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Os contratos cativos de longa duração e o direito ... - Milton Campos

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Luiz Felipe Ribeiro Rodrigues<strong>Os</strong> Contratos Cativos <strong>de</strong> Longa Duração e o Direito Intertemporal: Equilíbrionas Relações Contratuais com Base na Teoria dos Contratos IncompletosDissertação <strong>de</strong> Mestradoapresentado ao Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação em Direito da Faculda<strong>de</strong><strong>Milton</strong> <strong>Campos</strong>.Belo Horizonte, novembro <strong>de</strong> 2010.


SUMÁRIOINTRODUÇÃO1–A NOVA ORDEM CONTRATUAL e a FORÇA OBRIGATÓRIA DOSCONTRATOS2- NOVA PRINCIPIOLOGIA CONTRATUAL2-1- O Contrato e sua Função Social2-2 – A boa-fé nas Relações Contratuais3-OS CONTRATOS CATIVOS DE LONGA DURAÇÃO3-1-Origem e <strong>de</strong>finição3-2-Características3-2-1- O Fornecimento <strong>de</strong> Serviço3-2-2- A Longa Duração3-2-3- O Cliente Depen<strong>de</strong>nte4- ALTERAÇÕES DAS CIRCUNSTÂNCIAS NEGOCIAIS4-1- Teoria da imprevisão e da Base do Negócio Jurídico4-2- A Boa-Fé Como Norteadora do Restabelecimento do EquilíbrioContratual5-SUPERVENIÊNCIA DAS LEIS DURANTE OS CONTRATOS5-1- Principais Teorias Sobre o Conflito <strong>de</strong> Leis No Tempo5-2- Análise da Jurisprudência5-3- O Art. 2035 DO Código Civil5-4- O Diálogo das Fontes5-4-1- O Código Civil e o Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor6- OS CONTRATOS INCOMPLETOS6-1-O Movimento “Law Na Economics”6-2- Definição6-3- Contratos Incompletos E Contratos Relacionais6-4- Contratos Incompletos E O Princípio Da Boa-Fé7-CONCLUSÃO8-REFERÊNCIAS


INTRODUÇÃOConforme ressalta Enzo Roppo, o contrato constitui a vesteformal das operações econômicas, não po<strong>de</strong>ndo ser abstraído <strong>de</strong>stafinalida<strong>de</strong> instrumental (Roppo, 1988, p. 11)<strong>Os</strong> <strong>contratos</strong> são, assim, vias <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nação dos mercadosimpactados por normas jurídicas, pelas quais, o Estado intervêm sobre odomínio econômico.A dinamicida<strong>de</strong> das relações econômicas presente nasocieda<strong>de</strong> contemporânea trouxe novos <strong>de</strong>safios para a teoria geral dos<strong>contratos</strong>. Isto porque não existe mais a propalada visão <strong>de</strong> equilíbriocontratual <strong>de</strong>corrente puramente da liberda<strong>de</strong> e do consenso, que marcaram ateoria clássica, principalmente, em razão da notória <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> materialentre aqueles que contratam.Por estes fatores, tais pactos reclamam formas constantes <strong>de</strong>adaptação ou renegociação entre as partes para o fim <strong>de</strong> manter o equilíbrio<strong>de</strong>sejado e necessário à eficiente circulação <strong>de</strong> riquezas inerente à idéia <strong>de</strong>contrato, sendo, para isso, necessários instrumentos para sua imposição oumanutenção.<strong>Os</strong> <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração representam <strong>de</strong> formaintensa essas novas relações contratuais. São pactos que se protraem notempo; que se renovam, periodicamente, durante vários anos, e que têm,comumente, em seu objeto, a prestação se serviços consi<strong>de</strong>rados essenciais.Não raro, porém, as circunstâncias que levaram os agentes afirmarem o pacto são alteradas em <strong>de</strong>corrência da própria dinâmica da vidasocial, po<strong>de</strong>ndo surgir o <strong>de</strong>sequilíbrio entre as prestações assumidas.Assim, as contínuas mudanças nos produtos ou nascaracterísticas dos serviços contratados, por exemplo, impe<strong>de</strong>m que oscontratantes possam prever todas as contingências futuras e especificar <strong>de</strong>forma completa os termos dos ajustes, bem como regras para reajustescontratuais.


Um fator contingencial específico e problemático é asuperveniência <strong>de</strong> novas leis e os efeitos causados na relação jurídica jáexistente. Em tais situações po<strong>de</strong>rão surgir dificulda<strong>de</strong>s para os agentescontratantes manterem o equilíbrio do pacto mostrando-se necessário umplanejamento contratual para o futuro.A dogmática tradicional dos <strong>contratos</strong> não trouxe, ainda, <strong>de</strong>forma satisfatória, mecanismos que assegurem às partes, a manutenção dosinalagma contratual durante todo o pacto, reclamando a or<strong>de</strong>m jurídica outrosmecanismos que atinjam este mister.A teoria dos <strong>contratos</strong> incompletos, <strong>de</strong>finida pelos economistas,consiste na constatação da dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>screver, com precisão, asprestações a que se obrigam as partes ao longo do prazo <strong>de</strong> duração <strong>de</strong>contrato e as ações que cada uma <strong>de</strong>las po<strong>de</strong>rá adotar, baseando-se, paraisto, em conceitos econômicos como custos <strong>de</strong> transação, oportunismo eassimetria <strong>de</strong> informações.De forma conjunta com institutos e princípios informados pelaor<strong>de</strong>m jurídica, estas formulações po<strong>de</strong>m ser utilizadas para a análise doequilíbrio nos <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração.Para tanto, estes pactos <strong>de</strong>vem ser entendidos como umprocesso e como palco <strong>de</strong> constante renegociação baseada em um propósito<strong>de</strong> cooperação entre os agentes, o que permitirá, mediante interpretações dopacto com base na boa-fé, se atingir o fim almejado quando <strong>de</strong> suacelebração.O presente trabalho tem como propósito a abordagem daaplicação da teoria dos <strong>contratos</strong> incompletos como mecanismo parasolucionar as alterações das circunstâncias ocorridas durante a execução dos<strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração, em especial aquelas <strong>de</strong>correntes dasuperveniência <strong>de</strong> uma nova lei e seus efeitos na relação jurídica existenteentre os agentes.


1- A FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS - DA AUTONOMIA DAVONTADE À INTERVENÇÃO DO ESTADOIndispensável para a análise <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado fenômeno jurídico,sua contextualização histórica, uma vez que o <strong>direito</strong> normatiza os fatosmateriais, valorando-os <strong>de</strong> acordo com o pensamento sócio-cultural e político<strong>de</strong> certa época e lugar.O contrato, como fato social, como instrumento responsável pelacirculação <strong>de</strong> riquezas e como fonte <strong>de</strong> obrigações <strong>de</strong>ve se amoldar à era emque vive para cumprir sua utilida<strong>de</strong> no or<strong>de</strong>namento jurídico.Assim, sua própria concepção tem sofrido uma sensívelevolução vivendo, hoje um momento <strong>de</strong> mudança ou <strong>de</strong> crise, como enten<strong>de</strong>parte da doutrina.Não po<strong>de</strong> se apontar uma causa única, para a constituição <strong>de</strong>stecenário, guardando relação com as alterações ocorridas nas formas daprodução e distribuição <strong>de</strong> bens e com a absorção <strong>de</strong> valores sociais e <strong>de</strong>justiça distributiva.O contrato clássico inserido como instrumento <strong>de</strong> uma economialiberal, amparado pelas codificações oitocentistas e pela escola positivista do<strong>direito</strong>, tinha como paradigma a garantia da segurança jurídica cujo alcance sebuscava pela completu<strong>de</strong> da legislação.Prevalecia, então, a vonta<strong>de</strong> intersubjetiva como fundamentoúltimo dos <strong>contratos</strong>, sendo entendido como justo o contrato, se conformadopela manifestação livre das partes envolvidas.Com a livre concorrência; com a Revolução Industrial e com amassificação das relações econômicas, condições <strong>de</strong>sumanas <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong>trabalho surgiram e este conceito <strong>de</strong> contrato apresentou suas imperfeições.Muitos políticos e economistas passaram a abandonar a idéia doliberalismo surgindo, neste contexto, o <strong>de</strong>nominado Estado social, sendo,


posteriormente, seguidos pelos juristas ao constatarem que as liberda<strong>de</strong>sindividuais <strong>de</strong>veriam ser acompanhada <strong>de</strong> <strong>direito</strong>s sociais.Restou <strong>de</strong>sta forma, <strong>de</strong>sacreditada a crença <strong>de</strong> que o equilíbriocontratual seria assegurado pela suposição <strong>de</strong> que as partes eram,formalmente, iguais e o visível <strong>de</strong>sequilíbrio <strong>de</strong>corrente da contratação emmassa reclamou a interferência do Estado na vida econômica culminando nalimitação da autonomia privada, sobretudo na liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar oconteúdo da relação contratual, gerando modificações no regime legal e nainterpretação dos <strong>contratos</strong>.O interesse em proteger a parte mais fraca da relaçãoobrigacional, e garantir um equilíbrio material aos pactos legitimou o Estadopara intervir nos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> forma cada vez mais incisiva limitando aautonomia da vonta<strong>de</strong> e relativizando os princípios contratuais clássicos.Conforme, Orlando Gomes 1A política interventiva do Estado atingiu, por sua vez, o contrato nasua cida<strong>de</strong>la, ao restringir a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratar, na sua trípliceexpressão <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> celebrar contrato, da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong>escolher o outro contratante e da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar oconteúdo do contrato.Torna-se visível uma dissociação parcial da relação contratualcom o acordo <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>s, na medida em que uma das partes, simplesmente,passa a a<strong>de</strong>rir a um conjunto pré-estipulado <strong>de</strong> regras sobre as quais nãopo<strong>de</strong> negociar.Percebe, então, o jurista que a vonta<strong>de</strong> não po<strong>de</strong> mais ser oúnico fundamento da força obrigatória dos <strong>contratos</strong> na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>consumo:Assim, <strong>de</strong> várias formas o Estado se fez intervir: (a) pelo controle daativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadas empresas economicamente po<strong>de</strong>rosasou prestadoras <strong>de</strong> serviços ou produtos essenciais, até mesmoobrigando-as a contratar (a ven<strong>de</strong>r, não escon<strong>de</strong>r estoques, etc.);(b) pelo nivelamento do po<strong>de</strong>r das partes para sua equalização,1 GOMES, Orlando. Contratos. 17. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 1997, p. 9.


estaurando-se a igualda<strong>de</strong> real (v.g. <strong>contratos</strong> coletivos <strong>de</strong>trabalho); e (c) pelo dirigismo contratual, que é a interferência doEstado no conteúdo do contrato e no seu processo, com a restriçãoda liberda<strong>de</strong> das partes ao impor-lhes <strong>de</strong>terminada atuação (tratase<strong>de</strong> uma interferência na estipulação do contrato que afasta opo<strong>de</strong>r da vonta<strong>de</strong> em <strong>de</strong>terminada área consi<strong>de</strong>rada essencial) 2Na socieda<strong>de</strong> contemporânea, mais uma vez, em razão dacomplexida<strong>de</strong> das relações econômicas, o contrato passa a adquirir feiçõesque antes não possuía, reveladas por uma multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vínculoscontratuais, substancialmente, distintos da compreensão tradicional, facilitadospela revolução da comunicação por meios como a re<strong>de</strong> mundial <strong>de</strong>computadores, e outras formas garantidoras <strong>de</strong> uma nova forma <strong>de</strong>contratação em massa, dando origem a <strong>contratos</strong> eletrônicos, <strong>contratos</strong>conexos e <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração.Ocorre que, diferentemente do cenário encontrado no período <strong>de</strong>produção manufatureira e da produção em massa característica da revoluçãoindustrial e do <strong>de</strong>nominado período pós-industrial, em que a idéia <strong>de</strong> riquezaestava ligada ao acesso a bens móveis, valoriza-se, na socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> hoje, osbens imateriais e os serviços colocados à disposição <strong>de</strong> uma massa <strong>de</strong>consumidores.Notório que a dogmática tradicional se mostra insuficiente paraacompanhar tal evolução, surgindo, assim, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma renovaçãoda teoria contratual para que sejam absorvidos novos paradigmas para aanálise do cumprimento do programa contratual.Por força disto, o <strong>direito</strong> das obrigações e, por conseguinte, o<strong>direito</strong> contratual tenta se amoldar à contemporaneida<strong>de</strong>.Po<strong>de</strong>-se dizer que a evolução do <strong>direito</strong> contratualcontemporâneo se inicia com o reconhecimento e aplicação do princípio daboa-fé no <strong>direito</strong> das obrigações cuja aceitação se <strong>de</strong>u, em um primeiromomento, por intermédio <strong>de</strong> seu reconhecimento como princípio jurídicorecepcionado pelos meios acadêmicos e posteriormente, pela jurisprudência.2 José Guilherme Wernier


No <strong>direito</strong> brasileiro, após o princípio ser encampado pelajurisprudência, o legislador do Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor e do CódigoCivil <strong>de</strong> 2002, tentando ajustar as normas contratuais à nova realida<strong>de</strong>, opositivou. Afirma-se, assim, queCom a entrada em vigor do Código Civil <strong>de</strong> 2002 e arevogação da primeira parte contratual do Código Comercial<strong>de</strong> 1850, o paradigma máximo da boa-fé, que caracterizava omo<strong>de</strong>lo contratual do Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor,generalizou-se para todos os <strong>contratos</strong> no <strong>direito</strong> privadobrasileiro (arts. 113, 187 e 422 do CC/02), seja um contratoentre dois iguais, dois civis ou dois empresários, seja entredois diferentes, um contratante profissional, o fornecedor, umcontratante leigo e vulnerável, o consumidor, logo este últimoum contrato <strong>de</strong> consumo. Parece-me, pois, neste momento<strong>de</strong> generalização (pois em tempos pós-mo<strong>de</strong>rnos ageneralização geralmente leva à <strong>de</strong>sconstrução), necessário,necessário reforçar o paradigma e evitar que se enfraqueça. 3Desta forma, para se preservar a eficiência e a própria função doinstituto, os princípios da autonomia da vonta<strong>de</strong> e da força obrigatória, tidoscomo clássicos, são relativizados:Foi a crítica aos princípios da autonomia privada e daliberda<strong>de</strong> contratual que permitiu que <strong>de</strong>sabrochassem osprincípios da boa-fé e da justiça contratual – os quais aliásnunca <strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong> estar latentes em todos osor<strong>de</strong>namentos: apenas eram ofuscados pelo brilhoartificialmente acrescentado ao princípio da (velha)autonomia da vonta<strong>de</strong> 4Relativizados porque tanto a força obrigatória, como a autonomiadas partes persistem, ainda que com uma nova concepção e um novo papelna conformação do conteúdo do contrato. Conforme atesta Roppo: 5É, por isso, extremamente difícil abarcar estes processos <strong>de</strong>transformação <strong>de</strong>ntro do rigor <strong>de</strong> uma fórmula interpretativaabsolutamente abrangente, que, por si só, individualize e exprima oseu sentido. E a questão – hoje freqüentemente discutida – <strong>de</strong>saber se a socieda<strong>de</strong> e o <strong>direito</strong> contemporâneos conhecem um<strong>de</strong>clínio ou antes um relançamento do papel da autonomia privada3MARQUES, Cláudia Lima. A nova crise do contrato: estudos sobre a nova teoriacontratual/[org.]Cláudia Lima Marque – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 20074 NORONHA, Fernando. O Direito dos Contratos e seus Princípios Fundamentais , AutonomiaPrivada, Boa-fé, Justiça Contratual São Paulo: Saraiva, 1994, p. 1225 ROPPO, Enzo. O Contrato


e do contrato, seu instrumento fundamental não parece susceptível<strong>de</strong> respostas unívocas. Alguns dos fenômenos que aludimos,parecem, <strong>de</strong> facto, assinalar uma redução objectiva da área <strong>de</strong>incidência e da importância do contrato enquanto instrumento <strong>de</strong>mediação social, assim como existem outros fenômenos, queparecem, inversamente, dilatar e exaltar o seu papel; e, por vezesum mesmo fenômeno parece partilhar, contraditoriamente, <strong>de</strong>ambas as tendências.Entendida como a vinculativida<strong>de</strong> das partes às disposiçõescontidas no contrato, a força obrigatória continua tendo a vonta<strong>de</strong> como fonte,mas não como a única como concebido pela teoria clássica que reputava justoum contrato se fruto da manifestação livre e soberana das partes. 6O contrato contemporâneo, portanto, <strong>de</strong>ve ser entendido comoaquele que tem fontes heterônomas em seu regramento como fundamento <strong>de</strong>obrigatorieda<strong>de</strong>.Isto porque <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a crescente intervenção estatal, com alimitação da autonomia da vonta<strong>de</strong> baseada na justiça formal, as relaçõesprivadas passaram a se pautar pela justiça material e pelo interesse social.Entendido como o instrumento jurídico por meio do qual seconcretiza, em gran<strong>de</strong> medida, a or<strong>de</strong>m pública econômica, <strong>de</strong>ve assegurar osprincípios da or<strong>de</strong>m pública econômica constitucional, revestindo-se, assim,<strong>de</strong> força obrigatória, fomentando a confiança e assegurando a segurançajurídica.Sempre importante, <strong>de</strong>sta forma, reafirmar a substituição da<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> autonomia da vonta<strong>de</strong> pela idéia <strong>de</strong> autonomia privada entendidaesta como a possibilida<strong>de</strong> dada aos indivíduos pelo or<strong>de</strong>namento <strong>de</strong>estabelecer as normas jurídicas <strong>de</strong> seu próprio comportamento criando-as noslimites legais. Ou nas palavras <strong>de</strong> Orlando Gomes como “o po<strong>de</strong>r dos6 Assim, <strong>de</strong>fine Teresa Negreiros a autonomia da vonta<strong>de</strong>:“A vonta<strong>de</strong> como centro docontrato, articulada à regra da igualda<strong>de</strong> dos contratantes obriga a reconhecer que tanto olegislador como o juiz lhe <strong>de</strong>vem fiel observância, não po<strong>de</strong>ndo intervir naquilo que houversido pactuado pelas partes contratantes.” (NEGREIROS, Tereza. Teoria do Contrato: novosparadigmas/Tereza Negreiros – 2ª ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2006.)


indivíduos <strong>de</strong> suscitar, mediante <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, efeitos reconhecidose tutelados pela or<strong>de</strong>m jurídica”. 7Po<strong>de</strong>-se dizer, portanto, que a lei não atua, somente, comolimitadora da vonta<strong>de</strong>, mas como conformadora do conteúdo contratual,assumindo um papel <strong>de</strong> fonte direta do mesmo, legitimando a justiça eutilida<strong>de</strong> contratuais.Sofre o contrato, na <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> Roppo, uma objetivação, sem,contudo, per<strong>de</strong>r sua função <strong>de</strong> garantir o exercício da liberda<strong>de</strong> econômica e acirculação da riqueza:O contrato, portanto, transforma-se, para a<strong>de</strong>quar-se ao tipo <strong>de</strong>mercado, ao tipo <strong>de</strong> organização econômica em cada épocaprevalente. Mas, justamente, transformando-se e a<strong>de</strong>quando-se domodo que se disse, o contrato po<strong>de</strong> continuar a <strong>de</strong>sempenharaquela que é – e continua a ser – a sua função fundamental noâmbito das economias capitalistas <strong>de</strong> mercado: isto é, a função <strong>de</strong>instrumento da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciativa econômica. Está agora claroque as transformações do instituto contratual, que <strong>de</strong>signávamosem termos da sua objectivação, não contrariam, mas antessecundam, o princípio da autonomia privada, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se queirater <strong>de</strong>ste princípio uma noção realista e correcta: autonomiaprivada, portanto, não como sinônimo <strong>de</strong> «autonomia da vonta<strong>de</strong>individual» mas como forma jurídica e legitimação da liberda<strong>de</strong>econômica, da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> prosseguir o lucro ou, então <strong>de</strong> actuarsegundo as conveniências <strong>de</strong> mercado – nos modos ou com astécnicas a<strong>de</strong>quadas ao tipo <strong>de</strong> mercado historicamente<strong>de</strong>terminado. Por outras palavras, as tendências objectivas do<strong>direito</strong> mo<strong>de</strong>rno não vão necessariamente contra o princípio daautonomia privada, porque este – como já se tinha advertido – nãose i<strong>de</strong>ntifica com o «dogma da vonta<strong>de</strong>» 8A lei, na condição <strong>de</strong> fonte, atuará, mediante suas normassupletivas e imperativas, diretamente, na construção do regime contratualvinculando as partes a seus termos, revestindo <strong>de</strong> juridicida<strong>de</strong> os termosajustados, integrando o contrato naquilo que as partes <strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong> dispor, ouafastando as disposições que lhe contrariem.De outro turno, <strong>de</strong>cisões jurisdicionais e procedimentos dasautorida<strong>de</strong>s administrativas serão, também, agentes típicos das limitaçõesimpostas à liberda<strong>de</strong> contratual dos particulares. Conjuntamente com a7 Gomes, Orlando. Contratos. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Forense, 2007.8 ROPPO, Enzo. O Contrato.


vonta<strong>de</strong> das partes, que exprime o respectivo po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> autonomia, elesconstituirão as fontes do regulamento contratual, para cuja concreta<strong>de</strong>terminação po<strong>de</strong>m, segundo as circunstâncias, em diferentes medidas,concorrer, registrando-se assim, em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminação do conteúdo docontrato, uma dialética entre fontes <strong>de</strong> tipo diverso, que, po<strong>de</strong>rão sofrer, <strong>de</strong>acordo com o contexto político, social e econômico, diversas transformações.Importante <strong>de</strong>ixar claro que, mesmo, <strong>de</strong>ntro dos critérios <strong>de</strong>interpretação utilizados durante o mo<strong>de</strong>lo contratual clássico oitocentista, aautonomia da vonta<strong>de</strong> já sofria restrições <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o surgimento da teoria da<strong>de</strong>claração como resposta às imperfeições da teoria da vonta<strong>de</strong>, culminando,posteriormente, no <strong>de</strong>senvolvimento do princípio da confiança, substrato doprincípio da boa-fé.Em uma ativida<strong>de</strong> interpretativa, esta vonta<strong>de</strong> seráfuncionalizada pelo fato <strong>de</strong> não ser suficiente para a conformação do conteúdocontratual, já que “[...] o consentimento não é um texto normativo autosuficiente.Há que integrar, tipificar e recorrer a inúmeras disposiçõescomplementares que não surgem da vonta<strong>de</strong> das partes” 9Desta forma, a interpretação <strong>de</strong> um contrato não se resolve coma simples leitura do que foi <strong>de</strong>clarado pelas partes, necessitando o intérprete,para dar eficácia ao programa contratado, recorrer à lei, a princípios gerais aprece<strong>de</strong>ntes judiciários.Assim, o que se percebe é que “A or<strong>de</strong>m jurídica não <strong>de</strong>ixa emmãos particulares a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> criar or<strong>de</strong>namentos contratuais, equiparáveisao jurídico, sem um interventor” 10 , para que cumpra suas funções individuais,econômicas e sociais.2-A NOVA PRINCIPIOLOGIA CONTRATUAL9 LORENZETI, Ricardo. Fundamentos do <strong>direito</strong> privado, São Paulo, RT, 1998, p. 537.10 LORENZETI, Ricardo. Fundamentos do <strong>direito</strong> privado, São Paulo, RT, 1998, p. 540.


Na esteira da evolução acima tratada, o Código Civil <strong>de</strong> 2002incorporou princípios entendidos pela doutrina como novos princípioscontratuais, 11quais sejam, o princípio da boa-fé objetiva, o do equilíbrioeconômico do contrato, ou equivalência material e o princípio da função socialdo contrato.Enten<strong>de</strong>ndo-se o equilíbrio contratual mais como ferramentainterpretativa, do que princípio contratual, passa-se a analisar o princípio dafunção social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva.2-1- O CONTRATO E SUA FUNÇÃO SOCIALSeguindo as diretrizes 12que regem Código Civil <strong>de</strong> 2002, oprincípio da função social veio nele expresso, sendo apontado pela doutrinacomo um dos novos princípios do <strong>direito</strong> contratual.Entendido como cláusula geral 13 , tem sido um dos temas mais<strong>de</strong>batidos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da vigência do código 14 , confrontando-se a doutrinaacerca <strong>de</strong> seu significado 1511 Assim, na versão atualizada <strong>de</strong> Orlando Gomes: “O Direito dos <strong>contratos</strong> repousa em quatroprincípios: 1) o da autonomia da vonta<strong>de</strong>; 2) o do consenusalismo; 3) o da força obrigatória; 4)o da boa fé. <strong>Os</strong> três primeiros po<strong>de</strong>m ser chamados <strong>de</strong> tradicionais. A boa-fé, por sua vez,embora, já estivesse presente no Código Comercial <strong>de</strong> 1850, assumiu na doutrinacontemporânea sentido e funções inteiramente novos <strong>de</strong>sempenhando papel <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque noCódigo Civil <strong>de</strong> 2002. Ao lado <strong>de</strong>la, po<strong>de</strong>-se acrescentar dois outros princípios norteadores doregime contratual na nova codificação, o princípio do equilíbrio econômico do contrato e oprincípio da função social do contrato. Afirma-se, assim, que atualmente, há três princípiosclássicos (autonomia da vonta<strong>de</strong>, consensualsmo e força obrigatória, aos quais se po<strong>de</strong>reconduzir o princípio da relativida<strong>de</strong> dos efeitos contratuais) e três novos princípioscontratuais (boa-fé, equilíbrio econômico e função social) (GOMES, Orlando. Contratos. Rio<strong>de</strong> Janeiro 26ª edição, Forense, 2007, p. 25.12 Segundo Miguel Reale, o Código Civil foi criado com base em três fundamentais, quaissejam: a operabilida<strong>de</strong>, a eticida<strong>de</strong> e a socialida<strong>de</strong>. (REALE, Miguel. As diretrizesfundamentais do projeto do Código Civil. Comentário sobre o projeto do Código Civil brasileiro.Brasília: CJF, 2002. p. 5-21)13 Segundo Nelson Nery Jr. As cláusulas gerais “são formulações contidas na lei, <strong>de</strong> carátersignificativamente genérico e abstrato, cujos valores <strong>de</strong>vem ser preenchidos pelo juiz,autorizado para assim agir em <strong>de</strong>corrência da formulação legal da própria cláusula geral, quetem natureza <strong>de</strong> diretriz” (NERY JÚNIOR, Nelson. Contratos no Código Civil. In. MARTINSFILHO, Ives Gandra; MENDES, Gilmar Ferreira; FRANCIULLI NETO, Domingos (Org.). Onovo Código Civil: estudos em homenagem ao professor Miguel Reale. São Paulo: LTr, 2003.14 “Art. 421. A liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> contratar será exercida em razão e nos limites da função social docontrato” (disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm)


Interpretações têm vingado no sentido <strong>de</strong> que o contrato tem afunção <strong>de</strong> fazer prevalecer os valores sociais sobre os individuais, não raro<strong>de</strong>svirtuando-se este entendimento para uma concepção assistencialista doinstituto. Assim, o contrato, antes <strong>de</strong> representar a composição <strong>de</strong> interessesopostos, teria como função uma forma <strong>de</strong> cooperação entre as pessoas,acabando por prevalecer, em <strong>de</strong>terminadas situações o interesse do maisfraco frente ao contratante mais abastado.Deveria, assim, existir nas relações internas entre oscontratantes, condutas recíprocas ten<strong>de</strong>ntes a propiciar o adimplemento daobrigação pactuada que será atingido se a troca e a circulação <strong>de</strong> riqueza,ocorrer <strong>de</strong> forma justa, útil e eqüitativa para ambas as partes.analisada em dois níveis:Segundo a doutrina, a função social do contrato <strong>de</strong>ve ser[...] no intrínseco e no extrínseco. Ou seja: seu perfilextrínseco ( o contrato em face da coletivida<strong>de</strong>) rompe como princípio clássico da relativida<strong>de</strong> dos efeitos do contrato.Passa a teoria contratual a preocupar-se, também, com asrepercussões do negócio jurídico bilateral no largo campodas relações sociais.Já no aspecto intrínseco (o contrato visto como relaçãojurídica entre as partes negociais), a função social estarialigada à observância dos princípios da igualda<strong>de</strong> material,equida<strong>de</strong> e boa-fé objetiva, por parte dos contratantes,“todos <strong>de</strong>correntes da gran<strong>de</strong> cláusula constitucional <strong>de</strong>solidarieda<strong>de</strong>, sem que haja um imediato questionamentoacerca do princípio da relativida<strong>de</strong> dos <strong>contratos</strong> 1615 Conforme Humberto Theodor Júnior, citando Philippe Jestaz “É <strong>de</strong> todos sabido que a teoria atual docontrato, seja no âmbito da lei, da doutrina ou da jurisprudência, assiste a um gran<strong>de</strong> confrontofilosófico entre o voluntarismo (clássico) e o comutativismo (mo<strong>de</strong>rno) ou entre o individualismo e osolidarismo. Enquanto a primeira corrente vê o núcleo do fenômeno da vonta<strong>de</strong>, a segunda o <strong>de</strong>slocapara a cooperação entre as partes. De qualquer maneira, sua função é sempre a <strong>de</strong> criar obrigações e<strong>direito</strong>s entre elas. Deveu-se, por outro lado, ao solidarismo, a introdução na área do contrato daspreocupações com o equilíbrio, a proporcionalida<strong>de</strong> e a proscrição do abuso no relacionamentocontratual. Essas novas facetas do <strong>direito</strong> contratual manifestam-se, porém, na linha dos princípios enão do objetivo perseguido pelo contrato, que continua sendo a circulação da riqueza, sob a garantiada segurança jurídica. Mas, uma circulação que a própria economia incita aos contratantes a fazê-lo,sob um figurino <strong>de</strong> cooperação e confiança mútua.” (THEODORO Júnior Humberto. O Contrato esua Função Social. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Forense, 2008, p.50)16 Paulo Nalin, Apud THEODORO Júnior Humberto. O Contrato e sua Função Social. Rio <strong>de</strong>Janeiro, Forense, 2008, p. 44.


