12.07.2015 Views

Ludwig von Mises – Teoria do Dinheiro e Crédito (p.137 - p.145 ...

Ludwig von Mises – Teoria do Dinheiro e Crédito (p.137 - p.145 ...

Ludwig von Mises – Teoria do Dinheiro e Crédito (p.137 - p.145 ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>Ludwig</strong> <strong>von</strong> <strong>Mises</strong> – <strong>Teoria</strong> <strong>do</strong> <strong>Dinheiro</strong> e Crédito (<strong>p.137</strong> -<strong>p.145</strong>) (1911)Tradutor: Rafael HotzSobre o Texto:<strong>Ludwig</strong> <strong>von</strong> <strong>Mises</strong> foi um <strong>do</strong>s grandes expoentes da chamada Escola Austríacade Economia. Dentre outras características essa escola de pensamento écaracterizada por se focar nos processos de dinâmica (mudança) <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> enegar o uso de instrumental matemático para suas análises.Em “<strong>Teoria</strong> <strong>do</strong> <strong>Dinheiro</strong> e Crédito” <strong>Mises</strong> se propõe a fazer um trata<strong>do</strong>econômico sobre um assunto que muito confunde os economistas: o da moeda.Esse trecho seleciona<strong>do</strong> e traduzi<strong>do</strong> é <strong>do</strong> Capítulo 2 da segunda parte <strong>do</strong> livro.Aqui ele se dedica a refutar a <strong>Teoria</strong> Quantitativa da Moeda, que afirma quevariações na quantidade de dinheiro resultarão em variaçõesproporcionalmente inversas no poder de compra da moeda. Em contraposição aessa visão mecanicista ele propõe uma teoria dinâmica, que leva emconsideração o ponto de partida das alterações e a atitude <strong>do</strong>s agentes paracom relação a elas.Os seguintes conceitos retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong> próprio livro talvez ajudem o leitor menosfamiliariza<strong>do</strong> com alguns termos técnicos de economia:


<strong>Dinheiro</strong>-merca<strong>do</strong>ria: dinheiro que ao mesmo tempo também é um bemtangível (ouro, por exemplo).<strong>Dinheiro</strong> de crédito: dinheiro que constitui em direitos de recebimento (umcheque pré-data<strong>do</strong>, por exemplo).Fiat money: dinheiro legal, ou seja, que assim o é graças ao reconhecimento dalei (nossos reais brasileiros, por exemplo).**********************8 – Conseqüências de um aumento na quantidade de dinheiro enquanto ademanda por dinheiro fica imodificada ou não aumenta no mesmo passo.Aquelas variações na razão entre a demanda individual por dinheiro e sua ofertaque surgem por causas puramente individuais não pode, como uma regra, teruma influência quantitativa muito grande no merca<strong>do</strong>. Na maioria das vezeselas serão inteiramente, ou ao menos parcialmente, compensadas por variaçõescontrárias emanan<strong>do</strong> de outros indivíduos no merca<strong>do</strong>. Mas uma variação <strong>do</strong>valor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro só pode surgir quan<strong>do</strong> uma força que éexercida em uma direção não é cancelada por outra contrária na direção oposta.Se as causas que alteram a razão entre a oferta de dinheiro e sua demanda <strong>do</strong>ponto de vista <strong>do</strong> indivíduo consistem meramente em fatores pessoais eacidentais que dizem respeito apenas aquele indivíduo, então, de acor<strong>do</strong> com alei <strong>do</strong>s grandes números, é provável que as forças emergin<strong>do</strong> dessa causa, eagin<strong>do</strong> em ambas as direções no merca<strong>do</strong>, se contrabalancearão. Aprobabilidade de a compensação ser completa é maior quanto maior for aquantidade de agentes econômicos individuais.


Mas o caminho é outro quan<strong>do</strong> perturbações ocorrem na comunidade comoum to<strong>do</strong>, de uma forma que altere a razão entre a oferta de dinheiro <strong>do</strong>sindivíduos e sua demanda por ele. Tais perturbações, é claro, não podem teroutro efeito senão afetar as valorações subjetivas <strong>do</strong> indivíduo; mas as primeirassão fenômeno econômico social no senti<strong>do</strong> de que elas influenciam asvalorações subjetivas de um grande número de indivíduos, se nãosimultaneamente e na mesma intensidade, pelo menos na mesma direção,fazen<strong>do</strong> com que haja necessariamente algum efeito resultante no valor detroca objetivo <strong>do</strong> dinheiro.Na história <strong>do</strong> dinheiro uma parte especialmente importante foi desempenhadapor aquelas variações no seu valor objetivo de troca que surgiram emconseqüência de um aumento na oferta de dinheiro enquanto a demanda porele continuou inalterada ou pelo menos não aumentou na mesma proporção.Essas variações, é verdade, foram as que primeiro chamaram a atenção <strong>do</strong>seconomistas; foi com o propósito de explicá-las que a <strong>Teoria</strong> Quantitativa daMoeda foi primeiramente proposta. To<strong>do</strong>s os escritores lidaramminuciosamente com aquelas. É então talvez justificável dedicar atençãoespecial a elas e usa-las para iluminar certos pontos teóricos importantes.Seja lá qual for a forma que encontrarmos para ilustrarmos o aumento na ofertade dinheiro, seja vin<strong>do</strong> de uma produção crescente [*1] ou importação dasubstância a qual o dinheiro-merca<strong>do</strong>ria é feito, ou através de uma novaemissão de fiat-money ou dinheiro de crédito, o dinheiro novo sempre aumentaa oferta de dinheiro a disposição de certos agentes econômicos individuais [*2].Um aumento na oferta de dinheiro numa comunidade sempre significa umaumento da renda monetária de um número de certos indivíduos; mas talaumento não necessariamente significa ao mesmo um aumento na quantidade


de bens que se encontram a disposição da comunidade, ou seja, não significaum aumento <strong>do</strong> dividen<strong>do</strong> nacional. Um aumento na quantidade de dinheiro decrédito ou fiat só deve ser trata<strong>do</strong> como um aumento na quantidade de bens àdisposição da sociedade se permite a satisfação de uma demanda por dinheiroque até então era satisfeita pelo dinheiro-merca<strong>do</strong>ria, uma vez que o material oqual o dinheiro-merca<strong>do</strong>ria teve então que ser adquiri<strong>do</strong> através da entrega deoutros bens em troca dele ou produzi<strong>do</strong> ao custo de renunciar algum outro tipode produção. Se, por outro la<strong>do</strong>, a não existência da nova emissão de dinheirode crédito ou fiat não tivesse resulta<strong>do</strong> em um aumento da quantidade dedinheiro-merca<strong>do</strong>ria, então o aumento da oferta de dinheiro não pode sertoma<strong>do</strong> como um aumento da renda ou riqueza da sociedade.Um aumento na oferta de dinheiro da sociedade sempre significa um aumentona quantidade de dinheiro possuída por um número de certos agenteseconômicos, sejam eles os emissores <strong>do</strong> dinheiro de crédito ou fiat ou osprodutores da substância a qual o dinheiro-merca<strong>do</strong>ria é feito. Para essaspessoas, a razão entre a demanda por dinheiro e a oferta é alterada; elaspossuem uma superabundância de dinheiro e uma escassez relativa de outrosbens econômicos. A conseqüência imediata de tais circunstâncias é que autilidade marginal da unidade monetária para elas diminui. Issonecessariamente influencia seu comportamento no merca<strong>do</strong>. Elas estão numaposição de compra<strong>do</strong>res mais forte. Elas expressarão agora no merca<strong>do</strong> suademanda pelos objetos que desejam de maneira mais intensa <strong>do</strong> que antes;elas estão em condição de oferecer mais dinheiro pelas merca<strong>do</strong>rias quedesejam adquirir. Será o resulta<strong>do</strong> óbvio de tal processo que os preços <strong>do</strong>sbens deseja<strong>do</strong>s irão subir, e que o valor de troca objetivo <strong>do</strong> dinheiro irá cairem comparação.


Mas essa alta de preços de maneira alguma ficará restrita aos merca<strong>do</strong>s <strong>do</strong>sbens que são deseja<strong>do</strong>s por aqueles que originalmente possuem o dinheironovo a sua disposição. Soman<strong>do</strong> se a isso, aqueles que levaram tais bens aomerca<strong>do</strong> terão suas rendas e suas proporcionais ofertas de dinheiroaumentadas e, por sua vez, estarão em posição de demandar maisintensivamente os bens que desejam, de maneira que tais bens também subirãode preço. Dessa forma, o aumento de preços continua, possuin<strong>do</strong> um efeitodecrescente [*3], até todas as merca<strong>do</strong>rias, algumas em maior, outras em menorproporção, sejam afetadas por ele [1].O aumento na quantidade de dinheiro não significa um aumento na renda deto<strong>do</strong>s os indivíduos. Pelo contrário, aquelas parcelas da comunidade que são asúltimas a serem atingidas pela quantidade adicional de dinheiro possuem suasrendas reduzidas, como uma conseqüência da diminuição <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiroengendrada pelo aumento de sua quantidade; ocuparemos-nos disto maistarde. A redução da renda dessas últimas classes inicia agora uma contratendência,a qual se opõe a tendência da diminuição <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheirodevi<strong>do</strong> ao aumento da renda daquelas outras classes, no entanto sem ser capazde anular completamente seu efeito [*4].Aqueles que sustentam a versão mecânica da <strong>Teoria</strong> Quantitativa da Moedaserão os mais inclina<strong>do</strong>s a acreditarem que um aumento na quantidade dedinheiro deverá eventualmente levar a um aumento uniforme nos preços deto<strong>do</strong>s os bens econômicos, e menos clara é sua concepção da forma pela qual adeterminação <strong>do</strong>s preços é afetada por tal aumento. A compreensão cuida<strong>do</strong>sa<strong>do</strong> mecanismo através <strong>do</strong> qual a quantidade de dinheiro afeta os preços dasmerca<strong>do</strong>rias torna seu ponto de vista completamente insustentável. Uma vezque a quantidade aumentada de dinheiro é recebida em primeiro lugar apenaspor uma quantidade limitada de agentes econômicos, e não por to<strong>do</strong>s eles, o


aumento de preços primeiramente permeia apenas os bens que sãodemanda<strong>do</strong>s por aquelas pessoas; além disso, afeta tais bens mais <strong>do</strong> que afetaquaisquer outros no percurso. Quan<strong>do</strong> o aumento de preços se espalha maisprofundamente, se o aumento na quantidade de dinheiro é apenas umfenômeno transitório, será impossível para o aumento diferencial <strong>do</strong>s preçosdesses bens ser completamente manti<strong>do</strong>; certo grau de ajustamento terá queocorrer. Mas não haverá tal ajuste completo <strong>do</strong>s aumentos de forma que to<strong>do</strong>sos preços aumentem na mesma proporção. Os preços das merca<strong>do</strong>rias após aalta de preços não representarão a mesma relação entre si antes <strong>do</strong> início; aqueda <strong>do</strong> poder de compra <strong>do</strong> dinheiro não será uniforme no que toca aosdiferentes bens econômicos [*5].Hume, deve ser noticia<strong>do</strong>, baseia seu argumento com relação a esse assunto nasuposição de que to<strong>do</strong> inglês é milagrosamente <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de cinco peças de ourodurante a noite [2]. Mill corretamente nota isto, que o aumento na quantidadede dinheiro não leva a um aumento uniforme da demanda por merca<strong>do</strong>rias emsepara<strong>do</strong>; os artigos de luxo das classes mais pobres subiriam de preço mais <strong>do</strong>que outros bens. Tu<strong>do</strong> o mais constante, ele crê que um aumento uniforme nospreços de todas as merca<strong>do</strong>rias, e proporcionalmente ao aumento daquantidade de dinheiro, ocorreria, se os desejos e inclinações da comunidadecoletivamente no que diz respeito ao consumo permanecessem os mesmos. Eleassume, não mais artificialmente que Hume, que para toda libra, ou shilling, oupenny em posse de qualquer um, outra libra, shilling ou penny seriainstantaneamente adicionada [3]. Mas Mill falha em perceber que mesmo nessecaso uma alta uniforme de preços não ocorreria, mesmo supon<strong>do</strong> que paracada membro da comunidade a proporção entre oferta de dinheiro e riquezatotal fosse a mesma, de maneira que a adição de quantidade de dinheirosuplementar não resultasse na alteração da riqueza relativa <strong>do</strong>s indivíduos. Issoaconteceria uma vez que, mesmo nesse caso um tanto impossível, to<strong>do</strong>


