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<strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profissão <strong>de</strong>psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>


A presente obra encontra-se sob a licença Creative Commons(Atribuição-Uso não-comercial-No Derivative Works 3.0 <strong>Brasil</strong>)Para visualizar uma cópia da licença, visite http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/3.0/br/ou man<strong>de</strong> uma carta para: Creative Commons, 171 Second Street, Suite 300, San Francisco, California, 94105, USA.Esta obra encontra-se disponível integralmente <strong>no</strong> site: www.cchla.ufrn.br/bvpropsiEste livro teve o apoio do Conselho Nacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Científi co e Tec<strong>no</strong>lógico (CNPq)e da Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> Nível Superior (CAPES)


Oswaldo H. YamamotoAna Ludmila F. Costa(Organizadores)<strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profissão <strong>de</strong>psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Natal, 2010


UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTEReitorJosé Ivonildo do RêgoEditorHelton Rubia<strong>no</strong> <strong>de</strong> MacedoVice-ReitoraÂngela Maria Paiva CruzDiretor da EDUFRNHercula<strong>no</strong> Ricardo CamposConselho EditoralCipria<strong>no</strong> Maia <strong>de</strong> Vasconcelos (Presi<strong>de</strong>nte)Ana Luiza Me<strong>de</strong>irosHumberto Hermenegildo <strong>de</strong> AraújoJohn Andrew FossaHercula<strong>no</strong> Ricardo CamposMônica Maria Fernan<strong>de</strong>s OliveiraTânia Cristina Meira GarciaTécia Maria <strong>de</strong> Oliveira MaranhãoVirgínia Maria Dantas <strong>de</strong> AraújoWillian Eufrásio Nunes PereiraCapaFellipe Coelho-LimaFoto CapaPages of old book, <strong>de</strong> Zsuzsanna KilianRevisãoLíssia da Cruz e SilvaEditoração eletrônicaLuiz Junior (Bebeto)Supervisão editorialAlva Me<strong>de</strong>iros da CostaSupervisão gráficaFrancisco Guilherme <strong>de</strong> SantanaDivisão <strong>de</strong> Serviços TécnicosCatalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Central Zila Mame<strong>de</strong><strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> / Oswaldo H. Yamamoto, Ana LudmilaF. Costa (Organizadores). – Natal, RN: EDUFRN, 2010.274 p.ISBN 978-85-7273-668-81. Psicólogos – <strong>Brasil</strong>. 2. Psicólogos – Formação profi ssional – <strong>Brasil</strong>. I.Yamamoto, Oswaldo H. II. Costa, Ana Ludmila F.CDD 159.981RN/UF/BCZM 2010/81 CDU 159.9-051(81)Editora da UFRN – EDUFRNAv. Senador Salgado Filho, 3000 | Campus UniversitárioLagoa Nova | 59.078-970 | Natal/RN | <strong>Brasil</strong>edufrn@editora.ufrn.br | www.editora.ufrn.br84 3215 3236 | 84 3215 3206


SUMÁRIOApresentação.............................................................................................................. 7Parte I......................................................................................................................... 131 Estudando a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: introdução ............................. 15Oswaldo H. Yamamoto & Keyla Mafalda <strong>de</strong> Oliveira Amorim2 Profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: análise da produçãocientífi ca em artigos ............................................................................................ 31Ana Ludmila Freire Costa, Keyla Mafalda <strong>de</strong> Oliveira Amorim & Joyce Pereira da Costa3 Caracterização <strong>de</strong> dissertações/teses que versam <strong>sobre</strong> aprofi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.......................................................................... 59Pablo <strong>de</strong> Sousa Seixas, Fellipe Coelho-Lima & Ana Ludmila Freire Costa4 Um balanço (provisório) dos estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão.................................. 97Oswaldo H. Yamamoto, Ana Ludmila Freire Costa, Pablo <strong>de</strong> Sousa Seixas & Keyla Mafalda <strong>de</strong>Oliveira AmorimParte II..................................................................................................................... 1015 A situação atual da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>...................................... 103Enzo Azzi6 Enzo Azzi (1921-1985), um médico italia<strong>no</strong> na psicologia brasileira............. 119Maria do Carmo Gue<strong>de</strong>s7 Psicologia: características da profi ssão........................................................... 141Sylvia Leser <strong>de</strong> Mello Pereira8 Por que escrevemos antes, por que escrevermos agora?................................ 163Sylvia Leser <strong>de</strong> Mello9 A quem nós, psicólogos, servimos <strong>de</strong> fato?..................................................... 169Sílvio Paulo Botomé10 A função social do psicólogo........................................................................ 203Regina Helena <strong>de</strong> Freitas Campos11 Refl exões <strong>sobre</strong> a evolução e tendências contemporâneas nahistoriografi a da psicologia educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>............................................. 213Regina Helena <strong>de</strong> Freitas Campos12 O psicólogo brasileiro: sua atuação e formação profi ssional........................ 227Antonio Virgílio Bittencourt Bastos & Paula Inez Cunha Gomi<strong>de</strong>13 O psicólogo brasileiro: sua atuação e formação profi ssional. O quemudou nestas últimas décadas?........................................................................ 255Antonio Virgílio Bittencourt Bastos, Sonia Maria Gue<strong>de</strong>s Gondim& Jairo Eduardo Borges-Andra<strong>de</strong>Informações <strong>sobre</strong> os autores............................................................................... 271


APRESENTAÇÃOPróximos do cinquentenário da Psicologia como profi ssãoregulamentada, o quadro com o qual <strong>no</strong>s <strong>de</strong>paramos é impressionante.Ultrapassamos a marca <strong>de</strong> duas centenas <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> psicólogos, temos mais<strong>de</strong> três centenas <strong>de</strong> agências formadoras <strong>no</strong> nível da graduação e <strong>de</strong> seis <strong>de</strong>zenas<strong>de</strong> programas <strong>de</strong> pós-graduação stricto sensu <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Ao longo <strong>de</strong>sse período,foram produzidos gran<strong>de</strong>s estudos nacionais; o primeiro, patrocinado peloConselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia (CFP), com os resultados publicados em 1988, eo segundo, conduzido pelo Grupo <strong>de</strong> Trabalho em Psicologia Organizacional edo Trabalho da Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia(ANPEPP), cujos resultados estão sendo divulgados em 2010.Não é rara a alusão ao fato <strong>de</strong> que a Psicologia é uma das profi ssões quemais estuda e discute seus rumos, <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. De fato, há uma e<strong>no</strong>rme quantida<strong>de</strong><strong>de</strong> estudos <strong>de</strong> natureza diversa, com diferentes ângulos <strong>de</strong> análise, focalizaçõestemáticas e abrangência geográfi ca produzida por pesquisadores da área aolongo <strong>de</strong>stes a<strong>no</strong>s. E é nesse terre<strong>no</strong> que se move o presente trabalho: o estudo<strong>de</strong>ssa produção <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo.Este livro, fruto do projeto <strong>de</strong> pesquisa ‘Historiografi a da produção<strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>’, apoiado pelo Conselho Nacional <strong>de</strong>Desenvolvimento Científi co e Tec<strong>no</strong>lógico (CNPq) 1 , tem por intenção contribuirpara o <strong>de</strong>bate acerca da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Ele está divididoem duas partes: a primeira, resultado direto da pesquisa, e a segunda, umacoletânea com a reprodução <strong>de</strong> alguns dos textos que fazem parte <strong>de</strong>ssa história,acompanhados por post-scripta dos autores ou <strong>de</strong> pesquisadores convidados.1 Processo CNPq 471592/2007-2.


10 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A Parte I, organizada por sua vez em quatro capítulos, apresentaos resultados gerais do projeto <strong>de</strong> pesquisa antes mencionado. O capítulointrodutório apresenta, além das referências conceituais, um pa<strong>no</strong>rama geral<strong>de</strong>ssa produção. O <strong>de</strong>talhamento da análise é conduzido <strong>no</strong>s dois capítulossubsequentes, que tratam especifi camente da produção veiculada em periódicoscientífi cos (Capítulo 2) e da profi ssão como objeto <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong> teses edissertações do Sistema Nacional <strong>de</strong> Pós-Graduação (Capítulo 3). O últimocapítulo apresenta uma síntese dos principais resultados.A Parte II reúne alguns textos que fazem parte <strong>de</strong>ssa história emconstrução, da refl exão <strong>sobre</strong> a situação da profi ssão <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Alguns <strong>de</strong>les jáforam muito lidos e citados; outros, pela difi culda<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso, não tiveram aexposição necessária.Disse uma vez Machado <strong>de</strong> Assis, a propósito da reedição <strong>de</strong> um <strong>de</strong>seus livros, que cada obra pertence ao seu tempo. Os autores cujos textos foramaqui selecionados respon<strong>de</strong>ram aos <strong>de</strong>safi os que lhes foram postos <strong>no</strong> momentoem que foram escritos e não cabe atualizá-los, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> eventuais<strong>de</strong>scompassos históricos. Para fazer frente a esse hiato temporal, convidamos osautores dos textos originais ou, em alguns casos, pesquisadores <strong>de</strong> alguma formavinculados aos autores ou aos textos para elaborarem post-scripta, com totalliberda<strong>de</strong> <strong>no</strong> conteúdo e formato.O espaço restrito <strong>de</strong> publicação neste livro <strong>no</strong>s obrigou a selecionar unspoucos textos, cinco ao todo, além dos comentários. Evi<strong>de</strong>ntemente, fi camosmuito longe <strong>de</strong> cobrir o que se fez <strong>de</strong> signifi cativo na área – e não era essa a <strong>no</strong>ssapretensão. Queríamos, sim, apresentar exemplos do material produzido <strong>sobre</strong>o assunto nesses quase cinquenta a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> profi ssão regulamentada, alguns dosquais <strong>de</strong> difícil acesso.O Capítulo 5 é composto pelo texto ‘A situação atual da profi ssão<strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>’, <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Enzo Azzi, na época em que foi escrito,professor da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo, e pelo comentárioda Professora Maria do Carmo Gue<strong>de</strong>s (capítulo 6), docente e sua ex-colega daPontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo 2 . O texto foi produzido <strong>no</strong> a<strong>no</strong> quese seguiu a regulamentação da profi ssão, em 1963, por ocasião <strong>de</strong> um simpósio2 O professor Enzo Azzi faleceu em São Paulo, <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1985.


Apresentação11<strong>sobre</strong> a situação da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, promovido pela Associação <strong>Brasil</strong>eira<strong>de</strong> Psicólogos e pela Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo, e publicado doisa<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois, <strong>no</strong> Boletim <strong>de</strong> Psicologia. O texto constitui-se em um preciosodocumento acerca das questões que estavam postas para uma profi ssão nascente.A formação pregressa foi a<strong>de</strong>quada para o exercício da profi ssão? Como a LeiFe<strong>de</strong>ral n o 4.119/1962 afetou os psicólogos? Quais as perspectivas <strong>de</strong> crescimentoda profi ssão? Como lidar com as diferenças <strong>de</strong> remuneração entre as diferentesespecializações estabelecidas pela lei que regulamenta a profi ssão? A Psicologiapo<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada uma profi ssão liberal? Quais as consequencias para oestabelecimento <strong>de</strong> um código <strong>de</strong> ética?O Capítulo 7 é composto pelo texto ‘Psicologia: Características daprofi ssão’ <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Sylvia Leser <strong>de</strong> Mello, e comentário da própria autora(Capítulo 8). O texto foi também publicado originalmente <strong>no</strong> Boletim <strong>de</strong>Psicologia, órgão da Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo, <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1975. Otexto apresenta a síntese <strong>de</strong> uma pesquisa realizada em 1972 <strong>sobre</strong> a situação daPsicologia em São Paulo, que resultaria na obra que é, hoje, uma referência <strong>no</strong>sestudos <strong>sobre</strong> a profi ssão, ‘Psicologia e profi ssão em São Paulo’ (Mello, 1975).É <strong>de</strong>snecessário, portanto, <strong>no</strong>s alongarmos acerca da importância <strong>de</strong>sse texto.O Capítulo 9 é composto pelo texto ‘A quem nós, psicólogos, servimos<strong>de</strong> fato?’, <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Sílvio Paulo Botomé, que não só incluiu comentário aofi nal do texto como optou por realizar algumas modifi cações <strong>no</strong> conteúdo aolongo do material original. O texto foi inicialmente publicado na extinta revistaPsicologia e discorre <strong>sobre</strong> a elitização da Psicologia, um tema em evidência<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a regulamentação da profi ssão. Trata-se <strong>de</strong> uma versão adaptada <strong>de</strong>uma intervenção do autor na VIII Reunião Anual <strong>de</strong> Psicologia da Socieda<strong>de</strong><strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> Ribeirão Preto (atual Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicologia), emRibeirão Preto, SP, <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1978, que teve uma gran<strong>de</strong> repercussão na época.O tema abordado, em que pese às mudanças processadas na Psicologia hoje,ainda tem atualida<strong>de</strong> e se trata <strong>de</strong> um importante documento.O Capítulo 10 é composto pelo texto ‘A função social do psicólogo’,<strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Regina Helena Freitas Campos, com comentário da própria autora(Capítulo 11). O texto, versão <strong>de</strong> uma intervenção da autora em um encontropromovido pelo Conselho Regional <strong>de</strong> Psicologia, 4 a Região, <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1982, foioriginalmente publicado na revista Educação e Socieda<strong>de</strong> <strong>no</strong> a<strong>no</strong> seguinte. Além


12 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>da qualida<strong>de</strong> das refl exões da autora, o texto tem uma gran<strong>de</strong> importância pelofato <strong>de</strong> anunciar uma mudança em curso na Psicologia e uma polêmica que <strong>no</strong>sacompanha até hoje: <strong>de</strong>vido às condições do mercado <strong>de</strong> trabalho, o psicólogoseria cada vez mais confrontado com as classes subalternas, colocando emquestão a potencialida<strong>de</strong> do conhecimento até então produzido para fornecerbase para uma atuação diante <strong>de</strong>ssa <strong>no</strong>va <strong>de</strong>manda.Finalmente, o Capítulo 12 apresenta o texto ‘O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro:Sua Atuação e Formação Profi ssional’, <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Antonio Virgílio BittencourtBastos e Paula Inês Cunha Gomi<strong>de</strong>, com comentário do primeiro autor, emcolaboração com Sonia Maria Gue<strong>de</strong>s Godim e Jairo Eduardo Borges Andra<strong>de</strong>(Capítulo 13). O texto sintetiza os pontos principais da pesquisa nacionalpatrocinada pelo CFP <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1986, transformada dois a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>no</strong> livro‘Quem é o psicólogo brasileiro?’ (CFP, 1988). A pesquisa e, por conseguinte,o texto que aqui reproduzimos, tem o indiscutível mérito <strong>de</strong> se constituir naprimeira – e até muito recentemente, única – tentativa <strong>de</strong> mapear a situaçãoda Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, objeto que era <strong>de</strong> estudos geografi camente localizados 3 .Dissemos muito recentemente porque uma segunda pesquisa nacional teve início<strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 2006, coor<strong>de</strong>nado pelo Grupo <strong>de</strong> Trabalho Psicologia, Organizaçõese Trabalho da Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia,publicada <strong>no</strong> livro ‘O trabalho do psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>’ (Bastos & Gondim, 2010) 4 .O post-scriptum que agregamos a este capítulo é, na realida<strong>de</strong>, uma síntese dospontos principais <strong>de</strong>ssa atualização, <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> três dos pesquisadores do GT-POT, o que confere ao capítulo uma e<strong>no</strong>rme importância.Uma advertência com relação aos textos republicados: emboraredigitados, as <strong>no</strong>rmalizações e grafi as originais dos mesmos foram conservadas,3 É conveniente lembrar que o projeto <strong>de</strong> investigações <strong>sobre</strong> a Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> promovidopelo CFP foi <strong>de</strong>sdobrado em algumas etapas, resultando em outras produções <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rávelimportância, a saber, Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: construção <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos espaços (publicado em 1992,pela Editora Átomo, Campinas) e Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: práticas emergentes e <strong>de</strong>safi os para aformação (publicado em 1994 pela Casa do Psicólogo, SP).4 Bastos, A. V. B., & Gondim, S. M. G. (2010). O trabalho do psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. PortoAlegre: Artmed.


Apresentação13razão pela qual o leitor encontrará textos que adotam <strong>no</strong>tações diversas e,eventualmente, diferentes da <strong>no</strong>rma utilizada <strong>no</strong> restante do livro.A <strong>no</strong>ssa expectativa é que esta coletânea seja útil para todos aqueles quepensam a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> e se preocupam com seus rumos. E oconhecimento é uma condição essencial para essa tarefa.Gostaríamos <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cer aos autores que colaboraram para que estelivro pu<strong>de</strong>sse ser realizado; à Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo e ao Boletim<strong>de</strong> Psicologia, ao CFP e à revista Psicologia: Ciência e Profi ssão, e ao Centro<strong>de</strong> Estudos Educação e Socieda<strong>de</strong> (CEDES) e à revista Educação & Socieda<strong>de</strong>,pelas autorizações para republicação dos textos aqui incluídos; aos membrosdo Grupo <strong>de</strong> Pesquisas Marxismo & Educação, da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral doRio Gran<strong>de</strong> do Norte, pelo apoio; ao Prof. Dr. Paulo Menandro, pela leitura domaterial e colaboração <strong>no</strong>s comentários; e ao CNPq, pelo suporte ao projetooriginal e à presente publicação.Para fi nalizar, temos a satisfação <strong>de</strong> informar a a<strong>de</strong>são ao movimento<strong>de</strong> acesso aberto (open access), com a disponibilização da íntegra da presenteobra <strong>no</strong> sítio do projeto (www.cchla.ufrn.br/bvpropsi) e adoção da licença <strong>de</strong>atribuição Creative Commons.Natal, maio <strong>de</strong> 2010.Oswaldo H. YamamotoAna Ludmila Freire Costa


PARTE I


CAPÍTULO 1ESTUDANDO A PROFISSÃO DE PSICÓLOGONO BRASIL: INTRODUÇÃOOswaldo H. YamamotoKeyla Mafalda <strong>de</strong> Oliveira AmorimO marco referencial para os estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong><strong>Brasil</strong> é a sua regulamentação, promovida pela Lei Fe<strong>de</strong>ral n o 4.119, <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong>agosto <strong>de</strong> 1962. Não seria exagero afi rmar que, a partir <strong>de</strong> então, os psicólogospassaram a produzir conhecimento <strong>sobre</strong> a profi ssão. Assim é que o Boletim <strong>de</strong>Psicologia, periódico editado pela Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo, <strong>de</strong>dicouum número especial <strong>sobre</strong> a profi ssão recém regulamentada, resultado <strong>de</strong> umsimpósio promovido pela Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicólogos e pela própriaSocieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo intitulado “A situação atual da Psicologia<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>”, realizado em julho <strong>de</strong> 1963, em Campinas, São Paulo. Nesse númeroespecial, questões como a formação acadêmica do profi ssional (Angelini & Maria,1964-1965; Benko, 1964-1965), a situação da profi ssão (Azzi, 1964-1965) e ocódigo <strong>de</strong> ética profi ssional (Leite, 1964-1965), <strong>de</strong>ntre outros, já são objetos <strong>de</strong>investigação.Consi<strong>de</strong>rando o fato <strong>de</strong> que estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão não fi gurampropriamente <strong>no</strong> eixo central <strong>de</strong> investigações dos pesquisadores da Psicologia,é possível afi rmar que um <strong>no</strong>tável volume <strong>de</strong> estudos e refl exões <strong>sobre</strong> a suaprática foi produzido ao longo <strong>de</strong>stas cinco décadas. Tanto a preocupação com


18 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>as características e os rumos da profi ssão, quanto o perfi l <strong>de</strong>ssa produção, <strong>de</strong>pesquisa paralela às linhas prioritárias <strong>de</strong> trabalho dos pesquisadores, não sãoexclusivos da Psicologia. De fato, a literatura registra uma signifi cativa produçãoem áreas tão diversas como a Medicina (e.g., Machado, 1997; Schraiber, 1995),Nutrição (e.g., Bosi 1996), Engenharia (e.g., Kawamura, 1981; Laudares &Ribeiro, 2000), Enfermagem (e.g., Almeida & Rocha, 1997; Barbosa, Me<strong>de</strong>iros,Prado, Bachion & <strong>Brasil</strong>, 2004), e Serviço Social (Iamamoto, 1998; Iamamoto& Carvalho, 1982; Netto, 1989; 1990; 1992), para citar poucos exemplos. Paraalém, há mesmo um ramo das ciências sociais <strong>de</strong>dicado ao estudo das profi ssões,a chamada Sociologia das Profi ssões 1 .Tomaremos profi ssão, aqui, como uma prática institucionalizada,socialmente legitimada e legalmente sancionada (Netto, 1992). Para queuma ocupação ganhe o estatuto <strong>de</strong> profi ssão, entre diversos autores, Freidson(1998) propõe que as características principais sejam a expertise (domínio dabase técnica), o cre<strong>de</strong>ncialismo (institucionalização da expertise) e a auto<strong>no</strong>mia,em or<strong>de</strong>m crescente <strong>de</strong> exclusivida<strong>de</strong>. A auto<strong>no</strong>mia representaria, para Freidson(1998), a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma ocupação, pelo seu lugar na divisão social dotrabalho, adquirir o controle <strong>sobre</strong> a <strong>de</strong>terminação da essência do própriotrabalho. De acordo com o autor, a auto<strong>no</strong>mia <strong>de</strong> uma profi ssão comportariaduas dimensões: uma técnica, associada ao controle do conteúdo ouconhecimento (da base técnica), e uma socioeconômica e/ou política, que po<strong>de</strong>ser traduzida como a capacida<strong>de</strong> organizativa da profi ssão e a sua relação como Estado. Portanto, auto<strong>no</strong>mia, signifi cando “capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> avaliar e controlaro <strong>de</strong>senvolvimento do trabalho” (Bosi, 1996, p. 51) é uma categoria dinâmica,<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da correlação das forças historicamente postas. A sua esfera nuclearresidiria <strong>no</strong> controle da base técnica, ou seja, a posse <strong>de</strong> conhecimentos e/ouhabilida<strong>de</strong>s tão esotéricas quanto complexas que não permitiriam acesso aos nãomembros da profi ssão.1 Para uma análise das tendências <strong>de</strong>sse campo, consultar Barbosa (1993). Bosi (1996)apresenta uma síntese <strong>de</strong> algumas das questões-chave da discussão <strong>sobre</strong> profi ssão eprofi ssionalização. Na vasta literatura a respeito, ver, <strong>de</strong>ntre outros, Abbott (1988); Burrage eTorstendahl (1990); Derber e Schwartz (1990); Freidson (1970; 1988; 1998); e Perkin (1996).


Estudando a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Introdução19Os estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, <strong>de</strong> acordo com Botomé(1988), têm sido conduzidos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a regulamentação, com diferentes sujeitose metodologias, publicados em diversos periódicos especializados, em anais<strong>de</strong> eventos científi cos nacionais e regionais, além <strong>de</strong> livros e publicações <strong>de</strong>órgãos profi ssionais. Era chegado o momento <strong>de</strong> sistematizar o conhecimentoproduzido.Este capítulo apresenta uma visão geral <strong>de</strong>ssa produção, a partir <strong>de</strong> umaperspectiva cientométrica. A cientometria é consi<strong>de</strong>rada uma área <strong>de</strong> estudo<strong>de</strong>rivada da bibliometria, cujo objeto seria a análise quantitativa <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminadosaspectos da produção, difusão e utilização do conhecimento científi co (Braun,Glänzel & Schubert, 1985; Krauskopf, 1994; Meis & Leta, 1996; Santos, 2003;Silva & Bianchi, 2001; Taubes, 1993). Os indicadores bibliométricos referentesao volume da produção, sua distribuição geográfi ca, autoria e vinculaçãoinstitucional, distribuídos ao longo <strong>de</strong>stes pouco me<strong>no</strong>s <strong>de</strong> cinquenta a<strong>no</strong>s, queé o período-objeto do estudo, <strong>no</strong>s permitirão vislumbrar o quadro geral <strong>de</strong>ssaprodução <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 2 .1 A pesquisaO levantamento do material relativo à produção acerca da profi ssão<strong>de</strong> psicólogo, levado a cabo entre o segundo semestre <strong>de</strong> 2008 e o <strong>de</strong> 2009,foi conduzido em bases <strong>de</strong> dados bibliográfi cos eletrônicos reconhecidos pelacomunida<strong>de</strong> acadêmico-científi ca e profi ssional, e que in<strong>de</strong>xam documentoscientífi cos <strong>de</strong> Psicologia e <strong>de</strong> áreas afi ns. As bases <strong>de</strong> dados utilizadas foram:(1) o Banco <strong>de</strong> Teses da Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> NívelSuperior (CAPES); (2) a Biblioteca Virtual em Saú<strong>de</strong> – Psicologia (BVS-Psi) –que agrupa a Scientifi c Eletronic Library Online (SciELO), a Literatura Lati<strong>no</strong>-Americana e do Caribe em Ciências da Saú<strong>de</strong> (LILACS), o In<strong>de</strong>x Psi PeriódicosTécnico-Científi cos, o In<strong>de</strong>x Psi Periódicos <strong>de</strong> Divulgação Científi ca, o In<strong>de</strong>x PsiTeses, e o Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePSIC); (3) o Catálogo Global2 Nos dois capítulos subsequentes, a produção veiculada em periódicos e aquela <strong>de</strong>senvolvida<strong>no</strong> âmbito da pós-graduação brasileira será apresentada e discutida em <strong>de</strong>talhe.


20 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>on-line (DEDALUS) do Sistema Integrado <strong>de</strong> Bibliotecas da USP (Sibi-USP); (4)a Biblioteca Digital <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Teses e Dissertações do Instituto <strong>Brasil</strong>eiro <strong>de</strong>Informação em Ciência e Tec<strong>no</strong>logia (BDTD-IBICT); e (5) o sítio eletrônicoPsicologia Online, do Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. O buscador Googletambém foi consultado, mas <strong>de</strong>scartado por armazenar uma diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong>material que repetia os documentos buscados nas bases específi cas.A investigação foi realizada sem a especifi cação prévia do período <strong>de</strong>abrangência da produção e resultou em um conjunto <strong>de</strong> documentos acadêmicocientíficos <strong>de</strong> natureza diversa, <strong>de</strong>ntre os quais, artigos científi cos, livros,dissertações <strong>de</strong> mestrado e teses <strong>de</strong> doutorado, mo<strong>no</strong>grafi as, relatórios técnicos,artigos em periódicos técnico-científi cos, <strong>de</strong> divulgação científi ca e em sítioseletrônicos sem vinculação a periódicos. Nesta etapa, não foram consi<strong>de</strong>radosos documentos relativos a eventos científi cos e ou profi ssionais, sejam elestrabalhos completos ou resumos em anais.A busca sistemática do material bibliográfi co foi conduzida por meio dautilização <strong>de</strong> termos-chave, possibilitando a obtenção <strong>de</strong> informações <strong>sobre</strong> alocalização e o acesso aos documentos científi cos nas referidas bases. Os termos<strong>de</strong> busca utilizados foram: atuação, exercício, profi ssão, prática, mapeamento,trabalho, levantamento, inserção, ativida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>scrição; todas acrescidas <strong>de</strong>Psicologia.Tais termos foram selecionados por serem comumente utilizados comopalavras-chave pelos autores <strong>de</strong> estudos <strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo. Os termosforam testados em um estudo-piloto para verifi car a a<strong>de</strong>quação dos mesmospara este estudo. Esse conjunto <strong>de</strong> <strong>de</strong>scritores foi escolhido <strong>de</strong> modo que secomplementassem para melhor refi namento na busca, embora a escolha <strong>de</strong> tais<strong>de</strong>scritores não atinja a completu<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos <strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo.Não obstante, eles permitiram atingir um núcleo básico <strong>de</strong> informações quepossibilita a discussão da produção acerca da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> país.Para abranger a maior quantida<strong>de</strong> possível <strong>de</strong> textos, evitandoeliminações in<strong>de</strong>vidas, foram utilizados mecanismos específi cos <strong>de</strong> busca em


Estudando a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Introdução21cada uma das bases <strong>de</strong> dados 3 . Os buscadores empregam um padrão <strong>de</strong> códigos<strong>de</strong> truncamento das palavras para que, incompletas, seus caracteres anterioresao código (por exemplo, $ ou ?) i<strong>de</strong>ntifi quem todos os documentos em queconstem o tronco do vocábulo. Dessa forma, a palavra atuação associada àpalavra Psicologia po<strong>de</strong>ria ser pesquisada a partir da expressão: atua$ psicolog$ou atua? psicolog?, em que se encontrariam <strong>de</strong>rivados <strong>de</strong> atua.Os documentos foram selecionados a partir da leitura do título e doresumo dos mesmos, i<strong>de</strong>ntifi cando estudos <strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>. É importante <strong>de</strong>stacar que alguns documentos não apresentavam resumos,resultado tanto da indisponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse material na base <strong>de</strong> dados, quantoda ausência <strong>de</strong> resumo do próprio documento, como são os casos <strong>de</strong> livros ouartigos publicados em periódicos antigos.Os seguintes aspectos foram consi<strong>de</strong>rados para seleção dos documentos:profi ssão <strong>de</strong> psicólogo em regiões ou localida<strong>de</strong>s específi cas <strong>no</strong> país; <strong>de</strong>scriçãoda atuação <strong>de</strong> psicólogos (ativida<strong>de</strong>s realizadas, serviços <strong>de</strong> Psicologia); mo<strong>de</strong>los<strong>de</strong> atuação psicológica; características pessoais do profi ssional; <strong>de</strong>mandaspara o psicólogo; teorias que subsidiam a prática psicológica; mapeamento daprofi ssão-profi ssional <strong>de</strong> Psicologia; história da profi ssão; características relativasà profi ssão; e ativida<strong>de</strong>s interdisciplinares.I<strong>de</strong>ntifi cados, os documentos foram selecionados e arquivados emformato eletrônico (com extensão .doc ou .pdf ) e suas informações foramorganizadas em um banco eletrônico com o auxílio do software StatisticalPackage for the Social Sciences (SPSS), versão 16.As informações registradas <strong>no</strong> banco foram: código <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntifi cação dodocumento; título; autoria; a<strong>no</strong> <strong>de</strong> publicação; veículo <strong>de</strong> publicação; palavraschave;tipo <strong>de</strong> documento; palavra <strong>de</strong> busca que possibilitou a recuperação dodocumento; e disponibilida<strong>de</strong> do texto integral em formato eletrônico.3 Tecnicamente, esses mecanismos são <strong>de</strong><strong>no</strong>minados <strong>de</strong> operadores lógicos associados àbusca booleana (<strong>no</strong> caso, busca por truncamento).


22 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Após a recuperação e sistematização <strong>de</strong>ssas informações, o banco foi<strong>de</strong>purado. Além da exclusão <strong>de</strong> documentos não condizentes com os critérioseleitos para a coleta dos documentos, o banco eletrônico foi complementado cominformações ausentes nas bases <strong>de</strong> dados, mas que constavam <strong>no</strong>s documentoscompletos. Exemplo <strong>de</strong>sse procedimento foi a reclassifi cação dos artigos<strong>de</strong> divulgação científi ca recolhidos em bases <strong>de</strong> dados <strong>de</strong> periódicos técnicocientíficos. Esse banco eletrônico foi avaliado por três juízes com experiência <strong>de</strong>investigação <strong>sobre</strong> o tema, concluindo a <strong>de</strong>puração do banco <strong>de</strong> dados. A análisedos juízes seguiu as mesmas <strong>de</strong>terminações fornecidas para a recuperação dosdocumentos.Uma síntese do procedimento adotado é apresentada na Figura 1.Figura 1. Síntese da estratégia <strong>de</strong> recuperação e armazenagem dos documentos <strong>sobre</strong> profissão<strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.Tipos <strong>de</strong>DocumentosRecuperação daInformaçãoSeleção dosDocumentosArmazenamentoe <strong>de</strong>puração dasinformaçõesArtigos em periódicoscientificosLivrosDissertações <strong>de</strong> mestradoTeses <strong>de</strong> DoutoradoMo<strong>no</strong>grafias e relatóriostécnicos, artigos <strong>de</strong>divulgação científica eartigos em sitesPublicados <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> sem<strong>de</strong>limitação temporalBase <strong>de</strong> dados:Banco <strong>de</strong> Teses da CapesBVS-PsiDEDALUS/USPPsicologia online do CFPPalavras <strong>de</strong> busca:atuação, exercicio,profissão, prática,mapeamento, trabalho,levantamento, inserção,ativida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>scriçãoTodas acrescidas <strong>de</strong>PsicologiaMecanismo <strong>de</strong>truncamentouso da expressão “atua$psicolog$ ou ”atua?psicolog?Leitura do título e doresumoCritério para seleção:.<strong>de</strong>scrição da atuação<strong>de</strong> psicólogos.mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> atuaçãopsicológicas.<strong>de</strong>mandas para opsicólogo.teorias que subsidiama prática psicológica.mapeamento daprofissão/profissional<strong>de</strong> Psicologia.história da profissão.características relativasà profissão.ativida<strong>de</strong>sinterdisciplinaresDocumentos arquivadosem formato eletrônicoInformações organizadasem SPSS (versão 16)Categorias registradas:código <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificaçãodo documento, título,autoria, a<strong>no</strong> <strong>de</strong>publicação, veículo <strong>de</strong>publicação, palavraschave,tipo <strong>de</strong>documento, palavra <strong>de</strong>busca utilizada,i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong>disponibilida<strong>de</strong> integralem formato eletrônicoCorreções nasinformações registradas<strong>no</strong> banco <strong>de</strong> dadosAnálise do banco <strong>de</strong>dados por juízes


Estudando a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Introdução232 Quadro geral da produção <strong>sobre</strong> a profissãoA recolha dos dados <strong>sobre</strong> a produção <strong>no</strong>s bancos especifi cadosanteriormente resultou em um conjunto <strong>de</strong> 908 documentos, sendo 376 artigospublicados em periódicos científi cos, 46 livros, 411 trabalhos acadêmicos (teses,dissertações e mo<strong>no</strong>grafi as), 31 artigos <strong>de</strong> divulgação científi ca, além <strong>de</strong> 44outros documentos.A Figura 2 apresenta a evolução histórica da produção <strong>sobre</strong> a profi ssão,por modalida<strong>de</strong>:Figura 2. Série histórica da distribuição da produção <strong>sobre</strong> a profissão por modalida<strong>de</strong>.1000900800700Artigo científicoLivrosOutrosTrabalhos acadêmicosDivulgação científicaTotal6005004003002001000-19621962-19661967-19711972-19761977-19811982-19861987-19911992-19961997-20012002-20062007-2008Po<strong>de</strong>-se observar, em primeiro lugar, que há uma aceleração daprodução principalmente a partir da década <strong>de</strong> 1990, com um salto <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s2000. Esse crescimento da produção é <strong>de</strong>vido, <strong>sobre</strong>tudo, ao incremento donúmero <strong>de</strong> artigos e trabalhos <strong>de</strong> pós-graduação. Não <strong>no</strong>s alongaremos aqui nasrazões <strong>de</strong>sse crescimento, uma vez que análises mais <strong>de</strong>tidas <strong>sobre</strong> a questãoserão objeto dos capítulos subsequentes. Apenas <strong>de</strong>ixamos o registro <strong>de</strong> que araiz <strong>de</strong>sse crescimento <strong>de</strong>ve ser buscada <strong>no</strong> sistema <strong>de</strong> pós-graduação, tanto <strong>no</strong>que concerne ao aumento do número <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> titulação, quanto <strong>no</strong> quediz respeito à produção científi ca como critério <strong>de</strong> avaliação dos Programas.


24 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A questão seguinte é: quem são os autores <strong>de</strong>sses trabalhos? Propusemosanteriormente que uma das características da produção brasileira acerca daprofi ssão <strong>de</strong> psicólogo era a condição <strong>de</strong> relativa marginalida<strong>de</strong> do tema comrelação às preocupações <strong>de</strong> pesquisa dos autores. Os dados apresentados naTabela 1 tratam <strong>de</strong>sse aspecto da produção.Tabela 1Número <strong>de</strong> produtos por primeiro autorNúmero <strong>de</strong> produtos por autor n %1 627 86,72 64 8,93 15 2,14 4 0,65 7 1,06 4 0,613 1 0,114 1 0,1Somam 723 os autores principais que publicaram documentos <strong>sobre</strong>profi ssão do psicólogo <strong>no</strong> país. Os dados evi<strong>de</strong>nciam que a esmagadora maioria– <strong>de</strong> aproximadamente 90% – dos trabalhos é produzida por autores que têmapenas uma publicação <strong>sobre</strong> o assunto. Para uma avaliação mais precisa do peso<strong>de</strong>sse dado, seria necessário levantar o total da produção <strong>de</strong>sses autores, o quenão foi feito aqui. A<strong>de</strong>mais, seria necessária uma análise do padrão <strong>de</strong> produçãodos autores por tema. De fato, acerca <strong>de</strong>ssa questão, em estudo conduzido <strong>no</strong>campo da cientometria, Mueller e Pecegueiro (2001) observam que, analisandoos artigos publicados na revista Ciência da Informação <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 1990-1999, 83,33% dos autores assinaram apenas um artigo, seja como autor único,seja em parceria. Embora as inferências sejam <strong>de</strong>saconselháveis, não <strong>de</strong>ixa<strong>de</strong> ser interessante observar que, em uma década <strong>de</strong> funcionamento <strong>de</strong> umarevista bastante especializada, há pouquíssima repetição <strong>de</strong> autores. Se algumaconjectura é possível, o referido estudo coloca uma interrogação <strong>sobre</strong> aimportância relativa do tema da profi ssão para os estudiosos da Psicologia apartir dos dados <strong>sobre</strong> autoria.


Estudando a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Introdução25Um segundo conjunto <strong>de</strong> dados <strong>sobre</strong> autoria diz respeito à vinculaçãoinstitucional dos autores (Tabela 2).Tabela 2Número <strong>de</strong> produtos por instituiçãoProduçõesn>10 10911-20 1221-30 431-40 241-50 151-60 061-70 071-80 081-90 191-100 0>101 1Total* 130* Excluídos os trabalhos <strong>de</strong> autoria institucional e os que a vinculação institucional não pô<strong>de</strong> seri<strong>de</strong>ntifi cada.Observa-se, inicialmente, que 108 das 130 instituições com autores aelas vinculadas tiveram me<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 10 produções <strong>sobre</strong> o tema (64 <strong>de</strong>les comapenas uma produção), o que po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado um indicador da dispersãoda produção. Entretanto, é interessante observar que autores vinculados aapenas vinte e uma instituições são responsáveis por 72,9% da produção total(599 do total <strong>de</strong> 822 trabalhos com vinculação institucional i<strong>de</strong>ntifi cada).Duas conclusões preliminares po<strong>de</strong>m ser adiantadas: que o tema da profi ssãomobiliza, embora em escalas diversas, um consi<strong>de</strong>rável número <strong>de</strong> instituições, eque a produção mais expressiva, do ponto <strong>de</strong> vista quantitativo, está concentradaem poucas instituições. A Tabela 3 apresenta o <strong>de</strong>talhamento <strong>de</strong>sse grupo <strong>de</strong>instituições.


26 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tabela 3Instituições com autores com mais <strong>de</strong> 10 produçõesInstituiçõesnUSP 142PUC/SP 88UFRN 45PUCCAMP 37UFSC 35UFRGS 27PUC/RS 27UnB 24UERJ 24UFRJ 16UNICAP 14UNICAMP 14UNESP 13UFBA 12UFU 12UFC 12UFES 12UFF 12PUCRJ 11UFPB 11UFSCar 11Na Tabela 3 verifi ca-se, em primeiro lugar, que todas as instituições <strong>de</strong>vínculo dos autores que produziram <strong>sobre</strong> o tema são <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior, todaselas com o nível <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> pós-graduado, questão a ser <strong>de</strong>talhada posteriormente.O aspecto interessante e relativamente inesperado da vinculação institucional,contudo, diz respeito às 19 instituições que não são <strong>de</strong>dicadas ao ensi<strong>no</strong>superior, como são os casos, por exemplo, <strong>de</strong> secretarias <strong>de</strong> estado, entida<strong>de</strong>sprofi ssionais e hospitais.


Estudando a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Introdução27Do total <strong>de</strong> autores, 564 (78%) possuem Currículo Lattes – fonte dasinformações analisadas <strong>sobre</strong> os mesmos. Atualmente, a maioria <strong>de</strong>sses autoressão pós-graduados ou cursam pós-graduação stricto sensu (93,5%) – sendo29,3% mestres, 35% doutores, 17,2% doutores com estágio pós-doutoral oucom livre-docência e 12% com pós-graduação em andamento. Dos 564 autores,37 são bolsistas <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> do CNPq e 21,6% são orientadores <strong>de</strong> pósgraduaçãostricto sensu; também integram grupos <strong>de</strong> pesquisa (registrados <strong>no</strong>Diretório <strong>de</strong> Grupos <strong>de</strong> Pesquisa do CNPq) (41,1%) e são lí<strong>de</strong>res em 17% <strong>de</strong>ssesgrupos. Essas informações compilam o alto grau <strong>de</strong> titulação entre os autoresque publicam <strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo e o envolvimento com ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>pesquisa, principalmente em Programas <strong>de</strong> pós-graduação, sugerindo que sãopesquisadores que se mantiveram ou se mantêm vinculados à aca<strong>de</strong>mia.A Figura 3 apresenta a distribuição geográfi ca das instituições <strong>de</strong> vínculodos autores <strong>no</strong> período <strong>de</strong> publicação dos documentos.Figura 3. Distribuição geográfica das instituições <strong>de</strong> vínculo dos autores.Norte; 0,6Centro-Oeste; 6,9Nor<strong>de</strong>ste; 14,0Su<strong>de</strong>ste; 61,6Sul; 16,8


28 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A distribuição geográfi ca representada na Figura 3 replica, em linhasgerais, o quadro da ciência brasileira e da Psicologia, em particular: <strong>no</strong>s doisextremos, uma gran<strong>de</strong> concentração na região Su<strong>de</strong>ste, uma reduzida presençada região Norte e um relativo equilíbrio nas <strong>de</strong>mais regiões. Atualmente, essequadro se reproduz: ao todo, são 447 diferentes estabelecimentos <strong>de</strong> vínculoinstitucional atual dos autores, sendo 52,6% instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior.Dessas instituições <strong>de</strong> vínculo, 71,7% estão localizadas <strong>no</strong> eixo Sul-Su<strong>de</strong>ste(54,2% na região Su<strong>de</strong>ste e 19,5% na Sul). Há diversas razões para isso, <strong>de</strong>s<strong>de</strong>aquelas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m estritamente geopolítica-econômica, até <strong>de</strong> organização docampo educacional e da própria Psicologia. Essas questões serão retomadas e<strong>de</strong>talhadas em outros capítulos.Destaca-se, ainda, a baixa incidência <strong>de</strong> estudos cujos autores sãoinstitucionais (10 estudos – 1,7% – realizados por institutos <strong>de</strong> pesquisa ouentida<strong>de</strong>s representativas da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, a exemplo do ConselhoFe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia) e <strong>de</strong> autores vinculados a entida<strong>de</strong>s representativas daprofi ssão, associações profi ssionais ou socieda<strong>de</strong>s científi cas (11,8% dos 564).Tais índices po<strong>de</strong>m sinalizar que são poucas as iniciativas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<strong>de</strong> pesquisas por essas instituições e, em certa medida, que pesquisadoresvinculados à aca<strong>de</strong>mia não mantêm vínculo com instituições na qual o temaprofi ssão é <strong>de</strong> extrema relevância. Essas características coadunam-se à conjectura<strong>de</strong> que o tema profi ssão <strong>de</strong> psicólogo é uma linha subordinada às ativida<strong>de</strong>sprimeiras <strong>de</strong>sses autores 4 .3 Observações finaisO quadro acima apresentado fornece um pa<strong>no</strong>rama da produção <strong>sobre</strong>a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Afi rmações relativamente recorrentes quantoà importância que os psicólogos e pesquisadores da área conferem ao estudo4 É necessário fazer uma ressalva acerca <strong>de</strong>stes dados: o que a análise <strong>no</strong>s mostra diz respeitoà situação atual dos autores, enquanto as produções estão distribuídas ao longo <strong>de</strong> mais <strong>de</strong>quatro décadas. O quadro da situação atual é real e os autores efetivamente produziram, emalgum momento, conhecimento <strong>sobre</strong> a produção.


Estudando a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Introdução29da profi ssão, formação e prática profi ssional, encontram ressonância <strong>no</strong>s dadosapresentados. De fato, é <strong>no</strong>tável a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos <strong>de</strong> natureza diversaproduzidos ao longo do período <strong>de</strong> profi ssão regulamentada. Chama a atenção,também, a dispersão <strong>de</strong>ssa produção. Se, <strong>de</strong> uma parte, isso po<strong>de</strong> indicar umarelativa ausência <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong> do tema entre os pesquisadores, é <strong>no</strong>tável ofato <strong>de</strong> que o tema ocupa, mesmo que em posição subalterna, a preocupaçãodos pesquisadores.Os dois capítulos que se seguem <strong>de</strong>talham as características <strong>de</strong> duasmodalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção, aquela expressa em periódicos e a produzida <strong>no</strong>âmbito da pós-graduação. São modalida<strong>de</strong>s distintas <strong>de</strong> produção, emboraimbricadas: uma, <strong>de</strong>fi nitiva, <strong>de</strong> circulação ampla, com possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> impactara área e retroalimentar o sistema <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> e os profi ssionais; outra, provisória, <strong>de</strong>pesquisadores em treinamento, mas com uma qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refl exões afi ançadapelo sistema <strong>de</strong> controle e monitoramento da pós-graduação brasileira. Essescapítulos permitirão discutir com maior proprieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong>tença algumas dasquestões que os dados até aqui apresentados sugerem.ReferênciasAbbott, A. (1988). The system of professions: An essay on the division of expertlabor. Chicago: The Chicago University Press.Almeida, M. C. P., & Rocha, S. M. M. (1997). O trabalho <strong>de</strong> Enfermagem. SãoPaulo: Cortez.Angelini, A. L., & Maria, C. (1964-1965). Contribuição para a formação básica dopsicólogo. Boletim <strong>de</strong> Psicologia, 16-18(47-50), 41-45.Azzi, E. (1964-1965). A situação atual <strong>de</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Boletim<strong>de</strong> Psicologia, 16-18(47-50), 47-61.Barbosa, M. A., Me<strong>de</strong>iros, M., Prado, M. A., Bachion, M. M., & <strong>Brasil</strong>, V. V.(2004). Refl exões <strong>sobre</strong> o trabalho do enfermeiro em saú<strong>de</strong> coletiva. RevistaEletrônica <strong>de</strong> Enfermagem, 6(1), 9-15.Barbosa, M. L. O. (1993). A sociologia das profi ssões: em tor<strong>no</strong> da legitimida<strong>de</strong><strong>de</strong> um objeto. Boletim Informativo e Bibliográfi co <strong>de</strong> Ciências Sociais, 36,3-30.


30 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Benko, A. (1964-1965). Formação profi ssional do psicólogo. Boletim <strong>de</strong>Psicologia, 16-18(47-50), 75-89.Bosi, M. L. M. (1996). Profi ssionalização e conhecimento: a Nutrição emquestão. São Paulo: Hucitec.Botomé, S. P. (1988). Em busca <strong>de</strong> perspectivas para a Psicologia como área <strong>de</strong>conhecimento e como campo profi ssional. In Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia(Org.), Quem é o psicólogo brasileiro? (pp. 273-297). São Paulo: Edicon.Braun, T., Glänzel, W., & Schubert, A. (1985). Scientometric indicators.Cingapura: World Scientifi c.Burrage, M. B., & Torstendahl, R. (Orgs.). (1990). Professions in theory andhistory. Londres: Sage.Derber, C., & Schwartz, W. A. (1990). Power in the higher <strong>de</strong>gree: Professionalsand the rise of a New Mandarin Or<strong>de</strong>r. Oxford: Oxford University Press.Freidson, E. (1970). Profession of Medicine: A study of the Sociology of appliedk<strong>no</strong>wledge. Chicago: University of Chicago Press.Freidson, E. (1988). Professional powers: A study of the institutionalization offormal k<strong>no</strong>wledge. Chicago: University of Chicago Press.Freidson, E. (1998). Renascimento do profi ssionalismo. São Paulo: Edusp.Iamamoto, M. V. (1998). O Serviço Social na contemporaneida<strong>de</strong>: trabalho eformação profi ssional. São Paulo: Cortez.Iamamoto, M. V., & Carvalho, R. (1982). Relações sociais e Serviço Social <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>. São Paulo: Cortez.Kawamura, L. K. (1981). Engenheiro: trabalho e i<strong>de</strong>ologia (2 a ed.). São Paulo:Ática.Krauskopf, M. (1994). Epistemometria, a term contributing to express themeaning and potential methodologies of scientometrics in Spanish speakingcountries. Scientometrics, 20, 425-428.Laudares, J. B., & Ribeiro, S. (2000). Trabalho e formação do engenheiro. Revista<strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Estudos Pedagógicos, 81(199), 491-500.Leite, D. M. (1964-1965). Código <strong>de</strong> Ética do psicólogo. Boletim <strong>de</strong> Psicologia,16-18(47-50), 67-74.


Estudando a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Introdução31Machado, M. H. (Org.). (1997). Os médicos <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: um retrato da realida<strong>de</strong>.Rio <strong>de</strong> Janeiro: Fiocruz.Meis, L., & Leta, J. (1996). O perfi l da ciência brasileira. Rio <strong>de</strong> Janeiro: EditoraUERJ.Mueller, S. P. M., & Pecegueiro, C. M. P. A. (2001). O periódico Ciência daInformação na década <strong>de</strong> 90: um retrato da área refl etido em seus artigos.Ciência da Informação, 30(2), 47-53.Netto, J. P. (1989). Notas para a discussão da sistematização da prática e teoria emServiço Social. Ca<strong>de</strong>r<strong>no</strong>s ABESS, 3, 141-161.Netto, J. P. (1990). Ditadura e Serviço Social. São Paulo: Cortez.Netto, J. P. (1992). Capitalismo mo<strong>no</strong>polista e Serviço Social. São Paulo: Cortez.Perkin, H. (1996). The third revolution: Professional elites in the mo<strong>de</strong>rn world.Londres: Routledge.Santos, R. N. M. (2003). Produção científi ca: por que medir? O que medir? RevistaDigital <strong>de</strong> Biblioteco<strong>no</strong>mia e Ciência da Informação, 1(1), 22-38.Schraiber, L. B. (1995). O trabalho médico: questões acerca da auto<strong>no</strong>miaprofi ssional. Ca<strong>de</strong>r<strong>no</strong>s <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> Pública, 11(1), 57-64.Silva, J. A., & Bianchi, M. L. P. (2001). Cientometria: a métrica da ciência. Pai<strong>de</strong>ia,11(21), 5-10.Taubes, G. (1993). Measures for measure in science. Science, 260, 884-886.