Ocorre que, para se atingir tal objetivo, necessário se colocar ointeresse coletivo acima do interesse individual, valorizando-se no âmbito docontrato a solidarieda<strong>de</strong> e cooperação entre os contratantes.Assim, enten<strong>de</strong> Maria Celina Bodin <strong>de</strong> Moraes:[...] seus conteúdos se tornam complementares: regulamentasea liberda<strong>de</strong> em prol da solidarieda<strong>de</strong> social, isto é, darelação <strong>de</strong> cada um, com o interesse geral, o que, reduzindo a<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>, possibilita o livre <strong>de</strong>senvolvimento dapersonalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada um dos membros da comunida<strong>de</strong> 17:Esta concepção é rebatida por Humberto Theodoro Júnior:Dessa maneira, afirmar que o contrato tem a função <strong>de</strong>promover a igualda<strong>de</strong> dos contratantes equivale a dizer queesse tipo <strong>de</strong> negócio tem como objetivo fazer com que aspartes “sejam iguais”. Ora, o contrato jamais terásemelhante objetivo porque não se trata <strong>de</strong> instrumento <strong>de</strong>assistência ou <strong>de</strong> amparo a hipossuficientes ou <strong>de</strong>svalidos.O único e essencial objetivo do contrato é o <strong>de</strong> promover acirculação <strong>de</strong> riqueza, <strong>de</strong> modo que pressupõe semprepartes diferentes com interesses diversos e opostos. Paraharmonizar interesses conflitantes, o contrato se dispõe aser útil na <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> como aproximá-los e dar-lhes umasaída negocial. 18Note-se, ainda, que por esta concepção, inevitavelmente, estarse-iaimputando aos contratantes <strong>de</strong>veres <strong>de</strong> assistência social que não lhescabem e sim ao Estado.Desta forma, a função social do contrato não <strong>de</strong>ve fugir à buscapela eficaz circulação <strong>de</strong> <strong>direito</strong>s <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> entre as pessoas e nocontrole <strong>de</strong> seus efeitos perante a socieda<strong>de</strong>.Vem, assim, interferir no âmbito da relativida<strong>de</strong> dos <strong>contratos</strong>,ficando a cargo do princípio da boa-fé objetiva, os problemas relacionados aocomportamento ético dos contratantes:17 MORAES, Maria Celina Bodin <strong>de</strong>. Constituição e Direito Civil: Tendências. Revista dosTribunais, v. 779, p. 55-59, set. 2000.18 THEODORO Júnior Humberto. O Contrato e sua Função Social. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Forense,2008, p. 46


Nesse enfoque, o terreno próprio para cogitar-se da funçãosocial do contrato é o da mo<strong>de</strong>rnização do antigo einflexível princípio da relativida<strong>de</strong> dos <strong>contratos</strong>. <strong>Os</strong>problemas do comportamento ético entre os próprioscontratantes são cuidados por outro princípio novo do<strong>direito</strong> contratual, que vem disposto no art. 422 do novoCódigo Civil, e não naquele que implanta a função social docontrato (art. 421)Atua como limite à liberda<strong>de</strong> contratual, para que o contrato nãocause danos aos <strong>de</strong>mais indivíduos, bem como impedir que terceirosinterfiram na relação contratual, contribuindo para o <strong>de</strong>scumprimento <strong>de</strong> umaobrigação estipulada em contrato <strong>de</strong> que não faz parte o que a doutrinadominou tutela externa do crédito. 19O princípio da função social condiciona o exercício daliberda<strong>de</strong> contratual e torna o contrato, como situaçãojurídica merecedora <strong>de</strong> tutela, oponível erga omnes. Isto é,todos têm o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> se abster da prática <strong>de</strong> atos (inclusivea celebração <strong>de</strong> <strong>contratos</strong>) que saibam prejudiciais oucomprometedores da satisfação <strong>de</strong> créditos alheios. Aoponibilida<strong>de</strong> dos <strong>contratos</strong> traduz-se, portanto, nestaobrigação <strong>de</strong> não fazer, imposta àquele que conhece oconteúdo <strong>de</strong> um contrato, embora <strong>de</strong>le não seja parte. Istonão implica tornar as obrigações contratuais exigíveis emface <strong>de</strong> terceiros (é o que a relativida<strong>de</strong> impe<strong>de</strong>), masimpõe a terceiros o respeito por tais situações jurídicas,validamente constituídas e dignas da tutela door<strong>de</strong>namento (é o que a oponibilida<strong>de</strong> exige) 20Assim conclui Humberto Theodoro Júnior:Em suma, para <strong>de</strong>limitar o campo <strong>de</strong> atuação dos doisnovos princípios consagrados pelo Código Civil <strong>de</strong> 2002 – aboa-fé objetiva e a função social do contrato – impõe-seacentuar o seguinte:19 Teresa Negreiros cita bons exemplos. Em relação à hipótese <strong>de</strong> terceiro ser prejudicadopelo <strong>de</strong>scumprimento <strong>de</strong> uma obrigação contratual, cita os casos <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>solidária por vício e fato do produto <strong>de</strong>scrita no Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor. E para ahipótese em que o credor <strong>de</strong> uma relação é prejudicado por terceiro, situação <strong>de</strong>nominadapela doutrina <strong>de</strong> violação positiva <strong>de</strong> crédito, cita a violação <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong> sigilo que, foiinclusive, tratada no filme “O informante, em que se discutia a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma emissora<strong>de</strong> televisão ser con<strong>de</strong>nada a pagar uma in<strong>de</strong>nização a uma companhia <strong>de</strong> cigarros pelo fato<strong>de</strong> um ex-empregado da mesma divulgar informações que teve acesso quando lá trabalhou eo caso que envolveu o cantor Zeca Pagodinho quando violou cláusula <strong>de</strong> exclusivida<strong>de</strong>, emcontrato <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong>.20 NEGREIROS, Tereza. Teoria do contrato:novos paradigmas/Tereza Negreiros – 2ªed. Rio<strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2006.


a) ofen<strong>de</strong>-se o princípio da boa-fé quando o contrato, ou amaneira <strong>de</strong> interpretá-lo ou <strong>de</strong> executá-lo redundam emprejuízo injusto para uma das partes;b) ofen<strong>de</strong>-se a função social quando os efeitos externos docontrato prejudicam injustamente os interesses dacomunida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> estranhos ao vínculo negocial. 212- 2-A BOA-FÉ NAS RELAÇÕES CONTRATUAISNão restam dúvidas que o princípio da boa-fé objetiva refere-semais à interpretação do contrato do que à sua conformação.A idéia, surgida, há mais <strong>de</strong> um século no Código Civil alemãobuscou uma forma <strong>de</strong> interpretação dos negócios jurídicos <strong>de</strong> formacompatível a anseios éticos ligados ao meio social em que o contrato foicelebrado.Distinta da noção <strong>de</strong>senhada pela <strong>de</strong>nominada boa-fé subjetivaque se refere ao estado subjetivo ou psicológico do indivíduo em <strong>de</strong>terminadarelação jurídica, refere-se o princípio aqui estudado a regras <strong>de</strong> conduta, amo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> comportamento social, algo, portanto, externo em relação aosujeito.O primeiro dispositivo a prever a boa fé objetiva no DireitoBrasileiro foi o contido no artigo 131, I do Código Comercial 22 , mas não comtal contorno, por ser entendida, pela doutrina, como boa-fé fé subjetiva.21 THEODORO Júnior; Humberto. O contrato social e sua função. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense,2008, p.51.22 Assim dispunha o Código Comercial: Art. 131 - Sendo necessário interpretar ascláusulas do contrato, a interpretação, além das regras sobreditas, será regulada sobre asseguintes bases:1 - a inteligência simples e a<strong>de</strong>quada, que for mais conforme à boa fé, e ao verda<strong>de</strong>iroespírito e natureza do contrato, <strong>de</strong>verá sempre prevalecer à rigorosa e restritasignificação das palavras;2 - as cláusulas duvidosas serão entendidas pelas que o nãoforem, e que as partes tiverem admitido; e as antece<strong>de</strong>ntes e subseqüentes, queestiverem em harmonia, explicarão as ambíguas;3 - o fato dos contraentes posterior aocontrato, que tiver relação com o objeto principal, será a melhor explicação da vonta<strong>de</strong>que as partes tiverem no ato da celebração do mesmo contrato;4 - o uso e prática


Em face disto, os artigos 4°, III e 51, IV do Códig o <strong>de</strong> Defesa doConsumidor são apontados como os primeiros a consagrar, <strong>de</strong>finitivamente, anoção <strong>de</strong> boa fé objetiva em nosso sistema.Por se tratar <strong>de</strong> princípio amplo, carente <strong>de</strong> concretização paraser aplicado, no caso concreto, a doutrina, <strong>de</strong> forma até didática, acabou lhe<strong>de</strong>finindo diferentes no campo contratual, surgindo uma classificação quantoàs suas funções.Tem, assim, a boa-fé objetiva, a função interpretativa, conformeprevisão no artigo 113 do CC, no sentido <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminação da intenção ousentido atribuído pelas partes à <strong>de</strong>claração contratual.Não raro, a <strong>de</strong>claração contratual apresenta <strong>de</strong>ficiênciasrepresentadas por lacunas, ambigüida<strong>de</strong>s ou obscurida<strong>de</strong>s insanáveismediante a busca da intenção dos contratantes.Deverá, então, o intérprete saná-las buscando alcançar ahipotética vonta<strong>de</strong> das partes, analisada, segundo padrões retirados do meiosocial em que se celebrou o pacto.Entra em jogo, então a segunda função do princípio, <strong>de</strong>nominada<strong>de</strong> integradora, que busca eliminar as falhas da <strong>de</strong>claração negocial. Paratanto, adota-se um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> pessoa natural, razoável, a fim <strong>de</strong> averiguar osentido que essa pessoa atribuiria à <strong>de</strong>claração negocial caso houvessepercebido a <strong>de</strong>ficiência. 23Assim,geralmente observada no comércio nos casos da mesma natureza, e especialmente ocostume do lugar on<strong>de</strong> o contrato <strong>de</strong>va ter execução, prevalecerá a qualquerinteligência em contrário que se pretenda dar às palavras;5 - nos casos duvidosos, quenão possam resolver-se segundo as bases estabelecidas, <strong>de</strong>cidir-se-á em favor do<strong>de</strong>vedor.23 “Nestes casos, o juiz terá <strong>de</strong> interpretar a <strong>de</strong>claração da vonta<strong>de</strong> das partes “como aenten<strong>de</strong>riam as pessoas corretas e como estas proce<strong>de</strong>riam em relação a ela” (THEODOROJúnior; Humberto. O contrato social e sua função. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Forense, 2008, p.27)


[...] o princípio da boa fé revela-se como <strong>de</strong>lineador do campo aser preenchido pela interpretação integradora, pois, <strong>de</strong>perquirição dos propósitos e intenções dos contratantes po<strong>de</strong>manifestar-se a contrarieda<strong>de</strong> do ato aos bons costumes ou àboa-fé 24Aponta-se, então, a função supletiva, na medida em que a boa-féatua criando para os contratantes, <strong>de</strong>veres anexos, também chamadoslaterais, secundários ou instrumentais. Além dos <strong>de</strong>veres principais queconstituem o núcleo da relação contratual, há <strong>de</strong>veres não expressos cujafinalida<strong>de</strong> é assegurar o perfeito cumprimento da prestação e a plenasatisfação dos interesses envolvidos no contrato. Dentre eles <strong>de</strong>stacam-se<strong>de</strong>veres <strong>de</strong> informação, sigilo, custódia, colaboração, e proteção à pessoa eao patrimônio da contraparte.Po<strong>de</strong> se afirmar que a boa-fé, enquanto fonte geradora <strong>de</strong><strong>de</strong>veres encontra-se presente no artigo 422 do CC 25 , ressaltando-se que,embora o dispositivo mencione apenas a conclusão e a execução do contrato,é certo que a boa fé cria <strong>de</strong>veres anexos, também, na fase pré e póscontratual.Por fim, enten<strong>de</strong>-se que a aplicação do princípio tem uma funçãocorretiva na medida em que ocorrer um controle das cláusulas abusivas ecomo parâmetro para o exercício das posições jurídicas.O Código Civil <strong>de</strong> 2002 traz a boa-fé em função corretiva no art.187, ao erigi-la em critério <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> abuso <strong>de</strong> um <strong>direito</strong> quandoseu titular, ao exercê-lo, exce<strong>de</strong>, manifestamente, os limites impostos pelo seufim econômico ou social pela boa-fé e pelos bons costumes.3- OS CONTRATOS CATIVOS DE LONGA DURAÇÃO3-1- ORIGEM24 SILVA, Clóvis Veríssimo do Couto e. A obrigação como processo. José Bushatsky, Editor.São Paulo, 1976, p. 35.25 Assim dispõe o Art. 422 do Código Civil. “<strong>Os</strong> contratantes são obrigados a guardar, assimna conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios <strong>de</strong> probida<strong>de</strong> e boa-fé.”(disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm


Paralelamente à classificação dos <strong>contratos</strong> em espécies, adoutrina distingue os pactos, com formulações mais abstratas segundocritérios classificatórios como a existência <strong>de</strong> disciplina legislativa, o tempo <strong>de</strong>execução, a relação entre as prestações, os elementos pessoais dos agentes,<strong>de</strong>ntre outros.Com as relações contratuais em massa no início do século XX,novas formas <strong>de</strong> contratar surgiram que, aliadas ao dirigismo contratual, foramcausa <strong>de</strong> novas tipologias. A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> autorização <strong>de</strong> um órgão públicopara a contratação; a regulamentação coativa do conteúdo <strong>de</strong> numerosos<strong>contratos</strong>; a imposição a certos fornecedores <strong>de</strong> contratar; a limitação daliberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> estruturação do conteúdo do contrato através das condições <strong>de</strong>estipulação estabelecidas, unilateralmente pelas gran<strong>de</strong>s empresasmonopolísticas, grupos econômicos po<strong>de</strong>rosos e uniões <strong>de</strong> empresas; asmodificações <strong>de</strong>correntes dos usos e a regulamentação contratual pelosistema <strong>de</strong> formulários fizeram com que surgissem novas figuras, i<strong>de</strong>ntificadase conceituadas pela doutrina.Sobre os <strong>contratos</strong> em massa, a lição <strong>de</strong> Orlando Gomes: 26lição <strong>de</strong> Orlando Gomes:A principal modificação fez-se sentir em razão da expansãodo contrato em massa, que substituiu, em diversos setores docampo negocial, o negócio jurídico bilateral dantes concluídoindividualmente. Nos transportes, nos seguros, nasoperações bancárias, no trabalho realizado nas empresas eem tantos outros <strong>de</strong>partamentos da ativida<strong>de</strong> social dosindivíduos, esse elemento, sem constituir uma comunida<strong>de</strong>jurídica, influi <strong>de</strong>cisivamente na sua própria dogmática.Figuras, irredutíveis ao esquema clássico do contrato, segundo aDessas limitações, assim as impostas pelo Estado com as queresultam das novas necessida<strong>de</strong>s do comércio jurídico,organizaram-se novas figuras jurídicas, irredutíveis ao esquemaclássico do contrato e insubmissas a princípios gerais do Direitodas Obrigações. Surgem novas figuras jurídicas irredutíveis ao26 GOMES Orlando Transformações Gerais do Direito das Obrigações


esquema clássico do contrato e insubmissas a princípios geraisdo <strong>direito</strong> das obrigações. 27I<strong>de</strong>ntifica o autor, neste fenômeno, o contrato normativo, ocontrato coativo, o contrato tipo, o contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são e o contratonecessário 28 O contrato coativo seria aquele imposto, celebrado, sem a livremanifestação do consentimento das partes, consi<strong>de</strong>rada tal figura comocontrato por ficção já que a ela se aplicam as normas do <strong>direito</strong> dasobrigações.Nestas hipóteses, o sujeito passa a fazer parte <strong>de</strong> uma relaçãocontratual, sem ter emitido a correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, para quesejam atingidos objetivos da política econômica do Estado ou em razão <strong>de</strong> finsfiscais. Assim,Realizam-se os <strong>contratos</strong> impostos para que se atinjamobjetivos da política econômica do Estado, ou para facilitarsua ação financeira. Esclarece RENÉ MOREL que atécnica do contrato coativo se emprega para munir o Fisco<strong>de</strong> uma arma, obrigar os particulares a produzir ou a ven<strong>de</strong>rcertas categorias <strong>de</strong> pessoa, prevenir outras categoriascontra os riscos que se expõem e remediar a crise <strong>de</strong>habitação. 29Enquadram-se como exemplos <strong>de</strong>stes <strong>contratos</strong>, a prorrogaçãocompulsória do contrato <strong>de</strong> locação e o seguro obrigatório no contrato <strong>de</strong>transportes <strong>de</strong> pessoas. Nestas hipóteses, a relação jurídica não se formacontratualmente, eis que ausente a emissão da vonta<strong>de</strong> das partes, tanto emrelação à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> não quererem a prorrogação do contrato <strong>de</strong> locaçãocomo na situação <strong>de</strong>, até mesmo <strong>de</strong>sconhecer sua existência como, po<strong>de</strong>ocorrer em relação ao contrato <strong>de</strong> seguro27GOMES, Orlando. Transformações Gerais do Direito das Obrigações. São Paulo: Revistados Tribunais, 1967.28 GOMES, Orlando. Transformações Gerais do Direito das Obrigações. São Paulo: Revistados Tribunais, 1967.29GOMES, Orlando. Transformações Gerais do Direito das Obrigações. São Paulo: Revistados Tribunais, 1967.


Nestes casos, segundo Orlando Gomes, “organizam-se, assim,vínculos <strong>de</strong> fato, à imagem e semelhança do contrato, formando-se o quSAVATIER bem <strong>de</strong>nominou relações paracontratuais 30<strong>Os</strong> <strong>contratos</strong> necessários que, também, têm, como causa, maispróxima, a intervenção estatal na economia, estão relacionados à existência<strong>de</strong> organismos particulares encarregados da prestação <strong>de</strong> certos serviçosconsi<strong>de</strong>rados <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> pública como serviços <strong>de</strong> transporte, <strong>de</strong> telefonia,<strong>de</strong> eletricida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntre outros que são obrigados a contratar, assim comoaqueles que precisam dos serviços, normalmente, indispensáveis e,comumente, oferecidos em regime <strong>de</strong> monopólio. Conforme ressalta OrlandoGomes:Como, entretanto, esses serviços se tornam, dia a dia,indispensáveis a maior número <strong>de</strong> pessoas, a superiorida<strong>de</strong>em que se encontrariam as empresas em relação aosusuários potenciais é neutralizada pelo Estado aoestabelecer as condições em que <strong>de</strong>vem elas contratar,surgindo, em conseqüência, duas interessantes figurasnegociais, o contrato regulamentado e o contrato <strong>de</strong>a<strong>de</strong>são. Conquanto as relações entre as empresasconcessionárias <strong>de</strong> serviços públicos e os usuários nãosejam consi<strong>de</strong>radas contratuais por alguns, na verda<strong>de</strong>possuem essa natureza e são regidas pelas disposiçõesconcernentes aos <strong>contratos</strong>. Pouco importa que ospreten<strong>de</strong>ntes ao serviço se limitem a aceitar a oferta daempresa nas condições permitidas pelo regulamentoinserto em seu conteúdo. Realizam contrato <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são,mas nem por isso <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> constituir relação contratual. 31Há, ainda, segundo o mestre baiano, “<strong>contratos</strong> necessários nosquais não está eliminada a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha da outra parte. A pessoa tema obrigação <strong>de</strong> contratar, mas é livre para eleger o outro contratante” 3230 GOMES, Orlando. Transformações Gerais do Direito das Obrigações. São Paulo: Revistados Tribunais, 1967, p.2231GOMES, 1967, p. 2332GOMES, 1967, p. 23


Analisado o contrato <strong>de</strong> transporte sob o ângulo da relação entreo transportador e a seguradora, po<strong>de</strong> ser encontrada esta figura, já que oconcessionário é obrigado a celebrar o contrato, mas po<strong>de</strong> escolher aseguradora.São, ainda, apontadas, algumas outras figuras como <strong>de</strong>corrênciada expansão do contrato necessário e a limitação da liberda<strong>de</strong> contratual.Trata-se do contrato autorizado cuja realização <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> autorização <strong>de</strong>uma autorida<strong>de</strong> administrativa e os <strong>contratos</strong> regulamentados que têm seuconteúdo, previamente, <strong>de</strong>terminado buscando-se, com isto, <strong>de</strong> um ladoaten<strong>de</strong>r à própria <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> contratação em massa e <strong>de</strong> outro, coibir aimposição <strong>de</strong> condições extorsivas pelo parceiro mais forte.Outras <strong>de</strong>nominações, também, são utilizadas para estes tiposcontratuais. Assim, Roppo fala em <strong>contratos</strong> standard:Nas análises <strong>de</strong>dicadas ao contrato na socieda<strong>de</strong>contemporânea, actualmente quase um lugar comum vernos <strong>contratos</strong> standard o fenômeno através do qual seconsubstancial, hoje, algumas das mais significativas egraves formas <strong>de</strong> restrição da liberda<strong>de</strong> contratual. Ofenômeno consiste no seguinte: quem, pela sua posição epelas suas activida<strong>de</strong>s econômicas, se encontra nanecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer uma série in<strong>de</strong>finida <strong>de</strong>relações negociais, homogêneas no seu conteúdo, comuma série, por sua vez, in<strong>de</strong>finida, <strong>de</strong> contrapartes,predispõe, antecipadamente, um esquema contratual, umcomplexo uniforme <strong>de</strong> cláusulas aplicáveis indistintamentea todas as relações <strong>de</strong> série, que são, assim, sujeitas auma mesma regulamentação; aqueles que, por seu lado,<strong>de</strong>sejam entrar em relações negociais com o predisponentepara adquirir os bens ou os serviços oferecidos por este,não discutem nem negociam singularmente os termos e ascondições <strong>de</strong> cada operação, e, portanto, as cláusulas docontrato respectivo, mas limitam-se a aceitar em bloco(muitas vezes, sem sequer as conhecer completamente) ascláusulas, unilateral e uniformemente, predispostas pelacontraparte, assumindo, <strong>de</strong>ste modo, um papel <strong>de</strong> simplesa<strong>de</strong>rentes (fala-se, e facto, também, <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> <strong>de</strong>a<strong>de</strong>são). 33Não há dúvida que todos acima citados, surgidos na era pósindustrial,permanecem como instrumentos das atuais relações <strong>de</strong> consumo.33 ROPPO, Enzo. O Contrato. Trad. Ana Coimbra e M. Januário Gomes. Coimbra: Almedina,p. 311.


Nas últimas décadas, porém, po<strong>de</strong>-se dizer que novas formas <strong>de</strong>contratação em massa, surgiram, tendo como objeto contratual, o acesso abens imateriais e, principalmente, a serviços 34 da mais variada or<strong>de</strong>m,correspon<strong>de</strong>ndo este objeto a valores como segurança, lazer, status, saú<strong>de</strong>,educação, moradia e crédito, que são consi<strong>de</strong>rados não só úteis, masessenciais para seus <strong>de</strong>stinatários que são instados a a<strong>de</strong>rir a estes pactospor meio <strong>de</strong> fortes campanhas <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong>, ficando a partir daí, vinculadosàquele contrato por longos anos.I<strong>de</strong>ntificando o fenômeno, a doutrina, vem chamando esta forma<strong>de</strong> contratação <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração, que correspon<strong>de</strong>m àsrelações jurídicas complexas e duradouras que têm como fonte novosmétodos <strong>de</strong> contratação em massa.A expressão foi <strong>de</strong>senvolvida no <strong>direito</strong> brasileiro por CláudiaLima Marques 35 utilizando-se as expressões “<strong>longa</strong> duração” ou “largaduracion” <strong>de</strong> Ricardo Luis Lorenzetti 36 e <strong>cativos</strong>, <strong>de</strong> Carlos Alberto Ghersi,para representar a posição <strong>de</strong> cativida<strong>de</strong> dos consumidores, em relação àconclusão e execução do contrato.Referem-se a serviços cujas prestações se a<strong>longa</strong>m no tempo,com uma fase <strong>de</strong> execução contratual com obrigações duradouras, sendo quea satisfação total das partes <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da continuação <strong>de</strong>sta relação jurídica,uma vez que o contrato <strong>de</strong>senvolve seus efeitos justamente através dapassagem do tempo. Além disso, são formados a partir <strong>de</strong> fortes campanhas<strong>de</strong> propaganda na busca da captação <strong>de</strong> clientes, o que, também, explica otermo cativida<strong>de</strong>.34 Conforme Cláudia Lima Marques: “... da acumulação <strong>de</strong> bens materiais, passamos aacumulação <strong>de</strong> bens imateriais, dos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> dar, para os <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> fazer, do mo<strong>de</strong>loindividualista da compra e venda para um mo<strong>de</strong>lo duradouro da relação contratual” (Marques,Contratos bancários em tempos pós-mo<strong>de</strong>rnos – primeiras reflexões, p. 22.35 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor. 4 ed. São Paulo:RT, 2002. p. 8136 LORENZETTI, Ricardo Luis. Tratado <strong>de</strong> los <strong>contratos</strong>. Buenos Aires: Rubinzal-Culzoni,1999. t. I, p. 113.


