longe, e a gente ia passan<strong>do</strong> entre os meninos, e eles iam


110c<strong>um</strong>primentan<strong>do</strong>, aluno brincan<strong>do</strong>, mexen<strong>do</strong> com você. Sabe? Conversan<strong>do</strong> nocorre<strong>do</strong>r... e to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>... mexen<strong>do</strong> com <strong>um</strong>, brincan<strong>do</strong> com outro. Aqui, a gentesai da sala <strong>do</strong>s professores, e eles te atropelam. Ele te bate, sabe? Ele joga em cima.Sabe? Você tem que ir desvian<strong>do</strong> dele... [...]a gente anda no corre<strong>do</strong>r com a cabeçabaixa, para não chamar a atenção (SUJEITO 13-M). Perda de otimismo quanto à avaliação de seu futuro:O que o SUJEITO 16-F está falan<strong>do</strong> sobre estas pessoas readaptadas que estão noscorre<strong>do</strong>res e <strong>na</strong>s salas de vídeo... eu me vejo <strong>um</strong>a futura readaptada. Sabe por quê?(Deus me livre! Fala <strong>um</strong> professor ao fun<strong>do</strong>). Não. É sério, gente. (SUJEITO 18-F). Frustração: ocorrência por problemas em sala de aula.. Inúmeras são as falas nestesenti<strong>do</strong>. Além das já citadas, destacamos: Hostilidade a administra<strong>do</strong>res:Eu fico frustrada, eu me sinto também impotente, eu vejo que sou inútil, porque, pormais que eu queria fazer alg<strong>um</strong>a coisa, parece que eu só fico pati<strong>na</strong>n<strong>do</strong>. Eu nuncasaio <strong>do</strong> lugar. E é isso. Nossa realidade tem si<strong>do</strong> esta. De <strong>um</strong> ano e meio para cá,tem si<strong>do</strong> cada vez pior (SUJEITO 4-F).E, pra mim, o que foi pior, foi o mais <strong>do</strong>loroso, foi eu sentir que eu não tinha apoionenh<strong>um</strong> da <strong>escola</strong> (SUJEITO, 16-F). Hostilidade a familiares <strong>do</strong>s alunos: Hostilidade a alunos.O negócio é a família, eles colocam o aluno aqui e nós... Deus e nós tomamos conta.Deus e nós tomamos conta. É o que está acontecen<strong>do</strong>. Então, a gente precisa trazer afamília para a responsabilidade. Dizer pro pai: seu filho tem só 15 anos, pai. Você éresponsável. Se você não é, o Conselho Tutelar vai dizer quem é (SUJEITO 1-F). Desenvolvimento de visão depreciativa quanto à profissão:Então, são... inversão de valores. Aquilo que precisava ter <strong>um</strong>a res... serresguarda<strong>do</strong>, que é o professor, <strong>como</strong> nos países <strong>do</strong> Oriente, os professores são...são, sei lá. São ti<strong>do</strong>s <strong>como</strong> mestres, porque nós não somos mestres... só se for deobra. Seria bom se fosse de obra, porque ia ganhar melhor <strong>do</strong> que o professor. Mas,nós somos desvaloriza<strong>do</strong>s to<strong>do</strong>s os dias! (SUJEITO 14-M). Insônia: apesar de não termos pergunta<strong>do</strong> sobre a saúde <strong>do</strong>s professores, por duasvezes, a questão <strong>do</strong> sono surgiu; <strong>um</strong>a delas já consta da fala <strong>do</strong> sujeito 13-M (citada),<strong>na</strong> qual comenta que chegou a casa e <strong>do</strong>rmiu a noite toda, e esta segunda:Então, no começo, assim, eu nem <strong>do</strong>rmia direito, porque a gente fica pensan<strong>do</strong>, nãoé? Meu mari<strong>do</strong> falou: muda! Volta pro regular, não é? (SUJEITO 5-F).Há outros <strong>sintoma</strong>s psicossomáticos comuns, mas que não foram objeto de nossainvestigação: úlceras, <strong>do</strong>res de cabeça e hipertensão, além de abuso no uso de álcool,medicamentos e outras drogas. Para Farber (1991), a síndrome de Burnout deve ser a<strong>na</strong>lisadamediante perspectivas sociológicas, psicológicas e organizacio<strong>na</strong>is. O autor destaca o fato dea educação ser cercada de metas idealistas que favorecem o a<strong>do</strong>ecimento, o que também édito por <strong>um</strong> de nossos sujeitos: “Eu acho que a gente... é... fantasia <strong>um</strong>a realidade que nãoexiste” (SUJEITO 7-F).


111Segun<strong>do</strong> Carlotto (2002), amparan<strong>do</strong>-se em inúmeras pesquisas, são maisacometi<strong>do</strong>s professores atuantes com a<strong>do</strong>lescentes e jovens em contextos de conflito entreprofessores e alunos nos quais os professores têm de ass<strong>um</strong>ir outras funções além dasacadêmicas; nos quais há falta de autonomia e não participação <strong>na</strong>s decisões da educação;onde as condições salariais são desfavoráveis e as possibilidades de ascensão e progressãofuncio<strong>na</strong>l são inexistentes ou precárias; em que há ausência de trabalho em equipe <strong>na</strong> atuaçãopedagógica; em que há carência das redes sociais <strong>do</strong>s atores professores; em que háfragilidades da formação que não os prepara para os desafios que encontram <strong>na</strong> <strong>escola</strong>,sobretu<strong>do</strong>, por centrarem-se em questões técnicas; em que a relação com a família sejaausente ou equivocada; em que há excesso de críticas, pois, apesar de todas as profissões<strong>estar</strong>em sob constante avaliação da sociedade, de acor<strong>do</strong> com Farber (1991), nenh<strong>um</strong>a é maisavaliada e cobrada quanto a de professor. Digno de nota é que todas as afirmações citadasforam faladas pelos nossos sujeitos de pesquisa ou observadas por nós, sem exceção.Eu também não estou conseguin<strong>do</strong>, estou conseguin<strong>do</strong> ser inútil. Porque eles nãoquerem mesmo. Eu tento de <strong>um</strong>a forma e de outra. Já perdi... não tenho maisqualificação. De vinte e três anos da sala de aula, lá, de chamar a atenção para elesse interessarem. Não tem nenh<strong>um</strong> interesse lá. E aí, a frustração é igual à de to<strong>do</strong>s(SUJEITO 9-M).Assim, eu me sinto inútil. Porque, assim, tu<strong>do</strong> que eu já tentei durante... Eu estou <strong>na</strong>Secretaria de Educação desde 89. Desde 88. Então, assim, tu<strong>do</strong> que eu tento, sabe?Parece que eu não consigo alcançá-los. Quan<strong>do</strong> eu penso que já consegui, aí pareceque... sabe? (SUJEITO 3-F).Buscaremos concluir este núcleo de senti<strong>do</strong> com o auxílio da psicodinâmica <strong>do</strong>trabalho. Conforme dito, não possuíamos <strong>um</strong> capítulo teórico sobre o sofrimento no trabalho,ten<strong>do</strong> em vista não ter si<strong>do</strong> este o nosso foco inicial. Logo, fomos buscan<strong>do</strong> a teoriajuntamente com a análise e interpretação das falas <strong>do</strong>s sujeitos, visto que, além de constituirseo maior núcleo, trata-se de <strong>um</strong>a temática que perpassa praticamente to<strong>do</strong>s os outros núcleosde senti<strong>do</strong> e demais falas que orbitam em torno deles.Ten<strong>do</strong> em vista a grande quantidade de citações <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s já feitas com o auxílioda análise nosográfica, nos deteremos mais à teoria no senti<strong>do</strong> de reler, ratificar, e por vezesretificar alg<strong>um</strong>as das percepções que se encontram em voga com ancoragem <strong>na</strong>s correntesnosográficas.A psicodinâmica <strong>do</strong> trabalho foi pensada pelo psiquiatra e psica<strong>na</strong>lista francêsChristophe Dejours, para quem, é tanto <strong>um</strong>a clínica que se ancora <strong>na</strong> “descrição e noconhecimento das relações entre trabalho e saúde mental”, quanto <strong>um</strong>a teoria que busca“inscrever os resulta<strong>do</strong>s da investigação clínica da relação com o trabalho n<strong>um</strong>a teoria <strong>do</strong>


112sujeito” e que se utiliza tanto da psicanálise quanto da teoria social. Esta corrente teóricareconhece <strong>um</strong> lugar de centralidade <strong>do</strong> trabalho para a subjetividade, pois, consoante Dejours(2004, p. 28), o trabalho:É aquilo que implica, <strong>do</strong> ponto de vista h<strong>um</strong>ano, o fato de trabalhar: gestos, saberfazer,<strong>um</strong> engajamento <strong>do</strong> corpo, a mobilização da inteligência, a capacidade derefletir, de interpretar e de reagir às situações; é o poder de sentir, de pensar e deinventar etc.Como tal, apresenta impactos para a colocação <strong>do</strong> sujeito no mun<strong>do</strong> e no mo<strong>do</strong> deengajamento da perso<strong>na</strong>lidade, para responder a <strong>um</strong>a tarefa delimitada por pressões. Logo, ossujeitos desta pesquisa não vivenciam os <strong>sintoma</strong>s de seu <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong>, exclusivamente, noambiente de trabalho, conforme vimos das falas.Para esta teoria, trabalhar é preencher a lacu<strong>na</strong> entre o prescrito e o real, aquiloque o trabalha<strong>do</strong>r deve acrescentar de si mesmo, para enfrentar o que não funcio<strong>na</strong> quan<strong>do</strong> seatém à execução das prescrições de seu ofício. Há, portanto, <strong>um</strong>a colocação <strong>do</strong> sujeito <strong>na</strong>realização daquela tarefa. No mo<strong>do</strong> <strong>como</strong> faz, o trabalha<strong>do</strong>r implica sua subjetividade no real(DEJOURS, 1994). Esta percepção explica-nos o incremento <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>ecimentos <strong>do</strong>centes,ten<strong>do</strong> em vista a distância cada vez maior entre o prescrito e o real da qual tanto nos falaramos sujeitos da pesquisa.Para Dejours (2009), a prescrição é toda <strong>um</strong>a estrutura organizacio<strong>na</strong>l, <strong>um</strong>conjunto de regras, normas, mo<strong>do</strong>s instituí<strong>do</strong>s de fazer. Por sua vez, o real revela-se ao sujeitopela sua resistência aos procedimentos, pelo fracasso da maestria, e, <strong>como</strong> não há prescriçãoque dê conta <strong>do</strong> real, este coloca o sujeito em xeque, apresentan<strong>do</strong>-se ao trabalha<strong>do</strong>r semprede mo<strong>do</strong> afetivo, por meio <strong>do</strong> corpo, geran<strong>do</strong> sofrimento, ao qual pode responder comcriatividade ou a<strong>do</strong>ecimento.Meirieu (2002) compreende que o ato pedagógico genuíno é o que se coloca pelaresistência <strong>do</strong> real, no qual o professor é obriga<strong>do</strong> a mobilizar sua inventividade a serviço daaprendizagem <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s. Contu<strong>do</strong>, o mito cientificista <strong>na</strong> pedagogia (LAJONQUIÈRE,1999) mata esta inventividade, ao prescrever <strong>um</strong> conjunto de técnicas e modelos para oprocesso pedagógico.Sen<strong>do</strong> assim, o sofrimento decorrente da relação com o real, para Dejours (2004),não é o fim de <strong>um</strong> processo, mas <strong>um</strong> ponto de partida para a proteção da subjetividade que semobiliza <strong>na</strong> busca de meios de ação sobre o mun<strong>do</strong>. A transformação deste sofrimento é ocaminho que permitirá superar a resistência <strong>do</strong> real, que, por sua vez, transforma asubjetividade, engrandecen<strong>do</strong>-a e revelan<strong>do</strong>-se a si mesmo, <strong>como</strong> fizeram os grandes nomesda Pedagogia, ou diminuin<strong>do</strong>-a <strong>como</strong> parecem fazer os nossos sujeitos desta pesquisa.


