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Boletim SBH Setembro/2013 - Sociedade Brasileira de Hepatologia

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| Seção Transporte Biliar |A MORTECOMOPREMISSA:A DOAÇÃODE ÓRGÃOSNO BRASILRosana Notothen (RS)No dia 5 <strong>de</strong> agosto, completamos15 anos doprimeiro regulamentotécnico sobre transplantes,na sequência da lei e do <strong>de</strong>cretoque regulamentam a ativida<strong>de</strong>. Oconjunto normas <strong>de</strong> 1998 alinhou aativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transplantes aos princípiosconstitucionais do SUS, pormeio do instituto da “Lista Única”.Se não foi a <strong>de</strong>finição semanticamentemais castiça do que é hoje o nossoCadastro Técnico <strong>de</strong> Receptorese suas regras <strong>de</strong> alocação <strong>de</strong> órgãose tecidos, trouxe à luz um conceitomuito claro: neste país, os órgãos sãobens públicos e <strong>de</strong>vem ser distribuídossob os mesmos conceitos <strong>de</strong> universalida<strong>de</strong>,integralida<strong>de</strong>, equida<strong>de</strong>e justiça. O financiamento justo, premissafundamental para um sistemaque propõe um forte controle público,hoje contempla a maioria dosprocedimentos envolvidos na transplantação,e também as equipes <strong>de</strong>procura <strong>de</strong> órgãos têm seu financiamentoembasado na tabela <strong>de</strong> procedimentos<strong>de</strong>s<strong>de</strong> então.A criação do das CNCDO (Central<strong>de</strong> Notificação, Captação e Distribuição<strong>de</strong> Órgãos), braços executivosdo SNT (Sistema Nacional <strong>de</strong> Transplantes),a par <strong>de</strong> organizar os cadastros<strong>de</strong> receptores e atuar na distribuição,trouxe na sua concepção aresponsabilida<strong>de</strong> pela obtenção <strong>de</strong>órgãos. Cada CNCDO buscou seuscaminhos, a maioria trazendo para<strong>de</strong>ntro da estrutura <strong>de</strong> gestão tarefasque são assistenciais em sua natureza,opção que logo se <strong>de</strong>monstrou amenos eficaz para a maior parte dosEstados.Optaram por caminhos diversos, Estadoscomo São Paulo, e seus Serviços<strong>de</strong> Procura <strong>de</strong> Órgãos e Tecidos– SPOT, que nasceram em hospitaisuniversitários, e outros como SantaCatarina, o mais bem-sucedidoexemplo, agregaram o mo<strong>de</strong>lo espanhol<strong>de</strong> procura, que <strong>de</strong>lega a cadahospital essa função, por meio daCoor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Transplantes, noBrasil chamada Comissão Intra-Hos-pitalar <strong>de</strong> Doação <strong>de</strong> Órgãos e Tecidospara Transplantes – CIHDOTT.Outros Estados, como os da RegiãoNorte, recém agora firmam seus passospara o trabalho com doadoresfalecidos.A tentativa <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo híbrido <strong>de</strong>gestão da procura <strong>de</strong> doadores, pensandono enfrentamento da heterogeneida<strong>de</strong>e das gran<strong>de</strong>s distânciasa serem percorridas em nosso país eEstados, inspiraram estruturas comperfil <strong>de</strong> atuação supra-hospitalar,alocadas em hospitais estratégicos,as Organizações <strong>de</strong> Procura <strong>de</strong> Órgãose Tecidos – OPO, que foramformalizadas em 2009 com bastantemaleabilida<strong>de</strong> geográfica e funcional.Implantadas em alguns Estados,vêm permitindo a alocação mais integrativados recursos e a criação/supervisão das Coor<strong>de</strong>nações Hospitalaresem hospitais com maior incidência<strong>de</strong> morte encefálica, numalógica <strong>de</strong> trabalho em re<strong>de</strong>. Por meio<strong>de</strong>las, alguns Estados têm melhoradoconsi<strong>de</strong>ravelmente os indicadoresna nossa maior fragilida<strong>de</strong>, a subnotificaçãoda morte encefálica.Neste cenário, extremamente heterogêneo,vimos <strong>de</strong>spontar a níveis europeusos indicadores <strong>de</strong> notificações edoações em alguns Estados, que praticammo<strong>de</strong>lagens distintas na forma<strong>de</strong> atuação mas que compartilhama mesma preocupação quanto à suasustentabilida<strong>de</strong>. A tabela concebidapara procedimentos rotineiros nãoconsegue expressar ao gestor hospitalaros reforços necessários ao financiamento<strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> que é sempreexcepcional (1) pela lida com a mortecomo premissa; (2) por ocorrer quasesempre em horários alternativos aosconvencionais; (3) por envolver custosque não estão relacionados diretamentecom a ativida<strong>de</strong>-fim dos hospitais,como transporte, por exemplo; (4) porexigir relacionamento interinstitucional,inclusive financeiro, que muitasvezes é vedado por amarras legais efiscais. Por essas razões, o gestor estadual<strong>de</strong>sempenha um papel <strong>de</strong>cisivono relacionamento entre as