Cláudia Lima Marques lembra que a cativida<strong>de</strong>, elementoessencial <strong>de</strong>ste mo<strong>de</strong>lo, <strong>de</strong>ve “ser entendida no contexto do mundo atual, <strong>de</strong>indução ao consumo <strong>de</strong> bens materiais ou imateriais, <strong>de</strong> publicida<strong>de</strong> massivae métodos agressivos <strong>de</strong> “marketing”, <strong>de</strong> graves e renovados riscos na vidaem socieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> insegurança quanto ao seu futuro” 37Este tipo <strong>de</strong> contratação po<strong>de</strong> ser observada nos <strong>contratos</strong>bancários, <strong>de</strong> seguro, <strong>de</strong> planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, <strong>contratos</strong>, <strong>de</strong> previdência privada,<strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito, <strong>contratos</strong> referentes a serviços <strong>de</strong> telefone, televisão acabo, internet, além dos serviços públicos básicos como <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong>água, luz e telefone.Segundo a <strong>de</strong>finição proposta, portanto, estes pactos sãoreconhecidos por dois elementos essenciais, o tempo e a cativida<strong>de</strong>ressaltando esta última noção como seu diferencial, já que as fórmulas dos<strong>contratos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração já, há muito, existem na sistemática tradicionalcomo nos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> locação, <strong>de</strong>pósito, mútuo, <strong>de</strong>ntre outros. Assim,esclarece Cláudia Lima Marques 38 :O novo aqui não é a espécie <strong>de</strong> contrato (seguro, porexemplo), mas a sua relevância no contexto atual, asocieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo atual beneficia e fomenta estesserviços consi<strong>de</strong>rados, então, socialmente, essenciais, anecessitar nova disciplina”3-2- ESTRUTURA3-2-1-FORNECIMENTO DE SERVIÇONo período pós-industrial, correspon<strong>de</strong>nte ao surgimento dos<strong>contratos</strong> <strong>de</strong> massa o objeto contratual eram os bens móveis.37 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos bancários em tempos pós-mo<strong>de</strong>rnos – primeirasreflexões, p. 1938 1- MARQUES, 2002, p.80.


Em uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviços como a que se vive, atualmente,a idéia <strong>de</strong> riqueza é <strong>de</strong>slocada para o acesso a bens imateriais e a serviçoscolocados à disposição <strong>de</strong> uma massa <strong>de</strong> consumidores.<strong>Os</strong> <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração são, <strong>de</strong>sta forma,<strong>contratos</strong> <strong>de</strong> consumo em que um <strong>de</strong>terminado fornecedor presta um serviço aum consumidor. Não se amoldam a esta figura relações negociaisrepresentadas por mera aquisição <strong>de</strong> produto, por meio <strong>de</strong> um contratoinstantâneo incapaz <strong>de</strong> gerar qualquer <strong>de</strong>pendência ao consumidor.Segundo Cláudia Lima Marques:<strong>Os</strong> serviços prestados tanto po<strong>de</strong>m ser privados como públicos, eisque entes públicos po<strong>de</strong>m figurar na relação <strong>de</strong> consumo comofornecedor, como é sobejamente conhecido na matéria, fornecendo,inclusive, diversos serviços <strong>de</strong> caráter contínuo e essenciais.Notadamente, é a prestação <strong>de</strong> um serviço, cuja execução seráprotraída no <strong>de</strong>curso <strong>de</strong> tempo, havendo pagamento <strong>de</strong> contraprestaçõesperiódicas pelo consumidor que se torna <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> tais serviços.3-2-2- A LONGA DURAÇÃOA existência <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração já é bastanteconhecida na teoria contratual, contrapondo-se, aos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> execuçãoinstantânea, entendidos como aqueles executados <strong>de</strong> uma só vez e em umaúnica prestação, subdividindo-se em <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> execução imediata, hipóteseem que a prestação é satisfeita no momento da conclusão do acordo ou logoapós, como no caso da compra e venda à vista com entrega do bem, e<strong>contratos</strong> <strong>de</strong> execução diferida caracterizados pelo fato <strong>de</strong>, pelo menos, umadas prestações ser efetuada em tempo posterior ao da conclusão do contrato,como ocorre, por exemplo, com a venda a prestações <strong>de</strong> coisa futura. <strong>Os</strong><strong>contratos</strong> <strong>de</strong> duração, por sua vez, tem como característica essencial o fato<strong>de</strong>, pelo menos uma das prestações não se exaurir <strong>de</strong> imediato, <strong>de</strong>mandandocerto lapso temporal. Po<strong>de</strong>m ser classificados como <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> execuçãocontinuada e <strong>de</strong> execução periódica, sendo neste a prestação realizada <strong>de</strong>forma pro<strong>longa</strong>da no tempo e naquele, também, <strong>de</strong>nominado <strong>de</strong> tratosucessivo, mediante repetições periódicas.


Po<strong>de</strong>-se dizer que o tempo integra a causa <strong>de</strong>stes <strong>contratos</strong>,sendo, portanto, seu elemento essencial. Se uma prestação po<strong>de</strong> ser prestada<strong>de</strong> uma só vez e as partes resolvem dividi-la no tempo, ter-se-á contrato <strong>de</strong>execução instantânea com execução diferida como na hipótese <strong>de</strong> vendarealizada por prestações.Na sistemática tradicional são encontradas diversas fórmulascontratuais que representam esta modalida<strong>de</strong> vinculada à <strong>longa</strong> duração,como a locação, o mútuo, o <strong>de</strong>pósito, entre outros.Assim, o tempo, nos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> duração não é suportado pelaspartes, mas, antes, por elas <strong>de</strong>sejado para que o contrato atinja os interessesque levaram as partes a firmá-lo.O cumprimento do objeto contratual, por exemplo, em umcontrato <strong>de</strong> assistência médica, requer a continuação da relação jurídicatravada entre as partes.O fornecimento <strong>de</strong> serviço contratado, portanto, <strong>de</strong>ve sepro<strong>longa</strong>r por um longo período, não havendo, quando da celebração doinstrumento, uma fixação <strong>de</strong> prazo para término no vínculo.Em face <strong>de</strong>sta característica, alguns aspectos são extremamenterelevantes para a apreensão do fenômeno.Tais <strong>contratos</strong> têm na irretroativida<strong>de</strong> dos efeitos já produzidos, aregra, até mesmo em caso <strong>de</strong> resilição restando preservados os efeitos jáproduzidos, diferentemente do que ocorre como os <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> execuçãoinstantânea, em que as partes retornam ao status quo ante, com a extinção <strong>de</strong>todos os efeitos contratuais.Por outro lado as obrigações das partes são renovadassucessivamente, sem que seja modificado seu conteúdo, porquanto seja a<strong>longa</strong> duração contratual interessante para ambos. Isto porqueExistem certas obrigações nas quais o adimplementosempre se renova sem que se manifeste alteração dodébito. Essas obrigações são mais ricas numa dimensão,no tempo, no elemento duradouro, o qual se relaciona coma essência do <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> prestação. As relaçõesobrigacionais simples vigem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a conclusão do negóciojurídico até o adimplemento; as duradouras são adimplidaspermanentemente e assim perduram sem que seja


modificado o conteúdo do <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> prestação, até o seutérmino pelo <strong>de</strong>curso do prazo, ou pela <strong>de</strong>núncia 39Dessa forma, o tempo é extremamente importante para esses<strong>contratos</strong>, pois permite que o fornecedor faça captação <strong>de</strong> recursos suficientese o consumidor goze dos serviços prestados a seu favor por um períodoseguro <strong>de</strong> tempo, gerando um longo processo <strong>de</strong> convivência entre oscontratantes.A satisfação da prestação buscada pelo consumidor que, porexemplo, se utiliza dos serviços <strong>de</strong> um plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> não altera o débito quese renova permanecendo o mesmo, conforme o objetivo do contrato.Este aspecto, contudo, traz à tona os problemas que otranscurso do tempo po<strong>de</strong> causar, refletindo na duração útil e justa do vínculocontratual. Não há dúvidas que qualquer contrato se forma e se <strong>de</strong>senvolvepara ser equilibrado, buscando-se, sempre, na medida do possível umaequivalência entre as prestações ajustadas, seja na gênese do pacto ou nomomento <strong>de</strong> sua execução.Ocorre que, pactos <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração estão sujeitos a eventuaismudanças das circunstâncias o que acaba por se exigir um constante <strong>de</strong>ver<strong>de</strong> readaptação e renegociação pelas partes para se manter o equilíbrio e atéa subsistência do contrato.A inserção <strong>de</strong> novas tecnologias e a conseqüente alteração docusto para manutenção do contrato e a superveniência <strong>de</strong> novas leisregulando a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvida são alguns exemplos sobre a alteraçãodas circunstâncias negociais.Ante tal situação <strong>de</strong>verão os contratantes encontrar soluçõespara a manutenção do pacto celebrado, baseadas, sempre na cooperaçãoentre eles <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> uma relação <strong>de</strong> confiança, na qual se espera ocumprimento do contrato por parte <strong>de</strong> ambos contratantes, <strong>de</strong>vendo serentendida como complexa a relação contratual.39 SILVA, Clóvis Veríssimo do Couto e. A obrigação como processo. São Paulo, Bushatsky.1976, p. 211.


No que concerne à insuficiência da interpretação tradicional dos<strong>contratos</strong>, Cláudia Lima Marques (2005, p.78)Uma vez que tais relações contratuais cativas po<strong>de</strong>m durar anos evisam, na maioria das vezes a transferência <strong>de</strong> riscos futuros ou osuprimento <strong>de</strong> uma necessida<strong>de</strong> futura, estabelecendo umverda<strong>de</strong>iro processo <strong>de</strong> convivência necessária entre a empresafornecedora <strong>de</strong> serviços e os consumidores, notou-se que a óticaescolástica tradicional, <strong>de</strong> uma análise estática e unitemporal darelação obrigacional <strong>de</strong> execução diferida ou contínua não maisoferecia respostas a<strong>de</strong>quadas.Impõe-se, assim, a utilização <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo que propicie asconstantes renegociações necessárias em uma relação <strong>de</strong> consumo,perenizada evitando-se abusos da posição contratual dominante prejuízossem causa ao contratante mais fraco, <strong>de</strong>vendo tal mo<strong>de</strong>lo basear-se em<strong>de</strong>veres <strong>de</strong> cooperação solidarieda<strong>de</strong> e lealda<strong>de</strong> que vão integrar a relaçãoem toda a sua duração, que <strong>de</strong>verá ser vista, assim, como um processo.3-2-3- A CATIVIDADE E O CLIENTE DEPENDENTEIntimamente ligado à perenida<strong>de</strong> da relação entre oscontratantes encontra-se o caráter <strong>de</strong> cativida<strong>de</strong> do contrato entendida como aposição <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência que os consumidores se <strong>de</strong>param em relação aofornecedor e à expectativa <strong>de</strong> satisfação da prestação.A cativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve ser compreendida em dois momentos.Inicialmente, ela é representativa das técnicas <strong>de</strong> marketing utilizadas antesda formação do contrato, <strong>de</strong> forma a convencer o contratante em relação àsconveniências da contratação. Trata-se <strong>de</strong> situação típica da socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>massa. O aparato <strong>de</strong> marketing que geralmente acompanha os <strong>contratos</strong><strong>cativos</strong> costuma ser muito incisivo e preparado para atingir diretamente avonta<strong>de</strong> dos <strong>de</strong>stinatários e garantir um número cada vez maior <strong>de</strong>contratações. Da mesma forma, o momento <strong>de</strong> execução <strong>de</strong>ssas práticas écuidadosamente escolhido, visando chegar ao consumidor quando este se


encontra <strong>de</strong>spreparado para resistir às tentações típicas da atual socieda<strong>de</strong><strong>de</strong> consumo 40 O fornecedor, por um lado cria e fomenta necessida<strong>de</strong>s para osconsumidores induzindo-o a celebrar <strong>contratos</strong> tidos como indispensáveis ou,no mínimo, extremamente <strong>de</strong>sejáveis e por outro se utiliza <strong>de</strong> técnicas paramantê-lo vinculado.São exemplos <strong>de</strong>stes <strong>contratos</strong> os <strong>contratos</strong> bancários, <strong>de</strong>seguro e planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, <strong>de</strong> assistência médica hospitalar, <strong>de</strong> previdênciaprivada, <strong>de</strong> cartão <strong>de</strong> crédito, <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> telefone, televisão a cabo,internet, além <strong>de</strong> serviços públicos básicos como <strong>de</strong> fornecimento <strong>de</strong> água, luze telefone.Referem-se, portanto, a serviços <strong>de</strong> fundamental importânciaque fazem parte da vida cotidiana contemporânea assegurando o acesso aestes serviços um futuro seguro, como no caso dos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> plano <strong>de</strong>saú<strong>de</strong> ou a maximização dos potenciais <strong>de</strong> trabalho e lazer, como nos<strong>contratos</strong> <strong>de</strong> internet, educação e televisão a cabo.A cativida<strong>de</strong>, portanto, tem este caráter <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência,conforme, Cláudia Lima Marques:Esta posição <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência ou, como aqui estamos<strong>de</strong>nominando, <strong>de</strong> “cativida<strong>de</strong>”, só po<strong>de</strong> ser entendida no exame docontexto das relações atuais, on<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminados serviçosprestados no mercado asseguram (ou prometem) ao consumidor esua família “status”, “segurança”, “crédito renovado”, “escola ouformação universitária certa e qualificada”, “ moradia assegurada”ou mesmo “saú<strong>de</strong>” no futuro.Destarte, não obstante a contribuição periódica do consumidor edos longos anos <strong>de</strong> vínculo, o fornecedor não mais o consi<strong>de</strong>ra relevante à40 XAVIER, José Ta<strong>de</strong>u Neves. Reflexões sobre os <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração,Estudos Jurídicos, vol. 37 n° 99 JAN/ABR 2004 dispo nível emHTTP://www.unisinos.br/publicações_cientificas/images/stories/pdf_estjuridicos/edicoes_anteriores/vol37n99/vol37n99_artigo02.pdf


sua ambição <strong>de</strong> lucro e tenta romper uma relação que outrora foi apresentadacomo imprescindível à sua segurança, tranqüilida<strong>de</strong> e status.Sendo a referida conduta por parte do fornecedor um paradoxocom o próprio ato <strong>de</strong> seduzir o consumidor a usufruir dos seus serviços, há acomprovação <strong>de</strong> que existe a urgência <strong>de</strong> proteção dos sujeitos em<strong>de</strong>svantagem, para assim serem reequilibradas as forças envolvidas narelação.O consumidor, portanto, é premido por necessida<strong>de</strong>s antesinexistentes ou inexploradas. A contemporaneida<strong>de</strong> exige a aquisição <strong>de</strong>certos serviços essenciais, ou <strong>de</strong> relativa essencialida<strong>de</strong>, para o pleno<strong>de</strong>senvolvimento do potencial humano <strong>de</strong> cada um em socieda<strong>de</strong>Adotando-se o atendimento <strong>de</strong> Teresa Negreiros, po<strong>de</strong>-se,também, apontar que tais <strong>contratos</strong> referem-se à prestação <strong>de</strong> serviçosconsi<strong>de</strong>rados essenciais no mundo contemporâneo. Para a autora,À luz do <strong>de</strong>nominado paradigma da essencialida<strong>de</strong>,propõe-se que a utilida<strong>de</strong> existencial do bem contratadopasse a ser um critério juridicamente relevante no examedas questões contratuais. O paradigma da essencialida<strong>de</strong>sintetiza uma mudança no modo <strong>de</strong> se conceber osprincípios do contrato, traduzindo a superação <strong>de</strong> umaconcepção predominantemente patrimonialista esocialmente neutra do fenômeno contratual 41Ressalva a autora, porém, queo critério da utilida<strong>de</strong> do bem, avaliada esta em relação àpessoa – e não ao bem principal a que o acessório estejavinculado -, constitui um caminho nesta busca por soluçõesconcretas que, no âmbito do <strong>direito</strong> contratual, alcancemum meio termo justo em face da dialética tensão entreautonomia e autorida<strong>de</strong> 42Enfim, conforme escreve José Ta<strong>de</strong>u Xavier, “o contrato cativo<strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração, uma vez estabelecido, passa a fazer parte da vida doconsumidor, <strong>de</strong> forma inseparável, <strong>de</strong> forma extremamente significativa para o41 NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas/ Teresa Negreiros – 2ª ed. –Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 2006, p.388.42 NEGREIROS, p.388.


seu convívio em socieda<strong>de</strong>” 43 .Seria, assim, “seu ponto <strong>de</strong> segurança paraenfrentar as intempéries da vida, tornando-se uma necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> extremaimportância, inclusive para sua realização pessoal” 44Cite-se, por exemplo, o contrato que tenha em seu objeto aocorrência <strong>de</strong> um evento futuro certo ou incerto, como nos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> plano<strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Para se atingir o objetivo almejado existirá uma relação <strong>de</strong>convivência e <strong>de</strong>pendência entre consumidor e fornecedor por anos, com opagamento das contribuições ajustadas, chegando-se a um estágio em quenão mais interessa ao consumidor romper a relação contratual.Note-se que, não raramente, este caráter <strong>de</strong> essencialida<strong>de</strong> ésuscitado em <strong>de</strong>cisões jurispru<strong>de</strong>nciais que reconhecem a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>rompimento do vínculo contratual, em razão da situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência doconsumidor, como no acórdão proferido pelo Tribunal <strong>de</strong> Justiça do RioGran<strong>de</strong> do Sul 45 que, julgando apelação interposta por segurada <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong>vida e <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes pessoais, reconheceu à consumidora o <strong>direito</strong> <strong>de</strong>manutenção das condições do contrato, nos termos, inicialmente, ajustados eque já havia sido renovado, anteriormente. Vedou o reajuste do valor doprêmio pela operadora, consi<strong>de</strong>rando-o abusivo, mesmo na hipótese <strong>de</strong> sebasear em norma expedida pela SUSEP órgão regulador da ativida<strong>de</strong>.Segue, assim, a ementa do acórdão, que reformou a <strong>de</strong>cisãoproferida em primeira instância:APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE SEGURO, CLÁUSULACONTRATUAL. RENOVAÇÃO ANUAL AUTOMÁTICA.RESILIÇÃO UNILATERAL. NOVA PROPOSTA. CONDIÇÕESMAIS DESVANTAJOSAS. ABUSIVIDADE.43 XAVIER, José Ta<strong>de</strong>u Neves. Reflexões sobre os <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração,Estudos Jurídicos, vol. 37 n° 99 JAN/ABR 2004 dispo nível emHTTP://www.unisinos.br/publicações_cientificas/images/stories/pdf_estjuridicos/edicoes_anteriores/vol37n99/vol37n99_artigo02.pdf44 XAVIER, 2004.45 Brasil, Tribunal <strong>de</strong> Justiça do Rio Gran<strong>de</strong> Do Sul. Decisão no Recurso <strong>de</strong> Apelação Cível n°70019220557, Sexta Câmara Cível, Apelante: Lydia Rivera Valente. Apelada: SulaméricaSeguros <strong>de</strong> Vida e Previdência S.A. Relator: Des. Tasso Caubi Soares Delabary. Julgamentoem 09/10/2008. Disponível em http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris.


É abusiva a conduta da seguradora que propõe novacontratação do seguro em condições mais <strong>de</strong>sfavoráveis aosegurado, <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> renovar o contrato originário a pretexto<strong>de</strong> termino do prazo contratual, <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rando a naturezada avença que é <strong>de</strong> trato sucessivo e curso pro<strong>longa</strong>do,conhecido como “<strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong>”. Cobrança do prêmio combase no contrato originário mediante emissão <strong>de</strong> documento<strong>de</strong> cobrança.A operadora alegou, em <strong>de</strong>fesa, que o contrato não é vitalício eque há previsão bilateral <strong>de</strong> resilição, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que com aviso prévio; que arenovação automática ou tácita, no caso, é vedada pelo art. 774 do CódigoCivil 46e que o reenquadramento da carteira <strong>de</strong> segurados <strong>de</strong>correu do<strong>de</strong>sequilíbrio atuarial pela elevação do risco em face do aumento da faixaetária, ônus que estava sendo suportado exclusivamente por ela.Enten<strong>de</strong>u o relator, sendo seguido pelos <strong>de</strong>mais<strong>de</strong>sembargadores, que, por ser o contrato <strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida, um contratocativo <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração, pressupõe reiteradas renovações para permanecervigente, uma vez que é pautado pela duração da vida do segurado. Assim,constou em seu voto:E continuou:É bem verda<strong>de</strong> que ninguém, <strong>de</strong> boa-fé, contrata um seguro<strong>de</strong> vida pensando em utilizá-lo no mês seguinte, sendo certoque o segurado não tem a expectativa <strong>de</strong> falecer no mesmoano da contratação, mas <strong>de</strong> ter a continuida<strong>de</strong> do seguro porsucessivos anos. Assim, é possível perceber que o contrato<strong>de</strong> seguro <strong>de</strong> vida tem sim o caráter <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong>.Esta a orientação que teve o contrato primeiro firmado entreas partes e que embora limitado no tempo previa cláusula <strong>de</strong>renovação automática, que a <strong>de</strong>mandada preten<strong>de</strong> alterar,chamando a si a <strong>de</strong>nunciação unilateral do contrato apretexto <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r disposições normativas do órgãoregulador da ativida<strong>de</strong> securitária.Entretanto, referidas normativas da SUSEP não po<strong>de</strong>mprepon<strong>de</strong>rar frente ao <strong>direito</strong> adquirido e ao ato jurídicoperfeito, mormente levando em conta a natureza do contrato<strong>de</strong> seguro que conforme já visto é <strong>de</strong> duração pro<strong>longa</strong>da e abrecha aberta por ditas alterações, que em verda<strong>de</strong> visam é aproteção do contratante-segurado, não po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>svirtuar amens legis exatamente para prejudicar o <strong>direito</strong> do segurado.46 Dispõe o artigo art. 774 do Código Civil: “A recondução tácita do contrato pelo mesmoprazo, mediante expressa cláusula contratual, não po<strong>de</strong>rá operar mais <strong>de</strong> uma vez” (BRASIL,Código Civil, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm


Por fim, impen<strong>de</strong> ressaltar a reserva feita pela doutrina aocaráter <strong>de</strong> cativida<strong>de</strong> atribuído aos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração.Assim, a crítica feita por Ronaldo Porto Macedo Júnior:É por tal motivo que a afirmação <strong>de</strong> que este tipo <strong>de</strong>contrato <strong>de</strong> longo prazo é necessariamente um “contratocativo” me parece ser excessiva e imprópria para <strong>de</strong>screveros <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração e ainda mais para <strong>de</strong>screveros <strong>contratos</strong> relacionais, visto que a cativida<strong>de</strong> é umresultado possível mas não necessário da nova naturezadas relações contratuais <strong>de</strong> consumo <strong>de</strong> longo prazo ou,como prefiro caracterizá-las, <strong>de</strong> caráterrelacional.Evi<strong>de</strong>ntemente o “cliente preferencial” ou “VIP”<strong>de</strong> um banco é um consumidor po<strong>de</strong>roso pelo fato mesmo eser preferencial e supostamente representar bons negóciosou a expectativa <strong>de</strong>les (tanto do ponto <strong>de</strong> vista estritamenteeconômico como do ponto <strong>de</strong> vista da ampliação <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r)para o banco. É trivial dizer que isto é resultante <strong>de</strong> suaposição social, política e econômica que o torna umconsumidor influente e pouco ou nada hipossuficiente. 47Não parece, vingar, porém, a tese, eis que, ainda, que oconsumidor <strong>de</strong>tenha tal parcela <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, esta estará, com certeza, inseridano custo calculado pela instituição financeira ao disponibilizar tais tipos <strong>de</strong>produtos.4- TEMPO E EQUILÍBRIO NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS –ALTERAÇÕES DAS CIRCUNSTÂNCIAS NEGOCIAISComo visto, a gran<strong>de</strong> questão relacionada aos <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong><strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração diz respeito à possível alteração nas circunstânciasnegociais, ocasionando a necessida<strong>de</strong> ou pretensão das partes <strong>de</strong> reverem opactuado para o restabelecimento do equilíbrio contratual.Não se discute que qualquer contrato se forma e se <strong>de</strong>senvolvepara ser equilibrado <strong>de</strong>vendo ser mantida a parida<strong>de</strong> entre as partescontratantes. Ocorre que, pactos com a presença das características acimaexpostas, estarão sujeitos a eventuais mudanças <strong>de</strong> circunstâncias, o que47 MACEDO Jr. Ronaldo Porto. Contratos Relacionais e <strong>de</strong>fesa do consumidor.2ed. SãoPaulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.


acaba por se exigir um <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> adaptação ou <strong>de</strong> renegociação entre osagentes, para o fim <strong>de</strong> manter seu equilíbrio e, até, mesmo sua subsistência.Em tais <strong>contratos</strong>, é, <strong>de</strong> fato, difícil prever todos e quaisquereventos que possam resultar em contingências que venham a incidir sobre asrespectivas prestaçõesA <strong>de</strong>svalorização da moeda, a perda ou alteração do significadodo objeto contratual, as inovações tecnológicas, a superveniência <strong>de</strong> novasleis e outras séries <strong>de</strong> circunstâncias provocarão, nestes <strong>contratos</strong>, mudançasque po<strong>de</strong>m levá-los a uma situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>sequilíbrio.Há, assim, uma impossibilida<strong>de</strong> da previsão e especificação comclareza <strong>de</strong> efeitos e <strong>de</strong> eventos futuros que po<strong>de</strong>m alterar o equilíbrio inicial.Haverá uma pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fatores que vão <strong>de</strong>mandar das partesum <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> renegociação buscando-se a manutenção do equilíbriocontratual, <strong>de</strong>mandando, para isto, uma leitura dinâmica da execuçãocontratual, distinta do que foi concebido pela teoria clássica do contrato. Frutodo voluntarismo e do consensualismo, esta trata a relação contratual comomovimento uniforme, consi<strong>de</strong>rando justo aquele contrato celebrado por forçada livre apreciação pelas partes <strong>de</strong> seus respectivos interesses. Assim, a idéianorteadora dos princípios clássicos está ligada à estabilida<strong>de</strong> e permanênciadas circunstâncias contratuais.A continuida<strong>de</strong> e a <strong>longa</strong> duração dos <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong>requerem, porém, uma regulação constante da parida<strong>de</strong> entre os contratantes,tanto pela perenida<strong>de</strong> da relação quanto pela natureza do objeto contratado.4-1- A TEORIA DA IMPREVISÃO E DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICONão há dúvida que o cumprimento dos <strong>contratos</strong> baseados nopacta sunt servanda é fundamental para qualquer organização social. Contudoos pactos celebrados estão sujeitos a vicissitu<strong>de</strong>s que po<strong>de</strong>rão afetar tantosua valida<strong>de</strong> quanto sua eficácia 48 . Em relação a esta última a alteração48 Po<strong>de</strong>-se se dizer que os dois momentos para a análise do equilíbrio entre as prestaçõessão na formação do contrato, sua chamada fase genética, em que importa a análise da


posterior das circunstâncias po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>terminar a frustração do fim do contratoou a quebra <strong>de</strong> sua equivalência.. Não se nega que o intérprete po<strong>de</strong>, ainda, se valer parasolucionar a questão <strong>de</strong> institutos já, há muito, disponibilizados peloor<strong>de</strong>namento que, conformados pelos princípios da boa-fé, da confiança, dafunção social do contrato, trarão mecanismos para a garantia da execuçãocontratual.Tais mecanismos são, em regra, baseados na teoria da cláusularebus sic stantibus, <strong>de</strong> origem medieval, segundo a qual em um contrato <strong>de</strong>duração ou <strong>de</strong> execução diferida, as partes só permanecerão vinculadas aopactuado, se mantidas as condições da época da contratação.Em razão do i<strong>de</strong>ário revolucionário do século XVIII queprimavam pelo cumprimento da palavra dada e, por conseguinte, pela forçaobrigatória dos <strong>contratos</strong>, a jurisprudência, por um tempo, afastou-se <strong>de</strong>steprincípio.A relação contratual era tratada, então, como movimento estáticoe uniforme, prevalecendo a noção <strong>de</strong> que se a avença resultou da livremanifestação e apreciação dos interesses pelos agentes, o contrato seriasempre justo.Já no final do século XIX e, principalmente, no início do séculoXX, em razão das transformações imprevistas e imprevisíveis ocasionadaspela gran<strong>de</strong> Guerra foram <strong>de</strong> tal or<strong>de</strong>m que se mostrou impossível amanutenção <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> comutativos <strong>de</strong> trato sucessivo ou <strong>de</strong> execuçãocontinuada, sem qualquer revisão, ante a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> enriquecimento <strong>de</strong>um dos contratantes à custa da ruína do outro..valida<strong>de</strong> do negócio jurídico e sua fase funcional ou <strong>de</strong> execução, quando as partes <strong>de</strong>verãocumprir as obrigações pactuadas.