113É por esta razão que o corpo ocupa lugar de destaque <strong>na</strong> psicodinâmica <strong>do</strong>trabalho, pois é inteiramente envolvi<strong>do</strong> <strong>na</strong> resistência <strong>do</strong> real, visto não existir sofrimento sem<strong>um</strong> corpo para experimentá-lo. É pelo corpo que o sujeito investe e vê-se no mun<strong>do</strong>, o quetambém ajuda a explicar os <strong>sintoma</strong>s psicossomáticos da síndrome de Burnout.A própria inteligência <strong>do</strong> corpo forma-se no e pelo trabalho. Não é i<strong>na</strong>ta, masadquirida no exercício da atividade que passa por <strong>um</strong>a relação perseverante <strong>do</strong> corpo com atarefa. Esta inteligência <strong>do</strong> corpo (prática) é mais que habilidade, pois envolve <strong>um</strong>investimento afetivo. Trata-se, portanto, de <strong>um</strong> corpo erógeno: corpo que a gente habita, quese experimenta afetivamente, engaja<strong>do</strong> <strong>na</strong>s relações com o outro, coloca<strong>do</strong> a serviço daexpressão <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> e da vontade de agir sobre a sensibilidade <strong>do</strong> outro (DEJOURS, 1994).Não há, assim, separações sistemáticas: o processo de vivência desse corpoimplica a subjetividade por inteiro. Não há dissociações com<strong>um</strong>ente defendidas entre opessoal e o profissio<strong>na</strong>l, o racio<strong>na</strong>l e o emocio<strong>na</strong>l, o técnico e o afetivo, <strong>como</strong> propõem osteóricos da síndrome de Burnout, pois, quan<strong>do</strong> dissociamos, temos o a<strong>do</strong>ecimento. É o ser quevivencia e é habita<strong>do</strong> pelo sofrimento <strong>do</strong> trabalhar, pela resistência e pelas esquivas <strong>do</strong>mun<strong>do</strong>.Ten<strong>do</strong> em vista o fato de mobilizar a perso<strong>na</strong>lidade, o tempo <strong>do</strong> trabalho não serestringe ao limite <strong>do</strong> tempo físico conforme expressaram os nossos sujeitos de pesquisa, aorelatarem situações que extrapolam o ambiente de trabalho. Sen<strong>do</strong> assim, o trabalho, <strong>na</strong>quiloque tem de essencial, não pertence ao mun<strong>do</strong> visível, o que também gera sofrimento, vistoque é i<strong>na</strong>cessível à quantificação, pois só a dimensão da materialidade da produção é passívelde avaliação, o que não dá conta <strong>do</strong> trabalho efetivo (DEJOURS, 2004).Para Dejours (2008a), o uso da inteligência é com<strong>um</strong>ente invisível, discreto,clandestino, escondi<strong>do</strong>, pois os recursos que mobilizamos para enfrentar o real podemsubverter as prescrições, poden<strong>do</strong> ser passíveis de conde<strong>na</strong>ção, repreensão ou punição, aindaque favoráveis à empresa. Além <strong>do</strong> que, grande parte <strong>do</strong> trabalho ocorre em outros espaçosque não o <strong>do</strong> trabalho efetivo: <strong>na</strong> vida familiar, no momento de <strong>do</strong>rmir (conforme relataramos sujeitos 5-F e 13-M), nos horários de lazer, <strong>na</strong>s relações extraempresa (<strong>como</strong> relatou osujeito 14-M).Para a psicodinâmica <strong>do</strong> trabalho, portanto, trabalhar não é somente produzir, masproduzir-se, transformar a si mesmo, realizar-se, colocar a subjetividade à prova. É inscreverseno mun<strong>do</strong>, ao tempo em que transforma este mun<strong>do</strong>. Logo, o trabalho coloca-se <strong>como</strong>central no funcio<strong>na</strong>mento psíquico, sen<strong>do</strong> difícil, inclusive, falar em <strong>um</strong>a inteligência,quan<strong>do</strong>, de fato, são mobilizadas inteligências.


114A resistência <strong>do</strong> real não se circunscreve à tarefa somente, mas também àexperiência da resistência <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> social, o que as <strong>escola</strong>s cost<strong>um</strong>am tentar solucio<strong>na</strong>r pormeio <strong>do</strong> que Dejours (2008b) denomi<strong>na</strong> <strong>como</strong> coorde<strong>na</strong>ção, o que está <strong>na</strong> dimensão <strong>do</strong>prescrito. Para o autor, cabe aos trabalha<strong>do</strong>res vencer o solipsismo <strong>do</strong> exercício das funçõespor meio da cooperação, com vistas ao estabelecimento de regras e acor<strong>do</strong>s sobre as maneirasde trabalhar, ass<strong>um</strong>ir compromissos coletivos entre os estilos <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res, buscan<strong>do</strong><strong>um</strong>a compatibilização de suas preferências e performances.Conforme já vimos, outros autores que discutem a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> tambémapontam a importância <strong>do</strong> grupo <strong>na</strong> transformação das realidades <strong>escola</strong>res. Em nosso espaçode pesquisa, não há tal grupo. Os professores sofrem sozinhos, o que é denuncia<strong>do</strong> por Pain(2003) e Dubet (1997). Na modalidade de EJA, os professores possuem carga horária de 20horas sema<strong>na</strong>is, logo não há <strong>um</strong> espaço para reuniões de to<strong>do</strong> o grupo. Chegamos a levar paraa <strong>escola</strong> <strong>um</strong>a equipe de estagiários de Psicologia acompanha<strong>do</strong>s por <strong>um</strong>a professora quetrabalha com a Clínica <strong>do</strong> Trabalho de Dejours, sem que ela conseguisse atender aosprofessores, seja porque eles não vão à <strong>escola</strong>, nos dias das coorde<strong>na</strong>ções pedagógicas, sejaporque não acreditavam <strong>na</strong> clínica. Um professor, que nunca esteve em nenh<strong>um</strong> <strong>do</strong>s grupos deescuta, visto que não coorde<strong>na</strong>va, falou-me em certa ocasião: “Eu não tenho nenh<strong>um</strong>problema. Se alguém tem, o problema é dele.” Também ouvimos <strong>do</strong> sujeito 16-F o relato deque se envolvera <strong>na</strong> separação de <strong>um</strong>a briga física entre <strong>do</strong>is a<strong>do</strong>lescentes sem que nenh<strong>um</strong><strong>do</strong>s seus colegas professores a ajudassem. Informa que pediu ajuda aos colegas, que fecharamsuas portas, para não se envolver no problema.Assim, faz-se necessário dar visibilidade e tor<strong>na</strong>r inteligível o uso particular dainteligência que cada trabalha<strong>do</strong>r faz no seu trabalho. Isso os ajuda a tor<strong>na</strong>r compreensíveis ejustificar os distanciamentos em relação aos procedimentos prescritos. Em outras palavras,tira-os da invisibilidade parte da sua mobilização e a elaborar, significar, simbolizar e nomearsuas práticas. Contu<strong>do</strong>, para que isso ocorra, é necessário que possam encontrar-se em gruposcooperativos, que, <strong>como</strong> vimos, não existem <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Nem mesmo a presença deprofissio<strong>na</strong>l para ajudá-los favoreceu a criação de grupos.O quadro desta <strong>escola</strong> mostra-se preocupante, pois, além <strong>do</strong> que foi relata<strong>do</strong>, nãohá <strong>um</strong> trabalho em grupo. A psicodinâmica privilegia o viver junto, pois o abrir-mão <strong>do</strong>desejo individualista leva a conflitos e pode evoluir para patologias, enquanto, <strong>na</strong> cooperação<strong>do</strong> coletivo, possibilita-se tor<strong>na</strong>r visível importante dimensão da invisibilidade <strong>do</strong> trabalho,obten<strong>do</strong>-se, assim, reconhecimento <strong>do</strong>s pares. Esse aspecto, segun<strong>do</strong> Dejours, é o maissignificativo <strong>do</strong>s reconhecimentos <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r, da<strong>do</strong> que lhe confere pertencimento e


115distancia-o da solidão social. Para Dejours (2007), o sofrimento pode ser <strong>um</strong> ponto de partidae não ape<strong>na</strong>s <strong>um</strong>a consequência lastimável <strong>do</strong> trabalho.Os processos de avaliação inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l (PISA) e <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l (SAEB) da educaçãopodem intensificar o sofrimento no trabalho caso se atrelem a propostas meritocráticas quemensuram o trabalho por meio de avaliações profissio<strong>na</strong>is, pois, de acor<strong>do</strong> com Dejours(2008a), não levam em consideração a dimensão subjetiva <strong>do</strong> trabalho e, <strong>na</strong> sua grandemaioria, mostram-se <strong>como</strong> perversos ao trabalha<strong>do</strong>r, por desmerecê-los, reforçar <strong>um</strong>asobrecarga, gerar ansiedade e não permitir o reconhecimento – fator fundamental para a saúdeno trabalho.Não é de cobranças desnecessárias que os profissio<strong>na</strong>is da educação precisam,visto que, para a psicodinâmica, o prazer e o sofrimento são proporcio<strong>na</strong>is ao grau deautonomia que o trabalha<strong>do</strong>r tenha para a manifestação de sua inteligência prática, ao espaçode fala valida<strong>do</strong> socialmente que possua com os demais trabalha<strong>do</strong>res significativos para ele eao grau de cooperação ou individualismo construí<strong>do</strong>. Não se pense com isto que o trabalha<strong>do</strong>rseja passivo às condições postas pelas organizações. Mendes (2007) demonstra que, quan<strong>do</strong> aorganização <strong>do</strong> trabalho apresenta resistência para o prazer no trabalhar, o trabalha<strong>do</strong>r tende adesenvolver formas de defesa, para mediar o sofrimento, que podem ser: o cinismo, adissimulação, a hiperatividade, a desesperança, o desprezo, os danos aos subordi<strong>na</strong><strong>do</strong>s, anegação <strong>do</strong> risco inerente ao trabalho e a distorção da comunicação. Muitas dessascaracterísticas emergem das falas de nossos sujeitos de pesquisa.De outro mo<strong>do</strong>, essas “estratégias defensivas adaptam-se às demandas e àscaracterísticas de cada profissão, diferencian<strong>do</strong>-se entre os sexos” (MENDES e MORRONE,2002, p.36). As autoras evocam outras pesquisas que denunciam múltiplas e variadasestratégias de enfrentamento <strong>do</strong> sofrimento no trabalho por parte <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res, tais <strong>como</strong>,isolamento psicoafetivo e profissio<strong>na</strong>l <strong>do</strong> grupo de trabalho, resig<strong>na</strong>ção, descrença, renúncia àparticipação, indiferença e apatia.Jayet (1994 apud MENDES e MORRONE, 2002) destaca <strong>como</strong> indica<strong>do</strong>res deutilização de estratégias defensivas <strong>na</strong> situação de trabalho: desmotivação edesencorajamento, condutas de evitação, comportamentos agressivos, diluição deresponsabilidades, ativismos excessivos, presença excessiva ao local de trabalho,individualismo exacerba<strong>do</strong>. Mendes (1996 apud MENDES e MORRONE, 2002) destaca aracio<strong>na</strong>lização, a passividade e o individualismo, além de <strong>um</strong> conjunto de outras estratégiasespecíficas a cada área de atuação, presentes entre os nossos sujeitos de pesquisa, conformevimos.