CAPÍTULO 2PROFISSÃO DE PSICÓLOGO NO BRASIL:ANÁLISE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA EMARTIGOSAna Ludmila Freire CostaKeyla Mafalda <strong>de</strong> Oliveira AmorimJoyce Pereira da CostaO periódico científi co é consensualmente acatado pelos cientistas comoo canal privilegiado para o <strong>de</strong>bate acadêmico e instrumento <strong>de</strong> interlocuçãoentre pesquisadores e outros profi ssionais (Biojone, 2003; Meadows, 1999;Mueller, 1999). Três características essenciais o colocam nessa posição: a garantiada cientifi cida<strong>de</strong> dos fatos (avaliação rigorosa por pares), a recentida<strong>de</strong> dasinformações divulgadas (fl uxo ágil e periodicida<strong>de</strong> regular) e a acessibilida<strong>de</strong>(presença em bases <strong>de</strong> dados reconhecidas e disseminação pela internet). Além<strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r à necessida<strong>de</strong> cada vez mais premente <strong>de</strong> registro e <strong>de</strong> disseminaçãodo crescente conhecimento científi co <strong>de</strong> maneira dinâmica e efi ciente, operiódico respon<strong>de</strong> por uma função essencial, a <strong>de</strong> memória da ciência.O exame da produção <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo veiculada <strong>no</strong>speriódicos científi cos, portanto, possibilita tanto a análise da evolução históricada preocupação dos pesquisadores <strong>sobre</strong> esse tema, quanto o exame <strong>de</strong> algumasdas características centrais <strong>de</strong>ssa produção.


34 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>1 Periódicos científicos <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Antes <strong>de</strong> a<strong>de</strong>ntrarmos na análise da produção em si, é necessário fazerum breve percurso <strong>sobre</strong> o quadro editorial científi co da área da Psicologia.O cenário dos periódicos científi cos <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> – que não diferedo apresentado pela produção científi ca em outras áreas do conhecimento –é marcado por mudanças signifi cativas <strong>no</strong>s últimos a<strong>no</strong>s, impulsionadas pelocrescimento da área.As principais características que marcam o cenário atual da publicação<strong>de</strong> periódicos científi cos são a padronização (<strong>de</strong> forma a garantir efi caz troca<strong>de</strong> informações), a especialização e fragmentação (antes, os periódicos eramrelativos a campos abrangentes do conhecimento e hoje há uma tendência paraabordarem temas específi cos <strong>de</strong> uma subárea) e o crescimento exponencial<strong>de</strong> títulos (as revistas passaram a ser publicadas por editoras comerciais, porInstituições <strong>de</strong> Ensi<strong>no</strong> Superior e pelo Estado.Em um breve retrospecto, po<strong>de</strong>mos afi rmar que os primeiros periódicosda área datam <strong>de</strong> 1949: Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicotécnica 1 , editado peloInstituto <strong>de</strong> Seleção e Orientação Profi ssional (ISOP) e Boletim <strong>de</strong> Psicologia,pertencente à Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo (SPSP) (Sampaio, 2008). OISOP nasceu como um órgão eminentemente voltado para a Psicologia Aplicadae os artigos publicados por sua revista tratavam <strong>de</strong> pesquisas conduzidas pelaprópria instituição, em contato direto com o público atendido. O objetivo da SPSPnão era diferente, também buscando articular o <strong>de</strong>senvolvimento da Psicologiacomo ciência e profi ssão, ao promover o intercâmbio entre profi ssionais eacadêmicos ligados à Psicologia e a áreas afi ns.De acordo com Antunes (2007), <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s seguintes, houve umaprodução esparsa, até pela recentida<strong>de</strong> da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, cuja profi ssãofoi regulamentada na década <strong>de</strong> 1960. Os relatos da pesquisa psicológica foramveiculados em algumas poucas publicações da área, em geral editadas porassociações profi ssionais ou socieda<strong>de</strong>s científi cas.1 Atualmente, esse periódico correspon<strong>de</strong> ao Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicologia. Tal mudançaem seu <strong>no</strong>me se <strong>de</strong>u em refl exo às mudanças pela qual o ISOP se submeteu, <strong>sobre</strong>tudo quandofoi criado o curso <strong>de</strong> pós-graduação da UFRJ, na década <strong>de</strong> 1970, provocando transformações<strong>no</strong> perfi l da publicação e consequentemente, em sua <strong>de</strong><strong>no</strong>minação (Portugal, 2009).


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos35O quadro, que permaneceu praticamente inalterado atéaproximadamente a década <strong>de</strong> 1980, muda radicalmente com a vertigi<strong>no</strong>saexpansão do ensi<strong>no</strong> superior, o crescimento dos programas <strong>de</strong> pós-graduação naárea e os primeiros fi nanciamentos para publicações (Sampaio & Peixoto, 2000).A partir <strong>de</strong> então, verifi ca-se um progressivo aumento do volume da produçãocientífi ca, alimentando um número crescente <strong>de</strong> periódicos vinculados às IES,característica que persiste até os dias atuais.Um título que contrariou essa tendência foi a revista Psicologia: Ciênciae Profi ssão, uma vez que é editada pelo Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia (CFP).Des<strong>de</strong> o seu primeiro número, em 1979, já frisava que sua política editorial erapromover o <strong>de</strong>bate entre a Psicologia acadêmica e a prática profi ssional. Essecaráter me<strong>no</strong>s acadêmico se tor<strong>no</strong>u ainda mais forte a partir <strong>de</strong> 1984, comuma mudança da sua linha editorial, passando a publicar não só relatos <strong>de</strong>pesquisa, mas também reportagens, relatos <strong>de</strong> experiência, opiniões <strong>de</strong> leitores,entrevistas e resenhas <strong>de</strong> livros. Campos e Bernar<strong>de</strong>s (2005), ao avaliarem osprimeiros 25 a<strong>no</strong>s da revista, i<strong>de</strong>ntifi caram que, ao longo do período, houveuma preocupação permanente <strong>de</strong> que esse periódico fosse um veículo <strong>de</strong>aproximação e congregação dos psicólogos brasileiros, bem como <strong>de</strong> consolidarseu papel como canal <strong>de</strong> socialização <strong>de</strong> material relevante e i<strong>no</strong>vador.Da época dos primeiros periódicos até hoje, muitos títulos foramcriados e outros tantos expiraram. É preciso <strong>de</strong>stacar, em relação à publicaçãocientífi ca em Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> que, para além do crescimento quantitativoque se assistiu, principalmente a partir <strong>no</strong> século XXI, a organização <strong>de</strong>sse setorpropiciou um salto qualitativo nas revistas científi cas da área, tendo como umaconsequência o incremento <strong>de</strong> sua visibilida<strong>de</strong>.A preocupação com a qualida<strong>de</strong> das publicações científi cas não é,evi<strong>de</strong>ntemente, um fenôme<strong>no</strong> <strong>no</strong>vo 2 . Contudo, é a avaliação empreendida pelaComissão CAPES/ANPEPP – composta pela Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong>2 Veja-se, por exemplo, a reunião promovida em 1996 pela Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicologia(SBP) com os editores científi cos a fi m <strong>de</strong> “facilitar o fortalecimento <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssas publicações”(Gue<strong>de</strong>s, Zan<strong>no</strong>n & Luna, 1996, p. 1).


36 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Pessoal <strong>de</strong> Nível Superior e pela Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-graduaçãoem Psicologia – para a base Qualis que po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada, <strong>de</strong>fi nitivamente,um divisor <strong>de</strong> águas na comunida<strong>de</strong> científi ca <strong>de</strong> Psicologia (Costa & Yamamoto,2008). A iniciativa, que surgiu como componente das avaliações dos programas<strong>de</strong> pós-graduação <strong>no</strong> país, tem promovido uma mudança consi<strong>de</strong>rável <strong>no</strong> âmbitoda publicação científi ca em Psicologia, ao estabelecer um ranking que aponta onível <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> dos veículos, ao exigir a padronização dos títulos, ao direcionaro fomento às revistas, ao estimular a in<strong>de</strong>xação e a acessibilida<strong>de</strong> dos periódicos,principalmente pela internet, e, assim, <strong>de</strong>fi nir os periódicos científi cos <strong>no</strong>s quaisos pesquisadores publicam seus estudos.Paralelamente ao aperfeiçoamento dos periódicos, tor<strong>no</strong>u-se necessáriopromover o acesso a esses títulos. Visando aten<strong>de</strong>r a essa <strong>de</strong>manda, em 2001,foi criada a Biblioteca Virtual da Psicologia (BVS-Psi), um instrumento paraorganização e disseminação da literatura psicológica. Nela, estão contidos,<strong>de</strong>ntre outros, os In<strong>de</strong>x Psi Periódicos Técnico-Científi cos, In<strong>de</strong>x Psi Periódicos<strong>de</strong> Divulgação Científi ca, In<strong>de</strong>x Psi Teses, In<strong>de</strong>x Psi Livros, a Literatura Lati<strong>no</strong>-Americana e do Caribe em Ciências da Saú<strong>de</strong> (LILACS-Psicologia), a Scientifi cElectronic Library Online (SciELO) e o Periódicos Eletrônicos em Psicologia(PePSIC), portal que preten<strong>de</strong> reunir uma coleção <strong>de</strong> revistas científi casutilizando a metodologia SciELO 3 , além <strong>de</strong> sinalizar gratuitamente pela interneta localização <strong>de</strong> periódicos <strong>de</strong> Psicologia em formato eletrônico.Importante ressaltar que foi o Movimento <strong>de</strong> Acesso Livre (Open Access[OA]) que facilitou o acesso à literatura científi ca (Sampaio & Serradas, 2009).Ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a compatibilida<strong>de</strong> entre sistemas <strong>de</strong> forma a permitir o intercâmbio<strong>de</strong> dados, a preservação em longo prazo, o acesso universal à informação ea gratuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção científi ca, o OA coloca a literatura científi ca emoutro patamar, saindo dos círculos fechados da aca<strong>de</strong>mia e alcançando não sóestudantes, docentes e pesquisadores, mas também profi ssionais, usuários ouqualquer outro interessado em conhecer os resultados das pesquisas científi cas.3 Sobre metodologia SciELO, conferir Packer et al., 1998.


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos37Também em 2001 foi criada a Re<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Bibliotecas da Área <strong>de</strong>Psicologia (ReBAP); em 2004, a Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Editores Científi cos <strong>de</strong>Psicologia (ABECiP). Na primeira, o objetivo é a construção e manutenção <strong>de</strong>fontes <strong>de</strong> informação essenciais para a Psicologia, <strong>de</strong> forma compartilhada. Asegunda se propõe a discutir os problemas pelos quais passam os editores, sendorecorrentes a captação <strong>de</strong> investimentos para manutenção dos periódicos e aa<strong>de</strong>quação dos títulos aos critérios <strong>de</strong> avaliação Qualis, e a busca por alternativascoletivas para as questões (Sampaio, 2001).Em virtu<strong>de</strong> da atuação <strong>de</strong>sses organismos (Comissão CAPES/ANPEPP,BVS-Psi, ReBAP e ABECiP) e motivado em gran<strong>de</strong> medida pela organizaçãodo sistema editorial, há, hoje, um gran<strong>de</strong> interesse por parte da comunida<strong>de</strong>científi ca em não só divulgar seus relatos <strong>de</strong> pesquisa, mas em escolher comoe on<strong>de</strong> fazê-lo. É fato que a publicação <strong>de</strong> um artigo científi co <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>, atualmente, é uma tarefa muito distinta <strong>de</strong> como se fazia em um passadonão muito remoto, tendo em vista as diversas transformações ocorridas em tãopeque<strong>no</strong> intervalo <strong>de</strong> tempo 4 .O crescimento e a estruturação do sistema multiplicam as bases e osrepositórios dos periódicos da Psicologia brasileira. No In<strong>de</strong>x Psi PeriódicosTécnico-Científi cos são listados artigos <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 160 <strong>de</strong> revistas brasileiraspublicadas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1949. Já <strong>no</strong> PePSIC são 80 títulos eletrônicos lati<strong>no</strong>-america<strong>no</strong>s,sendo que, <strong>de</strong>sses, 54 são editados <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Na relação <strong>de</strong> sócios fundadoresda ABECiP consta o <strong>no</strong>me <strong>de</strong> 60 editores <strong>de</strong> Psicologia. Na última avaliaçãoda Comissão CAPES/ANPEPP, correspon<strong>de</strong>nte ao triênio 2007/2009, mais <strong>de</strong>mil e cem títulos apareceram <strong>no</strong>s relatórios dos Programas <strong>de</strong> Pós-graduação.Reduzindo esse número às revistas publicadas <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> que tenham comofoco principal temas <strong>de</strong> Psicologia ou <strong>de</strong> alguma <strong>de</strong> suas subáreas, totaliza-se,aproximadamente, 120 periódicos.4 Um dos resultados da organização do sistema editorial <strong>de</strong> Psicologia é a publicação <strong>de</strong>um manual <strong>de</strong>stinado a estudantes, profi ssionais, acadêmicos e editores científi cos. A versãocompleta <strong>de</strong> “Publicar em Psicologia”, organizado por Sabadini, Sampaio e Koller (2009), estádisponível em http://www.publicarempsicologia.blogspot.com.


38 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>O volume <strong>de</strong> periódicos e o modo como esse sistema editorial seorganiza servem para ilustrar o nível <strong>de</strong> organização e <strong>de</strong>senvolvimento <strong>no</strong> setor<strong>de</strong> publicação <strong>de</strong> artigos científi cos da Psicologia brasileira, que se encontraarticulado à estruturação da própria área como um todo. Assim, o incremento<strong>de</strong>ssa produção científi ca sob análise permite que se conheça o vigor e acomposição <strong>de</strong>sse campo do conhecimento, por meio da avaliação da qualida<strong>de</strong>do que é publicado e da <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> aspectos específi cos <strong>de</strong>ssa produção.2 A produção científica e a profissão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>No caso do trabalho em tela, em que se buscou investigar a produçãocientífi ca <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, é possível aquilatar não só ograu <strong>de</strong> envolvimento e investimento que tem sido feito na área em relação aesta temática, mas também em que condições e <strong>de</strong> que forma os pesquisadoresse arranjam para discutir a questão.Estudos <strong>de</strong> sistematização do conhecimento produzido, embora recentes,não são raros na Psicologia. De acordo com Santos, Amorim e Yamamoto (2009),é possível encontrar diversas pesquisas que investigam a produção científi ca naárea, variando quanto ao formato do material analisado (dissertações e teses,artigos científi cos ou anais <strong>de</strong> eventos), à área a qual se insere o estudo (se serefere à Psicologia como um todo ou a alguma <strong>de</strong> suas subáreas), ao recorteteórico, metodológico ou temático, ou, ainda, ao período <strong>de</strong> tempo analisado.Po<strong>de</strong>m-se aglutinar os achados <strong>de</strong>ssas pesquisas segundo os aspectosmais recorrentes. É conclusão generalizada que o número <strong>de</strong> trabalhos científi costem crescido signifi cativamente <strong>no</strong>s últimos a<strong>no</strong>s e que essa produção consisteprincipalmente em relatos <strong>de</strong> pesquisa. Em relação à distribuição geográfi ca, nãoé <strong>no</strong>vida<strong>de</strong> que a produção científi ca <strong>de</strong> Psicologia se concentre na região su<strong>de</strong>stedo país e nas instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior públicas. Também se atesta que aautoria na área é predominantemente múltipla e feminina e que são poucos osautores que publicam sistematicamente, havendo uma gran<strong>de</strong> dispersão <strong>de</strong>ssaliteratura científi ca.Contudo, ainda não foram i<strong>de</strong>ntifi cados estudos que sistematizama produção científi ca <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, como sinalizaBotomé (1988). Por um lado, as pesquisas nesta temática ocorrem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década<strong>de</strong> 1970 (a exemplo <strong>de</strong> Campos, 1983; Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia, 1988;


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos39Mello, 1975; Yamamoto, 1987) e também são recorrentes os estudos <strong>de</strong> análisemetacientífi ca conforme mencionado anteriormente. Por outro, não se i<strong>de</strong>ntifi camtrabalhos articulando esses dois aspectos discutindo a produção científi ca <strong>sobre</strong>a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo. Em outras palavras, po<strong>de</strong>-se consi<strong>de</strong>rar que a atuaçãoprofi ssional na área já é um tema <strong>de</strong> estudo para muitos pesquisadores. O queaté então não foi realizado refere-se à análise minuciosa dos dados obtidos portais pesquisas, ou seja, a <strong>de</strong>scrição criteriosa das condições <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>ssesestudos, a i<strong>de</strong>ntifi cação <strong>de</strong> quem realiza as pesquisas, como são divulgadas e<strong>sobre</strong> o que especifi camente tratam esses estudos.Em relação à publicação <strong>de</strong> pesquisas <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> <strong>no</strong> formato <strong>de</strong> artigos, há questões ainda mais <strong>de</strong>licadas a se abordar.A área <strong>de</strong> Psicologia, representada pela Comissão CAPES/ANPEPP, consi<strong>de</strong>racomo periódico científi co aquele veículo que tem como leitor principal e autoro pesquisador ou alu<strong>no</strong>s <strong>de</strong> qualquer nível, e que é publicado, prioritariamente,por socieda<strong>de</strong> científi ca ou instituição acadêmica. Em outras palavras, o artigocientífi co se confi gura quase que exclusivamente, como canal <strong>de</strong> comunicaçãoentre atores do circuito acadêmico, seja como produtores, seja comoconsumidores do conhecimento construído.Dessa forma, <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>-se que o profi ssional que está em ação não éum interlocutor preferencial <strong>no</strong> tocante aos periódicos científi cos para que seintegre e compartilhe experiências, ao contribuir com relatos que possibilitemo aprimoramento da Psicologia. Segundo a concepção anteriormente citada <strong>de</strong>revistas científi cas, ao psicólogo alheio à comunida<strong>de</strong> científi ca cabe a “busca daatualização continuada” (Bastos et al., 2008, p. 1).Foi com essa inquietação que se buscou analisar os artigos científi cosque retratam a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: como essa modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>publicação, tão vinculada à comunida<strong>de</strong> estritamente científi ca, aborda umatemática essencialmente relacionada à prática profi ssional?Os dados coletados permitiram i<strong>de</strong>ntifi car quando os artigos forampublicados e <strong>sobre</strong> o que se referem (qual o formato <strong>de</strong>sses artigos e <strong>sobre</strong> quaisáreas da Psicologia alu<strong>de</strong>m), quem publica <strong>sobre</strong> a profi ssão (quem são os autores,a qual instituição pertencem, on<strong>de</strong> estão localizados geografi camente) e em queveículos os artigos foram divulgados (em quais periódicos foram publicados, asagências editoras dos veículos, se tratam <strong>de</strong> títulos especializados ou genéricos).


40 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>3 A produção <strong>sobre</strong> a profissão veiculada pelos periódicos científicosbrasileirosO levantamento empreendido nessa pesquisa resultou <strong>no</strong> total <strong>de</strong> 376artigos, que versam <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, publicados emperiódicos científi cos. Contudo, 38,7% dos documentos não se encontravamdisponíveis na íntegra on-line à época da etapa <strong>de</strong> coleta das informações paraa pesquisa. Ainda, 22,6% dos trabalhos não tinham seu resumo acessível viainternet. Assim, dos 376 artigos i<strong>de</strong>ntifi cados para compor este estudo, 291foram coletados em sua completu<strong>de</strong>.Sabe-se que o Movimento <strong>de</strong> Acesso Aberto, que busca a disponibilizaçãointegral da literatura técnico-científi ca na internet, ganhou forças somente apartir das Declarações <strong>de</strong> Budapeste, em 2002, <strong>de</strong> Bethesda e <strong>de</strong> Berlim, ambasem 2003 (Sampaio & Serradas, 2009). No <strong>Brasil</strong>, a iniciativa resultou na Carta<strong>de</strong> São Paulo, em 2005, e na Psicologia, a Declaração <strong>de</strong> Florianópolis, com basena <strong>de</strong> Bethesda, foi assinada em 2006 por pesquisadores da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong><strong>no</strong> XI Simpósio <strong>de</strong> Intercâmbio Científi co da ANPEPP (Associação Nacional <strong>de</strong>Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia, 2006). Assim, é compreensível quemuitos dos artigos publicados, principalmente anteriores a esse período, nãoestejam acessíveis on-line.Apesar da recentida<strong>de</strong> da participação da internet na divulgação <strong>de</strong>artigos científi cos, existem algumas iniciativas que objetivam recuperar taisinformações científi cas já publicadas para disponibilização integral na internet.É o caso do PePSIC portal lançado em 2005 e que conta com uma coleção <strong>de</strong>80 periódicos <strong>de</strong> Psicologia, alguns <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o primeiro número, como as revistasPsicologia USP (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1990), Psicologia Escolar e Educacional (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1996), eNatureza Humana (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1999). Foi a partir <strong>de</strong>sse portal que se tor<strong>no</strong>u possível arecuperação do texto integral <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte dos artigos i<strong>de</strong>ntifi cados na coleta<strong>de</strong>sta pesquisa 5 .5 Cabe <strong>de</strong>stacar também a colaboração do COMUT (Programa <strong>de</strong> Comutação Bibliográfi ca)para acesso aos textos integrais, só disponíveis na forma impressa nas principais bibliotecasdo país. Maiores informações <strong>sobre</strong> o programa estão disponíveis em http://comut.ibict.br/comut/do/in<strong>de</strong>x?op=fi ltroForm.


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos413.1 Caracterização geral dos artigosPara uma primeira apreciação dos dados, foi consi<strong>de</strong>rada a distribuiçãodos artigos por a<strong>no</strong> <strong>de</strong> publicação, ao que foi verifi cada a existência <strong>de</strong>documentos que datam <strong>de</strong> 1952 a 2008, havendo concentração <strong>de</strong>sses estudosem 2007 (n = 42) e em 2005 (n = 39). Ainda, agrupando os documentos porfaixas <strong>de</strong> a<strong>no</strong>, percebe-se que há uma concentração dos artigos <strong>no</strong>s períodos <strong>de</strong>1997-2001 (n = 64), 2002-2006 (n = 128) e 2007-2008 (n = 57), como po<strong>de</strong>ser visualizado na Figura 1. Juntos, os três períodos citados congregam 66,2%dos artigos coletados.Figura 1. Distribuição temporal da produção <strong>de</strong> artigos em periódicos científicos da Psicologia.2007-20082002-20061997-20011992-19961987-19911982-19861977-19811972-19761967-19711962-1966-19620 50 100 150


42 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Os dados acima explicitados po<strong>de</strong>m estar relacionados a diversos<strong>de</strong>terminantes. Inicialmente, é mister ressaltar que a internet, fonte utilizadapara <strong>no</strong>ssa coleta <strong>de</strong> dados, é um meio <strong>de</strong> divulgação científi ca relativamenterecente, que acaba por privilegiar o material publicado nas últimas décadas. Atítulo <strong>de</strong> ilustração, nenhum dos artigos coletados que datam até a década <strong>de</strong>1980 foi encontrado na sua versão completa, constando apenas indicativos <strong>de</strong>sua existência em bibliotecas universitárias.Outro <strong>de</strong>terminante refere-se ao reconhecimento da Psicologia comoprofi ssão <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, só ocorrida em 1962, o que justifi ca a escassez <strong>de</strong> documentosimediatamente anteriores ou posteriores a essa época. Por fi m, há <strong>de</strong> se <strong>de</strong>stacaro próprio crescimento e a estruturação da área, <strong>de</strong> seu sistema <strong>de</strong> editoração eda expansão da pós-graduação, principalmente a partir dos a<strong>no</strong>s 2000. Comojá foi mencionado, a produção científi ca é atualmente mais incisiva não só paraaten<strong>de</strong>r ao imperativo da produtivida<strong>de</strong> imposta pelas agências fi nanciadoras,mas também pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da Psicologia como ciênciae profi ssão.Consi<strong>de</strong>rando as limitações <strong>de</strong>sta investigação, tais aspectos certamenteinfl uenciaram a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos <strong>sobre</strong> profi ssão recuperados, bemcomo sua distribuição ao longo dos a<strong>no</strong>s. Sugere-se, <strong>de</strong>sta feita, que trabalhosnão disponíveis on-line venham a ser <strong>de</strong>positados na internet, a fi m <strong>de</strong> que acomunida<strong>de</strong> possa ter acesso, contribuindo, assim, para o enriquecimento dasdiscussões e refl exões a respeito da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo.Além da distribuição temporal dos artigos coletados, buscou-sei<strong>de</strong>ntifi car como o material aborda a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo. Para tanto, foramexaminados os 291 resumos para a classifi cação quanto ao formato do trabalho,verifi cando-se que há predominância dos relatos <strong>de</strong> pesquisa (n=123; 42,3%),imediatamente acompanhados pelos trabalhos teóricos (n=120; 41,2%). Já osrelatos <strong>de</strong> experiência aparecem com apenas 16,5% (n=48).Tais índices po<strong>de</strong>m sinalizar uma das principais políticas adotadapela maioria dos periódicos científi cos, que é a <strong>de</strong> publicar relatos inéditos <strong>de</strong>pesquisa, o que acabou se refl etindo <strong>no</strong>s estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo.Por outro lado, tem-se também um consi<strong>de</strong>rável volume <strong>de</strong> trabalhos teóricos,


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos43o que sugere que há, diante <strong>de</strong>ssa temática, interesse pela discussão e refl exão afi m <strong>de</strong> construir um corpo teórico consistente.Ainda em relação à caracterização dos artigos coletados, buscou-seaveriguar a qual subárea da Psicologia os documentos se referem. Dessa forma,observou-se que 71 artigos empreen<strong>de</strong>m discussões a respeito da profi ssão dopsicólogo in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> subárea <strong>de</strong> atuação (categoria geral), sendo seguidosdos documentos classifi cados como Psicologia Escolar/Educacional e Psicologiada Saú<strong>de</strong>, ambas compreen<strong>de</strong>ndo 60 artigos cada, e Psicologia Hospitalar, com51 documentos. Na Tabela 1 é possível i<strong>de</strong>ntifi car as subáreas em que foramsituados os artigos para a referida análise.Tabela 1Distribuição da produção <strong>sobre</strong> a profi ssão veiculada pelas revistas científi casbrasileiras <strong>de</strong> Psicologia pelas subáreas (volume e percentual)Subárea da Psicologia n %Geral 71 18,9Psicologia Escolar/Educacional 60 16Psicologia da Saú<strong>de</strong> 60 16Psicologia Hospitalar 51 13,6Psicologia Clínica 37 9,8Psicologia Social 30 8Psicologia Organizacional e do Trabalho 27 7,2Psicologia Jurídica 17 4,5História da Psicologia 16 4,3Psicologia do Esporte 4 1,1Psicologia do Trânsito 1 0,3Neurociência 1 0,3Docência 1 0,3Total 376 100Ao analisar a distribuição dos documentos por subárea da Psicologia<strong>no</strong> <strong>de</strong>correr dos a<strong>no</strong>s, foi possível perceber que na época antece<strong>de</strong>nte àregulamentação profi ssional ocorriam discussões com relação à profi ssão como


44 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>um todo, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte das especifi cida<strong>de</strong>s das subáreas da Psicologia. Issopo<strong>de</strong> ter sido refl exo das movimentações ocorridas naquele período, em prol <strong>de</strong>um reconhecimento legal da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, tal como apresentado porPereira e Pereira Neto (2003).Os artigos publicados nas décadas <strong>de</strong> 1970 e 1980 abordam a profi ssão<strong>de</strong> modo mais focalizado; ou seja, os trabalhos discutem, predominantemente,acerca dos psicólogos que atuam em subáreas consi<strong>de</strong>radas tradicionais – Clínica,Escolar/Educacional e Organizacional e do Trabalho –, bem como naquelasemergentes àquela época, como Hospitalar e Saú<strong>de</strong>. Em relação a estas últimas,é possível dizer que estudos emergiram nesse período possivelmente na tentativa<strong>de</strong> <strong>de</strong>fi nir práticas e espaços cabíveis ao psicólogo atuante nessas subáreas, tendoem vista que em tais décadas houve uma série <strong>de</strong> mudanças <strong>no</strong> tocante à saú<strong>de</strong>pública do país, abrindo caminhos para uma atuação do psicólogo em espaçosdiferenciados aos tradicionais (Carvalho & Yamamoto, 1999; Marcon, Luna &Lisboa, 2004).Artigos <strong>de</strong> Psicologia Jurídica e Psicologia do Esporte também apareceramentre os trabalhos coletados, tendo sido publicados do fi m da década <strong>de</strong> 1990 emdiante. É provável que tal dado esteja vinculado à abertura <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos espaços parao psicólogo, tendo em vista a saturação <strong>de</strong> profi ssionais nas subáreas tradicionais,o que fez buscarem outros campos <strong>de</strong> atuação (Pereira & Pereira Neto, 2003).Vale salientar, ainda, a presença <strong>de</strong> apenas um artigo em cada uma dastrês subáreas a seguir: Psicologia do Trânsito, Neurociência e Docência. A rarida<strong>de</strong><strong>de</strong> artigos <strong>sobre</strong> a atuação nas duas últimas po<strong>de</strong> ser entendida por não seremconsi<strong>de</strong>radas propriamente da Psicologia – a primeira por estar majoritariamentevoltada à pesquisa e a segunda por não ser prática exclusiva da Psicologia.Quanto à Psicologia do Trânsito, foram localizados diversos documentosofi ciais (seja <strong>de</strong> órgãos da Psicologia, como o CFP, seja <strong>de</strong> órgãos referentes aotrânsito em si, como o Conselho Nacional <strong>de</strong> Trânsito), livros e apresentações emeventos científi cos referentes à atuação do psicólogo, mas não foram i<strong>de</strong>ntifi cadosmateriais <strong>no</strong> formato <strong>de</strong> artigos científi cos na subárea. Deve-se assinalar que oúnico periódico especializado na temática (Psicologia: Pesquisa e Trânsito) nãofoi além <strong>de</strong> dois números e em nenhum <strong>de</strong>les consta artigos que discutamespecifi camente <strong>sobre</strong> a prática do profi ssional nessa subárea.


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos45Buscou-se, ainda, relacionar a subárea da Psicologia da qual tratam ostrabalhos e o formato dos artigos (Figura 2).Figura 2. Distribuição da produção por subárea da Psicologia e formato do trabalho.302520151050Teórico Pesquisa Relato <strong>de</strong> experiênciaNa maior parte das áreas discriminadas, predomina a produção <strong>de</strong>artigos que apresentam relatos <strong>de</strong> pesquisa. A Psicologia da Saú<strong>de</strong> é a subáreaque apresentou maior número nesse formato (n = 25), <strong>sobre</strong>tudo a partir dosa<strong>no</strong>s 2000. Ou seja, é possível afi rmar que uma vez consolidada, a área passa aser objeto mais frequente <strong>de</strong> investigação.Os estudos teóricos superaram os relatos <strong>de</strong> pesquisa apenas nasubárea da Psicologia Social (n = 16), Organizacional e do Trabalho (n = 11)e Psicologia do Esporte (n = 4). Esse dado po<strong>de</strong> ser, eventualmente, tomadocomo um indicativo da preocupação especial que as mesmas apresentariamcom relação à fundamentação teórica, aos métodos e às técnicas <strong>de</strong> trabalho<strong>de</strong>senvolvidas. Com relação à produção em Psicologia Social, não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> serinteressante confrontar a observação <strong>de</strong> Albuquerque e Arendt (2003), <strong>de</strong> que aprodução acadêmica em Psicologia Social <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> está voltada “mais a produzirdiagnósticos e reconhecimentos <strong>de</strong> fatos que teorias psicológicas explicativas”(p. 198), com a gran<strong>de</strong> produção <strong>de</strong> trabalhos propriamente teóricos observados<strong>no</strong> presente estudo. Se há procedência a avaliação dos referidos autores, énecessário examinar com maior profundida<strong>de</strong> a natureza <strong>de</strong>sses estudos parase aquilatar as efetivas contribuições para o acúmulo <strong>de</strong> conhecimento da área.


46 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Vale apontar também que a Psicologia Jurídica foi a única subárea queapresentou o número <strong>de</strong> relatos <strong>de</strong> experiência superior aos <strong>de</strong>mais formatos <strong>de</strong>trabalho (n = 6), o que po<strong>de</strong> ser refl exo da busca pela consolidação da subárea<strong>no</strong> país, suscitando o interesse pela apresentação das práticas <strong>de</strong>senvolvidaspelos profi ssionais nela envolvidos.3.2 Análise da autoria dos artigosExpostas algumas características dos estudos publicados em formato <strong>de</strong>artigos científi cos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, a questão seguinte dizrespeito a quem produz esses estudos. Não foi possível i<strong>de</strong>ntifi car as instituições<strong>de</strong> vínculo dos autores principais em 59 casos. Dos <strong>de</strong>mais, foram i<strong>de</strong>ntifi cadas102 instituições distintas, sendo que 73,1% são provenientes do eixo Sul-Su<strong>de</strong>stedo país (Tabela 2). Esses índices estão muito próximos aos apresentados emoutros trabalhos que versam <strong>sobre</strong> a produção científi ca em Psicologia comoum todo, tal como constatado por Yamamoto, Souza e Yamamoto (1999) que,ao avaliarem os principais periódicos científi cos da área, verifi caram que mais <strong>de</strong>80% da produção se concentrava nas regiões geográfi cas Sul e Su<strong>de</strong>ste.Tabela 2Distribuição geográfi ca dos autores <strong>de</strong> artigos que versam <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong>psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> por região, estado e instituiçãoRegião Estado InstituiçãoSu<strong>de</strong>ste (50%) São Paulo (32,6%) USP (13,3%)Sul (23,1%) Rio Gran<strong>de</strong> do Sul (13,6%) UFRGS (4,4%)Nor<strong>de</strong>ste (17,1%) Rio Gran<strong>de</strong> do Norte (8,5%) UFRN (8,5%)Centro-Oeste (4,7%) Distrito Fe<strong>de</strong>ral (3,8%) UnB(2,8%)Norte (0,6%) Pará (0,6%) UFPA (0,6%)Analisando mais <strong>de</strong>tidamente a origem <strong>de</strong>stes materiais, verifi ca-se que,em relação à unida<strong>de</strong> fe<strong>de</strong>rativa on<strong>de</strong> se localiza a instituição <strong>de</strong> vínculo doautor principal, há predominância do estado <strong>de</strong> São Paulo, que abrange 32,6%


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos47dos artigos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, sendo seguido pelo Rio Gran<strong>de</strong> doSul, com 13,6%, Rio Gran<strong>de</strong> do Norte e Rio <strong>de</strong> Janeiro, ambos com 8,5% dosartigos. Finalmente, as instituições que se <strong>de</strong>stacam quanto à vinculação dosautores foram Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (USP) com 13,3% dos documentos,Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Norte (UFRN) com 8,5% e Universida<strong>de</strong>Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul (UFRGS) com 4,4%. Diante <strong>de</strong>sses dados percebeseque, mais do que centralização geográfi ca da produção analisada, existe umaconcentração institucional do material.Vale ressaltar que a concentração geográfi ca e institucional <strong>de</strong>monstradapor meio dos resultados não se refere apenas aos trabalhos que versam <strong>sobre</strong> aprofi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> país, mas está atrelada ao fato <strong>de</strong> que essas regiõescongregam a maior parcela <strong>de</strong> instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior do país (Soares,2002), consequência da <strong>de</strong>sigual distribuição <strong>de</strong> recursos, <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>seducacionais, bem como <strong>de</strong> formação acadêmica, ainda presentes <strong>no</strong> país( Yamamoto, Souza & Yamamoto, 1999). Apesar <strong>de</strong>sse contexto <strong>de</strong> concentraçãoda produção da ciência <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, há, <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s recentes, uma tendência <strong>de</strong>políticas científi cas governamentais em enfrentar esse <strong>de</strong>sequilíbrio, a exemploda <strong>de</strong>scentralização <strong>de</strong> editais para fomento à pesquisa por meio das FundaçõesEstaduais <strong>de</strong> Amparo à Pesquisa (FAPs); e pela interiorização do ensi<strong>no</strong> superiorpúblico, com a eventual interiorização da pesquisa. Como são tendênciasrecentes e ainda em consolidação, tais avanços ainda não estão refl etidos <strong>no</strong>síndices <strong>de</strong> produção científi ca estudados nesta investigação.Em relação ao tipo <strong>de</strong> instituição <strong>de</strong> origem dos autores dos artigoscoletados, verifi cou-se a predominância maciça das IES em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outrasinstituições, como órgãos executivos públicos, empresas privadas, socieda<strong>de</strong>se associações científi cas e/ou profi ssionais (Tabela 3), coadunando-se com ai<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a produção científi ca <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> encontra-se fortemente atreladaao ambiente acadêmico, principalmente à pós-graduação 6 (Cury, 2004). Sendoassim, não é <strong>de</strong> se estranhar que os artigos a respeito da profi ssão do psicólogobrasileiro, confi gurando-se enquanto um resultado <strong>de</strong> investigações científi cassejam, em sua maioria, originários <strong>de</strong> IES localizadas <strong>no</strong> su<strong>de</strong>ste do país.6 Esse tema será <strong>de</strong>talhado <strong>no</strong> próximo capítulo.


48 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tabela 3Tipo <strong>de</strong> instituição <strong>de</strong> origem dos autores <strong>de</strong> artigos referentes à profi ssão <strong>de</strong>psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tipo <strong>de</strong> instituição n %IES 83 81,4Outros 7 6,9Órgão público municipal 4 3,9Socieda<strong>de</strong>/Associação 3 2,9Órgão público estadual 3 2,9Entida<strong>de</strong> profi ssional 1 1Órgão público fe<strong>de</strong>ral 1 1Total 102 100Além disso, observa-se que os resultados estão fortemente associados aoutras pesquisas <strong>sobre</strong> a produção científi ca em Psicologia; as últimas apontampara concentração <strong>de</strong> autores vinculados a cursos <strong>de</strong> graduação e programas <strong>de</strong>pós-graduação (a exemplo dos estudos <strong>de</strong> Souza Filho, Belo & Gouveia, 2006;Tonetto, Amazarray, Koller & Gomes, 2008; Yamamoto, Souza & Yamamoto,1999).Tratando-se <strong>de</strong> artigos que abordam a temática da atuação profi ssional,po<strong>de</strong>r-se-ia esperar que houvesse uma participação expressiva <strong>de</strong> profi ssionaisem ação compartilhando experiências ou refl etindo <strong>sobre</strong> a sua prática. Todavia,não é o que ocorre: me<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 20% dos autores dos artigos i<strong>de</strong>ntifi cados nestapesquisa se enquadram na categoria.Assim, confi rma-se que, <strong>de</strong> fato, o periódico científi co é canal <strong>de</strong>comunicação para o ambiente acadêmico, restando aos psicólogos da práticaprofi ssional o consumo <strong>de</strong>sse material, e sua contribuição para a melhoria daatuação psicológica é relegada à posição <strong>de</strong> sujeitos das pesquisas empreendidaspelos pesquisadores das IES.No que diz respeito, ainda, à autoria dos artigos, exami<strong>no</strong>u-se o gênerodos autores (consi<strong>de</strong>rando apenas os primeiros autores), e o tipo <strong>de</strong> autoria (seindividual ou coletiva) (Tabelas 4 e 5).


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos49Tabela 4Gênero do autor principal dos artigos que versam <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Gênero n %Femini<strong>no</strong> 242 77,3Masculi<strong>no</strong> 70 22,3Não se aplica 1 0,3Total 313 100Tabela 5Tipo <strong>de</strong> autoria dos artigos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogoTipo <strong>de</strong> autoria n %Individual 202 53,7Coletiva 173 46,0Institucional 1 0,3Total 376 100,0Os dados evi<strong>de</strong>nciam a forte presença <strong>de</strong> autoria feminina (77,3%),índice semelhante aos apresentados em outras pesquisas em Psicologia acerca<strong>de</strong> sua produção científi ca (Souza Filho, Belo & Gouveia, 2006; Witter, 2005;Yamamoto Souza & Yamamoto, 1999), possivelmente, representando o próprioperfi l profi ssional da área.Por outro lado, ao se consi<strong>de</strong>rar a média <strong>de</strong> artigos produzidos porhomens e mulheres, percebe-se uma tendência inversa, em que autores do sexomasculi<strong>no</strong> são mais produtivos do que do sexo femini<strong>no</strong>, apesar <strong>de</strong>ssa diferençaser mínima (1,35 para homens contra 1,15 para as mulheres). Os dados confi rmama literatura especializada, que aponta para a hegemonia masculina referente àrelação ciência-gênero, ainda que se consi<strong>de</strong>rem as diferenças entre as áreasdo conhecimento, seja em termos <strong>de</strong> bolsistas <strong>de</strong> Produtivida<strong>de</strong> em Pesquisado CNPq, fi nanciamento <strong>de</strong> pesquisa proveniente <strong>de</strong> agências <strong>de</strong> fomento,expositores em congressos científi cos ou como autores <strong>de</strong> livros e <strong>de</strong>fesas <strong>de</strong>


50 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>teses e dissertações ( Yamamoto, Souza & Yamamoto, 1999). Ou seja, mesmoque a produção científi ca absoluta apresente maior participação das mulheres,em termos <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong>, os homens se <strong>de</strong>stacam mesmo na Psicologia, áreaconsi<strong>de</strong>rada majoritariamente feminina.Em relação à autoria individual e coletiva, verifi ca-se a existência <strong>de</strong>certo equilíbrio, com 53,7% e 46%, respectivamente. No entanto, avaliando comoisso se confi gura <strong>no</strong> <strong>de</strong>correr do tempo, observa-se que, <strong>no</strong>s últimos a<strong>no</strong>s, háum crescimento da produção em parceria em <strong>de</strong>trimento da individual, havendoassim o indicativo <strong>de</strong> que há, hoje, uma maior produção em colaboração do queem outras épocas. Essa inversão é apontada por algumas áreas do conhecimento,a exemplo da Ciência da Informação, como uma tendência <strong>no</strong> cenário daprodução científi ca como um todo. Soma-se a isso, o incentivo que a produçãoem parceria vem recebendo por parte das agências <strong>de</strong> fomento e pelas IES (VilanFilho, Souza & Muller, 2008).Assim, o tipo <strong>de</strong> autoria mais encontrado nesta pesquisa po<strong>de</strong> sercaracterizado por ser predominantemente femini<strong>no</strong>, porém os homens são osmais produtivos, com muitos autores <strong>de</strong> um só trabalho <strong>sobre</strong> o tema e autoriamúltipla em ascensão. Essa <strong>de</strong>scrição foi observada em outros estudos <strong>sobre</strong> aprodução científi ca em Psicologia, sendo a articulação entre gênero e quantida<strong>de</strong><strong>de</strong> autores característica da área, seja por motivos exter<strong>no</strong>s (o incentivo dasagências <strong>de</strong> fomento a trabalhos em parceria) ou inter<strong>no</strong>s à profi ssão (ao situara Psicologia como uma profi ssão historicamente feminina) (Oliveira, Cantalice,Joly & Santos, 2006).Um último aspecto que chama a atenção em relação aos dados referentesà autoria, diz respeito ao número signifi cativo <strong>de</strong> autores com um único trabalho(n = 276), enquanto poucos autores produziram mais <strong>de</strong> uma publicação natemática (n = 37). Essa discussão remete não necessariamente à consistência dacarreira <strong>de</strong> pesquisador dos autores, mas, <strong>sobre</strong>tudo, à participação da temáticaem questão nas linhas <strong>de</strong> pesquisa dos mesmos. Os dados apontam apenas 10autores com três ou quatro trabalhos publicados <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, o que po<strong>de</strong> signifi car que não é comum este tema se confi gurarcomo área <strong>de</strong> trabalho principal, po<strong>de</strong>ndo indicar, por sua vez, que a gran<strong>de</strong>


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos51maioria dos autores são pesquisadores que publicaram fora <strong>de</strong> sua especialida<strong>de</strong>principal, <strong>de</strong> forma isolada ou em equipe eventual.3.3 Análise dos veículos que publicaram os artigos coletadosDos resultados referentes aos veículos <strong>no</strong>s quais os artigos <strong>sobre</strong>profi ssão <strong>de</strong> psicólogo foram publicados, observa-se que os documentos estãodistribuídos em 78 periódicos acadêmico-científi cos, sendo 50,9% concentradosem apenas oito (Tabela 6).Tabela 6Periódicos que mais publicaram artigos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogoPeriódicos n %Psicologia: Ciência e Profi ssão 54 14,4Psicologia & Socieda<strong>de</strong> 27 7,2Psicologia em Estudo 23 6,1Psico 21 5,6Estudos <strong>de</strong> Psicologia (Natal) 18 4,8Estudos <strong>de</strong> Psicologia (Campinas) 17 4,5Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicologia 16 4,3Psicologia: Refl exão e Crítica 15 4Total 191 50,9Em relação aos oito títulos, um primeiro aspecto que chama atençãorefere-se ao tempo <strong>de</strong> circulação: a média <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses periódicos gira emtor<strong>no</strong> <strong>de</strong> 28 a<strong>no</strong>s, tendo os mais recentes mais <strong>de</strong> 10 a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> existência. Alémdisso, fi gura na lista a revista consi<strong>de</strong>rada uma das mais antigas em Psicologia <strong>no</strong><strong>Brasil</strong> (Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicologia). Esse aspecto po<strong>de</strong> ser contextualizadosegundo duas linhas <strong>de</strong> interpretação. A primeira aponta que, em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong>estarem em circulação há mais tempo, os periódicos em pauta teriam maisartigos publicados em geral e, portanto, mais chances <strong>de</strong> divulgar material <strong>sobre</strong>a temática em questão. A outra seria que, justamente em função <strong>de</strong> se tratarem<strong>de</strong> periódicos mais antigos e, portanto, mais conhecidos pela comunida<strong>de</strong>


52 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>acadêmica, teriam um apelo atrativo maior para os autores com interesse <strong>de</strong>que seus artigos tivessem maior alcance, ainda mais consi<strong>de</strong>rando que os oitoperiódicos aglutinam mais da meta<strong>de</strong> dos artigos cuja temática é geral, ou seja,não aborda nenhuma subárea específi ca da Psicologia.Corroborando com a i<strong>de</strong>ia acima apresentada, tem-se que cinco <strong>de</strong>ssestítulos estão disponibilizados na biblioteca virtual SciELO, o que representanão só maior facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso ao material (por se tratar <strong>de</strong> um portal comdisponibilida<strong>de</strong> integral dos textos on-line), mas, principalmente, signifi ca quese trata <strong>de</strong> periódicos com qualida<strong>de</strong> garantida pelo rígido processo seletivo peloqual os títulos passam antes <strong>de</strong> serem integrados à biblioteca (Centro Lati<strong>no</strong>-America<strong>no</strong> e do Caribe <strong>de</strong> Informação em Ciências da Saú<strong>de</strong>/Biblioteca Regional<strong>de</strong> Medicina [BIREME], 2004; Meneghini, 1998). Quanto às outras três revistas,também disponibilizam seu material integralmente na internet, seja em sitepróprio, seja fazendo parte <strong>de</strong> portais <strong>de</strong> agrupamento <strong>de</strong> revistas científi cas. Afacilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso aos artigos também po<strong>de</strong> justifi car a coleta <strong>de</strong> dados <strong>de</strong>stapesquisa ter apontado diretamente para eles.Ainda quanto à caracterização dos periódicos, quatro <strong>de</strong>les explicitamem suas linhas editoriais o interesse em publicar material referente à práticaprofi ssional do psicólogo, seja por privilegiar conteúdos oriundos da atuaçãoem campo, seja para discutir o impacto e a relação que a Psicologia estabelececom a socieda<strong>de</strong> e com os usuários <strong>de</strong> seus serviços. A<strong>de</strong>mais, tomando o casoda revista Psicologia: Ciência e Profi ssão, era plausível a expectativa que autores<strong>de</strong> estudos <strong>sobre</strong> profi ssão do psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> procurassem esse veículo parapublicação, uma vez que é baluarte das discussões <strong>sobre</strong> a categoria profi ssional.Com relação ao tipo <strong>de</strong> instituição responsável pela edição <strong>de</strong>ssesperiódicos, observa-se a predominância das IES, que correspon<strong>de</strong>m a 62,4%das instituições i<strong>de</strong>ntifi cadas (Tabela 7). Contudo, ao se levar em conta asrevistas que mais publicam <strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, percebe-se que osdois periódicos que se <strong>de</strong>stacaram são editados por associações ou socieda<strong>de</strong>scientífi cas e profi ssionais, a saber, Psicologia: Ciência e Profi ssão, do CFP, ePsicologia & Socieda<strong>de</strong>, da Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicologia Social (ABRAPSO),algo esperado (porém não apenas <strong>de</strong>les) já que as entida<strong>de</strong>s mencionadas


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos53lidam diretamente com questões profi ssionais. Essa confi guração reafi rma aimportância das associações e socieda<strong>de</strong>s <strong>no</strong> âmbito da Psicologia (Witter, 2007),mantendo-se como instituições que historicamente editam periódicos científi cosna área (Antunes, 2007).Tabela 7Tipo <strong>de</strong> instituição que publica a revistaTipo <strong>de</strong> instituição n %IES 35 61,4Socieda<strong>de</strong>/Associação 15 26,3Entida<strong>de</strong> profi ssional 3 5,3Grupo <strong>de</strong> pesquisa 2 3,5Editora comercial 1 1,8Não informado 1 1,8Total 57 100Nesse sentido, retoma-se a discussão anterior a respeito da circulaçãodos periódicos científi cos, que acontece prioritariamente na aca<strong>de</strong>mia. Já haviasido apontado que os autores dos artigos <strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo sãoprincipalmente pesquisadores vinculados a instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior.Agora, atesta-se a <strong>de</strong>stinação do material – há <strong>de</strong> se consi<strong>de</strong>rar a possibilida<strong>de</strong><strong>de</strong> que, em relação aos estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, outra parcela <strong>de</strong>atores (os psicólogos em exercício) para os quais essas investigações po<strong>de</strong>m terbastante signifi cado não estaria tendo acesso ao que se diz a seu respeito forado seu âmbito <strong>de</strong> atuação. Dessa forma, é preciso atentar para a amplitu<strong>de</strong> daresponsabilida<strong>de</strong> dos periódicos científi cos <strong>sobre</strong> a disseminação <strong>de</strong> informações<strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo entre aqueles que assumem a ocupação alvo dosestudos publicados.Os periódicos científi cos po<strong>de</strong>m ser classifi cados, em sua gran<strong>de</strong> parte,como da área <strong>de</strong> Psicologia e suas subáreas, que, juntas, compreen<strong>de</strong>m 70,4%das revistas (Tabela 8). Assim, po<strong>de</strong>-se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>r que existe uma preferência