Nesse contexto, surge a primeira lei francesa <strong>de</strong> revisão dos<strong>contratos</strong> Trata-se da Lei Failliot <strong>de</strong> 21 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1918 49 , e a cláusula rebussic stantibus <strong>de</strong>sponta sob uma nova roupagem por meio <strong>de</strong> teorias ligadas àteoria da imprevisão 50 , pelas quais se buscava mecanismos para a revisãodos preceitos contidos em uma relação contratual, em face da ocorrência <strong>de</strong>acontecimentos novos, imprevisíveis pelas partes e a elas não imputáveisadaptando-se a cláusula rebus sic stantibus, ao <strong>direito</strong> mo<strong>de</strong>rno.Segundo Ruy Rosado Aguiar, “A primeira reação ao princípio dain<strong>de</strong>rrogabilida<strong>de</strong> dos <strong>contratos</strong> por efeito <strong>de</strong> fatos novos veio <strong>de</strong> Windscheidque, em 1850, lançou a teoria da pressuposição, segundo a qual o contratantese obriga com a certeza da permanência <strong>de</strong> uma situação ou da ocorrência eum fato sem o qual não teria contratado” 51A teoria da pressuposição típica, por sua vez, é atribuída aPisko, pela qual há uma situação <strong>de</strong> fato, geralmente pressuposta em todonegócio jurídico da classe que é celebrado, não <strong>de</strong>vendo as obrigaçõesperdurare, se circunstâncias anormais modificarem a situação <strong>de</strong> fatopressuposta por todas as pessoas que celebraram o contrato, ressaltando-seque tais contingências não se referem à situação patrimonial do <strong>de</strong>vedor.Já a teoria da condição implícita criada pelo <strong>direito</strong> inglês refereseà orientação seguida pelo juiz, em casos nos quais, a execução do contrato49 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso <strong>de</strong> <strong>direito</strong> civil, volume IV: <strong>contratos</strong>, tomo 1: teoriageral/Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho, 2 ed. São Paulo Saraiva, 2006,p.26550 Segundo César Fiúza, “Dos vários autores que tratam do assunto, nenhum traz respostasegura a respeito da correta localização e dos contornos da teoria ou das teorias daimprevisão. Ora se fala em teoria da imprevisão como doutrina autônoma, ora a ela se referecomo gênero, ao qual pertenceriam várias doutrinas, tais como a da condição implícita, a dabase negocial objetiva e outras. A nós parece ser mais correta a segunda posição, que toma ateoria da imprevisão como gênero, sendo espécies suas <strong>de</strong>mais teses, inclusive a própriadoutrina da cláusula rebus sic stantibus. Isto porque, analisando <strong>de</strong>tidamente cada uma dasteorias revisionistas, não se lhes po<strong>de</strong> negar, quando nada, um quê <strong>de</strong> imprevisibilida<strong>de</strong> quetodas supõem como fundamento para a revisão dos <strong>contratos</strong>” (FIÚZA, César. Direito Civil:Curso Completo, 8 ed., Del Rey, Belo Horizonte, 2004, p. 387)51 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado <strong>de</strong>. Extinção dos <strong>contratos</strong> por incumprimento do <strong>de</strong>vedor/Ruy Rosado <strong>de</strong> Aguiar Júnior. Rio <strong>de</strong> Janeiro. AIDE Editora, 2004, p. 144.


não <strong>de</strong>ve ser exigida pela superveniência <strong>de</strong> fatos que impe<strong>de</strong>m seja aprestação cumprida.A teoria da base do negócio jurídico, atribuída a Oertman refereseà representação mental <strong>de</strong> uma das partes <strong>de</strong> um contrato, conhecida eadmitida pela outra, ou a comum representação das duas sobre a existênciaou o aparecimento <strong>de</strong> certas circunstâncias que condicionam a vonta<strong>de</strong>negocial. Assim, segundo Ennecerus, “Por base do negócio, a esses efeitos,se há enten<strong>de</strong>r as representações dos interessados ao tempo da conclusãodo contrato, sobre a existência <strong>de</strong> certas circunstâncias básicas para sua<strong>de</strong>cisão, no caso <strong>de</strong> que essas representações não hajam sido conhecidasmeramente, senão constituídas, por ambas as partes, em base do contrato,como, por exemplo, a igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> valor, em princípio, <strong>de</strong> prestação e contraprestaçãonos <strong>contratos</strong> bilaterais (equivalência), a permanência aproximadado preço convencionado, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> repor a provisão das mercadoriase outras circunstâncias semelhantes. A fundamentação, que se apóia no<strong>de</strong>feito da base do negócio faz possível satisfazer a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um <strong>direito</strong><strong>de</strong> resolução não só nos casos em que as bases econômicas do negócio<strong>de</strong>saparecem, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma alteração posterior das circunstâncias,senão também, naqueles em que, <strong>de</strong> antemão, essas bases não existem” 52Já Larenz distingue a base do negócio jurídico em subjetiva eobjetiva. Para ele, a base objetiva do negócio jurídico diz respeito àscircunstâncias existentes quando da celebração do contrato e durante suaexecução e, que pelas quais são satisfeitas as expectativas das partes,durante a execução contratual, ainda que, <strong>de</strong>las não tivessem consciência, oque, ao contrário, ocorre na teoria subjetiva. Com a alteração <strong>de</strong>stascircunstâncias, discute-se a possibilida<strong>de</strong> da parte prejudicada por um<strong>de</strong>sequilíbrio do contrato, pleitear sua resolução ou readaptação.Assim, a base objetiva do negócio é “o conjunto <strong>de</strong>circunstâncias e o estado geral das coisas, cuja existência ou subsistência é52 APUD AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado <strong>de</strong>. Extinção dos <strong>contratos</strong> por incumprimento do<strong>de</strong>vedor/ Ruy Rosado <strong>de</strong> Aguiar Júnior. Rio <strong>de</strong> Janeiro. AIDE Editora, 2004, p. 145.


objetivamente necessária para que o contrato, segundo o significado dasintenções <strong>de</strong> ambos os contratantes, possa subsistir como regulação dotada<strong>de</strong> sentido” 53 Segundo César Fiúza:A supressão da base objetiva do negócio é, especialmente,mas não, exclusivamente, importante em dois grupos <strong>de</strong>casos: o do <strong>de</strong>sequilíbrio das prestações e o da frustraçãodo motivo do contrato. Po<strong>de</strong>-se falar em verda<strong>de</strong>iro<strong>de</strong>sequilíbrio das prestações, quando, em razão <strong>de</strong> umaalteração imprevista num contrato bilateral, as obrigaçõesse tornam ‘grosseiramente <strong>de</strong>sproporcionais’; quando nem<strong>de</strong> longe ocorre a proporcionalida<strong>de</strong> aproximada dasprestações supostas pelas partes.A razão para um tal <strong>de</strong>sequilíbrio po<strong>de</strong> ser encontrada na<strong>de</strong>preciação monetária, na mudança da legislação ou emcircunstâncias políticas.A base do negócio jurídico subjetiva, por sua vez, guarda relaçãocom a representação mental <strong>de</strong> um, ou <strong>de</strong> ambos os contratantes. Estaria,assim, ligada aos motivos que não <strong>de</strong>vem ser levados em conta ou à teoria doerro, ou da invalida<strong>de</strong> por erro, se as duas partes se <strong>de</strong>ixarem levar porpressuposições incorretas.Por fim, parece não haver dúvida que não será possível arevisão ou resolução do negócio pela quebra <strong>de</strong> sua base objetiva, se o riscofor a ele imanente. 54Esta noção <strong>de</strong> risco é citada por Menezes Cor<strong>de</strong>iro ao tratarteoria do risco. Segundo o autor português, a noção <strong>de</strong> risco é ínsita aqualquer contrato, masExistiria um perigo da comunida<strong>de</strong>: causado por fatores naturais ouhumanos – máxime pelo Estado pelas guerras, medidaseconômicas ou outras vias, tornando-se, assim, o maior fator atual<strong>de</strong> perigo – ele atingiria, <strong>de</strong> modo indiscriminado, gran<strong>de</strong>s grupos.Po<strong>de</strong>r-se-ia, neste caso, falar da ‘gran<strong>de</strong> base do negócio. Esta53 LARENZ, Base <strong>de</strong>l negocio jurídico. Revista <strong>de</strong> Derecho Privado, p. 22454 Assim, Clóvis Couto e Silva, citando Siebert: “Por fim, para que se possa argüir o princípio<strong>de</strong> equivalência anteriormente, aludida, em se tratando <strong>de</strong> perda da base objetiva do negócioé preciso que não se trate <strong>de</strong> contrato aleatório, <strong>de</strong> especulação, ou daqueles em que o riscoé imanente à empresa” (COUTO E SILVA, Clóvis do. A obrigação como processo. São Paulo:Bushatsky, 1976. p. 135)


possibilitaria um juízo <strong>de</strong> valor jurídico-político que, vendo ser umainjustiça a imposição final do dando, sofrido no âmbito <strong>de</strong> um perigocomunitário, sobre apenas uma das partes, <strong>de</strong>terminaria a suadistribuição também pela outra 55Tem-se, assim, uma idéia <strong>de</strong> repartição <strong>de</strong> riscos, bem como aimpossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se buscar a resolução ou revisão do negócio em razão <strong>de</strong>fato <strong>de</strong>corrente do próprio risco do negócio.Registre-se que, em <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> execução imediata, como umcontrato <strong>de</strong> compra e venda, questão do risco é, mais facilmente, resolvidaficando em regra a cargo do proprietário, dispondo o Código Civil em seuartigo 492 que, até o momento da tradição, o ven<strong>de</strong>dor assume os riscos dacoisa enquanto o comprador assume os do preço. 564-2- A BOA-FÉ COMO NORTEADORA DO RESTABELECIMENTO DOEQUILÍBRIO CONTATUALAnalisando todas as doutrinas citadas, outra conclusão, não hásenão, que a revisão do conteúdo dos <strong>contratos</strong> está em consonância com a<strong>de</strong>vida consi<strong>de</strong>ração das legítimas expectativas das partes, buscando umretorno ao programa contratual que fora quebrado em <strong>de</strong>corrência do advento<strong>de</strong> circunstâncias supervenientes e imprevisíveis.A busca pelo restabelecimento da base funcional ligada à trocaeconômica <strong>de</strong>verá ser feita, no contrato <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração, enfim, mediante ainterpretação do negócio, com o exame das <strong>de</strong>clarações e do comportamentodas partes, com base no princípio da boa-fé, e privilegiando-se a idéia <strong>de</strong>vínculo obrigacional como um processo voltado à satisfação dos interessesdas partes prevalecendo a noção <strong>de</strong> dinamicida<strong>de</strong> do vínculo:..a inovação, que permitiu tratar a relação jurídica como umatotalida<strong>de</strong>, realmente orgânica, que permitiu tratar a relação jurídicacomo uma totalida<strong>de</strong>, realmente orgânica veio do conceito <strong>de</strong> vínculo55 MENEZES CORDEIRO, Antônio Manuel da Rocha e. Da boa-fé no Direito Civil, LivrariaAlmedina, Coimbra, 1984, p. 1059.56 “Art. 492. Até o momento da tradição, os riscos da coisa correm por conta do ven<strong>de</strong>dor, e osdo preço por conta do comprador.” (BRASIL, Código Civil. Disponível emhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm)


como uma or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> cooperação, formadora <strong>de</strong> uma unida<strong>de</strong> que nãose esgota na soma dos elementos que a compõem 57Neste contexto, por meio <strong>de</strong> uma interpretação integradora,<strong>de</strong>vem ser analisadas as <strong>de</strong>clarações e o comportamento das partes e aconfiança <strong>de</strong>spertada, com a utilização <strong>de</strong> regras <strong>de</strong> interpretação objetiva,buscando-se a necessária estabilida<strong>de</strong> e segurança que se <strong>de</strong>vem revestir asrelações obrigacionais, por meio da análise do conjunto das <strong>de</strong>clarações, doobjetivo das partes e das circunstâncias em que se praticou o ato.Em relação às <strong>de</strong>clarações, <strong>de</strong>ve prevalecer a vonta<strong>de</strong><strong>de</strong>clarada, já que, ainda que não se <strong>de</strong>scarte a investigação da vonta<strong>de</strong> real,este <strong>de</strong>sejo íntimo não é gerador <strong>de</strong> obrigações. Segundo Francisco Amaral,“O ponto <strong>de</strong> vista objetivo ou <strong>de</strong>clarativista relega a segundo plano a intençãodo agente. Interessa-lhe não essa intenção mas a vonta<strong>de</strong> concreta,objetivada, como foi <strong>de</strong>clarada, ou como se <strong>de</strong>duz das circunstâncias objetivasdo caso” 58Será válida, então, a <strong>de</strong>claração, conforme a confiança<strong>de</strong>spertada na contraparte, que é seu <strong>de</strong>stinatário. E será a boa-fé pauta <strong>de</strong>interpretação contratual integradora. Conforme Larenz:Para a «interpretação contratual integradora», que então há-<strong>de</strong> terlugar, são <strong>de</strong>cisivos o contexto global do contrato, um escopo docontrato reconhecido por ambas as partes e a situação <strong>de</strong> interesses,tal como foi configurada por cada uma das partes, no sentido <strong>de</strong> umjusto equilíbrio <strong>de</strong> interesses. Por isso, a lei menciona o princípio da«boa fé»(§ 157 do BGB) como pauta da interpretação contratualintegradora. Nestes termos, a regulação acordada pelas partes há <strong>de</strong>interpretar-se, sempre que assim o permitam a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> ambasas partes num sentido que seja, tanto quanto possível, justo paraambas. 59Note-se que a boa-fé <strong>de</strong>ve ser entendida como princípio geral do<strong>direito</strong>, sendo, por isso acolhida universalmente pelos povos civilizados e57 COUTO E SILVA, Clóvis do. A obrigação como processo. São Paulo: Bushatsky, 1976. p. 8.58 AMARAL, Francisco AMARAL, Francisco. Direito Civil: introdução/Francisco Amaral – 7.ed.ver., at. E aum. – Rio <strong>de</strong> Janeiro:Renovar, 2008, p. 43159LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito, 1991 (original AlemãoMETHODENLEHRE DER RECHTSWISSENSCHAFT, 1991, Springer Verlag Berlin 1991, p.423


vigorando, mesmo que não tenha previsão expressa no or<strong>de</strong>namento jurídicopositivo.E tal princípio não só representa limite aos exercícios dos<strong>direito</strong>s, mas faz nascerem normas <strong>de</strong> conduta, a serem seguidas durante oprograma contratual.Necessário, será, então, para se examinar a equivalência dasprestações durante todo o tempo <strong>de</strong> contrato levar-se em conta não só os<strong>de</strong>veres principais, mas os chamados <strong>de</strong>veres acessórios ou laterais, para quese alcance o equilíbrio <strong>de</strong>sejado, no sentido <strong>de</strong> se alcançar sua finalida<strong>de</strong>,qual seja, a circulação <strong>de</strong> riquezas, <strong>de</strong> forma justa.Assim, conforme Ruy Rosado Aguiar Júnior “a teoria daimpossibilida<strong>de</strong> superveniente, assim como regulada nos Códigos, aplica-se adiversas situações criadas por modificação posterior, ensejando a quebra docontrato. O próprio princípio venire contra factum proprium po<strong>de</strong> servir paraexplicar em alguns casos, o fenômeno da modificação, <strong>de</strong>tectando-secontradição entre o comportamento da contraparte ao tempo da celebração,gerador da confiança na base da qual o negócio foi assumido e ocomportamento diverso atual” 60Necessário será, enfim, uma interpretação contratual integradorapor parte do juiz, consi<strong>de</strong>rando as <strong>de</strong>clarações das partes, em um sentido queseja, justo para ambas, com base, sempre na confiança <strong>de</strong>spertada esegundo as estipulações usadas no tráfego negocial. Segundo Larenz:A regulação contratual é sempre, na verda<strong>de</strong>, uma regulação«justa», na medida em que tenha sido acordada pelos interessados,«livremente», sem coacção, mas, na medida em que <strong>de</strong>ixe espaçopara uma interpretação, esta há <strong>de</strong> realizar-se com vista à medidada «justiça contratual» aqui possível. Para efeito, não <strong>de</strong>verácertamente o juiz pôr as sua próprias pautas <strong>de</strong> valoração no lugardas das partes do contrato. O juiz está, na interpretação docontrato, vinculado às bases <strong>de</strong> valoração aceite pelas partes, se é60 AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado <strong>de</strong>. Extinção dos <strong>contratos</strong> por incumprimento do <strong>de</strong>vedor/Ruy Rosado <strong>de</strong> Aguiar Júnior. Rio <strong>de</strong> Janeiro. AIDE Editora, 2004, p. 147.


que a sua acitivida<strong>de</strong> haja ainda <strong>de</strong> continuar a ser interpretação docontrato 61Com esta ativida<strong>de</strong> integradora, <strong>de</strong>ve se buscar a garantia <strong>de</strong>uma equivalência material, no sentido <strong>de</strong> se garantir uma justa proporçãoentre as prestações, <strong>de</strong> uma forma objetiva.Tratando-se <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> comutativos, esta equivalência é maisfacilmente atingida, sendo inclusive verificável pelos contratantes, tornando-semais complexo nos <strong>contratos</strong> da natureza aqui estudada, principalmente a seconsi<strong>de</strong>rar que <strong>de</strong>ve ser pretendida <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fase pré-contratual, passandopela fase <strong>de</strong> execução do contrato, até atingir sua fase pós-contratual,incluindo-se, aí, os <strong>contratos</strong> aleatórios.E para se atingir este fim, valores como liberda<strong>de</strong>, justiçacontratual <strong>de</strong>verão ser pon<strong>de</strong>rados, mediante um juízo <strong>de</strong> razoabilida<strong>de</strong>, nãotendo espaço, em razão <strong>de</strong>ste último, para arbitrarieda<strong>de</strong>s. Assim conformeLuiz Roberto Barroso:sustenta que[...] é razoável o que seja conforme à razão, supondo equilíbrio,mo<strong>de</strong>ração e harmonia; o que não seja arbitrário ou caprichoso; oque corresponda ao senso comum, aos valores vigentes em dadoou lugar 62Sobre a questão, da equivalência material Teresa Negreiros,[...] no domínio das relações contratuais, a concepção <strong>de</strong> justiça,outrora formulada em termos <strong>de</strong> autonomia e liberda<strong>de</strong>, altera-seprofundamente à luz do equilíbrio econômico. Em lugar daliberda<strong>de</strong>, ressalta o valor social da parida<strong>de</strong> e do equilíbrio, que,conforme se procurou <strong>de</strong>monstrar acima, aproxima a justiçacontratual <strong>de</strong> uma certa tradição filosófica que consi<strong>de</strong>ra a regra dajustiça uma regra <strong>de</strong> distribuição paritária, proporcional e, nestamedida, uma regra, em todos seus sentido e projeções sociaisTal entendimento parece pecar, porém, no que diz respeito aoprincípio da liberda<strong>de</strong>, na medida em que, ainda que não mais reinante como61LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito, 1991 (original AlemãoMETHODENLEHRE DER RECHTSWISSENSCHAFT, 1991, Springer Verlag Berlin 1991, p.42362 Apud BRITO, Rodrigo Toscano <strong>de</strong>. Equivalência material dos <strong>contratos</strong> - civis, empresariaise <strong>de</strong> consumo. São Paulo: Saraiva, 2007, p.12.


outrora, ainda <strong>de</strong>ve ser assegurada, tendo a interpretação contratual comofim, garantir-se esta liberda<strong>de</strong>, assegurando, satisfação da vonta<strong>de</strong> daspartes, por meio <strong>de</strong> critérios objetivos, baseados na eticida<strong>de</strong> e cooperação,ou seja, fundado na boa-fé objetiva.Em sua interpretação <strong>de</strong>verá, assim, estar atento, para osignificado <strong>de</strong> três palavras fundamentais: “equilíbrio”, equivalência” e“igualda<strong>de</strong>”5-SUPERVENIÊNCIA DAS LEIS DURANTE OS CONTRATOSComo visto, o Estado, buscando garantir o exercício da livreiniciativa e coibir o abuso do exercício da autonomia da vonta<strong>de</strong> nos <strong>contratos</strong>,interveio na or<strong>de</strong>m econômica. Seja pela tutela específica do consumidor oudo trabalhador, seja pela regulação do mercado imobiliário, do mercadofinanceiro e <strong>de</strong> capitais, pela repressão ao abuso econômico, o Estado se fazpresente, pela edição <strong>de</strong> normas que acabam por influenciar nos pactoscelebrados pelos agentes econômicos gerando um fator contingencial capaz<strong>de</strong> ocasionar não só a limitação da liberda<strong>de</strong> contratual, mas a mitigação daintangibilida<strong>de</strong> dos pactos e não raramente, <strong>de</strong>sequilíbrio nas avenças feitas.É fato que as leis <strong>de</strong>vem acompanhar a evolução dasnecessida<strong>de</strong>s sociais e econômicas, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong>, tendo olegislador, ao regular as relações jurídicas, como missão, tentar garantir aobservância <strong>de</strong>stes valoresPor outro lado, a estabilida<strong>de</strong> das relações jurídicas <strong>de</strong>ve serassegurada, sob pena <strong>de</strong> insegurança para os agentes econômicos.Ocorre que, invariavelmente, quando há uma renovação nosistema normativo, uma série <strong>de</strong> dúvidas surge para o aplicador da lei. E emuma socieda<strong>de</strong> caracterizada pelo dinamismo das relações e por interessesconflitantes entre grupos <strong>de</strong> agentes econômicos, estas dúvidas acabam semostrando rotineiras, em razão do gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> leis esparsas, especiaiscom conceitos in<strong>de</strong>terminados e cláusulas gerais que geram no or<strong>de</strong>namentoum grau <strong>de</strong> flui<strong>de</strong>z propício ao surgimento <strong>de</strong> conflitos.


A <strong>de</strong>speito disso, a dogmática tradicional, ainda, não apresentoumecanismo <strong>de</strong> todo suficiente para a solução da questão, concentrando-se,ainda, a análise nos critérios fornecidos pela teoria geral do <strong>direito</strong> para asolução <strong>de</strong> conflitos <strong>de</strong> <strong>direito</strong> intertemporal, fundada nas concepções <strong>de</strong>retroativida<strong>de</strong> e eficácia imediata da lei e no respeito ao <strong>direito</strong> adquirido,restando, ainda, válida a pon<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> mestre sobre o assunto:A nosso ver, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma técnica própria do <strong>direito</strong>intertemporal advém <strong>de</strong> três fatores fundamentais: a) dainsuficiência das balizas para resolverem por si muitos dosproblemas da matéria; b) da impossibilida<strong>de</strong>, em certos casos,<strong>de</strong> se levar isso a efeito; c) e, sobretudo, entre nós, da completafalta <strong>de</strong> método que reina entre muitos dos nossos melhoresautores especializados.A insuficiência dos princípios fundamentais já assentados comrelação ao assunto, conforme vimos no início <strong>de</strong>ste trabalho,tem sido testemunhada por muitos autores, tanto alienígenas doporte <strong>de</strong> Winscheid e Savatier, como nacionais da estatura <strong>de</strong>José Augusto César e Fila<strong>de</strong>lfo Azevedo. 63Seja qual for a doutrina que se aceite, o que não sofre dúvida énão haverem os juristas, até hoje, encontrado uma fórmulaúnica e geral, aplicável a todos os aspectos do conflito das leisno tempo. 64Em relação aos <strong>contratos</strong>, a questão que se impõe diz respeito àpossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma lei nova atingir os efeitos produzidos por um pactocelebrado antes <strong>de</strong> sua vigência, ficando as partes <strong>de</strong> um contrato <strong>de</strong> <strong>longa</strong>duração, que po<strong>de</strong> perdurar por anos, ou, até, décadas, invariavelmente,sujeitas a ver o conteúdo do contrato alterado pela imposição <strong>de</strong> normassupervenientes à contratação.63 FRANÇA, Rubens Limongi. A irretroativida<strong>de</strong> das leis e o <strong>direito</strong> adquirido - 3 ed. Refundidae atualizada, do “Direito Intertemporal brasileiro” São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1982.p. 259.64 RAO, Vicente. O Direito e a Vida dos Direitos – Max Limonad. São Paulo, 1952, p.