116Nesse senti<strong>do</strong>, a psicodinâmica esclarece que essas defesas, ao tempo em quepodem auxiliar o enfrentamento <strong>do</strong> sofrimento, podem intensificá-lo, transforman<strong>do</strong>-se empatologias sociais, tais <strong>como</strong>, a sobrecarga, a servidão voluntária e a violência (MENDES,2007). Apesar <strong>do</strong> a<strong>um</strong>ento tecnológico, contraditoriamente, assistimos a <strong>um</strong> crescimento daspatologias ocasio<strong>na</strong>das por sobrecargas, das patologias pós-tra<strong>um</strong>áticas, não obstante osavanços em torno da civilidade, e das patologias <strong>do</strong> assédio, apesar <strong>do</strong>s avanços <strong>do</strong>s direitosh<strong>um</strong>anos, das depressões, <strong>do</strong>s suicídios ou das tentativas, associadas diretamente ao espaço detrabalho, mesmo com autonomia, independência e realização pessoal.De outra feita, a psicodinâmica <strong>do</strong> trabalho não se restringe à denúncia <strong>do</strong>a<strong>do</strong>ecimento no trabalho. Dejours, ao longo de sua caminhada, propôs <strong>um</strong>a clínica <strong>do</strong>trabalho, processo pelo qual o trabalha<strong>do</strong>r elabora, de forma criativa e saudável, os seusconteú<strong>do</strong>s de sofrimento junto a seus pares. Também não podemos perder de vista que aorganização <strong>do</strong> trabalho se encontra inserida em <strong>um</strong> contexto maior que tanto favorece quantolimita o prazer ou o sofrimento. Temos si<strong>do</strong> regi<strong>do</strong>s, ainda que o trabalha<strong>do</strong>r não tenha distoconsciência, pela lógica da racio<strong>na</strong>lidade econômica, <strong>um</strong>a forma de <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>ção sofisticada edifícil de ser identificada, que leva à precarização <strong>do</strong>s empregos e ao sofrimento ético, àba<strong>na</strong>lização das injustiças e <strong>do</strong> <strong>mal</strong>, às patologias sociais e à recomposição das defesas.Não obstante as questões precedentes tratadas, ainda se percebe <strong>um</strong> esforço <strong>do</strong>smeios de comunicação e de alguns setores da academia de reduzir o sofrimento <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>rao aspecto intrapsíquico e individual, <strong>como</strong> pode ser <strong>um</strong> <strong>do</strong>s riscos de alg<strong>um</strong>as abordagensque são feitas sobre a síndrome de Burnout. Daí advém o alerta de Faber (2001), <strong>um</strong> <strong>do</strong>sgrandes teóricos desta síndrome, para que a contextualizemos nos âmbitos social,organizacio<strong>na</strong>l e cultural.Ao que os teóricos da síndrome de Burnout apontam <strong>como</strong> perfeccionismo ouidealismo, responsabilizan<strong>do</strong> o sujeito pelo seu a<strong>do</strong>ecimento em razão de <strong>um</strong>a disposiçãointer<strong>na</strong>, Dejours (2000 apud MENDES, 2007) responde com a denúncia da hipersolicitação,conforme emerge da fala de <strong>um</strong> <strong>do</strong>s nossos sujeitos:Mas, você está se des<strong>do</strong>bran<strong>do</strong> com aquele tanto de problema diferente, né? Quevocê tem que ser, né? Aí, eu já sou mãe, que já faço isso em casa, que já éenfermeira, é professora, é tu<strong>do</strong>. E chega aqui, para fazer as mesmas coisas?(SUJEITO 5-F).Assim, a sobrecarga é de origem social, por ser prescrita pela organização <strong>do</strong>trabalho que, por sua vez, insere-se n<strong>um</strong>a lógica de excelência e desempenho, sobretu<strong>do</strong>quan<strong>do</strong> o trabalho está associa<strong>do</strong> ao sustento e à garantia de necessidades básicas ou à dereconhecimento (DEJOURS, 2008a).


117Subscreven<strong>do</strong> Boëtie, Dejours demonstrará que a servidão está relacio<strong>na</strong>da à pósmodernidadee ao projeto neoliberal, o que Mendes (2007) e Dejours (2008b) caracterizam<strong>como</strong> “convivência estratégica”, atitude pela qual o trabalha<strong>do</strong>r se sente obriga<strong>do</strong> a mostrar-se(e, por vezes, acreditar-se) conforma<strong>do</strong>, adapta<strong>do</strong>, integra<strong>do</strong> e eficaz. Isso legitima e<strong>na</strong>turaliza a ba<strong>na</strong>lização <strong>do</strong> sofrimento, das injustiças e <strong>do</strong> <strong>mal</strong>.Neste senti<strong>do</strong>, o termo título desta síndrome é perfeito, para explicitar a lógica daprodução no que concerne às demandas ao trabalha<strong>do</strong>r: dar tu<strong>do</strong> de si, queimar até o fim,cons<strong>um</strong>ir-se pela organização. Infelizmente, teóricos dessa síndrome reforçam a exploração,ao taxar <strong>como</strong> patológica a atitude daquele que “não se envolve mais com o que faz e reduz asambições."Freud considerou <strong>como</strong> da ordem <strong>do</strong> impossível as profissões <strong>do</strong> educar, <strong>do</strong> curare <strong>do</strong> gover<strong>na</strong>r. Com as devidas adaptações, é perfeita a aplicabilidade para os grupos de riscodessa síndrome. Apesar de Freud não ter trata<strong>do</strong>, diretamente, da questão, percebe-se seremprofissões associadas ao <strong>na</strong>rcisismo e à onipotência, características, conforme já abordamos,reforçadas, pois muito se espera de <strong>um</strong> médico, de <strong>um</strong> professor e de <strong>um</strong> gover<strong>na</strong>nte em diastão confusos, e, <strong>como</strong> sabemos, a onipotência é efeito e causa da impotência.A psicanálise ajuda-nos a perceber e exorcizar a onipotência tão própria dacondição de professor, visto que a Im-potência é muito próxima da Oni-potência própria de<strong>um</strong>a posição tão <strong>na</strong>rcísica quanto a <strong>do</strong> professor e que tem <strong>um</strong> histórico de status em nossopaís com perda significativa nos últimos anos. Colombier, Mangel e Perdriault (1989)chamam-nos à reflexão para o fato de que:O adulto, assim <strong>como</strong> a criança, também é habita<strong>do</strong> por esta nostalgia <strong>do</strong> prazer dafusão e <strong>do</strong> poder total. Esta nostalgia toma para o professor a forma de dupla ilusão:a de ser ele investi<strong>do</strong> de to<strong>do</strong>s os poderes, de saber tu<strong>do</strong> em face de <strong>um</strong> ser novo,despossuí<strong>do</strong> e instala<strong>do</strong> n<strong>um</strong>a dependência total. Se não localizarmos esta duplailusão, corremos o risco de não suportar os comportamentos <strong>do</strong>s alunos quedespertam em nós desejos infantis insatisfeitos: oscilamos, então, entre <strong>um</strong>arepressão que faz calar neles o que recusamos em nós e <strong>um</strong>a complacência que seesgota, por não chegar a satisfazer a falta <strong>do</strong> por demais gritante (p. 104).As autoras continuam a esclarecer que a dupla ilusão precisa ser localizada, paranão continuarmos ven<strong>do</strong> os alunos ape<strong>na</strong>s <strong>como</strong> outros semelhantes, recusan<strong>do</strong> as satisfaçõesque não tivemos ou nos apressan<strong>do</strong> em tu<strong>do</strong> satisfazer, “sem ter tempo de se perguntar se esteera seu desejo”. Faz-se necessário, portanto, <strong>um</strong> trabalho de reconhecimento em nós dacriança sempre presente, para que não continuemos falhan<strong>do</strong> no encontro com seres diferentes(da criança que fomos ou que queríamos ter si<strong>do</strong>) ou semelhantes demais à criança que fomos.A onipotência é filha <strong>do</strong> ser infantil em nós que continua reclaman<strong>do</strong> “tu<strong>do</strong> imediatamente”, etal atitude coloca-nos em frente ao “risco de matar, talvez não os alunos, mas, pelo menos,


118seus desejos, substituin<strong>do</strong>-os pelos nossos (COLOMBIER, MANGEL e PERDRIAULT,1989, p. 104). Há que se ter o cuida<strong>do</strong> de não se buscarem ações paliativas que, antes dequestio<strong>na</strong>r os equívocos coloca<strong>do</strong>s pelo momento, tentam adaptar o trabalha<strong>do</strong>r aos interesses<strong>do</strong> capital e <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> perverso.Apesar <strong>do</strong>s arg<strong>um</strong>entos desta proposta, é preciso lembrar que, não obstante opapel diferencia<strong>do</strong>r que o chefe possa ter <strong>na</strong> organização (LUNARDI e MAZILLI, 1996 apudMENDES, 2007), a saúde e o prazer no trabalho estão inseri<strong>do</strong>s n<strong>um</strong>a organização queDejours (1987, p.25 apud MENDES 2007) define <strong>como</strong> “a divisão <strong>do</strong> trabalho, o conteú<strong>do</strong> datarefa – a média que dela deriva – o sistema hierárquico, as modalidades de coman<strong>do</strong>, asrelações de poder, as questões de responsabilidade”. Mendes (idem) acrescenta que éresulta<strong>do</strong> de compromissos pluridimensio<strong>na</strong>is, relações socioprofissio<strong>na</strong>is, “padrõesespecíficos <strong>do</strong> sistema de produção, que, por sua vez, determi<strong>na</strong>m a estrutura organizacio<strong>na</strong>l<strong>na</strong> qual o trabalho é desenvolvi<strong>do</strong>” (p.29), portanto é algo além da mera vontade de <strong>um</strong> chefe.Todavia, <strong>como</strong> consolidar a “cura” se o sistema ao qual se pertence não foi cura<strong>do</strong>? Nãoqueremos, com estas provocações, negar a existência de tais patologias, mas demonstrar quesão mais que traços de perso<strong>na</strong>lidade de seus acometi<strong>do</strong>s. Assim, precisamos ampliar nossaslentes de percepção, e a psicodinâmica <strong>do</strong> trabalho mostra-se instr<strong>um</strong>ento muitíssimo eficazpara este fim.Entre o prescrito da <strong>escola</strong> e aluno ideal e o real da organização <strong>do</strong> trabalho, dascondições de trabalho e das relações de trabalho, da condição a<strong>do</strong>lescente e ou <strong>juvenil</strong>, restaao professor os desconforto, poden<strong>do</strong> a partir da cooperação transformar este em criatividadeou a<strong>do</strong>ecimento. Logo, ao publicarmos estes sofrimentos em ressonância de <strong>um</strong>a <strong>escola</strong>pública, não o fazemos no senti<strong>do</strong> de engrossar o coro das desgraças cultivadas por discursossensacio<strong>na</strong>listas, mas por acreditamos neste <strong>como</strong> <strong>um</strong> <strong>sintoma</strong> que, <strong>como</strong> formação decompromisso, traz consigo os elementos ansiogênicos propulsores da transformação d<strong>estar</strong>ealidade. Não se trata, pois, de psicopatologizar a crise, mas ressignificá-la.Em nossa compreensão, tal transformação passa pela formação <strong>do</strong>s profissio<strong>na</strong>isda educação. Mas, que formação?(In/De/Trans)formação: <strong>um</strong> caminho?A faculdade não me preparou para isso. [...] Mas,... é... a gente às vezes reclama dateoria, mas essa teoria a gente não vê. É o tipo de coisa que a gente aprende só <strong>na</strong>prática e é no tapa. E aí, eu acho que é <strong>um</strong>a experiência muito chocante, muito forte!(SUJEITO 7-F).