54 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>por parte dos autores em publicar seus estudos em veículos da própria área,estando os outros documentos (6,4%) disponíveis em revistas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> (e <strong>de</strong>suas subáreas), subáreas <strong>de</strong> humanas e interdisciplinares.Tabela 8Principal área do conhecimento a que se <strong>de</strong>stina o periódicoPrincipais áreas n %Psicologia 38 48,7Subáreas da Psicologia 17 21,7Saú<strong>de</strong> 5 6,4Subáreas da Saú<strong>de</strong> 12 15,3Interdisciplinar 4 5,1Subárea <strong>de</strong> Humanas 2 2,5Total 78 100Relacionando as áreas dos artigos com as dos periódicos <strong>no</strong>s quaissão publicados, <strong>no</strong>ta-se que todos os documentos das áreas <strong>de</strong> PsicologiaOrganizacional e do Trabalho e <strong>de</strong> Psicologia Jurídica foram publicados emrevistas <strong>de</strong> Psicologia ou <strong>de</strong> alguma <strong>de</strong> suas subáreas. Seguem esta tendênciaos artigos classifi cados como Geral e os <strong>de</strong> Psicologia Social (com 97% e 96%,cada uma). Estes resultados sugerem que a produção a respeito da profi ssão <strong>de</strong>psicólogo não estaria ocupando espaços exter<strong>no</strong>s a própria área, indicando queos autores <strong>de</strong>sta temática não consi<strong>de</strong>ram a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> discutir acerca da profi ssãocom profi ssionais <strong>de</strong> outras áreas, <strong>sobre</strong>tudo aqueles que trabalham em conjuntocom o psicólogo.Por outro lado, foi i<strong>de</strong>ntifi cado que artigos relativos às áreas <strong>de</strong> PsicologiaClínica, Escolar/Educacional, da Saú<strong>de</strong> e Hospitalar foram publicados em revistas<strong>de</strong> outros campos que não da própria Psicologia, tendo a Hospitalar o maior índice(21,5% dos documentos <strong>de</strong> Psicologia Hospitalar foram publicados em revistas<strong>de</strong> áreas externas à Psicologia). Po<strong>de</strong> signifi car que essas subáreas, ao contráriodo que parece ocorrer com as <strong>de</strong>mais, têm maior diálogo com outros camposdo saber, como, por exemplo, ao compor equipes multidisciplinares, e que,


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos55portanto, têm interesse em discutir <strong>sobre</strong> sua prática com outros profi ssionais.Essa afi rmação se coaduna com o trabalho <strong>de</strong> Féres-Carneiro e Lo Bianco (2003),que <strong>de</strong>stacam que, apesar <strong>de</strong> a Psicologia Clínica ser consi<strong>de</strong>rada fechada em simesma, voltada para o atendimento diádico privado, tem cada vez mais buscadoampliar seu campo <strong>de</strong> atuação e promover intervenções em múltiplas direções.4 Consi<strong>de</strong>rações FinaisEste trabalho compilou informações <strong>sobre</strong> características dos artigos,autoria dos mesmos e análise dos periódicos <strong>no</strong>s quais estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão<strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> são veiculados. A síntese <strong>de</strong> informações com esse caráter<strong>de</strong>scritor da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> país po<strong>de</strong> <strong>no</strong>s fornecer a dimensão doque seja a consolidação da Psicologia, 47 a<strong>no</strong>s após a sua regulamentação legal.Com consi<strong>de</strong>rável volume <strong>de</strong> documentos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong>psicólogo e <strong>sobre</strong> seus aspectos específi cos, o quantitativo <strong>de</strong> estudos analisados<strong>de</strong>monstra a preocupação dos pesquisadores da área em <strong>de</strong>senvolver refl exõesacerca das implicações da atuação profi ssional do psicólogo em âmbitos diversos,sob variadas condições <strong>de</strong> trabalho e realizando <strong>de</strong>terminadas ativida<strong>de</strong>s, combase em aportes teórico-técnicos <strong>de</strong>fi nidos, seja na aca<strong>de</strong>mia, seja na elaboração<strong>de</strong> protocolos <strong>no</strong>s próprios serviços.Esse boom <strong>de</strong> publicação científi ca <strong>sobre</strong> profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong>súltimos a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>riva não só da preocupação dos psicólogos em comunicarrefl exões teóricas <strong>sobre</strong> o tema, <strong>de</strong> informações científi cas <strong>sobre</strong> a atuaçãoprofi ssional do psicólogo ou da sistematização <strong>de</strong> práticas profi ssionais, mastambém das mudanças <strong>no</strong> mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> comunicação científi ca, <strong>no</strong> caso daPsicologia, amparada por um sistema editorial que se consolida cada vez mais,gerando uma re<strong>de</strong> entre pesquisadores, associações profi ssionais e socieda<strong>de</strong>scientífi cas, e mantenedores <strong>de</strong> bases <strong>de</strong> dados. O pa<strong>no</strong>rama <strong>de</strong> estudos <strong>sobre</strong>profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> refl ete, portanto, os avanços nessa estruturaçãoda área da Psicologia e <strong>de</strong> seus suportes comunicacionais.Também é preciso consi<strong>de</strong>rar o fato <strong>de</strong> que o periódico científi co é,primordialmente, um instrumento <strong>de</strong> comunicação <strong>no</strong> meio acadêmico, <strong>de</strong>


56 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>interlocução entre pesquisadores, o que acaba por imprimir ao material umcaráter pouco receptivo ao acesso do público exter<strong>no</strong>, sejam eles, como <strong>no</strong>presente caso, os informantes ou participantes da pesquisa, ou não.Há ainda algumas características <strong>de</strong> estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong>psicólogo levantadas nesta investigação que <strong>de</strong>vem ser <strong>de</strong>stacadas. Uma <strong>de</strong>las éa concentração <strong>de</strong>sses estudos em <strong>de</strong>terminadas subáreas da Psicologia, o queacaba por conferir a tais estudos características que são próprias da subárea 7 .Além disso, chama a atenção a concentração regional <strong>de</strong> estudos <strong>sobre</strong> a profi ssãodo psicólogo, por estado da fe<strong>de</strong>ração e por instituição <strong>de</strong> vínculo do autor,confi guradas <strong>de</strong> modo semelhante ao que ocorre na ciência brasileira como umtodo.Como a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo não é tema-chave dos pesquisadores,<strong>de</strong>ter-se em estudo <strong>sobre</strong> autoria dos documentos po<strong>de</strong> realçar a importânciadas instituições nas quais esses documentos são produzidos. Também é relevanteatentar para as características das instituições responsáveis por editorar artigos<strong>sobre</strong> profi ssão, como o <strong>de</strong>staque ganho pelas associações profi ssionais esocieda<strong>de</strong>s científi cas diante da comum editoria <strong>de</strong> periódicos científi cos por IES.Por fi m, verifi cou-se que é preciso resgatar e sistematizar as pesquisas<strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> país, haja vista que po<strong>de</strong> ser uma via paracontar a história recente da Psicologia como ciência e profi ssão. Manter essecircuito <strong>de</strong> comunicação <strong>de</strong> achados científi cos gera um clima <strong>de</strong> refl exão epermite a autoavaliação da Psicologia, <strong>de</strong>vido à importância dos mesmos paragarantir o <strong>de</strong>senvolvimento científi co e profi ssional na área.É preciso, além disso, atentar para os <strong>de</strong>mais públicos que po<strong>de</strong>riamusufruir dos resultados dos trabalhos científi cos, não só que articule oconhecimento teórico-prático – o que já é tentativa corrente <strong>no</strong>s estudosacadêmicos da área – como admita as refl exões profi ssionais dos psicólogos emserviço e amplie o alcance dos conhecimentos divulgados para que atinja a esse7 Por exemplo, nas subáreas nas quais, por suas características internas ou pelo estágio <strong>de</strong><strong>de</strong>senvolvimento em que encontram, têm os relatos <strong>de</strong> experiência como uma modalida<strong>de</strong><strong>de</strong> estudo muito frequente, os escritos <strong>sobre</strong> a profi ssão também recebem essa marca.


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos57mesmo público. Sendo o periódico científi co o canal primeiro <strong>de</strong> comunicaçãocientifi ca <strong>de</strong>ntro da aca<strong>de</strong>mia, é preciso ressaltar também a sua importânciapara o <strong>de</strong>senvolvimento da profi ssão. Válido é, outrossim, possibilitar modosdistintos <strong>de</strong> diálogo com os psicólogos que estão em campo, adotando padrõesdiversos <strong>de</strong> comunicação dos achados científi cos e provocando mudanças <strong>no</strong><strong>de</strong>senvolvimento da Psicologia, haja vista a interface possível entre aca<strong>de</strong>mia e<strong>de</strong>mais profi ssionais.ReferênciasAlbuquerque, F. J. B., & Arendt, R. (2003). A Psicologia Social e o <strong>Brasil</strong>. In O.H. Yamamoto & V. V. Gouveia (Orgs.), Construindo a Psicologia brasileira:<strong>de</strong>safi os da ciência e prática psicológica (pp. 185-212). São Paulo: Casa doPsicólogo.Antunes, M. A. M. (2007). A Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: leitura histórica <strong>sobre</strong> suaconstituição. São Paulo: EDUC.Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia. (2006, 19 <strong>de</strong>maio). Declaração <strong>de</strong> Florianópolis. XI Simpósio <strong>de</strong> Intercâmbio Científi coda Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia. Obtidoem 22 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2006, <strong>de</strong> http://www.bvs-psi.org.br/DeclFlor.pdfBastos, A. V. B., Maraschin, C., Tomanari, G. Y., An<strong>de</strong>ry, M. A. P. A., Gue<strong>de</strong>s, M. C.,Yamamoto, O. H., et al. (2008). Critérios do Qualis <strong>de</strong> periódicos – área daPsicologia. Obtido em 15 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2009, <strong>de</strong> http://www.anpepp.org.brBiojone, M. R. (2003). Os periódicos científi cos na comunicação da ciência. SãoPaulo: EDUC/FAPESP.Botomé, S. P. (1988). Em busca <strong>de</strong> perspectivas para a Psicologia como área<strong>de</strong> atuação e como campo profi ssional. In Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia(Org.), Quem é o psicólogo brasileiro? (pp. 273-297). São Paulo: Edicon.Campos, R. H. F. (1983). A função social do psicólogo. Educação & Socieda<strong>de</strong>,16, 74-84.Campos, R. H. F., & Bernar<strong>de</strong>s, L. H. G. (2005). A revista Psicologia: Ciência eProfi ssão: um registro da história recente da Psicologia brasileira. Psicologia:Ciência e Profi ssão, 25(4), 508-525.


58 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Carvalho, D. B., & Yamamoto, O. H. (1999). Psicologia e saú<strong>de</strong>: uma análise daestruturação <strong>de</strong> um <strong>no</strong>vo campo teórico-prático. Psico, 30(1), 5-28.Centro Lati<strong>no</strong>-America<strong>no</strong> e do Caribe <strong>de</strong> Informação em Ciências da Saú<strong>de</strong>/Biblioteca Regional <strong>de</strong> Medicina (BIREME). (2004). Critérios SciELO:critérios, política e procedimentos para a admissão e a permanência <strong>de</strong>periódicos científi cos na coleção SciELO. Obtido em 30 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2005,<strong>de</strong> http://www.scielo.org/in<strong>de</strong>x.php?lang=pt.Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. (1988). Quem é o psicólogo brasileiro? SãoPaulo: Edicon.Costa, A. L. F., & Yamamoto, O. H. (2008). Publicação e avaliação <strong>de</strong> periódicoscientífi cos: paradoxos da avaliação Qualis <strong>de</strong> Psicologia. Psicologia emEstudo, 13(1), 13-24.Cury, C. R. J. (2004). Graduação/Pós-graduação: a busca <strong>de</strong> uma relação virtuosa.Educação & Socieda<strong>de</strong>, 25(88), 777-793.Féres-Carneiro, T., & Lo Bianco. A. C. (2003). Psicologia Clínica: uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>em permanente construção. In O. H. Yamamoto & V. V. Gouveia (Orgs.),Construindo a Psicologia <strong>Brasil</strong>eira: <strong>de</strong>safi os da ciência e práticapsicológica (pp. 99-119). São Paulo: Casa do Psicólogo.Gue<strong>de</strong>s, M. C., Zan<strong>no</strong>n, C., & Luna, S. V. (1996). O cenário da publicaçãocientífi ca em Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. In Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicologia(Org.), Encontro <strong>de</strong> editores <strong>de</strong> Psicologia (p. 4). Ribeirão Preto: Autor.Marcon, C., Luna, I., & Lisboa, M. (2004). O psicólogo nas instituições hospitalares:características e <strong>de</strong>safi os. Psicologia: Ciência e Profi ssão, 24(1), 28-35.Meadows, A. J. (1999). A comunicação científi ca. Brasília: Briquet <strong>de</strong> Lemos/Livros.Mello, S. L. (1975). Psicologia e profi ssão em São Paulo. São Paulo: Ática.Meneghini, R. (1998). Avaliação da produção científi ca e Projeto SciELO. Ciênciada Informação, 27(2), 219-220.Mueller, S. P. M. (1999). O círculo vicioso que pren<strong>de</strong> os periódicos nacionais.DataGramaZero: Revista <strong>de</strong> Ciência da Informação, zero, Artigo 04. Obtidoem 11 <strong>de</strong> <strong>no</strong>vembro <strong>de</strong> 2003, <strong>de</strong> http://www.dgzero.org


Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: Análise da Produção Científi ca em Artigos59Oliveira, K. L., Cantalice, L. M., Joly, M. C. R. A., & Santos, A. A. A. (2006). Produçãocientífi ca <strong>de</strong> 10 a<strong>no</strong>s da Revista <strong>de</strong> Psicologia Escolar e Educacional. Revista<strong>de</strong> Psicologia Escolar e Educacional, 10(2), 283-292.Packer, A. L., Biojone, M. R., Antonio, I., Takenaka, R. M., García, A. P., Silva, A. C.,et al. (1998). SciELO: uma metodologia para publicação eletrônica. Ciênciada Informação, 27(2), 109-121. Obtido em 30 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2005, <strong>de</strong> http://www.scielo.br/pdf/ci/v27n2/scielo.pdfPereira, F. M., & Pereira Neto, A. (2003). O psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: <strong>no</strong>tas <strong>sobre</strong> seuprocesso <strong>de</strong> profi ssionalização. Psicologia em Estudo, 8(2), 19-27.Portugal, F. T. (2009). ABP: um pouco <strong>de</strong> história. Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong>Psicologia, 61(1), 194-195.Sabadini, A. A. Z. P., Sampaio, M. I. C., & Koller, S. H. (2009). Publicar emPsicologia. São Paulo: Casa do Psicólogo.Sampaio, M. I. C. (2001). Ata da primeira reunião do Comitê ConsultivoNacional da Biblioteca Virtual em Saú<strong>de</strong>. Obtido em 02 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong>2004, <strong>de</strong> http://www.bvs-psi.org.br/atas.htmSampaio, M. I. C. (2008). Citações a periódicos na produção científi ca <strong>de</strong>Psicologia. Psicologia: Ciência e Profi ssão, 28(3), 452-465.Sampaio, M. I. C., & Peixoto, M. L. (2000). Periódicos brasileiros <strong>de</strong> Psicologiain<strong>de</strong>xados nas bases <strong>de</strong> dados LILACS e PsycInfo. Boletim <strong>de</strong> Psicologia, 50,65-73.Sampaio. M. I. C., & Serradas, A. (2009). O Movimento <strong>de</strong> Acesso Aberto, osrepositórios e as revistas científi cas. In A. A. Z. P. Sabadini, M. I. C. Sampaio,& S. H. Koller (Orgs.), Publicar em Psicologia (pp. 77-89). São Paulo: Casado Psicólogo.Santos, L. I. C., Amorim, K. M. O., & Yamamoto, O. H. (2009, outubro). Estudos<strong>sobre</strong> produção do conhecimento em Psicologia [Resumo]. In Universida<strong>de</strong>Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Norte (Org.), XX Congresso <strong>de</strong> Iniciação Científi cada UFRN. Anais (p. 412). Natal: Autor.Soares, M. S. A. (Org.). (2002). A Educação Superior <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Brasília: InstitutoInternacional para a Educação Superior na América Latina e <strong>no</strong> Caribe(UNESCO).


60 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Souza Filho, M. L., Belo, R., & Gouveia, V. V. (2006). Testes psicológicos: análiseda produção científi ca brasileira <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 2000-2004. Psicologia:Ciência e Profi ssão, 26, 478-489.Tonetto, A. M., Amazarray, M. R., Koller, S. H., & Gomes, W. B. (2008). PsicologiaOrganizacional e do Trabalho <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: <strong>de</strong>senvolvimento científi cocontemporâneo. Psicologia & Socieda<strong>de</strong>, 20, 165-173.Vilan Filho, J. L., Souza, H. B., & Mueller, S. (2008). Artigos <strong>de</strong> periódicoscientífi cos das áreas <strong>de</strong> informação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: evolução da produção e daautoria múltipla. Perspectivas em Ciência da Informação, 13(2), 2-17.Witter, G. P. (2005). Pós-graduação em Psicologia na PUC-Campinas: dissertaçõese teses. Estudos <strong>de</strong> Psicologia (Campinas), 22(4), 365-370.Witter, G. P. (2007). Importância das socieda<strong>de</strong>s/associações científi cas:<strong>de</strong>senvolvimento da ciência e formação do profi ssional-pesquisador. Boletim<strong>de</strong> Psicologia, 57(126), 1-14.Yamamoto, O. H. (1987). A crise e as alternativas da Psicologia. São Paulo:Edicon.Yamamoto, O. H., Souza, C. C., & Yamamoto, M. E. (1999). A produção científi ca naPsicologia: uma análise dos periódicos brasileiros <strong>de</strong> 1990-1997. PsicologiaRefl exão e Crítica, 12, 549-565.


CAPÍTULO 3CARACTERIZAÇÃO DE DISSERTAÇÕES/TESES QUE VERSAM SOBRE A PROFISSÃO DEPSICÓLOGO NO BRASILPablo <strong>de</strong> Sousa SeixasFellipe Coelho-LimaAna Ludmila Freire CostaO Sistema Nacional <strong>de</strong> Pós-Graduação (SNPG), que começa a seestruturar a partir da segunda meta<strong>de</strong> dos a<strong>no</strong>s 1960, tem, como uma <strong>de</strong>suas consequências, a mudança do lócus da pesquisa para o interior dasuniversida<strong>de</strong>s e, mais especifi camente, para a pós-graduação. Com a centralida<strong>de</strong>da pesquisa estabelecida pelo III Pla<strong>no</strong> Nacional <strong>de</strong> Pós-Graduação, a produção<strong>de</strong> conhecimento passa a ser um aspecto chave tanto da avaliação dos Programas,quanto <strong>de</strong> sua própria estruturação interna.O estudo acerca do tratamento <strong>de</strong> temas específi cos <strong>no</strong> interior da pósgraduação,portanto, tem a potencialida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fornecer informações acerca nãosomente da importância que esses temas adquirem para a comunida<strong>de</strong> científi cada área, quanto indicações <strong>sobre</strong> o <strong>de</strong>senvolvimento do cuidado com o temapor parte <strong>de</strong>ssa comunida<strong>de</strong>. É essa a motivação principal para abordar, nestecapítulo, o tratamento dado aos estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo pelosprogramas <strong>de</strong> pós-graduação da área da Psicologia.


62 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>O capítulo é iniciado por uma breve introdução à estruturaçãoda pós-graduação <strong>no</strong> país, seguida <strong>de</strong> discussões a respeito <strong>de</strong>sse sistema,especifi camente na área <strong>de</strong> Psicologia, e apontamentos <strong>sobre</strong> a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>constante avaliação da produção científi ca para auxiliar o aprimoramento da área.Esse resgate teórico serve <strong>de</strong> subsídio para as análises <strong>de</strong>correntes da pesquisarealizada, expostas na sequência.1 O SNPG e a Psicologia1.1 Surgimento e <strong>de</strong>senvolvimento da pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> começou a <strong>de</strong>senvolver-se durantea implantação das primeiras universida<strong>de</strong>s brasileiras e por meio da construçãodo Estatuto das Universida<strong>de</strong>s <strong>Brasil</strong>eiras, tendo sido implementada, <strong>de</strong> formaincipiente, em meados da década <strong>de</strong> 1930.Durante os 30 a<strong>no</strong>s que se seguiram, a pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> foiobjeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>bates e intervenções acadêmicas e políticas. Na década <strong>de</strong> 1940,por exemplo, foi utilizado legalmente o termo “pós-graduação”, e nas décadas<strong>de</strong> 1950 e início <strong>de</strong> 1960 foram fi rmados acordos internacionais <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssasuniversida<strong>de</strong>s com instituições estrangeiras (seja <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> seja <strong>de</strong> fomento apesquisa) que permitiram criar diversos programas <strong>de</strong> pós-graduação, <strong>sobre</strong>tudo<strong>no</strong> campo das engenharias (Santos, 2003).Alguns acontecimentos levaram à criação <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo estruturado<strong>de</strong> pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, a saber: a consolidação das universida<strong>de</strong>s e apercepção da importância <strong>de</strong> uma política que pu<strong>de</strong>sse capacitar os docentes,como a criação da CAPES (Campanha <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> NívelSuperior) 1 ; a permissão da formação continuada <strong>de</strong> profi ssões especialistas e,1 A CAPES, quando criada em 1951, visava a capacitação <strong>de</strong> recursos huma<strong>no</strong>s nacionais paraacompanhar o <strong>de</strong>senvolvimento econômico-industrial pelo qual o <strong>Brasil</strong> passava <strong>no</strong> segundogover<strong>no</strong> <strong>de</strong> Getúlio Vargas.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>63principalmente, a urgência em produzir conhecimento científi co. Tais aspectosdominaram os <strong>de</strong>bates em cenário nacional, culminando, em 1965, com oparecer 977 2 do Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação.Esse mo<strong>de</strong>lo foi, então, implementado e estruturado pela reformauniversitária <strong>de</strong> 1968, marcando as políticas universitárias <strong>no</strong> país pela<strong>de</strong>pendência e parceria subordinada. De acordo com Santos (2003), essa parceriafoi feita, <strong>sobre</strong>tudo, com os Estados Unidos para a implantação <strong>de</strong> programas <strong>de</strong>pós-graduação <strong>no</strong> país com a capacitação, por meio <strong>de</strong> intercâmbio <strong>de</strong> docentesdas universida<strong>de</strong>s brasileiras para as americanas.Na década <strong>de</strong> 1970, a CAPES teve sua função consolidada e ampliada,passando do status <strong>de</strong> campanha para órgão governamental (Coor<strong>de</strong>nação<strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> Nível Superior) e tendo seu po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> açãomaximizado. Se antes estava mais preocupada com a capacitação <strong>de</strong> pessoal,voltou-se <strong>de</strong>pois para a produção <strong>de</strong> conhecimento científi co e a difusão da i<strong>de</strong>ia<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma ciência genuinamente brasileira, visando aten<strong>de</strong>r as<strong>de</strong>mandas regionais e específi cas <strong>de</strong> um país <strong>de</strong> terceiro mundo (CAPES, 2004;CAPES, n.d. a; Kuenzer & Moraes, 2005; MEC, 1975).Durante esse processo, consolidou-se <strong>no</strong> país o mo<strong>de</strong>lo <strong>no</strong>rte-america<strong>no</strong><strong>de</strong> pós-graduação 3 , que posteriormente sofreu alguns reajustes. Alguns autores(Bianchetti, 2005; Santos, 2003; Schwartzman, 2006) apontam como principaisalterações as avaliações inci<strong>de</strong>ntes <strong>sobre</strong> a titulação do discente, seguindo ospadrões europeus <strong>de</strong> alta exigência, principalmente através do sistema peerreview (a avaliação pelos próprios pares docentes), e da maior infl exibilida<strong>de</strong><strong>no</strong> manejo do sistema <strong>de</strong> formação na pós-graduação, sem levar em conta as<strong>de</strong>mandas regionais.2 Esse documento elaborado pelo Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação, em resposta a solicitaçãodo Ministério da Educação e Cultura, tem por objetivo <strong>de</strong>fi nir a natureza e os objetivos dapós-graduação brasileira.3 A pós-graduação americana tinha por característica a titulação em dois níveis in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes(mestrado e doutorado), os quais eram divididos em um período <strong>de</strong> aulas, quando o discenteera instruído em uma dada área <strong>de</strong> concentração do conhecimento, e um segundo, <strong>no</strong> qualse executaria uma pesquisa a fi m <strong>de</strong> obter a titulação.


64 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A pós-graduação stricto sensu possui, hoje, uma dupla função construídanesse percurso histórico: a) formação <strong>de</strong> corpo docente, pesquisadores eprofi ssionais qualifi cados para postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> alto nível (Botomé & Kubo,2002; Martins, 2000) e b) produção <strong>de</strong> conhecimentos científi cos (Martins, 1991,citado por Ferraro, 2005). Consi<strong>de</strong>rações recentes a respeito do papel da pósgraduaçãoatentam para o suporte que esta ofereceria à graduação, fornecendopessoal e conhecimentos para suprir a formação básica <strong>de</strong> profi ssionais <strong>de</strong> nívelsuperior ( Yamamoto, 2006).Tomando-se a criação da CAPES como marco fundamental nasistematização da pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, percebe-se em mais <strong>de</strong> cinquentaa<strong>no</strong>s <strong>de</strong> história um gran<strong>de</strong> crescimento quantitativo (em termos <strong>de</strong> capacitação/titulação) e qualitativo (consi<strong>de</strong>rando a produção científi ca gerada) impulsionado,principalmente, pelo advento dos Pla<strong>no</strong>s Nacionais <strong>de</strong> Pós-Graduação (PNPG) 4e sistematização da avaliação dos programas <strong>de</strong> pós-graduação 5 , conforme<strong>de</strong>stacado por Cury (2004).O crescimento contínuo, organizado e estruturado do sistema vemalcançando índices signifi cativos: em 1973 havia 3.500 mestres e 500 doutores<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> e em 2003 esse número saltou para 27.630 e 8.045, respectivamente.A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos recomendados (637, em 1976; 2.993, em 2004) e <strong>de</strong>alu<strong>no</strong>s matriculados (<strong>de</strong> 37.195 em 1987 para 112.314 em 2003) seguiu a mesmatendência. Atesta-se a tendência <strong>de</strong> expansão do sistema nacional contrastandoos 40% <strong>de</strong> doutores formados <strong>no</strong> estrangeiro na década <strong>de</strong> 1980 contra 20% nadécada <strong>de</strong> 1990. Marchelli (2005) compara o índice <strong>de</strong> titulação <strong>de</strong> doutores pormil habitantes do <strong>Brasil</strong> com diversos países – como EUA, Alemanha e Japão –e verifi ca a impressionante taxa <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> aproximadamente 15% naúltima década, o maior entre os países comparados.4 Criado em 1975, os PNPG são diretrizes gerais formuladas pela CAPES que estabelecemmetas e objetivos voltados a <strong>no</strong>rtear a ação <strong>no</strong> setor. Atualmente, estamos sob a regência doPNPG 2005-2010.5 A avaliação dos programas <strong>de</strong> pós-graduação foi implantada pela CAPES em 1976, como objetivo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntifi car <strong>de</strong>fi ciências nas instituições a partir <strong>de</strong> critérios preestabelecidos,servindo esse diagnóstico como fundamento para a elaboração <strong>de</strong> políticas voltadas para amelhoria dos programas.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>65Olhando mais <strong>de</strong> perto a realida<strong>de</strong> nacional, po<strong>de</strong>-se encontrarassimetrias importantes para a compreensão da conformação do campo. É <strong>no</strong>tórioque em todo o processo histórico <strong>de</strong> consolidação da pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>ocorreu maciçamente uma concentração, em todos os períodos, <strong>de</strong>ssa formação<strong>no</strong> Su<strong>de</strong>ste (CAPES, 2004; Cury, 2004). Mesmo com os avanços da ReformaUniversitária que propôs a criação <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>s fe<strong>de</strong>rais e programas <strong>de</strong>pós-graduação em todas as regiões do país, ainda é larga a diferença entre elas,havendo centralização não só em regiões específi cas, mas também em algumasinstituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior, como a USP 6 .1.2 A pós-graduação na área <strong>de</strong> PsicologiaA maior parte dos cursos pioneiros <strong>de</strong> pós-graduação pertencia àschamadas hard sciences (ciências exatas – engenharias e algumas ciênciasnaturais). Diferentemente <strong>de</strong> alguns cursos das ciências humanas, em 1966foi criado, na Psicologia, o primeiro programa <strong>de</strong> pós-graduação, <strong>no</strong> nível <strong>de</strong>mestrado <strong>no</strong> país, na PUC-RJ, na área da Psicologia Clínica 7 , e o primeiro curso<strong>de</strong> doutorado em 1974, na USP, nas áreas <strong>de</strong> Psicologia Experimental e PsicologiaEscolar.Foi em março <strong>de</strong> 1966 que o Departamento <strong>de</strong> Psicologia da PUC-Rio implantou o primeiro Curso <strong>de</strong> Mestrado em Psicologia do país, sob aCoor<strong>de</strong>nação do Padre Antonius Benko. A primeira dissertação <strong>de</strong> mestrado naárea da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, intitulada “Homeostase psíquica e agradabilida<strong>de</strong>”,foi <strong>de</strong>fendida <strong>no</strong> dia 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1968, por Leonel Correa Pinto, sob aorientação do professor Carlos Paes <strong>de</strong> Barros (Féres-Carneiro, 2007, p. 218).6 Em 2000, 6 em cada 10 doutores eram formados <strong>no</strong> estado <strong>de</strong> São Paulo e apenas a USP foiresponsável por 37% <strong>de</strong> todos os diplomas <strong>de</strong> doutorado expedidos <strong>no</strong> país.7 Apesar <strong>de</strong> possuir o título <strong>de</strong> pioneira em pós-graduação em Psicologia <strong>no</strong> país, a PUC-RJ,em função <strong>de</strong> alguns confl itos inter<strong>no</strong>s e problemas na organização <strong>de</strong> seu programa, sóinaugurou o doutorado <strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1985 (Féres-Carneiro, 2007) <strong>de</strong>vido, principalmente, àdifi culda<strong>de</strong> <strong>de</strong> estruturação <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> doutorado.


66 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Des<strong>de</strong> então, houve uma expansão consi<strong>de</strong>rável dos programas <strong>de</strong> pósgraduaçãoem Psicologia que, com alguns percalços, seguiu os rumos da já citadaexpansão das pós-graduações <strong>no</strong> país como um todo, como atesta a Figura 1.Figura 1. Distribuição dos cursos <strong>de</strong> pós-graduação em Psicologia <strong>no</strong> país ao longo <strong>de</strong> quatrodécadas. Fonte: Capes, n.d. a.70605040302010060DoutoradoMestrado3627131614412196601976 1986 1996 2008É <strong>no</strong>tório o pareamento entre as expansões em cada década e aconstrução dos PNPG, contudo, <strong>de</strong>ve-se ter <strong>no</strong> horizonte que estes últimos nãopo<strong>de</strong>m ser tomados como elementos explicativos para o primeiro fenôme<strong>no</strong>.Além disso, entre as ciências humanas (Gran<strong>de</strong> área da CAPES naqual a Psicologia está inserida), a referida área ocupa hoje o segundo lugar emquantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, o que atesta sua posição<strong>de</strong> <strong>de</strong>staque em produção do conhecimento <strong>no</strong> país, tendo hoje um total <strong>de</strong> 64cursos <strong>de</strong> pós-graduação stricto sensu cre<strong>de</strong>nciados pelo MEC, sendo 23 apenas<strong>no</strong> nível <strong>de</strong> mestrado, uma apenas <strong>no</strong> nível <strong>de</strong> doutorado e 40 contendo os níveis<strong>de</strong> mestrado e doutorado.Para ressaltar ainda mais essa crescente ampliação dos programas <strong>de</strong>pós-graduação em Psicologia, a apresentação <strong>de</strong> alguns dados se faz necessária.Segundo levantamento realizado por Borges-Andra<strong>de</strong> e Menandro (2002), o total<strong>de</strong> docentes atuando na pós-graduação em Psicologia merece ser consi<strong>de</strong>rado: <strong>de</strong>


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>67455, em 1996, para 586, em 2000, o equivalente a um aumento <strong>de</strong> 29%. Somemsea isso os dados referentes à classe discente: o quadro <strong>de</strong> alu<strong>no</strong>s <strong>de</strong> mestradoé acrescido a cada a<strong>no</strong>, em média 29%, e <strong>de</strong> doutorado, 27%. A evolução daquantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> titulados é bastante reveladora <strong>de</strong>ssa expansão: a taxa média <strong>de</strong>crescimento <strong>de</strong> titulados (<strong>no</strong> período compreendido entre 1996 e 2000) foi <strong>de</strong>22% e <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 1996 a 2000 formaram-se 2414 mestres e doutores.1.3 Avaliação da produção científica como aprimoramento para aPsicologiaÉ fato, então, que a comunida<strong>de</strong> acadêmica <strong>de</strong> Psicologia encontra-seem expansão. Tal questão tem <strong>de</strong>spertado, entre outras necessida<strong>de</strong>s, para aavaliação <strong>de</strong>sses programas e <strong>de</strong> toda a produção científi ca oriunda dos mesmos,visando, <strong>sobre</strong>tudo, estabelecer um padrão <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> compatível com oseu papel <strong>de</strong> formação profi ssional e disseminação científi ca ( Yamamoto &Menandro, 2004).Na verda<strong>de</strong>, apesar <strong>de</strong> a avaliação dos programas <strong>de</strong> pós-graduaçãoser feita pela CAPES <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1976, esta ganhou ainda maior consistência com acriação e utilização <strong>de</strong> uma base <strong>de</strong> dados (Qualis), a partir <strong>de</strong> 1998, que registraa classifi cação dos periódicos <strong>no</strong>s quais a produção dos docentes e discentes<strong>de</strong> cada programa é publicada. Segundo Paula (2002), o Qualis, ao qualifi caros programas <strong>de</strong> pós-graduação pela sua produção científi ca, busca auxiliar naelaboração <strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong> política científi ca, ainda hoje uma gran<strong>de</strong> difi culda<strong>de</strong>que existe <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.É importante que se tenha clareza <strong>de</strong> que a obtenção <strong>de</strong> informaçõesúteis em termos <strong>de</strong> sociologia da ciência <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> possibilita, entre outras ações,a criação <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> gestão científi ca e isso po<strong>de</strong> ser feito ao se conhecera produção acadêmico-científi ca em um contexto amplo, por meio <strong>de</strong> índicesbibliométricos 8 , por exemplo.8 A bibliometria, por meio <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los matemáticos, objetiva medir os processos <strong>de</strong>produção, disseminação e consumo <strong>de</strong> informações, gerando dados estatísticos para elaborarprevisões e apoiar tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões. Assim, é possível observar o estado da ciência e datec<strong>no</strong>logia através da literatura científi ca e subsidiar as políticas <strong>de</strong> fomento a pesquisas(Macias-Chapula, 1998).


68 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Dessa forma, é preciso i<strong>de</strong>ntifi car um conjunto <strong>de</strong> aspectos, taiscomo: quem está produzindo a literatura científi ca, a distribuição geográfi ca einstitucional dos pesquisadores, on<strong>de</strong> estão disponibilizadas as dissertações eteses, como se dá a dinâmica <strong>de</strong> circulação das informações e quais as temáticasdos trabalhos acadêmicos. Assim, a partir <strong>de</strong> uma massa crítica <strong>de</strong> dados, se tornapossível conhecer a pós-graduação brasileira <strong>de</strong> Psicologia e tomar <strong>de</strong>cisõesfundamentadas e arbitradas.Em um breve levantamento, percebe-se que há algumas iniciativas<strong>de</strong> estudos nesse sentido, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> pesquisas que objetivam a caracterização <strong>de</strong><strong>de</strong>terminados programas <strong>de</strong> pós-graduação em Psicologia (Carvalho, 1999;Carvalho 2001; Granja, 1995; Witter, 2005), até material que trata <strong>sobre</strong> avaliações<strong>de</strong>sses programas da área (Borges-Andra<strong>de</strong>, 2001; Macedo & Menandro, 1998;Weber, 2003; Yamamoto & Menandro, 2004).Além das possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> reunir dados signifi cativos <strong>sobre</strong> aconfi guração dos mestrados e doutorados <strong>de</strong> Psicologia, situam-se tambémas análises <strong>sobre</strong> a recorrência <strong>de</strong> um tema específi co nas dissertações e teses(como por exemplo, em Carelli, 2002; Domingos, 1999; Noronha, Andra<strong>de</strong> &Miguel, 2006). Nesses casos, busca-se não só observar características do sistema<strong>de</strong> pós-graduação, mas principalmente como <strong>de</strong>terminado assunto é abordadopelas produções acadêmicas, quem são os pesquisadores envolvidos, qual éa distribuição temporal e local dos trabalhos e as instituições e cursos que seenvolvem com a temática em questão.Dentre os assuntos abordados pelos pesquisadores <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, encontrasea “atuação profi ssional do psicólogo” em suas diferentes facetas. O tema temsido alvo <strong>de</strong> diversos estudos ao longo dos a<strong>no</strong>s, <strong>de</strong>stacando-se as publicaçõesdo Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia (CFP) que, com algumas exceções, fi guramentre os escritos mais importantes <strong>sobre</strong> o assunto, se não em profundida<strong>de</strong>, emabrangência dos dados e alcance dos resultados (CFP, 1988; 1992; 1994; 2001).Os dados divulgados falam <strong>de</strong> um pa<strong>no</strong>rama geral da profi ssão, <strong>de</strong> aspectosligados a condições <strong>de</strong> trabalho, avaliação da formação e sua prática profi ssional.De forma esparsa, alguns <strong>de</strong>sses temas foram abordados em outraspesquisas, por vezes com recortes mais diversos, seja por região, por subaspectoda atuação profi ssional, por público-alvo ou por alcance (como em Dimenstein,1998; Yamamoto et al, 2003; Yamamoto & Cunha, 1998; Zanelli, 1995). No entanto,


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>69não se tem i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> qual seja a dimensão <strong>de</strong>sse conjunto <strong>de</strong> pesquisadores, queaparentam não possuir i<strong>de</strong>ntifi cação mútua, uma vez que o fenôme<strong>no</strong> possuiinúmeras expressões, impedindo um sentido <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>. Percebe-se que,mesmo com a importância e relevância dos estudos <strong>sobre</strong> a profi ssão, não há <strong>no</strong><strong>Brasil</strong> um levantamento <strong>sobre</strong> a quantida<strong>de</strong> dos estudos, os temas que abordam,abrangência, métodos utilizados, nem qual a participação <strong>de</strong>les nas linhas <strong>de</strong>pesquisa (se é um tema aci<strong>de</strong>ntal ou recorrente, por exemplo).No caso, o presente capítulo visa apresentar a produção que se tem<strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> por meio <strong>de</strong> dissertações e teses. Assim,a análise do material oriundo dos programas <strong>de</strong> pós-graduação permite não só apromoção <strong>de</strong> dados a respeito do sistema que engloba mestrados e doutorados,mas também informa <strong>sobre</strong> a discussão que a aca<strong>de</strong>mia tem feito em tor<strong>no</strong> dotema.2 A produção <strong>sobre</strong> a profissão <strong>no</strong>s programas <strong>de</strong> pós-graduação da áreada PsicologiaComo ponto <strong>de</strong> partida para as análises a serem <strong>de</strong>senvolvidas nestecapítulo, é importante especifi car o conjunto <strong>de</strong> documentos aqui tratados. Foiobtido na coleta um total <strong>de</strong> 323 dissertações (correspon<strong>de</strong>nte a 79,6%) e 83teses (que forma 20,4% do grupo).Percebe-se, a partir <strong>de</strong>sses dados, que há uma proporção aproximada <strong>de</strong>quatro dissertações para uma tese, quadro que encontra raízes <strong>no</strong> modo comoocorreu o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da pós-graduação na América Latina,centrada majoritariamente <strong>no</strong>s programas <strong>de</strong> mestrado 9 .9 Santos (2003) refl ete a respeito <strong>de</strong>ssa confi guração, apontando que, por muito tempo, acriação <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> doutorado <strong>no</strong>s países periféricos era impraticável, tendo em vistao quão dispendiosos tais programas eram (e ainda são). Desse modo, a produção na pósgraduaçãopor um longo período foi atrelada exclusivamente ao mestrado, tendo estes umcaráter mais rigoroso quanto ao processo <strong>de</strong> avaliação para a titulação, e visavam projetos<strong>de</strong> maiores proporções, na tentativa <strong>de</strong> suprir a <strong>de</strong>fi ciência <strong>de</strong> conhecimentos nesses países.


70 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tendo esse primeiro apontamento em vista, passa-se a uma análise maisacurada <strong>sobre</strong> a produção acadêmica a respeito da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong>país.O primeiro bloco <strong>de</strong> resultados traz dados <strong>sobre</strong> os locais on<strong>de</strong> se realizamtais trabalhos e nele são avaliados a natureza das IES, a área dos programas <strong>de</strong>pós-graduação e o fi nanciamento dos trabalhos. O segundo conjunto <strong>de</strong> análisesrefere-se aos documentos propriamente ditos e discute a distribuição temporal egeográfi ca/institucional, a questão dos professores orientadores e a classifi caçãodas dissertações e teses quanto às áreas da Psicologia.2.1 Contexto <strong>de</strong> produção das dissertações e tesesAs instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior on<strong>de</strong> se produz dissertações e teses<strong>sobre</strong> o tema po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>radas centrais <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>ssestrabalhos.A Figura 2 introduz elementos que caracterizam a natureza <strong>de</strong>ssasinstituições, apontando uma alta participação das IES públicas (em sua maioriauniversida<strong>de</strong>s fe<strong>de</strong>rais e estaduais), que contribuem com pouco mais da meta<strong>de</strong><strong>de</strong>ssas produções (56,7% em dissertações e 56,6%, em teses). Em seguida, asIES confessionais (em sua maioria representada pelas Pontifícias Universida<strong>de</strong>sCatólicas – PUCs) fi cam responsáveis por 37,5% (para dissertações) e 43,4%(para teses), e as IES privadas somente participam da produção <strong>no</strong> âmbito dasdissertações (5,9%).Esses dados relacionam-se com o lugar das IES privadas <strong>de</strong>ntro dosistema <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior brasileiro: elas são as instituições que mais formamprofi ssionais em cursos superiores, mas, em contrapartida, são as que me<strong>no</strong>sinvestem em pesquisas e programas <strong>de</strong> pós-graduação stricto sensu, fi cando talativida<strong>de</strong> a cargo do po<strong>de</strong>r público (Martins, 2000). Sendo assim, não se tornainédita a informação <strong>de</strong> que na temática referente à profi ssão há uma escassez <strong>de</strong>investimento da iniciativa privada nessa produção.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>71Figura 2. Quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> documentos pela natureza da IES.Outro elemento importante que se inclui <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> caracterizaçãosão os programas <strong>de</strong> pós-graduação (PPG) 10 <strong>no</strong>s quais são produzidos, observandoseu arranjo quanto a área <strong>de</strong> produção do conhecimento.A partir da Figura 3, <strong>no</strong>ta-se que mesmo a maioria das produções <strong>de</strong>dissertações (70,75%) e teses (78%) terem sido feitas <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> PPG <strong>de</strong> Psicologia(seja tendo como área a Psicologia ou algumas <strong>de</strong> suas subáreas, como a PsicologiaEscolar e da Educação), ainda encontramos uma participação consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong>PPG <strong>de</strong> outras áreas.Analisando a fatia relacionada aos programas <strong>de</strong> pós-graduaçãoexteriores à Psicologia, a área da Educação <strong>de</strong>sponta como a que mais contribuipara a produção tanto <strong>de</strong> dissertações (46) como <strong>de</strong> teses (9) <strong>sobre</strong> a profi ssão<strong>de</strong> psicólogo. As <strong>de</strong>mais apresentam algumas produções esparsas, como é ocaso da Saú<strong>de</strong> Pública/Coletiva, com 14 produções (11 dissertações e 3 teses),Administração (4 dissertações e nenhuma tese) e Educação Física (com os mesmovalores que última área).10 Nos dados referentes aos Programas <strong>de</strong> Pós-Graduação aos quais as dissertações e tesesestavam atreladas, são contabilizadas 318 dissertações (das 323 totais) e 82 teses (das 83totais), tendo em vista não ter sido possível encontrar o vínculo com o PPG das <strong>de</strong>mais.


72 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Ainda é possível i<strong>de</strong>ntifi car diversos trabalhos (27 dissertações e 4teses) que foram produzidos em programas das mais diversas áreas (todos essesPPG produzindo somente um <strong>de</strong>sses materiais). Tal quadro corrobora com aafi rmação <strong>de</strong> que a participação das outras áreas, excetuando-se a Educação, nãoé sistemática.Figura 3. Área dos programas <strong>de</strong> pós-graduação.Acrescentando outro dado que auxilia na caracterização dosprogramas <strong>de</strong> pós-graduação <strong>no</strong>s quais os trabalhos foram produzimos, atentesepara o fi nanciamento 11 existente <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> produção da dissertaçãoe/ou tese 12 .A situação quanto à distribuição <strong>de</strong> bolsas é bastante otimista, tendoem vista que aproximadamente a meta<strong>de</strong> dos autores das dissertações e mais dameta<strong>de</strong> dos <strong>de</strong> teses possuíram fi nanciamento.11 Cabe salientar que, <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, a concessão <strong>de</strong> bolsas <strong>de</strong> mestrado ou doutorado é feitapara os PPG prioritariamente, sendo raros os casos <strong>de</strong> concessão direta a um <strong>de</strong>terminadodiscente. Sendo assim, é <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes realizarem a melhor administração/distribuição das bolsas seguindo orientações gerais dos órgãos fomentadores e <strong>de</strong> regrascriadas <strong>no</strong> interior dos próprios programas.12 Como fi nanciamento, consi<strong>de</strong>rou-se a presença <strong>de</strong> bolsa <strong>de</strong> pesquisa diretamente para osmestrandos ou doutorandos.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>73Atentando para a distribuição regional exposta na mesma Figura 4,percebe-se uma correspondência na proporção dos dados <strong>de</strong>sta com os <strong>de</strong>maisreferentes às distribuições regionais <strong>de</strong> trabalhos, <strong>de</strong> IES e <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> pósgraduação.Sendo assim, o Su<strong>de</strong>ste <strong>de</strong>tém quase 70% <strong>de</strong> todas as cotas <strong>de</strong> bolsas<strong>de</strong> mestrados concedidas e 90% das <strong>de</strong>stinadas aos programas <strong>de</strong> doutorado.Essa situação refl ete, diretamente, a confi guração nacional <strong>de</strong>distribuição <strong>de</strong> cotas <strong>de</strong> bolsas <strong>de</strong> pesquisa para programas <strong>de</strong> mestrado edoutorado, on<strong>de</strong> se encontra um abismo na quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> verbas para ambos ostipos <strong>de</strong> modalida<strong>de</strong>s, se compararmos a região Su<strong>de</strong>ste com as <strong>de</strong>mais (CAPES,n.d. b) (Figura 4).Figura 4. Quantida<strong>de</strong> e distribuição regional <strong>de</strong> financiamentos <strong>de</strong> dissertações e teses.Cabe acrescentar ainda que as principais fi nanciadoras <strong>de</strong>sses trabalhossão a CAPES (participando <strong>de</strong> 64% do número total <strong>de</strong> bolsas conferidas) e oCNPq (com 31%).Ainda foi possível encontrar dissertações e teses (5%) que possuíamoutras agências fi nanciadoras: Fundação Porticus, Fundação <strong>de</strong> Amparo à Pesquisado Estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro (FAPERJ), Fundação <strong>de</strong> Amparo à Pesquisa do Estado<strong>de</strong> São Paulo (FAPESP), Fundação Cearense <strong>de</strong> Apoio ao DesenvolvimentoCientífi co e Tec<strong>no</strong>lógico (FUNCAP); além do fi nanciamento inter<strong>no</strong> da própria


74 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>instituição, <strong>no</strong> caso da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, da Universida<strong>de</strong> Metodista <strong>de</strong>São Paulo e da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> Campinas (PUC-Campinas).O percurso <strong>de</strong> caracterização até aqui traçado focou os âmbitosinstitucionais on<strong>de</strong> se produz dissertações e teses a respeito da profi ssão <strong>de</strong>psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. As análises a seguir abordarão algumas características <strong>de</strong>ssesdocumentos.2.2 Análise das dissertações e teses <strong>sobre</strong> a profissão <strong>de</strong> psicólogo<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Inicialmente, será abordada a distribuição temporal das dissertações eteses coletadas na pesquisa (Figura 5):Figura 5. Distribuição em faixas <strong>de</strong> cinco a<strong>no</strong>s das dissertações e teses.A Figura 5 expressa uma tendência, a partir do fi nal da década <strong>de</strong> 1980,<strong>de</strong> crescimento na produção <strong>de</strong> dissertações e teses <strong>sobre</strong> o assunto referido,culminando em uma expressiva acumulação <strong>no</strong> início do século XXI, para ambosos tipos <strong>de</strong> produções (dissertações com 42,7% e teses com 38,6%). É importante


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>75atentar para o fato <strong>de</strong> que esse crescimento expressivo <strong>no</strong>s últimos a<strong>no</strong>s nãoé exclusivo da temática em questão, nem da própria Psicologia, mas da pósgraduaçãobrasileira.No início da década <strong>de</strong> 1990, a CAPES, principal órgão fi nanciador dapós-graduação <strong>no</strong> país (ao lado do CNPq), voltou suas políticas <strong>de</strong> ação paraa produção <strong>de</strong> conhecimento na pós-graduação, o que impulsio<strong>no</strong>u tanto aquantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> titulações por programas, como a própria quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> programas<strong>no</strong> país. Assim, a CAPES atesta um crescimento consi<strong>de</strong>rável nas últimas décadastanto da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> pós-graduação stricto sensu como <strong>de</strong> alu<strong>no</strong>stitulados <strong>no</strong>s mesmos: houve um acréscimo <strong>de</strong> aproximadamente cinco vezes<strong>no</strong> número <strong>de</strong> mestres titulados em 2003, em comparação com 1990, e umacréscimo superior a seis vezes para a titulação <strong>de</strong> doutores; além <strong>de</strong> ter sidoduplicada a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> mestrado e doutorado entre 1990 e 2004(CAPES, 2004).Comparando esses dados com o Relatório produzido pela CAPES, <strong>no</strong>a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 2001, referente à quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> titulações na área <strong>de</strong> Psicologia, <strong>de</strong>ntrodo período <strong>de</strong> 1996 a 2000 13 , po<strong>de</strong>mos perceber que há uma certa contiguida<strong>de</strong><strong>no</strong> crescimento total <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sse período do Relatório: enquanto na área <strong>de</strong>Psicologia cresceu, em média, 64% na produção <strong>de</strong> mestrados e 69% em teses,para a produção específi ca a respeito da profi ssão, <strong>no</strong>tamos um crescimento <strong>de</strong>63% e <strong>de</strong> 65% respectivamente, <strong>de</strong>ntro do período.Esse alinhamento <strong>no</strong>s índices <strong>de</strong> crescimento po<strong>de</strong> ser refl exo <strong>de</strong> umapreocupação por parte da aca<strong>de</strong>mia – e daqueles que compõem o processoprodutivo <strong>de</strong> conhecimento <strong>de</strong>ntro dos programas <strong>de</strong> pós-graduação – quantoà profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> país, haja vista que o crescimento da produção <strong>de</strong>dissertações e teses a respeito do tema acompanha a produção <strong>de</strong>ntro da área <strong>de</strong>Psicologia como um todo, não estando focalizada em somente um período, masapresentando uma parida<strong>de</strong> <strong>no</strong> crescimento ao longo do período em questão.13 Nesse momento, são contabilizadas somente as produções realizadas <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> programas<strong>de</strong> pós-graduação em Psicologia.