A jurisprudência brasileira, incluindo a dos tribunais superiores évacilante, sobre a questão, encontrando-se distante <strong>de</strong> uma unicida<strong>de</strong>. OSupremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral, em relação aos <strong>contratos</strong> mantém algumas teses,baseadas no entendimento <strong>de</strong> que os efeitos dos <strong>contratos</strong> regem-se pela leido tempo <strong>de</strong> sua constituição, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente se a lei se tratar <strong>de</strong> leiconsi<strong>de</strong>rada como <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, garantindo-se, assim, a proteção ao<strong>direito</strong> adquirido, Por outro lado, <strong>de</strong>fine que não é possível a oposição <strong>de</strong><strong>direito</strong> adquirido a regime jurídico <strong>de</strong> instituto <strong>de</strong> <strong>direito</strong>.Já a jurisprudência do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça tem admitir aincidência imediata da lei nova aos efeitos futuros dos negócios avençadosantes <strong>de</strong> sua vigência, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não venha a afetar situações consolidadas.Esta situação mereceu a relevante crítica <strong>de</strong> Maria Helena Diniz:o problema da irretroativida<strong>de</strong> é irrelevante na searajurispru<strong>de</strong>ncial e consuetudinária. Isto é assim porque ojudiciário resolve as questões <strong>de</strong> <strong>direito</strong> intertemporal caso acaso, fundado às vezes sobre o interesse geral, a or<strong>de</strong>mpública, as exigências fático axiológicas do sistema jurídico,etc. A irretorativida<strong>de</strong> das leis é somente um princípio <strong>de</strong>utilida<strong>de</strong> social5-1- PRINCIPAIS TEORIAS SOBRE O CONFLITO DE LEIS NO TEMPOA <strong>de</strong>speito da relevância e persistência do tema, a doutrina atualse mostra escassa sobre a matéria, sendo necessário, ainda, se recorrer àsobras clássicas, produzidas por autores como, Rubens Limongi França, CarlosMaximiliano, Wilson <strong>de</strong> Souza <strong>de</strong> <strong>Campos</strong> Batalha, Miguel Faria <strong>de</strong> SerpaLopes que, por sua vez, utilizaram-se da produção estrangeira em sua maiorparte produzida no século XIX.Das teorias formuladas, po<strong>de</strong> se encontrar como mecanismos, o<strong>direito</strong> adquirido, a titularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>direito</strong>s subjetivos que faziam parte dopatrimônio do indivíduo, a não retroativida<strong>de</strong> da lei e a distinção entresituações subjetivas e objetivas e efeito retroativo e imediato da lei.


Po<strong>de</strong>-se afirmar que <strong>de</strong>ntre as teorias formuladas 65 as que maisinfluenciaram a doutrina nacional com reflexos na jurisprudência, foramaquelas <strong>de</strong>senvolvidas pelo italiano Carlo Francesco Gabba e pelo francêsPaul Roubier, que, para solucionarem os conflitos <strong>de</strong> <strong>direito</strong> intertemporal, seutilizam, respectivamente, do conceito <strong>de</strong> <strong>direito</strong> adquirido e da distinção entreefeito imediato e efeito retroativo das leis.Assim, a afirmação <strong>de</strong> Wilson <strong>de</strong> Souza <strong>de</strong> <strong>Campos</strong> Batalha, nosentido <strong>de</strong> queA doutrina do respeito ao <strong>direito</strong> adquirido como fundamento dateoria da retroativida<strong>de</strong> das leis foi muito prestigiada no Brasil,principalmente, tal como Gabba a formulou. A Lei <strong>de</strong> Introduçãoao Código Civil brasileiro apartou-se <strong>de</strong>ssa teoria, procurandoaproximar-se dos doutrinamentos <strong>de</strong> Roubier, mas aConstituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1946 volveu os passos para trás,retornando ao ponto <strong>de</strong> vista da antiga Introdução ao CódigoCivil 66Analisando-se a doutrina e a jurisprudência recentes sobre otema, percebe-se que, ainda hoje, é perfeita a afirmação do autor eis que osfundamentos utilizados são retirados <strong>de</strong>stas teorias.Gabba foi um dos autores da teoria <strong>de</strong>nominada subjetivista, queleva em conta os efeitos dos fatos jurídicos sobre as pessoas, <strong>de</strong>limitando odomínio da lei nova segundo a natureza dos efeitos produzidos no passado.Fundamentou sua doutrina no entendimento <strong>de</strong> que as leispo<strong>de</strong>m ser retroativas, mas o limite da lei nova para disciplinar os efeitos dosfatos passados é o <strong>direito</strong> adquirido.Sobressaiu-se, então, por ter sido o responsável por darcontornos e <strong>de</strong>finição acerca do <strong>direito</strong> adquirido que serviu <strong>de</strong> influência,65 Apontam-se, ainda, as formulações <strong>de</strong> Savigny, Lassale, Duguit, Jèze (conforme AntônioJeová Santos. Direito Intertemporal e o novo Código Civil)66 BATALHA, Wilson <strong>de</strong> Souza <strong>Campos</strong>. Direito intertemporal. Rio <strong>de</strong> Janeiro:Forense, 1980,p. 112.


<strong>de</strong>ntre outros, para o legislador brasileiro e que prevalece até os dias <strong>de</strong> hoje,como orientação à jurisprudência pátriaRui Limongi França traz o conceito formulado por Gabba,i<strong>de</strong>ntificando como <strong>direito</strong> adquiridotodo <strong>direito</strong> que: a) é consequência <strong>de</strong> um fato idôneo aproduzi-lo, em virtu<strong>de</strong> da lei do tempo no qual o fato se viurealizado, embora a ocasião <strong>de</strong> fazê-lo valer não se tenhaapresentado antes da atuação <strong>de</strong> uma lei nova a respeito domesmo e que b) nos termos da lei sob o império da qual severificou o fato <strong>de</strong> on<strong>de</strong> se origina, entrou imediatamente afazer parte do patrimônio <strong>de</strong> quem o adquiriu 67Não estariam incluídos, assim, na categoria dos <strong>direito</strong>sadquiridos os <strong>direito</strong>s consumados, mas apenas, aqueles <strong>direito</strong>s que foramadquiridos, mas não foram ainda efetuados ou consumados, distinguindo-se,ainda, as faculda<strong>de</strong>s abstratas e as meras expectativas.Gabba consi<strong>de</strong>ra, ainda, que os <strong>direito</strong>s seriam adquiridos poratos da vonta<strong>de</strong> humana, mas também, por fatos previstos na hipótese<strong>de</strong>scrita pela lei, <strong>de</strong>vendo estes ser verificados por inteiro.Sustenta, ainda, que po<strong>de</strong>m ser divididos em fatos aquisitivossimples, quando completados, em um instante, somente, e aquisitivoscomplexos, se compostos por partes sucessivas que se concretizam,separadamente, surgindo, neste caso, como problema, a pluralida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leis aatingir as partes não finalizadas.Por fim, os fatos <strong>de</strong>vem ser posteriores ou, pelo menoscontemporâneos à entrada em vigor da lei que lhe dá amparo.67 LIMONGI FRANÇA, Rubens. A irretroativida<strong>de</strong> das leis e o <strong>direito</strong> adquirido. 2 ed. SãoPaulo, Revista dos Tribunais, 1982, p. 205.


Por se basear na incorporação do <strong>direito</strong> ao patrimônio do titular,sua teoria foi classificada como subjetivista, resumida por José EduardoMartins Cardozo nos seguintes termos:De forma sintética, po<strong>de</strong>ríamos dizer que os <strong>de</strong>fensores <strong>de</strong>stacorrente têm, como alicerce <strong>de</strong> todas suas reflexões, a idéia <strong>de</strong>que as novas leis não <strong>de</strong>vem retroagir sobre aqueles<strong>direito</strong>s subjetivos que sejam consi<strong>de</strong>rados juridicamente comoadquiridos pelo seu titular. Ou em outras palavras: ao ver<strong>de</strong>stes, a questão da irretroativida<strong>de</strong> das leis tem assento napremissa fundamental que afirma a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma leivir a <strong>de</strong>srespeitar “<strong>direito</strong>s adquiridos” sob o domínio <strong>de</strong> suaantece<strong>de</strong>nte 68Tal doutrina foi, <strong>de</strong> fato, a adotada pela legislação brasileira epela jurisprudência, incluindo, a atual jurisprudência do Supremo TribunalFe<strong>de</strong>ral, firmando-se como o verda<strong>de</strong>iro fundamento e até significado <strong>de</strong>irretroativida<strong>de</strong> das leis.Passível, <strong>de</strong> críticas, porém, em razão <strong>de</strong> não trazer, ainda, umasatisfatória <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> <strong>direito</strong> adquirido.Assim, já no século XX, alguns doutrinadores, chamados <strong>de</strong>objetivistas se opuseram à teoria dos <strong>direito</strong>s adquiridos procurando tratar dasquestões <strong>de</strong> <strong>direito</strong> intertemporal, pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manter intactas certassituações jurídicas constituídas na vigência da lei anterior, como critério da69 70não aplicação da lei nova, como foi o caso <strong>de</strong> Roubier.68 CARDOZO, José Eduardo Martins. Da retroativida<strong>de</strong> da lei. São Paulo: Editora Revista dosTribunais, 1995.69 ESPÍNOLA, Eduardo; FILHO, Eduardo Espínola. A Lei <strong>de</strong> Introdução ao Código CivilBrasileiro. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 1995, p. 242.70 Leon Duguit concentra sua crítica na distinção entre situações jurídicas objetivas esituações jurídicas subjetivas. Assim, segundo Batalha , ele baseia-se na distinção entresituações jurídicas individuais ou subjetivas, resultantes <strong>de</strong> manifestações individuais <strong>de</strong>vonta<strong>de</strong>, que não po<strong>de</strong>m ser atingidas pela Lei nova, e situações legais ou objetivas, as quais<strong>de</strong>rivam diretamente da lei, mesmo quando nascem por ocasião <strong>de</strong> um ato voluntário, que é acondição e não a causa eficiente <strong>de</strong> sua formação. As situações legais, permanentes, que<strong>de</strong>rivam da lei, seguem todas as transformações da lei e uma lei nova modificará umasituação legal nascida anteriormente sem que com isso produza efeito retroativo. Ao contrário,toda a manifestação individual <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> é sempre, quanto a sua legalida<strong>de</strong> e a suavalida<strong>de</strong>, regida pela lei vigente ao tempo em que ela se produziu, sejam quais forem as


Para ele, como sintetiza Limongi França,:Se a lei não po<strong>de</strong> aplicar-se às manifestações <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>individual anteriores à sua promulgação o po<strong>de</strong>m, entretanto,em relação às situações legais existentes no momento <strong>de</strong> suapromulgação. A situação legal não é um efeito <strong>de</strong>ste ato (istoé, do ato contratual); ela <strong>de</strong>riva diretamente da lei; a<strong>de</strong>claração <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>, mesmo contratual, não foi senão acondição da aplicação da lei a tal ou a tal pessoa; e a lei novamodifica somente esta situação 71Tenta, portanto, solucionar as dificulda<strong>de</strong>s do <strong>direito</strong> adquirido,formulando a idéia <strong>de</strong> situação jurídica e com a distinção entre situaçõesjurídicas individuais ou subjetivas e situações jurídicas legais, também ditasobjetivas 72Paul Roubier prefere, também, utilizar a expressão situaçãojurídica em lugar da <strong>de</strong>signação <strong>direito</strong> adquirido, sob o argumento <strong>de</strong> queaquela seria superior ao termo <strong>direito</strong> adquirido, por não ter um carátersubjetivo e po<strong>de</strong>r ser aplicada a situações como a do menor, do interdito e dopródigo 73 .Consi<strong>de</strong>ra que as situações jurídicas não se realizam em umúnico momento, perdurando no tempo, po<strong>de</strong>ndo ser atingidas por mais <strong>de</strong>uma lei.modificações posteriormente, introduzidas à lei.(BATALHA, Wilson <strong>de</strong> Souza <strong>de</strong>. Lei <strong>de</strong>Introdução ao Código Civil, vII, tomo I, p. 1180.71 LIMONGI FRANÇA, Direito Intertemporal, p. 171.72 Jéze também é responsável pela distinção entre situação jurídica individual subjetiva esituação jurídica geral ou objetiva. Segundo Eduardo Espínola, (...) no que diz respeito aoproblemas da irretroativida<strong>de</strong> das leis, é claro quem, em se tratando <strong>de</strong> uma situação geral,aplica-se-lhe a lei nova; ao contrário, esta respeita a situação individual constituída navigência da lei anterior” (ESPÍNOLA, Eduardo e ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. A Lei <strong>de</strong>Introdução ao Código Civil brasileiro. 3 ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Renovar, 1999, vol. 1, p. 243)73Conforme citado por Francisco Amaral, para Roubier “a situação jurídica é umconjunto <strong>de</strong> <strong>direito</strong>s e <strong>de</strong>veres, prerrogativas, e obrigações, que se cria em torno <strong>de</strong> umfato, uma situação ou um ato, capaz <strong>de</strong> gerar efeitos jurídicos” (AMARAL, Francisco.Direito Civil:introdução. 7ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro:Renovar, 2008, p.222)


Com base nisso, formula a distinção entre efeito retroativo eefeito imediato da lei, referindo-se primeiro à aplicação da lei ao passado,enquanto o segundo á sua aplicação ao presente.Enquanto uma situação jurídica não está constituída ou extinta,po<strong>de</strong> a lei nova modificar as condições para tal, sem agir retroativamente, mas<strong>de</strong> forma imediata.Para ele “... a lei é retroativa quando ela se volta para o passado,seja para apreciar as condições <strong>de</strong> legalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um ato, seja para modificarou suprimir os efeitos <strong>de</strong> um <strong>direito</strong> já realizado. Fora daí, não háretroativida<strong>de</strong>, e a lei po<strong>de</strong> modificar os “efeitos futuros” <strong>de</strong> fatos ou atosanteriores, sem ser retroativa.” 74Diferencia, assim, na aplicação da lei os fatos já realizados,<strong>de</strong>nominando-os <strong>de</strong> “facta praterita”, dos fatos em via <strong>de</strong> realização<strong>de</strong>nominando-os “facta pen<strong>de</strong>ntia” e os fatos futuros <strong>de</strong> “facta futura”. Equanto aos fatos pen<strong>de</strong>ntes separa as partes anteriores e as partesposteriores à data da mutação legislativa, concluindo que, aplicando-se a lei aestas últimas, ela não terá efeito retroativo 75 .Conclui, então, que as leis relativas aos modos <strong>de</strong> constituiçãoou <strong>de</strong> extinção <strong>de</strong> uma situação jurídica não po<strong>de</strong>m, sem retroativida<strong>de</strong>,contestar a eficácia ou ineficácia jurídica <strong>de</strong> um fato passado. Já quando secuida <strong>de</strong> fixar os efeitos <strong>de</strong>ssa situação jurídica, a <strong>de</strong>finição do caráter74 Apud Mário Luiz Delgado em JABUR, Gilberto Haddad & Pereira Júnior, Antônio Jorge(coord.) – Direito dos Contratos. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p.11275 A retroativida<strong>de</strong> da lei, também, é classificada pela doutrina 75 <strong>de</strong> acordo com atuação da leiaos fatos passados e a situação da relação jurídica constituída sob a vigência da lei anterior.Será, <strong>de</strong>sta forma, máxima, a retroativida<strong>de</strong>, na hipótese da lei nova vir <strong>de</strong>sfazer a coisajulgada e os fatos consumados, restituindo as partes ao estado anterior. Ocorrerá aretroativida<strong>de</strong> média se a lei posterior vier a ser aplicada apenas aos efeitos pen<strong>de</strong>ntes dosatos jurídicos ultimados antes <strong>de</strong> sua entrada em vigor e, por fim, será mínima a retroativida<strong>de</strong>no caso <strong>de</strong> observância dos preceitos da nova lei somente, aos efeitos futuros dos atosjurídicos passados. (Ver Mário Luiz Delgado em seu “Problemas <strong>de</strong> Direito Intertemporal noCódigo Civil.)


etroativo faz-se da seguinte forma: os efeitos já produzidos antes da entradaem vigor da nova lei fazem parte do domínio da lei antiga e são intocáveis. Alei nova <strong>de</strong>terminará os efeitos jurídicos que se produzirão após a sua entradaem vigor, sem que isto signifique algo diferente do efeito imediato.Ressalte-se, porém, que em relação aos <strong>contratos</strong>, há apermanência da lei antiga a regulá-los, ainda que se trate <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> emcurso, não sendo as partes posteriores à lei nova, por ela atingidas. Assim,o contrato é o instrumento da diferenciação dos indivíduos, eassim, correspon<strong>de</strong> a uma necessida<strong>de</strong> capital dassocieda<strong>de</strong>s humanas. Outrora, essa diferenciação erarealizada pela própria lei ou pelos costumes: atualmente,porém, uma vez que a lei exerce o seu império <strong>de</strong> modo igualperante todos, o contrato é o único instrumento <strong>de</strong>diversificação jurídica <strong>de</strong> on<strong>de</strong> a sua importância. Oarcabouço básico dos tipos <strong>de</strong> contrato é um só, mas emvirtu<strong>de</strong> do próprio consentimento do legislador, as partespo<strong>de</strong>m modificá-los ao infinito, exercendo uma escolha. Ora,o contrato pelo qual os interessados realizam esta escolhaconstitui um ato <strong>de</strong> previsão; os contratantes que, por essemeio, conjugam os seus interesses, sabem, aquilo quepo<strong>de</strong>m esperar do conjunto <strong>de</strong> cláusulas expressas do ato, ouainda da lei. É evi<strong>de</strong>nte que esta escolha seria inútil se umalei nova, modificando as disposições do regime em vigor notempo em que o contrato foi lavrado, viesse trazer um<strong>de</strong>sarranjo nas suas previsões. Para Roubier, não colheriasequer a objeção referente às leis imperativas. Elas terãoefeito com relação aos <strong>contratos</strong> que viessem a serconcluídos posteriormente (facta praterita), mas não noatinente aos <strong>contratos</strong> em curso (facta pen<strong>de</strong>ntia). As leisnovas não po<strong>de</strong>m atingir a escolha que fora conferida àspartes quando da lavratura do contrato: esta escolha tinha umsentido, o <strong>de</strong> permitir aos contratantes estabelecer suasprevisões e seria insuportável que, uma vez assim fixadas aspartes, sobre um <strong>de</strong>terminado tipo jurídico, a lei, <strong>de</strong>smentindosuas previsões, viesse a or<strong>de</strong>nar <strong>de</strong> outro modo as suasrelações contratuais. Um contrato constituiu um bloco <strong>de</strong>cláusulas indivisíveis que se não po<strong>de</strong> apreciar senão à luz


da legislação sob a qual foi entabulado. É por esta razão que,em matéria <strong>de</strong> <strong>contratos</strong>, o princípio da não retroativida<strong>de</strong>ce<strong>de</strong> lugar a um princípio mais amplo <strong>de</strong> proteção, o princípioda sobrevivência da lei antiga 76Roubier:Assim, Segundo Antônio Jeová Santos 77 , citando a doutrina <strong>de</strong>Se o contrato foi celebrado sob a existência <strong>de</strong> uma lei, aindaque seus efeitos ocorram no futuro, durante nova lei, ditosefeitos não se submetem à lei posterior. O Contrato ficajungido e subordinado à lei do tempo em que houve acelebração, a consumação do contrato.Por outro lado, porém, diferencia a disciplina das leis em relaçãoa um <strong>de</strong>terminado estatuto jurídico, inexistindo, neste caso, <strong>direito</strong> adquiridoaos institutos jurídicos, sendo que “se a lei nova trouxesse uma modificaçãono estatuto legal ela po<strong>de</strong>ria ser aplicada aos <strong>contratos</strong> em curso, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> queela não seja uma lei relativa às condições <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um contrato” 78Por fim, sobre a aplicação <strong>de</strong> normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública,geralmente utilizadas pelo Estado como forma <strong>de</strong> intervenção na economiasobre os <strong>contratos</strong>, Roubier não consi<strong>de</strong>ra pacífica a questão.Por outro lado, há outros autores que se posicionam. ConformeBatalha, é este o entendimento <strong>de</strong> Simoncelli:Assim, predominando na esfera do <strong>direito</strong> privado o interesseparticular e a autonomia da vonta<strong>de</strong>, o respeito <strong>de</strong>vido àconfiança que o particular <strong>de</strong>positou na lei vigente exige que76 Limongi França, Direito intertemporal, p. 179-18077 SANTOS, Antônio Jeová. Direito Intertemporal e o novo Código Civil: aplicações da Lei10.406/2002 – Antônio Jeová Santos – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 200478 BIZARRIA, Juliana Carolina Frutuoso. Direito adquirido e situações contratuais: uma análiseda jurisprudência do Supremo Tribunal. Revista <strong>de</strong> Direito Privado, n.° 33, 2008, p. 169, 200.


a lei nova não incida retroativamente sobre relações e efeitos<strong>de</strong>rivados daquela, ainda, que estes se produzam na vigênciada norma posterior. No <strong>direito</strong> público, ao contrário,predomina o interesse do Estado, que or<strong>de</strong>na ou proíbe tendoem vista um fim superior ao particular; a mais intensaobrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas normas exige que a nova norma seapo<strong>de</strong>re dos fatos e relações anteriores e os regule segundoo novo preceito. O critério fundamental seria, pois aprepon<strong>de</strong>rância do princípio da irretroativida<strong>de</strong> na esfera do<strong>direito</strong> privado e a prepon<strong>de</strong>rância do princípio daretroativida<strong>de</strong> na esfera do <strong>direito</strong> público, quer se tratasse <strong>de</strong>normas <strong>de</strong> <strong>direito</strong> público, em sentido técnico, ou apenas <strong>de</strong>or<strong>de</strong>m pública. 79Não po<strong>de</strong>ria ser diferente a crítica a esta doutrina senão emrelação à dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se estabelecer os limites entre a or<strong>de</strong>m pública e ointeresse social e o interesse privado.5-2- ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIAA jurisprudência brasileira, principalmente, a dos TribunaisSuperiores, ao tratar do <strong>direito</strong> intertemporal, fundamenta, ainda, suas<strong>de</strong>cisões, nas doutrinas aqui citadas.O Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral enten<strong>de</strong>, assim, em regra, que aregência dos <strong>contratos</strong> se faz pela lei em vigor na data em que foi formalizado,configurando-se a retroativida<strong>de</strong> da lei, se, aplicada aos <strong>contratos</strong> celebradosantes <strong>de</strong> sua vigência, ferir o <strong>direito</strong> adquirido, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente se a leinova se reveste <strong>de</strong> caráter <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, pois a garantia do <strong>direito</strong>adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada veiculam todas as leisinfraconstitucionais, inclusive as <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública.Em alguns julgados, porém, enten<strong>de</strong>u serem aplicáveis normas<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública para alterarem as condições pactuadas em <strong>contratos</strong>79 BATALHA, Wilson <strong>de</strong> Souza <strong>de</strong>. Lei <strong>de</strong> Introdução ao Código Civil, v. II, tomo I, p. 87


celebrados antes <strong>de</strong> sua entrada em vigor, como ocorreu com planoseconômicos alterando o padrão monetário.Já, por outro lado, <strong>de</strong>cidiu pela não incidência imediata doCódigo <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa do consumidor. A <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado norma <strong>de</strong>or<strong>de</strong>m pública, se aplicável a <strong>contratos</strong> celebrados antes <strong>de</strong> sua entrada emvigor, estaria ocorrendo retroativida<strong>de</strong> e afronta ao ato jurídico perfeito.Não se po<strong>de</strong>, portanto, afirmar que sua posição em relação àaplicação da lei nova aos <strong>contratos</strong> seja unificada.Diferentemente do que ocorre na corte suprema, no SuperiorTribunal <strong>de</strong> Justiça a jurisprudência tem sido enfática e uníssona no sentido<strong>de</strong> admitir a incidência imediata da lei nova aos efeitos futuros dos negóciosavençados antes <strong>de</strong> sua vigência, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não venha a afetar situaçõesconsolidadas. São abundantes os julgamentos em favor da eficácia imediatadas normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública sobre os <strong>contratos</strong> em curso <strong>de</strong> execução.Como exemplo do entendimento do Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral,<strong>de</strong> que a lei que se aplica aos efeitos dos <strong>contratos</strong> é aquela vigente domomento <strong>de</strong> sua celebração, sob pena <strong>de</strong> lesão a <strong>direito</strong> adquirido e ao atojurídico perfeito, po<strong>de</strong> ser citada a <strong>de</strong>cisão na ADIN 1931 ajuizada pelaConfe<strong>de</strong>ração Nacional De Saú<strong>de</strong> - Hospitais Estabelecimentos e Serviços,cujo objeto é a <strong>de</strong>claração da inconstitucionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alguns artigos da Lei9656/98 que regula os planos e seguros privados <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong>, porpreverem a aplicação da lei a <strong>contratos</strong> celebrados antes <strong>de</strong> sua entrada emvigor.Declarou o Tribunal inconstitucional o artigo 35-E 80 da Lei, porferir <strong>direito</strong> adquirido, conforme consta da ementa abaixo transcrita3 o O disposto no art. 35 <strong>de</strong>sta Lei aplica-se sem prejuízo do estabelecido neste artigo.