aumento na quantidade de dinheiro necessariamente causaria uma alteraçãonas condições de demanda, o que levaria a um aumento de preços nãouniforme <strong>do</strong>s bens econômicos <strong>do</strong>s indivíduos. Nem todas as merca<strong>do</strong>riasseriam demandadas mais intensivamente, e nem todas aquelas que fossemdemandadas mais intensivamente seriam afetadas na mesma intensidade [*6][4].Não há qualquer justificativa para a crença difundida que variações naquantidade de dinheiro devam levar à variações inversamente proporcionais novalor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro, de forma que, por exemplo, uma duplicaçãona quantidade de dinheiro leve a um redução pela metade <strong>do</strong> poder de comprada moeda.Mesmo assumin<strong>do</strong> que de uma maneira ou de outra – é admitivelmente difícilimaginar como – a oferta de moeda de to<strong>do</strong>s os indivíduos fosse ampliada demaneira que sua posição relativa quanto a outros proprietários de bens ficasseinalterada, não é difícil provar que a variação subseqüente no valor objetivo detroca <strong>do</strong> dinheiro não seria proporcional a variação na quantidade de dinheiro.Se o possui<strong>do</strong>r de a unidades de dinheiro recebe b unidades adicionais, logo demaneira alguma é verdade dizer que ele irá valorar seu estoque total a+bexatamente com a mesma intensidade que valorava apenas a quantidade a.Uma vez que agora ele possui um estoque maior, ele irá valorar cada unidademenos <strong>do</strong> que antes; mas quão menos dependerá de toda uma série decircunstâncias individuais, de valores subjetivos que serão diferentes para cadaindivíduo. Dois indivíduos que são igualmente ricos e que possuem um estoquede dinheiro a, de maneira alguma chegarão à mesma variação em seu apreçopela quantidade após um aumento de b unidades em cada um <strong>do</strong>s seusestoques de dinheiro. Não é nada senão um absur<strong>do</strong> assumir que, digamos, aduplicação da quantidade de dinheiro a disposição de um indivíduo levará a


uma redução pela metade <strong>do</strong> valor de troca que ele atribui a cada unidademonetária. Imaginemos, por exemplo, um indivíduo que costuma manter emcaixa um estoque de 100 coroas [*7], e suponha que a quantia adicional de 100coroas seja paga por alguém a esse indivíduo. A mera consideração desseexemplo é suficiente para mostrar a completa fantasia de todas as teorias queprescrevem a variações da quantidade de dinheiro um efeito uniformementeproporcional no poder de compra da moeda. Não envolve modificaçõesessenciais ao exemplo supor que aumentos similares na quantidade de dinheirosão vivencia<strong>do</strong>s por to<strong>do</strong>s os membros da comunidade como um to<strong>do</strong>.O erro no argumento daqueles que supõe que uma variação na quantidade dedinheiro resulta numa variação inversamente proporcional no seu poder decompra reside no seu ponto de partida. Se desejarmos chegar a uma conclusãocorreta, devemos examinar a forma pela qual um aumento ou diminuição naquantidade de dinheiro afeta as escalas de valor <strong>do</strong>s indivíduos, porque éapenas destas que as variações das proporções de troca <strong>do</strong>s bens procedem. Apressuposição nos argumentos daqueles que mantém a teoria de quemudanças na quantidade de dinheiro têm um efeito proporcional no poder decompra <strong>do</strong> dinheiro é a proposição de que se o valor da unidade monetária<strong>do</strong>brasse, metade da oferta de dinheiro a disposição da comunidade teria amesma utilidade que possuía antes a oferta inteira. A veracidade dessaproposição não é discutida; todavia ela não prova o que deveria provar.Em primeira instância, deve ser mostra<strong>do</strong> que o nível da oferta total de dinheiroe o nível <strong>do</strong> valor da unidade monetária são questões de completa indiferençaquan<strong>do</strong> a utilidade obtida <strong>do</strong> uso <strong>do</strong> dinheiro está sen<strong>do</strong> discutida. A sociedadeestá sempre desfrutan<strong>do</strong> da utilidade máxima obtida <strong>do</strong> uso <strong>do</strong> dinheiro [*8].Metade <strong>do</strong> dinheiro à disposição da comunidade proporcionaria a mesmasatisfação que o estoque completo, mesmo se a variação <strong>do</strong> valor da unidade


monetária não fosse proporcional à variação da quantidade de dinheiro. Mas éimportante notar que de maneira alguma segue que duplicar a quantidade dedinheiro significa reduzir pela metade o valor de troca <strong>do</strong> dinheiro. Teria que serdemonstra<strong>do</strong> que emanam forças das valorações individuais <strong>do</strong>s agenteseconômicos que são capazes de criar tal variação proporcional. Isso nuncapoderá ser prova<strong>do</strong>; de fato, o contrário é provável. Já demos uma prova dessaincapacidade para o caso de que um aumento na quantidade de dinheiropossuída pelos agentes econômicos individuais envolve ao mesmo tempo umaumento de sua renda ou riqueza. Mas mesmo quan<strong>do</strong> o aumento daquantidade de dinheiro não afeta a riqueza ou renda <strong>do</strong>s agentes econômicosindividuais, o efeito é o mesmo.Vamos supor que um homem consegue metade de sua renda na forma detítulos que rendem juros e metade na forma de dinheiro; e que ele éacostuma<strong>do</strong> a poupar três quartos de sua renda, fazen<strong>do</strong>-o seguran<strong>do</strong> ostítulos e usan<strong>do</strong> aquela metade de sua renda que recebe em dinheiroigualmente para pagar por seu consumo corrente e para a compra de maistítulos. Agora vamos supor que uma variação na composição de sua rendaocorra, de maneira que ele passe a receber três quartos em dinheiro e apenasum quarto em títulos. A partir de agora ele usará <strong>do</strong>is terços de suas receitasem dinheiro para a compra de títulos que rendem juros. Se o preço <strong>do</strong>s títulossobe, ou, o que dá na mesma, os juros auferi<strong>do</strong>s caem, então em ambos oscasos ele estará menos interessa<strong>do</strong> em comprar e irá reduzir a soma que ele iriaentão empregar para comprar os títulos; ele acabará perceben<strong>do</strong> que avantagem de uma reserva monetária um pouco aumentada excede aquela quepoderia ser obtida através da aquisição de títulos. No segun<strong>do</strong> caso ele semdúvida estará propenso a pagar um preço maior, ou mais corretamente,comprar uma quantidade maior a um preço mais alto <strong>do</strong> que no primeiro caso.


Mas ele certamente não estará prepara<strong>do</strong> para pagar duas vezes mais por umaunidade de título no segun<strong>do</strong> caso tanto quanto no primeiro caso.Enquanto os expoentes prévios da <strong>Teoria</strong> Quantitativa da Moeda sãomenciona<strong>do</strong>s, a suposição que variações na quantidade de moeda teriam umefeito inversamente proporcional no seu poder de compra pode até no entantoser justificável. É fácil se confundir nesse ponto se é tenta<strong>do</strong> explicar ofenômeno valor <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> se referin<strong>do</strong> ao valor de troca. Mas é inexplicávelque aqueles teóricos que também supõem que estão defenden<strong>do</strong> a teoriasubjetiva <strong>do</strong> valor possam cair em armadilhas similares. A culpa aqui só poderecair na concepção mecânica <strong>do</strong> processo de merca<strong>do</strong>. Dessa forma até Fishere Brown, cujos conceitos da <strong>Teoria</strong> Quantitativa da Moeda são mecânicos, e quetentam expressar em equações matemáticas a lei pela qual a lei <strong>do</strong> valor <strong>do</strong>dinheiro é determinada, necessariamente chegam à conclusão que variações narazão entre a quantidade de dinheiro e sua demanda levam a variaçõesproporcionais no valor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro [5]. Como e através de quecanais isso se processa não é exposto pela fórmula, uma vez que ela não possuireferência alguma aos fatores que são decisivos em causar variações nasproporções de troca, isto é, variações nas valorações subjetivas <strong>do</strong>s indivíduos.Fisher e Brown dão três exemplos para provar a veracidade de suas conclusões.No primeiro, eles começam com a suposição de que o governo muda adenominação <strong>do</strong> dinheiro, de forma que, por exemplo, o que era anteriormentechama<strong>do</strong> de meio-dólar é chama<strong>do</strong> agora de dólar inteiro. É óbvio, elesafirmam, que isso causará um aumento na quantidade de dólares em circulaçãoe que os preços reconheci<strong>do</strong>s em termos <strong>do</strong>s novos dólares terão que ser duasvezes maiores que anteriormente. Fisher e Brown podem estar certos até aí, masnão nas conclusões que pretendem retirar. O que seu exemplo lida na verdadenão é um aumento na quantidade de dinheiro, mas meramente uma alteração


em seu nome. Do que o “dinheiro” menciona<strong>do</strong> nesse exemplo realmenteconsiste? É <strong>do</strong> material o qual os dólares são feitos, da promessa que lastreiaum dólar de crédito, a bugiganga [*9] que é usada como dinheiro ou é a palavradólar?O segun<strong>do</strong> exemplo da<strong>do</strong> por Fisher e Brown é não menos incorretamenteinterpreta<strong>do</strong>. Eles começam com a suposição de que o governo divida cadadólar em <strong>do</strong>is e cunhe um novo dólar com cada metade. Aqui novamente tu<strong>do</strong>o que ocorre é uma mudança de nome.Em seu terceiro exemplo eles ao menos tentam lidar com um aumento real naquantidade de dinheiro. Mas esse exemplo é tão artificial e enganoso quantoaqueles de Hume e Mill, os quais já tratamos com algum detalhe. Eles supõemque o governo dê a to<strong>do</strong>s um dólar extra para cada dólar já possuí<strong>do</strong>. Jámostramos que nesse caso uma mudança proporcional no valor de trocaobjetivo da moeda não pode se efetivar.Apenas uma coisa pode explicar como Fisher é capaz de manter sua <strong>Teoria</strong>Quantitativa mecânica. Para ele a <strong>Teoria</strong> Quantitativa da Moeda parece uma<strong>do</strong>utrina peculiar ao valor <strong>do</strong> dinheiro; de fato, ele a contrasta abertamente comas leis de valor <strong>do</strong>s demais bens econômicos. Ele diz que se o estoque de açúcarmundial aumentasse de um milhão de libras para cem milhões, disso nãoseguiria que cem libras teriam o valor possuí<strong>do</strong> agora por uma libra. Apenas odinheiro é peculiar nesse aspecto, de acor<strong>do</strong> com Fisher. Mas ele não dá umaprova dessa afirmação. Com a mesma justificativa de Fisher e Brown para suafórmula mecânica para o valor <strong>do</strong> dinheiro, uma fórmula semelhante poderiaser elaborada para o valor de qualquer merca<strong>do</strong>ria, e conclusões similaresextraídas a partir dela. Que ninguém tenta fazer isso deve ser explica<strong>do</strong> simplese unicamente pela circunstância de que tal fórmula contestaria tão claramente


nossa experiência das curvas de demanda para a maioria das merca<strong>do</strong>rias, queela não poderia em momento algum ser sustentada.Se compararmos <strong>do</strong>is sistemas econômicos estáticos, que não diferem em nadaexceto que em um deles haja duas vezes mais dinheiro que em outro, pareceráque o poder de compra da unidade monetária em um sistema deva ser igual àmetade <strong>do</strong> poder de compra da unidade monetária no outro. Contu<strong>do</strong>, nãodevemos concluir disto que uma duplicação da quantidade de moeda devalevar a uma redução pela metade <strong>do</strong> poder de compra da unidade monetária;cada variação na quantidade de dinheiro introduz um fator dinâmico no sistemaeconômico estático. A nova posição de equilíbrio estático que é estabelecidaquan<strong>do</strong> os efeitos das flutuações assim colocadas em funcionamento sãofinaliza<strong>do</strong>s não pode ser a mesma que existia antes da introdução daquantidade adicional de dinheiro [*10]. Consequentemente, no novo esta<strong>do</strong> deequilíbrio as condições de demanda por dinheiro, da<strong>do</strong> certo valor de troca daunidade monetária, também serão diferentes. Se o poder de compra de cadaunidade da quantidade duplicada de dinheiro fosse reduzi<strong>do</strong> pela metade, aunidade não teria a mesma significância para cada indivíduo sob as novascondições como tinha no sistema estático anterior ao aumento na quantidadede dinheiro. To<strong>do</strong>s aqueles que creditam a variações na quantidade de dinheiroum efeito inverso proporcional no valor da unidade monetária estão aplican<strong>do</strong>a condições dinâmicas um méto<strong>do</strong> de análise que serve apenas para condiçõesestáticas.É também completamente incorreto pensar na <strong>Teoria</strong> Quantitativa da Moedacomo se as características em questão afetan<strong>do</strong> a determinação <strong>do</strong> valor fossempeculiares ao dinheiro. A maioria <strong>do</strong>s defensores anteriores e posteriores dateoria caíram nesse erro, e os ataques ferozes e frequentemente bárbaros que


foram direciona<strong>do</strong>s a ela revelam-se melhor quan<strong>do</strong> sabemos deste e de outroserros <strong>do</strong> mesmo tipo <strong>do</strong>s quais seus expoentes foram culpa<strong>do</strong>s.Notas <strong>do</strong> Autor[1] Cp. Hume, Essays (ed. Frow.de, Lon<strong>do</strong>n), pp. 294 ff.; Mill, op. cit., pp. 298 ff.;Cairnes, Essays in Political Economy, Theoretical and Applied, Lon<strong>do</strong>n 1873, pp.57 rT.; Spiethoff, Die Quantitatstheorie, pp. 250 ff.[2] Cp. Hume, op. cit., p. 307.[3] Cp. Mill, op. cit., p. 299.[4] Cp. Conant, What determines the Value of Money? (Quarterly Journal ofEconomics, Vol. XVIII, 1904), pp. 559 ff.[5] Cp. Fisher and Drown, op. cit., pp. 28 ff., 157 ff.Notas <strong>do</strong> Tradutor[*1] <strong>Mises</strong> tem em mente metais preciosos, mas tal produção pode serestendida a qualquer merca<strong>do</strong>ria que esteja servin<strong>do</strong> como um meio de trocaindireta em larga escala.