76 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Outro ponto <strong>de</strong> análise importante refere-se à proporção entre aquantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dissertações e a <strong>de</strong> teses. Resgatando dados já expostos <strong>no</strong>começo <strong>de</strong>ssa seção, a relação é <strong>de</strong> quatro dissertações para cada tese, havendopredominância <strong>de</strong>sse quadro ao longo dos tempos. Velloso (2004) constata queas áreas <strong>de</strong> formação <strong>de</strong><strong>no</strong>minadas profi ssionais (incluindo nessa categoria aPsicologia) possuem me<strong>no</strong>r índice <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> na carreira acadêmica, ouseja, os discentes formam-se mestres, mas não continuam sua formação ouatuação <strong>de</strong>ntro do campo da pesquisa e/ou docência.Um dos possíveis caminhos <strong>de</strong> análise para essa situação refere-se ao fato<strong>de</strong> que estes provêm do mercado exterior à aca<strong>de</strong>mia, buscando na obtenção <strong>de</strong>um grau <strong>de</strong> formação mais elevado a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> angariar melhores postos<strong>de</strong> trabalhos. Desse modo os egressos <strong>de</strong>sses cursos <strong>de</strong> pós-graduação não dãocontinuida<strong>de</strong> à carreira acadêmica já que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o princípio, a sua intenção nãofora essa. Por sua vez, estando os discentes preocupados com o mercado <strong>de</strong>trabalho, mais facilmente buscam discussões que se alinhem com seus campos<strong>de</strong> atuação, o que po<strong>de</strong>ria incitar trabalhos voltados para a questão da profi ssão<strong>de</strong> psicólogo.Outro ponto importante <strong>de</strong> discussão a partir da Figura 5 é o boom <strong>de</strong>produções (tanto <strong>de</strong> dissertações como <strong>de</strong> teses) <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 2002 a 2006, comvistas à continuida<strong>de</strong> <strong>no</strong> período seguinte. Vale salientar que este crescimento épareado com a pós-graduação como um todo: <strong>no</strong> documento referente ao PNPG2005-2010, a CAPES aponta para um <strong>de</strong>senvolvimento consi<strong>de</strong>rável nas últimasdécadas tanto da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> pós-graduação stricto sensu como <strong>de</strong>alu<strong>no</strong>s titulados <strong>no</strong>s mesmos com uma taxa <strong>de</strong> crescimento entre 1990 e 2003 <strong>de</strong>12,9% ao a<strong>no</strong> para o mestrado e 15,1% para doutorado.Partindo para a distribuição geográfi ca da produção, po<strong>de</strong>-se <strong>no</strong>tarcomo está estruturada a produção a respeito do tema <strong>no</strong> país.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>77Figura 6. Distribuição da produção por região e estados com maior índice <strong>de</strong> produção.Fica explícita na Figura 6 a hegemonia da região Su<strong>de</strong>ste <strong>sobre</strong> as<strong>de</strong>mais, chegando a aproximadamente 50% <strong>de</strong> diferença entre esta região e asegunda colocada (a região Sul) na produção <strong>de</strong> dissertações, e <strong>de</strong> 80% comrelação às teses, em comparação com a região Nor<strong>de</strong>ste (segunda na produção<strong>de</strong>sse último tipo <strong>de</strong> documento).Analisando mais <strong>de</strong>talhadamente a referida fi gura, com relação àsdissertações percebe-se que as regiões Nor<strong>de</strong>ste e Sul apresentam certa igualda<strong>de</strong>,enquanto as regiões Centro-Oeste e Norte apresentam um me<strong>no</strong>r volume <strong>de</strong>produção <strong>sobre</strong> o tema. Essa situação segue a mesma confi guração do cenário


78 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>nacional, na qual a região Su<strong>de</strong>ste apresenta maior concentração <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong>mestrado <strong>no</strong> país, seguida da região Sul, Nor<strong>de</strong>ste, Centro-Oeste e Norte (CAPES,2004).Já com relação às teses, a produção é ainda mais centralizada, já que aregião Su<strong>de</strong>ste produziu 73 teses, enquanto as <strong>de</strong>mais regiões variam entre duase cinco produções. Em ambas as seções, o Norte apresenta uma participaçãomínima <strong>no</strong> grupo <strong>de</strong> documentos coletados, fenôme<strong>no</strong> este compreendido pelofato <strong>de</strong> a região não possuir nem tradição, nem infraestrutura (instituições <strong>de</strong>ensi<strong>no</strong> superior e programas <strong>de</strong> pós-graduação) para pesquisa <strong>de</strong> um modo geral(CAPES, n.d. b).Ainda tendo como foco a Figura 6, que <strong>no</strong>s revela os <strong>de</strong>z estados quemais produzem dissertações e teses <strong>no</strong> tema, <strong>no</strong>tamos que São Paulo constituisecomo gran<strong>de</strong> polo produtor <strong>de</strong> dissertações e teses <strong>sobre</strong> essa temática emâmbito nacional, sendo responsável por, aproximadamente, 50% e 80% <strong>de</strong> todosos trabalhos, respectivamente. Esse dado ganha mais força quando comparadocom a situação do Rio <strong>de</strong> Janeiro, estado que segue em segundo lugar <strong>no</strong> rankingdas produções: este participa com 9,6% da produção <strong>de</strong> dissertações e 8,4% dasteses. Assim, a diferença entre o primeiro estado (São Paulo) e o segundo (Rio <strong>de</strong>Janeiro) é <strong>de</strong> quase 40% para a produção <strong>de</strong> dissertações e <strong>de</strong> 71,1% para teses.Com isso, <strong>de</strong>staca-se que não se po<strong>de</strong> atribuir a concentração daprodução acadêmica relacionada a esse tema à região Su<strong>de</strong>ste como um todo,mas sim ao estado <strong>de</strong> São Paulo especifi camente, pois tanto Rio <strong>de</strong> Janeiro,Espírito Santo e Minas Gerais não apresentam índices tão diferenciados dos<strong>de</strong>mais estados das outras regiões. Excetuando-se São Paulo e Rio <strong>de</strong> Janeiro,percebe-se uma diminuição gradativa e linear na produção, ao passo em que seobserva os <strong>de</strong>mais estados que produziram <strong>sobre</strong> o tema. Ou seja, até então, nãose po<strong>de</strong> concluir que há concentração específi ca por região, mas sim por estadoda fe<strong>de</strong>ração.Em uma análise ainda mais acurada, percebe-se que a concentração emum nível mais amplo (como regional ou estadual) é perpassada por elementosmais específi cos, na medida em que se observa a produção segundo os níveisinstitucionais. Po<strong>de</strong>-se atentar, com os dados da Figura 7, que são <strong>de</strong>terminadas


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>79IES as responsáveis por quase toda a produção <strong>de</strong> cada estado da fe<strong>de</strong>ração,sendo tamanho o volume <strong>de</strong> sua produção que repercute <strong>no</strong>s índices regionais<strong>de</strong> produção.Desse modo, i<strong>de</strong>ntifi ca-se a Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo(PUC-SP) e a Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (USP) como os dois polos nacionais <strong>de</strong>produção <strong>no</strong> tema. Estas, tanto são gran<strong>de</strong>s centros <strong>de</strong> produção em sua região– ambas com aproximadamente 23% da produção do Su<strong>de</strong>ste em dissertações,e, para teses, 31,5% e 32,9%, respectivamente – como em dimensão nacional:somadas são responsáveis por 30,4% da produção <strong>de</strong> dissertações <strong>no</strong> tema e maisda meta<strong>de</strong> das produções <strong>de</strong> teses, com 57,6%.Figura 7. Ranking das Instituições <strong>de</strong> Ensi<strong>no</strong> Superior em quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhos acadêmicos<strong>sobre</strong> a profissão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.


80 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Esse dado po<strong>de</strong> ser compreendido levando em conta o tempo <strong>de</strong>ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisa nessas universida<strong>de</strong>s, bem como a sua infraestruturafísica, econômica e <strong>de</strong> corpo docente. Ambas as instituições são referênciasnacionais em pesquisa e pós-graduação <strong>de</strong> modo geral, ou seja, o <strong>de</strong>sempenho<strong>de</strong>ssas instituições não é específi co da produção a respeito <strong>de</strong>ssa temática, mas,em si, são gran<strong>de</strong>s centros <strong>de</strong> pesquisa. Assim, ao se comparar a quantida<strong>de</strong><strong>de</strong> produção por região, estado ou instituição se está muito mais confrontandoum quadro geral <strong>de</strong> robustez em pesquisa na maioria das áreas, do que umrefl exo da excelência em um tema específi co, como seria <strong>no</strong> caso da profi ssão<strong>de</strong> psicólogo 14 .A<strong>de</strong>mais, observando especifi camente o histórico da pós-graduação <strong>no</strong>país, percebe-se que as instituições que mais produziram a respeito do tema sãoas pioneiras na implantação <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> pós-graduação em Psicologia. Oprimeiro mestrado em Psicologia foi o da PUC-Rio, criado em 1966, seguido daUSP (criando dois programas simultaneamente), em 1970, e somente em 1972houve a criação dos programas <strong>de</strong> mestrado na PUC-SP, PUC-RS e PUC-Campinas.Ou seja, infere-se que muita <strong>de</strong>ssa produção a respeito da profi ssão estejavinculada à antiguida<strong>de</strong> dos programas, haja vista que possuem um históricoantigo e gran<strong>de</strong> volume <strong>de</strong> materiais produzidos.Contudo, é imprescindível ressaltar que, além da antiguida<strong>de</strong> dosprogramas <strong>de</strong> pós-graduação, existem outros elementos que <strong>de</strong>vem serconsi<strong>de</strong>rados na compreensão <strong>de</strong>ssa produção. Entre estes, <strong>de</strong>staca-se a questãodos orientadores dos trabalhos analisados, cujo papel na <strong>de</strong>limitação da pesquisa,escolha metodológica, condução da investigação científi ca e <strong>de</strong>fi nição do temaestudado, <strong>de</strong>ntre outros momentos do processo <strong>de</strong> produção da dissertação outese.14 A respeito disso, Schwartzman (2006) afi rma que a USP, historicamente, é i<strong>de</strong>ntifi cadacomo um centro acadêmico <strong>de</strong> excelência, principalmente em relação às ativida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> pesquisa e <strong>de</strong> pós-graduação, tendo sido a primeira Instituição <strong>de</strong> Ensi<strong>no</strong> Superior aimplantar tais ativida<strong>de</strong>s.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>81Figura 8. Distribuição da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhos por orientador.De acordo com a Figura 8, existem 226 orientadores <strong>de</strong> mestradoa respeito da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo para 323 dissertações e 62 orientadorespara 83 teses, números que fornecem uma média <strong>de</strong> 1,4% trabalhos por cadaorientador, seja para dissertações ou teses (como po<strong>de</strong>rá ser visto mais a frente,existem exceções para essa média). Cabe ressaltar que 34 <strong>de</strong>sses orientadoresrealizaram tal ativida<strong>de</strong> tanto para dissertação como para teses, <strong>de</strong>sse modo, aototal, contabilizam-se 254 orientadores.Com isso, o que se percebe <strong>de</strong> maneira mais acentuada, é a dispersãodas dissertações e teses entre os orientadores. A gran<strong>de</strong> maioria dos orientadores(por volta <strong>de</strong> 78%) possui apenas um trabalho orientado na área, o que <strong>de</strong>monstraque, <strong>no</strong> geral, a produção é aci<strong>de</strong>ntal entre esses pesquisadores.Esse <strong>de</strong>lineamento da distribuição po<strong>de</strong> apontar para a consi<strong>de</strong>raçãoda relevância dos trabalhos a respeito da profi ssão na carreira acadêmica dospesquisadores: a maioria <strong>de</strong>les não se <strong>de</strong>tém <strong>de</strong> maneira específi ca e sistemática<strong>sobre</strong> o tema, refl etindo isso na quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> orientações <strong>de</strong> trabalhos queversam <strong>sobre</strong> a profi ssão.Por outro lado, a mesma fi gura aponta para a existência <strong>de</strong> algunspesquisadores que se <strong>de</strong>stacam da maioria por possuírem mais <strong>de</strong> uma orientaçãona área. Se somada a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> orientação daqueles que a realizaram mais


82 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong><strong>de</strong> uma vez, tem-se que estes são responsáveis por aproximadamente 40% daprodução <strong>de</strong> ambos os tipos <strong>de</strong> materiais. Assim sendo, cabe uma análise a parte<strong>de</strong>stes a fi m <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r melhor como ocorre o processo <strong>de</strong> produção dasdissertações e teses a respeito da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.É interessante <strong>no</strong>tar que, por um lado, esses orientadores corroboramfortemente com a produção das instituições das quais participam, mantendo-ascolocadas entre as primeiras do ranking – como é o caso das primeiras posições:a USP possui três dos quinze orientadores que mais orientam dissertações e umdos quatro que mais orientam teses <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, e a PUC-SPquatro e três orientadores das categorias referidas, respectivamente. Por outro,os docentes/pesquisadores, individualmente, conduzem orientações <strong>sobre</strong> otema in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da instituição a qual são vinculados: cinco, dos quinze quemais orientaram, realizaram essa ativida<strong>de</strong> em mais <strong>de</strong> uma instituição diferente,e dois o fi zeram em IES que não <strong>de</strong>spontam entre as <strong>de</strong>z universida<strong>de</strong>s que maisproduziram.Figura 9. Quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> artigos <strong>sobre</strong> a profissão por orientador.Ao se atentar para a produção <strong>de</strong> artigos 15 <strong>de</strong>sses orientadores a respeitoda profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, como <strong>de</strong>monstrado na Figura 9, i<strong>de</strong>ntifi ca-se15 Para maiores informações <strong>sobre</strong> a publicação <strong>de</strong> artigos que abordam a temática daprofi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, conferir o capítulo 2 <strong>de</strong>ste livro.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>83que não se <strong>de</strong>dicam a publicação nesse tema, já que 85% <strong>de</strong>stes não possuemnenhum artigo <strong>sobre</strong> o assunto e apenas 18,1% publicaram até quatro artigos <strong>no</strong>tema. Há a exceção <strong>de</strong> um orientador/pesquisador que possui 13 artigos.Esses dados po<strong>de</strong>m apontar para falta <strong>de</strong> sistematização da discussão arespeito da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> país, na medida em que os orientadores <strong>de</strong>mestrado e doutorado do tema não possuem uma <strong>de</strong>dicação, a priori, específi ca<strong>sobre</strong> o tema. O seu tratamento, <strong>de</strong>ntro do meio acadêmico, po<strong>de</strong> ocorrer <strong>de</strong>maneira tangencial a outros <strong>de</strong>bates, não sendo o foco principal das pesquisasrealizadas.Investigando mais <strong>de</strong>talhadamente o conjunto dos orientadores,<strong>de</strong>tém-se agora <strong>sobre</strong> os quatro mais produtivos, para análise <strong>de</strong> seus currículosacadêmicos 16 . A Tabela 1 expõe essas informações.Tabela 1Os oito orientadores mais produtivos a respeito da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo% <strong>de</strong> trabalhos <strong>sobre</strong> aN <strong>de</strong> trabalhos N <strong>de</strong> trabalhosprofi ssão em comparaçãoorientados <strong>no</strong> orientados <strong>no</strong>às <strong>de</strong>mais orientações dotema geralpesquisadorDissertaçõesOrientador A 9 41 22Orientador B 8 49 16,3Orientador C 6 19 31,6Orientador D 6 13 46,15TesesOrientador E 5 31 16,1Orientador F 3 41 7,3Orientador G 3 82 3,6Orientador H 3 22 13,616 Essa consulta foi realizada <strong>no</strong> Currículo Lattes dos pesquisadores, presente na PlataformaLattes, construída pelo CNPq, acessível <strong>no</strong> en<strong>de</strong>reço http://lattes.cnpq.br. Embora asinformações a respeito do <strong>no</strong>me dos pesquisadores/orientadores sejam públicas, optou-se,para efeito da análise, omiti-los.


84 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Os dados acima revelam que, <strong>no</strong> histórico <strong>de</strong> orientações realizadas,aquelas <strong>de</strong>stinadas aos trabalhos na temática da profi ssão encontram poucaexpressão, tendo em vista que a média do índice <strong>de</strong> representativida<strong>de</strong> nasorientações dos quatro pesquisadores é <strong>de</strong> 29% e somente um dos quatroapresentou índice <strong>de</strong> representativida<strong>de</strong> superior a 40%. No caso das teses, asituação é ainda mais drástica, sendo a média <strong>de</strong> representativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> 10,15%,chegando ao limite máximo <strong>de</strong> 16,1%. Isso refl ete que, mesmo <strong>de</strong>ntre ospesquisadores que mais orientam trabalhos na temática, elas não ocupam lugarcentral <strong>no</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong>.A<strong>de</strong>nsando a análise, verifi cam-se os projetos <strong>de</strong> pesquisas, já<strong>de</strong>senvolvidos e em curso, por estes pesquisadores.Tabela 2Temática dos projetos <strong>de</strong> pesquisas dos orientadores mais produtivos <strong>no</strong> temaNome dopesquisadorOrientador ATemática dos projetos <strong>de</strong> pesquisaPráticas psicológicas clínicas em instituiçõesAprendizagem signifi cativa e práticas psicológicasOrientador BA conscientização, quanto ao contexto <strong>de</strong> vida, do públicoatendido pelos psicólogosNovo mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> intervenção comunitáriaBases para prevenção primária (adaptação <strong>de</strong> instrumentos<strong>de</strong> avaliação) <strong>no</strong> contexto escolaOrientador CApoio psicológico para agentes <strong>de</strong> segurança diante do estresseO trabalho dos psicólogos em projetos vinculados a programas<strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> socialPapel do psicólogo como mediador <strong>de</strong> confl itos nasorganizaçõesAconselhamento psicológico e outras práticas psicológicasvoltada para soropositivosOs motivos que mantém as mulheres em situação <strong>de</strong> violênciadoméstica e estratégias utilizadas por elas para sair <strong>de</strong>ssasituação


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>85Orientador C Ação do psicólogo clínico em diferentes contextosinstitucionais e situacionais Ação do psicólogo clínico em avaliação psicológica Ação do psicólogo clínico junto ao núcleo <strong>de</strong> medidas sócioeducativas Prática Psicológica em InstituiçãoOrientador DInserção profi ssional do psicólogo brasileiro <strong>no</strong> setor do bemestarsocialHistoriografi a da produção <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>A produção acadêmica na pós-graduação em Psicologia <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>Psicologia e compromisso socialPolíticas públicas e a prática social do psicólogo (dividida emduas fases)Orientador EHistoria da Psicologia Social <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Dicionário <strong>de</strong> instituições que possuíram projetos e serviços<strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>O papel da SBP e Anpepp para disseminação da pesquisa emPsicologia <strong>no</strong> paísHistória da Análise do Comportamento <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Orientador FO processo <strong>de</strong> inclusão e exclusão e a afetivida<strong>de</strong> das pessoasenvolvidasAs emoções nas culturas indígenasOrientador G(não possui essa informação disponível <strong>no</strong> Currículo Lattes)Orientador H As emoções na socieda<strong>de</strong> XavanteDe maneira geral, <strong>de</strong> acordo com a Tabela 2, po<strong>de</strong>-se apreen<strong>de</strong>r queas temáticas são as mais diversas possíveis e não são orientadas diretamentepara o trato com a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo como um todo. Em muitos casos(como o Orientador A, Orientador B e Orientador C) é possível inferir que o<strong>de</strong>senvolvimento das dissertações a respeito da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo ocorreu


86 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>como uma temática transversal aos projetos mais amplos. Estes possuíam, porsua vez, o foco na discussão a respeito do <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> <strong>no</strong>vas práticas emuma dada área da Psicologia, o que abre espaço para a discussão da profi ssão,mas que, <strong>de</strong> partida, não prioriza esse <strong>de</strong>bate.Nota-se também na tabela que outros projetos <strong>de</strong> pesquisadores, comoOrientador F, Orientador G e Orientador H, em suas <strong>de</strong>scrições sumárias, nãoindicam a presença <strong>de</strong> discussões referentes à profi ssão <strong>de</strong> psicólogo.Como exceção a esse quadro, i<strong>de</strong>ntifi camos um pesquisador, OrientadorD, que <strong>de</strong>ixa explícito em mais <strong>de</strong> um <strong>de</strong> seus projetos a discussão direta arespeito da profi ssão do psicólogo, seja quanto a inserção do mesmo em <strong>no</strong>voslocais <strong>de</strong> trabalho, seja com relação à historiografi a da produção a respeito <strong>de</strong>ssetema.Os dados e discussões levantados até aqui a respeito dos orientadoresabrem caminho a algumas inferências a respeito da estrutura da produtivida<strong>de</strong>,na pós-graduação, a respeito do ofício <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Primeiramente,<strong>no</strong>ta-se que está dispersa nas mãos <strong>de</strong> muitos orientadores, os quais <strong>de</strong>senvolvemativida<strong>de</strong> nessa temática, costumeiramente, uma ou duas vezes. Contudo, quandose orienta três ou mais vezes, percebe-se que o fenôme<strong>no</strong> está relacionado muitomais com a gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> orientações <strong>no</strong> geral realizada pelo pesquisador,do que por uma preocupação mais explícita com o tema. Dados como a ausência<strong>de</strong> produção dos orientadores a respeito da profi ssão <strong>no</strong> formato <strong>de</strong> artigo, aanálise dos projetos <strong>de</strong> pesquisa dos quatro maiores orientadores <strong>de</strong> mestradoe doutorado <strong>no</strong> tema, bem como a relação entre as orientações <strong>de</strong> trabalhos<strong>sobre</strong> a profi ssão e as orientações gerais realizadas, <strong>de</strong>monstram que a temáticavem sendo tratada, ao longo dos a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>ntro da pós-graduação, <strong>de</strong> maneirasecundária, transversal e fragmentada.Prosseguindo na análise quanto às características dos documentos,examinam-se as áreas da Psicologia a que essas dissertações e teses fazemreferência:


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>87Tabela 3Distribuição <strong>de</strong> documentos por área da PsicologiaSubáreas da PsicologiaDissertaçõesTesesN % N %Psicologia Escolar/Educacional 74 22,9% 14 16,9%Psicologia Clínica 59 18,3% 11 13,3%Psicologia da Saú<strong>de</strong> 50 15,5% 8 9,6%Geral 26 8% 14 16,9%História da Psicologia 26 8% 14 16,9%Psicologia Organizacional e do Trabalho 26 8% 2 2,4%Psicologia Jurídica 22 6,8% 1 1,2%Psicologia Hospitalar 18 5,6% 5 6%Psicologia Social 16 5% 10 12%Docência 5 1,5% 1 1,2%Psicologia do Trânsito 1 0,3% - -Psicologia do Esporte - - 3 3,6%Na Tabela 3, i<strong>de</strong>ntifi ca-se a área da Psicologia Escolar/Educacional comoa que possuiu mais trabalhos direcionados à temática (22,9% das dissertaçõese 16,9% das teses). As <strong>de</strong>mais áreas variam neste ranking, quando comparadasas produções <strong>de</strong> mestrado com as <strong>de</strong> doutorado. Há uma relativa mudançaconcernente às teses, não estando presente a mesma disparida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produçãoentre as áreas, já que estão igualadas as quantida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalhos na área <strong>de</strong>Psicologia Escolar/Educacional, Geral e História da Psicologia.


88 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>É interessante atentar para o fato <strong>de</strong> que mesmo não havendo nenhumadissertação na área <strong>de</strong> Psicologia do Esporte foram coletadas três teses nareferida área, assim como foi encontrada uma dissertação a respeito da profi ssão<strong>de</strong> Psicologia do Trânsito, mas nenhuma tese.Em relação à predominância da Psicologia Escolar/Educacional, existemalguns aspectos a serem consi<strong>de</strong>rados. Primeiro, <strong>no</strong> âmbito da estruturaçãoda pós-graduação, tem-se que um dos primeiros programas <strong>de</strong> mestrado edoutorado em Psicologia <strong>no</strong> país, criado pela USP na década <strong>de</strong> 1970, priorizavaos estudos nesta área em articulação com o tema do Desenvolvimento Huma<strong>no</strong>;esse fato po<strong>de</strong> auxiliar na compreensão tanto do volume <strong>de</strong> produção na área,como também a distribuição temporal que possui.Acrescentando outro aspecto para esta análise, é importante consi<strong>de</strong>raro <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>sta subárea da Psicologia, <strong>no</strong> que concerne à sistematizaçãoe consolidação dos <strong>de</strong>bates. Maluf (2003) aponta que há um histórico <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>incidência <strong>de</strong> trabalhos – tanto <strong>no</strong> âmbito das dissertações e teses, como emartigos e livros – <strong>no</strong> campo da Psicologia Escolar que remontam à década <strong>de</strong>1980, em que eram encontradas produções que se preocupavam em <strong>de</strong>bater(e reformular) a profi ssão, haja vista o questionamento vigente a respeito dospressupostos e posturas <strong>sobre</strong> a qual a ação <strong>de</strong>sses profi ssionais estava alicerçada.É <strong>no</strong>tório que um dos motivadores da produção voltada ao <strong>de</strong>bate da profi ssão– mais específi ca para a Psicologia Escolar – era o reconhecimento da realida<strong>de</strong>brasileira <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, o que <strong>de</strong>mandava refl exões <strong>sobre</strong> consi<strong>de</strong>raçõesrealizadas na época a respeito dos fenôme<strong>no</strong>s atinentes ao contexto educacional,como por exemplo, o “fracasso escolar” (Witter, Witter, Yukmitsu & Gonçalves,1992).Assim sendo, a assunção <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va visão <strong>de</strong> mundo e <strong>de</strong> homem quepropõe a reformulação tanto da ciência psicológica voltada para a área, como aatuação dos próprios profi ssionais, contribui diretamente para o gran<strong>de</strong> volume<strong>de</strong> produções <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo escolar/educacional.A maior sistematização a respeito da profi ssão nesta subárea da Psicologiaé reiterada quando se consi<strong>de</strong>ra a distribuição histórica das produções. É a únicadas onze subáreas a apresentar uma recorrência sistemática <strong>de</strong> produção <strong>sobre</strong> a


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>89profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, movimento iniciado em 1980, intensifi cando-se a partir<strong>de</strong> 1992 (saltando <strong>de</strong> 5 dissertações <strong>no</strong> fi nal da última década, para 15 <strong>no</strong> períodocompreendido entre 1992 e 1996) e mantendo o mesmo nível até o século XXI(20 dissertações <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 2002 a 2006, e 17 somente entre 2007 e 2008).Essa confi guração não se repete em mais nenhuma outra área, nem <strong>no</strong> caso daPsicologia Clínica, segunda <strong>no</strong> ranking <strong>de</strong> dissertações e terceira <strong>no</strong> <strong>de</strong> teses,que possui seu volume <strong>de</strong> documentos infl acionados exatamente <strong>no</strong> período<strong>de</strong> 2002-2006 – neste, a área possui concentradas 51% (30 trabalhos) <strong>de</strong> suaprodução <strong>de</strong> dissertações.Na distribuição <strong>de</strong> teses, percebe-se uma situação parecida: o processo<strong>de</strong> produção a respeito da profi ssão na Psicologia Escolar/Educacional fi rma-secomo constantemente crescente, e as <strong>de</strong>mais áreas, por seu tur<strong>no</strong>, concentram aprodução <strong>de</strong>masiadamente <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 2002-2006. Enquanto a subárea citadaapresenta duas teses <strong>no</strong> período entre 1992-1996, cinco entre 1997-2001, quatroem 2002-2006 e, mais recentemente, <strong>no</strong> intervalo <strong>de</strong> 2007 a 2008 duas teses; aPsicologia Clínica (apenas para seguir o mesmo argumento anterior) concentrasua produção, quase por inteira, <strong>no</strong>s dois últimos intervalos <strong>de</strong>scritos – três tesesentre 2002-2006 e cinco entre 2007-2008.O elevado índice <strong>de</strong> produções <strong>no</strong> campo da Psicologia Clínica po<strong>de</strong> sercorroborado pelo fato <strong>de</strong> ser essa uma área que vem sendo tida como <strong>de</strong>sti<strong>no</strong>historicamente preferencial <strong>de</strong> muitos profi ssionais (Bastos & Gondim, 2010;CFP, 1988; 1992; 1994). Ou seja, é uma área que atrai/atraiu maciçamente ospsicólogos, tanto na dimensão profi ssional, como acadêmica. Além disso, outraspesquisas, como a realizada pela Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-Graduaçãoem Psicologia (citada por Castro, 1999), apontam um crescimento consi<strong>de</strong>rávelnas produções específi cas da área. Em trabalho <strong>de</strong> cunho ensaístico, Castro(1999) advoga <strong>sobre</strong> a necessida<strong>de</strong> da continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> trabalho parao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> <strong>no</strong>vas práticas e reformulação <strong>de</strong> ações já consagradas. Ouseja, percebe-se que <strong>no</strong> campo da Psicologia Clínica há um gran<strong>de</strong> volume <strong>de</strong>produções em diversas temáticas, estando a profi ssão do psicólogo nesse meio,seguindo a tendência geral.


90 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A produção <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>no</strong> campo da Psicologia da Saú<strong>de</strong> tambémé um fenôme<strong>no</strong> que merece consi<strong>de</strong>rações. É <strong>no</strong>tória a infl uência da mudança<strong>no</strong> mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong> ocorrida ao longo dos a<strong>no</strong>s na aca<strong>de</strong>mia,insufl ando <strong>de</strong>bates a respeito da atuação do psicólogo nesses (<strong>no</strong>vos) espaços. Talconsi<strong>de</strong>ração alinha-se com o que foi <strong>de</strong>tectado nesta pesquisa: o surgimento daprimeira dissertação da Psicologia da Saú<strong>de</strong> voltada à profi ssão ocorre <strong>no</strong> mesmoperíodo em que se cria o “Programa <strong>de</strong> Reorientação Psiquiátrica Previ<strong>de</strong>ncial”,em 1982. Note-se que é advindo <strong>de</strong>sse programa <strong>de</strong> reorientação – que visava àreestruturação do modo como se concebia a assistência psiquiátrica <strong>no</strong> país – aampliação das ações possíveis do psicólogo, bem como o que se <strong>de</strong>mandava<strong>de</strong>sses.Acrescente-se, ainda, que, <strong>no</strong> fi nal da década <strong>de</strong> 1980, houve a criaçãodo Sistema Único <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong>, que a<strong>de</strong>ria aos <strong>no</strong>vos preceitos da concepção <strong>de</strong>saú<strong>de</strong> e das práticas realizadas até então, <strong>de</strong>mandando dos profi ssionais da áreauma reconsi<strong>de</strong>ração <strong>sobre</strong> suas posturas e ações, incluindo nesse rol o própriopsicólogo. Além disso, com a criação do <strong>no</strong>vo sistema, houve a ampliaçãoprogressiva <strong>de</strong> postos <strong>de</strong> trabalhos <strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong>, sendo o profi ssional <strong>de</strong>Psicologia um daqueles que mais fora requisitado nesse ínterim (Dimenstein,1998). Assim, mesmo <strong>no</strong> fi nal da década <strong>de</strong> 1990, admite-se que não havia aindatrabalhos que discutissem e propusessem <strong>no</strong>vas formas <strong>de</strong> atuação do psicólogoda saú<strong>de</strong> nesse <strong>no</strong>vo campo, havendo um crescimento <strong>no</strong> número <strong>de</strong>ssestrabalhos mais fortemente, a partir <strong>de</strong>ssa época.Vale acrescentar, ainda, a aparição <strong>de</strong> uma quantida<strong>de</strong> relativa <strong>de</strong>produções <strong>de</strong>ntro da Psicologia Jurídica, área relativamente recente <strong>de</strong>ntrodos espaços e campos <strong>de</strong> atuação profi ssional do psicólogo, tendo sua maiorinserção na realida<strong>de</strong> brasileira a partir da década <strong>de</strong> 1990 (Altoé, 2001). Apesardisso, já <strong>de</strong>sponta com 22 dissertações e uma tese, estando à frente <strong>de</strong> áreascomo Hospitalar e Social (quanto ao número <strong>de</strong> dissertações), que há algumtempo possuem representativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro das atuações do psicólogo. Talemergência da Psicologia Jurídica na produção <strong>de</strong> dissertações e teses a respeitoda sua profi ssão po<strong>de</strong> ser refl exo <strong>de</strong> um movimento <strong>de</strong> discussão em busca <strong>de</strong>estruturação e construções <strong>de</strong> rumos para a profi ssão nessa área.


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>91Ainda cabe comentário a respeito do volume <strong>de</strong> teses produzidas pelaárea <strong>de</strong> História da Psicologia e aquelas classifi cadas como Geral 17 .Com relação às primeiras, é interessante ressaltar que se concentramprincipalmente <strong>no</strong> interreg<strong>no</strong> <strong>de</strong> 2002-2006, fato que po<strong>de</strong> se alinhar com aprópria recenticida<strong>de</strong> da regulamentação da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo em solobrasileiro, datada <strong>de</strong> 1962. Anterior a esse período é possível encontrar uma forteinserção da ciência psicológica <strong>no</strong> país, bem como <strong>de</strong> algumas ações voltadasà aplicação da mesma (Pereira e Pereira Neto, 2003; Pessotti, 1988). Contudo,até meados da década <strong>de</strong> 1970, a profi ssão ainda está em sua fase inicial <strong>de</strong><strong>de</strong>senvolvimento, com a criação dos primeiros cursos <strong>de</strong> graduação acadêmicae <strong>de</strong> institutos que formavam especialistas na área. É a partir <strong>de</strong>sse período,<strong>de</strong><strong>no</strong>minado por Pereira e Pereira Neto (2003) como profi ssional, que po<strong>de</strong>mosfalar <strong>de</strong> uma profi ssão estruturada, com espaço e po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> atuação.Por outro lado, a gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> teses na subárea é infl uenciadapelo entendimento do quesito histórico como fundamental para a compreensãodos fenôme<strong>no</strong>s. Ou seja, é possível que, como refl exo <strong>de</strong>sse pressuposto, hajamaior <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> pesquisas mais <strong>de</strong>nsas (tendo em vista que se trata <strong>de</strong>teses) visando compreen<strong>de</strong>r a profi ssão pela via histórica.Já com relação aos trabalhos <strong>de</strong> doutorado que não focalizaram emnenhuma subárea específi ca, é possível inferirmos que a sua alta incidência ocorra<strong>de</strong>vido ao formato do trabalho <strong>de</strong> obtenção <strong>de</strong> grau. Segundo Lubisco, Vieirae Santana (2008), as teses são materiais que, em comparação às dissertações,comportam análises mais profundas. Sendo assim, haveria um espaço fl exívelpara discussões mais abrangentes e elaboradas, o que po<strong>de</strong>ria ser realizadoatravés <strong>de</strong> pesquisas voltadas à profi ssão como um todo.Também é possível <strong>de</strong>duzir que a alta quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> teses po<strong>de</strong> sero retrato <strong>de</strong> uma preocupação, mesmo que incipiente, em discutir a profi ssãodo psicólogo pautada em uma visão mais integrada da classe profi ssional, semrealizar distinções <strong>de</strong> suas subáreas.17 Foram consi<strong>de</strong>rados nesta categoria os materiais que não se <strong>de</strong>tiveram em uma análiseespecífi ca por área, mas se dispuseram a tratar a Psicologia/psicólogo como um todo.


92 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Por fi m, com relação à Psicologia do Esporte e à Psicologia do Trânsito,não é <strong>de</strong> todo surpreen<strong>de</strong>nte a baixa produção i<strong>de</strong>ntifi cada, tendo em vistaque são campos eminentemente <strong>no</strong>vos na realida<strong>de</strong> brasileira, po<strong>de</strong>ndo haveruma difi culda<strong>de</strong> <strong>de</strong> existência tanto <strong>de</strong> linhas e projetos <strong>de</strong> pesquisas voltadasespecifi camente para o tema, como, muito mais, <strong>de</strong> orientadores aptos à tarefa.Fato que corrobora essa afi rmação são as três teses da área <strong>de</strong> Psicologia doEsporte terem sido <strong>de</strong>senvolvidas em programas <strong>de</strong> pós-graduação <strong>de</strong> EducaçãoFísica.3 Consi<strong>de</strong>rações finaisDescrever e avaliar a produção acadêmica não é <strong>no</strong>vida<strong>de</strong> <strong>no</strong> cenárioda Psicologia. Sabe-se que ao conhecer a dinâmica <strong>de</strong> produção e disseminação<strong>de</strong> teses e dissertações, é possível encontrar subsídios para análise do<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado contexto. No caso em tela, em que sebuscou trabalhos referentes à atuação profi ssional <strong>de</strong> psicólogos <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>,a pesquisa permitiu i<strong>de</strong>ntifi car <strong>de</strong> que forma os programas <strong>de</strong> pós-graduação,representados por seu corpo docente e discente, tem empreendido discussões arespeito da profi ssão.Uma gran<strong>de</strong> parte dos achados <strong>de</strong>sta pesquisa não surpreen<strong>de</strong>u,corroborando dados coletados anteriormente, seja na área específi ca <strong>de</strong>Psicologia, seja na ciência brasileira como um todo.A relação <strong>de</strong>sproporcional entre o número <strong>de</strong> dissertações e teses (compredominância das primeiras), a alta participação das instituições públicas <strong>de</strong>ensi<strong>no</strong> superior, o crescimento concentrado <strong>no</strong>s últimos a<strong>no</strong>s e a centralizaçãogeográfi ca e institucional (não só dos trabalhos, mas também dos fi nanciamentos)não são resultados exclusivos da temática em questão ou, sequer, da Psicologia.Na verda<strong>de</strong>, retratam o quadro típico da produção científi ca <strong>no</strong> país, como jáatestado por vários autores em décadas anteriores, com avanços muito sutis.No que concerne aos dados específi cos da área, três aspectos merecematenção. O primeiro <strong>de</strong>les refere-se à concentração dos trabalhos em programas<strong>de</strong> pós-graduação <strong>de</strong> Psicologia em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outras áreas. Isso nãocausa estranheza, uma vez que, por se tratar <strong>de</strong> tema <strong>sobre</strong> a profi ssão, os


Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>93pesquisadores se voltem para a própria área a fi m <strong>de</strong> contribuições acerca <strong>de</strong>seus questionamentos <strong>sobre</strong> a atuação do psicólogo.O segundo ponto, e o mais signifi cativo <strong>no</strong> tocante aos rumos dasdiscussões <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>no</strong> país, diz respeito à dispersão das dissertaçõese teses entre os orientadores. Foi apontado que quase 80% dos docentespesquisadorespossuem apenas um trabalho orientado na área. Além disso,mesmo entre aqueles com certa regularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhos acadêmicos <strong>sobre</strong> atemática, percebe-se que a preocupação com a questão é mais tangencial quedireta, ao se analisar outros tipos <strong>de</strong> produtos científi cos, como artigos e projetos<strong>de</strong> pesquisa. Tal dado <strong>de</strong>monstra, explicitamente, que a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> não é foco <strong>de</strong> interesse principal para os pesquisadores, mas simcircunstancial.A gran<strong>de</strong> implicação disso é a falta <strong>de</strong> sistematização da discussão arespeito do tema, que po<strong>de</strong> trazer prejuízos signifi cativos para o aprimoramentoda Psicologia. A ocorrência <strong>de</strong> trabalhos repetidos, ou <strong>de</strong> estudos que po<strong>de</strong>riamser complementares, mas entre os quais não há comunicação, e ainda pesquisasque po<strong>de</strong>riam ser replicadas ou exploradas sob uma <strong>no</strong>va perspectiva, acabampor se per<strong>de</strong>r em virtu<strong>de</strong> da ausência <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong> pesquisa sólidos e contínuos.Sem a <strong>de</strong>vida organização, não se torna possível i<strong>de</strong>ntifi car os avanços alcançadose as lacunas que ainda estão por preencher <strong>no</strong> tocante a locais <strong>de</strong> trabalho, teoriase técnicas <strong>de</strong> atuação e <strong>de</strong>mandas diferenciadas, por exemplo.O último ponto <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque se relaciona à predominância <strong>de</strong>dissertações e teses na subárea da Psicologia Escolar/Educacional, seguida pelaClínica e pela Saú<strong>de</strong>. Ora, apesar da ausência da Psicologia Organizacional e doTrabalho entre os três primeiros colocados <strong>no</strong> ranking, sabe-se que são áreasconsi<strong>de</strong>radas tradicionais da Psicologia, portanto, com certo percurso históricoque suscita questionamentos a respeito da prática profi ssional. Por esse motivo,tal dado não gera inquietações inexplicáveis.Diante <strong>de</strong>sse quadro, retoma-se o argumento da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seconhecer a pós-graduação brasileira <strong>de</strong> Psicologia sob os diversos aspectos (quem,on<strong>de</strong>, quando e como estão sendo conduzidos os estudos) para que, a partir <strong>de</strong>um conjunto maciço <strong>de</strong> informações, seja possível tomar <strong>de</strong>cisões mais balizadas


94 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>a respeito da profi ssão e que as preocupações acadêmicas possam auxiliar nabusca constante por uma melhor compreensão da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo.ReferênciasAltoé, S. E. (2001). Atualida<strong>de</strong> da Psicologia Jurídica. Psibrasil Revista <strong>de</strong>Pesquisadores da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, 2. Disponível em http://www.scribd.com/doc/2519940/Atualida<strong>de</strong>-da-psicologia-juridica, acessado em 20 <strong>de</strong><strong>no</strong>vembro <strong>de</strong> 2009.Bastos, A. V. B., & Gondim, S. M. G. (2010). O trabalho do psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.Porto Alegre: Artmed.Bianchetti, L. (2005). Juracy C. Marques: primórdios e expansão da pós-graduaçãostricto sensu em educação na região Sul. Revista <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Educação,(30), 139-150.Borges-Andra<strong>de</strong>, J. E. (2001). Pós-graduação: enfrentando <strong>no</strong>vos <strong>de</strong>safi os -Psicologia. InfoCAPES, 9 (2-3), 141-148.Borges-Andra<strong>de</strong>, J. E., & Menandro, P. R. M. (2002). Pós-graduação em Psicologia<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: tendências recentes e algumas refl exões para o futuro. In Anaisdo IX Simpósio <strong>de</strong> Pesquisa e Intercâmbio Científi co (pp. 33-38). Águas <strong>de</strong>Lindóia: Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia.Botomé, S. P., & Kubo, O. M. (2002). Responsabilida<strong>de</strong> social dos programas<strong>de</strong> pós-graduação e formação <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos cientistas e professores <strong>de</strong> nívelsuperior. Interação em Psicologia, 6(1), 81-110.CAPES – Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> Nível Superior. (n.d.a). Sobre a CAPES: história e missão. Disponível em http://www.capes.gov.br, acessado em 09 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2009.CAPES – Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> Nível Superior. (n.d.b). GeoCapes. Disponível em http://geocapes.capes.gov.br, acessado em 25<strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2009.CAPES – Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> Nível Superior. (2004).Pla<strong>no</strong> Nacional <strong>de</strong> Pós-Graduação 2005-2010. Disponível em http://www.capes.gov.br, acessado em 09 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2009.Carelli, A. E. (2002). Produção científi ca em leitura: dissertações e teses (1990-1999). Tese <strong>de</strong> doutorado não publicada, Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong>Campinas, Campinas.


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Caracterização <strong>de</strong> Dissertações/Teses que Versam <strong>sobre</strong> a Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>97Santos, C. M. (2003). Tradições e contradições da pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.Educação e Socieda<strong>de</strong>, 24(83), 627-641.Schwartzman, S. (2006). A universida<strong>de</strong> primeira do <strong>Brasil</strong>: entre intelligentsia,padrão internacional e inclusão social. Estudos Avançados, 20(56), 161-189.Veloso, J. (2004). Mestre e doutores <strong>no</strong> país: <strong>de</strong>sti<strong>no</strong>s profi ssionais e políticas <strong>de</strong>pós-graduação. Ca<strong>de</strong>r<strong>no</strong>s <strong>de</strong> pesquisa, 34(123), 583-611.Weber, S. (2003). Psicologia: mestres e doutores titulados entre 1990-1999. In J.Velloso (Org.), A pós-graduação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: formação e trabalho <strong>de</strong> mestres edoutores <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> (pp. 221-243). Brasília: Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Aperfeiçoamento<strong>de</strong> Pessoal <strong>de</strong> Nível Superior.Witter, G. P. (2005). Pós-Graduação em Psicologia na PUC-Campinas: dissertaçõese teses (1975-2004). Estudos <strong>de</strong> Psicologia (Campinas), 22(4), 365-370.Witter, G. P., Witter, C., Yukmitsu, M. T. C. P., & Gonçalves, C. L. C. (1992). Atuaçãodo psicólogo escolar e educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: perspectivas através <strong>de</strong> textos(1980-1992) In. A. L. Francisco, C. R. Klomfahs & M. M. D. Rocha (Org.),Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: construção <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos espaços (pp. 23-54). Campinas:Editora Tomo.Yamamoto, O. H. (2006). Graduação e pós-graduação em Psicologia: relaçõespossíveis. Revista <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Pós-Graduação, 3(6), 270-281.Yamamoto, O. H., & Menandro, P. R. M. (2004). A avaliação dos programas <strong>de</strong>pós-graduação em Psicologia. Temas em <strong>de</strong>bate, 12(1), 82-91.Yamamoto, O. H., & Cunha, I. M. F. F. O. (1998). O psicólogo em hospitais <strong>de</strong>Natal: uma caracterização preliminar. Psicologia: Refl exão e Crítica, 11(2),345-362.Yamamoto, O. H., Dantas, C. M. B., Costa, A. L. F., Alverga, A. R., Seixas, P. S.,Oliveira, I. F. (2003). A profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> Rio Gran<strong>de</strong> do Norte.Interação, 7(2), 23-30.Zanelli, J. C. (1995). Formação e atuação do psicólogo organizacional: umarevisão da literatura. Temas em Psicologia, 1, 95-107.


CAPÍTULO 4UM BALANÇO (PROVISÓRIO) DOS ESTUDOSSOBRE A PROFISSÃOOswaldo H. YamamotoAna Ludmila Freire CostaPablo <strong>de</strong> Sousa SeixasKeyla Mafalda <strong>de</strong> Oliveira AmorimAo longo <strong>de</strong>sses quase cinquenta a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> profi ssão regulamentada,muito se estudou e se <strong>de</strong>bateu <strong>sobre</strong> a situação da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.Suas características, suas responsabilida<strong>de</strong>s, seus rumos, evi<strong>de</strong>nciados <strong>no</strong>quadro traçado <strong>no</strong>s capítulos anteriores, <strong>de</strong>monstram a atenção da categoria(profi ssionais, pesquisadores, docentes e estudantes) ao evolver da profi ssão. Oestudo apresentado e discutido <strong>no</strong>s capítulos prece<strong>de</strong>ntes, ao mesmo tempo emque confi rma algumas suposições, <strong>de</strong>ixa algumas questões em aberto a <strong>de</strong>mandar<strong>no</strong>ssa atenção.O vigor do que se produz <strong>sobre</strong> a profi ssão é inquestionável: 908documentos, dos quais 376 artigos publicados em periódicos científi cos, 46 livros,411 trabalhos acadêmicos, 31 artigos <strong>de</strong> divulgação científi ca e 44 documentos<strong>de</strong> natureza diversa, não é um volume <strong>de</strong>sprezível.Tal produção se distribui temporal e geografi camente reproduzindoo padrão da Psicologia e mesmo da ciência brasileira: características comoo crescimento exponencial <strong>no</strong>s últimos a<strong>no</strong>s, concentração dos estudos nas


100 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>subáreas mais tradicionais da Psicologia e centralização geográfi ca e institucionaldos autores são confi gurações que também marcam a produção <strong>sobre</strong> a profi ssão.Um exame mais próximo <strong>no</strong>s revela algumas características quemerecem ser <strong>de</strong>stacadas. Uma <strong>de</strong>las refere-se ao fato <strong>de</strong> os artigos publicadosserem majoritariamente (mais <strong>de</strong> 80% dos autores) produzidos por docentes epesquisadores vinculados a instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior, mesmo se tratando<strong>de</strong> um tema eminentemente relacionado à prática profi ssional. Se isso <strong>de</strong>monstra,por um lado, o enraizamento do tema <strong>no</strong> meio acadêmico, tratado como umaimportante questão <strong>de</strong> pesquisa, por outro revela o papel secundário que osprofi ssionais em exercício assumem, resumindo-se basicamente à prestação <strong>de</strong>informações, na condição <strong>de</strong> sujeitos <strong>de</strong> pesquisa, e não como fomentadores dadiscussão ou produtores <strong>de</strong> conhecimento e refl exão <strong>sobre</strong> o tema.Certamente é um truísmo afi rmar que são os acadêmicos que,prioritariamente, produzem conhecimento científi co da área. No entanto,é preciso <strong>no</strong>tar que profi ssão é uma modalida<strong>de</strong> específi ca <strong>de</strong> objeto <strong>de</strong>investigação <strong>no</strong> qual uma parte consi<strong>de</strong>rável da informação relevante é prestadapor sujeitos que têm – ou po<strong>de</strong>riam ter, pelo seu background acadêmico – umpapel ativo na discussão dos seus <strong>de</strong>sti<strong>no</strong>s. Essa condição se potencializa tendoem vista a forte presença do chamado “Sistema Conselhos <strong>de</strong> Psicologia”, queoferece oportunida<strong>de</strong>s para a participação profi ssional – incluindo a publicação– em patamares difi cilmente encontrados em outras categorias profi ssionais.Ratifi cando o entendimento <strong>de</strong> que o periódico científi co é um meio privilegiado<strong>de</strong> veiculação <strong>de</strong> conhecimento e interlocução acadêmica, restaria verifi car seessa produção impacta diretamente, ou não, o profi ssional em exercício, que seencontra ‘na ponta da re<strong>de</strong>’.A forte presença da aca<strong>de</strong>mia na produção <strong>de</strong> conhecimento <strong>sobre</strong> aprofi ssão é traduzida, além da publicação <strong>de</strong> artigos, pelo volume <strong>de</strong> teses edissertações tratando da questão. Foram feitos três registros <strong>no</strong> que tange a essaprodução: (a) a (esperada) concentração dos trabalhos em programas <strong>de</strong> pósgraduação<strong>de</strong> Psicologia em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outras áreas; (b) a predominância <strong>de</strong>trabalhos em subáreas tradicionais da Psicologia; (c) a dispersão das dissertações eteses entre os orientadores (aproximadamente 80% dos docentes-pesquisadorescom apenas um trabalho orientado <strong>sobre</strong> o tema).