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIORDINÁRIA 9656/98. PLANOS DE SEGUROS PRIVADOSDE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. MEDIDAPROVISÓRIA 1730/98. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADEATIVA. INEXISTÊNCIA. AÇÃO CONHECIDA.INCONSTITUCIONALIDADES FORMAIS E OBSERVÂNCIADO DEVIDO PROCESSO LEGAL. OFENSA AO DIREITOADQUIRIDO E AO ATO JURÍDICO PERFEITO.1. Propositura da ação. Legitimida<strong>de</strong>. Não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong>autorização específica dos filiados a propositura <strong>de</strong> açãodireta <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong>. Preenchimento dos requisitosnecessários.2. Alegação genérica <strong>de</strong> existência <strong>de</strong> vício formal dasnormas impugnadas. Conhecimento. Impossibilida<strong>de</strong>.3. Inconstitucionalida<strong>de</strong> formal quanto à autorização, aofuncionamento e ao órgão fiscalizador das empresasoperadoras <strong>de</strong> planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Alterações introduzidas pelaúltima edição da Medida Provisória 1908-18/99. Modificaçãoda natureza jurídica das empresas. Lei regulamentadora.Possibilida<strong>de</strong>. Observância do disposto noartigo 197 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral.4. Prestação <strong>de</strong> serviço médico pela re<strong>de</strong> do SUS einstituições conveniadas, em virtu<strong>de</strong> da impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>atendimento pela operadora <strong>de</strong> Plano <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>.Ressarcimento à Administração Pública mediante condiçõespreestabelecidas em resoluções internas da Câmara <strong>de</strong>Saú<strong>de</strong> Complementar. Ofensa ao <strong>de</strong>vido processo legal.Alegação improce<strong>de</strong>nte. Norma programática pertinente àrealização <strong>de</strong> políticas públicas. Conveniência damanutenção da vigência da norma impugnada.5. Violação ao <strong>direito</strong> adquirido e ao ato jurídico perfeito.Pedido <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> do artigo 35, parágrafos 1o e2o, da Medida Provisória 1730-7/98. Ação não conhecidatendo em vista as substanciais alterações neles promovidapela medida provisória superveniente.6. Artigo 35-G, caput, incisos I a IV, parágrafos 1o, incisos I aV, e 2o, com a nova versão dada pela Medida Provisória1908-18/99. Incidência da norma sobre cláusulas contratuaispreexistentes, firmadas sob a égi<strong>de</strong> do regime legal anterior.Ofensa aos princípios do <strong>direito</strong> adquirido e do ato jurídicoperfeito. Ação conhecida, para suspen<strong>de</strong>r-lhes a eficácia até<strong>de</strong>cisão final da ação.7. Medida cautelar <strong>de</strong>ferida, em parte, no que tange àsuscitada violação ao artigo 5o, XXXVI, da Constituição,quanto ao artigo 35-G, hoje, renumerado como artigo 35-Epela Medida Provisória 1908-18, <strong>de</strong> 24 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1999;ação conhecida, em parte, quanto ao pedido <strong>de</strong>inconstitucionalida<strong>de</strong> do § 2o do artigo 10 da Lei9656/1998,com a redação dada pela Medida Provisória 1908-18/1999,


para suspen<strong>de</strong>r a eficácia apenas da expressão "atuais e".Suspensão da eficácia do artigo 35-E (redação dada pela MP2177-44/2001) e da expressão "artigo 35-E", contida no artigo3o da Medida Provisória 1908-18/99.Como se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> da ementa, o STF enten<strong>de</strong> serinconstitucional a norma contida no § 2° do artigo 10 81 e Artigo 35 82 da Lei queregula os planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, por ferirem o ato jurídico perfeito e o <strong>direito</strong>adquirido.As normas, alteradas por diversas medidas provisórias trazemdiversas imposições às operadoras e <strong>de</strong>finem que são aplicáveis aos<strong>contratos</strong> já celebrados antes <strong>de</strong> sua entrada em vigor. 83voto:Assim, se manifestou o Ministro Relator Maurício Corrêa em seu[...] entendo patente e indébita a ingerência do Estado nopacto celebrado entre as partes. De fato, os dispositivosacima transcritos interferem na órbita do <strong>direito</strong> adquirido e doato jurídico perfeito, visto que criam regras completamentedistintas daquelas que foram objeto <strong>de</strong> contratação.A retroativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada por esses preceitos faz incidirregras <strong>de</strong> legislação nova sobre cláusulas contratuaispreexistentes, firmadas sob a égi<strong>de</strong> do regime legal anterior,que, ao meu ver, afrontam o <strong>direito</strong> consolidado das partes[...]81 “Art. 10 (...) § 2° As pessoas jurídicas que comer cializam produtos <strong>de</strong> que tratam o inciso I eo § 1 o do art. 1 o <strong>de</strong>sta Lei oferecerão, obrigatoriamente, a partir <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1999, oplano-referência <strong>de</strong> que trata este artigo a todos os seus atuais e futuros consumidores”(BRASIL, Lei 9656/98, Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9656.htm)82 Art. 35. Aplicam-se as disposições <strong>de</strong>sta Lei a todos os <strong>contratos</strong> celebrados a partir <strong>de</strong> suavigência, assegurada aos consumidores com <strong>contratos</strong> anteriores, bem como àqueles com<strong>contratos</strong> celebrados entre 2 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1998 e 1 o <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1999, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>optar pela adaptação ao sistema previsto nesta Lei (BRASIL, Lei 9656/98, Disponível emhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9656.htm)83Prevêem as normas, por exemplo, que reajustes na contraprestação paga porconsumidores com mais <strong>de</strong> sessenta anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> fica submetida à autorização prévia daANS; que as cláusulas que tratam <strong>de</strong> doença pré-existente passarão a ser analisadas pelaANS, a vedação da rescisão unilateral do contrato pelas operadoras; que as cláusulas <strong>de</strong>reajuste <strong>de</strong>verão ser previamente analisadas pela ANS. (artigo 35-E e parágrafos da 9656/98,disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9656.htm)


julgado.Ressalte-se, que, até o momento o mérito da ação não foiNote-se, porém, que sobre normas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública é tradiçãodo STF alterar seu entendimento <strong>de</strong> acordo com as mudanças da economia.Com a análise <strong>de</strong> julgados mais antigos, são encontradas<strong>de</strong>cisões <strong>de</strong>terminando a aplicação imediata <strong>de</strong> normas consi<strong>de</strong>raras <strong>de</strong>or<strong>de</strong>m pública a <strong>contratos</strong> em curso como no caso da aplicação do Decreto22.626 <strong>de</strong> 1933, conhecido como Lei <strong>de</strong> Usura 84 , ou no caso da aplicação dachamada Lei <strong>de</strong> Luvas (Dec. 24.150 <strong>de</strong> 1934) sobre os <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> locaçãoem vigor 85 , fundamentando-se a <strong>de</strong>cisão no interesse da coletivida<strong>de</strong> e navedação a abusos e exploração <strong>de</strong> uma parte pela outra nas relaçõescontratuais.Já no período <strong>de</strong> crise vivido pelo país, após a década <strong>de</strong> 70, oEstado interveio <strong>de</strong> forma intensa na economia com a edição <strong>de</strong> leisobjetivando sanar os efeitos da inflação.Neste período, a jurisprudência do Tribunal primou pelamanutenção dos pactos em prol da aplicação do pacta sunt servanda,rejeitando, assim, a influência das leis novas aos <strong>contratos</strong> celebrados sob a84 Segundo Mário Luiz Delgado ocorreu nesta ocasião hipótese <strong>de</strong> retroativida<strong>de</strong> média, jáque “A retroativida<strong>de</strong> é média quando a lei posterior vem a ser aplicada apenas aos efeitospen<strong>de</strong>ntes dos atos jurídicos ultimados antes <strong>de</strong> sua entrada em vigor, como foi o caso dosempre citado Decreto 22.626/33 (lei da usura que, ao limitar a taxa <strong>de</strong> juros ao percentual<strong>de</strong> 12% ao ano, aplicou-se aos <strong>contratos</strong> então existentes. Trata-se <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>iraretroativida<strong>de</strong> porque os juros já estavam fixados no contrato ‘ab initio’. Conquanto acobrança <strong>de</strong>sses juros só se operaria quando vigente a lei nova limitadora, o seu percentual jáestava <strong>de</strong>finido antes. É o que Roubier chama <strong>de</strong> partes pretéritas <strong>de</strong> fatos pen<strong>de</strong>ntes”(JABUR, Gilberto Haddad & PEREIRA JÚNIOR, Antônio Jorge (coord.) – Direito dos Contratos– São Paulo: Quarter Latin, 2006, p. 109)85 O <strong>de</strong>creto trata do <strong>direito</strong> <strong>de</strong> preferência do locatário para aquisição do imóvel locado.Enten<strong>de</strong>ndo tratar-se <strong>de</strong> norma <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública o STF <strong>de</strong>terminou sua aplicação aos<strong>contratos</strong> celebrados anteriormente, conforme po<strong>de</strong> se constatar no julgamento do RE 27.377-DF.


égi<strong>de</strong> da lei anterior. Este foi o entendimento exarado da <strong>de</strong>cisão do RecursoExtraordinário 96.037-6, cuja ementa segue transcrita:EMENTA: Locação Comercial. Vinculação do aluguel aosalário-mínimo, consoante contato <strong>de</strong> celebradoanteriormente às Leis n.°s 6205/75 e 6.423/77.Respeito ao ato jurídico perfeito, <strong>de</strong> que se irradiam <strong>direito</strong>s eobrigações para os contratantes. Não há que se invocar oefeito imediato da lei nova, porquanto esta não se aplica aosefeitos futuros do <strong>contratos</strong> anteriormente celebrado e que seacha em curso.Não impressiona o argumento <strong>de</strong> que se cuida <strong>de</strong> lei <strong>de</strong>or<strong>de</strong>m pública, face ao princípio constitucional inserido no art.153, § 3°. Provimento do recurso extraordinário, pa rareconhecer o <strong>direito</strong> do locador ao aluguel reajustadoanualmente, com base no salário mínimo 86Tratou o referido <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> vedar a utilização do salário mínimocomo fator <strong>de</strong> atualização monetário, norma que foi <strong>de</strong> encontro a diversascláusulas contratuais estipulando este tipo <strong>de</strong> reajuste.Assim, constou no voto do Ministro Relator:Tratando-se <strong>de</strong> contrato legitimamente celebrado as partestêm o <strong>direito</strong> <strong>de</strong> vê-lo cumprido, nos termos da leicontemporânea ao seu nascimento, a regular inclusive osseus efeitos. <strong>Os</strong> efeitos do contrato ficam condicionados à leivigente no momento em que foi firmado pelas partes. Ai, nãohá que invocar o efeito imediato da leiMas em relação a normas que alteravam disposições referentesao padrão monetário, <strong>de</strong>cidiu o STF, que as mesmas <strong>de</strong>veriam incidir,imediatamente, por se referirem ao regime legal da moeda, não se aplicando,neste caso as limitações referentes ao <strong>direito</strong> adquirido e ao ato jurídicoperfeito por tratar-se, no caso, <strong>de</strong> estatuto legal 87 .86BRASIL – STF – RE 96.036-6-RJ – REL. Min. Djaci Falcão. Disponível emHTTP://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.201087 Assim, se <strong>de</strong>cidiu em relação a contribuições e benefícios ligados à Previdência Privada,ficando os <strong>contratos</strong> sujeitos à substituição do salário mínimo como critério <strong>de</strong> correção pelaORTN, conforme RE 105.137-RS – Rel. Min. Rafael Mayer. Disponível emHTTP://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.2010


Houve, porém, o julgamento da ADIn 493-DF que, durante certoperíodo, serviu <strong>de</strong> orientação, para outras <strong>de</strong>cisões. Nesta oportunida<strong>de</strong>, oTribunal negou a aplicação dos dispositivos contidos na Medida Provisória 94<strong>de</strong> 1991, posteriormente, convertida na Lei 8177/91, que alteraram a forma <strong>de</strong>atualização do valor dos saldos <strong>de</strong>vedores e das prestações, a partir <strong>de</strong>fevereiro <strong>de</strong> 1991, em <strong>contratos</strong> celebrados perante o Sistema Financeiro <strong>de</strong>Habitação.Segundo Ministro Moreira Alves:Sendo as partes contratantes entes privados, colocados juridicamenteem plano <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong>, são <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> <strong>direito</strong> privado, ainda que,<strong>de</strong> a<strong>de</strong>são, não lhe alterando essa natureza o dirigismo contratualimposto pela lei, para aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s econômico-financeirasdo sistema habitacional que está subjacente 88Sustentou, assim, o ministro em seu voto que a proteção ao<strong>direito</strong> adquirido no or<strong>de</strong>namento brasileiro não é excepcionado em razão <strong>de</strong>aplicação das <strong>de</strong>nominadas leis <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública, <strong>de</strong>stacando que “se a leialcançar os efeitos futuros <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> celebrados, anteriormente a ela, seráessa lei retroativa porque vai interferir na causa, que é um ato ou fato ocorridono passado” 89 Enten<strong>de</strong>u tratar-se <strong>de</strong> hipótese <strong>de</strong> retroativida<strong>de</strong> mínima da lei.Por meio <strong>de</strong>sta <strong>de</strong>cisão, proferida em 1992, o Tribunal, apósconcluir que TR não constitui índice <strong>de</strong> correção monetária, consi<strong>de</strong>rouinconstitucional sua aplicação como substituta da correção monetária em<strong>contratos</strong> anteriores, por ferir o <strong>direito</strong> adquirido dos mutuários, alterarem suaforma <strong>de</strong> atualização.Consi<strong>de</strong>rou, também, inconstitucionais as normas que alteraramo critério <strong>de</strong> reajuste das prestações, que antes tinha por base o aumento do88BRASIL – STF – ADIn 493 – DF – Rel. Min. Moreira Alves. Disponível em://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.201089BRASIL – STF – ADIn 493 – DF – Rel. Min. Moreira Alves. Disponível em://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.2010


salário mínimo da categoria profissional do mutuário. Assim, constou naementa:EMENTA: Ação direta <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong>.- Se a lei alcançar os efeitos futuros <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> celebradosanteriormente a ela,será essa lei retroativa (retroativida<strong>de</strong> mínima)porque vai interferir na causa, que é um ato ou fato ocorrido nopassado.- O disposto no artigo 5°, XXXVI, da Constituição F e<strong>de</strong>ral se aplica atoda e qualquer lei infraconstitucional, sem qualquer distinção entre lei<strong>de</strong> <strong>direito</strong> público e lei <strong>de</strong> <strong>direito</strong> privado, ou entre lei <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m públicae lei dispositiva. Prece<strong>de</strong>nte do S.T.F.- Ocorrência, no caso, <strong>de</strong> violação <strong>de</strong> <strong>direito</strong> adquirido. A taxareferencial não é índice <strong>de</strong> correção monetária, pois refletindo asvariações do custo primário da captação dos <strong>de</strong>pósitos a prazo fixo,não constitui índice que reflita a variação do po<strong>de</strong>r aquisitivo amoeda. Por isso, não há necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se examinar a questão <strong>de</strong>saber se as normas que alteram índice <strong>de</strong> correção monetário seaplicam imediatamente alcançando, pois as prestações futuras <strong>de</strong><strong>contratos</strong> celebrados no passado, sem violarem o disposto no artigo5°, XXXVI , da Carta Magna.-Também ofen<strong>de</strong>m o ato jurídico perfeito os dispositivos impugnadosque alteram o critério <strong>de</strong> reajuste das prestações nos <strong>contratos</strong> jácelebrado pelo sistema do Plano <strong>de</strong> Equivalência Salarial porCategoria Profissional (PES/CP).Ação direita <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> julgada proce<strong>de</strong>nte, para<strong>de</strong>clarar a inconstitucionalida<strong>de</strong> dos artigos 18, “caput” e parágrafos1° e 4°; 20; 21 e parágrafo único; 23 e parágrafos; e 24 e parágrafos,todos da Lei 8.177<strong>de</strong> 1° <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1991.Durante certo período, esta <strong>de</strong>cisão serviu <strong>de</strong> base para muitosoutros julgamentos envolvendo a questão, incluindo <strong>de</strong>cisões sobre aaplicação do Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor a <strong>contratos</strong> celebrados, emdata anterior à sua vigência, enten<strong>de</strong>ndo não ser possível sua aplicaçãoretroativa sob pena <strong>de</strong> violação do artigo 5°, XXXVI da Constituição Fe<strong>de</strong>ral.Assim, no julgamento do Recurso Extraordinário 205.999-4 SP, não admitiu aaplicação da norma contida no CDC, ainda que entendida como <strong>de</strong> or<strong>de</strong>mpública, que consi<strong>de</strong>ra nula cláusula em <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> compromisso <strong>de</strong> comprae venda e alienação fiduciária, prevendo, em razão <strong>de</strong> inadimplemento, aretenção pelo credor <strong>de</strong> todas as prestações pagas 9090Assim dispõe o art. 53 do CDC: “Art. 53 Nos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> compra e venda <strong>de</strong> móveis ouimóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias emgarantia, consi<strong>de</strong>ram-se nulas <strong>de</strong> pleno <strong>direito</strong> as cláusulas que estabeleçam a perda total dasprestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear aresolução do contrato e a retomada do produto alienado.” (BRASIL, Código <strong>de</strong> Defesa doConsumidor, disponível em


Assim, se manifestou o Ministro Moreira Alves:(...) se a cláusula relativa à rescisão com a perda <strong>de</strong> todas as quantias jápagas constava do contrato celebrado anteriormente ao Código <strong>de</strong> Defesa doConsumidor, ainda, quando a rescisão tenha ocorrido após a entrada emvigor <strong>de</strong>ste, a aplicação <strong>de</strong>le para se <strong>de</strong>clarar nula a rescisão feita <strong>de</strong> acordocom aquela cláusula fere, sem dúvida alguma, o ato jurídico perfeito,porquanto a modificação dos efeitos futuros <strong>de</strong> ato jurídico perfeito caracterizaa hipótese <strong>de</strong> retroativida<strong>de</strong> mínima que também é alcançada pelo dispostono art. 5° XXXVi, da Carta Magna 91Este entendimento acabou, porém, sendo alterado, passando oTribunal a conferir outro tratamento à questão da aplicação <strong>de</strong> leis <strong>de</strong> or<strong>de</strong>mpública aos <strong>contratos</strong> em curso, aplicando a teoria da imprevisão e voltando aaplicar a tese da inoponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>direito</strong> adquirido em face <strong>de</strong> modificaçãodo padrão da moeda, com base na doutrina <strong>de</strong> Roubier sobre aplicaçãoimediata <strong>de</strong> normas sobre estatuto legal.Assim, <strong>de</strong>cidindo casos envolvendo correção relacionadas aosplanos Bresser, Verão, Collor I e II, <strong>de</strong>cidiu que não cabia aplicar a garantia do<strong>direito</strong> adquirido, porque enten<strong>de</strong>u que “as leis que modificam o valor damoeda <strong>de</strong>vem ser aplicadas aos <strong>contratos</strong> em curso porque, se assim nãofosse, elas não atingiriam o objetivo para o qual foram criadas, que é o <strong>de</strong>facilitar ao Estado e aos particulares a liberação <strong>de</strong> seus débitos, além <strong>de</strong>evitar o enriquecimento <strong>de</strong> uma parte em <strong>de</strong>trimento da outra” 92Tem esta alteração como prece<strong>de</strong>nte o julgamento no RecursoExtraordinário 141.190-2-SP 93 .Em razão do súbito e inesperado congelamento dos preços<strong>de</strong>terminado tanto pelo Plano Cruzado quanto pelo Plano Bresser, houve uma91BRASIL – STF – 205.999-4 SP Rel. Min. Moreira Alves. Disponível em://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.201092BRASIL – STF – RE 141.190-2-SP rel. p/acórdão: Min. Nelson Jobim. Disponível em://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.201093 BRASIL – STF – 141.190-2-SP Rel. p/ o acórdão Min.Nelson Jobim. Disponível em://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.2010


paralisação da inflação e conseqüente supressão da correção monetária,atingindo, com isto os <strong>contratos</strong> que continham expressa, ou implicitamente,cláusula <strong>de</strong> correção monetária pré-fixada, já que os <strong>de</strong>vedores <strong>de</strong> tais<strong>contratos</strong> continuariam a <strong>de</strong>ver uma correção monetária que não mais existia,onerando, excessivamente uma das partes contratantes.Foi, então, prevista em lei a aplicação <strong>de</strong> índice <strong>de</strong> <strong>de</strong>flação<strong>de</strong>nominado <strong>de</strong> tablita a aplicações em certificados <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósitos com correçãomonetária pré-fixada para os resgates.Enten<strong>de</strong>u o tribunal que a discussão fugia do âmbito daeconomia dos <strong>contratos</strong>, constituindo questão <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública.Amparado em Roubier, o Ministro relator originário Ilmar Galvãosustentou a tese que já havia sido aplicada pelo tribunal <strong>de</strong> aplicação imediata<strong>de</strong> normas sobre estatuto legal:Na verda<strong>de</strong>, o que o insigne mestre da faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito <strong>de</strong> Lyon nosrevelou, na esteira dos ensinamentos <strong>de</strong> Pothier, um dos precursores do“Co<strong>de</strong> Civil” <strong>de</strong> 1804, -- o qual, por volta <strong>de</strong> 1750, já escrevia que “c’este umaquestion entre les interpretes, si l’argent prete doit être rendu sur le pied qu’ilvaut au temps du payement ou sur celui qu’il valait au temps du contrat” (Éuma questão entre os intérpretes, se a prata emprestada <strong>de</strong>ve ser restituída àbase do que ela vale ao tempo do pagamento, ou sobre o que valia ao tempodo contrato (cf. A. Men<strong>de</strong>s e Edson B. Nascimento, op. E loc. Cits.) --, foi queas leis que criam ou modificam algum “estatuto legal”, seja, algum institutofundamental integrante do sistema jurídico <strong>de</strong> uma nação, tem aplicaçãoimediata, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> estar-se diante <strong>de</strong> <strong>direito</strong> resultante <strong>de</strong>contrato ou diretamente da própria lei 94Registre-se que os ministros Marco Aurélio e Celso <strong>de</strong> Melloproferiram votos divergentes no sentido da inconstitucionalida<strong>de</strong> do art. 13 doDec. Lei 2.342/87 por ofensa ao <strong>direito</strong> adquirido e ao ato jurídico perfeito Oprimeiro consi<strong>de</strong>rou que a diminuição do índice inflacionário não repercute naespécie <strong>de</strong> investimento tratada, já que “as partes, quando contrataram,submeteram-se à própria incerteza relativa à operação, arcando cada qual94BRASIL – STF – 141.190-2-SP Rel. p/ o acórdão Min.Nelson Jobim. Disponível em://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.2010


com o risco a esta inerente” 95 Já o segundo, com base no julgamento da ADIn493, afastou a tese <strong>de</strong> que a garantia constitucional do ato jurídico perfeitopo<strong>de</strong> ser mitigada em razão da retroativida<strong>de</strong> da lei nova dispondo sobrematéria <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m pública.Já o Ministro Maurício Corrêa reafirmou o entendimento contidono julgamento da ADIn 493 e se utilizou, para a solução do caso, da teoria daimprevisão, enten<strong>de</strong>ndo que a introdução <strong>de</strong> planos econômicos provocouexpressivas alterações na economia que modificaram, significativamente,qualquer tentativa <strong>de</strong> previsão antes realizada pelas partes 96Conclui-se, portanto, que o Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral se utiliza<strong>de</strong> várias teses para aplicar ou não a lei nova aos <strong>contratos</strong> em curso, nãopo<strong>de</strong>ndo se afirmar, portanto,que sua posição seja unificada.Já a Jurisprudência do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça apresentauniformida<strong>de</strong> no entendimento <strong>de</strong> que, sempre que a retroativida<strong>de</strong> da normanão ultrapasse o grau mínimo, ocorrerá aplicação imediata da lei e nãoretroativida<strong>de</strong>, conforme se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong> do julgamento do Recurso Especialque envolveu, também a discussão acerca da aplicação das tablitas já citada:DIREITO ECONOMICO. PLANO "BRESSER". MERCADO A TERMO.CONTRATOS DERISCO. APLICAÇÃO DA "TABLITA". INCIDENCIA DO ART. 13 DODECRETO-LEI2.335/87 NÃO EXCEPCIONADA PELO ART. 16 DO MESMODIPLOMA.INOCORRENCIA DE RETROATIVIDADE DA NORMA. EMBARGOSDE DIVERGENCIACONHECIDOS MAS DESPROVIDOS.I - A OCORRENCIA EM CONTRATO DOS PRESSUPOSTOSABSTRATOS CONTIDOSNA NORMA IMPÕE A ATUAÇÃO DO COMANDO LEGAL NELACONTIDO, DE SORTEQUE, PREENCHENDO OS CONTRATOS DO MERCADO FUTUROOS REQUISITOS95 BRASIL – STF – 141.190-2-SP Rel. p/ o acórdão Min.Nelson Jobim. Disponível em://www.stf.gov.br. Acesso em 12.09.201096 Segundo o Ministro,


FIXADOS NO ART. 13 DO DECRETO-LEI 2.335/87, A APLICAÇÃODA TABLITAAOS SEUS VALORES DE LIQUIDAÇÃO NÃO PODERIA SERAFASTADA.II - O ART. 16 DO MESMO DIPLOMA, NÃO EXCEPCIONANDODAQUELE COMANDOOS MENCIONADOS CONTRATOS, APENAS ESCLARECEU QUE AREGULAMENTAÇÃO DOMERCADO FINANCEIRO E DO SISTEMA FINANCEIRO DAHABITAÇÃO, EXERCIDAPELO CONSELHO MONETARIO NACIONAL, TERIA DE SERADEQUADA A LEGISLAÇÃOINSTITUIDORA DA NOVA POLITICA ECONOMICA.III - A JURISPRUDENCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇATEM SIDOENFATICA E UNISSONA NO SENTIDO DE QUE A INCIDENCIAIMEDIATA DENORMAS DE DIREITO ECONOMICO NOS NEGOCIOSAVENÇADOS ANTES DE SUAVIGENCIA, E COM PREVISÃO DE SALVAGUARDAINFLACIONARIA QUE SE PROJETANO FUTURO, NÃO IMPORTA EM RETROAÇÃO, POR NÃOAFETAR SITUAÇÕESJURIDICAS CONSOLIDADAS.Enfim, da análise feita, po<strong>de</strong> ser concluir que o judiciárioresolve as questões <strong>de</strong> <strong>direito</strong> intertemporal caso a caso, fundado em valorescomo o interesse geral, a or<strong>de</strong>m pública, a estabilida<strong>de</strong> das relações,po<strong>de</strong>ndo, inclusive se concluir que o princípio da irretroativida<strong>de</strong> da lei nosistema brasileiro não é absoluto, ficando às partes sujeitas a ver a alteraçãodo conteúdo dos pactos celebrados em razão da superveniência <strong>de</strong> leis.5-3-O ART. 2035 DO CÓDIGO CIVILQuestão não analisada, amplamente, ainda, pelos tribunaissuperiores diz respeito à norma do artigo 2035 97 do Código Civil, ao entrar emvigor e prever uma suposta retroativida<strong>de</strong>, foi <strong>de</strong> encontro às diversasinterpretações ora analisadas.A abordagem da questão po<strong>de</strong> ser feita com a análise sobre apossibilida<strong>de</strong> do Código regular os efeitos futuros ou situações jurídicas que jáexistiam antes do início <strong>de</strong> sua vigência, assim como modificar <strong>de</strong>terminados97 Art. 2.035. A valida<strong>de</strong> dos negócios e <strong>de</strong>mais atos jurídicos, constituídos antes da entradaem vigor <strong>de</strong>ste Código, obe<strong>de</strong>ce ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, masos seus efeitos, produzidos após a vigência <strong>de</strong>ste Código, aos preceitos <strong>de</strong>le se subordinam,salvo se houver sido prevista pelas partes <strong>de</strong>terminada forma <strong>de</strong> execução.


efeitos produzidos no passado e, ainda permitir a criação <strong>de</strong> situações combase em fatos ocorridos, sem que fira a vedação <strong>de</strong> retroativida<strong>de</strong> da leiprevista na Constituição Fe<strong>de</strong>ral.Não se manifestando, ainda, o Supremo sobre aconstitucionalida<strong>de</strong> da norma, a discussão fica com a doutrina, que apresentainterpretações diversas. Assim, conforme Mário Luiz Delgado:Como se vê, a idéia <strong>de</strong> que o contrato, como negócio jurídicorealizado sob o império <strong>de</strong> uma lei enquadra-se no conceito <strong>de</strong> “atojurídico perfeito” para os fins <strong>de</strong> se furtar à retroativida<strong>de</strong> da lei nova,é assimilada pelo Código, que inclui, sob a sua regência, tãosomente,os efeitos futuros dos <strong>contratos</strong> anteriores, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> queproduzidos após a vigência da lei nova e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que as partes nãohajam previsto <strong>de</strong>terminada forma <strong>de</strong> execução. Caso os contratantestenham feito essa previsão, afasta-se a incidência imediata da lei.Fica assegurada, assim, a pós-ativida<strong>de</strong> do Código anterior no quetange aos requisitos <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> dos <strong>contratos</strong> e à eficácia imediatado novo Código quanto aos efeitos futuros <strong>de</strong>sses negóciosjurídicos 98Em entendimento contrário Antônio Jeová dos Santos:O legislador tentou resolver um problema e criou vários outros.A primeira parte do art. 2035 contém o óbvio. <strong>Os</strong> atos jurídicosconsolidados antes da entrada em vigor do Código Civil <strong>de</strong>2002 estarão sob a égi<strong>de</strong> da lei anterior. A segunda parte, quetentou resolver problema grave e sério <strong>de</strong> <strong>direito</strong> intertemporal,não alcançou o fim <strong>de</strong>sejado. Ao preten<strong>de</strong>r que os efeitos dosnegócios jurídicos ocorridos <strong>de</strong>pois da vigência do novelCódigo, a ele se subordinem, vulnerou o legislador o art. 5º,XXXVI, da Constituição da República. 99corte suprema.Resta, assim, aguardar a opção a ser adotada pela5-4- DO DIÁLOGO DAS FONTESDefinida a aplicação <strong>de</strong> uma lei superveniente a <strong>contratos</strong> emcurso, outra questão surge, no que diz respeito à incidência <strong>de</strong> normasdiversas para uma <strong>de</strong>terminada situação jurídica.98 Régis, Mário Luiz Delgado. Problemas <strong>de</strong> <strong>direito</strong> intertemporal no código civil: doutrina ejurisprudência/ Mário Luiz <strong>de</strong>lgado Régis – São Paulo. Saraiva, 2004.99 SANTOS, Antônio Jeová. Direito Intertemporal e o novo Código Civil: aplicações da Lei10.406/2002. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p.61.