[*2] É importante dar atenção ao fato que o dinheiro novo chega às mãos dealguns agentes privilegia<strong>do</strong>s primeiro.[*3] É importante notar que o aumento de preços não é uma coisa homogênea,como se fosse dada por um “nível geral de preços”. Ele distorce preços demerca<strong>do</strong>rias em específico, geran<strong>do</strong> sinais múltiplos para os agentes que osinterpretarão de maneira pessoal, de acor<strong>do</strong> com seu conhecimento (ou seja,subjetivamente), e fará com que seus planos de ação atinjam um grau maior dedescoordenação.[*4] Fica-se claro então que interferências externas intencionais aofuncionamento natural <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> monetário (assim como em qualquer outromerca<strong>do</strong>) gerarão um grupo perde<strong>do</strong>r e um ganha<strong>do</strong>r. Isso é exatamente o queestá acontecen<strong>do</strong> com a famigerada “crise <strong>do</strong> subprime”. Os governos pelomun<strong>do</strong> inteiro estão injetan<strong>do</strong> esse dinheiro novo nas mãos <strong>do</strong>s “pobres”banqueiros, em detrimento da grande maioria da população que colocará suasmãos em tal dinheiro depois de considerável tempo, enfrentan<strong>do</strong> maiorespreços. Na realidade, a própria crise é resulta<strong>do</strong> de intervenções externasintencionais pretéritas, algumas das quais <strong>Mises</strong> discute já em 1911 na “<strong>Teoria</strong><strong>do</strong> <strong>Dinheiro</strong> e Crédito”, como o sistema de reservas bancárias fracionárias. Sobreoutras intervenções estruturais no merca<strong>do</strong> monetário, meu blogue(www.enxurrada.blogspot) e seus links recomenda<strong>do</strong>s, como por exemplo, o<strong>Mises</strong> Institute (Brasil) possuem outras informações.[*5] O que <strong>Mises</strong> quer sugerir é que os preços irão diferir em proporção, nãohaven<strong>do</strong> uma mera subida nominal (por exemplo, <strong>do</strong>is preços que antes serelacionavam em 1 : 2 não se relacionarão em 2 : 4, e sim por outras relações,como por exemplo 2 : 5, geran<strong>do</strong> tendências a mudanças nos da<strong>do</strong>seconômicos – preferências <strong>do</strong>s consumi<strong>do</strong>res, méto<strong>do</strong>s de produção usa<strong>do</strong>s,


etc. – devi<strong>do</strong> à compreensão pessoal subjetiva <strong>do</strong>s agentes de tais mudanças<strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s).[*6] Percebe-se que como os preços relativos mudam, alguns ficamrelativamente mais ricos que outros após a introdução <strong>do</strong> novo dinheiro, poissuas merca<strong>do</strong>rias são mais (menos) bem valoradas pelos demais agentes nomerca<strong>do</strong>. Há na verdade uma redistribuição de riqueza.[*7] Coroa era a antiga moeda de ouro da Alemanha.[*8] De um ponto de vista Hayekiano ou Kirzneriano tal proposição é duvi<strong>do</strong>sa,uma vez que trocas mutuamente benéficas e desejadas pelos agentes podemnão estar sen<strong>do</strong> realizadas por ignorância pura <strong>do</strong>s agentes quanto a suapossibilidade.[*9] “Token”.[*10] Na realidade o sistema econômico nunca está em um equilíbrio estático enunca chegará a algum, embora possua forças que o levem cada vez mais emdireção a um ponto de equilíbrio. A velocidade e intensidade de tal caminhadaem direção a um ponto de equilíbrio estático dependem de quão estáveis sãoos da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> sistema (preferências individuais, preços, conhecimento técnico,etc) e sua interpretação pelos agentes econômicos. O próprio <strong>Mises</strong> mais tardeem Ação Humana explicita tais fatos.


<strong>Ludwig</strong> <strong>von</strong> <strong>Mises</strong> – <strong>Teoria</strong> <strong>do</strong> <strong>Dinheiro</strong> e Crédito (p.195- p.215) (1924)Tradutor: Rafael HotzSobre o Texto:<strong>Ludwig</strong> <strong>von</strong> <strong>Mises</strong> foi um <strong>do</strong>s grandes expoentes da chamada Escola Austríacade Economia. Dentre outras características essa escola de pensamento écaracterizada por se focar nos processos de dinâmica (mudança) <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> enegar o uso de instrumental matemático para suas análises.Em “<strong>Teoria</strong> <strong>do</strong> <strong>Dinheiro</strong> e Crédito” <strong>Mises</strong> se propõe a fazer um trata<strong>do</strong>econômico sobre um assunto que muito confunde os economistas: o damoeda.Esse trecho seleciona<strong>do</strong> e traduzi<strong>do</strong> é <strong>do</strong> Capítulo 6 da segunda parte <strong>do</strong> livro.Aqui ele se dedica a investigar as conseqüências econômicas ao longo <strong>do</strong>tempo de aumentos e diminuições da quantidade de dinheiro num sistema. Suaconclusão é a de que temos redistribuições de renda e riqueza.Os seguintes conceitos retira<strong>do</strong>s <strong>do</strong> próprio livro talvez ajudem o leitor menosfamiliariza<strong>do</strong> com alguns termos técnicos de economia:<strong>Dinheiro</strong>-merca<strong>do</strong>ria: dinheiro que ao mesmo tempo também é um bemtangível (ouro, por exemplo).<strong>Dinheiro</strong> de crédito: dinheiro que constitui em direitos de recebimento (umcheque pré-data<strong>do</strong>, por exemplo).Fiat money: dinheiro legal, ou seja, que assim o é graças ao reconhecimentoda lei (nossos reais brasileiros, por exemplo).


**********************Capítulo VIAs conseqüências sociais de variações no valor objetivo de troca <strong>do</strong>dinheiro1 – A troca de bens presentes por bens futurosVariações no valor de troca objetivo <strong>do</strong> dinheiro incitam deslocamentos nadistribuição de renda e propriedade, de um la<strong>do</strong> porque os indivíduos sãocapazes de fazer vista grossa a variabilidade <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro, e por outrola<strong>do</strong> porque variações no valor <strong>do</strong> dinheiro não afetam to<strong>do</strong>s os benseconômicos e serviços uniforme e simultaneamente.Por centenas, mesmo milhares de anos, as pessoas falharam completamenteem perceber que variações no valor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro poderiam serinduzidas por fatores monetários. Elas tentaram explicar todas as variações depreços exclusivamente pelo la<strong>do</strong> das merca<strong>do</strong>rias. Foi a grande conquista deBodin fazer o primeiro ataque contra essa suposição, que logo entãodesapareceu rapidamente da literatura cientifica. Ela continuou por um bomtempo a <strong>do</strong>minar a opinião <strong>do</strong>s leigos; mas hoje em dia parece ter si<strong>do</strong>sacudida até mesmo aqui. Todavia, quan<strong>do</strong> os indivíduos estão trocan<strong>do</strong> benspresentes por bens futuros eles não levam em conta em suas valorações asvariações no valor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro. Toma<strong>do</strong>res e cre<strong>do</strong>res nãoestão acostuma<strong>do</strong>s em considerar possíveis flutuações futuras no valor detroca objetivo <strong>do</strong> dinheiro.Transações nas quais bens presentes são troca<strong>do</strong>s por bens futuros tambémocorrem quan<strong>do</strong> uma obrigação futura tem que ser cumprida, não em dinheiro,mas em outros bens. Ainda mais freqüentes são transações nas quais os


contratos não têm que ser cumpri<strong>do</strong>s por ambas as partes até certo ponto notempo. Todas essas transações envolvem um risco, e tal fato é bemcompreendi<strong>do</strong> por to<strong>do</strong>s os contratantes. Quan<strong>do</strong> alguém compra (ou vende)contratos futuros de milho, algodão, ou açúcar, ou quan<strong>do</strong> alguém entra numcontrato de longo prazo para o abastecimento de carvão, ferro ou madeira, seestá bem ciente <strong>do</strong>s riscos que estão envolvi<strong>do</strong>s na transação. O agente irácuida<strong>do</strong>samente pesar as chances de variações futuras nos preços, efrequentemente tomará precauções, através de seguros e transações dehedging [*1] como aquelas que as modernas técnicas de troca desenvolveram,para reduzir o fator aleatório em suas transações.Ao fazerem contratos de longo prazo envolven<strong>do</strong> dinheiro, as partescontratantes geralmente não estão cientes de que estão toman<strong>do</strong> parte numatransação especulativa. Os indivíduos são guia<strong>do</strong>s em suas negociações pelacrença de que o dinheiro é estável em seu valor, ou seja, que seu valor objetivode troca não está sujeito a flutuações, ao menos no que seus determinantesmonetários estão relaciona<strong>do</strong>s. Isso é evidencia<strong>do</strong> mais claramente na atitudetomada pelos sistemas legais com relação ao problema <strong>do</strong> valor de trocaobjetivo <strong>do</strong> dinheiro.Na lei, o valor de troca objetivo <strong>do</strong> dinheiro é estável. É de vez em quan<strong>do</strong>afirma<strong>do</strong> que os sistemas legais a<strong>do</strong>tam a ficção da estabilidade <strong>do</strong> valor detroca <strong>do</strong> dinheiro; mas isso é falso. Ao armar uma ficção, a lei requer que nóstomemos uma situação atual e a imaginemos diferente <strong>do</strong> que realmente é,tanto pensan<strong>do</strong> em elementos não existentes como adiciona<strong>do</strong>s a ela oupensan<strong>do</strong> em elementos existentes como removi<strong>do</strong>s dela, com vistas a permitira aplicação de máximas legais as quais se referem apenas a situação entãotransformada. Seu propósito ao fazer isso é possibilitar decidir casos de acor<strong>do</strong>com uma analogia quan<strong>do</strong> uma ordem direta não se aplica. Toda a naturezadas ficções legais é determinada por esse propósito, e são sustentadas atéonde são necessárias. O legisla<strong>do</strong>r e o juiz sempre estão cientes de que asituação fictícia não corresponde à realidade. É da mesma forma com a assimchamada ficção <strong>do</strong>gmática que é empregada na jurisprudência de maneira apermitir fatos legais serem sistematicamente classifica<strong>do</strong>s e relaciona<strong>do</strong>s uns


com os outros. Aqui, novamente, a situação é pensada como se existisse, masnão é afirmada como existin<strong>do</strong> [1].A atitude da lei perante o dinheiro é um problema um pouco diferente. O juristaé completamente desfamiliariza<strong>do</strong> com o problema <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro; nãosabe nada sobre flutuações em seu valor de troca. A ingênua crença popularna estabilidade de seu valor de troca foi admitida na lei com toda suaobscuridade, e nunca nenhuma grande causa histórica de grandes e repentinasvariações no valor <strong>do</strong> dinheiro providenciou um motivo para exame crítico daatitude legal perante o assunto. O sistema de lei civil já tinha si<strong>do</strong> constituí<strong>do</strong>quan<strong>do</strong> Bodin deu o exemplo de tentar remontar variações no poder de compra<strong>do</strong> dinheiro a causas que exercem sua influência pelo la<strong>do</strong> monetário. Nessaquestão, as descobertas de economistas mais modernos não deixaram traçoalgum na lei. Para a lei, a invariabilidade <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro não é uma ficção,mas sim um fato.Tu<strong>do</strong> o mais constante, a lei devota sua atenção a certas questões incidentaisde valor <strong>do</strong> dinheiro. Ela lida profundamente com a questão de como asexistentes obrigações legais e débitos deveriam ser reconheci<strong>do</strong>s comoafeta<strong>do</strong>s pela transição de uma moeda para outra. Antigamente, ajurisprudência devotava a mesma atenção à degradação real da moeda [*2]que um pouco mais no futuro viria a devotar aos problemas cria<strong>do</strong>s pelascambiantes políticas de Esta<strong>do</strong> de escolher primeiro entre dinheiro de crédito edinheiro metálico e depois entre ouro e prata. No entanto, o tratamento queessas questões receberam nas mãos <strong>do</strong>s juristas não resultou dereconhecimento <strong>do</strong> fato de que o valor <strong>do</strong> dinheiro está sujeito à flutuaçãocontínua. De fato, a natureza <strong>do</strong> problema, e a forma pela qual foi trata<strong>do</strong>,tornaram isso impossível desde o início. Foi trata<strong>do</strong> não como uma questão daatitude da lei para com variações <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro, mas como uma questão<strong>do</strong> poder <strong>do</strong> Príncipe ou Esta<strong>do</strong> modificar arbitrariamente obrigações existentese assim então destruir direitos existentes. De uma só vez, isso deu origem aquestão de se validade legal <strong>do</strong> dinheiro era determinada pelo carimbo <strong>do</strong>soberano <strong>do</strong> país ou pelo conteú<strong>do</strong> metálico da moeda; depois, a questão dese o coman<strong>do</strong> da lei ou a livre disposição <strong>do</strong> comércio deveria definir se o