esferas <strong>de</strong>gestão para o sucesso logístico <strong>de</strong> suaCNCDO, situação nem sempre bemcompreendida ou isenta <strong>de</strong> nuancespolíticas e vieses relacionados ao exercíciodo po<strong>de</strong>r. Posta ainda a heterogeneida<strong>de</strong>na capacida<strong>de</strong> instalada e naqualida<strong>de</strong> da gestão dos nossos mais<strong>de</strong> 6.000 hospitais, constatamos quenão há ainda mecanismo que assegurea chegada dos recursos às mãosdos coor<strong>de</strong>nadores hospitalares, partefixos, parte variáveis, para que se permitaa disponibilida<strong>de</strong> e se estimule otrabalho bem feito.Por fim, resguardadas honrosas exceções,vivemos mais <strong>de</strong> uma década<strong>de</strong> inércia das universida<strong>de</strong>s emrelação à formação <strong>de</strong> recursos humanosvoltados para esta ativida<strong>de</strong>,e sequer o conteúdo curricular damaioria <strong>de</strong> nossos cursos <strong>de</strong> graduaçãoda área da saú<strong>de</strong> contempla oprocesso <strong>de</strong> doação-transplante. Háescassez <strong>de</strong> pessoal especializado,e muitos profissionais começam naativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>spreparados ou parcialmentecapacitados por cursosbreves, o que prejudica a eficácia doprocesso, compromete o protagonismodo coor<strong>de</strong>nador em situações--chave e agrega estresse no exercício<strong>de</strong> uma ativida<strong>de</strong> já penosa pela suanatureza. O melhor preparo <strong>de</strong>ssesprofissionais, somado ao trabalhoeducacional junto à população <strong>de</strong>forma permanente, inserindo a doação<strong>de</strong> órgãos como exercício <strong>de</strong>cidadania, <strong>de</strong>rrubariam nossos altosíndices <strong>de</strong> recusa familiar à autorização,condição essencial à doação pelanossa legislação.Somos hoje o 2 o país em númeroabsoluto <strong>de</strong> transplantes, com <strong>de</strong>staquesrelevantes ao Rio Gran<strong>de</strong> doSul e ao Ceará, mas somos o 31 o emnúmeros relativos, com apenas 10,9doadores por milhão <strong>de</strong> população(pmp) em 2011. O <strong>de</strong>snível entre asregiões é ainda alarmante, e estamoslonge <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r minimamente à lista<strong>de</strong> espera para que se diminuam osagravos e a mortalida<strong>de</strong> aos pacientesque aguardam por um órgão. AABTO prognostica para 2017 a meta<strong>de</strong> 20 doadores pmp. As dificulda<strong>de</strong>saqui apontadas exigem tempoe trabalho para que se busquem soluções.No entanto, há atitu<strong>de</strong>s quepo<strong>de</strong>m ser tomadas hoje, que facilitariamsobremaneira o processo. Oalinhamento do protocolo <strong>de</strong> morteencefálica às atuais diretrizes internacionais,aditivos contratuais pararemuneração <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nadores <strong>de</strong>transplante, inclusão em tabela <strong>de</strong>procedimentos especializados <strong>de</strong>avaliação e preservação dos órgãos,cursos <strong>de</strong> especialização com bolsas<strong>de</strong> estudo voltados ao processodoação/transplante, e maior protagonismoda ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro doMinistério da Educação são medidaspossíveis, <strong>de</strong> custo relativamentebaixo, e que teriam alto impacto nonúmero <strong>de</strong> doadores, superando osprognósticos, arriscaria dizer.O SUS financia a quase totalida<strong>de</strong>dos transplantes <strong>de</strong> órgãos, boa partedos transplantes <strong>de</strong> tecidos, e a medicaçãoimunossupressora para todaa vida do paciente. Tem o terceiromaior registro <strong>de</strong> doadores voluntários<strong>de</strong> medula óssea do mundo,o REDOME. São ganhos enormesconsi<strong>de</strong>rando que nosso sistema<strong>de</strong> transplantes é ainda um adolescente.A falta <strong>de</strong> doadores é o nossomaior problema, multifatorial comona maioria das ativida<strong>de</strong>s sanitárias.No entanto, nenhuma modalida<strong>de</strong>assistencial <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> mais da atuaçãointegrativa dos vários atores dosistema <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> envolvidos e dasocieda<strong>de</strong> como um todo. O direito<strong>de</strong> um brasileiro vir a ser um doador,caso a vida lhe imponha essa escolha,precisa estar na pauta dos governos edos movimentos sociais. Pela prosaicarazão <strong>de</strong> que todos temos chancesmuito maiores <strong>de</strong> viver a necessida<strong>de</strong><strong>de</strong> um órgão para nós mesmos oupara alguém que amamos, do quevir a ser um doador <strong>de</strong> órgãos. •50 | <strong>Boletim</strong> <strong>SBH</strong><strong>Boletim</strong> <strong>SBH</strong> | 51

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