Um Balanço (Provisório) dos Estudos <strong>sobre</strong> a Profi ssão 101Se os dois primeiros aspectos não merecem mais do que o registro,o terceiro <strong>no</strong>s fornece uma informação que qualifi ca o aludido vigor daprodução <strong>sobre</strong> o assunto. O fato <strong>de</strong> haver tamanha dispersão parece confi rmara observação <strong>de</strong> que a temática em foco é mais tangencial do que preocupaçãocentral dos pesquisadores. Tanto <strong>no</strong> caso dos artigos quanto <strong>no</strong> <strong>de</strong> dissertaçõese teses, a dispersão chegou a mais <strong>de</strong> 70%, ou seja, a gran<strong>de</strong> maioria dos autorese orientadores tem apenas um estudo <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> país.Finalmente, <strong>de</strong>ntre as questões que se impõem, <strong>de</strong>stacamos duas:(1) O conhecimento acumulado <strong>sobre</strong> o tema, produzido ao longo <strong>de</strong> quasecinco décadas, seria a<strong>de</strong>quado para retratar a consolidação da Psicologia, paranarrar a história recente da área como profi ssão? Em outras palavras, questionasequanto os documentos coletados são <strong>de</strong>talhados e teórico e empiricamenteconsistentes, a ponto <strong>de</strong> confi gurar um conhecimento acurado da profi ssão.Sem preten<strong>de</strong>r dar uma resposta à questão, pelos limites da estratégia <strong>de</strong>pesquisa aqui adotada, alguns elementos apontam em direção a uma respostanegativa. A <strong>de</strong>speito do volume, a dispersão dos autores parece levar à ausência<strong>de</strong> sistematização da discussão a respeito do tema, difi cultando o acúmulo darefl exão <strong>sobre</strong> a profi ssão. Uma consequência inevitável <strong>de</strong>ssa constelação <strong>de</strong>autores e orientadores – exceto talvez pelos estudos conduzidos pelo ConselhoFe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia (1988, 1992 e 1994), publicados em formato <strong>de</strong> coletânea,e do Grupo <strong>de</strong> Trabalho da ANPEPP <strong>de</strong> Psicologia Organizacional e do Trabalho(Bastos & Godim, 2010) – é a virtual inexistência <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> investigação<strong>de</strong> longo curso que conferiria a indispensável <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> a essa área <strong>de</strong> estudo.Dentre as implicações <strong>de</strong>sse fato está uma eventual fragilida<strong>de</strong> do ponto <strong>de</strong> vistateórico-metodológico na abordagem <strong>de</strong> um tema que é objeto consagrado <strong>de</strong>estudo em outras áreas do conhecimento 1 .(2) Quais são as reais possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> contribuição <strong>de</strong>ssa produção para operarmudanças signifi cativas na atuação psicológica brasileira? A questão não é se ospesquisadores têm se <strong>de</strong>bruçado para estudar a profi ssão, mas em que medidatais pesquisas têm sido úteis para embasar <strong>de</strong>cisões a respeito das difi culda<strong>de</strong>s1 Conforme referido <strong>no</strong> Capítulo 1 <strong>de</strong>ste livro.


102 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>e <strong>de</strong>safi os que se impõem à Psicologia. Que a aca<strong>de</strong>mia prevaleça na produçãoe disseminação do conhecimento é, como afi rmamos, uma obvieda<strong>de</strong>. Restariasaber (a) se o conhecimento produzido efetivamente tem a potencialida<strong>de</strong> <strong>de</strong>retroalimentar o sistema <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> e a prática profi ssional, consi<strong>de</strong>rando oquestionamento anterior e (b) se esse conhecimento, uma vez suposta a suaqualida<strong>de</strong>, chega aos <strong>de</strong>stinatários fi nais ou é simplesmente consumido pelosprodutores <strong>de</strong>sse conhecimento.Apesar <strong>de</strong> este estudo não fornecer dados sufi cientemente robustos parapermitir respostas a essas refl exões, po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado uma primeira tentativa<strong>de</strong> sistematizar o conhecimento até então produzido <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>no</strong> país. Aproposta <strong>de</strong> reunir tais documentos e empreen<strong>de</strong>r uma análise cientométrica doconjunto da produção acadêmico-científi ca parece ser condição necessária paraque se alcance outro patamar <strong>de</strong> questionamentos acerca da atuação profi ssionaldo psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.Assim, as questões por ora lançadas permanecem como um <strong>de</strong>safi o<strong>no</strong> horizonte dos estudiosos e daqueles que se preocupam com os <strong>de</strong>sti<strong>no</strong>s daprofi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.ReferênciasBastos, A. V. B., & Gondim, S. M. G. (2010). O trabalho do psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.Porto Alegre: Artmed.Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. (1988). Quem é o psicólogo brasileiro? SãoPaulo: Edicon/Educ.Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. (1992). Psicólogo brasileiro: construção <strong>de</strong><strong>no</strong>vos espaços. Campinas: Átomo.Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. (1994). Psicólogo brasileiro: práticas emergentese <strong>de</strong>safi os para a formação. São Paulo: Casa do Psicólogo.


PARTE II


CAPÍTULO 5*A SITUAÇÃO ATUAL DA PROFISSÃO DEPSICÓLOGO NO BRASILEnzo AzziDiretor do Instituto <strong>de</strong> Psicologia da Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São PauloAntes <strong>de</strong> iniciar a minha exposição, três observações preliminares:a) Não me foi possível, por falta <strong>de</strong> tempo, recolher sugestões sufi cientespara transmitir, neste Simpósio, o pensamento que representasse o dos psicólogos<strong>de</strong> todo o <strong>Brasil</strong>. Assim sendo, as idéias aqui expostas são fruto, em gran<strong>de</strong> parte<strong>de</strong> refl exão pessoal, em parte <strong>de</strong> sugestões <strong>de</strong> alguns entre os colaboradores queformam minha equipe <strong>no</strong> Instituto <strong>de</strong> Psicologia da Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> SãoPaulo.b) Também não me foi possível recolher dados estatísticos – nem sei seexistem – para confi rmar conceitos aqui expostos, alguns dos quais, portanto,são resultado <strong>de</strong> “impressão” diria mais “clínica” do que fruto <strong>de</strong> observaçãoobjetiva. Estarei pronto, evi<strong>de</strong>ntemente, a modifi cá-los, com a colaboração doscolegas aqui presentes.c) A Comissão Organizadora do Simpósio distribuiu aos Relatoresconvidados, a título <strong>de</strong> sugestão, alguns tópicos que eu seguirei em minhaexposição, quer por ter sido inteligentemente escolhidos, quer pela escassez <strong>de</strong>tempo à minha exposição, quer para facilitar os <strong>de</strong>bates sôbre o assunto.* Referência completa do texto original: Azzi, E. (1964/1965). A situação atual da profi ssão<strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Boletim <strong>de</strong> Psicologia, XVI/XVIII, 47-61.


106 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>I TÓPICO – A preparação profi ssional até agora recebida pelospsicólogos forneceu instrumentos necessários aoexercício da profi ssão? Traz a recente legislaçãoreais contribuições à profi ciência?A resposta a êste tópico <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do esclarecimento preliminar <strong>de</strong> umaoutra questão extremamente grave: Em que consiste a profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo?A êsse respeito, a Lei 4119 é apenas aparentemente clara, na realida<strong>de</strong>bastante confusa e imprecisa talvez para não criar, numa época que seria muitoi<strong>no</strong>portuna para a classe psicológica, problemas <strong>de</strong> competência recíproca, <strong>de</strong>superposição e <strong>de</strong> rivalida<strong>de</strong>s.Diz a Lei 4119, em seu artigo 13: “Ao portador <strong>de</strong> diploma <strong>de</strong> psicólogoé conferido o direito <strong>de</strong> ensinar Psicologia <strong>no</strong>s vários cursos <strong>de</strong> que trata esta lei,observadas as exigências legais específi cas,e a exercer a profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo.§ 1º - Constitui função privativa do Psicólogo a utilização <strong>de</strong> métodos etécnicas psicológicas com os seguintes objetivos:a. diagnóstico psicólogo;b. orientação e seleção profi ssional;c. orientação psicopedagógica;d. solução <strong>de</strong> problemas <strong>de</strong> ajustamento.§ 2º - É <strong>de</strong> competência do psicólogo a colaboração em assuntospsicológicos ligados a outras ciências.Chamarei a atenção dos colegas apenas para alguns problemasrelacionados com o item a) (diagnóstico psicológico), e o item d) (solução <strong>de</strong>problemas <strong>de</strong> ajustamento), justamente os dois itens que criam, ou parecemcriar, ou po<strong>de</strong>m criar, problemas <strong>de</strong> competência, superposição e rivalida<strong>de</strong> coma profi ssão médica. Coloca-se, <strong>de</strong> fato, aqui, o problema da “Psicologia Clínica”,sôbre o qual gostaria manifestar minha opinião, antes <strong>de</strong> abordar os dois aspectosespecífi cos acima mencionados.Parece-me que <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, ou pelo me<strong>no</strong>s em São Paulo, as conceituações<strong>de</strong> Psicologia Clínica po<strong>de</strong>m ser agrupadas em três categorias: médicas,psicométricas, comportamentais e metodológicas.


A Situação Atual da Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 107As conceituações médicas, <strong>de</strong>fendidas naturalmente por médicospsiquiatras – felizmente cada vez me<strong>no</strong>s numerosos – se baseiam na acepçãoestritamente etmológica e tradicional do têrmo “clínico”. A Psicologia Clínica –dizem êles – outra signifi cação não têm senão aquela implícita <strong>no</strong>s têrmos: umapsicologia fundamentada na experiência clínica. Ninguém po<strong>de</strong> se consi<strong>de</strong>rarpsicólogo clínico se não tiver sufi ciente prática na arte médica, como o médiconão po<strong>de</strong> se consi<strong>de</strong>rar psicólogo clínico se não tiver preparo psicológico.A segunda categoria <strong>de</strong> <strong>de</strong>fi nições, que faz da psicologia clínica umsinônimo <strong>de</strong> análise psicométrica, se encontra freqüentemente <strong>de</strong>fendida porpsiquiatras e leigos – a isso também pelo fato <strong>de</strong> numerosos psicólogos ousedizentes psicólogos, por sentimento <strong>de</strong> inferiorida<strong>de</strong> ou por ig<strong>no</strong>rância aliadaa charlatanismo, limitarem suas ativida<strong>de</strong>s à aplicação mais ou me<strong>no</strong>s mecânica<strong>de</strong> “testes” psicológicos.Finalmente, a terceira concepção é aquela que nós <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>mose que ten<strong>de</strong> a se impôr cada vez mais. A Psicologia Clínica, não obstante suaressonância médica, não quer dizer nem Psicologia Patológica, nem Psiquiatriaou Psicoterapia, embora pretenda incluir num mesmo conjunto as condutasadaptadas e as perturbações da conduta. Ela se caracteriza mais por uma atitu<strong>de</strong>metodológica do que pelo seu objeto, o qual, afi nal <strong>de</strong> contas, é sempre aconduta (como conjunto <strong>de</strong> operações fi siológicas, motoras e simbólicas, pelasquais um organismo em situação ten<strong>de</strong> a realizar as suas possibilida<strong>de</strong>s e areduzir as tensões que comprometem a sua integrida<strong>de</strong>). A Psicologia Clínica,isto é, visa encarar a conduta individual <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> sua perspectiva própria,apanhar o mais fi elmente possível as maneiras <strong>de</strong> ser e <strong>de</strong> reagir <strong>de</strong> um serhuma<strong>no</strong> concreto em contato com situações percebidas e vividas, estabelecer asignifi cação da conduta, sua estrutura e gênese, <strong>de</strong>svendar tensões e confl itos quea motivam e os mecanismos que ten<strong>de</strong>m a resolvê-los. Sob êste ponto <strong>de</strong> vista,existe uma diferença característica entre atitu<strong>de</strong> clínica e atitu<strong>de</strong> experimental.O experimentador cria uma situação e controla artifi cialmente todo osfatôres, <strong>de</strong> maneira a estudar as variações relativas das respostas ou variáveis<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes em relação à ou às variáveis in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes, fazendo abstraçãodo conjunto; o clínico, não po<strong>de</strong>ndo nem criar, nem <strong>sobre</strong>tudo controlar a


108 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>situação <strong>de</strong> maneira a fazer abstração <strong>de</strong> uma parte <strong>de</strong> suas condições, esforçasepor recolocar os fatôres que o interessam <strong>no</strong> conjunto <strong>de</strong> suas condições. Oexperimentador e o clínico utilizam duas maneiras diversas para alcançar ummesmo objetivo: controlar as condições da conduta, o primeiro eliminando oconjunto das condições e manipulando uma “variável in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte”, o segundoreconstituindo o conjunto das condições. Compreen<strong>de</strong>-se fàcilmente como aprimeira atitu<strong>de</strong> possa conduzir a uma psicologia com tendência molecular, asegunda a uma psicologia molar; a primeira a relações universais e, portanto,impessoais e atemporais, a segunda à história <strong>de</strong> um caso.Entretanto, a diferenciação <strong>de</strong> uma Psicologia Clínica ao lado <strong>de</strong> umaPsicologia Experimental não tem outra signifi cação senão <strong>de</strong> uma necessida<strong>de</strong>técnica <strong>de</strong>vida à divisão do trabalho científi co e à acomodação dos instrumentosintelectuais às proprieda<strong>de</strong>s positivas e originais <strong>de</strong> seus objetos. Certamente,po<strong>de</strong>rá haver divergências, por gôsto pessoal ou por julgamento, sôbre a or<strong>de</strong>m<strong>de</strong> urgência dos problemas e preferir, por exemplo, a <strong>de</strong>monstração experimental<strong>de</strong> uma lei à elucidação clínica dos conjuntos complexos da conduta humana.Mas um confl ito mais profundo <strong>de</strong> natureza doutrinária ou fi losófi ca (naturalismoe humanismo psicológico) não correspon<strong>de</strong> senão a um momento da históriadas idéias e a uma crise. E o confl ito entre Psicologia Experimental e PsicologiaClínica é um momento já superado na história da Psicologia.Mas voltemos ao <strong>no</strong>sso assunto.1. Pelo que diz respeito ao diagnóstico psicológico, em que consiste? Equais suas relações com o diagnóstico médico-psiquiátrico?a) O médico clínico, conhecendo esquemàticamente as doenças(fenôme<strong>no</strong>s caracterizados por sintomas, síndromes, uma evolução, fatosanatomopatológicos e fatos terapêuticos), procura <strong>de</strong>scobrir a qual, entre osesquemas conhecidos, correspon<strong>de</strong>m, com certeza ou com probabilida<strong>de</strong>, ascaracterísticas do doente. Há doenças, que fazem parte da ciência chamadapatologia, e há uma realida<strong>de</strong>, a individualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada doente.O médico clínico tem uma segunda tarefa, relacionada com a primeira:frente a um doente, <strong>de</strong>pois frente a doentes sucessivos, êle <strong>de</strong>ve se perguntarse as particularida<strong>de</strong>s que alteram um ou outro dos esquemas conhecidos, não


A Situação Atual da Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 109justifi cam um esquema nôvo, uma doença ainda não <strong>de</strong>scrita e explicada. Acolheita <strong>de</strong> observações, a evi<strong>de</strong>nciação do fator patoge<strong>no</strong> ou <strong>de</strong> um processofi siopatológico coerente, po<strong>de</strong> fundamentar a sua <strong>de</strong>scoberta e enriquecer, <strong>de</strong>stamaneira, os esquemas da ciência médica.Assim, a atitu<strong>de</strong> clínica supõe sempre o estado <strong>de</strong> fenôme<strong>no</strong>sindividualizados, mas com preocupações gerais. A medicina foi a primeiraciência que encontrou êsse objeto particular (o indivíduo) e que o estudou coma preocupação <strong>de</strong> estabelecer leis. Para isso foi necessário construir, aos poucos,um método especial que tomasse largamente em consi<strong>de</strong>ração a individualida<strong>de</strong>:é, justamente, o método clínico. É fácil ver que tôda e qualquer ciência que,embora com outras preocupações, também <strong>de</strong>va partir dêsse objeto (o indivíduo)revestirá igualmente uma “estrutura clínica”. Conseqüentemente, essa estrutura<strong>de</strong> investigação, nascida com a medicina, a supera e chega a interessar a outrasciências.b) Em Psicologia Aplicada, nós partimos das diferenças individuais<strong>de</strong> conduta, as observamos ou as provocamos, para classifi car, orientar,utilizar ou ajudar o indivíduo. Evi<strong>de</strong>ntemente, essas diferenças individuais <strong>de</strong>conduta <strong>de</strong>verão ser prèviamente esquematizadas em sua forma, quantitativa equalitativamente, e explicadas, eventualmente com referência a outras disciplinas(anatomofi siologia, patologia, sociologia, etc.). Dentro dêstes esquemas, serásituada a conduta individual, ou como grau <strong>de</strong> variação ou como tipo.Voltando ao paralelo com a medicina, em psicologia aplicada <strong>de</strong>vemossubstituir à <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> sintoma aquela <strong>de</strong> grau <strong>de</strong> variação ou aquela <strong>de</strong> reaçãotípica, e à <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> doença aquela <strong>de</strong> signifi cação e <strong>de</strong> importância prática dostraços <strong>de</strong> conduta observados ou provocados, importância prática para as futurasadaptações do indivíduo (escolares, profi ssionais, sociais, familiares, afetivas,etc.);c) Po<strong>de</strong>mos, agora, abordar a <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> “clínica” em psicologia.Em Medicina, dissemos, os sintomas são sempre individualizados e a arte domédico clínico consiste em <strong>de</strong>scobrir, com a maior probabilida<strong>de</strong> possível, aqual esquema <strong>no</strong>sológico êstes sintomas correspon<strong>de</strong>m. Em psicologia também,os graus <strong>de</strong> variação e as formas <strong>de</strong> reação são, por <strong>de</strong>fi nição, fenôme<strong>no</strong>s


110 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>individuais; atrás dêles po<strong>de</strong>mos colocar os esquemas <strong>de</strong> conduta que traduzemdiversos modos <strong>de</strong> efi ciência, <strong>de</strong> organização e <strong>de</strong> adaptação. Se êsses esquemasfôssem condicionados apenas pelo organismo e pelo sistema nervoso, o trabalhodo psicólogo seria idêntico àquêle do médico organicista, embora com outrosobjetivos. Tratar-se-ia <strong>de</strong> uma “neurologia” extremamente fi na que visaria nãoi<strong>de</strong>ntifi car um doente a ser curado, mas proprieda<strong>de</strong>s que inferem ao indivíduoum certo valor econômico e social e que permitem também agir sôbre êle paraaumentar, se possível, êste valor.Ora, é supérfl uo lembrar que a conduta humana não é condicionadaapenas pelas características individuais do organismo, mas também pela históriapessoal. Por isso se torna indispensável uma exegêse que permita encontrar asignifi cação exata dos graus <strong>de</strong> variação e das formas <strong>de</strong> reação encontradas <strong>no</strong>exame <strong>de</strong> cada indivíduo.Assim, por exemplo, a efi ciência intelectual num <strong>de</strong>terminadoindivíduo, po<strong>de</strong> ser baixa por causa das proprieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> seu sistema nervoso:reconhecer-se-á isso por certos sinais e correlações que po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong> or<strong>de</strong>minteiramente psicológica (características dos processos atuais <strong>de</strong> aprendizagem,nível baixo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s pouco infl uenciadas pela educação e pelos exercíciosespecializados, sinais <strong>de</strong> insufi ciência psicológica experimentalmente validados,etc.): cabe à clínica psicológica procurá-los. Mas, a efi ciência intelectual po<strong>de</strong> serbaixa por ausência <strong>de</strong> trei<strong>no</strong>, ou <strong>de</strong> iniciação, ou pela interferência <strong>de</strong> estadosafetivos diversos: reconhecer-se-á isso por outros sinais, mas <strong>sobre</strong>tudo peloexame atento da história do indivíduo. Dessa maneira, à clínica <strong>de</strong> observaçãoe <strong>de</strong> experimentação atual <strong>de</strong>ve-se acrescentar uma clínica <strong>de</strong> análise históricaretrospectiva. Êste duplo trabalho, porém, não esgota a pesquisa, pois uma<strong>de</strong>fi ciência aparente <strong>no</strong> rendimento intelectual po<strong>de</strong> muito bem resultar <strong>de</strong> umamá colaboração do sujeito examinado. Em psicologia, êste fator <strong>de</strong> colaboração éfundamental e o psicólogo, se não quizer cair em erros grosseiros, <strong>de</strong>verá realizar,<strong>no</strong> <strong>de</strong>curso do exame psicológico, uma verda<strong>de</strong>ira clínica das motivações.Dessa maneira, tendo sido observado um grau <strong>de</strong> variação que traduzuma insufi ciência, é preciso ser clínico para apreciar a importância dêsse <strong>de</strong>fi citparticular na organização neuropsíquica do indivíduo; é preciso ser clínico


A Situação Atual da Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 111para constatar até que ponto essa insufi ciência não é senão um efeito histórico,reversível em certas condições, ou se, pelo contrário, é a expressão <strong>de</strong> umaproprieda<strong>de</strong> mais fundamental do organismo; é preciso ser clínico para distinguirse as observações provocadas não são fruto <strong>de</strong> certas resistências ou <strong>de</strong> uma mácolaboração do sujeito; é preciso ser clínico, enfi m, para po<strong>de</strong>r conduzir estasdiferentes “clínicas” que interferem contínuamente.Neste ponto <strong>de</strong> vista, a psicologia aplicada não po<strong>de</strong> ser senão clínica<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o momento em que, abandonando o estudo dos grupos como tais, seocupa <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado indivíduo.O método clínico, portanto, enquanto consi<strong>de</strong>ração do indivíduo comotal, não é exclusivo do médico, mas sim pertence a todo psicólogo, e não apenasao psicólogo que colabora profi ssionalmente com a clínica médica, mas a tôdoaquêle que se ocupa <strong>de</strong> indivíduos, <strong>no</strong>rmais ou inadaptados, nas ofi cinas, escolas,centros <strong>de</strong> orientação, etc.d) O estudo psicológico <strong>de</strong> doentes não é senão um caso particular empsicologia clínica: diríamos que é uma psicologia clínica especializada.Aliás, direi entre parênteses, que a psicologia contribuí às vêzes, <strong>de</strong>maneira <strong>de</strong>cisiva para o progresso <strong>de</strong> amplos setores da ciência médica, taiscomo a psicopatologia, a psiquiatria clínica, a neurologia, etc. O que não <strong>de</strong>vea patologia a trabalhos da importância daquêles <strong>de</strong> Gelb e Goldstein, Wechsler,Rapaport, Schafer, André Rey, Porteus, Eysenck, Inhel<strong>de</strong>r, Gemelli, Haufman eKasanin, Frank e tantos outros? A psicologia da Gestalt e o estudo das percepçõesem patologia não fi zeram progredir sensívelmente o conhecimento das ag<strong>no</strong>sias?Um estudo mais sistemático dos comportamentos não permitiu diferenciarmelhor as apraxias? O exame das capacida<strong>de</strong>s verbais e <strong>sobre</strong>tudo do vocabulário,como <strong>de</strong> outras capacida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> efi ciência intelectual não <strong>no</strong>s esclareceu sôbrea existência <strong>de</strong> diversas formas <strong>de</strong> <strong>de</strong>terioramento intelectual ou mneumônico?Quem po<strong>de</strong> negar uma melhor compreensão das neuroses, psicoses e psicopatiasgraças ao emprêgo <strong>de</strong> procedimentos psicanalíticos e projetivos em patologia?Bem entendido, o psicólogo não se ocupa <strong>de</strong> <strong>no</strong>sografi a. Êlesimplesmente procura estabelecer até que ponto os graus <strong>de</strong> variação ou ostipos <strong>de</strong> reação observados num comportamento individual correspon<strong>de</strong>m a


112 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>características fundamentais ou contingentes, reversíveis ou irreversíveis, ligadasà história ou in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>la, ligadas ao grau <strong>de</strong> motivação que intervém<strong>no</strong> exame ou sem relação com êste estado subjetivo. E dado que a conduta temnumerosos aspectos, o psicólogo <strong>de</strong>verá também relacionar entre si tôdas asreações particulares, integrar cada aspecto num todo e mostrar como êsse todocomporta necessàriamente faces e componentes diversas.Mas, por outro lado, as variações quantitativas e qualitativas da condutaevi<strong>de</strong>nciadas sôbre os doentes po<strong>de</strong>m ser, <strong>no</strong> mesmo tempo, sintomas. Nossocaso, o psicólogo fornecerá ao médico o resultado <strong>de</strong> suas investigações, cabendoao médico interpretá-las, como sintomas, com referência à ciência <strong>no</strong>sográfi ca.Em outras palavras, o psicólogo não faz diagnósticos médicos; êle caracterizacondutas, tão bem quanto possível.2. Ligado a êste problema, está o segundo, o da psicoterapia. Legalmente,apenas aos médicos é consentido curar doentes; esta importantíssima e difíciltarefa <strong>de</strong>veria ser, portanto, proibida a quem não seja médico, conseqüentementetambém aos psicólogos não formados em medicina. É esta a tese <strong>de</strong>fendida pormuitos psiquiatras.Não <strong>de</strong>vemos esquecer, entretanto, que a psicoterapia é uma forma<strong>de</strong> terapia sui generis, que não requer um preparo médico em sentido restrito,mas sim um longo preparo doutrinário e técnico <strong>de</strong> psicologia geral e aplicada,preparo que, na maioria dos casos, os médicos não possuem. Preten<strong>de</strong>r que apsicoterapia seja feita exclusivamente por pessoas com preparo médico mas sempreparo sufi ciente para aquela forma especial <strong>de</strong> terapia, é negar êste direitoa quem, mesmo sem ser formado em medicina (formação não indispensávelpara fazer psicoterapia), possui entretanto um preparo psicológico, portantomais específi co para aquela forma especial <strong>de</strong> terapia, seria um êrro grosseiro.Tomemos como exemplo a psicanálise, que é a forma <strong>de</strong> psicoterapia que éobjeto <strong>de</strong> luta mais acirrada entre psicólogos e médicos. É sabido como umaboa parte <strong>de</strong> psicanalistas, <strong>no</strong> mundo inteiro, não são médicos. Uma boa parte<strong>de</strong> médicos, por outro lado, psiquiatras compreendidos repudiam a psicanálise.Que essa aversão, <strong>de</strong>clarada ou não, <strong>de</strong> muitos médicos pela psicanálise sejaa conseqüência <strong>de</strong> uma educação e formação unilateralmente organicística <strong>de</strong>


A Situação Atual da Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 113muitos psiquiatras, ou apenas a conseqüência <strong>de</strong> falta <strong>de</strong> preparo e, portanto,<strong>de</strong> conhecimento, é assunto que não <strong>no</strong>s interessa aqui e agora. O fato é que,se negarmos aos psicólogos não médicos o direito <strong>de</strong> exercer a psicanálise, nãosaberíamos com quem substituí-los, sendo escasso o número <strong>de</strong> psicanalistasmédicos. Estes últimos, por sua vez, não acredito se aproveitem <strong>de</strong> seu preparobiológico e médico quando fazem psicanálise.A conclusão disso seria reconhecer aos psicólogos não médicos o direito<strong>de</strong> exercer a psicanálise como terapia.Mas vejamos o problema sob outro ponto <strong>de</strong> vista. Quais as doençasou os casos clínicos em que a psicoterapia é útil? Muitos, sem dúvida, mascertamente não todos. É opinião habitual, e bem fundada, por exemplo, que naspsicoses orgânicas a psicoterapia possa ser útil, mas apenas como complemento<strong>de</strong> uma terapêutica somática que permanece a base mais sólida da cura. Oprimeiro problema, portanto, é aquêle do diagnóstico. E êste o psicólogoclínico, já o dissemos, não po<strong>de</strong> fazê-lo sozinho. Mas mesmo <strong>no</strong> caso em que opsicólogo que exerce a psicoterapia trate apenas <strong>de</strong> doentes cujo diagnóstico foifeito por médicos ou em colaboração com médicos, é sufi ciente um diagnósticoinicial, Sabemos, por exemplo, quantas vêzes um diagnóstico diferencial entreneuroses e esquizofrenia oscile durante meses antes que se possa formular umjulgamento seguro, e quantas vêzes o diagnóstico é mudado durante o <strong>de</strong> cursoda terapia, justamente por esta fazer surgir elementos <strong>no</strong>vos. E há outros casos <strong>de</strong>diagnóstico mais difícil e enga<strong>no</strong>so, por exemplo entre neuroses e doenças bemmais grosseiramente orgânicas. Todos nós po<strong>de</strong>mos citar, em <strong>no</strong>ssa experiênciapessoal, casos <strong>de</strong> paralisia progressiva <strong>de</strong> tumor cerebral ou <strong>de</strong> aneurismaendocrania<strong>no</strong> que, durante meses, apresentaram apenas uma sintomatologiasubjetiva <strong>de</strong> tipo claramente psiconevrósico. O que acontece nestes casos, emque o êrro diagnóstico não é advertido e em que o psicoterapêuta continúa seutratamento, quase sempre sem sucesso, baseando-se num diagnóstico inicial domédico?Penso eu que a única solução razoável para todos êstes problemas sejaa seguinte: <strong>no</strong> setor específi co da psicoterapia, o psicólogo <strong>de</strong>verá trabalharobrigatòriamente em colaboração com o médico, colaboração verda<strong>de</strong>ira ecriadora, e não simples coexistência pacífi ca ou tolerância recíproca.


114 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Estas consi<strong>de</strong>rações foram feitas exclusivamente para <strong>de</strong>monstrar acomplexida<strong>de</strong> do tópico I, para o qual me foi pedida uma resposta.Antes da organização <strong>de</strong> Cursos em nível universitário, a formação<strong>de</strong>pendia mais <strong>de</strong> recursos, interêsses e <strong>de</strong>dicação <strong>de</strong> cada um: é difícil julgar,evi<strong>de</strong>ntemente, do preparo dêstes profi ssionais. Por outro lado, levando-seem consi<strong>de</strong>ração os Cursos <strong>de</strong> Pós-Graduação, organizados <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> antes dapromulgação da lei nº 4119, e que vieram ao meu conhecimento (cursos êstesque, por sugestão conjunta <strong>de</strong> Lourenço Filho, Pe. A. Benkö, P. Parafi ta Bessa, C.Martuscelli e Enzo Azzi, não <strong>de</strong>veriam ter aceito mais matrículas iniciais a partir<strong>de</strong> 1963 e <strong>de</strong>veriam encerrar suas ativida<strong>de</strong>s até o fi m do a<strong>no</strong> acadêmico <strong>de</strong> 1964,para dar lugar ao Curso <strong>de</strong> Psicologia reservado exclusivamente para Bacharéisou Licenciados em Psicologia), a resposta à pergunta po<strong>de</strong> ser afi rmativa. Êlesforneceram os instrumentos indispensáveis básicos sufi cientes a um início <strong>de</strong>profi ssão e sem dúvida contribuíram <strong>no</strong>tàvelmente para a melhoria do padrãotécnico do psicólogo profi ssional. Evi<strong>de</strong>ntemente, um <strong>de</strong>sempenho plenamentesatisfatório só seria possível após a experiência prática <strong>de</strong> vários a<strong>no</strong>s, como é ocaso <strong>de</strong> qualquer profi ssão liberal.A resposta afi rmativa é válida <strong>sobre</strong>tudo pelo que diz respeito aodiagnóstico psicológico, à orientação psicopedagógica e à orientação e seleçãoprofi ssional. As <strong>de</strong>fi ciências maiores, a meu ver, se referem:a) ao preparo psicoterapêutico, geralmente falho teórica e pràticamente;b) à falta <strong>de</strong> uma maior base neurofi siológica, falta que induzfreqüentemente os psicólogos a um “psicologismo” perigoso, isso é à<strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração nas condutas, <strong>sobre</strong>tudo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sajustamento, <strong>de</strong> motivaçõesoutras que não as psicogênicas;c) à falta <strong>de</strong> um maior preparo estatístico, imprescindível para uso einterpretação correta e a<strong>de</strong>quada dos resultados <strong>de</strong> muitas técnicas psicológicas.A recente legislação traz contribuições reais à profi ciência, não sópelo fato <strong>de</strong> se estruturar um curso <strong>de</strong> nível universitário, <strong>de</strong> longa duração (5a<strong>no</strong>s) e com gran<strong>de</strong>s exigências, mas também porque amplia a segurança e aconsciência do psicólogo como profi ssional, eliminando do campo <strong>de</strong> trabalhotodo indivíduo não <strong>de</strong>vidamente preparado e evitando os males <strong>de</strong>correntes da


A Situação Atual da Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 115audácia dos improvisadores que se erigem em psicólogos sem preparo técnicoe muitas vêzes sem respeitar os princípios elementares que <strong>de</strong>vem orientar aconduta do profi ssional.Naturalmente, a lei não traz em si mesma as condições necessárias parauma mudança completa; essa mudança será conseguida se as Faculda<strong>de</strong>s queobtiverem autorização para instalar Cursos <strong>de</strong> Psicologia tomarem consciência<strong>de</strong> que a Psicologia é “ciência em formação” e que a abordagem experimentaldos problemas e a acentuação do interêsse pela pesquisa é <strong>de</strong> capital importâncianessa etapa.II TÓPICO –De que maneira seria afetada a ativida<strong>de</strong> dopsicólogo <strong>no</strong> que diz respeito aos seus direitos e<strong>de</strong>veres, pela regulamentação da lei 4119? Demodo geral, como qualifi car essa modifi cação?Esta regulamentação, tal como foi sugerida pela Comissão <strong>no</strong>meada peloMinistro da Educação em obediência ao artigo 23 da Lei 4119 e constituída pelosProfessôres M. B. Lourenço Filho, Pe. A. Benkö, P. Parafi ta Bessa, C. Martuscelli eEnzo Azzi, afeta benèfi camente a ativida<strong>de</strong> do psicólogo, pois:a) <strong>de</strong>clara livre em todo território nacional exercício da profi ssão <strong>de</strong>psicólogo;b) reserva a <strong>de</strong>signação profi ssional <strong>de</strong> psicólogo aos habilitados naforma <strong>de</strong> legislação vigente;c) limita o exercício da profi ssão <strong>de</strong> psicólogo;c-1) aos possuidores <strong>de</strong> diploma <strong>de</strong> psicólogo expedido <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> porFaculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a ofi cial ou reconhecida;c-2) aos diplomados em Psicologia por Universida<strong>de</strong>s ou Faculda<strong>de</strong>estrangeira reconhecidas pelas leis do país <strong>de</strong> origem, cujos diplomas tenhamsido revalidados <strong>de</strong> conformida<strong>de</strong> com a legislação em vigor;c-3) aos atuais portadores <strong>de</strong> diploma ou certifi cado <strong>de</strong> especialista emPsicologia, Psicologia Educacional, Psicologia Aplicada ao Trabalho expedidospor estabelecimento <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior ofi cial ou reconhecido, após estudos


116 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>em cursos regulares <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> psicólogos, com duração mínima <strong>de</strong> quatroa<strong>no</strong>s, ou estudos regulares em cursos <strong>de</strong> pós-graduação, com duração mínima<strong>de</strong> dois a<strong>no</strong>s;c-4) aos atuais portadores do título <strong>de</strong> Doutor em Psicologia e <strong>de</strong> Doutorem Psicologia Educacional, bem como àquêles portadores <strong>de</strong> título <strong>de</strong> Doutorem Filosofa, em Educação ou em Pedagogia que tenham <strong>de</strong>fendido tese sôbreassunto concernente à Psicologia;c-5) aos funcionários públicos efetivos que, em data anterior ao dia 5 <strong>de</strong>Setembro <strong>de</strong> 1962, tenham sido providos em cargos ou funções públicas, sob as<strong>de</strong><strong>no</strong>minações <strong>de</strong> Psicólogo, Psicologista ou Psicotécnico;c-6) aos militares que, em data anterior ao dia 5-9-1962, tenham obtidodiplomas conferidos pelo Curso criado pela Portaria nº 171, <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong>1949, do Ministério da Guerra;c-7) às pessoas que, até o dia 5 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1962, já tenham exercidopor mais <strong>de</strong> 5 a<strong>no</strong>s, ativida<strong>de</strong>s profi ssionais <strong>de</strong> psicologia aplicada.d) exige, como condição indispensável para o exercício legal da profi ssão<strong>de</strong> Psicólogo, o registro profi ssional <strong>de</strong> Psicólogo na Diretoria do Ensi<strong>no</strong> Superiordo Ministério da Educação e Cultura.e) fi nalmente estabelece como funções <strong>de</strong> psicólogo as seguintes:e-1) utilizar métodos e técnicas psicológicas com o objetivo <strong>de</strong> diagnósticopsicológico, orientação e seleção profi ssional, orientação psicopedagógica,solução <strong>de</strong> problemas <strong>de</strong> ajustamento;e-2) dirigir serviços <strong>de</strong> psicologia em órgãos e estabelecimentospúblicos, autárquicos, paraestatais, <strong>de</strong> eco<strong>no</strong>mia mista e particulares;e-3) ensinar as ca<strong>de</strong>iras ou disciplinas <strong>de</strong> psicologia <strong>no</strong>s vários níveis <strong>de</strong>ensi<strong>no</strong>, observadas as <strong>de</strong>mais exigências da legislação em vigor;e-4) supervisionar profi ssionais e alu<strong>no</strong>s em trabalhos teóricos e práticos<strong>de</strong> psicologia;e-5) assessorar, tècnicamente, órgãos e estabelecimentos públicos,autárquicos, paraestatais, <strong>de</strong> eco<strong>no</strong>mia mista e particulares;e-6) relatar perícias e emitir pareceres sôbre a matéria <strong>de</strong> psicologia.


A Situação Atual da Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 117Estranhei não ver, na regulamentação assinada pelo Sr. Presi<strong>de</strong>nte daRepública, tôda a parte que a Comissão tinha sugerido, referente à criação doConselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia, com jurisdição em todo o território nacional, edos Conselhos Regionais <strong>de</strong> Psicologia, com funções <strong>de</strong> disciplina e fi scalizaçãodo exercício da profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo.Estranhei também que o prazo <strong>de</strong> encerramento dos Cursos <strong>de</strong> Pós-Graduação ou <strong>de</strong> Especialização em Psicologia tenha sido adiado até1967,quando a Comissão tinha sugerido, baseada em razões difícilmente atacáveis,que êste prazo se encerasse em 1963.III TÓPICO – Tem sido a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo capaz <strong>de</strong> atrairvocações em número sufi ciente para aten<strong>de</strong>r aosreclamos da comunida<strong>de</strong>? Quais as perspectivasque, nesse contexto, traz a proteção legal?Duas observações preliminares, antes <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a êste tópico:1. É sabido como a Psicologia contemporânea, quer <strong>no</strong>rmal querpatológica, é uma ciência em ple<strong>no</strong> e confuso <strong>de</strong>senvolvimento, e que, se <strong>de</strong>um lado apresenta um conteúdo surpreen<strong>de</strong>ntemente rico, variado e complexo,por outro é agitada por teorias contraditórias (aliás fecundas para o progressoda ciência) que a tornam me<strong>no</strong>s segura daquilo que freqüentemente se supõe.Ela po<strong>de</strong> oferecer muito à <strong>no</strong>ssa socieda<strong>de</strong> inquieta, não tanto, porém, quantoesta necessita, e nem tanto como vastos setôres da socieda<strong>de</strong> atual, ingênua eprecipitadamente, <strong>de</strong>la esperam ou exigem. E <strong>sobre</strong>tudo a psicologia <strong>de</strong>ve evitar<strong>de</strong> se tornar instrumento <strong>de</strong> opressão social, confundindo (e esta confusãoseria por <strong>de</strong>mais simples, ou melhor, por <strong>de</strong>mais <strong>de</strong>sonesta) uma or<strong>de</strong>m socialinjusta com uma <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m psicológica e conseqüentemente tentar substituirações sociais a<strong>de</strong>quadas por medidas mais ou me<strong>no</strong>s paternalísticas e inócuas <strong>de</strong>higiene mental, relações humanas ou coisa que se equivalha.2. Às vêzes tem-se a impressão que a jovem ciência que é a psicologia,tenta se impôr adotando um nível <strong>de</strong> aspiração irreal, isto é, ela se propõe umfi m sem consi<strong>de</strong>rar as possibilida<strong>de</strong>s concretas para essa realização, e isto na


118 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>esperança <strong>de</strong> atingir o nível das ciências físicas. Deparamo-<strong>no</strong>s aqui com umadas manifestações do <strong>de</strong>sejo da psicologia <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminar seus objetivos segundoo modêlo das outras ciências, ao invés <strong>de</strong> os adaptar à natureza própria dosfenôme<strong>no</strong>s que ela estuda. Êste tipo <strong>de</strong> comportamento é um sistema <strong>de</strong>infantilismo ou falta <strong>de</strong> maturida<strong>de</strong>. Estamos convencidos <strong>de</strong> que uma verda<strong>de</strong>iraciência psicológica <strong>de</strong>verá alimentar me<strong>no</strong>s ilusões sôbre suas possibilida<strong>de</strong>s e sepropôr objetivos mais “orientífi cos”. Por isso o psicólogo, hoje, embora confi e nafecundida<strong>de</strong> do seu trabalho, é um homem dolorosamente consciente <strong>de</strong> caraterincoativo <strong>de</strong> sua ciência, das fi ssuras doutrinárias que quebram sua unida<strong>de</strong>, dotorpor <strong>de</strong> muitos dos seus métodos e <strong>sobre</strong>tudo da sutil e esquiva complexida<strong>de</strong>das realida<strong>de</strong>s que estuda.Voltando ao <strong>no</strong>sso tópico, a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo, se atraiu muitoscuriosos, alguns bem intencionados, outros utilizadores fraudulentos ecomerciais da elegante simplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> certas técnicas psicológicas (e que muitotem contribuído para o <strong>de</strong>scrédito da profi ssão em tôdos os setôres), não atraíu“vocações” em número sufi ciente para aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s da comunida<strong>de</strong>,por muitas razões, entre outras:a) as incertezas do exercício profi ssional, <strong>de</strong>corrente também da falta <strong>de</strong>reconhecimento legal da profi ssão;b) a existência <strong>de</strong> poucos cursos <strong>de</strong> nível universitário com conseqüentesdifi culda<strong>de</strong>s do preparo acadêmico;c) o preconceito, difundido até em meios cultos, <strong>de</strong> que o psicólogo nãopassa <strong>de</strong> um psicometrista e, portanto, só com direito ao exercício <strong>de</strong> funçõessubalternas <strong>no</strong> esquema do trabalho;d) e ainda pouco esclarecimento do gran<strong>de</strong> público sôbre as funções doPsicólogo, que às vêzes é confundido com o orientador educacional, outros como psiquiatra ou o psicanalista, outros são às vêzes consi<strong>de</strong>rados simples aplicidor<strong>de</strong> testes.Mas não basta preparar profi ssionais para conseguir a aceitação <strong>de</strong> suaimportância, pois o trabalho do psicólogo sempre tem encontrado barreirasbaseadas <strong>no</strong> preconceito <strong>de</strong> ser a Psicologia “ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> luxo”. Na medida emque a profi ssão ganhar prestígio pelo reconhecimento do seu valor social, estasbarreiras ten<strong>de</strong>rão a <strong>de</strong>saparecer.


A Situação Atual da Profi ssão <strong>de</strong> Psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> 119Não duvidamos que o atual status legal abreviará êste processo e atrairámaior número <strong>de</strong> elementos, principalmente do sexo masculi<strong>no</strong> (representados,até o momento, por uma mi<strong>no</strong>ria reduzida), pelas seguintes razões:a) maior estabilida<strong>de</strong> profi ssional e maiores garantias <strong>de</strong> trabalho e, porconseguinte, maiores possibilida<strong>de</strong>s econômicas;b) maior aceitação social e por parte <strong>de</strong> outras classes profi ssionais, comconseqüente melhoria das condições <strong>de</strong> trabalho em equipe;c) limitação e proibição <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s abusivas e charlatanescas, aindatão comuns entre nós.IV TÓPICO –Existem entre os ramos <strong>de</strong> especialização inferidosdo artigo 16 da Lei 4119, diferentes expectativas<strong>de</strong> retribuição fi nanceira, <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong> trabalhoe <strong>de</strong> status na classe dos psicólogos? Se sim, <strong>de</strong>veseou po<strong>de</strong>-se corrigir essas diferenças? Como?Pelo que diz respeito, em primeiro lugar, à retribuição fi nanceirae <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> trabalho, sem dúvida a indústria e o comércio oferecem asmelhores possibilida<strong>de</strong>s, econômicas também, para os psicólogos e por êssesmotivos os psicólogos especializados <strong>no</strong> ramo do Trabalho estão, e acho quepor bastante tempo ainda estarão, pelo me<strong>no</strong>s em São Paulo, em condiçõesprivilegiadas. Em seguida vem os psicólogos clínicos, em último os psicólogoseducacionais (escolares): a êsse respeito seria interessante discutir (mas não meacho competente para isso) as relações entre orientação educacional (obrigatóriaem <strong>no</strong>ssas escolas secundárias) e a orientação psicopedagógica que, em base àLei 4119, é função privativa do psicólogo.Pelo que diz respeito, em 2º lugar, ao estatus social, talvez aos psicólogosclínicos se atribua o status mais elevado, pela própria natureza <strong>de</strong> suas ativida<strong>de</strong>s(diagnóstico psicológico, solução <strong>de</strong> problemas <strong>de</strong> ajustamento, etc.) que astorna semelhantes e, aos olhos <strong>de</strong> muitos, idênticas as ativida<strong>de</strong>s médicas, isto é,<strong>de</strong> um profi ssional <strong>de</strong> status reconhecidamente elevado.


120 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Estas diferenças, aliás, existem em tôdas as outras profi ssões (porexemplo, entre as várias especialida<strong>de</strong>s médicas, tôdas <strong>de</strong> igual nível universitário,mas muito diferentes quanto aos atributos apontados), e não vejo sinceramenteque se <strong>de</strong>vam e nem se possam ser corrigidas, principalmente <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> umregime <strong>de</strong> livre iniciativa. Os <strong>de</strong>sníveis talvez se tornem me<strong>no</strong>s acentuados, àmedida em que aumentar a procura <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> cada ramo.V TÓPICO –Po<strong>de</strong> a ativida<strong>de</strong> do psicólogo ser consi<strong>de</strong>radacomo uma profi ssão liberal? Quais as <strong>de</strong>corrências<strong>de</strong>ssa qualifi cação para o estabelecimento <strong>de</strong> umcódigo <strong>de</strong> ética?Sem dúvida alguma, a ativida<strong>de</strong> do psicólogo se enquadra perfeitamente<strong>de</strong>ntro das profi ssões liberais, pois:a) a ativida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser exercida com in<strong>de</strong>pendência, sem vinculaçõeshierárquicas;b) a ativida<strong>de</strong> é livre;c) a ativida<strong>de</strong> se caracteriza pela predominância do exercício dasfaculda<strong>de</strong>s intelectuais e conhecimentos técnicos (tal como a ativida<strong>de</strong> domédico, advogado, engenheiro, etc.).Assim sendo, o passo necessário para estabelecer um Código <strong>de</strong> ética<strong>de</strong>verá ser a criação <strong>de</strong> um Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia, que admitindo atodos os psicólogos em igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> direitos e <strong>de</strong> <strong>de</strong>veres, possa elaborar êsseCódigo e exigir o estrito apêgo dos psicólogos às <strong>no</strong>rmas <strong>de</strong> conduta profi ssionalestabelecidas, pelo que diz respeito, por exemplo. às relações com os clientes,com os colegas, com outros profi ssionais, com a Justiça, com Instituiçõesassistenciais, ao segrêdo profi ssional, aos ho<strong>no</strong>rários profi ssionais, à propaganda,etc.


CAPÍTULO 6ENZO AZZI (1921-1985), UM MÉDICOITALIANO NA PSICOLOGIA BRASILEIRAMaria do Carmo Gue<strong>de</strong>sNascido em Mantova (Itália), Enzo Azzi tinha 28 a<strong>no</strong>s quando chegou<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> em <strong>no</strong>vembro <strong>de</strong> 1949. Tinha sido contratado, ainda na Itália, parainstalar, na Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo 1 , um Laboratório <strong>de</strong> PsicologiaExperimental voltado ao ensi<strong>no</strong> e à pesquisa, marco inicial <strong>de</strong> um futuro Instituto<strong>de</strong> Psicologia que a Universida<strong>de</strong> Católica vai inaugurar a<strong>no</strong> e meio <strong>de</strong>pois, como <strong>no</strong>me então <strong>de</strong> “Instituto <strong>de</strong> Psicologia e Pedagogia”, unida<strong>de</strong> acadêmicadiretamente ligada à Reitoria (Azzi, 1952). Vinha indicado pelo Diretor doInstituto Salesia<strong>no</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> Turim, Professor Giacomo Lorenzini, comcarta <strong>de</strong> recomendação que <strong>de</strong>staca seu zelo <strong>no</strong> <strong>de</strong>sempenho das funções eentusiasmo pelas disciplinas que escolheu e sua vasta preparação doutrinária eplena capacida<strong>de</strong> para exercê-la como médico e como docente.Ocupou importante posto na psicologia brasileira – foi membroda Comissão que, em 1962, o Ministro da Educação <strong>no</strong>meou, aten<strong>de</strong>ndo à1 Era por este <strong>no</strong>me que a PUC era então conhecida, embora Pontifícia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1946. Aprópria Revista da Universida<strong>de</strong> era assim <strong>no</strong>meada ainda em 1952, a<strong>no</strong> em que é publicadoo discurso <strong>de</strong> Azzi na inauguração do IPPUC/SP.