dinheiro era de curso legal ou não. A resposta da opinião pública, fundada nosprincípios da propriedade privada e proteção de direitos adquiri<strong>do</strong>s, foi amesma em ambos os casos: Front quidque contractum est, ita et solvi debet; utcum re contraximus,re solvi debet, veluti cum mutuum dedimus, ut retropecuniae tantundem solvi debeat [2]. A restrição nessa conexão, que nadadeveria ser reconheci<strong>do</strong> como dinheiro exceto o que era reconheci<strong>do</strong> como talno momento que a transação foi efetuada e que o débito deveria ser quita<strong>do</strong>novamente não meramente em metal, mas na moeda que havia si<strong>do</strong>especificada no contrato, vinha da visão popular, tomada como a única corretapor todas as classes da comunidade e especialmente pelos merca<strong>do</strong>res, a qualdizia que o que era essencial numa moeda era seu conteú<strong>do</strong> metálico, e que ocarimbo não possui outro significa<strong>do</strong> senão um certifica<strong>do</strong> das autoridadesquanto ao seu peso e pureza. Não passava pela cabeça de ninguém tratarmoedas em transações comerciais diferentemente de outras peças de metal <strong>do</strong>mesmo peso e pureza. Na verdade, atualmente é nega<strong>do</strong> que o padrãomonetário era metálico.A visão de que no cumprimento de obrigações firmadas em termos de dinheiroapenas o conteú<strong>do</strong> metálico <strong>do</strong> dinheiro deveria ser leva<strong>do</strong> em conta prevaleciacontra a <strong>do</strong>utrina nominalista exposta pelas autoridades cunha<strong>do</strong>ras. Émanifesta nas medidas legais tomadas para estabilizar o conteú<strong>do</strong> metálico dacunhagem, e desde o fim <strong>do</strong> século dezessete, quan<strong>do</strong> as moedas sedesenvolveram em padrões monetários sistemáticos, essa visão tem garanti<strong>do</strong>o critério para determinar a proporção entre duas moedas diferentes <strong>do</strong> mesmometal (quan<strong>do</strong> em circulação simultânea ou sucessivamente), e critério para astentativas, sabidamente mal sucedidas, de tentar combinar os <strong>do</strong>is metaispreciosos num sistema monetário uniforme [*3].Mesmo o aparecimento <strong>do</strong> dinheiro de crédito, e os problemas que ele trouxe,não poderiam direcionar a atenção da jurisprudência para a questão <strong>do</strong> valor<strong>do</strong> dinheiro. Um sistema de papel-moeda era imagina<strong>do</strong> como um de acor<strong>do</strong>com o espírito da lei apenas se o papel-moeda continuasse constantementeequivalente ao dinheiro metálico ao qual era originalmente e que veio asubstituir ou se o conteú<strong>do</strong> ou valor metálico das notas continuasse decisivo


em contratos ou dívidas. Mas o fato de que o valor de troca <strong>do</strong> próprio dinheirometálico está suscetível a variações continuou a escapar <strong>do</strong> reconhecimentolegal e da opinião pública, pelo menos no que concerne o ouro (e atualmentenenhum outro metal precisa ser leva<strong>do</strong> em consideração); não há máxima legalalguma que tome conta disto, mesmo que seja bem sabi<strong>do</strong> por economistaspor mais de três séculos.Nessa crença ingênua na estabilidade <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro a lei está emharmonia completa com a opinião pública. Quan<strong>do</strong> qualquer tipo de diferençasurge entre a lei e a opinião pública, uma reação deve seguir necessariamente,um movimento se vira contra aquela parte da lei que se sente ser injusta. Taisconflitos tendem a acabar numa vitória da opinião sobre a lei; ultimamente avisão da classe <strong>do</strong>minante foi incorporada à lei. O fato de que em lugar algum épossível descobrir um traço de oposição à atitude da lei nesse assunto <strong>do</strong> valor<strong>do</strong> dinheiro mostra claramente que suas medidas com relação a esse assuntonão podem estar opostas à opinião geral. Ou seja, não apenas a lei, mastambém a opinião pública nunca esteve preocupada com qualquer dúvida comrelação à estabilidade <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro; de fato, tem esta<strong>do</strong> tão livre dedúvidas quanto a isso que por um perío<strong>do</strong> extremamente longo o dinheiro foitrata<strong>do</strong> como uma medida de valor. E então, quan<strong>do</strong> alguém entra numatransação de crédito que deve ser cumprida em termos de dinheiro, nuncapassa por sua cabeça que deve levar em conta flutuações futuras no poder decompra da moeda.Toda variação na relação de troca entre o dinheiro e outros bens econômicosmuda a posição assumida inicialmente pelas partes nas transações a créditoem termos de dinheiro. Um aumento no poder de compra <strong>do</strong> dinheiro édesvantajoso para o cre<strong>do</strong>r; uma diminuição no seu poder de compra temsignificância contrária. Se as partes contratantes levassem em conta asvariações esperadas no valor <strong>do</strong> dinheiro quan<strong>do</strong> trocassem bens presentescontra bens futuros, essas conseqüências não ocorreriam. (Mas é bem verdadeque nem a extensão nem a direção dessas variações podem ser previstas.)


A variabilidade <strong>do</strong> poder de compra <strong>do</strong> dinheiro apenas é levada em contaquan<strong>do</strong> a atenção é desviada para o problema graças a coexistência de <strong>do</strong>isou mais tipos de dinheiro cuja relação de troca está sujeita a grandesflutuações. É geralmente reconheci<strong>do</strong> que possíveis variações futuras nastaxas de cambio são totalmente levadas em conta nos termos de transações decrédito de to<strong>do</strong>s os tipos. O papel desempenha<strong>do</strong> por considerações dessetipo, tanto na troca dentro países onde mais de um tipo de dinheiro está em usoe na troca entre países com moedas diferentes, é bem conheci<strong>do</strong>. Mas aconsideração da variabilidade <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro em tais casos é feita de umaforma que ainda não é incompatível com a suposição de que o valor <strong>do</strong>dinheiro é estável. As flutuações no valor de um tipo de moeda são medidaspelo equivalente de uma de suas unidades em termos de unidades de outrotipo de dinheiro, mas o valor desse outro tipo de moeda é por sua vez supostoconstante. As flutuações da moeda cuja estabilidade em prova são medidas emtemos de ouro; mas o fato de que moedas lastreadas em ouro também estãosujeitas a flutuações não é leva<strong>do</strong> em conta. Em suas transações os indivíduoslevam em conta as variações <strong>do</strong> valor de troca objetivo <strong>do</strong> dinheiro, na medidaem que estejam conscientes delas; mas estão conscientes delas apenas noque toca a certos tipos de dinheiro, não com relação a to<strong>do</strong>s. O ouro, oprincipal meio de troca hoje em dia, é considera<strong>do</strong> como estável em valor [3].Assim que variações no valor de troca objetivo <strong>do</strong> dinheiro são previstas, elasinfluenciam os termos das transações a crédito. Se uma queda futura no poderde compra da moeda é reconhecida, os empresta<strong>do</strong>res devem estarprepara<strong>do</strong>s para o fato de que a soma de dinheiro que um deve<strong>do</strong>r repaga naconclusão da transação deverá ter um poder de compra menor <strong>do</strong> que a somaoriginalmente emprestada. Os empresta<strong>do</strong>res, na verdade, estariam melhoresnão emprestan<strong>do</strong>, e compran<strong>do</strong> outros bens com seu dinheiro. O contrário éverdade para os deve<strong>do</strong>res. Se eles compram merca<strong>do</strong>rias com o dinheiro quetomaram empresta<strong>do</strong>s e as vendem novamente após um tempo, eles obterãoum excedente sobre a soma que precisam pagar de volta. Consequentementenão é difícil entender que, assim que depreciações contínuas sãoreconhecidas, aqueles que emprestam dinheiro demandam taxas mais altas dejuros e aqueles que tomam empresta<strong>do</strong> estão aceitan<strong>do</strong> pagar essas taxas


mais altas. Se, por outro la<strong>do</strong>, se espera que o valor <strong>do</strong> dinheiro aumente,então a taxa de juros será menor <strong>do</strong> que teria si<strong>do</strong> até então [4].Assim, se a direção e extensão das variações no valor de troca <strong>do</strong> dinheiropudessem ser previstas, elas não seriam capazes de afetar as relações entredeve<strong>do</strong>res e cre<strong>do</strong>res; as alterações a vir no poder de compra poderiam sersuficientemente levadas em conta nos termos originais da transação de crédito[5]. Mas já que essa suposição, mesmo que flutuações relativas ao dinheiro decrédito e fiat-money ao ouro estivessem em pauta, nunca é válida exceto numamaneira muito imperfeita, a margem deixada nos contratos de débito paravariações futuras <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro é necessariamente inadequada; mesmoainda hoje em dia, após as grandes e rápidas flutuações no valor <strong>do</strong> ouro queocorreram desde o estopim da Grande Guerra, a grande maioria daquelespreocupa<strong>do</strong>s com a vida econômica (alguém poderia dizer, de fato, to<strong>do</strong>s eles,exceto aqueles que estão familiariza<strong>do</strong>s com economia teórica) sãocompletamente ignorantes <strong>do</strong> fato de que o valor <strong>do</strong> dinheiro é variável. O valordas moedas lastreadas em ouro ainda é toma<strong>do</strong> como estável.Aqueles economistas que reconheceram que mesmo o valor <strong>do</strong> melhordinheiro é variável recomendaram que ao se firmar os termos das transaçõesde crédito, ou seja, os termos nos quais bens presentes são troca<strong>do</strong>s por bensfuturos, o meio de troca não deveria ser apenas uma merca<strong>do</strong>ria, como écomum atualmente, mas sim uma “cesta” de bens; é possível pelo menos emteoria se não o é na prática incluir to<strong>do</strong>s os bens econômicos em tal cesta [*4].Se essa proposta fosse a<strong>do</strong>tada, o dinheiro ainda seria usa<strong>do</strong> como um meiode troca de bens presentes; mas em transações a crédito as obrigaçõespendentes seriam quitadas não através <strong>do</strong> pagamento da soma nominal dedinheiro especificada no contrato, mas pelo pagamento de uma soma dedinheiro com o poder de compra que a soma original possuía quan<strong>do</strong> ocontrato foi feito. Assim, se o valor objetivo <strong>do</strong> dinheiro aumenta durante operío<strong>do</strong> <strong>do</strong> contrato, uma soma menor correspondente será paga; se o valordiminui, uma soma maior correspondente.


Os argumentos dedica<strong>do</strong>s acima ao problema de medir variações no valor <strong>do</strong>dinheiro mostram a inadequação fundamental de suas recomendações. Se ospreços <strong>do</strong>s vários bens econômicos são considera<strong>do</strong>s com o mesmo peso nadeterminação <strong>do</strong>s coeficientes de paridade sem se levar em conta suasquantidades relativas, então os males para os quais o remédio é busca<strong>do</strong>podem ser simplesmente agrava<strong>do</strong>s. Se às variações <strong>do</strong>s preços demerca<strong>do</strong>rias como trigo, centeio, algodão, carvão e ferro são dadas a mesmasignificância que às variações <strong>do</strong>s preços de merca<strong>do</strong>rias como pimenta, ópio,diamantes ou níquel, então o estabelecimento <strong>do</strong> Padrão Tabela<strong>do</strong> teria oefeito de fazer o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s contratos de longo prazo ainda mais incertosque hoje em dia. Se o que é chama<strong>do</strong> de uma média ponderada, na qual cadamerca<strong>do</strong>ria individual possui um efeito proporcional à sua significância [6], éutilizada, então as mesmas conseqüências ainda seguirão assim que ascondições de produção e consumo se alterarem. Isso porque os valoressubjetivos atribuí<strong>do</strong>s pelos seres humanos aos diferentes bens econômicosestão tão susceptíveis a flutuações constantes quanto as condições deprodução; mas é impossível levar em conta esse fato ao determinar oscoeficientes de paridade, porque estes devem ser invariáveis para se permitirconexão com o passa<strong>do</strong>.É provável que as associações imediatas de qualquer menção hoje em dia aosefeitos das variações <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro nas relações de débito existentesserão em termos <strong>do</strong>s resulta<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s monstruosos experimentos de inflaçãoque caracterizaram a história recente da Europa. Em to<strong>do</strong>s os países, durantea parte final desse perío<strong>do</strong>, os juristas discutiram a fun<strong>do</strong> a questão de se teriasi<strong>do</strong> possível ou se ainda sim seria possível, através da lei existente, oucrian<strong>do</strong> novas leis, amenizar o prejuízo causa<strong>do</strong> aos cre<strong>do</strong>res. Nessasdiscussões era usualmente deixa<strong>do</strong> de la<strong>do</strong> o fato de que variações noconteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s contratos de débito que eram conseqüências da depreciação <strong>do</strong>dinheiro eram devidas à atitude tomada pela própria lei com relação aoproblema. Não é como se o sistema legal estivesse sen<strong>do</strong> chama<strong>do</strong> pararemediar uma inconveniência pela qual não fosse responsável. Foi sua própriaatitude que foi sentida como sen<strong>do</strong> uma inconveniência – a circunstância deque o governo havia cria<strong>do</strong> a depreciação. Quanto à máxima legal pela qual


