Função visual <strong>de</strong> crianças pseudofácicas por catarata infantil281Tabela 1Características clínicas pré-operatóriasPaciente Ida<strong>de</strong> Classificação Ida<strong>de</strong> do AV pré operatória OD AV pré operatória OE(anos) da catarata diagnóstico1 10 P 3-4+ 8,0 0,17 0,132 15 NE 5,0 0,20 0,133 10 N 2+/ CA e CP 2+ 8,0 0,33 0,254 5 N+/CA e CP 1 + 3,0 NÃO INFORMAVA NÃO INFORMAVA5 10 P 3+ 0,5 0,30 0,406 13 SCP 3+ 9,0 0,05 0,05p= pulverulenta; NE= nuclear embrionária; N= nuclear; CA= cortical anterior; CP= cortical posterior; SCP= subcapsular. Classificação<strong>de</strong> + a 4+/4.Tabela 2Características clínicas pós- operatóriasTempo <strong>de</strong>Ida<strong>de</strong> (anos) pós operatório AV AV Titmus Luzes <strong>de</strong> Luzes <strong>de</strong>Pacientes na 1ª cirurgia mínimo (meses) pós operatória pós-operatória (segundos <strong>de</strong> arco) Worth (PP) Worth (PL)ODOE1 8 12 0,33 0,33 3000 fusão fusão2 13 9 0,25 0,50 3000 fusão fusão3 10 3 1,00 0,80 200 fusão fusão4 3 6 0,25 0,10 O supressão supressão5 7 12 0,50 0,50 400 fusão fusão6 12 18 0,67 0,67 200 fusão fusãocomo a correlação entre ida<strong>de</strong> da primeira cirurgia eAV pós operatória (OD: p=0,74; OE: p=0,2). Tambémnão foi observada correlação estatística entre AV préoperatóriacom Titmus (OD:p=0,8; OE: p= 1,0) e AV pósoperatóriacom Titmus e luzes <strong>de</strong> Worth (OD: p=0,67;p=0,27; OE, p= 0,93; p=0,15).DISCUSSÃOA maioria dos estudos sobre função visual emcataratas congênitas e da infância avaliam crianças cujascirurgias foram realizadas nos primeiros meses <strong>de</strong> vidae que, após o acompanhamento <strong>de</strong> quatro ou mais anos,quando a criança já adquiriu capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> informação,foram aplicados os testes <strong>de</strong> acuida<strong>de</strong> visual pela tabela<strong>de</strong> Snellen e testes <strong>de</strong> função sensorial, como o Titmus eas Luzes <strong>de</strong> Worth.Os pacientes <strong>de</strong>ste estudo apresentaram ida<strong>de</strong>superior a quatro anos para que pudéssemos obter asinformações aos testes, e todos foram operados em ida<strong>de</strong>tardia, seja por diagnóstico tardio ou conduta expectantepreviamente adotada. Esses pacientes chegaram ao <strong>de</strong>partamento<strong>de</strong> <strong>Oftalmologia</strong> da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> MedicinaTabela 3Correlação entre acuida<strong>de</strong>s visuais prée pós-operatórias entre os olhosAV pré-operatória AV pós-operatóriaODMÉDIA ± DP 0,21 ± 0,11 0,5 ± 0,29Mín-Máx 0,05 -0,33 0,25 -1,00OEMÉDIA ± DP 0,19 ± 0,13 0,48 ± 0,24Mín-Máx 0,05 -0,4 0,10-0,80Wilcoxon Signed Ranks Testdo ABC já com o diagnóstico relatado pelo familiar; sendoneste serviço então indicadas e realizadas as cirurgias(após a avaliação oftalmológica completa).A média <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> do diagnóstico da catarata dospacientes avaliados (5,58 anos, DP=3,35) aponta parauma possível classificação (quanto à ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aparecimento)como infantil tardia, ou como congênita ou infantilprecoce, porém com <strong>de</strong>senvolvimento da opacida<strong>de</strong>lento.Esses dados não pu<strong>de</strong>ram ser averiguados comRev Bras Oftalmol. 2009; 68 (5): 278-83
282Ferraz PRP, Sugano DM, Fernan<strong>de</strong>s CLprecisão pois foram coletados a partir <strong>de</strong> informaçõesdadas pelos responsáveis pelas crianças. Cinco (83%)<strong>de</strong>les não relataram avaliação médica prévia ao períodoe apenas 1 (16,7%) criança apresentou ida<strong>de</strong> do diagnósticoaos seis meses <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, porém, segundo informaçãocoletada, foi adotada conduta expectante.Cinquenta e 67% das crianças apresentaramacuida<strong>de</strong> visual pós-operatória melhor que 0,4 <strong>de</strong> olho direitoe esquerdo respectivamente. Esses dados são compatíveiscom um estudo brasileiro em que 48% das criançaspseudofácicas por catarata bilateral operadas entre 4 e 10anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, obtiveram boa acuida<strong>de</strong> visual 9 . Este resultadotambém é compatível com um estudo envolvendo 22pacientes, em que 46,8% apresentaram boa acuida<strong>de</strong> visualpós-operatória 3 . <strong>Out</strong>ros estudos obtiveram os melhoresresultados na acuida<strong>de</strong> visual pós-operatória <strong>de</strong> criançascom ida<strong>de</strong> mais avançada tanto para diagnóstico quantopara cirurgia 7,10 . Esses estudos porém não relatam os dadosda acuida<strong>de</strong> visual pré-operatória das crianças avaliadas.Neste estudo o índice <strong>de</strong> função sensorial obtidofoi satisfatório. Apenas uma (16,7%) criança não apresentouestereopsia ao teste <strong>de</strong> Titmus e fusão nos testes<strong>de</strong> luzes <strong>de</strong> Worth. As outras 5(83%) crianças apresentaramestereopsia