122 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>regulamentação na área; e na ciência em São Paulo – integrou o primeiroConselho Superior da Fundação <strong>de</strong> Amparo à Pesquisa <strong>no</strong> Estado <strong>de</strong> São Paulo(FAPESP), presidido pelo então Reitor da USP. Diretor do IPPUC-SP, colaborou,como Assessor Técnico, com a Secretaria da Educação do Estado <strong>de</strong> São Paulo e oJuizado <strong>de</strong> Me<strong>no</strong>res <strong>de</strong> São Paulo nas áreas <strong>de</strong> orientação educacional e vocacional(1954-1965), além <strong>de</strong> chefi ar convênio da PUC-SP com o Serviço <strong>de</strong> DoençasMentais do Ministério da Saú<strong>de</strong> (1962-1969) e com a Secretaria <strong>de</strong> Educação doEstado <strong>de</strong> São Paulo, que comissionava <strong>no</strong> IP professores em pesquisa e estágio.Participou como sócio fundador <strong>de</strong> associações como a Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong>Psicologia Religiosa e a Associação <strong>Brasil</strong>eira para o Estudo Científi co da DoençaMental. Exerceu cargos em diretorias <strong>de</strong> associações como a Socieda<strong>de</strong> Pestalozzi<strong>de</strong> São Paulo (1953-1954) e a Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo (1961-1964). Eintegrou Comissões como a da SPSP para elaboração <strong>de</strong> um Código <strong>de</strong> Ética paraPsicólogos, a <strong>de</strong> Exame <strong>de</strong> Requerimentos para Registro Profi ssional <strong>de</strong> Psicólogo(MEC, 1962-1963), a <strong>de</strong> Cinema e Publicações (Juizado Privativo <strong>de</strong> Me<strong>no</strong>res <strong>de</strong>São Paulo) e a <strong>de</strong> Combate à Defi ciência Mental (MEC, 1966) (Gue<strong>de</strong>s, 2001).Médico em 1947 pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Parma (“à parmegiana”, brincavaele), Enzo Azzi trabalhou na Clínica Neuropsiquiátrica <strong>de</strong>ssa instituição comoAssistente Voluntário, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo tese <strong>sobre</strong> alucinações. Paralelamente, fezespecialização em Psicologia e Pedagogia <strong>no</strong> Ateneu Salesia<strong>no</strong> <strong>de</strong> Turim 2 , on<strong>de</strong> seiniciou em pesquisa experimental com crianças, <strong>sobre</strong> percepção estereoscópica.Ao chegar, teria logo pedido reconhecimento <strong>de</strong> seu título <strong>de</strong> médico,providência que <strong>de</strong>morou perto <strong>de</strong> 20 a<strong>no</strong>s a ser respondida. No entanto, maisfeliz que Mira y Lopes – médico estrangeiro formado na Espanha, que fez suacarreira na psicologia brasileira à mesma época, mas <strong>no</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, Azziobteve autorização para praticar a medicina <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> antes <strong>de</strong> sua morte, o que2 Foi com apoio dos Salesia<strong>no</strong>s que Azzi trouxe para o <strong>Brasil</strong> um laboratório <strong>de</strong> psicofi siologiae psicofísica à moda dos que se instalaram <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1940 em diversas instituições (na Itália,na Bélgica, na Alemanha) (Hillmann, 1958). Em anexo, foto <strong>de</strong> uma das ativida<strong>de</strong>s nainauguração do IPPUC/SP em 1951.


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 123lhe permitiu chegar a chefe do Departamento <strong>de</strong> Psiquiatria e Psicologia Médicana Escola <strong>de</strong> Ciências Médicas da Santa Casa <strong>de</strong> São Paulo, on<strong>de</strong> lecionavaPsicologia médica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> meados dos a<strong>no</strong>s 1960.Mas Enzo Azzi é, acima <strong>de</strong> tudo, lembrado por seus ex-alu<strong>no</strong>s da PUC-SP, da Católica <strong>de</strong> Campinas e da Santa Casa com muito carinho e muito respeito,por seu competente e entusiasmado <strong>de</strong>sempenho como professor.Pouco mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois, pensava, <strong>sobre</strong> a regulamentação daprofi ssão <strong>de</strong> psicólogo e sua formação, o que se lê <strong>no</strong> artigo <strong>de</strong> 1963, que integraesta coletânea. Como se preten<strong>de</strong> mostrar em seguida, uma posição contrária àdos médicos (<strong>de</strong>fendida ainda hoje, como se vê <strong>no</strong> “Ato médico” que, em 2003,retoma, ampliando para outras áreas além da psicologia, antigo projeto dosmédicos e <strong>de</strong>putados estaduais Pedro Kassab e Salvador Julianelli; mas contrária,também, à dos psicotécnicos, <strong>de</strong>fendida em proposta enviada ao MEC em 1954pela Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicotécnica (RPNP 3 , 1956).Para melhor compreen<strong>de</strong>r sua posição, serão apresentados alguns dados<strong>sobre</strong> sua relação com a Psicologia brasileira <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua chegada a São Paulo;segue-se análise <strong>de</strong> sua proposta para um “Curso <strong>de</strong> formação em Psicologia”(RPNP, 1963) e uma rápida <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> sua atuação junto à formação médica,permitindo concluir que e por que, para ele, a psicoterapia não era uma questãopara médicos ou psicologistas (título que aparece na proposta dos psicotécnicos),mas para psicólogos clínicos e, mais tar<strong>de</strong>, “clínicos” com estudos em psicologiamédica e psicopatologia.1 A Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> em 1950À chegada <strong>de</strong> Azzi, a Psicologia na PUC-SP era apenas uma cátedra naFaculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a, Ciências e Letras (FFCL) <strong>de</strong> São Bento, com uma disciplina<strong>no</strong> Curso <strong>de</strong> Filosofi a – Psicologia científi ca (que lhe ren<strong>de</strong>u seu primeiro contrato3 A Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica – revista do Instituto <strong>de</strong> Psicologia da PUC-SP,será referida ao longo do texto como RPNP.


124 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>como professor <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>) e uma disciplina <strong>no</strong> curso <strong>de</strong> Pedagogia – Psicologiada Educação, então confi ada a um padre belga. Na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo(USP), também submetida então ao sistema <strong>de</strong> cátedras, duas cátedras diferentesrespondiam por disciplinas na área, uma para o Curso <strong>de</strong> Filosofi a (dirigida porAnnita Cabral e com várias disciplinas); e uma que atendia ao Curso <strong>de</strong> Pedagogiae às Licenciaturas dos diversos cursos da FFCL (também com várias disciplinase sob direção <strong>de</strong> Noemy Silveira, <strong>de</strong>pois Rudolfer). Agregada à PUC para fi ns<strong>de</strong> ofi cialização junto ao MEC, mas <strong>de</strong>la totalmente in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte (apenastinha presença e voto <strong>no</strong> Conselho Universitário), havia também a FFCL Se<strong>de</strong>sSapientiae, na qual a Psicologia, ensinada <strong>no</strong>s cursos <strong>de</strong> Filosofi a e Pedagogia,era dirigida por Madre Cristina (Celia Sodré Dória).Ainda em São Paulo, uma Associação <strong>de</strong> classe recentemente criada – aSocieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo (SPSP em 1945), já editava um periódico– o Boletim <strong>de</strong> Psicologia (1949-). Além <strong>de</strong>ssas, mais três instituições chamamlogo a atenção do jovem pesquisador: a Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira para o Progressoda Ciência (SBPC), criada em 1948 e na qual a Psicologia compõe a Seção F –com Antropologia e Sociologia; e duas instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior: a EscolaLivre <strong>de</strong> Sociologia e Política (ELSP), criada em 1933 e a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Eco<strong>no</strong>mia,Administração e Ciências Contábeis da USP, criada em 1946, instituiçõesque então colaboram diretamente com profi ssionais <strong>de</strong> diferentes áreas 4em sua contribuição à mo<strong>de</strong>rnização do país. É nelas que Azzi vai encontrar4 As transformações <strong>no</strong> cenário urba<strong>no</strong>-industrial <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> levam a <strong>no</strong>vas formas <strong>de</strong>organização racional do trabalho. A Psicologia, por meio da Psicotécnica, assume o papel daciência responsável por organizar as técnicas e métodos relacionados à gestão administrativa.Foi o engenheiro suíço Roberto Mange que, em 1924, <strong>no</strong> Liceu <strong>de</strong> Artes e Ofícios <strong>de</strong> SãoPaulo, aplicou pela primeira vez testes para fi ns <strong>de</strong> seleção profi ssional. Na década <strong>de</strong> 1930,é criado o Instituto <strong>de</strong> Organização Racional do Trabalho – o IDORT. Observa-se, a partirdaí, a infl uência da Psicologia na administração pública e privada, por meio <strong>de</strong> sua atuaçãoem instituições como a Escola Livre <strong>de</strong> Sociologia e Política, a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Administração,Eco<strong>no</strong>mia e Ciências Contábeis da USP, o SENAI, a Fundação Getúlio Vargas, o DepartamentoAdministrativo do Serviço Público - DASP, a Associação <strong>Brasil</strong>eira para Prevenção <strong>de</strong> Aci<strong>de</strong>ntese o Conselho <strong>de</strong> Higiene e Segurança do Trabalho (Antunes, 2003).


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 125Aniela Ginsberg (1982-1986), colaboradora muito próxima <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1951, chefedo Laboratório <strong>de</strong> Psicologia Social na ELSP, a quem vai entregar em 1959 oDepartamento <strong>de</strong> Pesquisa do IPPUC-SP; e Raul <strong>de</strong> Moraes, um dos assinantes daAta <strong>de</strong> Fundação da SBPC e professor na Administração da USP, que trará paralecionar Estatística <strong>no</strong> IP <strong>no</strong> Curso <strong>de</strong> Especialização em Psicologia (em 1959) e<strong>no</strong> Curso <strong>de</strong> Psicologia da São Bento (em 1964).Fora <strong>de</strong> São Paulo, vale citar pelo me<strong>no</strong>s dois periódicos que davamconta do que ocorria na área <strong>no</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro: os Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong>Psicotécnica (hoje Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicologia), revista do Instituto <strong>de</strong>Seleção e Orientação Profi ssional (ISOP), da Fundação Getúlio Vargas (FGV),iniciada também em 1949; e o Boletim <strong>de</strong> Psicologia da Universida<strong>de</strong> do <strong>Brasil</strong>(1951-1952). Cabe citar ainda eminente historiador da psicologia brasileira, oProfessor Paulo Rosas, que em 1997 diz, em entrevista ao periódico Estudos <strong>de</strong>Psicologia (Natal):…eu não tinha com quem dialogar, era pouca gente (…) [e]ntãoas dúvidas que eu tinha, principalmente na parte <strong>de</strong> pesquisa… eujuntava e mais ou me<strong>no</strong>s uma vez <strong>no</strong> a<strong>no</strong>, ou para congresso, ou parao que fosse, eu ia ao Rio, São Paulo. E então, eu procurava pessoas,me apresentava. Eu as procurava com aquelas questões, com problemasque eu não conseguia resolver. Não tinha quem <strong>de</strong>sse orientaçãodireta... não havia cursos regulares, mestrados... Então, eu tive muitocontato nesse tempo e <strong>de</strong>sse tipo com Enzo Azzi, em São Paulo… era aFaculda<strong>de</strong> São Bento... – ele me escrevia, dava indicações etc. (Campos,p. 317)2 Enzo A zzi na Psicologia <strong>Brasil</strong>eiraEnzo Azzi foi professor principalmente na PUC-SP, na Universida<strong>de</strong>Católica <strong>de</strong> Campinas, <strong>no</strong> Curso <strong>de</strong> Ciências Médicas da Santa Casa <strong>de</strong> São Paulo.Começou lecionando Psicologia Científi ca (para alu<strong>no</strong>s <strong>de</strong> Filosofi a), PsicologiaGeral e da Educação (para Pedagogia e Serviço Social), respon<strong>de</strong>u por váriasdisciplinas <strong>no</strong>s cursos para especialistas e na Graduação em Psicologia e termi<strong>no</strong>u


126 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>sua carreira como professor <strong>no</strong> curso <strong>de</strong> medicina da Santa Casa <strong>de</strong> São Paulo,on<strong>de</strong> dirigiu o Departamento <strong>de</strong> Psiquiatria e Psicologia Médica. Na década <strong>de</strong>1950 criou, na PUC-SP, em colaboração com a FFCL <strong>de</strong> São Bento, os cursos <strong>de</strong>Especialização em Psicologia Clínica e do Trabalho e em Orientação Educacionale, em 1961, o <strong>de</strong> graduação em Fo<strong>no</strong>audiologia.Com boa formação em pesquisa, respon<strong>de</strong>u pela criação do Boletim <strong>de</strong>Psicologia do Instituto <strong>de</strong> Psicologia Educacional e Experimental (1952-1954),substituído em 1955 pela Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica (RPNP),que dirigiu até o último número, publicado em 1973. Quase <strong>de</strong>z a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois<strong>de</strong> terminada (após saída <strong>de</strong> Azzi da PUC), a RPNP trazia ainda para a Bibliotecada Universida<strong>de</strong> muitos dos mais <strong>de</strong> 150 periódicos com os quais chegoua ser intercambiada <strong>de</strong>s<strong>de</strong> seu primeiro número. Em 1962, imediatamenteapós regulamentação da profi ssão, propôs à FFCL <strong>de</strong> São Bento um Curso <strong>de</strong>Graduação em Psicologia, que dirigiu até 1968 5 . Era um curso em tempo integral,com seis a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> duração e dois Trabalhos <strong>de</strong> Conclusão <strong>de</strong> Curso – uma pesquisaexperimental para obtenção do título <strong>de</strong> Bacharel, após o 4° a<strong>no</strong> e outro para otítulo <strong>de</strong> Psicólogo, <strong>de</strong>pois do 6° a<strong>no</strong>, este em pesquisa clínica ou experimental– ambos os TCCs a serem <strong>de</strong>fendidos publicamente (RPNP, 1963).No IPPUC-SP, criou ou acolheu movimentos que mostravam tanto seucompromisso com a psicologia e a formação do psicólogo 6 , como seu entusiasmocom as i<strong>no</strong>vações para a área. Publicou por alguns a<strong>no</strong>s, como Anexo à RPNP, oBoletim da Divisão Nacional do <strong>Brasil</strong> da The International Society for Clinicaland Experimental Hyp<strong>no</strong>sis; divulgou, na seção “Crônicas e Documentação” darevista, toda espécie <strong>de</strong> <strong>no</strong>tícia <strong>sobre</strong> Psicologia e áreas afi ns (livros e periódicos,cursos, congressos, legislação, abertura <strong>de</strong> associações – tanto locais comointernacionais...). E trouxe, para cursos, simpósios e conferências, importantes5 Em 1968, Azzi assumiu a direção da FFCL <strong>de</strong> São Bento, <strong>de</strong>ixando a Coor<strong>de</strong>nação do Curso<strong>de</strong> Psicologia ao Professor Raul <strong>de</strong> Moraes.6 Para se ter i<strong>de</strong>ia, <strong>no</strong> período 1958-1966 (quatro a<strong>no</strong>s antes e quatro a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois da leique regulamentou a profi ssão), a sua revista era a única que vinha regularmente publicandoartigos <strong>sobre</strong> o tema.


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 127pesquisadores estrangeiros, convidados diretamente pelo IP ou trazidos ao <strong>Brasil</strong>por outras instituições e brasileiros, das mais diversas áreas e posturas teóricas(RPNP, seção Crônicas e Documentação, 1955-1973).3 A formação do psicólogo na proposta <strong>de</strong> 1962Importante documento para compreensão do pensamento <strong>de</strong> Enzo Azzi<strong>sobre</strong> a formação do psicólogo é, sem dúvida, sua proposta para um Curso <strong>de</strong>Psicologia, que propõe à PUC em 1962, tão logo aprovada a lei 4119/62, que“dispõe <strong>sobre</strong> os cursos <strong>de</strong> formação em Psicologia e regulamenta a profi ssão <strong>de</strong>psicólogo”. Publicada na íntegra na RPNP (1963), sua proposta provocou, paraeste texto, a análise que segue.A ser cumprido em tempo integral e ao longo <strong>de</strong> seis a<strong>no</strong>s, o Cursoatribuiria três diferentes títulos: o <strong>de</strong> Bacharel (ao fi nal do 4° a<strong>no</strong> e após <strong>de</strong>fesapública <strong>de</strong> pesquisa experimental), título que permitia ao egresso <strong>de</strong>dicar-se àpesquisa, indo então para cursos <strong>de</strong> pós-graduação; o <strong>de</strong> Licenciado (que exigia,além do diploma <strong>de</strong> bacharel, três disciplinas pedagógicas oferecidas peloCentro <strong>de</strong> Educação); e o <strong>de</strong> Psicólogo, em duas modalida<strong>de</strong>s: Psicologia Clínicae Psicologia do Trabalho, a ser liberado após mais dois a<strong>no</strong>s e <strong>de</strong>fesa pública <strong>de</strong>pesquisa com metodologia clínica ou experimental.Percebe-se na gra<strong>de</strong> curricular, logo <strong>de</strong> início, a preocupação com umaformação ampla, reunindo disciplinas <strong>de</strong> diversas áreas. Em anexo, estão astabelas que foram montadas especialmente para esta análise, ao todo quatro,e estão em anexo apenas para fl uência do texto. A primeira traz as disciplinaspsicológicas, com indicação do número <strong>de</strong> horas em cada semestre e a formaçãoe ou ocupação dos docentes convidados para ministrá-las, informações essasque se repetirão nas três tabelas seguintes; a segunda traz as outras disciplinasdas então chamadas (pela SBPC) “Ciências do Homem”; na terceira, estão duasdisciplinas das Ciências Matemáticas; e na quarta as disciplinas das “Ciências daVida” (que, conforme subdivisão posterior da SBPC, vai incluir a Psicologia).A tabela que segue é, pois, apenas um resumo <strong>de</strong>sse conjunto <strong>de</strong>informações:


128 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tabela 1Horas semanais <strong>de</strong> aulas <strong>no</strong> currículo para formação <strong>de</strong> psicólogoproposto por Enzo Azzi em 1962 (RPNP, 1963)Área doconhecimentocf SBPCDisciplinasNo.Semestre em que seriam ministradasn° <strong>de</strong>horas semanais1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 teóricas práticasda Psicologia*subárea emCiências doHomem(ver Ciência e Cultura,1955)ouCiências da Vida(ver Ciência e Cultura,1970)Ciências do Homem(cf SBPC)Ciências da VidaeCiências Aplicadas(Medicina)Ciências MatemáticasP. Geral* - x x 8 -P. Experimental I e II x x x x 12 16P. Desenvolvimento I e II x x x x 8 12P. Diferencial - x x 4 -P. Social I e II x x x x 8 -P. Personalida<strong>de</strong> - x x 4 -P. da Aprendizagem - x x 4 4P. Animal ou Comp. - x 2 1P. Religiosa - x 2 -Questões <strong>de</strong> P. Exp. - x x 4 4P. Criança e Adoles- - x xcente Excepcional4 4Técnicas <strong>de</strong> Exame I e II x x x xPsicológico12 12Teorias e Técnicas- x xPsicoterápicas4 10Psicoterapia Infantil - x x 4 4Subtotal 18 3 3 4 4 4 4 2 2 2 2 2 2 80 67Introd. à Filosofia - x 2 -História da Psicol. - x x 4 -Psicol. filosófica - x 2 -Teoria do Conheci/o - x 2 -Lógica simbólica - x 2 1Sociologia - x 2 -Antropologia - x x 4 4Pedagogia terapêutica - x 2 1Subtotal 8 3 2 1 1 1 1 1 20 6Biol. e Gen. Humana - x x 2 2Neuroanatomia - x 1 2Fisiologia Geral - x x 4 6Neurofisiologia - x x 4 4Psicofisiologia - x x 4 2Patologia Geral - x x 4 4Psicol. Profunda - x x 4 4Noções <strong>de</strong> Neuropat. - x 2 1Psicopatol. Especial I e II x x x x 8 8Fo<strong>no</strong>audiologia - x 2 1Psiquiatria Infantil - x x 4 2Terapêuticas auxilia-res - x 2 1em psiquiatriaSubtotal 12 2 3 1 1 2 2 2 1 2 1 3 2 41 37Estatística - x x x x 2 2Questões <strong>de</strong> estatística - x x 2 1Subtotal 2 1 1 1 1 1 1 4 3T o t a l 40 8 8 7 7 7 7 6 5 4 4 5 4 145 113(*) Estão contadas entre as Ciências Humanas e Sociais e as Ciências da Vida, disciplinas(ditas) psicológicas ministradas por pesquisadores <strong>de</strong>ssas áreas, <strong>de</strong> modo a aten<strong>de</strong>ra perspectiva do autor da proposta. São elas: História da Psicologia, Psicofisiologia,Psicologia Profunda, Psicopatologia especial I e II.Cabem, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, alguns reparos especiais para falar da formaçãoproposta por Enzo Azzi.


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 129Um primeiro diz respeito à forte presença da medicina, na indicação<strong>de</strong> disciplinas na área <strong>de</strong>sta ciência aplicada mas, principalmente, na escolha<strong>de</strong> médicos para respon<strong>de</strong>r por muitas das disciplinas ditas psicológicas(Psicofi siologia, Psicologia Profunda, Psicopatologia). Para isso, uma razãopo<strong>de</strong> ser rapidamente lembrada: a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> espaços apropriados paraseu ensi<strong>no</strong> – laboratórios especializados e hospitais. Vale lembrar também suaprópria formação médica e, não por acaso, estão entre alguns dos primeirosperiódicos adquiridos pelo IP: L’évolution psychiatrique (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1951), Il lavoroneuropsiquiatrico (<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1955) e os Annales medico-psychologiques (<strong>de</strong>s<strong>de</strong>1940).O segundo reparo está na exigência explícita na proposta na forma<strong>de</strong> horas práticas, referendada ainda na escolha <strong>de</strong> professores para lecionar amaioria das disciplinas, quase sempre pesquisadores.Ainda um reparo, o terceiro: a proposta <strong>de</strong> um curso fortementemarcado pela preparação <strong>de</strong> um psicólogo a quem pouco falta para ser opsicólogo voltado à psicoterapia, ainda que disciplinas muito específi cas (Teoriase técnicas psicoterápicas e Psicoterapia Infantil, outras três são “médicas”). Aexplicação para isto po<strong>de</strong> estar na maneira como Azzi entendia o método clínico:“não é exclusivo do médico, mas sim pertence a todo psicólogo [grifo dopróprio Azzi] e não apenas ao psicólogo que colabora profi ssionalmente com aclínica médica (…), mas a todo aquele que se ocupe <strong>de</strong> indivíduos, <strong>no</strong>rmais ou<strong>de</strong>sajustados, nas escolas, ofi cinas, centros <strong>de</strong> orientação profi ssional, prisões,etc” (Azzi, 1962). E, em 1963, na palestra incluída nesta coletânea, ele vai maislonge: “a psicologia aplicada não po<strong>de</strong> ser senão clínica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o momento emque, abandonando o estudo dos grupos como tais, se ocupa <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminadoindivíduo” (Azzi, 1964-1965).Cabe <strong>de</strong>stacar fi nalmente a ênfase na formação científi ca do psicólogo,que merecerá consi<strong>de</strong>ração especial <strong>no</strong> próximo item.4 A ênfase em formação científicaChama atenção na proposta <strong>de</strong> Azzi que a formação do psicólogo exijadois TCCs. E, <strong>de</strong> fato, isso acabou se revelando muito difícil para os estudantesmas também para os professores. Não se sabe <strong>de</strong> nenhum estudante que tenha<strong>de</strong>sistido <strong>de</strong> nenhum dos títulos por causa das pesquisas exigidas, mas muitos


130 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>se atrasaram para obtê-los, porque o curso todo era muito exigente: muitasdisciplinas, muitas <strong>de</strong>las com parte prática que obrigava a <strong>de</strong>slocamentos emrelação ao campus da Universida<strong>de</strong> (por exemplo, era <strong>no</strong> Hospital do Juqueri,Município <strong>de</strong> Franco da Rocha a 45 km da Capital, que os estudantes começavamjá <strong>no</strong> 4° a<strong>no</strong> seus estudos em psicopatologia). Para os professores <strong>de</strong>sta série,além das aulas, havia 40 pesquisas individuais para orientar, razão pela quala disciplina Questões <strong>de</strong> Psicologia Experimental passou a ser totalmente<strong>de</strong>dicada ao primeiro TCC. Cabe contar que a única turma que passou peloprimeiro currículo <strong>de</strong> psicologia (a Reforma Universitária em 1968 da São Bentoapresentou, como TCC <strong>de</strong> 6° a<strong>no</strong>, mais um “tipo” <strong>de</strong> pesquisa, além da clínica(caso da maioria) e da experimental (poucos alu<strong>no</strong>s) – solicitaram entregar oque se po<strong>de</strong>ria chamar <strong>de</strong> pesquisa teórica (na sua opinião, mais exequível, nascondições dadas).Na XIV Reunião Anual da SBPC, realizada em Curitiba em 1962, Azzijá <strong>de</strong>ixara claro o que pensava <strong>sobre</strong> a diferença entre as atitu<strong>de</strong>s clínica eexperimental e sua “necessida<strong>de</strong> técnica” na construção da Psicologia (Azzi,1962a) e, um a<strong>no</strong> antes, também na SPBC, quando apresentara trabalhointitulado “Aspecto teórico da Psicologia Clínica (Azzi, 1962b). Reafi rmado agorana palestra <strong>de</strong> 1963 (Azzi, 1964-5), este pensar se refl ete na proposta <strong>de</strong> curso,ao separar como indispensável para o bacharel a realização <strong>de</strong> uma pesquisaexperimental e ao liberar o sextanista para realização <strong>de</strong> pesquisa clínica.A diferenciação entretanto <strong>de</strong> uma Psicologia humana e clínica ao lado<strong>de</strong> uma Psicologia experimental e comparativa outra signifi cação nãotem senão <strong>de</strong> uma necessida<strong>de</strong> técnica <strong>de</strong>vida à divisão do trabalhocientífi co (...) (1963, p. 49).Assim, “por gosto pessoal ou por julgamento <strong>sobre</strong> a or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> urgência”do seu problema, o estudante ao fi nal do curso po<strong>de</strong>ria ainda “preferir (...) a<strong>de</strong>monstração experimental <strong>de</strong> leis simples à elucidação clínica dos conjuntoscomplexos da conduta humana” (Azzi, 1962, p. 175).


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 131Refl etindo uma discussão can<strong>de</strong>nte à época, Azzi toma sua posiçãoentre os “clássicos ou tradicionais”, representados claramente na posição <strong>de</strong>Lagache 5 (1949), que em seu L’unité <strong>de</strong> la Psychologie pregava a reunião dascorrentes existentes dando a cada uma um papel específi co na construção daPsicologia. Contra estes, havia os que Garcia Werebe 6 (1952, p. 36) chama então<strong>de</strong> “re<strong>no</strong>vadores”, expressão usada “justamente para indicar uma oposição”.Representando <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> esta ala, Schnei<strong>de</strong>r 7 (1952), se referia à “psicologia puraexperimental” como “estéril”, nada oferecendo “que infl ua, esclareça e re<strong>no</strong>ve oshorizontes da psicologia humana” (p. 21). No limite, para ele, importava apenasa “atitu<strong>de</strong> psicológica fundamentada socialmente e não fi sicamente” (p. 23).Para Azzi, <strong>de</strong>z a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois, este “confl ito mais profundo <strong>de</strong> naturezadoutrinária e fi losófi ca não correspon<strong>de</strong> senão a um momento da história dasi<strong>de</strong>ias e a uma crise” (p. 175). Por uma razão que ele já apresentara em 1951,quando da inauguração do Instituto: como falar em crise se...é sabido como seu auxílio é invocado, hoje, a todo momento, pelamedicina, pela justiça, pelo ministério sacerdotal, pelo trabalho, pelaimprensa, pelo comércio, pelas indústrias, pelas artes, pela guerra...(Azzi, 1952, p. 182).Diferente <strong>de</strong> ambas as posições 7 , entretanto, havia já o que Politzer 8(1929) referia como crise da Psicologia: “uma gran<strong>de</strong> liquefação i<strong>de</strong>alista”.Lembra ele que, “mesmo o behaviorismo rigoroso, <strong>de</strong> inspiração materialista,<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo foi incapaz <strong>de</strong> manter-se na sua própria linha”, dando origema diferentes “<strong>no</strong>rmas mais ou me<strong>no</strong>s fortemente i<strong>de</strong>alistas” (citado por Werebe,1952, p. 37).Na primeira meta<strong>de</strong> dos a<strong>no</strong>s 60, Azzi coor<strong>de</strong><strong>no</strong>u um gran<strong>de</strong> projetoapoiado pela Fapesp, <strong>no</strong> qual se propunha integrar o que chamava <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>clínica e atitu<strong>de</strong> experimental. Tinha como parceiros Doutora Aniela Ginsberg,representando a primeira, e, pela segunda, o Professor Nelson <strong>de</strong> Campos Pires,7 É diferente também a posição <strong>de</strong> Annita Cabral que, em texto <strong>de</strong> 1952, diz que há trêsmétodos em Psicologia: o experimental, o estatístico, o clínico e que este é ciência e arte.


132 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>então Chefe do Laboratório <strong>de</strong> Psicologia Experimental do IPPUC-SP, pesquisa aconferir em Ginsberg, Azzi e Pires (1967). Vários estudantes das primeiras turmastiveram oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> participar <strong>de</strong>sse projeto e tanto Azzi como AnielaGinsberg sempre incentivaram professores a buscar bolsas <strong>de</strong> Iniciação Científi cajunto à Fapesp e ao CNPq.Entretanto, cabe <strong>de</strong>stacar ainda uma i<strong>de</strong>ia <strong>no</strong>s textos <strong>de</strong> Azzi <strong>no</strong> mínimocuriosa: o que exatamente ele quer dizer quando se refere a uma “necessida<strong>de</strong>técnica da psicologia”, quando fala da psicologia experimental versus psicologiaclínica? Será que para ele haveria um momento em que a pesquisa experimental(pesquisa básica?) seria <strong>de</strong>snecessária à Psicologia? Seria a Psicologia um dia,como a Medicina, “apenas” uma “Ciência Aplicada”? Isto, entretanto, merecepesquisa especial. No momento, queremos apenas lembrar que <strong>no</strong>s textos <strong>de</strong>Azzi até agora analisados em nenhum momento ele diz isso, mas dirá muitasvezes da psicologia clínica que é um tipo especial <strong>de</strong> Psicologia Aplicada.5 ConclusãoHistória é sempre embate entre posições. E se uma vence, não signifi canecessariamente que é a melhor, mas apenas que, <strong>no</strong> jogo <strong>de</strong> forças presentesna situação em que o embate se <strong>de</strong>u, uma <strong>de</strong>las pô<strong>de</strong> <strong>sobre</strong>ssair-se. Não signifi catambém que fi cará sempre assim, pois aos per<strong>de</strong>dores basta reorganizarem-se erecomeçar. No que se refere à luta com a medicina, cabe lembrar que, enquantoos psicólogos comemoravam a lei 4119, graças a um termo (ajustamento)que parecia eliminar (para Azzi, apenas contornar) a objeção dos médicos àexistência <strong>de</strong> psicólogos ditos clínicos, já os médicos se preparavam para umaprimeira volta, volta que veio ganhando força <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o fi nal dos a<strong>no</strong>s 70, atéchegar ao fi nal do século com uma <strong>no</strong>va e mais pesada proposta, o chamado “AtoMédico”, também mais abrangente – para enquadrar agora todas as ocupações(regulamentadas ou não) voltadas à “saú<strong>de</strong>”.Quanto aos psicotécnicos, só tinham a ganhar, pelo me<strong>no</strong>s os quepu<strong>de</strong>ram se candidatar ao título nas condições da lei: “estar exercendo, pormais <strong>de</strong> dois a<strong>no</strong>s, ativida<strong>de</strong>s profi ssionais <strong>de</strong> psicologia aplicada, em serviçosidôneos” (Lei 4119/62). Um “Memorial encaminhado aos Senhores Deputados,


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 133a propósito da Regulamentação da profi ssão <strong>de</strong> Psicologista” (em Arquivos<strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicotécnica, 1960), mostra bem quanto lutaram por seu projeto<strong>de</strong> 1954: pediam ainda a volta <strong>de</strong> artigos mudados pelo Substitutivo da Comissão<strong>de</strong> Educação e Cultura da Câmara, entre eles: a “discriminação incompreensível”contra a “Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicologia Aplicada, ex-Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong>Psicotécnica [que] engloba a maioria dos Psicotécnicos ou Psicologistas existentes<strong>no</strong> território nacional” (p. 83); e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> requerer o título pessoas quevinham exercendo, ou tivessem exercido ativida<strong>de</strong>s em psicologia aplicada porcinco a<strong>no</strong>s, recuperando os cinco a<strong>no</strong>s em vez <strong>de</strong> apenas “dois a<strong>no</strong>s [mas] em“serviços idôneos”. Além disso, aliam-se aos médicos, ao insistir na manutenção<strong>de</strong> alguns parágrafos que excluem da profi ssão o que é específi co da profi ssãomédica e reafi rmando como competência do psicologista: “a colaboração (grifo<strong>no</strong>sso) em assuntos psicológicos ligados a outras disciplinas, respeitados osdireitos e áreas privativas dos respectivos profi ssionais” (p. 84).Quanto à posição do Professor Enzo Azzi relativamente à formaçãoem Psicologia, diferia bastante também das propostas então existentes,principalmente na <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> pesquisa, experimental e clínica, e na exigência <strong>de</strong>seis a<strong>no</strong>s para formação em psicologia, para dar conta da forte carga médicobiológicaque vai exigir, além <strong>de</strong> uma formação humanista. Rápida comparaçãocom as primeiras propostas para a área mostra bem a diferença, como vemosem Annita Cabral (1953-4): a <strong>de</strong> Schnei<strong>de</strong>r (FGV), com 4 a<strong>no</strong>s e 12 disciplinas,todas psicológicas – que tem como característica principal segundo a autora “seruma formação pura e exclusivamente psicológica (grifo da autora); a da PUCdo Rio <strong>de</strong> Janeiro, com três a<strong>no</strong>s após um “curso <strong>de</strong> adaptação” para eliminaros candidatos que buscam <strong>no</strong> curso ajuda para problemas psicológicos próprios– proposta que, segundo Cabral, tem “acentuada formação médico-fi siológica”[mas] ausência <strong>de</strong> Psicologia experimental, base antropológica ou sociológica(grifo <strong>no</strong>sso) e Psicologia educacional. Cabral (1952) se refere ainda à proposta <strong>de</strong>uma “Seção <strong>de</strong> Psicologia em FFCLs” (apresentada <strong>no</strong> I Simpósio das Faculda<strong>de</strong>s<strong>de</strong> Filosofi a em 1953) cujas características incluem: não ter “nenhuma feiçãotécnica”, apresentar “boa base biológica e um coroamento fi losófi co”, além <strong>de</strong>meta<strong>de</strong> (apenas?) <strong>de</strong> “matérias psicológicas” (pp. 64-68).


134 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A ousadia <strong>de</strong> um curso com seis a<strong>no</strong>s (como o da medicina) e <strong>de</strong>pesquisas como parte obrigatória para o alu<strong>no</strong> se formar (duas <strong>no</strong>vida<strong>de</strong>s emrelação às propostas anteriores) tornam a <strong>de</strong> Enzo Azzi <strong>de</strong> fato muito diferente.Mas seria preciso ainda, para enten<strong>de</strong>r completamente sua proposta, uma análisedo que proporá como formação em psicologia necessária à formação do médico,proposta que vai implantar <strong>no</strong> Curso <strong>de</strong> Medicina da Santa Casa <strong>de</strong> São Pauloa partir <strong>de</strong> 1966. É on<strong>de</strong> vai ainda criar um Ambulatório – o primeiro (talvezmesmo único) em Santas Casas <strong>de</strong> Misericórdia (que sempre excluíram <strong>de</strong> seuprojeto o atendimento ao doente mental) – e que, conforme primeiros dadoslevantados, teria sido o embrião do CAISM, um conceituado Centro <strong>de</strong> AssistênciaIntegral ao Doente Mental, que aten<strong>de</strong> hoje “em quatro níveis: ambulatório,internações, emergência psiquiátrica, hospital-dia, nas especialida<strong>de</strong>s psiquiatria,<strong>de</strong>pendência química, psicogeriatria e infância, oferecendo ainda serviços <strong>de</strong>psicoterapia, psicologia e serviço social” (site do CAISM, acesso em 28 <strong>de</strong> maio<strong>de</strong> 2010).Objeto, entretanto, para outro artigo, a análise <strong>de</strong>ssa proposta po<strong>de</strong>rámostrar pontos comuns com sua proposta para formação <strong>de</strong> psicólogos.Bem <strong>de</strong>talhada em documento publicado na RPNP, “O ensi<strong>no</strong> das disciplinaspsicológicas e psicopatológicas na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Médicas <strong>de</strong> São Paulo”(Azzi, 1966), a proposta mostra a exigência <strong>de</strong> três horas semanais <strong>de</strong>s<strong>de</strong> oprimeiro semestre, em Disciplinas Psicológicas e Disciplinas Psicopatológicas: <strong>no</strong>primeiro a<strong>no</strong>, Psicologia Geral, Social e do Desenvolvimento; <strong>no</strong> segundo a<strong>no</strong>,Psicofi siologia <strong>no</strong> primeiro semestre, e Psicologia Profunda <strong>no</strong> segundo semestre.A partir do terceiro a<strong>no</strong>, os estudantes têm as Disciplinas Psicopatológicas:Psicopatologia Geral (terceiro a<strong>no</strong>) e Especial (quarto a<strong>no</strong>), fechando comMedicina Psicossomática, <strong>no</strong> quinto a<strong>no</strong>.Em seu discurso <strong>de</strong> inauguração do Instituto <strong>de</strong> Psicologia da PUC-SPem 1951 (Revista da Universida<strong>de</strong> Católica, 1952), Azzi dissera que “a maturida<strong>de</strong><strong>de</strong> uma ciência po<strong>de</strong> ser revelada, também, pelo grau <strong>de</strong> aplicabilida<strong>de</strong> que osdados, as <strong>no</strong>ções e as leis por ela recolhidas assumem aos fi ns da vida prática


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 135e social” (p. 182). Em 1966, <strong>de</strong>dicado agora com exclusivida<strong>de</strong> a uma Ciência(<strong>de</strong>fi nitivamente) Aplicada, como a Medicina, como pensará a formação <strong>de</strong> seusprofi ssionais? Leitura inicial <strong>de</strong> Atas <strong>de</strong> reuniões do Conselho Departamentalda Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ciências Médicas da Santa Casa, das quais participava porquedirigia o Departamento <strong>de</strong> Psicologia Médica e Psiquiatria, permite ver um Azzitão batalhador como o que chegou a São Paulo em 1950. Talvez se possa ver aícomo e quanto mudaram suas concepções <strong>sobre</strong> a formação <strong>de</strong> um clínico.ReferênciasAntunes, M. A. M. (2003). A Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Leitura histórica <strong>sobre</strong> suaconstituição. São Paulo: Unimarco.Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicólogos e Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo.(1958). Substitutivo ao anteprojeto <strong>de</strong> lei 3825/1958 do Ministério <strong>de</strong>Educação e Cultura. Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica, IV(3-4), 394-401.Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicotécnica. (1954). O problema da regulamentaçãoda profi ssão <strong>de</strong> psicologista e da formação regular <strong>de</strong> profi ssionais nessegênero. Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicotécnica, 2, 45-50.Azzi, E. (1952). Discurso por ocasião da inauguração do Instituto <strong>de</strong> Psicologiada PUC-SP. Revista da Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo, 1, 182-188.Azzi, E. (1962a). Aspecto teórico da Psicologia clínica. Ciência e Cultura, 14(1),25-26.Azzi, E. (1962b). Método experimental e método clínico em Psicologia Científi ca.Ciência e Cultura, 14(3), 175.Azzi, E. (1966). O Ensi<strong>no</strong> das Disciplinas Psicológicas e Patológicas na Faculda<strong>de</strong><strong>de</strong> Ciências Médicas <strong>de</strong> São Paulo. Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica,XII(3-4), 462-470.Boletim do Instituto <strong>de</strong> Psicologia Experimental e Educacional (1952-1954).Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo, I-III.Cabral, A. C. M. (1952). Requisitos básicos da formação <strong>de</strong> psicologistas. Ciênciae Cultura, 5(1), 43-44.


136 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Cabral, A. C. M. (1953-1954). Problemas da formação <strong>de</strong> psicólogos. Boletim <strong>de</strong>Psicologia, 5/6(18-20), 64-68.Campos, H. R. (1997). Paulo Rosas (Entrevista). Estudos <strong>de</strong> Psicologia (Natal),2(2), 301-327.Centro <strong>de</strong> Psicologia Aplicada. (1967). Formação do Psicólogo e Regulamentação<strong>de</strong> seu trabalho. Boletim CEPA, 1, 1-12.Ginsberg, A. G.; Azzi, E.; & Pires, N. C. (1967). Comparação entre métodosprojetivos e experimentais <strong>no</strong> estudo <strong>de</strong> alguns aspectos da personalida<strong>de</strong>.Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica, XIII(4), 269-286.Garcia Werebe, M. J. (1952). As tendências atuais da Psicologia em França. Boletim<strong>de</strong> Psicologia, março-setembro, 35-45.Gue<strong>de</strong>s, M. C. (2001). “Enzo Azzi”. In R. H. F. Campos (Org.), DicionárioBiográfi co da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Imago.Hiltmann, H. (1958). Pesquisa e Prática <strong>de</strong> Psicologia na América do Sul. Revista<strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica, IV(3-4), 339-343.Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica. (1955-1973). Instituto <strong>de</strong> Psicologiada Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo, 1-19(1-4).Instituto <strong>de</strong> Psicologia da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo. (1958).Substitutivo apresentado pela Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicólogos e pelaSocieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> São Paulo ao ante-projeto <strong>de</strong> lei 3.825/1958 doMinistério da Educação e Cultura. Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica,4(3-4), 394-401.Instituto <strong>de</strong> Psicologia da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo. (1960).Memorial encaminhado aos Srs. Deputados, a propósito da regulamentaçãoda profi ssão <strong>de</strong> psicologista. Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica,VI(1), 83-86.Instituto <strong>de</strong> Psicologia da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo.(1963). Curso <strong>de</strong> Psicologia da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a, Ciências e Letras <strong>de</strong>São Bento. Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica, IX(1-2), 301-304.Instituto <strong>de</strong> Seleção e Orientação Profi ssional. (1959). Substitutivo adotadopela Comissão <strong>de</strong> Educação e Cultura, ao Projeto nº 3.825 <strong>de</strong> 1958, dispõe<strong>sobre</strong> os cursos <strong>de</strong> formação em Psicologia e regulamenta a profi ssão <strong>de</strong>Psicologista. Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicotécnica, 11(3-4), 87-91.


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 137Lagache, D. (1949). L’unité <strong>de</strong> la Psychologie: Psychologie experimentale etPsychologie clinique. Paris: Presses Universitaire <strong>de</strong> France.Schnei<strong>de</strong>r, E. (1952). A Psicologia como Ciência Social. Boletim do Instituto <strong>de</strong>Psicologia (Universida<strong>de</strong> do <strong>Brasil</strong>), 2(1-2), 20-26.Seção Crônica e Documentação. (1955-1973). Seção especial da Revista <strong>de</strong>Psicologia Normal e Patológica. Instituto <strong>de</strong> Psicologia da PontifíciaUniversida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo.Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo. (1952). Crônica da Reitoria: 5° Aniversárioda Equiparação da Universida<strong>de</strong>. Revista da Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> SãoPaulo, 1, 182-188.A autora agra<strong>de</strong>ce a Andréa Wuo, Camila Silveira da Silva e GabrielVieira Candido, do Grupo <strong>de</strong> Pesquisa em História da Psicologia da PUC-SP,que colaboraram na localização e processamento <strong>de</strong> informações para estetrabalho.


138 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>ANEXO 1ANEXO 2Número <strong>de</strong> tomos consultados e número <strong>de</strong> artigos encontrados em quatroperiódicos brasileiros <strong>no</strong> período 1958-1966*: Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicotécnica (FGV),Boletim <strong>de</strong> Psicologia (SPSP), Revista <strong>de</strong> Psicologia Normal e Patológica (IPPUC-SP) e Revistado Departamento <strong>de</strong> Psicologia da USP.A<strong>no</strong>Número <strong>de</strong> tomos consultadosNúmero <strong>de</strong> artigos encontradosABP BP RPNP USP Total ABP BP RPNP USP Total1958 3 1 2 - 6 0 0 2 - 21959 3 1 2 - 6 1 0 1 - 21960 4 1 3 - 8 1 0 0 - 11961 4 1 2 - 7 1 0 1 - 21962 4 1 1 - 6 0 0 0 - 01963 4 0 2 - 6 0 0 1 - 11964 3 1 2 2 8 0 0 0 0 01965 4 1 2 2 9 0 5 1 0 61966 4 1 2 2 9 0 1 1 0 2Total 33 8 18 6 65 3 6 7 0 16* Quatro a<strong>no</strong>s antes e quatro a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois da publicação da Lei (1962).Fonte: Gue<strong>de</strong>s, M.C. “40 a<strong>no</strong>s da Profissão e a Psicologia na PUC-SP”. Palestra na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> PsicologiaPUC-SP, 2002. Arquivado <strong>no</strong> NEHPSI/PUC-SP, Projeto “A Psicologia em SP”.


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 139ANEXO 3Disciplinas <strong>no</strong> Curso <strong>de</strong> Psicologia proposto por Enzo Azzi em 1962 (Divisão cfSBPC, Ciência e Cultura, 1970).Tabela 1 – Disciplinas psicológicas(exceto as regidas por pessoal <strong>de</strong> outra área: História da Psicologia, Psicologia Profunda ePsicopatologia I e II )<strong>no</strong>me da disciplinasemestre(s) e horassemanais (teóricas epráticas)outra ocupação ouexperiência profi ssional doProfessor convidadoPsicologia Geral 1° e 2° 4hs (o próprio Professor Azzi)Psicologia Experimental I e II 1° a 4° semestres 3h+4h Pesquisadora <strong>no</strong> CRPE*Psic. Desenvolvimento I e II 1° a 4° semestres 2h+3h Pesquisadora <strong>no</strong> IPPUC-SPPsicologia Diferencial 3° e 4° semestres 2h (Azzi + Pesquisadora do IP)Psicologia Social 3° a 6° semestres 2h Pesquisadora <strong>no</strong> CRPEPersonalida<strong>de</strong> 5° e 6° semestres 2h a mesma <strong>de</strong> P. SocialP. da Aprendizagem 5° e 6° semestres 2h+2h Professor USP e pesquisador<strong>no</strong> CRPEP. Animal ou Comparada 5° semestre 2+1h Substituida por horaspráticas em P.Experimental(I e II)P. Religiosa 6° semestre 2h Padre com pós-graduaçãoQuestões <strong>de</strong> P. Experimental 7° e 8° semestres 2h+2h (Vários - Orientação <strong>de</strong> TCC)P. da Criança e do Adolescente 7° e 8° semestres 2h+2h Psicóloga do IPPUCExcepcionalTécnicas <strong>de</strong> Exame psicológico 9° a12 semestres 3h+3h Psicóloga do IPPUC-SPI e IIDisciplinas exigidas apenas aos optantes pela Psicologia ClínicaTeorias e Técnicas9° e 10° semestres Especialização em PsicologiaPsicoterápicas2h+5hPsicoterapia Infantil11 e 12° semestres2h+2hEspecialização em PsicologiaFonte: RPNP, 1963, 1-2, pp. 298-303.* CRPE – Centro Regional <strong>de</strong> Pesquisas Educacionais (MEC – 1956-1966).


140 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tabela 2 – Disciplinas das Ciências do Homem (exceto Psicologia)<strong>no</strong>me da subárea <strong>no</strong>me da disciplinasemestre(s) e n° <strong>de</strong> horas semanais (a2a. informação é <strong>de</strong> hs práticas)Introdução à Filosofi a 1° semestre 2 h/semanaisHistória da Psicologia* 1° e 2° semestres 2h/semanaisFilosofi a Psicologia fi losófi ca2° semestre 2h/semanaisTeoria do Conhecimento** 7° semestre 2h/semanaisLógica simbólica **8° semestre 2h+1h/semanaisCiências SociaisSociologia1° semestre 2h/semanaisAntropologia3° e 4° semestres 2h+2h/semanaisEducação Pedagogia terapêutica 10° semestre 2h+1h/semanais* Disciplinas (ditas) psicológicas mas com professor <strong>de</strong> outra área que não a Psicologia sãoincluídas na área do professor escolhido por A zzi para ministrá-las.** Cabe contar que, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> iniciado o Curso, estas disciplinas foram trocadas por umaintitulada “Crítica à metodologia científica”, 7° e 8° semestres, 3 horas/semanais.Tabela 3 – Disciplinas das Ciências matemáticasEstatística 3° a 6° semestres 2h+2h Estatística Aplicada PesquisadorQuestões <strong>de</strong> Estatística 7° e 8° semestres 2h+1h Estatística Aplicada PesquisadorTabela 4 – Disciplinas das Ciências da Vida<strong>no</strong>me da disciplina semestre(s) e horas semanais formação/ocupação doProfessor convidadoBiologia e Genética Humana* 1° e 2° semestres 2h ciências biológicasNeuroanatomia 2° semestre 1h+2h Medicina; pesquisadorFisiologia geral 1° e 2° semestres 2h+3h Fisiologia; pesquisadorNeurofi siologia 3° e 4° semestres 2h+2h Medicina; pesquisadorPsicofi siologia 5° e 6° semestres 2h+1h Fisiologia; pesquisadorPatologia Geral 5° e 6° semestres 2h+2h Médico, pesquisadorPsicologia Profunda 7° e 8° semestres 2h+2h Medicina; pesquisadorNoções <strong>de</strong> Neuropatologia 7° semestre 2h+1h Medicina; pesquisadorPsicopatologia Especial I 9° e 10° semestres 2h+2h Medicina; prática emhospitalFo<strong>no</strong>audiologia 9° semestre 2h+1h Medicina; pesquisador


Enzo Azzi (1921-1985), um Médico Italia<strong>no</strong> na Psicologia <strong>Brasil</strong>eira 141Disciplinas exigidas apenas aos optantes por Psicologia ClínicaPsiquiatria Infantil 11° e 12°semestres 2h+1h Psiquiatria; pesquisadorPsicopatologia Especial II 11° e 12°semestres 2h+2h Medicina; prática emhospitalTerapêuticas. auxiliares empsiquiatria11° semestre 2h+1h Psiquiatria* Por sugestão do Professor Frota Pessoa, esta disciplina foi subdividida em 1964: Biologia 1° 2°semestre 2h+2h (mesmo Professor); Genética 3° semestre 2h e Genética do Comportamento 4°semestre 2h (por pesquisadoras da equipe <strong>de</strong> Frota Pessoa).