uma nota bancária inconvertível é de curso legal tanto quanto o dinheiro deouro que estava em circulação antes <strong>do</strong> estopim da Guerra, com o qual aprimeira não tem nada em comum exceto o nome “marco”, ela é uma parte deum sistema de regras legais que permitem o Esta<strong>do</strong> explorar seu poder de criardinheiro novo como uma fonte de renda [*5]. Ele não pode mais ser dissocia<strong>do</strong>desse sistema assim como as leis cancelan<strong>do</strong> a obrigação <strong>do</strong>s bancos deconverter suas notas e obrigan<strong>do</strong>-os a fazerem empréstimos para o governopara a emissão de novas notas.Quan<strong>do</strong> juristas e empresários afirmam que a depreciação <strong>do</strong> dinheiro tem umainfluência muito grande em todas as relações de débito, que ela torna to<strong>do</strong> tipode negócio mais difícil ou até mesmo impossível, que ela invariavelmente levaà conseqüências que ninguém deseja e que to<strong>do</strong>s sentem ser injustas, nósnaturalmente concordamos com eles. Numa ordem social que écompletamente fundada no uso <strong>do</strong> dinheiro e que toda a contabilidade é feitaem termos de dinheiro, a destruição <strong>do</strong> sistema monetário significa nadamenos que a destruição da base de todas as trocas. Entretanto, esse mal nãopode ser combati<strong>do</strong> por leis criadas ad hoc com o intuito de remover o far<strong>do</strong> dadepreciação de algumas pessoas, ou grupos de pessoas, ou classes dacomunidade, e consequentemente o impor de maneira ainda mais pesada emoutros. Se não desejamos as conseqüências perniciosas da depreciação, entãotemos que nos convencer de se opor às políticas inflacionárias pelas quais adepreciação é criada.Foi proposto que as pendências monetárias deveriam ser acertadas em termosde ouro e sem estarem de acor<strong>do</strong> com sua quantia nominal. Se essa propostafosse a<strong>do</strong>tada, para cada marco que fosse empresta<strong>do</strong> a soma que teria queser repagada teria que ser aquela que no momento da quitação comprasse omesmo peso de ouro que o marco era capaz quan<strong>do</strong> o contrato de débito foiacerta<strong>do</strong> [7]. O fato de que tais propostas agora são elaboradas e contam comaprovação mostra que o estatismo já perdeu sua força no sistema monetário eque as políticas inflacionistas estão inevitavelmente se aproximan<strong>do</strong> de seutérmino [8]. Mesmo há alguns poucos anos, tal proposta teria si<strong>do</strong> ridicularizadaou então rotulada como alta traição. (É, pelo jeito, característico que o primeiro


passo em direção à fortificação da idéia de que o curso legal de papel moedadeveria ser restrito ao seu valor de merca<strong>do</strong> foi toma<strong>do</strong> sem exceções emdireções que eram favoráveis ao tesouro nacional.)Para se livrar das conseqüências de políticas inflacionistas ilimitadas apenasuma coisa é necessária – a renúncia a qualquer medida inflacionista. Oproblema que os defensores <strong>do</strong> Padrão Tabela<strong>do</strong> tentam resolver através deuma “moeda merca<strong>do</strong>ria” suplementar a moeda metálica, e que Irving Fishertenta resolver através de suas propostas para estabilizar o poder de compra <strong>do</strong>dinheiro, é um de natureza diferente – lidar com variações no valor <strong>do</strong> ouro.2 - Cálculo Econômico e ContabilidadeA concepção ingênua <strong>do</strong> dinheiro como estável em valor ou como uma medidade valor também é responsável pelo cálculo econômico ser realiza<strong>do</strong> emtermos de dinheiro.Mesmo em outros assuntos, a contabilidade não é perfeita. A precisão de suasafirmações é apenas ilusória. As valorações de bens e direitos com as quaisela lida estão sempre baseadas em estimativas que dependem em maior oumenor medida de fatores incertos e desconheci<strong>do</strong>s. Assim que essa incertezase revele no la<strong>do</strong> das merca<strong>do</strong>rias nas valorações, a prática comercial,sancionada pela lei, tenta superar essa dificuldade através <strong>do</strong> exercício damaior cautela possível. Com esse propósito ela demanda estimativasconserva<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>s ativos e estimativas liberais <strong>do</strong>s passivos [*6], de forma queo comerciante possa ser preserva<strong>do</strong> de se iludir sobre o sucesso de suasempreitadas e seus cre<strong>do</strong>res protegi<strong>do</strong>s.Mas existem também deficiências na contabilidade que são devidas à incertezaquanto as suas valorações que resultam da propensão a variação <strong>do</strong> valor <strong>do</strong>próprio dinheiro. Dessas, o comerciante, o conta<strong>do</strong>r, e os tribunais de comércioestão igualmente despercebi<strong>do</strong>s. Eles tomam o dinheiro como uma medida depreço e valor, e reconhecem tão livremente em unidades monetárias quantoem unidades de área, comprimento, capacidade e peso. E se um economista


calha em direcionar sua atenção à natureza dúbia <strong>do</strong> processo, ele nãoentende nem o porquê de seus comentários [9].Esse desprezo pelas variações no valor <strong>do</strong> dinheiro no cálculo econômicofalseia toda a contabilidade de lucros e perdas. Se o valor <strong>do</strong> dinheiro cai, acontabilidade ordinária, a qual não leva em conta a depreciação monetária,mostra lucros aparentes, porque ela equipara às somas de dinheiro recebidaspelas vendas um custo de produção calcula<strong>do</strong> em dinheiro de maior valor, eporque ela amortiza <strong>do</strong>s registros originalmente estima<strong>do</strong>s em dinheiro de valormaior itens de dinheiro com um valor menor. O que é então impropriamentetoma<strong>do</strong> como lucro, ao invés de parte <strong>do</strong> capital, é consumi<strong>do</strong> peloempreende<strong>do</strong>r ou repassa<strong>do</strong> para o consumi<strong>do</strong>r na forma de reduções depreços que caso contrário não teriam si<strong>do</strong> efetuadas ou repassadas aostrabalha<strong>do</strong>res na forma de salários mais altos, e o governo age tributan<strong>do</strong> talsoma como renda ou lucros [*7]. De qualquer forma, o consumo de capitalresulta <strong>do</strong> fato que a depreciação monetária falseia a contabilidade de capital.Sob certas condições, a conseqüente destruição de capital e aumento <strong>do</strong>consumo podem ser parcialmente contrabalancea<strong>do</strong>s pelo fato de que adepreciação também dá origem a lucros genuínos, aqueles <strong>do</strong>s deve<strong>do</strong>res porexemplo, os quais não são consumi<strong>do</strong>s mas sim coloca<strong>do</strong>s em reservas. Masisso nunca poderá mais que balancear parcialmente a destruição <strong>do</strong> capitalinduzida pela depreciação [10].Os consumi<strong>do</strong>res das merca<strong>do</strong>rias que são vendidas muito barato como umresulta<strong>do</strong> desse falso reconhecimento induzi<strong>do</strong> pela depreciação não precisamser necessariamente habitantes <strong>do</strong> território no qual o dinheiro deprecia<strong>do</strong> éusa<strong>do</strong> como moeda corrente. As reduções de preço trazidas pela depreciaçãoda moeda encorajam exportações para os países cujo valor <strong>do</strong> dinheiro ou nãoestá cain<strong>do</strong> ou ao menos não tão rapidamente quanto. O empreende<strong>do</strong>r queestá operan<strong>do</strong> em termos de uma moeda com valor estável é incapaz decompetir com o empreende<strong>do</strong>r que está prepara<strong>do</strong> para fazer praticamenteuma <strong>do</strong>ação de parte de seu capital aos seus fregueses. Em 1920 e 1921,merca<strong>do</strong>res Holandeses que haviam vendi<strong>do</strong> merca<strong>do</strong>rias para a Áustria eramcapazes de comprá-las de volta muito mais barato após certo tempo, porque os


comerciantes Austríacos falharam completamente em perceber que asestavam venden<strong>do</strong> por menos que elas custavam.Até quan<strong>do</strong> a verdadeira situação não seja reconhecida, é costumeiroregozijar-se numa forma mercantilista ingênua com o aumento das importaçõese ver na depreciação <strong>do</strong> dinheiro um “prêmio de exportação” bem vin<strong>do</strong>. Masuma vez que é descoberto que a fonte de onde o premio flui é o capital dacomunidade, aí o procedimento de “liquidação” é usualmente toma<strong>do</strong> comomenos favorável. Novamente, em países importa<strong>do</strong>res a atitude <strong>do</strong> públicooscila entre indignação contra o “dumping” e satisfação com as condiçõesfavoráveis de compra.Aonde a depreciação da moeda é um resulta<strong>do</strong> da inflação governamentalcriada pela emissão de notas, é possível evitar esse efeito desastroso nocálculo econômico conduzin<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s os registros em termos de um dinheiroestável. Mas quan<strong>do</strong> a depreciação é uma <strong>do</strong> dinheiro mundial, o ouro, não hámuita escapatória [11].3 – Conseqüências sociais de variações <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro quan<strong>do</strong>apenas um tipo de dinheiro é emprega<strong>do</strong>Se ignorarmos a troca de bens presentes por bens futuros, e restringirmosnossas considerações por enquanto àqueles casos nos quais as únicas trocassão aquelas entre bens presentes e dinheiro presente apenas, veremos deuma vez uma diferença fundamental entre os efeitos de uma variação isoladaem um preço de uma merca<strong>do</strong>ria emanan<strong>do</strong> unicamente <strong>do</strong> la<strong>do</strong> real, e osefeitos da variação na relação de troca entre o dinheiro e os demais benseconômicos em geral, emanan<strong>do</strong> <strong>do</strong> la<strong>do</strong> monetário. Variações no preço deuma merca<strong>do</strong>ria em particular influenciam a distribuição de bens entreindivíduos primariamente porque a merca<strong>do</strong>ria em questão, se nãodesempenha um papel nas relações de troca, é ex-definitione não distribuídaentre os indivíduos em proporção a sua demanda por ela. Há agenteseconômicos que a produzem (no senti<strong>do</strong> amplo da palavra, para que incluamosos merca<strong>do</strong>res) e a vendem, e há agentes econômicos que meramente a


compram e a consomem. E são óbvios quais efeitos resultariam de umdeslocamento da relação de troca entre esse bem em particular os demaisbens econômicos (incluin<strong>do</strong> o dinheiro); é claro quem estaria em condições dese beneficiar daquele e quem sairia prejudica<strong>do</strong>.Os efeitos no caso <strong>do</strong> dinheiro são diferentes. Ao passo que lidamos com odinheiro, to<strong>do</strong>s os agentes econômicos são até certo ponto merca<strong>do</strong>res [12].To<strong>do</strong> agente econômico individual mantém um estoque de dinheiro adisposição que corresponde a forma e a intensidade com a qual ele é capaz deexpressar sua demanda por dinheiro no merca<strong>do</strong>. Se o valor de troca objetivode to<strong>do</strong>s os estoques de dinheiro no mun<strong>do</strong> pudesse ser instantaneamente eem igual proporção aumenta<strong>do</strong> ou reduzi<strong>do</strong>, se de uma só vez os preçosmonetários de to<strong>do</strong>s os bens e serviços pudessem subir ou cairuniformemente, a riqueza relativa <strong>do</strong>s agentes econômicos individuais nãoseria afetada. O cálculo monetário subseqüente seria com figuras maiores oumenores; e é tu<strong>do</strong>. A variação no valor <strong>do</strong> dinheiro não teria outro significa<strong>do</strong>senão um similar a uma variação no calendário ou de pesos e medidas.Os deslocamentos sociais que ocorrem em conseqüência de variações no valor<strong>do</strong> dinheiro resultam apenas da circunstância de que essa suposição nunca éválida. No capítulo lidan<strong>do</strong> com os determinantes <strong>do</strong> valor objetivo de troca <strong>do</strong>dinheiro foi mostra<strong>do</strong> que variações no valor <strong>do</strong> dinheiro sempre começam emum determina<strong>do</strong> ponto e gradualmente se disseminam através de toda acomunidade. E apenas por isso é que tais variações possuem um efeito nadistribuição social da renda.É verdade que variações nas relações de troca <strong>do</strong> merca<strong>do</strong> que emanam <strong>do</strong>la<strong>do</strong> das merca<strong>do</strong>rias também não são como regra completadas de uma sóvez; elas também começam em algum ponto em particular e depois seespalham com maior ou menor rapidez. E graças a isso, variações de preçosde tal natureza também são seguidas por conseqüências que são devidas aofato de que variações nos preços não ocorrem todas de uma vez, mas apenasgradualmente. Mas essas são conseqüências que são percebidas de maneira