119Não conseguimos visualizar outro caminho de diálogo e superações <strong>do</strong>s desafiosque se apresentaram ao longo das falas <strong>do</strong>s sujeitos que não fosse o da formação. Todavia, talqual Enriquèz (1994), apesar de reconhecermos o valor da in-formação, temos de cuidar coma ideia de colocar em forma, tão própria de alguns discursos pedagógicos: é precisoaban<strong>do</strong><strong>na</strong>r, definitivamente, o termo formação, no senti<strong>do</strong> que o temos. “Trata-se de <strong>um</strong>aexperiência, de <strong>um</strong> processo, de <strong>um</strong> trabalho de mudança, não de <strong>um</strong>a formação - a rigor,pode-se falar de de-formação e de trans-formação” (ENRIQUÈZ, 2001, p.220). Mesmoporque, não se trata de <strong>um</strong> problema de nomenclatura, mas <strong>do</strong> que esta nomenclatura vemdenuncian<strong>do</strong> da realidade: formar <strong>como</strong> colocar em forma ou desconsideran<strong>do</strong> muitas dasreflexões que aqui serão traçadas.Que os acadêmicos olhem para a realidade com as suas lentes - ao que pese ascríticas da Fenomenologia - é compreensível. Mas, olharmos os problemas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> <strong>como</strong>decorrentes da ausência de nossa teoria e querermos, com isto, empanturrar o professor <strong>como</strong>s nossos conceitos é problema que consideramos grave.Nossos sujeitos de pesquisa, tal <strong>como</strong> os inúmeros outros profissio<strong>na</strong>is daeducação com os quais temos convivi<strong>do</strong>, reconhecem as suas fragilidades de formação inicial,conforme cita o sujeito 7-F <strong>na</strong> epígrafe deste tema, e continuada, conforme destaca o sujeito12-M:Nós cinco (refere-se a <strong>um</strong> grupo de professores que tentou <strong>um</strong> trabalho conjuntosem sucesso) estamos com a falta de pré-requisito neste setor, para podermostrabalhar melhor. Então, assim, a angústia de Mauro é muito grande. Eu meenquadro no grupo de professores que quer, realmente, junto com os demais colegas,resolver alg<strong>um</strong>a coisa, mas eu não encontro a resposta, para trabalhar com <strong>um</strong> grupode alunos tão diversifica<strong>do</strong>. Um grupo de alunos, assim, que eu nunca trabalheiantes, nestes 14 anos de Secretaria de Educação (SUJEITO 12-M).Ante este contexto, para<strong>do</strong>xalmente, os sujeitos desta pesquisa pedem formação:Então, assim, eu acho que o que ele (o aluno) precisaria de fato, que surtiria muitomais efeito dentro <strong>do</strong> EJA é <strong>um</strong> trabalho com a gente, porque, às vezes, o professorfaz assim não é porque ele não queira abraçar esse aluno. Às vezes, ele não sabe<strong>como</strong> agir. Eu acho que existe <strong>um</strong> despreparo muito grande para nós, porque a gentefica angustiada, porque a gente quer fazer mais (SUJEITO 6-F).Contu<strong>do</strong>, ao falarem da formação <strong>como</strong> <strong>um</strong> caminho muito importante para asuperação de seus desafios, criticam, severamente, as formações recebidas. Tal situação é tãograve que assistimos a <strong>um</strong>a recusa pelas formações apresentadas pela Secretaria de Esta<strong>do</strong> deEducação. Vejamos alg<strong>um</strong>as falas sobre <strong>como</strong> os professores veem estas formações:Eu acho que tem que ter <strong>um</strong> curso no início <strong>do</strong> semestre. Não este curso da EAPE lá,enjoa<strong>do</strong>, com pedagogo, essa coisa enjoada, não. Vocês me per<strong>do</strong>em se tempedagogo aqui. Mas é enjoa<strong>do</strong>. [...] Ninguém suporta. [...] E por pessoa que temnoção de sala de aula, não é aquela pessoa que nunca deu aula <strong>na</strong> vida que pegouaquele cargo pra não entrar n<strong>um</strong>a sala de aula. Aí, fica mandan<strong>do</strong> você fazer isso,fazer aquilo sem ter noção nenh<strong>um</strong>a (SUJEITO 17-M).


120Então, nós temos... o ano passa<strong>do</strong>, acho que foi no ano atrasa<strong>do</strong>, nós fizemos aquiaquele curso que você nem concluiu: da diversidade, da educação, da juventudetransviada. Eu fiz e falei pra eles, olha, até hoje, no fi<strong>na</strong>l <strong>do</strong> curso, eu não descobri<strong>na</strong>da. O que é que eu vim fazer aqui? (SUJEITO 14-M)Nossa caminhada <strong>como</strong> professor da <strong>escola</strong> pública, pesquisa<strong>do</strong>r e forma<strong>do</strong>rpossibilita-nos conhecer três lugares da formação <strong>na</strong> temática em que buscamos especializarnos:o lugar <strong>do</strong> forman<strong>do</strong>, o lugar <strong>do</strong> forma<strong>do</strong>r e o lugar <strong>do</strong> observa<strong>do</strong>r/avalia<strong>do</strong>r. Ao longodesses percursos, construímos <strong>um</strong> saber-de-fazer-feito, que, longe de ser o caminho, tem-nossi<strong>do</strong> útil no processo de auxílio de nossos pares professores que vivenciam contextos deviolência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>. Isso nos deu elementos, para apontar qual formação rejeitamos.Juntamente com os nossos sujeitos de pesquisa e com Enriquèz (1994), rejeitamostoda formação que caia <strong>na</strong> ilusão megalomaníaca de restringir-se à oferta de conteú<strong>do</strong>s etécnicas para o ego. Nossos sujeitos parecem ainda acreditar nesta ilusão conforme podemosperceber <strong>do</strong> desfecho da última fala citada <strong>do</strong> sujeito 14-M, e é ele quem, em outro contexto,informa:Vocês estão falan<strong>do</strong> aí que sabem. Que são professores, que sabem o que nósestamos passan<strong>do</strong>. Então, me diga, porque eu não sei. Eu tô aprenden<strong>do</strong> tu<strong>do</strong> agora.Eu nunca tinha visto maconha <strong>na</strong> minha vida. Ninguém me falou que eu iria ver. Eeu vi maconha, peguei a maconha, eu vi o aluno fazen<strong>do</strong> o cigarro de maconha,então, <strong>como</strong> você sabe? (SUJEITO 16-F).Temos aprendi<strong>do</strong> com Kupfer (1999) que cada <strong>um</strong> de nós construiu seu estiloúnico de obturar a falta, o que se mostra também <strong>na</strong> condição de professor. Apesar de, <strong>como</strong>esclarece Enriquèz (1994), preferirmos a perversão da técnica que nos engaiola à vacilação daneurose que nos abre as portas. Também rejeitamos com Enriquèz (op. cit.) <strong>um</strong>a formaçãoque parta <strong>do</strong> pressuposto de plenitude e <strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano que negue toda a sua complexidade eincompletude, <strong>como</strong> defendem <strong>escola</strong>s da Psicologia, que não leve em consideração o semprepresente desconhecimento (ENRIQUEZ, 2001). Rejeitamos formações que não alertem para anecessidade da “inventividade”, da qual nos fala Meirieu (2002), visto que o “prescrito” de<strong>um</strong>a ação nunca dá conta <strong>do</strong> real conforme esclarece (Dejours, 1994). Apesar dereconhecermos a importância <strong>do</strong>s lugares de professor e aluno, com os quais precisamosdialogar, colocá-los em causa, não concordamos com formações que se dirigem a estespapéis, sem levar em consideração que o professor também é <strong>um</strong>a pessoa (ABRAHAM,1986), para além da encar<strong>na</strong>ção abstrata de <strong>um</strong>a entidade exigida pela vida da <strong>escola</strong> ou <strong>um</strong>ca<strong>na</strong>l estéril através <strong>do</strong> qual o saber passa de geração a geração, <strong>como</strong> nos lembra Rogers(apud ABRAHAM, 1986).


121Alinha<strong>do</strong>s a nossos sujeitos de pesquisa, ancora<strong>do</strong>s em Baremblitt (2002),questio<strong>na</strong>mos o lugar da<strong>do</strong> ao expert em nossa cultura. Não desconsideremos o valor <strong>do</strong> saberacadêmico, o que faria desta caminhada de pesquisa <strong>um</strong> contrassenso, mas questio<strong>na</strong>mos aforma <strong>como</strong> o diálogo da academia se tem da<strong>do</strong> com quem se encontra no terreno da prática,pois, <strong>como</strong> bem lembrou o sujeito 14-M:Mas, nós ficamos só ouvin<strong>do</strong> bla, bla, bla, bla, bla, bla, bla, bla, bla, e ninguémresolveu <strong>na</strong>da. [...] eles vieram só com teorias [...] é bonito falar. Falar é bonito.Agora, eu queria ver colocar a mão <strong>na</strong> massa (SUJEITO 14-M).A nossa caminhada <strong>como</strong> par destes sujeitos alerta-nos para o risco aponta<strong>do</strong> porBarus-Michel (2004) de que nos utilizemos <strong>do</strong> campo institucio<strong>na</strong>l <strong>como</strong> <strong>um</strong> palco pararepresentar o nosso pretenso poder e saber ancora<strong>do</strong>s em nossa fantasia de onipotênciainfantil, verificar nossas teorias, agenciar os atores sociais deste campo e criar <strong>um</strong>a dinâmica,o que alie<strong>na</strong> mais os que pretendemos “libertar”. Ao defendermos a formação <strong>como</strong> <strong>um</strong>caminho, fazemos isso em senti<strong>do</strong> contrário àquele que é proposto pelo discurso pedagógicoaferra<strong>do</strong> a <strong>do</strong>utri<strong>na</strong>s acadêmico-políticas para o qual os desafios da realidade educacio<strong>na</strong>l sedevem à alie<strong>na</strong>ção <strong>do</strong> professor, sen<strong>do</strong> o antí<strong>do</strong>to à <strong>do</strong>utri<strong>na</strong> que professa, ou seja, <strong>um</strong>asubstituição de teorias para o ego apoia<strong>do</strong> em <strong>um</strong>a ilusão megalomaníaca (ENRIQUÈZ,1994).Não conseguimos conceber <strong>um</strong>a formação que não leve em consideração a escuta,seja pela valorização de saberes e inventividades <strong>do</strong>s sujeitos que se encontram imersos <strong>na</strong>realidade (MEIRIEU, 2002); seja pela necessidade de (re)significação pessoal e entre os pares<strong>do</strong>s conteú<strong>do</strong>s que decorrem <strong>do</strong> sofrimento advin<strong>do</strong> entre o prescrito e o real (DEJOURS,1994); seja pela necessidade de colocar em causa a instituição que fala pelo professor sem queele tenha disso toda a clareza (COLOMBIER, MANGEL e PERDRIAULT, 1989; PAIN,2003); seja pela necessidade de trazer o eu-aluno que atravessa o eu-professor e, por vezes,coloca-se entre a relação autêntica com o outro (BLANCHARD-LAVILLE); seja pelanecessidade de gerirmos o infantil que, ante a criança ou o a<strong>do</strong>lescente real (o aluno), evocaos recalques da criança ou <strong>do</strong> a<strong>do</strong>lescente que fomos ou não pudemos ser (COLOMBIER,MANGEL e PERDRIAULT, 1989); seja para trazer elementos de <strong>um</strong> inconsciente que oatravessa e atropela-o, pois, conforme afirmou Lacan (1992, p. 70),“A constituição <strong>do</strong> sujeito é de significa<strong>do</strong> para significante. Sujeito esse que opróprio nome já diz: aquele que se sujeita, sujeito inconsciente, que só é possívelaparecer no percurso da fala onde recupera, <strong>na</strong> própria fala, todas as falas faladassobre ele.”Apesar disso, é preciso ter muito clara a advertência de Oury (apud PAIN,2003) de que, quan<strong>do</strong> o professor fala, inicialmente, é a cultura (a elite) que fala, razão pela