CAPÍTULO 7*PSICOLOGIA: CARACTERÍSTICAS DAPROFISSÃOSylvia Leser <strong>de</strong> Mello PereiraInstituto <strong>de</strong> Psicologia da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São PauloO estudo aqui apresentado é o resumo da primeira parte <strong>de</strong> um trabalho,redigido em 1972, que pretendia verifi car como se caracterizava a profi ssão <strong>de</strong>psicólogo em São Paulo (Mello, 1975), e que tipos <strong>de</strong> trabalho os profi ssionaistinham a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolher ao terminarem os cursos <strong>de</strong> Psicologia.É evi<strong>de</strong>nte que <strong>no</strong> tempo <strong>de</strong>corrido após a redação do trabalho, muitasmodifi cações se concretizaram em relação aos problemas tratados. É sufi cientelembrar que temos, atualmente, mais <strong>de</strong> 20 cursos <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong> estado <strong>de</strong>São Paulo. Isso representa um gran<strong>de</strong> aumento <strong>no</strong> número dos psicólogosdiplomados em cursos superiores, o que traz como conseqüência maior oferta<strong>de</strong> profi ssionais <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> trabalho, e eventual mudança nas orientaçõesconstatadas para a distribuição das ativida<strong>de</strong>s dos profi ssionais. Mesmo assim,penso que as constatações feitas são ainda válidas, como um diagnóstico inicialda profi ssão ou como contribuição a estudos mais aprofundados, que procuremsituar o lugar e o papel da Psicologia, e dos psicólogos, na vida da socieda<strong>de</strong>brasileira.*Referência completa do texto original: Pereira, S. L. M. (1975): Psicologia: característicasda profi ssão. Boletim <strong>de</strong> Psicologia, XXVI(69), 41-50.


144 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Os dados que vamos apresentar correspon<strong>de</strong>m ao levantamentodas ocupações <strong>de</strong> todos os psicólogos diplomados, até 1970, pelos cursos<strong>de</strong> graduação existentes na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. O curso <strong>de</strong> Psicologia daUniversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, o da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a Se<strong>de</strong>s Sapientiae e o daFaculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a São Bento, haviam formado, quando iniciamos a coleta<strong>de</strong> dados, respectivamente 82, 43 e 73 psicólogos. As informações relativas àsativida<strong>de</strong>s profi ssionais dos 198 psicólogos foram recolhidas por meio <strong>de</strong> umquestionário, intencionalmente simples, que perguntava, apenas, quais asprimeiras ocupações dos psicólogos após o térmi<strong>no</strong> do curso, e quais as suasocupações <strong>no</strong> momento da pesquisa.Embora as informações assim obtidas fossem claras e precisas, a suaorganização num todo compreensivo, que permitisse traçar as linhas gerais do<strong>de</strong>senvolvimento da profi ssão, acarretou alguns problemas. Optamos, afi nal, poradotar uma classifi cação que se limitasse às áreas <strong>de</strong> trabalho mencionadas pelalei fe<strong>de</strong>ral: Ensi<strong>no</strong>, Clínica, Escolar e Industrial. Embora essa divisão das áreasseja muito geral, ela facilita a apresentação das informações <strong>de</strong> modo or<strong>de</strong>nado.Dessa forma, as ativida<strong>de</strong>s profi ssionais exercidas pelos 198 psicólogos da <strong>no</strong>ssapopulação, foram assim distribuídas:ENSINO – incluem-se nesta área <strong>de</strong> trabalho todas as ativida<strong>de</strong>s docentese <strong>de</strong> pesquisa dos psicólogos, inclusive as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> supervisão e treinamento<strong>de</strong> alu<strong>no</strong>s.PSICOLOGIA CLÍNICA – incluem-se nesta área <strong>de</strong> trabalho todasas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> diagnóstico e <strong>de</strong> terapia dos psicólogos, quando realizadasem clínicas e consultórios particulares, hospitais, serviços públicos e serviçosassistenciais.PSICOLOGIA ESCOLAR – incluem-se nesta área <strong>de</strong> trabalho todas asativida<strong>de</strong>s dos psicólogos que, realizadas em escolas ou em instituições vinculadasa elas, visam à utilização das técnicas psicológicas, com fi nalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> promover aefi ciência do ensi<strong>no</strong> em todos os seus aspectos.


Psicologia: Características da Profi ssão145PSICOLOGIA INDUSTRIAL – incluem-se nesta área <strong>de</strong> trabalho todas asativida<strong>de</strong>s dos psicólogos que, realizadas em empresas industriais, comerciais ouem outras instituições, visam a aplicar as técnicas psicológicas, a fi m <strong>de</strong> promovera efi ciência e a produtivida<strong>de</strong> <strong>no</strong> trabalho 1 .O primeiro aspecto a chamar a atenção nas informações obtidas refereseàs ocupações concomitantes, ou seja, uma boa parte dos psicólogos teve, etem ainda mais <strong>de</strong> uma ocupação. Esse fato é signifi cativo para uma análise domercado <strong>de</strong> trabalho, pois parece indicar que os ex-alu<strong>no</strong>s não só encontraramocupação <strong>de</strong>ntro do campo da Psicologia, mas tiveram possibilida<strong>de</strong> (ounecessida<strong>de</strong>?) <strong>de</strong> manter mais <strong>de</strong> uma ocupação como psicólogo.1 As seguintes “categorias” completam o quadro das informações recolhidas:OUTRAS ATIVIDADES - incluem nesta “categoria” duas ocupações dos psicólogos que nãoestão compreendidas nas áreas <strong>de</strong> trabalho consi<strong>de</strong>radas acima, e três casos <strong>de</strong> psicólogosque mantêm ocupações sem relação com a psicologia.EXTERIOR - incluem-se nesta “categoria” treze casos <strong>de</strong> psicólogos que, <strong>no</strong> período da coleta<strong>de</strong> dados, encontravam-se fora do <strong>Brasil</strong>.NÃO TRABALHA - incluem-se nesta “categoria” <strong>de</strong>zoito casos <strong>de</strong> psicólogos que, <strong>no</strong> períododa coleta <strong>de</strong> dados, não estavam exercendo quaisquer ativida<strong>de</strong>s profi ssionais.SEM INFORMAÇÕES - incluem-se nesta “categoria” seis casos <strong>de</strong> psicólogos <strong>sobre</strong> os quais nãofoi possível obter-se qualquer informação durante o período da coleta <strong>de</strong> dados. (Na categoriaOutras Ativida<strong>de</strong>s encontramos experiências <strong>de</strong> trabalho sem relação com a Psicologia(industrial, publicitário, administração pública, etc.). Duas ativida<strong>de</strong>s atuais, incluídas nessacategoria, po<strong>de</strong>riam ser classifi cados como “trabalho <strong>de</strong> divulgação <strong>de</strong> conhecimentospsicológicos”. Essas duas experiências profi ssionais foram aí colocadas, porque são emnúmero reduzido e não se enquadram, pela natureza da ativida<strong>de</strong>, em nenhuma dasquatro categorias principais que <strong>de</strong>sejamos analisar. Reconhecemos, entretanto, que talvezrepresentem uma abertura promissora para um <strong>no</strong>vo mercado <strong>de</strong> trabalho. Eliminaremos <strong>de</strong>todas as tabelas seguintes os psicólogos incluídos nas “categorias” exterior, não trabalha esem informações, bem como os dois psicólogos que exercem ativida<strong>de</strong>s sem relação com apsicologia. Reduzimos assim a <strong>no</strong>ssa população a 158 psicólogos, quando tratamos das suasativida<strong>de</strong>s atuais e a 170 psicólogos, quando tratamos das suas primeiras experiências <strong>de</strong>trabalho, pois 12 psicólogos tiveram experiências profi ssionais em Psicologia ao <strong>de</strong>ixarem ocurso, abandonando-as <strong>de</strong>pois.


146 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tabela IDistribuição dos Psicólogos segundo o número <strong>de</strong> ocupações concomitantesque exerceram após o térmi<strong>no</strong> do cursoFACULDADE DE FILOSOFIA,CIÊNCIAS E LETRASSão Bento“Se<strong>de</strong>s Sapientiae”Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo1Ocup.321652PSIC. QUE EXERCIAM2Ocups.3 ou +Ocups.TOTAL 100 48 22 1701613191273Tot.603664Tabela IIDistribuição dos Psicólogos segundo o número <strong>de</strong>Ocupações que Exercem AtualmenteFACULDADE DE FILOSOFIA,CIÊNCIASE LETRASSão Bento“Se<strong>de</strong>s Sapientiae”Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo1 Ocup.361048PSIC. QUE EXERCIAM2Ocups.3 ou +Ocups.TOTAL 94 42 22 158151512796Tot.583466Os dados das tabelas acima têm que ser consi<strong>de</strong>rados para se po<strong>de</strong>roferecer um quadro bastante claro <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento da profi ssão, <strong>de</strong> modo quenas tabelas subseqüentes estaremos sempre lidando com todas as experiênciasprofi ssionais dos psicólogos, isto é, com o número <strong>de</strong> ocupações concomitantesmantidas pelos profi ssionais, e não com o número <strong>de</strong> psicólogos que mantêmas ocupações. Assim, nas tabelas III e IV os números indicam as experiênciasprofi ssionais dos psicólogos segundo as áreas <strong>de</strong> trabalho já <strong>de</strong>fi nidas.


Psicologia: Características da Profi ssão147Tabela IIINúmero <strong>de</strong> primeiras experiências profi ssionais dos Psicólogos distribuídassegundo as Áreas <strong>de</strong> TrabalhoÁREAS DE TRABALHOFACULDADE DE FILOSOFIA,CIÊNCIAS ELETRASSão BentoN = 60Ensi<strong>no</strong> Clínica Industrial Escolar32 45 8 17Tot.<strong>de</strong>Ativ.102“Se<strong>de</strong>s Sapientiae”N = 3610396964Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São PauloN = 74TOTALN = 17037 46 7 8 9879 130 21 34 264Tabela IVNúmero <strong>de</strong> Ativida<strong>de</strong>s Atuais dos Psicólogos Distribuídassegundo as áreas <strong>de</strong> trabalhoÁREASDETRABALHOEnsi<strong>no</strong>ClínicaIndustrialEscolarSão Bento(N = 58)2442713FACULDADE DE FILOSOFIACIÊNCIAS E LETRASSe<strong>de</strong>sSapientiae(N = 34)940129USP(N = 66)3043125TOTAL(N = 158)631253127Total <strong>de</strong> at. 86 70 90 246


148 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Analisando os números das tabelas acima, verifi camos que as experiênciasnas áreas do ensi<strong>no</strong> e da clínica correspon<strong>de</strong>m a 76% <strong>de</strong> todas as experiências <strong>de</strong>trabalho dos diplomados.O Ensi<strong>no</strong>, a que se refere a <strong>no</strong>ssa categoria, restringe-se, quase queexclusivamente ao Ensi<strong>no</strong> superior, como se po<strong>de</strong> verifi car na Tabela V.Tabela VNúmero das primeiras experiências profi ssionais e ativida<strong>de</strong>s atuais dospsicólogos na área do ensi<strong>no</strong>Cursos <strong>de</strong> Formação<strong>de</strong> PsicólogosENSINO SUPERIOROutros CursosSuperioresEnsi<strong>no</strong><strong>de</strong> NívelMédioOutrosPrimeiraexperiênciaProfi ssional4616611Ativida<strong>de</strong>Atual461214O ensi<strong>no</strong> superior representa um importante mercado <strong>de</strong> trabalhopara o psicólogo. Da <strong>no</strong>ssa população, 53 psicólogos eram docentes <strong>de</strong> cursossuperiores, predominantemente <strong>de</strong> cursos para a formação <strong>de</strong> psicólogos. Novoscursos <strong>de</strong> Psicologia, e currículos ampliados e diversifi cados 2 . representam,ainda, <strong>no</strong>vas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho para os diplomados.Se a diversifi cação das disciplinas e a criação <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos cursos <strong>de</strong>Psicologia po<strong>de</strong>m representar uma expansão do mercado <strong>de</strong> trabalho para opsicólogo <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> superior, são necessárias algumas ressalvas: <strong>no</strong>te-se, por2 O currículo do curso <strong>de</strong> Psicologia da USP constava, quando da sua criação em 1958, <strong>de</strong> 16disciplinas. O currículo proposto para o a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1972 consta <strong>de</strong> 41 disciplinas obrigatórias e16 disciplinas optativas.


Psicologia: Características da Profi ssão149exemplo, que enquanto a USP e a PUC <strong>de</strong> São Paulo ofereceram, em conjunto,280 vagas para os seus cursos <strong>de</strong> Psicologia, em 1972, 360 vagas foram oferecidassomente por um dos <strong>no</strong>vos cursos criados na Capital. Mesmo tomando em contao aparecimento <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos cursos, a diversifi cação dos currículos e ainda outrosfatores, a tendência é a diminuir a importância do ensi<strong>no</strong> superior como mercado<strong>de</strong> trabalho para os psicólogos <strong>no</strong>s próximos a<strong>no</strong>s.Ao classifi carmos as ativida<strong>de</strong>s dos psicólogos, segundo as áreastradicionais <strong>de</strong> aplicação da Psicologia, consi<strong>de</strong>ramos que as <strong>no</strong>ssas categoriaspermitiam, apenas, uma apresentação or<strong>de</strong>nada das informações recolhidas<strong>no</strong>s questionários, não porque as ativida<strong>de</strong>s dos psicólogos se estendam alémdaquelas áreas <strong>de</strong>fi nidas, mas porque os limites entre elas não são nítidos. As trêscategorias, <strong>de</strong>fi nidas como áreas <strong>de</strong> aplicação das técnicas psicológicas, foram porisso reunidas numa única análise, <strong>de</strong> modo a fornecer uma perspectiva global daprofi ssão. Consi<strong>de</strong>ramos, também, as difi culda<strong>de</strong>s encontradas para classifi caras ativida<strong>de</strong>s dos psicólogos, pois as funções <strong>de</strong>scritas pelos informantes são,em gran<strong>de</strong> parte, idênticas para as três categorias. Dessa forma, concluímosque se fosse possível elaborar uma classifi cação precisa, esta <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ria da<strong>de</strong>terminação dos objetivos que, em cada caso, conduzem ao emprego dastécnicas psicológicas. Portanto, a divisão em áreas <strong>de</strong> trabalho, Clínica, Industriale Escolar, é uma divisão formal que correspon<strong>de</strong> mais à <strong>no</strong>ssa necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>organizar os dados disponíveis, a fi m <strong>de</strong> analisar a atuação dos profi ssionais aonível do seu signifi cado social, do que ao propósito <strong>de</strong> realizar um inquérito<strong>sobre</strong> a característica das técnicas psicológicas, ou <strong>sobre</strong> a natureza do trabalhodos psicólogos nas diferentes áreas <strong>de</strong> aplicação.A área <strong>de</strong> Psicologia Clínica, tal como nós a <strong>de</strong>fi nimos, reúne o maioríndice <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa população, isto é, 52% dos psicólogosdiplomados, até 1970, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, <strong>de</strong>dicam-se, ao me<strong>no</strong>s em parte,a ativida<strong>de</strong>s que eles <strong>de</strong><strong>no</strong>minam clínicas.


150 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Tabela VINúmero <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s atuais dos psicólogos na área <strong>de</strong> Psicologia Clínica,distribuídas segundo o local <strong>de</strong> trabalhoFACULDADES DEFILOSOFIA, CIÊNCIASE LETRASSão BentoClínicas eConsultóriosParticulares28LOCAL DE TRABALHOServiçosPúblicos10OutrosServiços4TOT.42“Se<strong>de</strong>s Sapientiae”352340Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> SãoPaulo3210 1 43TOTAL 95 22 8 125A distribuição <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s pelos diferentes locais em queos psicólogos prestam seus serviços, parece indicar que o psicólogo atua,preferencialmente, como um profi ssional autô<strong>no</strong>mo, sendo a clínica particular aexpressão mais concreta <strong>de</strong>ssa preferência.Chamamos preferencialmente à ativida<strong>de</strong> autô<strong>no</strong>ma, porque foi possívelconstatar uma evasão <strong>de</strong> todas as ativida<strong>de</strong>s assalariadas em benefício do número<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s autô<strong>no</strong>mas, como po<strong>de</strong>mos verifi car <strong>no</strong>s números da Tabela VII.Tabela VIINúmero das primeiras experiências <strong>de</strong> trabalho e das ativida<strong>de</strong>s atuais dospsicólogos na área da Psicologia Clínica, por local <strong>de</strong> trabalhoLOCAL DE TRABALHOClínicas eConsultóriosParticularesServiçosPúblicosOutrosServiçosTotal dasAtiv.PrimeiraExperiênciaProfi ssional753718130Ativida<strong>de</strong> Atual95228125


Psicologia: Características da Profi ssão151Contrastando com o gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s profi ssionais na áreada clínica, é muito reduzido o número <strong>de</strong> psicólogos atuando como psicólogosindustriais e escolares.A psicologia industrial, por exemplo, embora seja uma das antigasmodalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aplicação das técnicas psicológicas em <strong>no</strong>sso estado, vem se<strong>de</strong>senvolvendo muito lentamente.Tabela VIIINúmero <strong>de</strong> primeiras experiências profi ssionais e ativida<strong>de</strong>s atuais dospsicólogos, na área da Psicologia Industrial, por local <strong>de</strong> trabalhoEmpresas“Institutos”<strong>de</strong>PsicotécnicaAssessoria aempresasOutrosTotalPrimeiraExperiênciaProfi ssional15-1521Ativida<strong>de</strong>Atual15123131A tabela VIII <strong>de</strong>ixa bem claro que o aumento das ativida<strong>de</strong>s atuais dospsicólogos, na área industrial, em relação ao número das primeiras experiências,tem a ver, apenas, com a instituição recente dos exames psicotécnicos paramotoristas. Sem entrarmos <strong>no</strong> problema do valor <strong>de</strong>sses exames para umaseleção a<strong>de</strong>quada dos motoristas, uma popularização da imagem <strong>de</strong> “aplicador<strong>de</strong> testes”, do ponto <strong>de</strong> vista do psicólogo, talvez não seja benéfi ca, nem a curtonem a longo prazo. Se consi<strong>de</strong>rarmos ainda o caráter rotineiro <strong>de</strong> aplicação eavaliação sempre das mesmas provas, po<strong>de</strong>-se compreen<strong>de</strong>r que esse tipo <strong>de</strong>trabalho nada possui <strong>de</strong> estimulante. Entretanto, se as experiências profi ssionaisdos psicólogos, na área do trabalho, aumentaram tão consi<strong>de</strong>ravelmente, aexplicação <strong>de</strong>ve residir <strong>no</strong> fato <strong>de</strong> que os Institutos <strong>de</strong> Psicotécnica representamuma abertura para o trabalho profi ssional autô<strong>no</strong>mo.


152 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Os dados referentes à área da Psicologia Escolar parecem vir em apoiodo que afi rmamos, pois é a área <strong>de</strong> aplicação que reúne o me<strong>no</strong>r número <strong>de</strong>ativida<strong>de</strong>s atuais dos psicólogos.Tabela 9Número <strong>de</strong> primeiras experiências profi ssionais e ativida<strong>de</strong>s atuais dopsicólogo, na área da Psicologia Escolar, por local <strong>de</strong> trabalhoEscolas Particulares Escolas Públicas TotalPrimeiraexperiência29534Ativida<strong>de</strong> atual21627Os dados da tabela IX exigem refl exão e colocam um problema dosmais graves, cuja natureza se refere a toda a psicologia aplicada, e <strong>no</strong>s leva arealizar uma análise do conjunto das informações obtidas a respeito das áreas <strong>de</strong>aplicação da Psicologia, em São Paulo.O estudo dos limites da aplicação das técnicas psicológicas, <strong>de</strong>ve seriniciado por uma revisão crítica da história do ensi<strong>no</strong> da Psicologia em São Paulo,<strong>de</strong> forma a revelar alguns problemas nucleares que merecem a atenção. Paradiag<strong>no</strong>sticar aqueles problemas, <strong>no</strong> entanto, é preciso adotar uma perspectivamais ampla do que os simples limites das preocupações formais com o conteúdodos conhecimentos, que os psicólogos <strong>de</strong>vem adquirir para exercer a suaprofi ssão e <strong>de</strong>fi nir, assim, alguns aspectos do ensi<strong>no</strong> e da profi ssão que não estãosendo consi<strong>de</strong>rados quando se discute apenas, o elenco das disciplinas que<strong>de</strong>vem compor um curso <strong>de</strong> Psicologia.Em São Paulo, antes <strong>de</strong> 1930, era inexistente o Ensi<strong>no</strong> Superior daPsicologia e, “até cerca <strong>de</strong> 1915 a infl uência francesa era incontrastável, e até1930 os cursos nas escolas <strong>no</strong>rmais eram <strong>de</strong> Psicologia Geral, entrando nelasmuito pouco a Psicologia Infantil e o ponto <strong>de</strong> vista genético e, em lugar das


Psicologia: Características da Profi ssão153teorias da aprendizagem, era tratada a formação <strong>de</strong> conceitos <strong>de</strong> um ponto <strong>de</strong>vista mais lógico que psicológico” (Cabral, 1950, p. 32-33).Até essa época encontramos alguns ensaios <strong>de</strong> aplicação <strong>de</strong> técnicaspsicológicas em São Paulo. Já em 1924 o engenheiro Roberto Mange introduziapráticas <strong>de</strong> orientação e seleção profi ssional para os aprendizes, <strong>no</strong> Liceu <strong>de</strong>Artes e Ofícios, em 1930; passou a prestar esses serviços junto à Estrada <strong>de</strong> FerroSorocabana (Santos, 1953). Em 1928, Lourenço Filho ensaiava a utilização, emvárias escolas da Capital, do seu teste ABC (Lourenço Filho, 1957). Franco daRocha e Durval Marcon<strong>de</strong>s, antes <strong>de</strong> 1930, interessados <strong>sobre</strong>tudo <strong>no</strong>s conceitose técnicas psicanalíticas, haviam-nas introduzido <strong>no</strong> estudo e tratamento dosdoentes mentais (Cabral, 1950).Se consi<strong>de</strong>rarmos que o objeto da Psicologia, enquanto ciência eenquanto profi ssão, é o conhecimento do e a intervenção <strong>no</strong> comportamentohuma<strong>no</strong>, somos obrigados a reconhecer que numa socieda<strong>de</strong> em processo lento<strong>de</strong> evolução, tal como o <strong>Brasil</strong> até a década <strong>de</strong> trinta, não po<strong>de</strong> haver consciênciados problemas, com os quais a Psicologia vai lidar. Ela não encontra lugar num paíson<strong>de</strong> as escolas são poucas e pequena a sua procura, on<strong>de</strong> o encaminhamentoprofi ssional dos jovens resolve-se <strong>no</strong> âmbito das ocupações tradicionais, on<strong>de</strong> aorganização familiar e a educação das crianças não oferecem problemas que fujamàs soluções fi xadas pelos costumes e pelos preceitos morais e religiosos, on<strong>de</strong>uma industrialização incipiente não tem problemas sérios com a mão-<strong>de</strong>-obra,ou mesmo, quando as comunida<strong>de</strong>s são razoavelmente estáveis e inexistentes osproblemas huma<strong>no</strong>s e sociais característicos das gran<strong>de</strong>s metrópoles.A partir <strong>de</strong> 1930 tem início <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> um processo <strong>de</strong> aceleração doseu ritmo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Segundo os mo<strong>de</strong>los oferecidos pelas socieda<strong>de</strong>smais <strong>de</strong>senvolvidas da época, os técnicos e os especialistas passam a ser vistoscomo indispensáveis para o progresso do país.Esse interesse <strong>no</strong>vo pela aplicação <strong>de</strong> técnicas que representam, <strong>de</strong>alguma forma, uma mo<strong>de</strong>rnização do país, refl ete-se <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> da Psicologia: em1931 uma disciplina psicológica é introduzida, pela primeira vez, <strong>no</strong> currículo <strong>de</strong>um curso universitário, e o <strong>no</strong>me que recebe – Psicologia Aplicada aos Problemasda Educação – dá indícios do caráter que se queria atribuir aos cursos.


154 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A partir <strong>de</strong> então, e dadas as características do movimento <strong>de</strong> idéias <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>, naquele momento, po<strong>de</strong>r-se-ia esperar que o ensi<strong>no</strong> superior passasse aser o principal responsável pela formação dos profi ssionais em Psicologia, e que<strong>no</strong> seu âmbito, a ciência e a pesquisa criassem sólidas raízes.Tal, porém, não aconteceu, e assim como me<strong>de</strong>ia um longo tempoentre a introdução da Psicologia num curso <strong>de</strong> nível superior e a criação doprimeiro curso superior <strong>de</strong> Psicologia, assim também a pesquisa é, ainda agora,incipiente mesmo <strong>no</strong>s centros universitários mais importantes, e estamos longeda originalida<strong>de</strong>, quer na criação da ciência, quer na invenção tec<strong>no</strong>lógica.Mesmo nas áreas aplicadas, como as tabelas relativas às ativida<strong>de</strong>s dos psicólogoso <strong>de</strong>monstram, é relativamente restrita a expansão dos serviços psicológicos àcomunida<strong>de</strong>.Estamos, portanto, diante <strong>de</strong> difi culda<strong>de</strong>s que, tanto o ensi<strong>no</strong> daPsicologia, como a sua aplicação, têm que enfrentar, e que se manifestam pelapouca receptivida<strong>de</strong> que as técnicas psicológicas encontram fora da clínica, e pelaescassa representação <strong>de</strong> profi ssionais em outras áreas <strong>de</strong> aplicação, <strong>sobre</strong>tudoem serviços escolares.Uma primeira explicação para tais difi culda<strong>de</strong>s po<strong>de</strong> ser encontrada nasresistências do meio ambiente às i<strong>no</strong>vações que a Psicologia traz à compreensão eao tratamento dos problemas do comportamento. Para o senso comum, o trabalhodos psicólogos <strong>sobre</strong>põe-se, <strong>de</strong> modo supérfl uo, ao <strong>de</strong> outros profi ssionais emesmo às funções da família. Assim sendo, é preciso chamar a atenção paraos problemas especiais que <strong>de</strong>vem ser enfrentados por uma profi ssão, que seproponha a introduzir práticas <strong>no</strong>vas em domínios tradicionais, ou consi<strong>de</strong>radoscomo o centro privativo da vida dos indivíduos.Mas, se compararmos as linhas principais <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento daPsicologia Aplicada e do ensi<strong>no</strong> superior da Psicologia, a partir <strong>de</strong> 1930, tornaseevi<strong>de</strong>nte que a explicação é insatisfatória. O que encontramos é um maiorinteresse pelas aplicações, em oposição ao <strong>de</strong>senvolvimento do ensi<strong>no</strong> superiorda Psicologia, o que parece indicar que se o meio não é muito acolhedor paraa profi ssão, também não oferece resistências excessivas. Tanto é assim que, em1953, um anteprojeto <strong>de</strong> lei, preparado pela Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicotécnica,


Psicologia: Características da Profi ssão155dava corpo às incompatibilida<strong>de</strong>s que então se imaginava existirem entre aformação universitária dos profi ssionais, com a ênfase necessária na ciência e<strong>no</strong> treinamento experimental, e a formação dos profi ssionais “técnicos”, ou“psicotécnicos”, visando aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s mais imediatas.Essa <strong>de</strong>fasagem entre as necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aplicação da Psicologia e opreparo <strong>de</strong> técnicos, e a insufi ciência do ensi<strong>no</strong> superior para formar profi ssionais,parece indicar que se po<strong>de</strong> ver a problemática do ensi<strong>no</strong> da Psicologia aindasob outra perspectiva, ou seja, o da ina<strong>de</strong>quação entre o ensi<strong>no</strong> superior e asnecessida<strong>de</strong>s que <strong>de</strong>terminam o aparecimento das profi ssões. Assim, enquanto sepreparavam os técnicos em cursos breves, ou <strong>no</strong> próprio exercício da profi ssão,a orientação predominante <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> superior era teórica, <strong>de</strong>vido em gran<strong>de</strong>parte, ao fato das disciplinas psicológicas, ou mesmo dos cursos <strong>de</strong> Psicologia,integrarem as Faculda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Filosofi a.Alguns dos problemas peculiares aos cursos superiores <strong>de</strong> Psicologia, eque merecem atenção, po<strong>de</strong>m ser assim or<strong>de</strong>nados: 1) separação entre ciência etécnica. As técnicas foram e são transportadas <strong>de</strong> seus países <strong>de</strong> origem, enquantotécnicas e com vistas à sua aplicação imediata; a ciência da qual elas <strong>de</strong>rivamaparece como um “acessório” à utilização das técnicas; 2) os cursos universitárioscontinuam não realizando sua vocação científi ca, incapazes <strong>de</strong> criar um padrãodiverso do simples consumo <strong>de</strong> conhecimentos que são transplantados, <strong>no</strong> maisdas vezes, em função das técnicas. A pesquisa, como expressão do crescimento ematurida<strong>de</strong> da universida<strong>de</strong>, ainda se faz <strong>de</strong> forma assistemática ou originada <strong>no</strong>esforço individual <strong>de</strong> pessoas isoladas, mesmo quando pertencem aos quadrosuniversitários; 3) a partir da lei nº 4119, os profi ssionais <strong>de</strong>vem ser formadosem cursos superiores, mas os cursos se manifestam impotentes para dinamizara profi ssão e ultrapassar as fórmulas, socialmente pobres, das velhas profi ssõesliberais.As difi culda<strong>de</strong>s e contradições que envolvem a concepção do ensi<strong>no</strong>superior <strong>de</strong> Psicologia, e se refl etem na profi ssão, aparecem com muita clareza,quando procuramos analisar o porquê da limitada atuação dos psicólogos naárea da Psicologia Escolar.


156 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Retomando, a título <strong>de</strong> exemplo, o ensi<strong>no</strong> da Psicologia na Universida<strong>de</strong><strong>de</strong> São Paulo, é importante salientar que o interesse pelos problemas do ensi<strong>no</strong>e da escola inspirou a estréia da Psicologia como disciplina <strong>de</strong> um curso <strong>de</strong> nívelsuperior. Esse interesse não era teórico, mas <strong>de</strong>scendia da gran<strong>de</strong> convivência<strong>de</strong> Lourenço Filho com os problemas do ensi<strong>no</strong> primário em São Paulo. Apósa transferência da disciplina para a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a, já com o <strong>no</strong>me <strong>de</strong>Psicologia Educacional, a vinculação com os problemas do ensi<strong>no</strong> e da escola vaise per<strong>de</strong>ndo, em parte, porque as ligações com a profi ssionalização dos alu<strong>no</strong>snão fossem tão imediatas; em parte, talvez, graças a uma <strong>no</strong>va orientação clínicaque se imprime à disciplina.Convém estabelecermos agora uma distinção que po<strong>de</strong>rá parecerinútil, à primeira vista, mas que, face ao problema da Psicologia Escolar, ganhaum signifi cado especial. A Psicologia oferece à educação duas qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>contribuições: uma, científi ca, que consiste <strong>no</strong>s conhecimentos <strong>sobre</strong> problemasque interessam à educação; a outra, que chamaríamos profi ssional, e queconsiste na introdução do psicólogo na escola, como um técnico interessado<strong>no</strong> <strong>de</strong>senrolar do processo educacional. A primeira recebe, comumente, o <strong>no</strong>me<strong>de</strong> Psicologia Educacional, mas não se trata <strong>de</strong> uma disciplina psicológica comobjeto e problemas próprios. Essa é uma <strong>de</strong>signação genérica que reúne aquelescampos especiais <strong>de</strong> investigação da ciência psicológica, tais como os estudosdo <strong>de</strong>senvolvimento mental, das diferenças individuais, da aprendizagem, etc.,isto é, todos os conhecimentos psicológicos que, <strong>de</strong> alguma forma, possamtrazer qualquer contribuição para a efi cácia do processo educativo. A segunda,chamamos <strong>de</strong> Psicologia Escolar, porque é uma área <strong>de</strong> aplicação da Psicologiavoltada para a solução dos problemas escolares concretos, que possam perturbaros objetivos educacionais.Ora, a Ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Psicologia Educacional da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo,tanto por integrar a Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a, Ciências e Letras, como pelas funçõesa que se <strong>de</strong>stinava <strong>no</strong> curso <strong>de</strong> Pedagogia e <strong>no</strong>s cursos <strong>de</strong> licenciatura para todosos alu<strong>no</strong>s da Faculda<strong>de</strong>, nunca se propôs a formação <strong>de</strong> psicólogos escolares.Enquanto uma ca<strong>de</strong>ira da Seção <strong>de</strong> Pedagogia, seu interesse estava voltado para aPsicologia Educacional, entendida como um conjunto <strong>de</strong> disciplinas psicológicas,


Psicologia: Características da Profi ssão157e, <strong>de</strong>pois, quando se constituiu o Curso <strong>de</strong> Psicologia, em 1958, passou a serresponsável por algumas das disciplinas básicas <strong>de</strong>sse curso.A explicação para a inexistência prática da Psicologia Escolar, <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>,envolve ainda outros fatores, sendo que um dos mais importantes resi<strong>de</strong> <strong>no</strong> modocomo as técnicas psicológicas foram encontrando aplicação <strong>no</strong> país. A orientaçãoprofi ssional oferece um bom exemplo. Des<strong>de</strong> a sua introdução, em 1924, <strong>no</strong>Liceu <strong>de</strong> Artes e Ofícios, em São Paulo, e <strong>de</strong>pois da criação do SENAI, em 1945,ela teve um <strong>de</strong>senvolvimento consistente, mas extremamente limitado, posto quea sua realização sistemática não ultrapassou o âmbito das escolas <strong>de</strong> aprendizesindustriais ou comerciais. Se esse âmbito <strong>de</strong> atuação correspon<strong>de</strong> às mo<strong>de</strong>stasambições originais da orientação profi ssional na França, ou mesmo <strong>no</strong>s EstadosUnidos, a concepção <strong>de</strong> uma orientação profi ssional voltada, exclusivamente,para os trabalhos manuais, foi vencida há muito pela progressiva <strong>de</strong>mocratizaçãoda escola secundária comum e pela evolução técnica da indústria, com a suacoorte <strong>de</strong> <strong>no</strong>vas e <strong>de</strong>sconhecidas profi ssões.Mais ainda, a orientação profi ssional dos jovens, concebida como umfator ten<strong>de</strong>nte a promover a <strong>de</strong>mocratização <strong>no</strong> mundo do trabalho e, portanto,a idéia <strong>de</strong> que a orientação profi ssional está vinculada ao <strong>de</strong>sti<strong>no</strong> <strong>de</strong>mocráticodas comunida<strong>de</strong>s, tem hoje plena aceitação. Um relatório <strong>de</strong>1962 explicita essaidéia <strong>no</strong> contexto francês:“Até os <strong>no</strong>ssos dias, a organização escolar, na França, e os meios <strong>de</strong>formação profi ssional refl etiram as concepções sociais <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong>estratifi cada e <strong>de</strong> tipo malthusia<strong>no</strong>. Nessas condições, só po<strong>de</strong>ria ser aceitauma orientação profi ssional <strong>de</strong>stinada às crianças das classes sociais mais<strong>de</strong>sfavorecidas (e mais numerosas) e que levasse aos empregos mais humil<strong>de</strong>s daeco<strong>no</strong>mia. A própria idéia <strong>de</strong> orientação escolar, se bem que expressa <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1936,durante muito tempo pareceu incongruente e mesmo atentatória à liberda<strong>de</strong>das famílias. Com efeito, só é possível uma orientação escolar em estruturaseducativas não concorrenciais e que permitam uma verda<strong>de</strong>ira mobilida<strong>de</strong> social.Em 1900, e mesmo em 1936, uma reforma escolar verda<strong>de</strong>ira teria posto emcausa os próprios fundamentos da socieda<strong>de</strong> francesa, porque teria modifi cadoseu modo <strong>de</strong> seleção das elites” (Bi<strong>no</strong>p, 1962, p. 134-35).


158 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Aparecendo, pois, a orientação profi ssional como um imperativo dassocieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong>mocráticas, a escola surge como o centro privilegiado para assumiressa tarefa. A mais bela concepção das funções <strong>de</strong>mocratizadoras da orientaçãoescolar e profi ssional é o projeto Langevin-Wallon, <strong>de</strong> reforma do ensi<strong>no</strong> francês,em que orientar constitui o núcleo socialmente signifi cativo do processoeducacional. Também <strong>no</strong>s Estados Unidos encontramos a mesma preocupação:“A maior responsabilida<strong>de</strong> em fornecer à juventu<strong>de</strong> a orientaçãovocacional necessária recai <strong>sobre</strong> o sistema escolar. Ele tem a seu cargo a gran<strong>de</strong>maioria dos jovens, na época em que mais necessitam <strong>de</strong> orientação vocacional.A escola, melhor do que qualquer outra agência da comunida<strong>de</strong>, está em posição<strong>de</strong> reunir informações relativas às qualida<strong>de</strong>s e características da juventu<strong>de</strong>. Elapo<strong>de</strong> reunir a informação ocupacional necessária e usá-la com maior proveito.O público confi a em suas escolas e <strong>no</strong> <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong>stas <strong>de</strong> proporcionar umserviço genuinamente <strong>de</strong>sinteressado. O público vem atribuindo mais e maisresponsabilida<strong>de</strong>s às escolas, <strong>no</strong> que se refere ao bem-estar das crianças e dajuventu<strong>de</strong>. Um programa a<strong>de</strong>quado <strong>de</strong> educação pública é impossível sem aorientação vocacional. Entretanto, o sistema escolar não po<strong>de</strong> realizar sem ajudaesse trabalho. Agindo como um lí<strong>de</strong>r responsável, ele <strong>de</strong>ve procurar e obter acooperação <strong>de</strong> muitas outras agências sociais /. . ./. Dessa forma, a orientaçãovocacional torna-se empresa da comunida<strong>de</strong>, centralizada nas escolas públicas”(Myers, 1941, p. 89).É bem verda<strong>de</strong> que assistimos, <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, a uma tentativa <strong>de</strong> implantaçãoda orientação profi ssional em <strong>no</strong>ssas escolas secundárias, por intermédio daOrientação Educacional. Assim, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1942, com a Reforma Capanema (LeiOrgânica do Ensi<strong>no</strong> Secundário, nº 4244, <strong>de</strong> 9/4/42), a Orientação Educacional éofi cializada em <strong>no</strong>ssas escolas secundárias. Não tendo a lei sido regulamentada enenhuma provisão sido feito quanto à formação dos orientadores, a OrientaçãoEducacional não teve nem acolhida nem <strong>de</strong>senvolvimento sequer razoável. Apósa Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação Nacional, <strong>de</strong> 1961, que em seu Art. 38,item V, instituía a orientação educativa e vocacional nas escolas do ensi<strong>no</strong> médio,e, em seus Arts. 62 e 63, baixava <strong>no</strong>rmas para a formação dos profi ssionais,regularizou-se a situação da Orientação Educacional. Entretanto, 10 a<strong>no</strong>s após alei, ela não é ainda uma prática comum em <strong>no</strong>ssas escolas secundárias públicas.


Psicologia: Características da Profi ssão159A existência <strong>de</strong> uma profi ssão, a <strong>de</strong> Orientador Educacional com seulugar legalmente garantido nas escolas secundárias públicas, tem conseqüênciaspara a Psicologia Escolar, mas a própria existência da orientação, como uma opçãodo Curso <strong>de</strong> Pedagogia, e não <strong>de</strong> Psicologia, é conseqüência <strong>de</strong> alguns equívocoshistóricos quanto à concepção do papel do psicólogo na escola, que <strong>de</strong>rivam,em gran<strong>de</strong> parte, da ênfase clínica que se atribuiu à profi ssão <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. É certoque, em 1942, quando pela primeira vez se instituiu a Orientação Educacional <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>, nem mesmo países como a França e os Estados Unidos podiam oferecermo<strong>de</strong>los seguros quanto à formação <strong>de</strong>sejável para esses <strong>no</strong>vos técnicos. OsVocational Counselors <strong>no</strong>s Estados Unidos, e os Conseilleurs d’Orientation, naFrança, foram, <strong>de</strong> início, recrutados <strong>no</strong>s meios docentes. É justo, pois, que <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>, em 1942, também se atribuíssem aos pedagogos essas funções, mesmoporque eram aqueles que, <strong>no</strong> curso superior, recebiam a mais coerente formaçãopsicológica. Porém, em 1961, quando da promulgação da Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Basesda Educação, ou em 1962, quando da Lei nº 4119, a situação era inteiramenteoutra. As experiências francesa e <strong>no</strong>rte-americana haviam <strong>de</strong>monstrado que,embora variassem os títulos e as funções 3 , os profi ssionais que trabalhavam nasescolas, ou em instituições vinculadas a elas, <strong>de</strong>veriam receber uma formaçãopsicológica, geralmente em nível <strong>de</strong> pós-graduação.3 Veja-se, a respeito da evolução da Psicologia Escolar <strong>no</strong>s Estados Unidos, Newland (1962),Super (1957) e Jones (1963). Assim, o School Psychologist, que originariamente lidava comos problemas <strong>de</strong> diagnóstico e reeducação dos <strong>de</strong>fi cientes, e os Vocational Counselorsou Guidance Counselors, ligados aos problemas do trabalho, viram, nesse processo, suasfunções per<strong>de</strong>rem os limites precisos e seus objetivos se unifi carem em tor<strong>no</strong> das criançase adolescentes <strong>no</strong>rmais. Super (1957) sugere que os termos predominantes, conselor ecounseling, representam uma síntese dos diversos serviços prestados pelos psicólogos nasescolas. Encontramos a mesma concepção ampla do termo counseling em Krumboltz eThoresen (1969). Mesmo na França, on<strong>de</strong> a evolução dos serviços é mais lenta por ser maisrigidamente fi xada na legislação fe<strong>de</strong>ral, também as funções dos Psychologues Scolaires e dosConseilleurs d’Orientation ten<strong>de</strong>m a se <strong>sobre</strong>por e a per<strong>de</strong>r os limites que as caracterizavam.Veja-se, a respeito, um relatório dos especialistas franceses em Bi<strong>no</strong>p (1962), bem como as<strong>de</strong>fi nições mais tradicionais <strong>de</strong> Zazzo (1953), Gal (1946), e Lefèvre (1949).


160 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Assim sendo, a legislação brasileira, como é <strong>de</strong> âmbito fe<strong>de</strong>ral e buscapadronizar as experiências educacionais, criou um impasse que representa umatraso extraordinário para o atendimento psicológico da população em ida<strong>de</strong>escolar, sem mencionar os benefícios da atuação do psicólogo para a própriaescola. Esse impasse, que é a resposta do problema da ausência do psicólogo nas<strong>no</strong>ssas escolas públicas, po<strong>de</strong> ser assim resumido:1. a Psicologia, por força das contingências que presidiram a suaintrodução <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, foi adotando, gradativamente, uma orientaçãoclínica;2. essa orientação acabou por subestimar as contribuições que aPsicologia po<strong>de</strong> oferecer fora da clínica, <strong>sobre</strong>tudo à escola;3. a Lei nº 4119 não procurou corrigir essa tendência, mas antesratifi cou-a, se não ao nível dos cursos, que <strong>de</strong>veriam formar psicólogos,ao me<strong>no</strong>s ao nível da profi ssão;4. o mais patente exemplo dos preconceitos profi ssionais ou acadêmicosque, disfarçadamente, presidiram a formulação legal, é o esquecimentoda Orientação Educacional, que <strong>de</strong>veria ter sido incorporada às funçõesdos psicólogos, tão precisamente especifi cadas pela lei;5. se esse esquecimento custou à Psicologia a perda <strong>de</strong> uma das suas mais<strong>no</strong>bres áreas <strong>de</strong> aplicação, e à Orientação Educacional o esvaziamento<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte das suas funções, ele é, sem dúvida, ainda mais onerosopara o sistema educacional como um todo.É inegável que a Psicologia Escolar, em seu sentido mais amplo emo<strong>de</strong>r<strong>no</strong>, implica em ativida<strong>de</strong>s clínicas, mas estas não representam a parcelamais importante das ativida<strong>de</strong>s do psicólogo escolar, pois a imensa maioriados alu<strong>no</strong>s não necessita <strong>de</strong>sse atendimento. Entretanto, é certo que a imensamaioria dos professores seria benefi ciada com a presença do psicólogo na escola,até mesmo porque, através <strong>de</strong> uma assessoria psicológica segura, estariam emcondições <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r a resolver, na própria sala <strong>de</strong> aula, gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong>problemas que, em outras circunstâncias acabariam por se converter em casosclínicos.


Psicologia: Características da Profi ssão161A inexistência da Psicologia Escolar, em <strong>no</strong>ssas escolas públicas,justifi ca os serviços <strong>de</strong> orientação profi ssional e vocacional e <strong>de</strong> orientaçãopsicopedagógica, que os psicólogos oferecem em suas clínicas particulares, masempobrece o conteúdo social <strong>de</strong>ssas intervenções e, <strong>de</strong> certa forma, cria umpadrão brasileiro <strong>de</strong> atendimento psicológico que é extremamente ina<strong>de</strong>quado,seja ao dinamismo que tem caracterizado, nas últimas décadas, a PsicologiaEscolar <strong>no</strong>s países mais adiantados, seja à <strong>no</strong>ssa realida<strong>de</strong> social e econômica.ConclusãoAcreditamos que pelo fato da Psicologia ser uma profi ssão mais oume<strong>no</strong>s recente entre nós, e pelo fato, já apontado, da in<strong>de</strong>fi nição que cercaas funções do psicólogo na socieda<strong>de</strong>, os cursos não têm oferecido mo<strong>de</strong>los<strong>no</strong>vos e estimulantes <strong>de</strong> atuação para o psicólogo, trazendo aos alu<strong>no</strong>s umaidéia ina<strong>de</strong>quada das suas funções sociais. A limitada extensão <strong>de</strong> serviços queo psicólogo presta à comunida<strong>de</strong> é, parcialmente, uma <strong>de</strong>corrência das funçõestambém limitadas que ele se atribui. Dada a virtual inexistência <strong>de</strong> serviçosclínicos públicos e gratuitos, nem mesmo a orientação clínica, predominante naPsicologia, po<strong>de</strong> ter ampla difusão e chegar a ser socialmente signifi cante, poisa clínica e o consultório particulares são eco<strong>no</strong>micamente seletivos, <strong>de</strong>stinadosa aten<strong>de</strong>r a uma escassa mi<strong>no</strong>ria, dotada <strong>de</strong> recursos. Nesse contexto cabe, eé justa, a crítica <strong>de</strong> A. Benkö (1970) acusando a psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> se tertransformado numa “ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> luxo”, ou, em outras palavras, numa ativida<strong>de</strong>supérfl ua.A formulação e manutenção da imagem <strong>de</strong> um profi ssional “<strong>de</strong> luxo”,transmite certos conteúdos i<strong>de</strong>ológicos residuais, que não po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> serapontados. Esses conteúdos são, basicamente, <strong>de</strong> duas or<strong>de</strong>ns: implicam umaconcepção da Psicologia alheia às instituições sociais, <strong>de</strong>votada ao estudo docomportamento huma<strong>no</strong> em si e por si; implicam um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atuação parao psicólogo <strong>de</strong>votado à melhoria individual em si e por si. É inegável, contudo,que o modo <strong>de</strong> vida do homem mo<strong>de</strong>r<strong>no</strong> é o modo <strong>de</strong> vida mais coletivo que ahistória da humanida<strong>de</strong> já conheceu. As tensões e confl itos que caracterizam a<strong>no</strong>ssa época são vividos por socieda<strong>de</strong>s inteiras. Os problemas psicológicos com


162 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>que <strong>no</strong>s <strong>de</strong>frontamos são, na verda<strong>de</strong>, problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> mental coletiva. Épreciso trazer ao primeiro pla<strong>no</strong> a preocupação <strong>de</strong> atuar <strong>sobre</strong> os <strong>de</strong>terminantessociais da conduta individual. As fontes virtuais <strong>de</strong> confl ito na comunida<strong>de</strong>, <strong>no</strong>país e, por fi m, <strong>no</strong> mundo, <strong>de</strong>vem ser gradativamente incorporadas a uma visãopsicológica do homem e também à perspectiva da Psicologia Clínica. A intensae extensa crítica ao mo<strong>de</strong>lo médico das doenças mentais é apenas um aspectodas tendências atuais da psicologia clínica, para situar as responsabilida<strong>de</strong>s dasocieda<strong>de</strong> na criação e manutenção dos padrões <strong>de</strong> conduta dos indivíduos.Na verda<strong>de</strong>, a crítica apresentou um duplo <strong>de</strong>safi o: um <strong>de</strong>safi o à ampliação dopróprio conceito <strong>de</strong> “clínica” ao nível mais geral da Psicologia, e um <strong>de</strong>safi o àinventivida<strong>de</strong> científi ca e técnica dos psicólogos.A abertura dos <strong>no</strong>ssos cursos <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> psicólogos para os problemasda <strong>no</strong>ssa socieda<strong>de</strong> e, por conseqüência, do <strong>no</strong>sso homem, representaria umatentativa <strong>de</strong> superar o problema dos estreitos limites <strong>de</strong> atuação que a Psicologiatem encontrado <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.BibliografiaBENKO, A. “Como se tem feito e como <strong>de</strong>verá ser feito o treinamento do PsicólogoClínico?” Arquivos <strong>Brasil</strong>eiros <strong>de</strong> Psicologia Aplicada, 22 (2) : 21-35, 1970.BINOP. “Intégration dês Jeunes dans um Mon<strong>de</strong> em Évolution Technique etÉco<strong>no</strong>mique Accélérée”. Bi<strong>no</strong>p, nº spécial, 123-44, 1962.CABRAL, A. “A Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>”. Boletim CXIX nº 3 da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Filosofi a,Ciências e Letras da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, 9-47, 1950.GAL, R. L’Orientation Scolaire. Paris, Press Universitaires <strong>de</strong> France, 1946.JONES, A. J. Principles of Guidance. New York, McGraw-Hill, 1963.KRUMBOLTZ, J, D. e Thorensen, C. E. (eds.) Behavioral Counseling: Cases andTechniques. New York, Holt, Rinehart and Winston, 1969.LEFÈVRE. Le Professeur Psychologue. Paris, Press Universitaires <strong>de</strong> France, 1949.LOURENÇO FILHO, M. B. O Teste ABC. São Paulo, Ed. Melhoramentos, 1957.MELLO, S. L. Psicologia e Profi ssão em São Paulo. Ed. Ática, S.P., 1975.MYERS, G. E. Principles and Techniques of Vocational Guidance. New York,McGraw-Hill, 1941.