sinalizada apenas por um número limita<strong>do</strong> de agentes econômicos, em outraspalavras, aqueles os quais, como intermediários ou produtores, sãovende<strong>do</strong>res da merca<strong>do</strong>ria em questão. Além disso, essa não é a soma dasconseqüências de variações no valor de troca objetivo de uma merca<strong>do</strong>ria.Quan<strong>do</strong> o preço <strong>do</strong> carvão cai porque a produção aumentou enquanto ademanda ficou inalterada, então, por exemplo, estão em apuros aquelesvarejistas que investiram em estoques <strong>do</strong>s atacadistas ao preço antigo, masagora só podem se livrar deles ao preço novo. Contu<strong>do</strong> isso sozinho nãoresponde por todas as mudanças sociais trazidas pelo aumento da produçãode carvão. O aumento da oferta de carvão terá melhora<strong>do</strong> a posiçãoeconômica da comunidade. A queda no preço <strong>do</strong> carvão não significameramente um rearranjo de renda e propriedade entre produtor e consumi<strong>do</strong>r;também expressa um aumento no dividen<strong>do</strong> nacional e na riqueza nacional.Muitos ganharam o que ninguém perdeu. No caso <strong>do</strong> dinheiro é diferente.A causa mais importante da diminuição <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro que devemos levarem conta é um aumento da oferta de dinheiro ao passo que sua demandapermanece a mesma, ou então cai, ou ainda, se aquela cresce, cresce menosque a oferta. Esse aumento na oferta de dinheiro, como vimos, começa com os<strong>do</strong>nos originais da quantidade adicional de dinheiro e só então se transfereàqueles que negociam com tais pessoas, e por aí em diante. Uma valoraçãosubjetiva menos intensa é então transmitida de pessoa em pessoa, porqueaqueles que se vêem em posse de uma quantidade adicional de dinheiro estãopropensos a aceitar pagar preços mais altos <strong>do</strong> que antes. Preços mais altoslevam a produção mais elevada e salários mais altos, e, porque isso tu<strong>do</strong> égeralmente considera<strong>do</strong> um sinal de prosperidade econômica, uma queda novalor <strong>do</strong> dinheiro é, e sempre tem si<strong>do</strong> considera<strong>do</strong> um meioextraordinariamente efetivo de aumentar o bem estar econômico [13]. Isso éuma visão errônea, porque um aumento na quantidade de dinheiro não resultaem um aumento da oferta de bens de consumo à disposição das pessoas. Seuefeito pode muito bem consistir em uma alteração da distribuição de benseconômicos entre os seres humanos, mas de maneira alguma, exceto nacircunstância casual referida na página 138 acima, pode aumentar diretamentea quantidade total de bens possuí<strong>do</strong>s pelos seres humanos, ou então seu bem


estar. É verdade que tal resulta<strong>do</strong> será trazi<strong>do</strong> indiretamente, de tal forma quequalquer mudança na distribuição também pode afetar a produção; isto é,através daquelas classes em cujo favor a redistribuição ocorre, utilizan<strong>do</strong>-se deseu coman<strong>do</strong> adicional de dinheiro para acumular mais capital <strong>do</strong> que seriaacumula<strong>do</strong> por aquelas pessoas de quem o dinheiro foi retira<strong>do</strong> [*8]. Mas istonão nos interessa aqui. Estamos interessa<strong>do</strong>s é se a variação <strong>do</strong> valor <strong>do</strong>dinheiro possui qualquer outro significa<strong>do</strong> econômico além <strong>do</strong> seu efeito nadistribuição de renda. Se não possui outro significa<strong>do</strong> econômico [*9], então oaumento de prosperidade só pode ser apenas aparente; isso uma vez que elesó pode beneficiar uma parte da comunidade as expensas de uma perdacorrespondente de outra parte. E assim é na realidade. O custo deve sersuporta<strong>do</strong> por aquelas classes ou países que são as últimas a serem atingidaspela queda no valor <strong>do</strong> dinheiro.Vamos, por exemplo, supor que uma nova mina de ouro seja inaugurada emum Esta<strong>do</strong> isola<strong>do</strong>. A quantidade de ouro suplementar que flui dali até ocomércio chega primeiro aos <strong>do</strong>nos da mina e então vai para aqueles quenegociam com eles. Se dividirmos esquematicamente toda a sociedade emquatro grupos, os <strong>do</strong>nos da mina, os produtores de bens de luxo, os produtoresremanescentes e os agricultores, os <strong>do</strong>is primeiros grupos serão capazes dedesfrutar <strong>do</strong>s benefícios resultantes da redução <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro, o primeiromais ainda <strong>do</strong> que o último. Mas assim que o dinheiro atinge o terceiro grupo, asituação está alterada. Os lucros obti<strong>do</strong>s por este grupo como um resulta<strong>do</strong> damaior demanda <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is primeiros já terão si<strong>do</strong> contrabalancea<strong>do</strong>s em algumtanto pelo aumento de preços <strong>do</strong>s bens de luxo, que já terão desfruta<strong>do</strong> deto<strong>do</strong> o efeito da depreciação quan<strong>do</strong> começarem a afetar outros bens.Finalmente, quanto ao quarto grupo, o processo to<strong>do</strong> não resultará em nadaalém de perdas. Os fazendeiros terão que pagar mais caro por to<strong>do</strong>s osprodutos industriais antes que sejam compensa<strong>do</strong>s pelos preços mais altos <strong>do</strong>sprodutos agrícolas. É verdade que no final, quan<strong>do</strong> os preços agrícolassubirem, o perío<strong>do</strong> de dificuldade econômica para os fazendeiros já terápassa<strong>do</strong>; mas não será mais possível então para eles garantirem lucros que oscompensarão pelas perdas que sofreram. Isto é, eles não serão capazes deutilizar suas receitas ampliadas para comprar merca<strong>do</strong>rias a preços


correspondentes ao nível antigo de valor <strong>do</strong> dinheiro; isso porque o aumento<strong>do</strong>s preços já terá atingi<strong>do</strong> toda a comunidade. Assim as perdas sofridas pelosfazendeiros no momento em que ainda vendiam seus produtos a preçosantigos, mas tinham que pagar por produtos de terceiros aos novos e maisaltos preços continuam não compensadas. São essas perdas <strong>do</strong>s grupos quesão os últimos a serem atingi<strong>do</strong>s pela variação <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro queconstituem em última instância a fonte <strong>do</strong>s lucros feitos pelos <strong>do</strong>nos da mina egrupos mais próximos conecta<strong>do</strong>s com eles.Não há diferença entre os efeitos na distribuição de renda e riqueza que sãoprovoca<strong>do</strong>s pelo fato que variações no valor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro nãoafetam bens e serviços diferentes ao mesmo tempo e com a mesmaintensidade, seja numa situação de dinheiro metálico ou de dinheiro de créditoou fiat-money. Quan<strong>do</strong> o aumento da oferta de dinheiro se dá por meio deemissão de papel-moeda ou de notas bancárias inconvertíveis [*10], apenasnum primeiro momento certos agentes econômicos irão se beneficiar daquantidade adicional de dinheiro que se espalha apenas gradualmente por todaa comunidade. Se, por exemplo, há uma emissão de papel moeda em temposde guerra, as novas notas chegarão primeiro nos bolsos <strong>do</strong>s contratantes deguerra [*11]. Como resulta<strong>do</strong>, a demanda dessas pessoas por certos artigosaumentará, assim como o preço de venda destes, especialmente se foremartigos de luxo. Assim, a posição <strong>do</strong>s produtores desses artigos serámelhorada, sua demanda por outras merca<strong>do</strong>rias também aumentará, e dessamaneira o aumento de preços e vendas continuará, se distribuin<strong>do</strong> numnúmero de artigos constantemente aumenta<strong>do</strong>, até que tenha, enfim, atingi<strong>do</strong>todas elas [14]. Nesse caso, como antes, há aqueles que ganham com ainflação e aqueles que perdem com ela. Quanto mais ce<strong>do</strong> alguém está emcondições de ajustar sua renda monetária ao seu novo valor, mais favorávelserá o processo para ele. Quais pessoas, grupos, e classes se dão melhornisso tu<strong>do</strong>, e quais se dão pior, depende <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s atuais de cada casoindividual, sem conhecimento <strong>do</strong>s quais não estamos em posições de formarum julgamento.


Deixe nos aban<strong>do</strong>nar o exemplo de um Esta<strong>do</strong> isola<strong>do</strong> e virar nossa atençãoaos movimentos internacionais que surgem devi<strong>do</strong> a uma queda no valor <strong>do</strong>dinheiro devi<strong>do</strong> a um aumento em sua quantidade. Aqui, novamente, oprocesso é o mesmo. Não há aumento na oferta de bens disponível; apenassua distribuição é alterada. O país no qual novas minas estão localizadas e ospaíses que negociam diretamente com ele tem sua posição melhorada pelofato de que eles ainda são capazes de comprar merca<strong>do</strong>rias de outros paísesaos preços antigos quan<strong>do</strong> a depreciação em casa já aconteceu. Aquelespaíses que são os últimos a serem atingi<strong>do</strong>s pela nova corrente de dinheiro sãoaqueles que devem em última instância pagar o custo <strong>do</strong> maior bem estar <strong>do</strong>soutros países [*12]. Dessa forma a Europa fez um mau negócio quan<strong>do</strong> asrecém descobertas minas de ouro da América, Austrália, e África <strong>do</strong> Sul deramorigem a um tremen<strong>do</strong> boom nesses países. Palácios brotaram <strong>do</strong> dia para anoite aonde não havia nada exceto florestas virgens e desertos há alguns anosatrás; as pradarias foram intersectadas por ferrovias; e toda e qualquer coisano caminho de ser bem de luxo que poderia ser produzida pelo Velho Mun<strong>do</strong>encontrou merca<strong>do</strong>s em territórios nos quais até pouco atrás tinham si<strong>do</strong>povoa<strong>do</strong>s por nômades nus e em pessoas que até pouco tempo atrás estavamsem mesmo as mais limitadas necessidades de existência. Toda essa riquezafoi importada <strong>do</strong>s antigos países industriais pelos novos coloniza<strong>do</strong>res, ossortu<strong>do</strong>s cava<strong>do</strong>res, e paga em ouro que foi gasto assim que o foi recebi<strong>do</strong>. Éverdade que os preços pagos por essas merca<strong>do</strong>rias eram maiores <strong>do</strong> queteria correspondi<strong>do</strong> ao antigo poder de compra <strong>do</strong> dinheiro; entretanto, nãoeram tão altos para que cubram completamente as novas circunstâncias. AEuropa exportou navios e trilhos, bens metálicos e têxteis, mobília e máquinas,por ouro o qual ela pouco ou nada necessitava, uma vez que to<strong>do</strong> o que elapossuía era suficiente para todas suas transações monetárias.Uma diminuição <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro ocasionada por qualquer outro tipo decausa teria um efeito completamente similar. As conseqüências econômicas devariações no valor <strong>do</strong> dinheiro são determinadas não por suas causas, mas simpela natureza de seu lento progresso, de pessoa a pessoa, de classe a classe,e de país a pais. Se considerarmos em particular aquelas variações no valor <strong>do</strong>dinheiro que surgem da ação de vende<strong>do</strong>res quan<strong>do</strong> os preços estão em


elevação, como descrito no segun<strong>do</strong> capítulo dessa parte, veremos que adiminuição gradual <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro resultante constitui uma dasmotivações <strong>do</strong>s grupos que aparentemente ditam a alta de preços. Os gruposque iniciam o aumento o vêem contra sua própria vantagem quan<strong>do</strong> os demaisgrupos eventualmente também aumentam seus preços; mas os grupos iniciaisrecebem seus preços mais altos quan<strong>do</strong> os preços das coisas que compramainda estão no nível mais baixo. Isso constitui um ganho permanente para eles.Este é contrabalancea<strong>do</strong> pelas perdas daqueles grupos que são os últimos aaumentarem os preços <strong>do</strong>s seus bens ou serviços; esses já têm que pagarpreços mais altos quan<strong>do</strong> ainda estão receben<strong>do</strong> preços mais baixos por aquiloque vendem. E quan<strong>do</strong> eventualmente também aumentam seus preços, aoserem os últimos a fazer eles não podem mais cobrir suas perdas anteriores àcusta das demais classes da comunidade. Assalaria<strong>do</strong>s costumavam estarnessa situação, porque como uma regra o preço <strong>do</strong> trabalho não participava<strong>do</strong>s estágios iniciais <strong>do</strong> movimento de alta de preços. Aqui os empreende<strong>do</strong>resganhavam aquilo que os trabalha<strong>do</strong>res perdiam. Por um longo tempo,servi<strong>do</strong>res civis estavam na mesma situação. Suas numerosas reclamaçõeseram parcialmente baseadas no fato de que, uma vez que rendas monetáriasnão podiam ser facilmente aumentadas, eles tinham que pagar o custo <strong>do</strong>aumento contínuo de preços. Mas recentemente esse esta<strong>do</strong> de coisas mu<strong>do</strong>uatravés da organização <strong>do</strong>s servi<strong>do</strong>res civis em linhas de sindicato, o que ospermitiu garantir uma resposta mais rápida às suas demandas por aumentossalariais.O inverso <strong>do</strong> que é verdade numa depreciação no valor <strong>do</strong> dinheiro vale paraum aumento de seu valor. A apreciação monetária, assim como a depreciaçãomonetária, não ocorre subitamente e uniformemente através da comunidadeinteira, mas como uma regra começa a partir de classes específicas e seespalha gradualmente. Se não fosse esse o caso, e se o aumento no valor <strong>do</strong>dinheiro se desse quase simultaneamente em toda a comunidade, então nãoseria acompanhada pelo tipo especial de conseqüências econômicas que nosinteressam aqui. Deixe nos supor, por exemplo, que a falência de instituiçõesde crédito de um país leve a um pânico e que to<strong>do</strong>s estejam prontos paravender merca<strong>do</strong>rias a qualquer preço oferta<strong>do</strong> para se ver na posse de