122qual precisamos fazer o produto desta fala trabalhar. Pelo verbo <strong>do</strong>s sujeitos desta pesquisa,temos ouvi<strong>do</strong> professores reproduzirem mitos apregoa<strong>do</strong>s pela mídia n<strong>um</strong> jogo deretroalimentação com o senso com<strong>um</strong>, em discordância <strong>do</strong> que mostram as pesquisas,conforme discutimos no capítulo quatro. Ouvimos de <strong>um</strong> professor que “este governo até noschamou para nos ouvir, mas ele não nos escuta”. É justamente esta a impressão que temos eminúmeros encontros nos quais pontuamos a formação <strong>na</strong> Secretaria de Educação, mas que nãose confunda com <strong>um</strong> ouvir pelo ouvir, <strong>como</strong> nos adverte o sujeito 6-F:Teve <strong>um</strong> curso semestre passa<strong>do</strong>, ridículo! Era <strong>um</strong> curso para o EJA, eu fui <strong>na</strong> maioresperança <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> de que alguém ia me ajudar a ajudar esses meninos. Bom,alguém vai fazer alg<strong>um</strong>a coisa fi<strong>na</strong>lmente. Quan<strong>do</strong> chegamos lá, qual que era aproposta? Ouvir tu<strong>do</strong> que você, Mauro, está ouvin<strong>do</strong> aqui e que nós apontássemossoluções. Mas, não havia <strong>um</strong>a luz, não havia <strong>na</strong>da, e as 56 pessoas que estavamconduzin<strong>do</strong>, também despreparadas... Essa que é a verdade... <strong>um</strong> negócio ou chacal,monóto<strong>na</strong>. Ridículo! Então, eu não consegui nem acabar o tal <strong>do</strong> curso. Eu tava atécomentan<strong>do</strong> com as meni<strong>na</strong>s, eu <strong>do</strong>rmia <strong>na</strong> cadeira, olhan<strong>do</strong> para aquela criatura,tentan<strong>do</strong> também fazer alg<strong>um</strong>a coisa. Então, a verdade é que, assim, nós não somosouvi<strong>do</strong>s, não se faz <strong>um</strong> trabalho efetivo em relação a isto, de realmente sentar to<strong>do</strong>mun<strong>do</strong> junto, apontar alg<strong>um</strong>a coisa. Precisa, assim, de <strong>um</strong> trabalho com o professorpara que o professor possa chegar melhor neste aluno, a <strong>escola</strong> envolver esse alunode alg<strong>um</strong>a maneira, com matérias que trabalham isso (SUJEITO 6-F).O sujeito professor diz-nos que ele quer ser escuta<strong>do</strong>, mas que ele também querescutar. Gastamos muito de nossa caminhada, escutan<strong>do</strong> professores até que aprendêssemoscom Barus-Michel (2004) e Enriquèz (1994) a ocupar o terceiro <strong>na</strong> reserva, <strong>um</strong> lugar vazioque não demanda pelo grupo. Aprendemos com Lacan (1992) a usar <strong>do</strong> discurso <strong>do</strong>psica<strong>na</strong>lista <strong>como</strong> aquele que faz semblante de que sabe, para mostrar que quem sabe, de fato,é o outro, que o saber <strong>do</strong> outro é importante.N<strong>um</strong> processo de “formação”, feita esta escuta, conforme nos demonstrou osujeito 6, o professor empresta-nos o palco para que ass<strong>um</strong>amos o nosso papel de mestre ouacadêmico, a fim de enunciar <strong>um</strong>a verdade sobre os processos que compartilhou conosco.Neste momento corremos <strong>um</strong> grande risco: aceitar a sedução da permanência no palco que é,antes, a sedução da criança megalomaníaca que reside em nós, conforme nos advertiu Barus-Michel (2004). Convém subir ao palco e por meio de nosso saber, fazer o semblante <strong>do</strong> paique tu<strong>do</strong> sabe, para ajudar este profissio<strong>na</strong>l a (re)significar suas vivências mediante osconhecimentos e as técnicas que temos utiliza<strong>do</strong>, para ler a realidade, a fim de que, assim, esteprofissio<strong>na</strong>l possa ass<strong>um</strong>ir o seu lugar no palco e ajudar seus educan<strong>do</strong>s a fazer também e quenão se faça uso desse processo <strong>como</strong> “astúcia” (MEIRIEU, 2002) ou sedução (PAIN, 2003)para sustentação de nossos anseios megalomaníacos.Pensamos <strong>um</strong>a formação que considere o grupo coletivo concreto, onde ossujeitos se entrecortam (ENRIQUÈZ, 1994), no qual <strong>um</strong>a proposta possa ou não se


123consubstanciar (PAIN, 2009, 2006, 2003, 2000; DUBET, 1997), no qual os conteú<strong>do</strong>spossuem <strong>um</strong> significa<strong>do</strong> próprio, conforme demonstra Dejours (1994, 2009, 2004, 2008a,2008b), portanto onde precisam ser (re)significa<strong>do</strong>s. Tanto quanto os sujeitos desta pesquisa,defendemos <strong>um</strong>a formação que considere as instituições a serviço <strong>do</strong>s h<strong>um</strong>anos e não ocontrário (BLEGER, 1984), que dialogue com o real de suas práticas diárias. Pain (2003),a<strong>na</strong>lisan<strong>do</strong> a timidez <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s de <strong>um</strong> instituto de formação de professores constituí<strong>do</strong> <strong>na</strong>França, chama-nos atenção para muitos pontos aqui cita<strong>do</strong>s e, principalmente, para o desenhode formações que considerem e partam da prática <strong>do</strong>s professores.Nesta mesma linha de raciocínio, Maren (2003) propõe que a pesquisa seaproxime <strong>do</strong>s ambientes <strong>escola</strong>res, não ape<strong>na</strong>s voltada aos interesses <strong>do</strong> poder público, pelohábito acadêmico obceca<strong>do</strong> pela cientificidade e preocupa<strong>do</strong> em fazer “boa figura” junto àsdisciplines savantes, <strong>como</strong> ocorre com muitos destes pesquisa<strong>do</strong>res, relegan<strong>do</strong>, assim, aPedagogia, enquanto prática social e educativa, a <strong>um</strong> espaço de escanteio, mas a que ofereçaaos sujeitos da educação modelos pertinentes para as ações que devem conduzir, utilizáveispor to<strong>do</strong>s que estejam mergulha<strong>do</strong>s <strong>na</strong> prática pedagógica. Na compreensão <strong>do</strong> autor, apreocupação com a dita “ruptura epistemológica”, tida em conta de condição <strong>do</strong> pensamentoverdadeiramente científico, que se quer “isento e objetivo”, conduz à elaboração de <strong>um</strong>pensamento abstrato, descontextualiza<strong>do</strong>, feito de situações atomizadas.O autor defende que o ponto de partida habitual de tais pesquisas cost<strong>um</strong>a ser odas “discipli<strong>na</strong>s da educação” – Psicologia, Sociologia, Antropologia, Economia, Política eassim por diante. Estas ditam os problemas. Os pesquisa<strong>do</strong>res em educação (em especial, emPedagogia), queren<strong>do</strong> fazer boa figura entre as discipli<strong>na</strong>s acadêmicas, tomam emprestada alinguagem e os mo<strong>do</strong>s de pensar. Com isso, ficam à margem, esqueci<strong>do</strong>s e desconsidera<strong>do</strong>s.Os profissio<strong>na</strong>is da prática, os practiciens, por sua vez, não os apreciam e não os leem, pornão serem igualmente “práticos”.O objetivo da pesquisa em educação deve ser fornecer aos sujeitos da educaçãoteorias ou modelos pertinentes à prática e às ações que o exercício da profissão faz emergir, oque representa, para esse autor, a exigência ética. A falta em educação proporcio<strong>na</strong> <strong>um</strong>adesqualificação da teoria pelos estudantes que sentem a “desconexão” entre elas, aomergulharem <strong>na</strong> prática, conforme tão bem expresso <strong>na</strong>s falas de nossos sujeitos. Daí decorrea necessidade de atribuir <strong>um</strong> lugar mais importante à pesquisa pedagógica <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, maisprecisamente, a que parte <strong>do</strong>s problemas da prática, não para t<strong>estar</strong> teorias, mas para aconstrução de conhecimentos pedagógicos, o que não pode ser feito sem que seja peladescrição e pelo questio<strong>na</strong>mento das razões da ação pedagógica, com seus sucessos e


124fracassos, graças a <strong>um</strong>a presença sobre o terreno da prática e com a acolhida cúmplice <strong>do</strong>outro (p.42), <strong>na</strong> qual o diálogo e o respeito pelos praticantes são essenciais. É reforçar, oureconhecer, ou trazer o pensar pedagógico para junto <strong>do</strong> fazer pedagógico.Compreendemos com Maren (2003) a pesquisa pedagógica <strong>como</strong> prática eimplicada, que se formule mediante sua linguagem, suas imagens e sua fi<strong>na</strong>lidade e forneçainstr<strong>um</strong>entos, meios, recursos que permitam encontrar soluções eventuais para a práticapedagógica. Seu objetivo não é a “busca da verdade”, no senti<strong>do</strong> de julgar a veracidade ou afalsidade de <strong>um</strong>a teoria. É, antes, a funcio<strong>na</strong>lidade, pois é o campo <strong>do</strong> ensaio e <strong>do</strong> erro quetestemunham os grandes pedagogos 58 : Celestin Freinet, Paulo Freire, Fer<strong>na</strong>nd Oury,Pestalozzi etc. A prática funcio<strong>na</strong>l transcende as teorias, é transdiscipli<strong>na</strong>r e empresta seuselementos teóricos e conceituais a várias teorias e áreas de conhecimento. Uma formação quese pretenda equânime com as necessidades da <strong>escola</strong> precisa, em nossa compreensão, pensarestas questões.