e fusão nos testes. Duas (33%) apresentaramestereopsia grosseira (3000 segundos <strong>de</strong> arco) e3(50%) boa (menor ou igual a 400 segundos <strong>de</strong> arco);sendo que 2(33,3%) <strong>de</strong>stas apresentaram 200 segundos<strong>de</strong> arco. Este dado difere da maior parte da literatura,em que a binocularida<strong>de</strong> foi atingida por menor porcentagem<strong>de</strong> pacientes e seus resultados ainda são consi<strong>de</strong>radoslimitados; porém é compatível com dados <strong>de</strong> estudosemelhante com crianças operadas por catarata unilateral3,10-12 .Estudos mostram que as seis primeiras semanas<strong>de</strong> vida representam um período sensível para o <strong>de</strong>senvolvimentoda binocularida<strong>de</strong>, e, que o grau <strong>de</strong> privaçãovisual que ocorre pela catarata nesse período, <strong>de</strong>terminavariações em seu prognóstico. <strong>Out</strong>ros, relatam queesse período ocorre do terceiro ao sexto mês do períodopós-natal 10,13 .Um outro fator <strong>de</strong>terminante à binocularida<strong>de</strong> éa acuida<strong>de</strong> visual. Estudos antigos apontam que quandoa AV binocular varia entre 20/200 e 20/20, a estereopsiamuda proporcionalmente 14 . Zubcov et al apontam que apreservação da estereopsia precisa <strong>de</strong> pelo menos AV<strong>de</strong> 20/100 (0,20) do pior olho 6 .Apenas 1 (16,7%) criança<strong>de</strong>ste estudo não obteve visão melhor que 0,20; sendoesta a única criança a não apresentar estereopsia ao teste<strong>de</strong> Titmus, nem fusão às luzes <strong>de</strong> Worth.As cataratas bilaterais têm melhor prognósticovisual em relação às cataratas unilaterais 3,4,10 . Todos ospacientes avaliados apresentavam catarata bilateral, amaioria (50%) dos casos corticais e/ou nucleares e/ ousubcapsulares, seguida pela pulverulenta(33,3%). Essesdados diferem na literatura pelo fato da localização daopacida<strong>de</strong> (classificação da catarata) variar entre osestudos. Um estudo aponta 27,3% <strong>de</strong> catarata nuclear e40% <strong>de</strong> catarata subcapsular posterior 3 .Nenhuma criança avaliada apresentou cataratatotal ou polar posterior, tidos como os tipos <strong>de</strong> catarataque mais causam ambliopia pela literatura 4 .Assim, os bons índices <strong>de</strong> função sensorialbinocular dos pacientes <strong>de</strong>ste estudo po<strong>de</strong>m ser atribuídosa três fatores: a não serem incluídos pacientes queapresentavam <strong>de</strong>svio ocular prévio ou nistagmo, a todasas cataratas serem bilaterais e à apresentação da opacida<strong>de</strong>limitante à visão ter sido em ida<strong>de</strong> mais tardia, nãointerferindo no período <strong>de</strong> aprendizagem dabinocularida<strong>de</strong>.No entanto, obtivemos diferença estatística significativaapenas entre as acuida<strong>de</strong>s visuais pré e pós operatórias.As outras variáveis que correlacionamos nãoapresentaram significância estatística, provavelmente<strong>de</strong>vido à amostra reduzida, dado que na literatura, o resultadovisual <strong>de</strong> olhos operados <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da ida<strong>de</strong> <strong>de</strong>início da catarata, ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> início da <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> da opacida<strong>de</strong>e ida<strong>de</strong> da realização da cirurgia 4,10 . <strong>Out</strong>ros estudosapontam significância estatística entre AV e funçãobinocular, entre AV e ida<strong>de</strong> da cirurgia 3, 10 .Houve neste estudo, alta incidência <strong>de</strong> opacida<strong>de</strong><strong>de</strong> cápsula posterior pós-operatória (67%). Um estudomostrou 31,5% <strong>de</strong> opacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cápsula posterior, porém,essas crianças foram submetidas à lensectomia eimplante <strong>de</strong> lente intraocular sem vitrectomia anterior,enquanto nossos pacientes foram submetidos àfacoemulsificação com implante <strong>de</strong> lente intraocular 10 .<strong>Out</strong>ro estudo (22 olhos) obteve 56% <strong>de</strong> opacida<strong>de</strong><strong>de</strong> cápsula posterior, porém a técnica cirúrgica adotadavariava <strong>de</strong>vido à abordagem <strong>de</strong> três tipos <strong>de</strong> catarata(congênita, do <strong>de</strong>senvolvimento e traumática) 6 .CONCLUSÕESNeste estudo, crianças portadoras <strong>de</strong> catarata congênitaou infantil precoce <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento lento e<strong>de</strong> catarata infantil tardia, apresentaram bom prognósticovisual. A maioria apresentou função binocular apóscirurgia com implante <strong>de</strong> lente intraocular, mesmo emida<strong>de</strong> avançada para cirurgia. Houve diferençaestatíticamente significante entre as acuida<strong>de</strong>s visuaisRev Bras Oftalmol. 2009; 68 (5): 278-83