dinheiro, enquanto por outro la<strong>do</strong> não se acham compra<strong>do</strong>res senão por preçosmuito reduzi<strong>do</strong>s. É possível que o aumento <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro que viria comoconseqüência de tal pânico afetaria todas as pessoas e merca<strong>do</strong>riasuniformemente e simultaneamente. Como uma regra, entretanto, um aumentono valor <strong>do</strong> dinheiro se espalha apenas gradualmente. Os primeiros daquelesque tem que se contentar com preços pelas merca<strong>do</strong>rias que vendem maisbaixos <strong>do</strong> que os anteriores, enquanto ainda tem que comprar pelos preçosantigos, são aqueles prejudica<strong>do</strong>s pelo aumento <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro. Aqueles,entretanto, que são os últimos que tem que reduzir os preços das merca<strong>do</strong>riasque vendem, e enquanto isso estavam em condições de se aproveitar daqueda <strong>do</strong> preço das outras coisas, são aqueles que lucram com a mudança.4 – As conseqüências das variações da relação de troca entre <strong>do</strong>is tiposde dinheiroDentre as conseqüências de variações no valor <strong>do</strong> dinheiro temos aquelasvariações entre a relação de troca entre de tipos diferentes de dinheiro, nasquais a ciência econômica está extremamente interessada. Esse interesse foidesperta<strong>do</strong> pelos eventos da história monetária. Ao longo <strong>do</strong> século dezenove,o comércio internacional se desenvolveu de uma maneira até entãoinimaginável, e as conexões econômicas entre os países se tornaramextraordinariamente estreitas. E bem nesse momento quan<strong>do</strong> as relaçõescomerciais estavam começan<strong>do</strong> a se tornarem mais ativas, os padrõesmonetários <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s individuais estavam se tornan<strong>do</strong> mais diversos. Umnúmero de países se engajou por um perío<strong>do</strong> maior ou menor no dinheiro decrédito, e os demais, que estavam parcialmente em ouro e parcialmente emprata, rapidamente estavam em dificuldades, porque a razão entre os valoresdesses <strong>do</strong>is metais preciosos, que havia muda<strong>do</strong> apenas vagarosamentedurante séculos, subitamente começou a exibir variações bruscas. Em anosrecentes ainda foi atribuí<strong>do</strong> um significa<strong>do</strong> prático muito maior a esse problemagraças aos acontecimentos monetários <strong>do</strong>s perío<strong>do</strong>s de guerra e pós-guerra.Vamos supor que um quilo de prato fosse trocável por 10 quintais de trigo, eque com o valor objetivo de troca da prata sen<strong>do</strong> reduzi<strong>do</strong> pela metade devi<strong>do</strong>,


digamos, a uma descoberta de minas novas e mais produtivas, um quilodaquela não seria mais capaz de comprar mais <strong>do</strong> que cinco bushels [*13] detrigo. Partin<strong>do</strong> daquilo que já foi dito sobre a relação de troca natural entre <strong>do</strong>istipos de dinheiro, segue que o valor objetivo de troca da prata em termos deoutros tipos de moeda também teria si<strong>do</strong> agora corta<strong>do</strong> pela metade. Sepreviamente tivesse si<strong>do</strong> possível comprar um quilo de ouro com quinze quilosde ouro, seriam necessários agora trinta quilos de prata para realizar a mesmatransação; isso porque o valor objetivo de troca <strong>do</strong> ouro em relação asmerca<strong>do</strong>rias teria se manti<strong>do</strong> inaltera<strong>do</strong>, enquanto aquele da prata teria si<strong>do</strong>reduzi<strong>do</strong> pela metade. Agora essa mudança no poder de compra da pratasobre as merca<strong>do</strong>rias não aconteceria de uma só vez, mas constantemente.Um tratamento completo foi da<strong>do</strong> à maneira pela qual a mudança começará apartir de certo ponto e gradualmente se espalhará em outras direções, e àsconseqüências desse processo. Até agora nós só investigamos aquelasconseqüências que ocorrem dentro de uma área com um padrão monetáriouniforme; mas agora devemos buscar as conseqüências posteriores envolvidasem relações comerciais com áreas nas quais outros tipos de dinheiro sãoemprega<strong>do</strong>s. Uma coisa que era válida para o caso anterior pode serestabelecida também para esse: se variações no valor objetivo de troca <strong>do</strong>dinheiro ocorressem uniforme e simultaneamente por toda a comunidade,então tais conseqüências sociais não poderiam de forma alguma surgir. O fatode que essas variações sempre ocorrem uma após a outra é o fator único paraseus notáveis efeitos econômicos.Variações no valor objetivo de troca de um da<strong>do</strong> tipo de dinheiro não afetam adeterminação da relação de troca entre esse e outros tipos de dinheiro até quecomecem a afetar merca<strong>do</strong>rias que são ambas objetos de relações comerciaisentre as duas áreas ou que ao menos são capazes de assim se tornarem comuma mudança moderada nos preços. O ponto no tempo no qual essa situaçãonasce determina os efeitos sobre as relações comerciais das duas áreas queresultarão de variações no valor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro. Esse valor variade acor<strong>do</strong> com a forma pela qual os preços das merca<strong>do</strong>rias envolvidas nastrocas internacionais são ajusta<strong>do</strong>s ao novo valor <strong>do</strong> dinheiro, antes ou depois<strong>do</strong>s preços das demais merca<strong>do</strong>rias. Sob a moderna organização <strong>do</strong> sistema


monetário esse ajuste é usualmente feito primeiramente nas Bolsas de Valores.A especulação com o cambio e nos merca<strong>do</strong>s de títulos antecipa variaçõesfuturas nas relações de troca entre os diferentes tipos de dinheiro nummomento no qual variações <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro ainda não completaram deforma alguma seu curso ao longo da comunidade, talvez quan<strong>do</strong> elas tenhamapenas o inicia<strong>do</strong>, mas de qualquer maneira antes de terem atingi<strong>do</strong> asmerca<strong>do</strong>rias que desempenham um papel decisivo no comércio exterior. Seriaum péssimo especula<strong>do</strong>r aquele que não captasse o curso <strong>do</strong>s eventos aolongo <strong>do</strong> tempo e agisse de acor<strong>do</strong>. Mas assim que a variação da taxa decâmbio aconteceu, ela provoca uma reação no comércio internacional de umamaneira peculiar até que to<strong>do</strong>s os preços de to<strong>do</strong>s os bens e serviços tiveremsi<strong>do</strong> ajusta<strong>do</strong>s ao novo valor objetivo de troca <strong>do</strong> dinheiro. Durante esseintervalo as margens entre os diferentes preços e salários constituem um fun<strong>do</strong>que alguém deverá receber e alguém aban<strong>do</strong>nar. Numa palavra, estamos aquinovamente confronta<strong>do</strong>s com uma redistribuição, a qual é notável uma vez quesua influência se entende além da área na qual o bem cujo valor objetivo detroca está em mutação é emprega<strong>do</strong> como dinheiro <strong>do</strong>méstico. É claro queessa é o único tipo de conseqüência que pode surgir de variações no valor <strong>do</strong>dinheiro. O estoque social de bens não foi incrementa<strong>do</strong> de forma alguma; aquantidade total que pode ser distribuída continuou a mesma.Assim que uma mudança incompleta no valor objetivo de troca de qualquer tipoparticular de dinheiro se expressa em taxas de câmbio, uma nova oportunidadede auferir lucros é aberta, tanto para exporta<strong>do</strong>res quanto para importa<strong>do</strong>res deacor<strong>do</strong> com o poder de compra <strong>do</strong> dinheiro descendente ou ascendente.Vamos considerar o primeiro caso, o de uma diminuição <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro.Uma vez que, de acor<strong>do</strong> com nossas pressuposições, mudanças nos preços<strong>do</strong>mésticos ainda não estão finalizadas, os exporta<strong>do</strong>res se beneficiam dacircunstância de que as merca<strong>do</strong>rias que negociam já alcançam os preçosnovos mais altos enquanto que as merca<strong>do</strong>rias e serviços que desejam, e oque é de particular importância, o fatores de produção materiais e pessoais queempregam, ainda são obti<strong>do</strong>s aos preços antigos mais baixos. Se o“exporta<strong>do</strong>r” que embolsa esse ganho é um produtor ou um intermediário, éimpertinente para nossa investigação atual; tu<strong>do</strong> o que precisamos saber é que


nas dadas circunstâncias as transações resultarão em lucros para alguns eperdas para outros.De qualquer maneira o exporta<strong>do</strong>r divide seus lucros com o importa<strong>do</strong>r econsumi<strong>do</strong>r estrangeiros. E é até mesmo possível – isto depende daorganização <strong>do</strong> comércio exporta<strong>do</strong>r – que os lucros reti<strong>do</strong>s pelo exporta<strong>do</strong>rsejam apenas aparentes, e não reais.Assim o resulta<strong>do</strong> será sempre que os ganhos <strong>do</strong>s compra<strong>do</strong>res estrangeiros,que em certos casos são dividi<strong>do</strong>s com exporta<strong>do</strong>res caseiros, serãocontrabalancea<strong>do</strong>s pelas perdas que são sofridas inteiramente em casa. Éclaro que o que foi dito da promoção da exportação através da falsificação <strong>do</strong>cálculo monetário se aplica também ao “prêmio de exportação” que surge deuma diminuição <strong>do</strong> valor <strong>do</strong> dinheiro.Notas <strong>do</strong> Autor:[1] Cp. Dernburg, Pandekten, 6. Aufl. Berlin 1900, I Bd., p. 84. Sobre o fato deque uma das características principais de uma ficção é a consciência explícitade sua condição ficcional ver também Vaihinger, Die Philosophie des Als oft, 6.Aufl., Leipzig igao, p. 173 (Tradução para inglês, The Philosophy of'As If,Kegan Paul, Lon<strong>do</strong>n 1924).[2] L. 80, Dig. de solutionibus et tiberationibus 46, 3. I'omponius libro quarto adQuintum Mucium, Cp. ver mais em Seidler, op. cit., pp. 685 ft'.; Endemann, op.cit., II I3d., p. 173.[3] Numa resenha da primeira edição (Die Neue Zeit, 30 Jahrgang, II BD.,p.102), Hilferding criticou os argumentos acima como “meramente engraça<strong>do</strong>s”.Talvez seja exigir muito esperar que esse senso de humor indiferente seja


capta<strong>do</strong> por aquelas classes da nação Alemã que sofreram as conseqüênciasda depreciação <strong>do</strong> marco. Há ainda um ano ou <strong>do</strong>is nem mesmo essesparecem ter compreendi<strong>do</strong> o problema um pouco melhor. Fisher (Hearingsbefore the Committee on Banking and Currency of the House ofRepresentatives, 67th Congress, 4th Session, on H.R. 11788, Washington1923, pp. 5 ff., 25 ff.) dá ilustrações típicas. Foi certamente um destino cruelpara a Alemanha que sua política econômica e monetária nos anos recentesficasse nas mãos de homens como Hilferding e Havestein, os quais não eramqualifica<strong>do</strong>s nem para lidar com a depreciação <strong>do</strong> marco com relação ao ouro.[4] Hearings before the Committee on Banking and Currency of the House ofRepresentatives, 67th Congress, 4th Session, on H.R. 11788, Washington1923, pp. 5 ff., 25 ff.)[5] Cp. Ciark, Essentials, pp. 542 ff.[6] Cp. Walsh The Measurement of General Exchange Value, pp. 80 ff.; 2izek,Die statistischen Mittelwerte, Leipzig 1908, pp. 183 ff.[7] Cp. Miigel, Geldentwertung und Gesetzgebung, Berlin 1923, p. 24.[8] Deve-se lembrar que tu<strong>do</strong> isso foi escrito em 1924. (Nota <strong>do</strong> tradutor daversão em inglês)[9] Em Viena em Março de 1892, nas sessões da Comissão de InvestigaçãoSobre a Moeda que foi convocada para a preparação da regulação da moedaAustríaca, Carl Menger disse:“Eu gostaria de adicionar que não apenas legisla<strong>do</strong>res, mas to<strong>do</strong>s nós emnossa vida cotidiana, estamos acostuma<strong>do</strong>s a desprezar as flutuações nopoder de compra da moeda. Mesmo banqueiros distintos como vocês,senhores, realizam seus balancetes ao final <strong>do</strong> ano sem investigar se poracaso a soma de dinheiro que representava a cota de capital ganhou ouperdeu poder de compra.”