125CAPÍTULO 6 CONSIDERAÇÕES FINAISPaz sem vozPaz sem vozNão é pazÉ me<strong>do</strong>!(Rappa)Isso aqui não é nem a <strong>um</strong>a tese, não. Eu só estou fazen<strong>do</strong> <strong>um</strong> raciocínio e tentan<strong>do</strong>chegar <strong>na</strong> frente. Tenho fala<strong>do</strong> isso, e vai ser as próximas gerações, a próxima delas.Os nossos alunos hoje... eu acho que a meto<strong>do</strong>logia de sala de aula vai acabar,porque, se não achar outra forma lá, não vai ser essa mais. Tem que se buscaroutro. Os estudiosos, para isso, têm que buscar outra forma. Por que os alunos nãoestão mais queren<strong>do</strong> assistir aula em sala de aula lá. [...]. Não estou nem colocan<strong>do</strong>em <strong>um</strong> outro século, não. É ainda nestes primeiros cinquenta anos deste século lá.Eu acho que vai mudar isso, vai precisar de mudar isso (SUJEITO 9-M).Filhos que somos de nossa história, iniciamos esta caminhada preocupa<strong>do</strong>s com o<strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> discente, mas, ao longo dela, fomos captura<strong>do</strong>s pelo <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>do</strong>cente.Parafrasean<strong>do</strong> <strong>um</strong> adágio oriental no início da caminhada, os rios são rios, e as montanhas sãomontanhas. No meio da caminhada, os rios não são mais rios, e as montanhas não são maismontanhas. No fim da caminhada, os rios são rios, e as montanhas são montanhas.Apesar disso, não são mais os mesmos rios e tampouco as mesmas montanhas.Fechamos aqui <strong>um</strong> pequeno ciclo desta caminhada cuja vinculação com ciclos maioresdificultam a delimitação de <strong>um</strong> início e <strong>um</strong> fim.“O espanto continua nos olhos de quem vê” o grande monstro a criar-se 59 . Logo,precisamos achar culpa<strong>do</strong>s, e tal qual a bruxa, o corcunda, o deficiente, o diferente medieval,o a<strong>do</strong>lescente e ou o jovem são coloca<strong>do</strong>s neste lugar de responsabilização pelos equívocos detempos tão confusos. Contu<strong>do</strong>, ao invés da fogueira ou <strong>do</strong> açoitamento, buscamos méto<strong>do</strong>smais sutis e, talvez, mais perversos. Ao aban<strong>do</strong>no respondemos com a culpabilização.Conde<strong>na</strong>mos neles o que abunda em nossa sociedade.Estamos extermi<strong>na</strong>n<strong>do</strong> os nossos jovens! Os da<strong>do</strong>s aí se encontram, paracomprovar este fato. Mas, existe <strong>um</strong>a agressão mais violenta e perigosa, porque sutil edissimulada: a violência simbólica que reproduzimos mediante <strong>um</strong>a instituição que fala pornós, da qual podemos ser meros avatares. Quan<strong>do</strong> <strong>na</strong> condição de a<strong>do</strong>lescente e ou jove<strong>mal</strong>uno<strong>um</strong> desses avatares nos chamou de menor, em que pese os efeitos desta fala anunciadade <strong>um</strong> lugar transferencial de pretenso saber, soubemos, muitos de nós, empunhar as armaspara <strong>um</strong> contra-ataque, ainda que tenhamos busca<strong>do</strong> o refúgio de nosso íntimo, para lambernossos ferimentos.


126Apesar disso, nem sempre, esta defesa foi tão fácil, visto que, <strong>na</strong> maioria dasvezes, não foi falada por <strong>um</strong>a boca, mas gritada por <strong>um</strong> olhar, pela burocracia, por <strong>um</strong>aavaliação de aprendizagem que, <strong>na</strong> verdade, tornou-se <strong>um</strong> instr<strong>um</strong>ento de avaliação de nossaautoimagem. Então, fomos nós que dissemos: “Caramba! Eu sou menor". Restou-nossubmeter, fugir ou lutar!Propomo-nos ao resgate da palavra não falada, a <strong>um</strong>a investigação de <strong>um</strong>a dasfrentes de <strong>um</strong> campo de batalha no qual to<strong>do</strong>s os professores já houvéramos ocupa<strong>do</strong> lugar: afrente <strong>do</strong>s alunos. Contu<strong>do</strong>, alguns de nós professores fomos para esta nova frente, a fim deocupar o mesmo lugar da maioria de nossos mestres, portanto destruir a abstração <strong>do</strong> alunoque vemos atravessa<strong>do</strong> pelo aluno que fomos ou somos. Outros fomos tentar reinventar esteslugares.Todavia, ao passar pela frente <strong>do</strong>s <strong>do</strong>centes, fomos captura<strong>do</strong>s pelas suas chagas econs<strong>um</strong>i<strong>do</strong>s pelas tentativas de entendimento delas. Vimos que, se cuidarmos melhor <strong>do</strong>smédicos, os pacientes receberão os benefícios. Descobrimos que os professores se encontrammais aprisio<strong>na</strong><strong>do</strong>s <strong>do</strong> que os educan<strong>do</strong>s, visto que a moratória é ape<strong>na</strong>s para os educan<strong>do</strong>s,pois, se <strong>um</strong> aluno agride <strong>um</strong> professor, vira espetáculo, mas muito mais vem sen<strong>do</strong> explora<strong>do</strong>de <strong>um</strong>a agressão oriunda de <strong>um</strong> professor. O primeiro é ape<strong>na</strong>s mais <strong>um</strong> desses desregra<strong>do</strong>sdesta geração <strong>mal</strong>uca. O segun<strong>do</strong> é <strong>um</strong> irresponsável que não se faz digno <strong>do</strong> título queostenta. Muitos têm críticas e soluções para a <strong>escola</strong>, mas poucos entram no seu cotidiano,para olhá-la sem aprioris rígi<strong>do</strong>s, para com-partilhar.Nosso objetivo, quan<strong>do</strong> da delineação desta caminhada em forma de projeto, foi ode investigar se a violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong> é <strong>um</strong> <strong>sintoma</strong> <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>juvenil</strong> e institucio<strong>na</strong>l <strong>na</strong> pósmodernidade,acentua<strong>do</strong> pelos (des)encontros no cotidiano <strong>escola</strong>r. Mais especificamente,almejamos compreender as concepções de <strong>sintoma</strong> e <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>na</strong> pós-modernidade por meioda leitura psica<strong>na</strong>lítica, identificar as possíveis interações entre os fenômenos da indiscipli<strong>na</strong> eou da violência e o cotidiano <strong>escola</strong>r e verificar as implicações <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> a<strong>do</strong>lescente e ou<strong>juvenil</strong> reforça<strong>do</strong> pelo contexto <strong>escola</strong>r pós-moderno no fenômeno da violência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.Consideramos que a <strong>escola</strong> predispõe o (des)encontro de <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong>es de formaímpar em nossa sociedade, haja vista a sua condição de a<strong>na</strong>cronismo e rigidez para com astransformações que lhe são exigidas. Apesar de o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> da não aprendizagem feri-la<strong>na</strong>rcisicamente, o da indiscipli<strong>na</strong> e ou da violência fazem-no de forma mais direta e commenor possibilidade de recalcamento.A <strong>escola</strong> objeto de nossa investigação, a exemplo de tantas outras <strong>na</strong>s quais jáestivemos para processos semelhantes de escuta, vivencia <strong>um</strong>a desregulamentação,


127predispon<strong>do</strong> atuações a<strong>do</strong>lescêntricas. Oscila entre a fragilidade da lei e a lei punitivopopulista,em outros termos, entre o laissez-faire e o autoritarismo, entre a fluidez <strong>do</strong>s lugaresde professor e, consequentemente, de aluno e a concepção ainda idealizada e rígida deles.Assim, sobressai a lei-código ancorada no mestre, que é o senhor da sanção imposta em <strong>um</strong>face-a-face rotineiro que lhe desgasta a ação e inverte o senti<strong>do</strong>. Para<strong>do</strong>xalmente, trata-se de<strong>um</strong>a <strong>escola</strong> caótica no que concerne ao outro/Outro e não democrática. Em <strong>um</strong>a expressão, é<strong>um</strong>a <strong>escola</strong> que cola o funcio<strong>na</strong>mento a<strong>do</strong>lescente de crise e conflito com a lei.Parte considerável deste <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> deve-se às novas formas de socialização esubjetivação impostas pelo mun<strong>do</strong> pós-moderno, que distancia os estatutos de jovem e dealuno, o que tem dificulta<strong>do</strong> ao aluno a ocupação concomitante destes lugares ou papéis, porvezes conflitantes, e ao professor a compreensão de que, qualquer que seja a modalidade, atipologia ou os estudantes, antes de dirigir-se à abstração aluno, toda educação deve dirigir-sea <strong>um</strong> sujeito cujos ritmos, tempos, histórias, bagagens e estilos são únicos.Olhan<strong>do</strong> pela perspectiva <strong>do</strong> a<strong>do</strong>ecimento profissio<strong>na</strong>l, percebemos com apedagogia institucio<strong>na</strong>l que, ou vamos mudar esta profissão, ou vamos mudar de profissão, oque acrescentamos: ou vamos continuar a<strong>do</strong>ecen<strong>do</strong>, visto que o prescrito para o lugar, papelou função de professor está cada vez mais distante <strong>do</strong> real desta função. A frase de nossosujeito em epígrafe nestas considerações fi<strong>na</strong>is é revela<strong>do</strong>ra neste senti<strong>do</strong>, e o caminho quejulgamos procedente para a (des/re)construção é o <strong>do</strong> resgate <strong>do</strong> coletivo local, o <strong>do</strong> reforçoao pensar pedagógico junto ao fazer pedagógico mediante processos que nos auxiliem a falaresta instituição e dialogar com ela em e a partir de nós.Para tanto, precisamos (re)pensar o que temos chama<strong>do</strong> de formação. Aslicenciaturas precisam decidir pela Pedagogia, pelas ciências da educação e pelas falas <strong>do</strong>sque se encontram imersos <strong>na</strong> prática <strong>do</strong>s seus currículos; sem isso, continuaremos crian<strong>do</strong>programas, projetos e discipli<strong>na</strong>s para cada novo fogo que se acenda nestes tempos confusos.Nossos sujeitos dizem que as faculdades não os têm forma<strong>do</strong> para o queencontram <strong>na</strong> realidade e pedem formação, mas não deixam de criticar os modeloshegemônicos de formação. Conforme discutimos, precisamos pensar <strong>um</strong>a formação que, aotempo em que INforme, REforme, DEforme e TRANSforme o que acreditamos, não sejapossível pelos modelos que se têm hegemonicamente apresenta<strong>do</strong>.Precisamos inserir o estu<strong>do</strong> das temáticas que foram aqui discutidas em nossoscurrículos de licenciatura, <strong>como</strong> dizem os sujeitos desta pesquisa. É passada a hora dediscutirmos a a<strong>do</strong>lescência para além das apreensões desenvolvimentistasdescontextualizadas, a juventude, as novas formas de socialização e de subjetivação