Não raras são as hipóteses em que para uma mesma relaçãojurídica, há a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação <strong>de</strong> normas contidas em leis diversassem que o critério temporal, da hierarquia, ou da especifida<strong>de</strong> da lei resolva aquestão.Assim, ocorreu, por exemplo, com a entrada em vigor do Código<strong>de</strong> Defesa do Consumidor, sem que tenha revogado legislação especialreferente a <strong>de</strong>terminadas ativida<strong>de</strong>s que passaram a ser tratada pelo códigocomo, no caso <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> <strong>de</strong> transporte terrestre e aéreo, planos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,seguros, etc.Em casos como estes, tem a doutrina e a jurisprudência sevalido da construção do diálogo das fontes, sendo interessante, para tratar daquestão, a análise da aplicação do Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor e doCódigo Civil <strong>de</strong> 2002.5-4-1- O CÓDIGO CIVIL E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDORCom a entrada em vigor do Código Civil <strong>de</strong> 2002, porém,algumas normas se mostraram mais benéficas do que os dispositivosprevistos no Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor para casos semelhantes.Em uma primeira análise, optando-se pela simples aplicação danorma mais favorável ao consumidor, parece tranqüila a solução da questão.Ao que parece, entretanto, o problema carece <strong>de</strong> maior análise necessitandoreclamando para solução uma melhor fundamentação eis que a hipótese não<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser um conflitos <strong>de</strong> normas. Seria o diálogo das fontes o mo<strong>de</strong>lo maisa<strong>de</strong>quado?Para análise da questão, serão trazidos ao estudo uma hipótese<strong>de</strong> aparente conflito <strong>de</strong> normas contidas nos dois diplomas, mostrando-se osdispositivos do Código Civil mais favoráveis que aqueles do Código <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesado Consumidor.Trata-se da análise das normas que tratam do vício do produto edo serviço e as normas que prevêem o vício redibitório.


Com o objetivo <strong>de</strong> assegurar que os produtos e serviçoscolocados no mercado atendam às necessida<strong>de</strong>s dos consumidores, notocante à qualida<strong>de</strong> e ao atendimento <strong>de</strong> sua finalida<strong>de</strong>, tal como ofertadapelos consumidores, o Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor regula a<strong>de</strong>nominada responsabilida<strong>de</strong> por vício do produto e do serviço.Paralelamente, permanece no bojo do Código Civil <strong>de</strong> 2002, adisciplina dos vícios redibitórios, com algumas alterações acerca dotratamento que instituto tinha no Código Civil <strong>de</strong> 1916, principalmente no quediz respeito aos prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais.Parece claro que a inclusão da responsabilida<strong>de</strong> por vício doproduto e do serviço na Lei 8078/90 teve o propósito <strong>de</strong> garantir normas maisfavoráveis ao consumidor vulnerável, sanando as <strong>de</strong>ficiências apontadas peladoutrina e pela jurisprudência das normas do Código Civil <strong>de</strong> 1916, na tutelado <strong>direito</strong> do comprador.código 100 :Previa a norma contida no caput do art. 1.101 do antigoArt. 1.101. A coisa recebida em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> contrato comutativo po<strong>de</strong>ser enjeitada por vícios ou <strong>de</strong>feitos ocultos, que a tornem imprópriaao uso a que é <strong>de</strong>stinada ou lhe diminuam o valor.Presente o vício ou <strong>de</strong>feito oculto tinha o adquirente a opção <strong>de</strong>reclamar o abatimento do preço ao invés <strong>de</strong> rejeitar a coisa, conforme lheassegurava o artigo 1105: 101Art. 1.105. Em vez <strong>de</strong> rejeitar a coisa, redibindo o contrato po<strong>de</strong> oadquirente reclamar abatimento no preço.100 BRASIL. Código Civil. Lei n. 10406, <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2002. Va<strong>de</strong> Mecum. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2008.101 BRASIL. Código Civil 2008


Para exercer uma ou outra opção, tinha o prazo <strong>de</strong> 15 dias se acoisa fosse móvel e <strong>de</strong> seis meses se fosse imóvel, conforme previsto noartigo 178, § 2° e 5º, IV, respectivamente.O Código <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa do Consumidor, em seu artigo 18, trouxe asnormas referentes à responsabilida<strong>de</strong> do fornecedor pelo vício do produto edo serviço, estabelecendo regime próprio em observância ao seu estado <strong>de</strong>vulnerabilida<strong>de</strong> 102 :Art. 18. <strong>Os</strong> fornecedores <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> consumo duráveis ou nãoduráveis respon<strong>de</strong>m solidariamente pelos vícios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ouquantida<strong>de</strong> que os tornem impróprios ou ina<strong>de</strong>quados ao consumoa que se <strong>de</strong>stinam ou lhes diminuam o valor, assim como poraqueles <strong>de</strong>correntes da disparida<strong>de</strong>, com as indicações constantesdo recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária,respeitadas as variações <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> sua natureza, po<strong>de</strong>ndo oconsumidor exigir a substituição das partes viciadas.Em certos aspectos, as normas do Código <strong>de</strong> Defesa doConsumidor são mais benéficas, conforme apontado pela a doutrina 103O CDC, objetivando uma tutela mais eficaz em favor do consumidor,amplia o conceito <strong>de</strong> vício, impõe obrigação solidária entre todos osfornecedores participantes da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> produção ecomercialização do produto, impossibilita, em qualquer hipótese, aexoneração contratual da responsabilida<strong>de</strong> do fornecedor e ofereceuma terceira alternativa ao comprador em caso <strong>de</strong> vício: asubstituição do produto por outro da mesma espécie.No que diz respeito aos prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais assegurados aoconsumidor, a Lei 8078/90 também trouxe mudanças em relação àqueles102BRASIL. Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor. Lei 8078/90. Va<strong>de</strong> Mecum. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2008.103Benjamim, Antônio Herman V. Manual <strong>de</strong> Direito do Consumidor/Antônio HermanBenjamin, Cláudia Lima Marques, Leonardo Roscoe Bessa; apresentação Cláudia LimaMarques. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.


previstos no Código Civil <strong>de</strong> 1916, prevendo no artigo 26 o prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial<strong>de</strong> 30 dias para reclamar vícios em produtos não duráveis e <strong>de</strong> 90 dias parareclamação <strong>de</strong> vícios em produtos duráveis.Como inovação trouxe, ainda, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contagem doprazo do conhecimento do vício se este for oculto.Pois bem; o Código Civil <strong>de</strong> 2002, ao regular os víciosredibitórios, manteve, em linha gerais, a estrutura do instituto tal como nocódigo anterior:Art. 441. A coisa recebida em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> contrato comutativo po<strong>de</strong>ser enjeitada por vícios ou <strong>de</strong>feitos ocultos, que a tornem imprópriaao uso a que é <strong>de</strong>stinada, ou lhe diminuam o valor.Parágrafo único. É aplicável a disposição <strong>de</strong>ste artigo às doaçõesonerosas.Art. 442. Em vez <strong>de</strong> rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441),po<strong>de</strong> o adquirente reclamar abatimento no preço 104Alteração importante se <strong>de</strong>u em relação aos prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciaispara o adquirente exercer seu <strong>direito</strong> <strong>de</strong> restituir a coisa ou reclamar oabatimento no preço:Art. 445. O adquirente <strong>de</strong>cai do <strong>direito</strong> <strong>de</strong> obter a redibição ouabatimento no preço no prazo <strong>de</strong> trinta dias se a coisa for móvel, e <strong>de</strong>um ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava naposse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à meta<strong>de</strong>.§ 1 o Quando o vício, por sua natureza, só pu<strong>de</strong>r ser conhecido maistar<strong>de</strong>, o prazo contar-se-á do momento em que <strong>de</strong>le tiver ciência, atéo prazo máximo <strong>de</strong> cento e oitenta dias, em se tratando <strong>de</strong> bensmóveis; e <strong>de</strong> um ano, para os imóveis. 105O que se percebe, então, é a garantia <strong>de</strong> um prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncialmais favorável para o caso <strong>de</strong> vícios redibitórios aplicável às relações travadasentre iguais do que aquele assegurado para a hipótese <strong>de</strong> vício <strong>de</strong> produto emuma relação <strong>de</strong> consumo.104 BRASIL. Código Civil 2008105 BRASIL. Código Civil 2008


Como resolver a questão? Aplica-se, simplesmente, a normamais favorável ao consumidor?A questão que se impõe, portanto, é se seria possível aaplicação simultânea <strong>de</strong> institutos do Código Civil e do Código <strong>de</strong> Defesa doConsumidor numa espécie <strong>de</strong> regime misto em favor da parte vulnerável, emuma <strong>de</strong>terminada relação jurídicaImportante salientar que há entendimento da doutrina 106 ,especificamente quanto à questão dos vícios do produto e dos víciosredibitórios, que a norma contida no artigo 26 do CDC é mais benéficajustificando sua posição com a utilização do “critério da vida útil”:“Se o vício é oculto, porque se manifesta somente com o uso,experimentação do produto ou porque se evi<strong>de</strong>nciará muito tempoapós a tradição, o limite temporal da garantia legal está em aberto,seu termo inicial, segundo o § 3º do art. 26, é a <strong>de</strong>scoberta do vício.Somente a partir da <strong>de</strong>scoberta do vício, (talvez meses ou anos apóso contrato) é que passarão a correr os 30 ou 90 dias. Será, então, anova garantia eterna? Não, os bens <strong>de</strong> consumo possuem umadurabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada. É a chamada vida útil do produto”Desta forma, diferentemente da norma prevista no Código Civil<strong>de</strong> 2002 que limita o prazo para surgimento do <strong>de</strong>feito em até cento e oitentadias, em se tratando <strong>de</strong> bens móveis; e em até um ano, para os imóveis; poresta interpretação, para o caso <strong>de</strong> vícios ocultos, (em um produto objeto <strong>de</strong>um contrato <strong>de</strong> compra e venda celebrado entre consumidor e fornecedor, porexemplo), não haveria regra objetiva acerca do prazo máximo previsto para osurgimento do <strong>de</strong>feito e para o início da fluência do prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> 30ou 90 dias.Não parece a solução mais a<strong>de</strong>quada, a se consi<strong>de</strong>rar aspeculiarida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada produto e a possibilida<strong>de</strong> das garantias seesten<strong>de</strong>rem, conforme o caso, a longos períodos ficando o fornecedor amercê, inclusive <strong>de</strong> abusos praticados pelo consumidor.106 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos...p. 1196-1197


Outra solução apontada pela doutrina seria a observância dodiálogo das fontes citada como um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nação das diversasfontes legislativas, no intuito <strong>de</strong> preservar o tratamento diferenciado aoconsumidor.Antes <strong>de</strong> tratá-la, porém, seria válida apontar outra situação emque as normas contidas no Código Civil <strong>de</strong>spontam como mais favoráveis aoconsumidor do que aquelas previstas pelo Código <strong>de</strong> Defesa do Consumidor.Ainda na parte que trata da responsabilida<strong>de</strong> por vício, prevê alegislação do consumidor os chamados “vícios <strong>de</strong> quantida<strong>de</strong>” que consistemna possibilida<strong>de</strong> do consumidor, quando da aquisição <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado produto,postular o abatimento do preço, a complementação do peso ou medida, asubstituição do produto adquirido por outro da mesma espécie, marca oumo<strong>de</strong>lo, ou a restituição da quantia paga mais perdas e danos.Prevalece aqui, também, o prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> 30 dias parabens não duráveis e <strong>de</strong> 90 dias para bens duráveis.Tal previsão guarda certa semelhança com a chamada venda admensuram pela qual a <strong>de</strong>terminação da área <strong>de</strong> um imóvel constitui elemento<strong>de</strong>terminante para a fixação <strong>de</strong> seu preço, tendo o comprador o <strong>direito</strong> <strong>de</strong>exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o <strong>de</strong> reclamar aresolução do contrato ou abatimento proporcional do preço, sendo, para tanto,previsto o prazo <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> um ano a contar do registro.Aqui, também, <strong>de</strong>sponta a possibilida<strong>de</strong> do prazo previsto noCódigo Civil ser mais favorável ao consumidor.Passa-se, aqui, então, a se analisar a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicaçãodo diálogo das fontes como meio <strong>de</strong> invocar normas <strong>de</strong> diversos diplomasconcomitantemente ao código <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa do consumidor para a sua tutela.


O mo<strong>de</strong>lo apresentado tem como propósito coor<strong>de</strong>nação eaplicação <strong>de</strong> diversas fontes legislativas <strong>de</strong>ntro do or<strong>de</strong>namento jurídico.Conforme Cláudia Lima Marques (2005, p.665) 107Diálogo das fontes é uma expressão retórica (e semiótica = contasua própria finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> impor duas lógicas, <strong>de</strong> aplicar simultâneae coerentemente duas leis). Esta expressão, que já foi citada peloSupremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral na ADIN dos bancos (ADIn 2.591, votodo Min. Joaquim Barbosa) foi criada por Erik Jaime justamente parase contrapor à expressão antes usada, ou seja, <strong>de</strong> conflitos <strong>de</strong> leisno tempo.[...]Interessante observar que também Jayme procura na Constituiçãoa resposta para as antinomias mo<strong>de</strong>rnas e a complexida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sistemas legais <strong>de</strong>scodificados. É o que parece acontecer no Brasil,on<strong>de</strong> a Constituição <strong>de</strong> 1988 prima pela lista <strong>de</strong> <strong>direito</strong>sfundamentais, <strong>de</strong>ntre os quais se <strong>de</strong>staca o <strong>de</strong>finido pelo incisoXXXII do art. 5°: “ O Estado promoverá, na forma da lei, a <strong>de</strong>fesa doconsumidor”. O art. 48 das Disposições Transitórias da ConstituiçãoFe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988 or<strong>de</strong>nou ao legislador ordinário organizar umCódigo <strong>de</strong> Defesa do Consumidor em plena era da <strong>de</strong>scodificaçãoA teoria, em outras palavras, para a solução do caso concreto,busca um diálogo entre normas diferentes, para que, ao invés da exclusão <strong>de</strong>uma <strong>de</strong>las, prevaleça a aplicação simultânea e harmoniosa <strong>de</strong> ambas.Afasta, <strong>de</strong>sta forma, a aplicação dos critérios <strong>de</strong> hierarquia,cronologia e especialida<strong>de</strong> da norma, por meio dos quais o intérprete eaplicador do Direito <strong>de</strong>ve escolher pela prevalência <strong>de</strong> apenas uma dasnormas que estão em conflito.De fato, tem-se aqui a mesma premissa <strong>de</strong> que se parte parauma visão integrada do or<strong>de</strong>namento jurídico, <strong>de</strong>vendo este compor um únicosistema, caracterizado pela idéia <strong>de</strong> a<strong>de</strong>quação e unida<strong>de</strong> conforme as idéias<strong>de</strong> Canaris: 108Longe <strong>de</strong> ser uma aberração, como preten<strong>de</strong>m os críticos dopensamento sistemático, a idéia do sistema jurídico justifica-se apartir <strong>de</strong> um dos mais elevados valores do Direito, nomeadamente do107 Benjamim, Antônio Herman V. Manual <strong>de</strong> Direito do Consumidor...108 CANARIS, Claus-Wilhem. Pensamento sistemático e conceito <strong>de</strong> sistema na ciência doDireito. 2. ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1996. p. 22.


princípio da justiça e das suas concretizações no princípio daigualda<strong>de</strong> e na tendência para a generalização. Acontece ainda queoutro valor supremo, a segurança jurídica aponta na mesma direcção.Também ela pressiona, em todas as suas manifestações – seja como<strong>de</strong>terminabilida<strong>de</strong> e previsibilida<strong>de</strong> do Direito, como estabilida<strong>de</strong> econtinuida<strong>de</strong> da legislação e da jurisprudência ou simplesmente comopraticabilida<strong>de</strong> da aplicação do Direito – para a formação <strong>de</strong> umsistema, pois todos esses postulados po<strong>de</strong>m ser muito melhorprosseguidos através <strong>de</strong> um Direito a<strong>de</strong>quadamente or<strong>de</strong>nado,dominado por poucos e alcançáveis princípios, portanto, um <strong>direito</strong>or<strong>de</strong>nado em sistema, do que por uma multiplicida<strong>de</strong> inabarcável <strong>de</strong>normas singulares <strong>de</strong>sconexas e em <strong>de</strong>masiado fácil contradiçãoumas com as outras. Assim, no pensamento sistemático radica, <strong>de</strong>facto, imediatamente, na idéia <strong>de</strong> Direito (como o conjunto dosvalores jurídicos mais elevados). Ele é, por conseqüência, imanentecada Direito positivo porque e na medida em que este representeuma sua concretização (numa forma historicamente <strong>de</strong>terminada) enão se queda, por isso, como mero postulado, antes sendo sempre,também, pressuposto <strong>de</strong> todo o Direito e <strong>de</strong> todo o pensamentojurídico e ainda que a a<strong>de</strong>quação e a unida<strong>de</strong> também comfreqüência possam realizar-se <strong>de</strong> modofragmentado.Conseqüentemente, o <strong>direito</strong> privado, quiçá oor<strong>de</strong>namento jurídico como um todo, não alberga contradiçõesinternas, havendo mecanismos <strong>de</strong> solução dos conflitos entrenormas, que, até então, é realizado <strong>de</strong> maneira que se excluicompulsoriamente apenas uma das normas.O primeiro dos critériosclássicos <strong>de</strong> solução do conflito <strong>de</strong> normas é o hierárquico, no qualuma norma superior prevalece sobre a inferior. O segundo critério é,então, o cronológico, no qual a norma posterior revoga a anterior. Porfim, o último critério é o da especialida<strong>de</strong>, no qual a norma especialafasta a aplicação da norma geral.O mo<strong>de</strong>lo do diálogo das fontes é, <strong>de</strong> fato, em prol da integraçãodas normas que compõem o or<strong>de</strong>namento jurídico, <strong>de</strong> uma forma harmônica,resolvendo-se, assim, conflitos sem que se apele para os critérios clássicoscomo o da especialida<strong>de</strong> que, por certo po<strong>de</strong>ria ser suscitado para o examedas questões aqui tratadasRessalte-se que a teoria já vem sendo citada na jurisprudência,po<strong>de</strong>ndo-se apontar como caso emblemático a <strong>de</strong>cisão proferida nojulgamento da ADIn 2591 que concluiu pela constitucionalida<strong>de</strong> da aplicaçãodo CDC a todas as ativida<strong>de</strong>s bancárias. Em seu voto o Ministro JoaquimBarbosa Moreira cita a teoria 109 :A Emenda Constitucional 40, na medida em que conferiu maiorvagueza à disciplina constitucional do sistema financeiro (dando nova109 BRASIL. Supremo Tribunal Fe<strong>de</strong>ral. Ação Direta <strong>de</strong> Inconstitucionalida<strong>de</strong> n.º 4591.Requerente: Confe<strong>de</strong>ração Nacional do Sistema Financeiro Consif. Relator: Ministro ErroGrau


edação ao art.192) tornou, ainda maior este campo que a ProfessoraCláudia Lima Marques <strong>de</strong>nominou “diálogos entre fontes” – no casoentre a lei ordinária (que disciplina as relações consumeristas) e asleis complementares (que disciplinam o sistema financeiro nacional).Não há, a priori, por que falar em exclusão formal entre essasespécies normativas, mas, sim, em “influências recíprocas”, emaplicação conjunta das duas normas ao mesmo tempo e ao mesmocaso, seja complementarmente, seja, subsidiariamente, sejapermitindo a opção voluntária das partes sobre a fonte prevalente.Como visto, são, <strong>de</strong> fato, fortes, os fundamentos para a soluçãodos conflitos ora tratados por meio <strong>de</strong>ste mo<strong>de</strong>lo.Por outro lado, porém, é certo que o tema necessita <strong>de</strong>aprofundamento maior, para que não se busque, a todo preço, uma proteçãoaos sujeitos mais vulneráveis da relação contratual, trazendo, com isto, ônusinsuportáveis aos fornecedores, o que não é interessante.Note-se que, em muitos casos, o que se vê é uma mistura <strong>de</strong>regimes, “pinçando-se” as normas mais favoráveis ao consumidor, em cadalei, <strong>de</strong>ixando-se <strong>de</strong> aplicar as normas que favorecem o consumidor, gerando,em certa medida, insegurança jurídica no exercício da ativida<strong>de</strong> econômica.6- OS CONTRATOS INCOMPLETOS6-1-O MOVIMENTO “LAW NA ECONOMICS”As ciências econômicas têm como objeto <strong>de</strong> estudo a ativida<strong>de</strong>produtiva com a análise da alocação <strong>de</strong> recursos conforme as leis e osmecanismos <strong>de</strong> sua aplicação na realida<strong>de</strong> dos agentes econômicos.Busca a realização <strong>de</strong>sta alocação da forma mais útil possível,tendo como principal referencial a idéia <strong>de</strong> eficiência.E em busca <strong>de</strong>sta eficiência, são criados mo<strong>de</strong>los econômicosque consistem em um recorte da realida<strong>de</strong> social para se reconhecer<strong>de</strong>terminados fatores <strong>de</strong>sta realida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>nominados <strong>de</strong> variáveis, que vãoinfluenciar o comportamento dos agentes, no que diz respeito às suasescolhas. E <strong>de</strong>ntre estas variáveis encontra-se a atuação das normas jurídicassobre o comportamento dos agentes.Assim, segundo Eduardo Goulart Pimenta,


Uma análise econômica pressupõe a apreensão das opçõesentre diferentes condutas bem como dos custos, riscos ebenefícios envolvidos em cada uma <strong>de</strong>stas escolhas. Acompreensão do número <strong>de</strong> opções <strong>de</strong> conduta disponíveisaos agentes econômicos e dos incentivos que encontram emcada uma <strong>de</strong>las para a maximização <strong>de</strong> seus interesses(medidos pela relação entre seus custos e seus benefícios)somente se revela digna <strong>de</strong> credibilida<strong>de</strong> se efetuada pormeio <strong>de</strong> avaliações numericamente, mensuráveis 110O <strong>direito</strong> <strong>de</strong>ve ser entendido como um conjunto <strong>de</strong> regras quevão atuar na conduta da socieda<strong>de</strong>, buscando a efetivação <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadosvalores e <strong>de</strong>ntre eles, a eficiência na distribuição <strong>de</strong> riquezas.E para tal, po<strong>de</strong> utilizar-se <strong>de</strong> métodos relacionados à análise darealida<strong>de</strong> social empreendida pela ciência econômica, ligada à distribuição econsumo da riqueza produzida, buscando influenciar nas condutas dosagentes econômicos.Foi nos Estados Unidos, com a publicação, na década <strong>de</strong> 60, dosestudos <strong>de</strong> Ronald Coase e <strong>de</strong> Richard Posner intitulados The Problem ofSocial Cost e Economic Analysis of Law que relação o diálogo entre estasduas ciências sociais tomou maior impulso.Tomando conta da insuficiência dos instrumentos jurídicostradicionais, os autores, professores da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Chicago, passaram arecorrer à Economia como método <strong>de</strong> estudo, principalmente, sobre ainfluência da legislação no comportamento dos agentes econômicos,entendida como um instrumento <strong>de</strong> maximização e distribuição <strong>de</strong> riqueza.Seus estudos <strong>de</strong>ram origem ao movimento <strong>de</strong>nominado Law andEconomics, consi<strong>de</strong>rado entre os juristas norte-americanos um gran<strong>de</strong> avançopara a ciência jurídica do século XX.Nos países <strong>de</strong> tradição romano-germânica, a adoção da teoriamostra-se, ainda, incipiente e com muitos opositores. Segundo Rachel Sztajn,autora que se <strong>de</strong>dica ao estudo no nosso país,[ ... ] o sucesso dos diálogos não convence a um grupo <strong>de</strong>juristas. Eles se baseiam nas diferenças metodológicas entre110 PIMENTA, Eduardo Goulart. Recuperação <strong>de</strong> empresas: um estudo sistematizado da novalei <strong>de</strong> falências. São Paulo.IOB Thomson, 2006, p.15.


entendimento:os dois ramos <strong>de</strong> conhecimento, que lhes pareceminsuperáveis. Essas diferenças são mais nítidas nos países<strong>de</strong> Direito filiado à família romano-germânica-canônica, emque predominam a dogmática, a discussão e classificaçãodas fontes do <strong>direito</strong>, expostas <strong>de</strong> maneira sistemática para<strong>de</strong>senhar um conjunto coerente, que não segue ametodologia adotada pelos economistas baseada na análise<strong>de</strong> esquemas empíricos. 111Citando Daniel D. Friedman a autora combate esteTomando a Economia como po<strong>de</strong>rosa ferramenta paraanalisar normas jurídicas, em face da premissa <strong>de</strong> que aspessoas agem racionalmente, conclui-se que elasrespon<strong>de</strong>rão melhor a incentivos externos que induzam acertos comportamentos mediante sistema <strong>de</strong> prêmios epunições. Ora, se a legislação é um <strong>de</strong>sses estímulos,externos, quanto mais as forem as normas positivadasa<strong>de</strong>rentes às instituições sociais mais eficiente será osistema. 112Desta forma, é na análise da racionalida<strong>de</strong> dos agentes,postulado econômico, que se busca a maximização <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong>s e eficiênciana alocação <strong>de</strong> riquezas no meio social.A<strong>de</strong>mais, “o <strong>direito</strong> é um sistema aberto que influi e éinfluenciado pelas instituições sociais existentes na comunida<strong>de</strong> em que seaplica” 113 .Em relação ao fenômeno contratual, o interesse da análiseeconômica do <strong>direito</strong> mostra-se natural e evi<strong>de</strong>nte, eis que instituto,intimamente ligado à produção e circulação <strong>de</strong> riqueza e à divisão do trabalhono mercado.Assim,A análise econômica do contrato preten<strong>de</strong> ser complementarda análise jurídica, fazendo ressaltar o escopo utilitário quepresi<strong>de</strong>, quase invariavelmente, à <strong>de</strong>liberação <strong>de</strong> contratar, e111 STAJN, Rachel. Law and economics. Direito & economia. Análise econômica do <strong>direito</strong> edas organizações. Rio <strong>de</strong> Janeiro. Campus, 2005, p. 75.112 STAJN, 2005, p. 75.113 STAJN, 2005, p. 81.


fazendo recair uma especial atenção nos efeitos geradores<strong>de</strong> riqueza que po<strong>de</strong>m associar-se àquele acordo <strong>de</strong>coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> condutas, efeitos que o transformam emveículo <strong>de</strong> consumação e permuta <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong>s. São visõesque não se excluem nem <strong>de</strong>smentem: por exemplo, não é <strong>de</strong>modo algum irrelevante para a análise econômica que ocarácter vinculativo do contrato resulte <strong>de</strong> uma intençãojurídica <strong>de</strong> respeito pela autonomia moral dos promitentes, ou<strong>de</strong> objectivos <strong>de</strong> prevenção do dano que a <strong>de</strong>svinculaçãopo<strong>de</strong>ria causar à confiança dos credores, simplesmente, asabordagens econômicas preferem incidir, seja na utilida<strong>de</strong>criada pelas trocas consumadas (admitindo assim que hajahipóteses <strong>de</strong> <strong>de</strong>svinculação eficiente), seja no carácterincentivador que o ex ante revestirá a adstrição jurídica«forte» às obrigações contratuais, fazendo neste segundocaso ressaltar a utilida<strong>de</strong> imediatamente criada pela própriavinculação (o valor da «confiança»), que suplementará autilida<strong>de</strong> a gerar futuramente pela consumação das trocasque sejam objecto contratual 114Foi, somente, a partir do final dos anos 60 que esta interação sefez <strong>de</strong> forma mais significativa, a partir da constatação da existência <strong>de</strong>elementos que impõem custos às transações, mais especificamente, aconsi<strong>de</strong>ração da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um dos agentes <strong>de</strong>ter informações que aoutra parte não tinha, o que foi <strong>de</strong>finido como informação assimétrica.Assim, verificando-se que a contratação é uma ativida<strong>de</strong>custosa, necessário o estudo <strong>de</strong> mecanismos para mitigar estes custos emprol do <strong>de</strong>sempenho econômico.Em face disso, algumas teorias, foram formuladas, tendo comoponto comum, a idéia <strong>de</strong> que o contrato é basicamente, consi<strong>de</strong>rado como umprojetor <strong>de</strong> trocas, que terá em sua essência uma promessa, significando“uma maneira <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nar as transações provendo incentivos para osagentes atuarem <strong>de</strong> maneira coor<strong>de</strong>nada na produção, o que permiteplanejamento <strong>de</strong> longo prazo e, em especial, permitindo que agentesin<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes tenham incentivos para se engajarem em esforços conjuntos<strong>de</strong> produção” 115114 ARAÚJO, Fernando. Teoria econômica do Contrato. Almedina. Lisboa. 2007, p. 14.115 ZYLBERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel. Direito e Economia. Análise econômica doDireito e das organizações. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Elsevier, 2005.