Essas afirmações de Menger não foram compreendidas pelo diretor <strong>do</strong>Bodenkreditanstalt, Theo<strong>do</strong>r <strong>von</strong> Taussig, o mais proeminente de to<strong>do</strong>s osbanqueiros Austríacos. Ele respondeu:“Um balancete é um balanço da propriedade ou ativos de uma companhia ouindivíduo contra seus passivos, ambos expressos em termos da medida devalor ou padrão monetário aceito, por exemplo, na Áustria o florim. Agora eunão consigo ver como quan<strong>do</strong> assim estamos expressan<strong>do</strong> propriedade edébitos em termos <strong>do</strong> padrão (o qual assumimos ser homogêneo) podemoslevar em conta variações no padrão de medida ao invés de levar em contavariações no objeto a ser medi<strong>do</strong>, como de praxe.”Taussig falhou completamente em perceber que o ponto em discussão era aestimativa <strong>do</strong> valor <strong>do</strong>s bens e a quantidade de depreciação a ser deduzida, enão como o balanço de direitos e obrigações monetárias, ou como umacontabilidade de lucros e perdas, se essa não for absurdamente inexata, develidar com variações no valor <strong>do</strong> dinheiro. Menger não teve oportunidade defocar nesse ponto em sua resposta, uma vez que ele estava ao invésinteressa<strong>do</strong> em mostrar que suas afirmações não deveriam ser interpretadas,como Taussig estava propenso a fazer, como uma acusação de práticadesonesta por parte <strong>do</strong>s diretores <strong>do</strong> banco. Menger adicionou:“O que eu disse era meramente de to<strong>do</strong>s nós, não apenas <strong>do</strong>s diretores <strong>do</strong>sbancos (eu disse até homens como aqueles que estão no coman<strong>do</strong> <strong>do</strong>sbancos), cometem o erro de não levar em conta na vida cotidiana as mudançasno valor <strong>do</strong> dinheiro.”(Cp. Stenographische Protokolle uber die vom 8. bis 17. Marz 1S92abgehaltenen Sitzungen der nach Wien einberufenen Wahrurtgs-Enquete-Kommission, Vienna 1892, pp. 211, 257, 27°)


[10] Cp. Meu livro, Nation, Staat unci Wirlschaft, Vienna 1919, pp. 139 ff. Umasérie completa de escritos lidan<strong>do</strong> com esses assuntos apareceu na Alemanhae na Áustria.[11] Mais na página 401.[12] Cp. Ricar<strong>do</strong>, Letters to Malthus, ed, Bonar, Oxford 1887, p. to.[13] Cp. Hume, op. cit., p. 294 ff.[14] Cp. Auspitz and Lieben, Untersuchungen iiber die Theorie des Preises,Leipzig 1889, p. 65.Notas <strong>do</strong> Tradutor:[*1] “Hedging” seriam transações que teriam como objetivo minimizar o risco.Por exemplo, alguém que mexe com importação tem dúvidas quanto ao câmbiofuturo. Essa pessoa irá comprar um contrato de opção de moeda estrangeira.Ela pagará um valor presente para ter o direito de compra de certa quantidadede moeda estrangeira no futuro a um valor pré-fixa<strong>do</strong> no contrato, não sen<strong>do</strong>obrigada a executar a compra se as condições futuras forem tais que comprara moeda estrangeira à vista no merca<strong>do</strong> seja mais barato <strong>do</strong> que nos termos<strong>do</strong> contrato. Empresas que negociam tais transações de risco são chamadasde “hedge funds”.[*2] Antigamente, quan<strong>do</strong> os reis queriam recursos, eles simplesmenterecolhiam as moedas de prata e ouro em circulação, e as recunhavam,devolven<strong>do</strong> ao público moedas com menor pureza e fican<strong>do</strong> com o conteú<strong>do</strong>restante. Dessa forma, os governantes se apropriavam <strong>do</strong> ouro e prata <strong>do</strong>ssúditos. Quan<strong>do</strong> atualmente o governo incorre em déficits públicos ou emitemoeda, ele está fazen<strong>do</strong> algo análogo com sua população.


[*3] O sistema bimetálico não funcionava direito porque os governos tentavamdeterminar a taxa de câmbio entre os metais, função que deveria ser cumpridapelo processo de merca<strong>do</strong>. Na prática, os governos criavam uma diferença depreços artificial entre o mun<strong>do</strong> interno e o externo. Se, por exemplo, o preço <strong>do</strong>ouro em termos de prata dentro <strong>do</strong> país sob o regime de câmbio fixo estivessemais barato <strong>do</strong> que no mun<strong>do</strong> exterior (digamos 15 pratas por ouro lá dentrocontra 20 pratas por ouro lá fora), compensaria para os agentes de dentro <strong>do</strong>país trocarem prata por ouro sob a paridade fixa e venderem o ouro no exterior,realizan<strong>do</strong> lucros (ganhan<strong>do</strong> 5 pratas extra). Essa é a chamada Lei deGreshan, que postula que a “moeda ruim” (no caso a artificialmentedesvalorizada, a prata) expulsa <strong>do</strong> país a “moeda boa” (no caso aartificialmente valorizada, o ouro).[*4] Em seu “Desnacionalização <strong>do</strong> <strong>Dinheiro</strong>”, Hayek propõe que a moeda sejaemitida levan<strong>do</strong>-se em conta as relações de troca de uma “cesta” de bensprimários.[*5] <strong>Mises</strong> aí se refere ao problema da moeda de curso legal, ou seja, algo quea lei reconhece e obriga a aceitação como meio de pagamento. Ao obrigar ummeio de pagamento a ser aceito, o governo implicitamente legaliza o sistemade reservas fracionárias – sistema no qual os depósitos bancários não sãomanti<strong>do</strong>s 100% nos “cofres” <strong>do</strong> banco. Isso proporciona aos bancos aoportunidade de emprestar parte <strong>do</strong> dinheiro <strong>do</strong>s correntistas sem seuconsentimento, crian<strong>do</strong> novos meios de pagamento e expandin<strong>do</strong> a ofertamonetária. O Esta<strong>do</strong> pode se valer desse sistema para criar dinheiro e utilizalo.[*6] Para simplificar o entendimento, ativos podem ser considera<strong>do</strong>s comofontes (possíveis) de renda e passivos como fontes (possíveis) de despesas.[*7] Para clarificar o ponto de <strong>Mises</strong>: imagine que um empresário teve custosde 10, uma receita de 20, incorren<strong>do</strong> num lucro de 10. Suponha também que odinheiro perdeu valor de forma que aquelas coisas com as quais o empresáriogastaria antes 10 agora lhe requerem 15. Como o aumento de preços não é


instantâneo e homogêneo, o nosso empresário, que na realidade lucrou 5,pensa que lucrou 10. Se ele resolver investir, abaixar seus preços ou aumentaros salários de seus funcionários antes de perceber a perda <strong>do</strong> valor <strong>do</strong>dinheiro, poderá vir a gastar mais que os 5 que ele realmente lucrou,consumin<strong>do</strong> seu capital e cometen<strong>do</strong> um erro crasso.[*8] É bem verdade que numa situação hipotética o dinheiro poderia serredistribuí<strong>do</strong> casualmente em favor de algum empreende<strong>do</strong>r que realizasse uminvestimento tecnicamente mais produtivo <strong>do</strong> que aquele que seria realiza<strong>do</strong>pelo antigo <strong>do</strong>no. Mas defender tal redistribuição seria um argumento utilitaristae sem bases morais (como o respeito a um sistema qualquer pré-defini<strong>do</strong> depropriedade). Nesse caso em particular a oportunidade de lucro existe (oinvestimento tecnicamente mais produtivo), e está esperan<strong>do</strong> algumempreende<strong>do</strong>r alerta aproveita-la, ou seja, mais ce<strong>do</strong> ou mais tarde a próprialivre interação humana encontrará uma solução para o problema.[*9] Alterações no valor <strong>do</strong> dinheiro possuem sim outros significa<strong>do</strong>seconômicos, reconheci<strong>do</strong>s pelo próprio <strong>Mises</strong> neste livro e por outros autores.Reduzir o valor <strong>do</strong> dinheiro engendra o que é chama<strong>do</strong> de ciclos econômicos.Isso se daria resumidamente da maneira a seguir:Com o novo dinheiro, mais fun<strong>do</strong>s podem ser canaliza<strong>do</strong>s para o merca<strong>do</strong> deempréstimos, fazen<strong>do</strong> a taxa monetária de juros cair. Isso modifica os preçosrelativos entre bens de ordem mais elevada (mais distantes <strong>do</strong> consumo) epreços de bens de ordem mais baixa. Por quê? Processos mais demora<strong>do</strong>s deprodução costumam ser mais rentáveis (um agente só empregará um processomais demora<strong>do</strong>, tu<strong>do</strong> o mais constante, se for mais rentável que um menosdemora<strong>do</strong>), e, como a taxa de juros monetária caiu, alguns desses processosmais demora<strong>do</strong>s parecem agora lucrativos. Na realidade os agentes pensamque há poupança real suficiente para tocar os projetos ao longo <strong>do</strong> tempo, sinaltransmiti<strong>do</strong> pela taxa monetária de juros mais baixa. Entretanto, a adição dedinheiro não aumentou a quantidade de poupança real para tocar esses


projetos, apenas redistribuiu riqueza, como <strong>Mises</strong> enfatiza. Num futuro nãomuito distante, quan<strong>do</strong> os preços <strong>do</strong>s bens de ordem mais baixa tiverem si<strong>do</strong>pressiona<strong>do</strong>s para cima, devi<strong>do</strong> à competição desses novos investi<strong>do</strong>res, osagentes perceberão que não há poupança real suficiente para tornarem osinvestimentos feitos lucrativos. Isso gera uma tendência de nova mudança <strong>do</strong>spreços relativos, agora tornan<strong>do</strong> os bens ordens mais baixa mais caros emrelação aos bens de ordem mais elevada, agora inúteis. É a recessão.Para uma leitura mais aprofundada sobre os ciclos econômicos, ver osseguintes livros:<strong>Mises</strong> – Theory of Money and Credit<strong>Mises</strong> – Ação HumanaHayek – Prices And ProductionOu fuce sobre o assunto no www.mises.org e www.mises.org.br[*10] Uma nota bancária inconvertível seria um fruto <strong>do</strong> sistema de reservabancária fracionária. Ou seja, seria uma nota para a qual não existiria dinheiro(seja ele ouro, fiat-money, dinheiro de crédito, etc.) em caixa no banco pararedimi-la, caso to<strong>do</strong>s os detentores de notas bancárias chegassem ao mesmotempo no banco para quita-las.[*11] Isso é um fato recorrente na história. Os exemplos mais cita<strong>do</strong>s são:“assignats” (no perío<strong>do</strong> da Revolução Francesa) e os “greenbacks” (na GuerraCivil Americana). Virtualmente todas as guerras governamentais <strong>do</strong> século XXe XXI foram e são pagas com emissão de dinheiro. O governo americano, porexemplo, financia seus gastos militares através de um déficit públicomonumental.[*12] Essa é uma questão mais complexa, que remete ao tema de “exportaçãode inflação”. Teoricamente, há vários fatores influin<strong>do</strong> em tal questão: regimecambial (fixo ou desregula<strong>do</strong>); padrão monetário (padrão ouro, papel-moedaestatal, moedas privadas, etc.); sistema bancário (reservas fracionárias ou


100%) e, é claro, o problema <strong>do</strong> conhecimento (que leva em conta o fato deque mudanças em qualquer variável econômica não estão disponíveis parato<strong>do</strong>s instantaneamente, e nem são interpretadas de maneira igual pelosagentes).<strong>Mises</strong> dá ênfase a um cenário onde temos o padrão ouro, câmbio fixo (asmoedas equivalem a um peso de ouro) e sistema de reservas fracionárias. Odefini<strong>do</strong>r em última instância se há ou não exportação de inflação, em minhaopinião, seria o problema <strong>do</strong> conhecimento, sen<strong>do</strong> as demais variáveisinfluentes apenas na intensidade e forma de como a desvalorização seprocessa.Nesse cenário proposto, a descoberta de novas minas de ouro dariaoportunidade para os detentores da moeda lastreada nesse ouro comprar bens<strong>do</strong>s demais países que estão dentro <strong>do</strong> padrão ouro a um preço inicialmentemais baixo <strong>do</strong> que aqueles que comprarão depois. Países com sistemabancário mais desenvolvi<strong>do</strong> (e que por conseqüência criam mais moeda nosistema de reservas fracionárias) tendem até certo ponto a levar vantagem nocomércio, pois podem trocar notas bancárias inconvertíveis por bens ou ouroantes que os demais agentes percebam o truque. Num momento posterior apressão se daria no câmbio, impossibilitan<strong>do</strong> que o sistema prossiga, massempre haverá uma janela de lucros e perdas enquanto os agentes nãoidentificarem que estão sen<strong>do</strong> ludibria<strong>do</strong>s.Atualmente, a situação será um tanto quanto semelhante com a crise <strong>do</strong>subprime. Se o governo americano injetar mais dólares na economia, aquelesque negociam mundialmente em dólar, e que não têm condições no momentode usar outra moeda, que têm contratos fixos de longo prazo para recebimentode dólares, ou que simplesmente são obriga<strong>do</strong>s a usar dólares (a maioria dapopulação americana) serão prejudica<strong>do</strong>s em favor daqueles que receberemos dólares antes (os banqueiros de Wall Street).Em suma, quero dizer que a “exportação de inflação”, significan<strong>do</strong> umaelevação de preços iniciada em um país e absorvida por outro, está ligada a


alguns fatores básicos: quantidade de pessoas que usam a moeda depreciadano país não emissor; fatores potencializantes de emissão e recepção de novamoeda (sistema de reservas fracionárias, déficit público, câmbio fixo,quantidade de contratos inalteráveis já feitos, monopólio estatal da moeda); eao fluxo de informações <strong>do</strong> sistema, que quanto mais eficiente, mais evita queas pessoas se envolvam em transações potencialmente maléficas, quedisseminam a alta de preços.[*13] Se tratam de medidas de quantidade. Um quintal seria 100 quilos e 1bushel-trigo seria 27,2154 quilos.Mais Em:http://www.enxurrada.blogspot.com

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!