128apresentadas pela pós-modernidade, ten<strong>do</strong> em vista que é esta a grande dificuldade expostapelos sujeitos desta pesquisa, ou seja, precisamos formar para a inventividade. Mas <strong>como</strong>conseguir êxito nesta proposta com licenciaturas <strong>na</strong>s quais os estudantes <strong>do</strong> Ensino Superiorfazem ape<strong>na</strong>s três discipli<strong>na</strong>s da área de educação e estágio supervisio<strong>na</strong><strong>do</strong>, em muitasocasiões ministra<strong>do</strong>s por professores que não possuem experiência com a <strong>escola</strong>rização decrianças e a<strong>do</strong>lescentes. Tal é o quadro da Universidade de Brasília.É lamentável comprovarmos que os sujeitos desta pesquisa, não obstanteencontrarem-se <strong>na</strong> vanguarda da relação com a comunidade, não conhecem ou sabem acio<strong>na</strong>ra retaguarda de <strong>um</strong>a rede de proteção social; afastam-se da pesquisa e reiteram preconceitos,estigmas e estereótipos amplamente difundi<strong>do</strong>s no senso com<strong>um</strong>; perpetuam práticasreacionárias, excludentes, destrui<strong>do</strong>ras da autoimagem <strong>do</strong>s atores-autores no palco <strong>escola</strong>r.Em <strong>um</strong>a palavra, continuam sen<strong>do</strong> “hospedeiros” e agin<strong>do</strong> por <strong>um</strong>a instituição que por elesfala e age. Não temos a pretensão de levar nosso clamor às faculdades <strong>do</strong> Brasil e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>,mas dizemos <strong>na</strong> esperança de que possa ser ouvi<strong>do</strong>, ao menos, pela Faculdade de Educação daUniversidade de Brasília.Os forma<strong>do</strong>res precisam aprender com a psicanálise a escutar, para além de ouvir,a romper com os prepostos modelos prepotentes, a escutar-se e a auxiliar os que estão nomesmo caminho. Precisamos pensar a formação em processo no qual as situações concretas<strong>do</strong> cotidiano <strong>escola</strong>r (prática) sejam o currículo, os conteú<strong>do</strong>s sejam auxiliares a estacaminhada, e os saberes de-fazer-feito <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res sejam trazi<strong>do</strong>s à pauta das reflexões eda aprendizagem com o mesmo valor e importância que se tem da<strong>do</strong> aos saberes <strong>do</strong>sconsagra<strong>do</strong>s teóricos da educação.Chegamos ao término desta caminhada, comungan<strong>do</strong> com a fala <strong>do</strong> sujeito emepígrafe: a <strong>escola</strong> precisa reinventar-se. Porém, contrarian<strong>do</strong> este mesmo sujeito, acreditamosque esta não é tarefa ape<strong>na</strong>s para os estudiosos, pois o que os educa<strong>do</strong>res têm chama<strong>do</strong> deviolência <strong>na</strong>da mais é que <strong>um</strong> <strong>sintoma</strong> <strong>do</strong> a<strong>na</strong>cronismo da <strong>escola</strong> com o tempo vivi<strong>do</strong> no hojee com as novas configurações <strong>do</strong>s estudantes, <strong>do</strong> distanciamento entre o prescrito e o real parao ofício de professor, <strong>do</strong> solipsismo <strong>do</strong> exercício da profissão, <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> que é a<strong>do</strong>lescer eser jovem com media<strong>do</strong>res culturais tão flui<strong>do</strong>s e para<strong>do</strong>xais, da fragilidade <strong>do</strong>s modelos deadulto que se tem apresenta<strong>do</strong>, <strong>do</strong>s ditames e das convocações para<strong>do</strong>xais da cultura, <strong>do</strong>sadultos tão inseguros de ocupar os seus papéis e os lugares sociais n<strong>um</strong> país onde abundamcobranças e carece-se de políticas públicas para esta parcela da população. Os atos disruptivosde nossos a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens são <strong>sintoma</strong>s <strong>do</strong> desamparo e da carência de apoio<strong>na</strong>rcísico parental. Mas, <strong>como</strong> ser este suporte se, também, os adultos-referências professores


129se encontram tão fragiliza<strong>do</strong>s? Como ser este suporte ocupan<strong>do</strong> o papel e lugar de <strong>um</strong>aprofissão que exige tanto de nós?Uma dissertação é também a elaboração de nossa caminhada e esperamos que ossaberes aqui conti<strong>do</strong>s sejam também para quantos se interessem pelas temáticas aqui tratadas.Gostaríamos de ter feito <strong>um</strong> trabalho interventivo aos moldes <strong>do</strong> que temos aprendi<strong>do</strong> com apsicossociologia, mas o tempo <strong>do</strong> mestra<strong>do</strong> não nos permitiu. Quem sabe saldar esta dívidacom <strong>um</strong> <strong>do</strong>utora<strong>do</strong>.Muitas questões permanecem em aberto, aguardan<strong>do</strong> que outros pesquisa<strong>do</strong>rescontinuem a caminhada da academia para esta temática. De nossa parte, concluímos que aviolência <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, tanto quanto a não-aprendizagem e o sofrimento psíquico <strong>do</strong> professor –além de tantos outros desafios <strong>do</strong> cotidiano <strong>escola</strong>r, são <strong>sintoma</strong>s <strong>do</strong>s <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong>es que se(des)encontram em seu cotidiano: <strong>do</strong>s estudantes-a<strong>do</strong>lescentes e ou jovens, <strong>do</strong>s professores,de <strong>um</strong> tempo que tem o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>como</strong> marca privilegiada e, principalmente, de <strong>um</strong>ainstituição que não vem conseguin<strong>do</strong> se reinventar para fazer frente ao seu cotidiano.Os <strong>sintoma</strong>s nos dão as pistas <strong>do</strong>s descompassos que os produziram, o que oscolocam <strong>como</strong> formação de compromisso. Logo, ante a aparente desordem, <strong>um</strong>a nova ordemse anuncia. Ante o quadro <strong>do</strong>s sofrimentos em ressonância que assistimos, encontram-se emação as forças pulsio<strong>na</strong>is de sua superação, pois, ao contrário <strong>do</strong> que possa parecer a <strong>um</strong> olharmenos atento, não se trata de <strong>um</strong>a realidade <strong>do</strong>mi<strong>na</strong>da pela pulsão de morte, mas sim de <strong>um</strong>ainstituição <strong>na</strong> qual esta pulsão tenta prevalecer, contrastan<strong>do</strong> com a pulsão de vida <strong>do</strong>ssujeitos que a compõem. Aliás, a reinvenção desta organização e instituição já vem sen<strong>do</strong>feita por inúmeras experiências inventivas no Brasil e no mun<strong>do</strong>. Ancoran<strong>do</strong>-se nestasiniciativas e construções, é preciso reinventar a <strong>escola</strong>.


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146APÊNCICETermo de consentimento livre e esclareci<strong>do</strong>Preza<strong>do</strong> (a) Professor (a),Universidade de BrasíliaFaculdade de EducaçãoComo é <strong>do</strong> conhecimento de V. Sa., encontramo-nos imersos nesta <strong>escola</strong> pararealização de pesquisa junto ao programa de pós-graduação da Faculdade de Educação daUniversidade de Brasília, no qual nos encontramos matricula<strong>do</strong>s <strong>como</strong> aluno <strong>do</strong> Mestra<strong>do</strong>em Educação.A temática que pesquisamos é a interface entre a juventude, a Escola e a violência,pretenden<strong>do</strong> pesquisar o <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>juvenil</strong>, institucio<strong>na</strong>l e pós-moderno e seus(des)encontros no cotidiano <strong>escola</strong>r.Esperamos, com o auxilio de vocês, poder contribuir com a oferta de elementos quenos auxiliem <strong>na</strong> análise e intervenção para outras realidades que vivenciam dificuldadessemelhantes de violência e/ou indiscipli<strong>na</strong> <strong>na</strong> <strong>escola</strong>.Pretendemos, tão logo tenhamos a análise destes da<strong>do</strong>s, poder compartilhá-los <strong>como</strong>s senhores e senhoras, o que acreditamos que somente será possível em março <strong>do</strong>próximo ano.Solicitamos, por fim que assinem o termo de consentimento livre e esclareci<strong>do</strong>,conforme versa a legislação vigente.Gostaríamos de agradecer a to<strong>do</strong>s e todas pela preciosa colaboração e reafirmar anossa disponibilidade para contribuir no que possamos com aquilo que nos sejademanda<strong>do</strong>.Reforçamos ainda que não é permitida, em hipótese alg<strong>um</strong>a, a identificação <strong>do</strong>ssujeitos da pesquisa, o que implicaria desc<strong>um</strong>primento ético e legal.Registramos abaixo os nossos contatos para quaisquer dúvidas.Respeitosamente,Mauro Gleisson de Castro Evangelista.Matrícula SEE-DF; 33.313-1, matrícula UnB: 10/0044123, endereço de e-mail:maurogleisson@gmail.comOrienta<strong>do</strong>ra da pesquisa: Profª Drª Inês Maria M. Z. Pires de Almeida. endereço dee-mail: almeida@unb.br


147TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDOEu,___________________________________________________________________,CI nº _____________, pronunciei-me perante o pesquisa<strong>do</strong>r de livre e espontâneavontade, fui informa<strong>do</strong> pelo mesmo sobre o objetivo <strong>do</strong> encontro, autorizei a gravação deminha fala e autorizo a utilização da mesma para fins da pesquisa (“A violência <strong>na</strong> Escola<strong>como</strong> <strong>sintoma</strong> <strong>do</strong> <strong>mal</strong>-<strong>estar</strong> <strong>juvenil</strong>, institucio<strong>na</strong>l e pós-moderno e seus (des)encontros nocotidiano <strong>escola</strong>r), respeita<strong>do</strong> o sigilo que versa legislação._________________, ________ de ________________________________________________________________________Assi<strong>na</strong>tura <strong>do</strong> informante___________________________________________________________Assi<strong>na</strong>tura <strong>do</strong> Pesquisa<strong>do</strong>r