É i<strong>de</strong>ntificado por uma prática jurídica ligada à or<strong>de</strong>m <strong>de</strong>mercado <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada socieda<strong>de</strong> pela qual se estipula um acordo <strong>de</strong>condutas, baseado na pon<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> custos e riscos.São formuladas, então, algumas teorias baseadas, sempre naexistência <strong>de</strong> custos para a elaboração e manutenção dos <strong>contratos</strong>,principalmente, em razão das contingências a que estão sujeitosPo<strong>de</strong>-se falar, assim, em custos <strong>de</strong> redação, custos <strong>de</strong> disciplinacontratual e contingências imprevistas 116Não se limitam, assim, a dispêndios financeiros, incluindo-se oesforço com a procura <strong>de</strong> bens ou serviços no mercado, a análise comparativa<strong>de</strong> preços, a segurança quanto ao adimplemento da operação pelas partes, acerteza <strong>de</strong> que o adimplemento será perfeito e a tempo, a busca por garantiaspara este adimplemento, a redação dos instrumentos contratuais, etc.Compreen<strong>de</strong>, portanto, todos os esforços cuidados e tempo gasto <strong>de</strong>s<strong>de</strong> oinício da busca por <strong>de</strong>terminado bem, a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> efetuar a operação e ocumprimento satisfatório das obrigações assumidas pelos agentes. Tem a ver,mesmo com idéia <strong>de</strong> custo benefício do negócio.Conceito ligado aos custos <strong>de</strong> transação é o <strong>de</strong> assimetria <strong>de</strong>informações, <strong>de</strong>corrente, normalmente, da especialização do trabalho que vaiinterferir na divisão da informação entre os contratantes.A or<strong>de</strong>m jurídica – entendida <strong>de</strong> modo amplo, incluindo leis,práticas e recursos que o sistema judiciário possui – é umimportante <strong>de</strong>terminante do <strong>de</strong>senho dos <strong>contratos</strong> e, maisainda, da eficiência econômica <strong>de</strong>corrente da transformação<strong>de</strong> um <strong>de</strong>sejo coletivo <strong>de</strong> padrão <strong>de</strong> comportamento em açãocoletiva. 117Ligada à assimetria <strong>de</strong> informações encontra-se a teoria daagência, que aponta a existência <strong>de</strong> interesses conflitantes entre os116 ARAÚJO, 2007, p. 199.117 ZYLBERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel. Direito e Economia. Análise econômica doDireito e das organizações. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Elsevier, 2005, p. 126


contratantes, exatamente em razão <strong>de</strong>sta assimetria, surgindo as figuras doprincipal e agente, tendo este po<strong>de</strong>r sobre o comportamento e bem-estardaquele.Por força <strong>de</strong>stes conceitos, <strong>de</strong> custos <strong>de</strong> transação, <strong>de</strong>assimetria <strong>de</strong> informação, a elaboração <strong>de</strong> um contrato que consi<strong>de</strong>re todasas contingências possíveis, apresentam gran<strong>de</strong> custo para os agentes, umavez que estes têm uma racionalida<strong>de</strong> limitada.Para tanto, po<strong>de</strong>rão as partes <strong>de</strong>ixar lacunas nos pactoscelebrados substituindo o esgotamento do conteúdo substantivo contratual porum processo <strong>de</strong> ajustes e renegociações.Inseridos nestes mo<strong>de</strong>los, encontra-se a teoria dos <strong>contratos</strong>incompletos, que po<strong>de</strong>m dar uma gran<strong>de</strong> contribuição para a teoria contratual,posto que criam um mo<strong>de</strong>lo teórico com o fito <strong>de</strong> preservar a utilida<strong>de</strong> e oequilíbrio <strong>de</strong> uma relação contratual que se protrai no tempo, e, em especialem <strong>contratos</strong>, on<strong>de</strong> haja uma relação <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência entre os agentes, comoocorre com os <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong>. Assim,6-2- DEFINIÇÃOA <strong>de</strong>pendência econômica é, em especial, problemática,porque as partes não são capazes <strong>de</strong> prever todas ascontingências possíveis e incorporar as respectivassalvaguardas na ocasião da redação dos <strong>contratos</strong>. Emoutras palavras, <strong>contratos</strong> são intrinsecamente incompletos,apresentando lacunas que abrem a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ocorrência <strong>de</strong> custos <strong>de</strong>rivados da <strong>de</strong>pendência econômica.Uma vez que não é possível <strong>de</strong>senhar um contrato completo,as partes <strong>de</strong>vem criar mecanismos para lidar com ascontingências inesperadas, sendo essa, na perspectiva <strong>de</strong>alguns autores, uma das mais importantes características <strong>de</strong>um contrato. 118Não restam dúvidas que a negociação dos <strong>contratos</strong> nemsempre permite a previsão e explicitação <strong>de</strong> todo o objeto do contrato e,118 ZYLBERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel. Direito e Economia. Análise econômica doDireito e das organizações. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Elsevier, 2005, p. 128


ainda, das contingências suscetíveis capazes <strong>de</strong> interferirem no equilíbriocontratual.Por força disto, conflitos po<strong>de</strong>rão surgir durante a relaçãocontratual, mesmo que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma margem <strong>de</strong> boa-fé dos contratantes.Consi<strong>de</strong>rando o contrato como uma pon<strong>de</strong>ração entre riscos eincentivos, sua elaboração e execução po<strong>de</strong>rá se mostrar <strong>de</strong>masiadamentedispendiosa, não valendo a pena para as partes persistirem nas negociaçõesse seu resultado não for suficiente para administrá-los.A assimetria informativa e a racionalida<strong>de</strong> limitada impe<strong>de</strong>m aspartes <strong>de</strong> esgotarem o domínio das estipulações possíveis, bem como daimpossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> supervisão das condutas por elas mesmas ou por umterceiro, em face, também, da insuficiência judicial ou arbitral.O inacabamento contratual surge, então, como medida para estecenário <strong>de</strong> imperfeição e insegurança que, tornam proibitivos os custos <strong>de</strong>transação.Opõe-se, assim, à concepção <strong>de</strong> <strong>contratos</strong> completos em que hápossibilida<strong>de</strong> das partes <strong>de</strong> especificarem todas as condições e obrigaçõesajustadas, incluindo as contingências capazes <strong>de</strong> afetar a onerosida<strong>de</strong> docontrato, ressaltando-se que sua existência é contestada em face dos custos aserem suportados pelas partes. Se não impossíveis <strong>de</strong> serem redigidos, comcerteza inconvenientes serão.Em face disto, a incompletu<strong>de</strong> po<strong>de</strong>rá ser involuntária, em razãodas próprias condições estruturais, do tipo contratual o que ocorre com os<strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> e <strong>de</strong>liberada, ou estratégica, na medida em que as partes<strong>de</strong>ixam interstícios para serem explorados, posteriormente.6-3 – O PREENCHIMENTO DAS LACUNAS – SOLUÇÕES PARA OINACABAMENTO


A chamada Incomplete Contract Theory 119traz o mo<strong>de</strong>lo dos<strong>contratos</strong> incompletos po<strong>de</strong>ndo ser <strong>de</strong>finidos como “instrumentos cujo<strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> seus termos contratuais <strong>de</strong>ixam ganhos potenciais datransação irrealizados, face às informações disponíveis para os agentes epara as cortes <strong>de</strong> justiça no momento em que o <strong>de</strong>sempenho ocorre” 120Assim,Numa outra abordagem teórica, o inacabamento contratual éa resposta pragmática a um contexto econômico e jurídicoeivado <strong>de</strong> imperfeições e incertezas – é o fruto daconstatação <strong>de</strong> que talvez não valha a pena a<strong>longa</strong>r asnegociações quando as resultantes estipulações nãoerradicariam ou cobririam eficiente os riscos subsistentes, ouquando elas se tornassem insusceptíveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>sneca<strong>de</strong>arreacções tutelares a<strong>de</strong>quadas. Em termos <strong>de</strong> eficiência, dirse-áque o inacabamento se encara como uma <strong>de</strong>liberaçãoassente numa pon<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> custos, os custos do contratocompleto, <strong>de</strong> um acordo em que tivessem sido levadas emconta, no clausulado final, todas as variáveis que po<strong>de</strong>m terimpacto nas condições da relação entre as partes peladuração do acordo. 121Quando a lei fornece condições supletivas preferidas porambas as partes, elas po<strong>de</strong>m omitir essas condições nocontrato. Omitindo essas condições do contrato, as partespo<strong>de</strong>m se concentrar na negociação <strong>de</strong> outras condições.Quanto menor for o número <strong>de</strong> condições que exigem umanegociação, tanto mais barato será o processo contratual.Portanto, a lei po<strong>de</strong> poupar dinheiro para as partescontratantes fornecendo condições supletivas eficientes parapreencher lacunas existentes nos <strong>contratos</strong> [...] 122Ante tal situação <strong>de</strong>verão as partes ter consciência danecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> adaptação do programa contratual em face <strong>de</strong> alteração dascondições existentes quando da celebração do acordo.119 Segundo Fernando Araújo, foram Sanford Grossman e Oliver Hart que, em 1986,colocaram os <strong>contratos</strong> incompletos no centro das atenções dos economistas, ainda que aprimazia <strong>de</strong>va ser atribuída, em muitos aspectos, às intuições pioneiras <strong>de</strong> HerbertSimon(ARAÚJO, Fernando. Teoria econômica do Contrato. Almedina. Lisboa. 2007, p.158)120 CATEB, Alexandre Bueno; GALLO, José Alberto Albeny. Breves consi<strong>de</strong>rações sobre ateoria dos <strong>contratos</strong> incompletos. Berkeley Program in Law & Economics. Latin American andCaribbean Law and Economics Association – ALACDE. Annual Papers. Paper 050107.May/01/2007. Disponível em: acesso em07.09.2010.121 ARAÚJO, Fernando. Teoria econômica do Contrato. Almedina. Lisboa. 2007, p. 151.122 COOTER, Robert. Direito & economia/Robert Cooter, Thomas Ullen; tradução: Luís MarcosSan<strong>de</strong>r, Francisco Araújo da Costa, 5 ed. Bookman. Porto Alegre. 2010


O contrato lacunar seria entendido comoum acordo que, nos precisos termos em que ficouestabelecido, <strong>de</strong>ixa por realizar «ganhos <strong>de</strong> bem estar» entreas partes envolvidas na relação – ganhos pressupõe-se, jáperceptíveis pela informação e pela racionalida<strong>de</strong> das partesno próprio momento da celebração. O «contrato lacunar» há<strong>de</strong> resultar-se, pois, ou <strong>de</strong> uma menor atenção ou diligênciadas partes (ou <strong>de</strong> rigi<strong>de</strong>z negocial, como no caso <strong>de</strong> uma ouambas as partes negociarem <strong>de</strong> modo standardizado, semconsi<strong>de</strong>ração dos <strong>de</strong>talhes <strong>de</strong> cada situação), ou <strong>de</strong> uma<strong>de</strong>cisão, novamente unilateral ou bilateral, <strong>de</strong> inacabamentoestratégico, <strong>de</strong>ixando-se ab initio uma margem <strong>de</strong> recaptura<strong>de</strong> bem-estar, esteja ou não prevista qualquerrenegociação 123O preenchimento das lacunas passaria, portanto, pela hipótese<strong>de</strong> renegociação do pactuado, mediante concessões recíprocas com base emum <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> cooperação e, ainda por meio <strong>de</strong> integração do pactuado pelaspartes.Consi<strong>de</strong>rando, porém, a subjetivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> parte a parte e opossível oportunismo <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>las, ou <strong>de</strong> ambas, po<strong>de</strong>rá surgir a figura doagente. Além disto, a integração <strong>de</strong> suas lacunas, comumente <strong>de</strong>verá ser feitapor um terceiro. Ocorre que<strong>Os</strong> tribunais necessitam <strong>de</strong> regras para preencher lacunas em<strong>contratos</strong>. Uma teoria dos <strong>contratos</strong> <strong>de</strong>veria dar orientaçãoaos tribunais (e, através das <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong>les, às partesprivadas e a seus advogados) respon<strong>de</strong>ndo a seguintepergunta: “Como os tribunais <strong>de</strong>veriam completar as lacunasem <strong>contratos</strong>? 124Assim, o próprio conhecimento pelas partes <strong>de</strong> que o encargo <strong>de</strong>interpretação e integração do contrato será suportado por árbitros ou juízes.Isto porque po<strong>de</strong>rão ficar sujeitas a uma possível e provávelatitu<strong>de</strong> casuística baseadas na utilização <strong>de</strong> cláusulas gerais e conceitosjurídicos in<strong>de</strong>terminados.Surge, então, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>senvolver mecanismosque, mesmo diante da assimetria <strong>de</strong> informações, busque <strong>de</strong>ixar a cargo das123 ARAÚJO, Fernando. Teoria econômica do Contrato. Almedina. Lisboa. 2007, p. 157, citandoMasten, S.E. (2000), 28-29124 COOTER, Robert. Direito & economia/Robert Cooter, Thomas Ullen; tradução: Luís MarcosSan<strong>de</strong>r, Francisco Araújo da Costa, 5 ed. Bookman. Porto Alegre. 2010, p.225.


partes, ainda que, com um alinhamento das avaliações do principal e doagente.Deverá a solução se basear na cooperação mútua doscontratantes, entendida como associação para a divisão dos riscos assumidospela celebração do contrato.E para, tanto, não é outra a medida, senão a observância daboa-fé e uma tutela da confiança na relação entre as agentes, valendo-se,para tanto, <strong>de</strong> uma abordagem relacional.6-3- CONTRATOS INCOMPLETOS E CONTRATOS RELACIONAISO jurista norte americano Ian Macneil é apontado como oresponsável pela concepção da teoria dos <strong>contratos</strong> relacionais.Segundo Fernando Araújo,[...] o contrato relacional é aquele em que as partes não reduzem termosfulcrais do seu entendimento a obrigações precisamente estipuladas, porquenão po<strong>de</strong>m ou porque não querem, e se remetem a modos informais eevolutivos <strong>de</strong> resolução da infinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contingências que po<strong>de</strong>m vir ainterferir na inter<strong>de</strong>pendência dos seus interesses e no <strong>de</strong>senvolvimento dassuas condutas, afastando-se da intervenção judicial irrestrita como soluçãopara os conflitos endógenos para privilegiarem o recurso a formas alternativas<strong>de</strong> conciliação <strong>de</strong> interesses, seja as que vão emergindo da evolução darelação contratual, seja as que são oferecidas pelo quadro das normassociais. 125Sobre os <strong>contratos</strong> relacionais, necessária se faz a transcriçãoda autora Eloíza Prado <strong>de</strong> Melo (2003, p.6-7)<strong>Os</strong> <strong>contratos</strong> relacionais são <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração, por se inclinarem àscriações <strong>de</strong> relações contínuas e duradouras, on<strong>de</strong> os termos <strong>de</strong>troca são cada vez mais abertos, e as cláusulas são <strong>de</strong>regulamentação do processo <strong>de</strong> negociação contínua. Enfim,<strong>contratos</strong> relacionais englobam relações difíceis entre diversas125 ARAÚJO, Fernando. Teoria econômica do Contrato. Almedina. Lisboa. 2007, p. 394,citando Craswell, R. (2000e), 118-148


partes, on<strong>de</strong> os vínculos pessoais <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, confiança ecooperação são <strong>de</strong>terminantes.Emerso, pois, da realida<strong>de</strong> norte-americana, há quem afirme quesão os correspon<strong>de</strong>ntes aos brasileiros “<strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong> <strong>de</strong> <strong>longa</strong> duração”.Assim, Cláudia Lima Marques, ao <strong>de</strong>finir os <strong>contratos</strong> <strong>cativos</strong>:Observe-se que o realismo norte-americano <strong>de</strong>nominou estes<strong>contratos</strong> <strong>de</strong> “relacionais” (relational contracts), <strong>de</strong>stacando oselementos sociológicos que condicionam o nascimento e aNão se po<strong>de</strong> confundir, porém, <strong>contratos</strong> relacionais com<strong>contratos</strong> incompletos. “Isto porque gran<strong>de</strong> parte da doutrina sobre aincompletu<strong>de</strong> contratual, assim como ocorre nos <strong>contratos</strong> relacionais,fundamenta-se na premissa comum <strong>de</strong> que as pessoas no mercado agemracionalmente, maximizando vantagens individuais, o que po<strong>de</strong>ria sercompensado pelo aprofundamento das relações <strong>de</strong> confiança, solidarieda<strong>de</strong> ecooperação” 126 Assim, conforme Ronaldo Porto Macedo Júnior, em obra sobre otema:O objeto do contrato relacional aproxima-se, assim, <strong>de</strong> uma “miniconstituição” ou estatuto <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> ou clube queestabelece regras para a resolução <strong>de</strong> conflitos e reformulação doplanejamento 127Não há dúvidas, porém, que seus preceitos po<strong>de</strong>m ser aplicáveisaos <strong>contratos</strong> incompletos. Assim, conforme Fernando Araújo:Ora o contrato incompleto, assegurando a um nível a<strong>de</strong>quado <strong>de</strong>custos uma «estrutura <strong>de</strong> governo» verda<strong>de</strong>iramente operativa eaté uma «ponte» com outras formas <strong>de</strong> «governo» que, face aos126 CATEB, Alexandre Bueno; GALLO, José Alberto Albeny. Breves consi<strong>de</strong>rações sobre ateoria dos <strong>contratos</strong> incompletos. Berkeley Program in Law & Economics. Latin American andCaribbean Law and Economics Association – ALACDE. Annual Papers. Paper 050107.127 MACEDO Jr. Ronaldo Porto. Contratos Relacionais e <strong>de</strong>fesa do consumidor.2ed. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 133.


iscos envolvidos, possam representar, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certos limites,soluções mais eficientes do que a do completamento contratual,afigurar-se-á ser a melhor escolha, e mais ainda se levarmos emconta as virtualida<strong>de</strong>s «relacionais» que advêm da circunstância <strong>de</strong>o inacabamento ex ante apresentar abertura ex post aoajustamento «dialéctico» das posições das partes, uma vezverificadas as principais contingências susceptíveis <strong>de</strong> afectarem osresultados visados por elas 128O domínio da teoria do contrato relacional é, assim, a dos<strong>contratos</strong> complexos em que as partes, percebem, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, suaspossibilida<strong>de</strong>s e seus riscos, mas com acumulação idiossincrasias narelação 129Deverão as partes, como alternativa à ineficaz intervençãoexterna, adotarem um quadro procedimental que encontre soluções para ascontingências surgidasRonaldo Porto Macedo, sobre a importância do conceito <strong>de</strong> boaféna prática contratual contemporâneas afirma queE continua:[...] bastaria citar o crescimento da importância do conceito <strong>de</strong>boa-fé no <strong>direito</strong> contratual do “Common Law” nos últimosanos, bem como a existência <strong>de</strong> previsões expressas noscódigos <strong>de</strong> <strong>direito</strong> privado da maioria dos países <strong>de</strong> tradiçãojurídica continental européia (“Civil Law”), como a França, aAlemanha, a Itália, a Suíça etc e sua recente revalorização 130Há elementos que evi<strong>de</strong>nciam a importância da boa-fé <strong>de</strong>ntroda perspectiva relacional, notadamente o fato <strong>de</strong> que, emprimeiro lugar, ela lembra a incompletu<strong>de</strong> dos <strong>contratos</strong>, oslimites da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previsão humana, os custos eameaça à solidarieda<strong>de</strong> e as barreiras insuperáveis para acomunicação perfeita e sem ruído. Em segundo lugar, elaenfatiza, valoriza e torna juridicamente protegido o elementoconfiança (“trust”), sem o qual nenhum contrato po<strong>de</strong> operar.Em terceiro lugar, ela evi<strong>de</strong>ncia a natureza participatória do128 ARAÚJO, Fernando. Teoria econômica do Contrato. Almedina. Lisboa. 2007, p. 154 (citandoMacneil, I.R. (1974), 691-816; Macneil, I.R. (1978), 854-906129 ARAÚJO, Fernando. Teoria econômica do Contrato. Almedina. Lisboa. 2007, p. 395 (citandoWilliamson, O.E. (1986), 105-110;)130 MACEDO Jr. Ronaldo Porto. Contratos Relacionais e <strong>de</strong>fesa do consumidor.2ed. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 183,


contrato, que envolve comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> significados e práticassociais, linguagem normas e elementos <strong>de</strong> vinculação nãopromissórios(não-contratuais). Assim, a boa-fé realça oelemento moral das relações contratuais. Por fim, a boa-fécontratual envolve uma concepção <strong>de</strong> Justiça social, a justiçaenquanto normalida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>senvolvida nos capítulos iniciais<strong>de</strong>ste trabalho. 131Para tanto, <strong>de</strong>verá o intérprete investigar o consenso das partese, mediante sua interpretação estabelecer quais os efeitos que quiseramproduzir, <strong>de</strong>finindo-se uma vonta<strong>de</strong> hipotética para o caso <strong>de</strong> terem previsto acondição futura do contrato. 132Para tanto, <strong>de</strong>vem ser utilizados padrões éticos retirados dotráfico negocial e ligado ao tipo <strong>de</strong> contrato celebrado.Não há dúvida que,[...] o campo propício para aplicar-se a boa-fé objetiva é o das<strong>de</strong>clarações imprecisas ou lacunosas. Nestes casos, o juizterá <strong>de</strong> interpretar a <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> das partes “como131 MACEDO Jr. Ronaldo Porto. Contratos Relacionais e <strong>de</strong>fesa do consumidor.2ed. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 185.132 «A susceptibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lacunas e a imperfeição das formas <strong>de</strong> sentido». diz BETTI,«suscitam um problema <strong>de</strong> interpretação integradora». <strong>Os</strong> métodos não são porém osmesmos, porque as regras legais se harmonizam entre si em muito maior medida – e, <strong>de</strong>maisa mais, estão orientadas por <strong>de</strong>terminadas rectoras - do que a regulação <strong>de</strong> um contrato,muito mais fragmentária, por <strong>de</strong>trás da qual se perfilam com freqüência interesses muitodivergentes. Quando a lei tem à mão uma regulação dispositiva para <strong>de</strong>terminados tipos <strong>de</strong>contrato e o contrato correspon<strong>de</strong>, plenamente, ao tipo, as «lacunas do contrato» sãocolmatadas, em regra, com o Direito dispositivo legal. Mas se o contrato concreto se afasta<strong>de</strong> modo tão <strong>de</strong>spiciendo do tipo regular, com base no qual a norma dispositiva foi recortada,então a aplicação da norma legal dispositiva po<strong>de</strong> ser ina<strong>de</strong>quada à situação <strong>de</strong> interessesque aqui se <strong>de</strong>para e ao sentido do contrato <strong>de</strong>la corrente. Nestes casos, como tambémquando falte uma regulação dispositiva, especialmente, portanto, nas modalida<strong>de</strong>scontratuais recentemente <strong>de</strong>senvolvidas no tráfego, que, ainda, não acharam uma regulaçãoespecial, «a interpretação contratual integradora» é a via para o preenchimento das lacunasdo contrato. (LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do <strong>direito</strong>. 3 ed. Lisboa: FundaçãoCaloust Gulbenkian, 1997. Tradução <strong>de</strong> José Lamego, p. 422).


enten<strong>de</strong>riam as pessoas corretas e como estas proce<strong>de</strong>riamem relação a ela” 133Sem penetrar no mundo psíquico do contratante, o intérprete<strong>de</strong>verá, com exigência do cumprimento dos <strong>de</strong>veres acessórios surgido emrazão do próprio princípio, aplicá-lo como cláusula geral, seguindo um padrão<strong>de</strong> conduta, geralmente, aceito para aquela situação.Para preencher, as lacunas, porém, o julgador não po<strong>de</strong>rásubstituir ou modificar o conteúdo do acordo, conforme com suas própriasconvicções, mas integrá-lo reconhecendo obrigações e <strong>direito</strong>s que seriamusuais para aquele tipo <strong>de</strong> negócio realizado. Assim,Não se presta a teoria da boa-fé objetiva para cre<strong>de</strong>nciar ojuiz a alterar a substância do contrato, ainda que pactuado <strong>de</strong>má-fé, por uma das partes, visto que o acordo <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>scontinua sendo o fundamento <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> negócio bilateral.O juiz po<strong>de</strong> interpretá-lo ou suprir-lhe lacunas segundo osusos e costumes. Po<strong>de</strong> <strong>de</strong>cotar-lhe cláusulas ou condiçõesilícitas ou imorais. Não lhe cabe, porém, a pretexto <strong>de</strong> apoiarsena boa-fé, recriar o conteúdo do contrato, em mol<strong>de</strong>sdiferentes daqueles fixados pelo acordo bilateral <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong>sque lhe <strong>de</strong>u origem. 134Deverá, para restabelecer o equilíbrio contratual, valer-se davonta<strong>de</strong> hipotética das partes, e <strong>de</strong> institutos disponibilizados peloor<strong>de</strong>namento, como a lesão, a onerosida<strong>de</strong> excessiva e o abuso <strong>de</strong> <strong>direito</strong>.Mas, ainda,Impõe-se aqui uma advertência similar àquela que éhabitualmente formulada acerca da apreciação judicial <strong>de</strong><strong>de</strong>cisões empresariais – e que é a <strong>de</strong> que nem todas as<strong>de</strong>cisões num contrato são sindicáveis, porque muitas <strong>de</strong>lasresultam <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões econômicas – <strong>de</strong> investimento, <strong>de</strong>oportunida<strong>de</strong>, e outras – que escapam totalmente àperspectiva jurídica, a solução afinal da «business judgmentrule», sob pena <strong>de</strong> submergirmos a função arbitral ejurisdicional numa avalanche <strong>de</strong> atribuições que nem um«juiz-Hércules», suportaria,133 THEODORO Júnior Humberto. O Contrato e sua Função Social. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Forense,2008, p. 27.134 PUTTEMANS, Andrée, APUD THEODORO Júnior Humberto. O Contrato e sua FunçãoSocial. Rio <strong>de</strong> Janeiro, Forense, 2008, p. 29.


8- CONCLUSÃO


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