148ANEXOAutorização para a pesquisa


149NOTAS1 Sobre esta questão, cf. Dayrell (2009).2 Silva e Nogueira (2008) discutem a sobreposição e a imprecisão <strong>do</strong>s termos indiscipli<strong>na</strong> e violência, o quedificulta o enfrentamento eficaz e eficiente. Também entre nossos sujeitos de pesquisa, essa confusão mostra-se.Ten<strong>do</strong> em vista não nos sentirmos contempla<strong>do</strong>s por nenh<strong>um</strong>a das definições a ponto de diferenciá-las, optamospor manter a expressão indiscipli<strong>na</strong> e ou violência.3 Segun<strong>do</strong> Roudinesco e Plon (1998), o princípio <strong>do</strong> prazer e o princípio da realidade são <strong>um</strong> par de expressõesintroduzidas por Freud (1911), para desig<strong>na</strong>r os <strong>do</strong>is princípios que regem o funcio<strong>na</strong>mento psíquico. O princípio<strong>do</strong> prazer tem por objetivo buscar o prazer e evitar o desprazer, e o princípio da realidade modifica o princípio <strong>do</strong>prazer, impon<strong>do</strong> restrições necessárias à adaptação da vida exter<strong>na</strong>.4 Discussão semelhante é feita por Kehl (2005), Palmade (2001), Haag (2007).5 Conferência pronunciada em Oxford (Inglaterra), escrita em inglês no ano de 1941 e publicada juntamente <strong>como</strong>utros textos em 1943, no livro Diagnose of our time. Contribuição da professora <strong>do</strong>utora Wívian Weller.6 A discussão muito semelhante chega Labriola (2004), trabalhan<strong>do</strong> o pensamento de Arendt (2001).7 Nome da<strong>do</strong> a <strong>um</strong>a linha teórica da psicanálise que estuda a a<strong>do</strong>lescência sob o signo das violências provocadaspela puberdade.8 Lacan (1992) propôs três discursos: o <strong>do</strong> mestre, o <strong>do</strong> universitário e o <strong>do</strong> psica<strong>na</strong>lista. O mestre é porta<strong>do</strong>r daverdade com base em sua sabe<strong>do</strong>ria pessoal. Sabe, porque sabe. o enuncia<strong>do</strong> daquele que é porta<strong>do</strong>r da verdade,<strong>do</strong> tu<strong>do</strong>. O universitário sabe pela ciência e o psica<strong>na</strong>lista faz semblante de que sabe para mostrar que quem sabeé o outro. Há ainda, segun<strong>do</strong> este autor o discurso da histérica.9 Expressão utilizada por Freud (1916), para desig<strong>na</strong>r atos transgressivos de a<strong>do</strong>lescentes relata<strong>do</strong>s por seuspacientes quan<strong>do</strong> adultos, tais <strong>como</strong>, pequenos roubos, incêndios voluntários etc.10 Sain<strong>do</strong> da latência, o púbero direcio<strong>na</strong> a libi<strong>do</strong> para o afetivo-sexual.11 Perío<strong>do</strong> que, segun<strong>do</strong> Freud (1905), estende-se <strong>do</strong>s 5, 6 anos aos 11, 12 anos12 Roudinesco e Plon (1998) indicou <strong>como</strong> o modelo de referência <strong>do</strong> eu que vem em substituição ao <strong>na</strong>rcisismoinfantil e <strong>como</strong> resulta<strong>do</strong> da identificação com figuras parentais e seus substitutos sociais. Trata-se <strong>do</strong> modeloque substitui a pre<strong>do</strong>minância <strong>do</strong> ego ideal, próprio da onipotência <strong>na</strong>rcísica infantil, a que Laplanche e Pontalis(1998, p. 222) se referem <strong>como</strong> “<strong>um</strong>a formação intrapsíquica relativamente autônoma que serve de referência aoego, para apreciar as suas realizações efetivas”, sua subjetivação e identidade.13 Mais detalhes sobre o que podemos considerar <strong>como</strong> <strong>um</strong> extermínio da população jovem no Brasil podem serobti<strong>do</strong>s <strong>na</strong> obra de Waiselfisz (2011).14 Antropólogo, antes de ser psica<strong>na</strong>lista, este autor é pioneiro <strong>na</strong> associação com o cultural e social.15 Termo introduzi<strong>do</strong> por Freud (1927), para desig<strong>na</strong>r a coexistência no cerne <strong>do</strong> eu de duas atitudescontraditórias: recusa e aceitação da realidade.16 Considerações semelhantes serão tecidas por Castoriadis (1982), Pagès (2001) e Rueff-Escoubès, 1997.17 Aglaê Jardel, Conselheira principal de educação apud Pain (2006, p. 250).18 Sobre esta questão, ver Souza (2010).19 Cambi (1999) demonstra que este é <strong>um</strong> <strong>do</strong>s grandes mitos da educação no século XX.20 O termo slogan decorre <strong>do</strong> uso que provoca esvaziamento conceitual e fortalece a prevalência de meraretórica (Sposito, 2008).21 No senti<strong>do</strong> psica<strong>na</strong>lítico <strong>do</strong> termo.22 Sobre esta questão, cf. SOUZA, M. P. R. Medicalização <strong>na</strong> educação infantil e no Ensino Fundamental e aspolíticas de formação <strong>do</strong>cente. Retor<strong>na</strong>n<strong>do</strong> à patologia para justificar a não aprendizagem <strong>escola</strong>r: amedicalização e o diagnóstico de transtornos de aprendizagem em tempos de neoliberalismo. 2010.23 Para este autor, o espaço é da ordem concreta, objetiva, enquanto o território é construí<strong>do</strong>, portanto, subjetivo.24 Nesta mesma linha, pensa a UNESCO com o programa “Abrin<strong>do</strong> Espaços” e o MEC com o programa“Escola Aberta”.25 Estêvão, 2004, 2006, 2008; Sacristán, 2003; Jares, 2005 e Santos Guerra, 2002; 1996.26 Rueff-Scoubès (1997) propõe outra meto<strong>do</strong>logia para a expressão <strong>do</strong>s alunos.27 Abramovay e Rua (2002) desig<strong>na</strong>m <strong>como</strong> violência dura.28 No senti<strong>do</strong> da<strong>do</strong> por Baremblitt (2002) <strong>como</strong> o especialista alieníge<strong>na</strong> que é senhor da verdade.29 No senti<strong>do</strong> psica<strong>na</strong>lítico <strong>do</strong> termo, que o associa intimamente ao inconsciente.30 Utilizan<strong>do</strong>-se de <strong>um</strong> jargão piagetiano.31 Movimento de referência para a abordagem sistêmica em Psicologia.32 Não no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> indutivismo lógico.33 I Segmento corresponde às séries iniciais <strong>do</strong> Ensino Fundamental; II segmento, séries fi<strong>na</strong>is e III segmento,Ensino Médio.34 À época da pesquisa de campo, este órgão ainda se chamava Diretoria Regio<strong>na</strong>l de Ensino. DRE.


35 Estivemos mais diretamente com alunos indica<strong>do</strong>s pela direção da <strong>escola</strong>, a nosso pedi<strong>do</strong>, mas não faremosuso destes da<strong>do</strong>s de forma direta, ten<strong>do</strong> em vista a riqueza e a complexidade <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s oriun<strong>do</strong>s das falas <strong>do</strong>ssujeitos professores e a exiguidade de tempo imposto pelo mestra<strong>do</strong>.36 A ausência de alg<strong>um</strong>as discipli<strong>na</strong>s deu-se pela ausência às coorde<strong>na</strong>ções pedagógicas. Por questões quedesconhecemos as causas, durante to<strong>do</strong> o ano em que estivemos <strong>na</strong> <strong>escola</strong>, nunca notamos a presença <strong>do</strong>sprofessores de matemática <strong>na</strong>s coorde<strong>na</strong>ções. Apesar de terem compareci<strong>do</strong> aos encontros nos quais falamos aogrupo.37 Os professores em regime de Contratação Temporária tem lotação provisória <strong>na</strong>s <strong>escola</strong>s. Portanto,temporária.38 Sobre o perfil <strong>do</strong> professor brasileiro, convém consultar UNESCO (2004).39 Também chamada de regra fundamental da psicanálise, consiste em orientar o sujeito falante a dizer tu<strong>do</strong> oque lhe vier à cabeça, sem preocupar-se com julgamentos de quem escuta.40 Técnica pela qual se escuta, sem privilegiar nenh<strong>um</strong> elemento <strong>do</strong> discurso de quem fala, deixan<strong>do</strong> a própriaatividade inconsciente da ação.41 Por <strong>um</strong>a questão de curiosidade acadêmica, promovemos <strong>um</strong>a análise de nossos da<strong>do</strong>s pelo softwareALCESTE, cujos resulta<strong>do</strong>s foram muito próximos <strong>do</strong> que já houvéramos a<strong>na</strong>lisa<strong>do</strong>, e estudamos o resulta<strong>do</strong> de<strong>um</strong>a pesquisa realizada pelo curso de Psicologia da UCB, com a qual colaboramos sobre o sofrimento notrabalho de professores vincula<strong>do</strong>s à Regio<strong>na</strong>l de Ensino <strong>na</strong> qual a <strong>escola</strong> campo desta pesquisa está localizada.Esta pesquisa utilizou-se <strong>do</strong> INTRA e ainda não foi publicada.42 A autora trata por dessemelhança o esforço pela diferenciação, o que é por vezes, busca<strong>do</strong> pela dissemitriadas posições de pesquisa<strong>do</strong>r e pesquisa<strong>do</strong>, com o cuida<strong>do</strong> de possíveis equívocos de hierarquização destasposições.43 Por <strong>um</strong> processo que consideramos (contra)transferencial, portanto inconsciente, sem que tévéssemos nosda<strong>do</strong> conta disto, não percebemos de início muito elementos <strong>na</strong>s falas de <strong>um</strong> <strong>do</strong>s sujeitos de pesquisa, o quedepois reconhecemos nos causava maior desconforto. Todavia, as falas deste sujeito foram incrivelmentebastante rebuscadas pelo software ALCESTE.44 “O termo ‘preconceito’ é a expressão mais adequada para o grande desejo da Aufklärung, a vontade de <strong>um</strong>exame livre e sem parcialidade. Preconceito é o correlato polêmico unívoco desse termo tão excessivamenteambíguo que é ‘liberdade’”. (In. Gadamer, 1997, p. 407).45 Conforme vimos com Vieira (2008), Oliveira (2009), Pain (2003), Dubet (1997), Merle (1996), Estêvão(2008), Santos Guerra (2002), Houssaye (1996), Dayrell (2007).46 No intuito de identificar o gênero <strong>do</strong>s sujeitos, acrescentamos a letra “M” para sujeitos <strong>do</strong> sexo masculino e“F” para sujeitos <strong>do</strong> sexo feminino.47 Termo pelo qual Freud (1920) desig<strong>na</strong> a tendência à repetição, a negação <strong>do</strong> conflito.48 PROEM: Escola <strong>do</strong> DF com proposta específica para alunos em contexto de vulnerabilidade, EMMP: <strong>escola</strong><strong>do</strong> DF específica para crianças e a<strong>do</strong>lescentes em situação de rua.49 Mecanismo pelo qual, ante <strong>um</strong>a ameaça, o sujeito retoma psiquicamente à condição infantil <strong>na</strong> busca daproteção de <strong>um</strong> outro que tu<strong>do</strong> podia (ROUDINESCO e PLON, 1998).50 Não confundir com pai (real), mas função de, metáfora <strong>do</strong> pai, nome-<strong>do</strong>-pai.51 Rassial discute a fragilização <strong>do</strong> nome-<strong>do</strong>-pai e a autoridade <strong>do</strong> professor em: RASSIAL, Jean Jacques.Declínio <strong>do</strong> pai ou falha <strong>do</strong> professor. In II Colóquio <strong>do</strong> LEPSI: A psicanálise, a educação e os impasses dasubjetivação no mun<strong>do</strong> moderno. FAPESP, 2000.52 Nazismo usa<strong>do</strong> em senti<strong>do</strong> metafórico.53 Jor<strong>na</strong>da de trabalho <strong>na</strong> qual o professor tem a carga horária de 40 horas sema<strong>na</strong>is, sen<strong>do</strong> 30 horas em regênciaem <strong>um</strong> <strong>do</strong>s turnos e 10 horas de coorde<strong>na</strong>ção pedagógica no turno contrário.54 Antigo nome da modalidade de Educação de Jovens e Adultos.55 Vale destacar que o sujeito 9-M fala-nos que a <strong>juvenil</strong>ização da EJA começa a chegar ao noturno.56 Entre outros, sugere-se a leitura de Paulo Carrano (2007).57 A única <strong>escola</strong> que não nos convi<strong>do</strong>u a esta discussão oferece ape<strong>na</strong>s três turmas de EJA primeiro segmento.Por tratar-se de alfabetização, é composta, basicamente, por pessoas mais velhas.58 Copiamos a fala de nosso professor e amigo, <strong>do</strong>utor Rogério de Andrade Cór<strong>do</strong>va.59 Epígrafes utilizadas ao longo <strong>do</strong>s capítulos.150

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