Psicologia: Características da Profi ssão163NEWLAND, T. E. “Psychologists in the Schools”. In WEBB, W. E. (ed.) TheProfession of Psychology. New York, Holt, Rinehart and Winston, 1962.SANTOS, O. B. “Psicologia do Trabalho: Orientação Profi ssional”. In KLINEBERG,O. (ed.) A Psicologia Mo<strong>de</strong>rna. Liv. Agir Ed., 1953.SUPER, D. E. The Psychology of Careers. New York, Harper, 1957.ZAZZO, R. “Le Psychologue Scolaire”. Enfance: La Psychologie Scolaire, nºspécial, 1953.


CAPÍTULO 8POR QUE ESCREVEMOS ANTES, POR QUEESCREVERMOS AGORA?Sylvia Leser <strong>de</strong> MelloEl perigo real es la sor<strong>de</strong>ra...Julio Cortázar (1975, p. 91)Reler algo escrito há mais <strong>de</strong> trinta a<strong>no</strong>s é uma experiência reveladorae concreta do terrível sentimento do passar do tempo. Ela po<strong>de</strong> ser por <strong>de</strong>maisdolorosa quando temos, diante <strong>de</strong> nós, a manifestação legível do que pensavaa respeito da confi guração do mundo, e <strong>de</strong> seus efeitos, <strong>sobre</strong> algo que aindaera <strong>no</strong>vo para nós: uma ciência e uma profi ssão. Também é uma experiênciareveladora <strong>sobre</strong> o tempo e sua ação <strong>no</strong>s discursos e nas i<strong>de</strong>ias. O que julgavacom excessiva severida<strong>de</strong>, e sem complacência, caracterizando uma possíveltendência para a <strong>no</strong>va profi ssão é, hoje, parte importante <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong>,mas tão múltipla e variada, indicando caminhos inesperados, surpreen<strong>de</strong>ntes epromissores. Por isso tive muita resistência a reler e pensar o que ainda po<strong>de</strong>riaser escrito e se valeria a pena escrevê-lo. Mas, <strong>sobre</strong>tudo, porque, nas palavras<strong>de</strong> Foucault (1996), o discurso é um acontecimento, é em si mesmo e <strong>de</strong>veser liberado do signifi cante. Escrever algo <strong>sobre</strong> o passado tendo em menteesse ponto <strong>de</strong> partida é quase impossível, sem prece<strong>de</strong>r o discurso <strong>de</strong> uma


166 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong><strong>de</strong>scrição crítica <strong>de</strong> seus antece<strong>de</strong>ntes, <strong>de</strong> que lugar nasceu e quais eram as suaspretensões à verda<strong>de</strong>. Mo<strong>de</strong>stamente, repor as palavras <strong>de</strong> então <strong>no</strong> âmbito dacriação discursiva e propor palavras <strong>de</strong> agora como uma experiência atual <strong>de</strong>reconhecimento dos limites do alcance <strong>de</strong> um pensamento que, sem intenção,se revelava <strong>no</strong>rmativo.Em 1975 o país vivia a obscurida<strong>de</strong> política da dominação e da violênciamilitares. As universida<strong>de</strong>s públicas haviam sido duramente atingidas em alu<strong>no</strong>se professores, seus espaços <strong>de</strong>srespeitados. A ausência da <strong>de</strong>mocracia marcavaos rumos do país, adormecia consciências. Os órgãos encarregados da repressãotambém se acirravam contra o pensamento e a palavra escrita: diziam como,on<strong>de</strong> e o que po<strong>de</strong>ria ser dito, quais livros eram aceitáveis e quais não <strong>de</strong>veriamser indicados e lidos. Não há <strong>no</strong>vida<strong>de</strong> nessa censura: regimes ditatoriais etotalitários sempre temeram a palavra, a divergência e a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquernatureza.Quando não se é chamado a <strong>de</strong>cidir <strong>sobre</strong> o <strong>de</strong>sti<strong>no</strong> da socieda<strong>de</strong>,por me<strong>no</strong>r que seja a participação possível dos cidadãos numa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>massa, <strong>no</strong>s habituamos à conformida<strong>de</strong>, o arbítrio prevalece e a esfera públicace<strong>de</strong> lugar à privatização da vida social. A universida<strong>de</strong> foi profundamentemarcada pela violência do po<strong>de</strong>r militar que, como em todas as instituiçõeslegitimamente <strong>de</strong>mocráticas, teve um efeito <strong>de</strong>vastador. Também aqui <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>,os acontecimentos <strong>de</strong> 1968 na França, com o papel tão <strong>de</strong>cisivo dos estudantese <strong>de</strong> sua aliança com os operários, teve um impacto muito gran<strong>de</strong> na repressão,disparando, <strong>de</strong> fato, a caça aos movimentos populares <strong>de</strong> contestação do regime,e os estudantes e professores universitários foram do mesmo modo atingidospela brutalida<strong>de</strong> dos órgãos encarregados da contenção do que <strong>de</strong><strong>no</strong>minavamsubversão. Também, e em resposta à selvageria da repressão, diversas formas <strong>de</strong>resistência se formaram <strong>de</strong>ixando uma história que apenas começa a ser contada,ou revelada. As universida<strong>de</strong>s resistiram à invasão do seu espaço geográfi co e<strong>de</strong> seu espaço simbólico, embora tenham sido necessários alguns a<strong>no</strong>s paraque os da<strong>no</strong>s da censura e do po<strong>de</strong>r incontestável pu<strong>de</strong>ssem começar a serminimamente reparados.


Por que Escrevemos Antes, Por que Escrevermos Agora? 167Em 1970, o ensi<strong>no</strong> superior, ao passar pela reforma universitária,apoiada <strong>no</strong>s mo<strong>de</strong>los america<strong>no</strong>s, modifi ca profundamente a estrutura e asambições acadêmicas das universida<strong>de</strong>s, fragmentando os cursos e as disciplinase imprimindo uma posição <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque aos cursos com base tec<strong>no</strong>lógica. Haviauma clara intenção <strong>de</strong> <strong>de</strong>svalorizar as ciências humanas e a fi losofi a, perigosase contestadoras. As chamadas ciências duras ganharam espaço, porque sepretendia que elas pu<strong>de</strong>ssem colocar o país na corrida tec<strong>no</strong>lógica e promover amo<strong>de</strong>rnização. Um outro aspecto evi<strong>de</strong>nte da transformação do ensi<strong>no</strong> superiorfoi a criação <strong>de</strong> faculda<strong>de</strong>s particulares. O número <strong>de</strong> vagas oferecidas <strong>no</strong>sdiversos cursos pelas universida<strong>de</strong>s públicas, e algumas confessionais <strong>de</strong> altopadrão, não acompanhava a <strong>de</strong>manda crescente <strong>de</strong> formação dos jovens que,nessa época, ainda viam <strong>no</strong> estudo um mecanismo privilegiado <strong>de</strong> ascen<strong>de</strong>rsocialmente. Os chamados “exce<strong>de</strong>ntes”, jovens que não eram selecionados paraingressar <strong>no</strong>s cursos universitários, embora aprovados <strong>no</strong>s vestibulares, eramfontes potenciais <strong>de</strong> agitação das classes médias e <strong>de</strong> <strong>de</strong>scontentamento como regime. A resposta aberta pelas autorida<strong>de</strong>s militares foi liberar a criação <strong>de</strong>escolas particulares para eliminar um dos potenciais motivos <strong>de</strong> atrito com apopulação, que exigia vagas nas universida<strong>de</strong>s. De 68 em diante muitos cursos<strong>de</strong> Psicologia foram criados. A qualida<strong>de</strong> dos cursos e a intenção <strong>de</strong> oferecerboa formação aos alu<strong>no</strong>s, com possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> transformar efetivamente asescolhas profi ssionais, não pareciam ser a fi nalida<strong>de</strong> dos <strong>no</strong>vos cursos. Sabeseque a quantida<strong>de</strong> não representa a qualida<strong>de</strong>, lugar comum, mas instrutivo.Sabe-se, também, que as circunstâncias que cercam o nascimento <strong>de</strong> seres ouinstituições são parte fundamental <strong>de</strong> suas escolhas e <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>sti<strong>no</strong>s. Foinecessário muito tempo para que o gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> profi ssionais formadospu<strong>de</strong>sse começar a reverter esse quadro e a qualida<strong>de</strong> começasse a ser uma dasexigências da profi ssão.O mundo, hoje, é outro. O país, e o mundo, transformaram-se <strong>de</strong>maisnesses 35 a<strong>no</strong>s, as profi ssões sofreram signifi cativas mudanças e as perspectivasprofi ssionais já não são as mesmas. O trabalho que escrevi parece-me agora a préhistóriado quadro atual da profi ssão mas é, também, uma indicação segura dosrumos da mudança do mundo. Os escassos postos <strong>de</strong> trabalho que, na época,


168 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>indicavam uma vocação mais <strong>de</strong>mocrática da Psicologia, hoje se multiplicaram eos psicólogos são em gran<strong>de</strong> número nas escolas públicas, na atenção públicaà saú<strong>de</strong> e em outros postos <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> vocação mais social. Tiveram parteimportante <strong>no</strong>s movimentos que culminaram <strong>no</strong> fechamento dos hospitais,vergonhosos <strong>de</strong>pósitos <strong>de</strong> pacientes caracterizados como doentes mentais, e têmparticipado <strong>de</strong> maneira <strong>de</strong>cisiva <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncia e <strong>de</strong> dissolução dasclasses especiais, também <strong>de</strong>pósitos vergonhosos <strong>de</strong> crianças “ com difi culda<strong>de</strong>s”escolares. Eu ouso dizer, mesmo correndo o risco <strong>de</strong> ser mal entendida, queassistimos a um processo <strong>de</strong> humanização da Psicologia.Do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> quem lê, hoje, a pequena apreciação <strong>sobre</strong> operfi l profi ssional da Psicologia em 1975, o que aí se apresenta per<strong>de</strong>u-seirremediavelmente <strong>no</strong> passado. Os 180 psicólogos paulistas que entrevistei em1970, que eram a inteira população <strong>de</strong> profi ssionais da época, em São Paulo,parecem pioneiros distantes. Mas foram os criadores <strong>de</strong> padrões que ainda hojepersistem sob a forma <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> atuação, disciplinas dos currículos dos cursose valorização social <strong>de</strong> algumas áreas que representavam, naquele momento, otrabalho mais <strong>de</strong>sejável para os alu<strong>no</strong>s e futuros profi ssionais. Era uma profi ssãonascente e cheia <strong>de</strong> apelo e possibilida<strong>de</strong>s. Compreen<strong>de</strong>-se a atração queexerceu, e ainda exerce, <strong>sobre</strong> os jovens: uma espécie <strong>de</strong> aventura espiritual<strong>no</strong>s universos da cognição e do afeto. Um bom número dos entrevistados <strong>de</strong>então <strong>de</strong>u aulas, ou ainda dá, em cursos superiores e são, assim, formadores dosjovens que vinham, em gran<strong>de</strong> número, procurar os cursos <strong>de</strong> Psicologia e queforam, naquele momento, também pioneiros. Essas gerações formaram mestrese doutores – os <strong>no</strong>vos professores e pesquisadores –, garantindo a sua presençana re<strong>no</strong>vação e na criação <strong>de</strong> conhecimentos. Mas, às vezes, também, em suaretransmissão conservadora.Nestes a<strong>no</strong>s, a Psicologia se abriu para o mundo e já não cabe <strong>no</strong>sapertados limites das áreas <strong>de</strong> atuação on<strong>de</strong> se colocavam os psicólogos dosa<strong>no</strong>s 70. Mas, estranhamente, os currículos das disciplinas dos cursos não sãotão diferentes e embora se multipliquem e mesmo se <strong>de</strong>sdobrem, ainda hámuito dos i<strong>de</strong>ais e aspirações que motivaram os professores <strong>de</strong> 1950 e 1960 aenfrentarem difi culda<strong>de</strong>s e preconceitos para criarem os cursos superiores <strong>de</strong>


Por que Escrevemos Antes, Por que Escrevermos Agora? 169Psicologia. Criar os cursos nas universida<strong>de</strong>s signifi cava almejar uma formação<strong>de</strong> alto nível, digna <strong>de</strong> uma ciência <strong>no</strong>va mas her<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> questões que outrasciências humanas perseguiam há muito tempo: situar os homens <strong>no</strong> âmbitodo mundo construído por eles, <strong>de</strong>fi nir parentescos e fronteiras, estabeleceruma troca fecunda <strong>de</strong> perspectivas, métodos, teorias. Mas não foi uma açãotranquila para os seus <strong>de</strong>fensores, pois havia percepções diferentes do lugare da importância da Psicologia <strong>de</strong>vidas a uma forte corrente <strong>de</strong> concepçãotecnicista, que não encontrava espaço <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> superior e sua qualifi caçãocomo ciência, necessitada <strong>de</strong> formação acadêmica. Mas era ainda mais po<strong>de</strong>rosoo preconceito que reduzia a Psicologia ao exercício empírico <strong>de</strong> pessoas semqualquer formação, nem mesmo a técnica. Esse preconceito ainda se fez sentirmesmo após a criação e regulamentação da Psicologia e durante ataquesreiterados, que ainda hoje ameaçam a profi ssão, propondo sua subordinaçãoincondicional, por exemplo, ao saber médico. A ausência <strong>de</strong> <strong>de</strong>fi nição <strong>de</strong> umcampo próprio <strong>de</strong> conhecimento, ou a sua duplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ciência biológica, mas,com certeza, humana e histórica, que consi<strong>de</strong>ramos como uma riqueza especial,se apresentava como fragilida<strong>de</strong> propícia às tentativas <strong>de</strong> assimilação a outroscampos <strong>de</strong> atuação e <strong>de</strong> conhecimento.Quando realizei a pesquisa, que <strong>de</strong>u origem à publicação <strong>de</strong>sse artigo,eu acreditava que a Psicologia, fi ncando suas raízes <strong>no</strong> solo das universida<strong>de</strong>s,estaria situada em lugar apropriado para respon<strong>de</strong>r questões ou, ao me<strong>no</strong>s,acirrar os <strong>de</strong>bates salutares da interdisciplinarida<strong>de</strong>.Talvez essas coisas já tenham acontecido ou estejam acontecendo. Agoraa Psicologia ocupa um lugar próprio e respeitável <strong>no</strong> conjunto dos cursos quea universida<strong>de</strong> oferece aos seus alu<strong>no</strong>s. Enquanto outras áreas <strong>de</strong>saparecemou per<strong>de</strong>m a sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> em contacto com outras, a Psicologia se fortaleceexpandindo seus limites, acolhendo e se associando a conhecimentos <strong>de</strong> outrasáreas <strong>de</strong> atuação. Mas o discurso produzido em 1975 evoca outros tempos,outras circunstâncias e, nesse sentido, tem algum valor porque é sempreimportante voltar-se para o passado e redimir, se possível, os <strong>no</strong>ssos mortos.Porque, lembrando Walter Benjamin (1994, p. 17): “O que é ‘solucionado’?Todas as questões da vida vivida não fi cam para trás, como uma ramagem


170 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>que <strong>no</strong>s impedisse a visão? Em <strong>de</strong>sbastá-la, em iluminá-la sequer, difi cilmentepensamos. Seguimos adiante, a <strong>de</strong>ixamos atrás <strong>de</strong> nós, e da distância ela é semdúvida abarcável, mas indistinta, sombria e, nessa medida, mais enigmaticamenteenredada.”Não foi fácil ou simples escrever estas poucas linhas. Mas o testemunhodo que uma vez foi vivido e pensado aí está. E, com certeza, também fi ca registradaa ação das pessoas que <strong>de</strong>ram formato aos rumos que a profi ssão foi adotandoe, embora sujeita às mudanças que o tempo exige, ou às vicissitu<strong>de</strong>s a que ele dáorigem, se mostra capaz <strong>de</strong> enfrentar os <strong>de</strong>safi os do presente e do futuro. O quese po<strong>de</strong> perceber é que a própria Psicologia e seus órgãos representativos nãofi caram ausentes <strong>de</strong>sses <strong>de</strong>safi os e têm respondido com acertada prontidão às<strong>de</strong>mandas da socieda<strong>de</strong>, valorizando as disposições <strong>de</strong>mocráticas tão presentesna profi ssão. Cada um dos testemunhos que foram sendo <strong>de</strong>positados na históriada profi ssão po<strong>de</strong>m ter, humil<strong>de</strong>mente, o papel <strong>de</strong> tornar me<strong>no</strong>s sombrias eme<strong>no</strong>s indistintas as questões que presidiram a sua origem.ReferênciasBenjamin,W. (1994). Rua <strong>de</strong> Mão Única. São Paulo: <strong>Brasil</strong>iense.Cortázar, J. (1975). La Casilla <strong>de</strong> los <strong>More</strong>lli. Barcelona: Tusquets.Foucault, M. (1996). Or<strong>de</strong>m do Discurso. São Paulo: Loyola.


CAPÍTULO 9*A QUEM NÓS, PSICÓLOGOS, SERVIMOS DEFATO 1 ?Sílvio Paulo BotoméAo receber a correspondência da Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> RibeirãoPreto, lemos que vocês gostariam que o trabalho, neste simpósio, fosse iniciadocom uma “análise crítica da atuação do psicólogo em termos do público quetem sido tradicionalmente atendido”. Talvez não sejamos capazes <strong>de</strong> realizar umaanálise sufi cientemente crítica, mas, tentando aten<strong>de</strong>r um pouco à solicitaçãofeita, vamos examinar alguns dados <strong>sobre</strong> a atuação dos psicólogos. Para isso,usaremos como exemplo, a atuação dos psicólogos em São Paulo.No início <strong>de</strong> seu livro “A maturida<strong>de</strong> mental”, Overstreet (1967)chama a atenção em relação ao conhecimento característico do século XX sero “conhecimento psicológico”. O autor salienta que, embora tenha havidodramático <strong>de</strong>senvolvimento na Física e na Química com o método científi co, essaatitu<strong>de</strong> ou disposição (científi ca) em relação à natureza e experiência humana é<strong>no</strong>va. O autor ainda <strong>de</strong>staca que isso não po<strong>de</strong>ria ter acontecido anteriormente.*Referência completa do texto original: Botomé, S. P. (1979). A quem nós, psicólogos,servimos <strong>de</strong> fato? Psicologia, 5, 1-15.1 Este trabalho foi apresentado <strong>no</strong> simpósio “A quem a Psicologia aten<strong>de</strong> e a quem <strong>de</strong>veriaaten<strong>de</strong>r?”, realizado na VIII Reunião Anual da Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> Ribeirão Preto (SP),em outubro <strong>de</strong> 1978. Nos a<strong>no</strong>s seguintes, a Socieda<strong>de</strong> se transformou na Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira<strong>de</strong> Psicologia.


172 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Foi necessário haver, antes, uma longa preparação. A Fisiologia teve, primeiro,que se constituir como uma disciplina. O <strong>de</strong>grau que possibilitou esse avançoda Fisiologia foi um adiantado conjunto <strong>de</strong> conhecimentos <strong>sobre</strong> processos efenôme<strong>no</strong>s biológicos. Mas, antes da Biologia, teve que haver um signifi cativo<strong>de</strong>senvolvimento da Química e, antes <strong>de</strong>la, da Física e, ainda antes <strong>de</strong>sta última,da Matemática. “Parece – salienta o autor – haver um <strong>de</strong>spertador científi co.Cada disciplina tem uma hora histórica para manifestar-se. Hoje – parece! – o<strong>de</strong>spertador da Ciência anuncia a hora da Psicologia e, talvez, estejamos em umaera on<strong>de</strong> se vê nascer um <strong>no</strong>vo esclarecimento (...)”.O autor prossegue consi<strong>de</strong>rando que “sem dúvida alguma, os interessesexplorados pela disciplina que nasce são antigos, mas a acuida<strong>de</strong> da pesquisa é<strong>no</strong>va. Parece haver uma lógica <strong>de</strong> ferro <strong>no</strong> domínio das coisas: cada disciplinatem que aguardar o momento para alcançar sua acuida<strong>de</strong> específi ca, até que adisciplina prece<strong>de</strong>nte lhe tenha fornecido os dados e instrumentos para tanto.Hoje, esta <strong>no</strong>va acuida<strong>de</strong> <strong>no</strong> campo da Psicologia está trazendo concepções queestão reformando <strong>no</strong>ssa vida”. É em relação a essa afi rmação <strong>de</strong> Overstreet queparece haver a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um exame mais <strong>de</strong>morado: a vida <strong>de</strong> quem estásendo reformada em quê?Sem dúvida, a Psicologia é a disciplina (a área <strong>de</strong> conhecimento) domomento. Está na moda, não apenas nas revistas e livros, mas nas verbas <strong>de</strong>pesquisa, na proliferação <strong>de</strong> cursos e escolas e <strong>no</strong> “milagroso” surgimento <strong>de</strong><strong>no</strong>vida<strong>de</strong>s “clínicas”, “terapêuticas” e outras capazes <strong>de</strong> fazer “tanto” pelos“problemas huma<strong>no</strong>s”. No entanto, se perguntarmos o que é feito em Psicologia,hoje, precisamos examinar do que, efetivamente, se ocupam os psicólogos nassuas ativida<strong>de</strong>s profi ssionais. Talvez aí encontremos mais precisa e claramentealguma resposta à pergunta “a quem a Psicologia está servindo?”.Sylvia Leser <strong>de</strong> Mello (1975), em uma investigação <strong>sobre</strong> “Psicologia eprofi ssão em São Paulo” faz, para nós psicólogos, um primeiro alerta <strong>sobre</strong> adireção dos serviços em Psicologia. Em seu trabalho a autora mostra a discrepânciaentre quatro grupos <strong>de</strong> ocupações tradicionais da Psicologia: Clínica, Escola,Indústria e Ensi<strong>no</strong> da Psicologia. O que a investigação <strong>de</strong> Mello <strong>de</strong>nuncia é umperigoso <strong>de</strong>sequilíbrio entre esses quatro campos <strong>de</strong> aplicação do conhecimentoem Psicologia.


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 173Na Figura 1 há uma representação aproximada das percentagens<strong>de</strong> ocupações dos psicólogos formados por três dos mais tradicionais cursos<strong>de</strong> Psicologia da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo: Se<strong>de</strong>s Spientiae, São Bento (ambos daPontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo) e Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (USP).A Figura 1 ilustra que a gran<strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> ocupação dos psicólogos é aclínica, com um índice oscilando em tor<strong>no</strong> <strong>de</strong> 60% dos profi ssionais <strong>de</strong>dicandosea esse tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>. Em segundo lugar, os psicólogos se ocupam com oensi<strong>no</strong> <strong>de</strong> Psicologia (em tor<strong>no</strong> <strong>de</strong> 25% dos profi ssionais realizam esse tipo <strong>de</strong>trabalho). As ativida<strong>de</strong>s em escolas e indústrias fi cam em tor<strong>no</strong> dos 15% restantes,aproximadamente.Figura 1. Distribuição <strong>de</strong> percentagens aproximadas das ocupações atuais principais dospsicólogos formados por três universida<strong>de</strong>s da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, pelos campos <strong>de</strong> atuaçãodos profissionais, em 1969 (Fonte: Mello, 1975).Ao examinar essas ocupações, Mello ainda observa que a quase totalida<strong>de</strong>das ocupações em clínica se distribuem indicando que os psicólogos atuam,preferencialmente, como profi ssionais autô<strong>no</strong>mos, sendo a clínica particular aexpressão mais concreta <strong>de</strong>ssa preferência por tipo <strong>de</strong> trabalho dos profi ssionais


174 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>da Psicologia. A autora explica “chamamos preferencial a ativida<strong>de</strong> autô<strong>no</strong>maporque foi possível constatar uma evasão <strong>de</strong> todas as ativida<strong>de</strong>s assalariadas embenefício das ativida<strong>de</strong>s autô<strong>no</strong>mas” (Mello, 1975, p. 44).Os dados apresentados por Sylvia Leser <strong>de</strong> Mello e sua análiserevelam (ou <strong>de</strong>nunciam) uma tendência <strong>no</strong> tipo <strong>de</strong> serviço que os psicólogospreferencialmente oferecem à comunida<strong>de</strong>. O trabalho <strong>de</strong> Mello mostra, emlinhas gerais, do que se ocupam os psicólogos formados por três gran<strong>de</strong>suniversida<strong>de</strong>s paulistas. A partir disso é útil examinar quem ele aten<strong>de</strong> nessasocupações preferenciais e ten<strong>de</strong> a aten<strong>de</strong>r cada vez mais.O Boletim Informativo do Sindicato dos Psicólogos <strong>de</strong> São Paulo, emuma publicação <strong>de</strong> 1977 (relatório publicado em <strong>no</strong>vembro do mesmo a<strong>no</strong>),mostrou quanto custavam os serviços do “trabalho preferencial dos psicólogos”.Na Tabela 1 estão apresentados os preços <strong>de</strong>sses serviços em 1977 e umaestimativa para o a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1978.Tabela 1Preços* <strong>de</strong> diferentes tipos <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> Psicologia em 1977 e estimativa parao a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1978 na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.PREÇOS DOS SERVIÇOS EM 1977PREÇOSTIPOS DE SERVIÇOSORIENTAÇÃOVOCACIONALPREÇOS DOS SERVIÇOSESTIMADOS PARA 1978MÉDIA VARIAÇÃO MÉDIA VARIAÇÃO2.000,00300,00 a4.500,002.800,00420,00 a6.300,00PSICODIAGNÓSTICO 2.300,00500,00 a700,00 a3.220,003.500,004.900,00CONSULTA 400,00 - 560,00 -SESSÃO INDIVIDUAL 400,00 - 560,00 -SESSÃO EM GRUPO 300,00 - 420,00 -(Fonte: Sindicato dos Psicólogos <strong>de</strong> São Paulo, 1977)*Os valores são em cruzeiros e o salário mínimo, em 1977, correspondia a aproximadamente1.500,00, nessa moeda.Na Tabela 1 po<strong>de</strong> ser vista a relação dos preços dos serviços <strong>de</strong>Psicologia e sua relação com o salário mínimo aproximado na época (1977). Uma


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 175consulta ou sessão semanal com um psicólogo equivaleria a gastar, na médiados preços, um salário mínimo por mês com esse tipo <strong>de</strong> atendimento. Umaorientação vocacional ou um psicodiagnóstico custaria, cada um, mais <strong>de</strong> umsalário mínimo também na média dos preços cobrados pelos profi ssionais <strong>de</strong>Psicologia na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. No a<strong>no</strong> seguinte, esses preços manteriam amesma proporcionalida<strong>de</strong> em relação ao salário mínimo ajustado para o <strong>no</strong>voa<strong>no</strong>.Na Figura 2 fi ca mais visível a relação entre o preço dos serviços dospsicólogos e o salário mínimo em São Paulo. Uma orientação vocacional ouum psicodiagnóstico chegam a custar, cada um, em média, quase dois saláriosmínimos. Comparando o salário mínimo com os preços mais altos dos serviçosdos psicólogos, esses valores custam dois ou mais salários mínimos. No caso <strong>de</strong>consulta ou sessão individual, o valor se aproxima pouco mais <strong>de</strong> um saláriomínimo por mês (consi<strong>de</strong>rando quatro consultas nesse período).Os dados da Figura 2 foram extraídos e estimados das informaçõesexistentes <strong>no</strong> Boletim do Sindicato dos Psicólogos <strong>de</strong> São Paulo. No primeirosemestre <strong>de</strong> 1978, os alu<strong>no</strong>s da disciplina “Psicologia preventiva ou educaçãosocial?”, do Curso <strong>de</strong> Psicologia da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo,encontraram preços bem mais altos que os estimados com 40% <strong>de</strong> acréscimopara o a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 1978, a partir dos dados do Boletim do Sindicato <strong>sobre</strong> os preçospraticados em 1977.Figura 2. Média estimada em cruzeiros (moeda <strong>de</strong> 1977) dos preços dos serviços <strong>de</strong> psicologiaem relação ao salário mínimo <strong>no</strong> segundo semestre <strong>de</strong> 1978 na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo,consi<strong>de</strong>rando 40% <strong>de</strong> aumento <strong>no</strong>s preços <strong>de</strong> 1977 indicados <strong>no</strong> Boletim do Sindicato dosPsicólogos em <strong>no</strong>vembro <strong>de</strong> 1977. A estimativa dos preços é consi<strong>de</strong>rada <strong>no</strong> mês para osatendimentos semanais (atendimento individual ou em grupo).


176 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Pelos dados observados nas Figuras 1 e 2 e na Tabela 1, só quem recebemais <strong>de</strong> três salários mínimos terá possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pagar os preços dos serviçosdos psicólogos, consi<strong>de</strong>rando que qualquer pessoa tem outras <strong>de</strong>spesas paracustear sua vida ao longo <strong>de</strong> um mês. Isso signifi ca que os serviços da Psicologiasó são acessíveis a quem recebe mais <strong>de</strong> três salários mínimos por mês, fazendocom que seja necessário perguntar: quem, na população brasileira, efetivamentepo<strong>de</strong> arcar com esses preços, po<strong>de</strong>ndo pagá-los se necessitar <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong>serviço?Singer (1975) apresentou, <strong>no</strong> jornal Opinião, que, em 1972, a populaçãobrasileira tinha uma renda distribuída <strong>de</strong> forma muito diferenciada, conformepo<strong>de</strong> ser visto na Figura 3. Os dados <strong>sobre</strong> a distribuição da renda familiar dosbrasileiros mostram que apenas uma parcela aproximada <strong>de</strong> 5 a 15% das famíliasbrasileiras po<strong>de</strong>ria pagar, e provavelmente com difi culda<strong>de</strong>, por serviços <strong>de</strong>Psicologia para alguém da família. Isso signifi ca que somente os que, em tese,têm mais e melhores condições <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong> rendimento serão atendidos pelospsicólogos, mantendo as condições <strong>de</strong> pagamento aos serviços <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong>smol<strong>de</strong>s <strong>de</strong> São Paulo <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 1977 e 1978. Serão eles os que mais necessitamdos serviços <strong>de</strong> Psicologia? Os <strong>de</strong>mais 85% da população não necessitam <strong>de</strong>ssesmesmos serviços? O que os psicólogos têm a oferecer é “tão especial” que agran<strong>de</strong> maioria <strong>de</strong> seus benefícios só se dirige aos ricos mais ricos?É alarmante a distorção encontrada em tais dados e a direção <strong>de</strong> suastransformações não parece estar melhorando para a maior parte da população.A formação dos psicólogos permanece sendo em gran<strong>de</strong> parte a mesma: osalu<strong>no</strong>s continuam procurando preferencialmente por clínicas e ativida<strong>de</strong>s afi ns,o mercado parece reconhecer e pagar apenas aos “autô<strong>no</strong>mos”, pagando muitome<strong>no</strong>s aos que colocam seus serviços sob o rótulo <strong>de</strong> “assalariados”. On<strong>de</strong> estarãoessas condições dos serviços <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong>s próximos a<strong>no</strong>s? Os psicólogos eadministradores da Psicologia, como ciência e como profi ssão, mudarão essastendências? O que dará a Psicologia a um povo <strong>de</strong> um país pobre como o <strong>Brasil</strong>?


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 177Figura 3. Distribuição percentual da população em relação à renda em salários mínimos porfamília em 1972 <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> (Fonte: Singer, 1975).É possível examinar, pelo me<strong>no</strong>s um pouco, o que po<strong>de</strong>rá ser, em umfuturo próximo, a Psicologia que os dados examinados mostraram como profi ssãoe benefício para o país. Os dados <strong>sobre</strong> as escolas, os cursos <strong>de</strong> graduação, on<strong>de</strong>são preparados os psicólogos que estarão trabalhando <strong>no</strong>s próximos a<strong>no</strong>s não sórevelam tendências como as que apareceram na Figura 1 <strong>sobre</strong> as preferênciasdos psicólogos. Os cursos e os psicólogos estão aumentando em uma progressãomuito acelerada que não parece compatível com as necessida<strong>de</strong>s da populaçãodo país, consi<strong>de</strong>rando os dados existentes na década <strong>de</strong> 1970. Talvez sejama<strong>de</strong>quados apenas aos interesses ou aos lucros <strong>de</strong> pessoas ou grupos muitorestritos <strong>no</strong> país.


178 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Figura 4. Evolução da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong> Estado <strong>de</strong> São Paulo <strong>de</strong> 1960 a1975. (Fontes: MEC, 1968; Mello, 1971; Pastore, 1972; Secretaria da Educação e Cultura, 1975).Na Figura 5 aparece a evolução da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> matrículas <strong>no</strong>s cursos<strong>de</strong> Psicologia do Estado <strong>de</strong> São Paulo <strong>no</strong> período <strong>de</strong> 1960 a 1975, <strong>de</strong>ixandomais claro a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> agentes prestadores <strong>de</strong> serviço <strong>de</strong> Psicologia com aprovável “preferência” caracterizada <strong>no</strong>s dados das Figuras 1 a 3 e Tabela 1.Figura 5. Evolução da quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> matrículas <strong>no</strong>s cursos <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong> Estado <strong>de</strong> SãoPaulo <strong>de</strong> 1960 a 1975. (Fontes: MEC, 1968; Mello, 1971; Pastore, 1972; Secretaria da Educaçãoe Cultura, 1975).


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 179Além do gran<strong>de</strong> aumento <strong>no</strong>s cursos <strong>de</strong> Psicologia, cada um <strong>de</strong>les tambémaumentou a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alu<strong>no</strong>s matriculados com um respectivo aumento <strong>de</strong>vagas em vários <strong>de</strong>sses cursos. O que levou, <strong>no</strong> Estado, a haver um aumentotão gran<strong>de</strong> em apenas uma década e meia? As necessida<strong>de</strong>s da população? Dequal população? Para aten<strong>de</strong>r a uma pequena percentagem das pessoas queconstituem a socieda<strong>de</strong>, são necessários tantos psicólogos? O aumento <strong>de</strong>profi ssionais também acarretará <strong>no</strong>vas formas <strong>de</strong> atuação profi ssional? Novasperspectivas para o trabalho nesse campo <strong>de</strong> atuação? O que acontecerá, irá alémda repetição das <strong>de</strong>mandas tradicionais e ofertas <strong>de</strong> emprego já conhecidas?O inquietante nesse tipo <strong>de</strong> dados é a tendência acelerada a haver umagran<strong>de</strong> disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atendimento aos que me<strong>no</strong>s necessitam <strong>de</strong> serviços<strong>de</strong> Psicologia. Parece que, se forem mantidas as “preferências” <strong>de</strong> trabalhoi<strong>de</strong>ntifi cadas por Mello (1975), os psicólogos estarão aten<strong>de</strong>ndo cada vez maisa quem tem mais dinheiro <strong>no</strong> país e, com alta probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>scuidar dos<strong>de</strong>mais, com me<strong>no</strong>s recursos fi nanceiros.Como se não bastasse, a concentração <strong>de</strong> renda <strong>no</strong> país pareceajudar essa tendência. Se houvesse uma direção para um maior equilíbrio nadistribuição da renda <strong>no</strong> país, talvez pu<strong>de</strong>sse haver maior “tranquilida<strong>de</strong>” com atendência <strong>de</strong> a Psicologia se voltar para ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> serviço caras, atualmenteacessíveis a apenas cerca <strong>de</strong> 15% da população. Uma progressiva concentração<strong>de</strong> renda, porém, aumenta a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> profi ssionais e administradoresda Psicologia em relação ao que é feito e ao que po<strong>de</strong>m fazer os psicólogos comoserviço à população que constitui o país.Po<strong>de</strong>mos avaliar quanto estamos sendo profi ssionalmente atingidospela política e pela administração do país nesta última década e meia. Tambémseja possível avaliar agora a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reformas ou mudanças sociais que,sem dúvida, <strong>no</strong>s atingem e envolvem como psicólogos, como profi ssionais<strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> serviço para o país. Ou, ainda, quanto um regime político outipo <strong>de</strong> gover<strong>no</strong> como o que temos infl ui na administração, na concepção, <strong>no</strong>ensi<strong>no</strong> e <strong>no</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma profi ssão como a dos psicólogos <strong>no</strong> país.Os <strong>de</strong>terminantes sociais, políticos e econômicos precisam ser examinados em


180 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>relação à infl uência que exercem <strong>sobre</strong> o que fazemos como profi ssionais daPsicologia e como parte da classe dominante, seja como componentes ativos, sejacomo seus servidores ou como aspirantes a participar <strong>de</strong>la.Em relação a tudo isso, expresso ou “anunciado” como possibilida<strong>de</strong><strong>no</strong>s dados examinados, parece útil examinar quatro conjuntos <strong>de</strong> aspectosque parecem mais acessíveis e pertinentes ao que po<strong>de</strong>mos interferir comoestudantes, pesquisadores, professores ou profi ssionais <strong>de</strong> outras modalida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> atuação na Psicologia: (1) o mercado <strong>de</strong> trabalho, (2) a formação do psicólogoem relação a esse mercado, (3) a produção e a divulgação do conhecimento emPsicologia e (4) a administração da Psicologia como Ciência e como profi ssão <strong>no</strong>País.O mercado <strong>de</strong> trabalho dos psicólogosHá uma concordância generalizada <strong>de</strong> que um dos mais po<strong>de</strong>rosos<strong>de</strong>terminantes do trabalho dos psicólogos é o mercado <strong>de</strong> seus serviços. Parecenão haver dúvidas <strong>de</strong> que ele é o fator “mestre” <strong>no</strong> exame do que leva ospsicólogos a agirem profi ssionalmente <strong>de</strong>sta ou daquela maneira. Pelo me<strong>no</strong>s<strong>no</strong> que é predominante <strong>no</strong> exercício da profi ssão. Também parece não haverdúvidas <strong>de</strong> que a relação entre procura e oferta dos serviços <strong>de</strong> Psicologia éum forte <strong>de</strong>terminante das principais ocupações profi ssionais dos psicólogos <strong>no</strong>país.Mas não basta consi<strong>de</strong>rar só tais <strong>de</strong>terminantes ou aspectos do exercícioprofi ssional. A oferta <strong>de</strong> cada tipo <strong>de</strong> serviço em Psicologia também é <strong>de</strong>terminadapor variáveis que po<strong>de</strong>mos i<strong>de</strong>ntifi car, revelar e alterar. A mesma coisa ocorre coma procura dos serviços <strong>de</strong> Psicologia. Ela também ocorre <strong>de</strong> certa forma <strong>de</strong>vidoa variáveis (fatores, aspectos, eventos...) acessíveis à percepção e intervençãohumanas. Por que não interferimos nisso? Talvez, nessa pergunta, estejampresentes várias exigências ou <strong>de</strong>safi os aos que são pesquisadores na Psicologia.As relações entre a procura e a oferta dos serviços <strong>de</strong> Psicologia são afetadas porvariáveis que, como psicólogos, temos que examinar e <strong>sobre</strong> as quais tambémtemos que interferir por meio <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa própria atuação profi ssional em múltiplasinstâncias.


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 181Quem, como e quando procura os serviços <strong>de</strong> Psicologia? Em geralo comportamento – ou classe geral <strong>de</strong> respostas! – <strong>de</strong> “procurar serviços<strong>de</strong> Psicologia” tem sido apresentado pela população diante <strong>de</strong> situaçõesproblemáticas extremas ou quase, ou diante <strong>de</strong> situações tradicionalmenteatribuídas aos psicólogos como trabalho profi ssional dos mesmos. Os psicólogossão solicitados porque “há um problema que só um psicólogo po<strong>de</strong> resolver”ou porque “faz parte do serviço ter um psicólogo <strong>no</strong> quadro <strong>de</strong> funcionários”.Os psicólogos são consi<strong>de</strong>rados necessários quando há problemas sérios comas pessoas (“precisam <strong>de</strong> terapia”, “há problemas com os recursos huma<strong>no</strong>sna empresa”, “há difi culda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aprendizagem”) ou quando é “usual” ter opsicólogo realizando certas ativida<strong>de</strong>s (seleção <strong>de</strong> pessoal, psicodiagnóstico,treinamento <strong>de</strong> pessoal).Só para esses casos serve o trabalho dos psicólogos? Não são profi ssionaisaptos a ajudar em outros campos (ou subcampos) <strong>de</strong> atuação além dos játradicionalmente <strong>de</strong>fi nidos como sendo <strong>de</strong> competência ou responsabilida<strong>de</strong>do psicólogo? O trabalho dos psicólogos só é necessário para “curar quem nãoestá bem”, ou para “resolver problemas huma<strong>no</strong>s que já surgiram”? Serão ospsicólogos, à maneira da medicina tradicional, profi ssionais que só cuidam dosproblemas huma<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois que eles se tornam sérios?Compete aos profi ssionais da Psicologia, mostrar o que a Psicologiatem e em que po<strong>de</strong> ajudar nas áreas on<strong>de</strong> há mais problemas, nas áreas on<strong>de</strong>é possível evitá-los ou nas quais seja possível promover melhores condiçõespara o <strong>de</strong>senvolvimento da vida humana, mesmo que não existam problemasi<strong>de</strong>ntifi cados. Não é sufi ciente uma profi ssão <strong>de</strong>dicar-se na maioria <strong>de</strong> sua atuaçãoa “curar” ou “remediar” problemas. É necessário atuar também para “prevenir”ou “impedir” os problemas <strong>de</strong> acontecerem ou existirem e – até! – ir mais longe,criando condições para “promover melhores comportamentos na socieda<strong>de</strong>”em qualquer instância <strong>de</strong> atuação dos mais diferentes agentes sociais, inclusiveos da classe dominante em relação à maioria da população em condições maisprecárias <strong>de</strong> vida.


182 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Nós, psicólogos, precisamos mostrar melhor o que a Psicologia tem,on<strong>de</strong> e em que ela po<strong>de</strong> ajudar à população em geral. Po<strong>de</strong>mos, sem dúvida,ajudar muito a “curar” on<strong>de</strong> os comportamentos são ina<strong>de</strong>quados, insufi cientesou produtores <strong>de</strong> sofrimento ou <strong>de</strong>sconforto. Mas é possível também ospsicólogos contribuírem para evitar os problemas acontecerem ou existirem ouaté para, apesar e além dos problemas, contribuírem com a i<strong>de</strong>ntifi cação, análisee construção <strong>de</strong> condições que aumentem a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> maior qualida<strong>de</strong>naquilo que as pessoas fazem em suas interações com os aspectos do mundocom o qual se <strong>de</strong>frontam a cada momento <strong>de</strong> suas vidas.Nossa contribuição social, como profi ssionais da Psicologia, precisará serfeita em relação àquilo que mais necessita <strong>de</strong> contribuição e não apenas naquiloque há mais oferta <strong>de</strong> dinheiro envolvida. Talvez seja <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa competência ouresponsabilida<strong>de</strong> esclarecer, ensinar e divulgar o que Psicologia ou os psicólogospo<strong>de</strong>m fazer antes <strong>de</strong> surgirem os problemas e para evitá-los <strong>de</strong> maneiraapropriada não apenas para si próprio, mas, também, em relação aos <strong>de</strong>mais queparticipam do mesmo ambiente atingido pelas <strong>de</strong>corrências do comportamento<strong>de</strong> cada um. Também parece ser <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa responsabilida<strong>de</strong> mostrar que, além<strong>de</strong> “curar” e “prevenir”, somos capazes <strong>de</strong> propor medidas que melhorem ascondições <strong>de</strong> vida das pessoas e suas interações com os aspectos do mundocom os quais se <strong>de</strong>frontam, indo mais longe do que apenas “ajudar quando osproblemas já surgiram ou ocorreram”.Nosso povo, a população que constitui este País, conhece <strong>de</strong> algumaforma ou em algum grau em que a Psicologia po<strong>de</strong> ajudar além daquilo que écostume ou difundido? A quem cabe, compete ou é responsabilida<strong>de</strong> informar<strong>sobre</strong> ou difundir as contribuições que a Psicologia tem para o <strong>de</strong>senvolvimento daspessoas, da socieda<strong>de</strong>, das organizações, dos processos <strong>de</strong> trabalho profi ssional,das interações pessoais etc.? Vamos continuar predominantemente a “abrirconsultórios” e a ganhar o dinheiro que precisamos graças ao <strong>de</strong>sconhecimentoque a população tem a respeito do que interfere com o comportamento huma<strong>no</strong>,com as interações entre as classes <strong>de</strong> ações e os aspectos que constituem o mundocom o qual cada um se <strong>de</strong>fronta e lida? Ou vamos também interferir ou propor


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 183medidas que minimizem a necessida<strong>de</strong> do psicólogo para “tirar ou diminuirsofrimento”? Em outras palavras: a quem é acessível a literatura, divulgação edifusão da Psicologia? Que tipo <strong>de</strong> informações divulgamos ou difundimos <strong>sobre</strong>a Psicologia e suas contribuições para a vida das pessoas?Talvez quem tenha acesso à informação daquilo que a Psicologia possaoferecer sejam muito poucos. Provavelmente, apenas alguns eco<strong>no</strong>micamenteprivilegiados po<strong>de</strong>m ter os “luxos” das psicoterapias e afi ns, conheçam alguns dosbenefícios que essa área <strong>de</strong> conhecimento e esse campo <strong>de</strong> atuação profi ssionalpo<strong>de</strong>m propiciar às pessoas. Por outro lado, também é preciso consi<strong>de</strong>rar queos que precisam <strong>de</strong> ajuda para que “outros não atrapalhem seus lucros”, ouprejudiquem seu bem estar, sossego ou status sejam os que solicitam e pagam osserviços dos psicólogos. Holland (1977), em relação a isso, examina a diferençaentre cliente e paciente. Nem sempre a procura dos serviços dos psicólogos é<strong>de</strong>terminada pelo sofrimento dos seus “pacientes”, mas pelos interesses dos“clientes” que solicitam e pagam os serviços do psicólogo para que realize umaintervenção <strong>sobre</strong> o comportamento <strong>de</strong> outras pessoas (“paciente”).Parece que o atual “mercado <strong>de</strong> trabalho” po<strong>de</strong> ser melhor examinadoe avaliado. Procurar um serviço ou vários é uma classe <strong>de</strong> comportamentoshuma<strong>no</strong>s e, sendo assim, o psicólogo tem o que oferecer como contribuiçãopara conhecer, caracterizar, revelar e interferir <strong>no</strong>s <strong>de</strong>terminantes do tipo efrequência da classe <strong>de</strong> comportamentos <strong>de</strong><strong>no</strong>minada “procurar serviços <strong>de</strong>Psicologia” apresentada pela população do país. A procura dos serviços dospsicólogos po<strong>de</strong> ser alterada. E não parece valer a pena <strong>de</strong>ixar que as empresas– talvez estrangeiras – façam essa alteração. Po<strong>de</strong>mos <strong>no</strong>s preocupar com issocomo um problema social <strong>de</strong> interesse da Psicologia? No primeiro caso corremoso risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar que o lucro <strong>de</strong> empresários <strong>de</strong>termine o que faremos e quetipo <strong>de</strong> psicólogo as escolas <strong>de</strong>verão formar. No segundo caso, a pergunta po<strong>de</strong>ser respondida com <strong>no</strong>sso trabalho e experimentar caminhos, alternativas <strong>de</strong>procedimentos, em direção aos problemas, sofrimentos e necessida<strong>de</strong>s efetivasmais signifi cativas <strong>no</strong> país, o que inclui quem e quantos terão acesso a que tipos<strong>de</strong> trabalho dos psicólogos.


184 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Além da procura, que é uma classe <strong>de</strong> comportamentos da população,há os problemas relacionados com a oferta dos serviços <strong>de</strong> Psicologia – e estaé uma classe <strong>de</strong> comportamentos dos psicólogos. Somos nós, profi ssionaise administradores da Psicologia, que apresentamos os comportamentosrelacionados à classe geral <strong>de</strong><strong>no</strong>minada “oferecer serviços <strong>de</strong> Psicologia”. O quefaz com que apresentemos comportamentos estereotipados, ou pelo me<strong>no</strong>smuito convencionais, conforme foi analisado <strong>no</strong> estudo <strong>de</strong> Sylvia Leser <strong>de</strong> Mello(ver Figura 1).Novamente, os <strong>de</strong>terminantes <strong>de</strong>ssas classes <strong>de</strong> comportamentos (eda situação <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong>les) existem e basta examinarmos <strong>no</strong>ssos próprioscomportamentos profi ssionais, como cientistas do comportamento, para<strong>de</strong>scobrirmos um pouco mais o que <strong>no</strong>s leva a fazer o que fazemos comopsicólogos, em qualquer um dos papéis que <strong>de</strong>sempenhemos <strong>no</strong> complexo queestá reunido <strong>no</strong> país sob o <strong>no</strong>me <strong>de</strong> “Psicologia”, seja como área <strong>de</strong> conhecimento,seja como campo <strong>de</strong> atuação, seja como ensi<strong>no</strong> profi ssional. Isso po<strong>de</strong> serexaminado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa formação pessoal e profi ssional até as oportunida<strong>de</strong>sque <strong>no</strong>s oferecem ou que construímos. Em qualquer caso existem variáveis quedirigirão e <strong>de</strong>terminarão o que ofereceremos como contribuição profi ssional aopaís. Po<strong>de</strong>mos mantê-las ou alterá-las se também <strong>no</strong>s ocuparmos <strong>de</strong> conhecero próprio comportamento profi ssional dos psicólogos, as variáveis que os<strong>de</strong>terminam e interferir <strong>sobre</strong> sua ocorrência <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já e durante o longo e talvezpermanente tempo <strong>de</strong> duração do trabalho <strong>de</strong> construção do conhecimento e docampo <strong>de</strong> atuação profi ssional <strong>no</strong> âmbito dos processos psicológicos.A formação, as experiências realizadas, as disciplinas que estudamos, aspesquisas que realizamos, o que elaboramos, os investimentos feitos em dinheiro,esforço e trabalho pessoal e coletivo infl uirão naquilo que os psicólogos, <strong>no</strong>futuro, oferecerão como serviço ao país. Felizmente <strong>no</strong>tamos alguns esforços,embora ainda sejam insufi cientes, para tornar o trabalho dos psicólogos umserviço mais signifi cativo e abrangente do que está sendo hoje. Ao comentarisso, já é possível iniciar o segundo aspecto que prometemos examinar comvocês: além do mercado, a formação do psicólogo como <strong>de</strong>terminando quem éatendido por esse profi ssional.


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 185A formação do psicólogo em relação ao mercado <strong>de</strong> trabalhoA formação oferecida aos psicólogos é basicamente constituída a partirda experiência <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seus professores e pelas condições locais ouambiente <strong>de</strong> vida dos mesmos. É difícil que o atual ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong> Psicologia saiaalém do “experiencialismo” e das contingências locais a que estão submetidas osdiferentes cursos <strong>de</strong> Psicologia. Não há uma formação ou preparação específi ca– mesmo <strong>no</strong>s programas <strong>de</strong> pós-graduação em geral – para a docência comoprofi ssão.Os ambientes e condições existentes na vida <strong>de</strong>sses professores e<strong>de</strong>sses cursos, <strong>no</strong> entanto, parecem representar uma parcela muito pequenado que são as condições <strong>de</strong> vida neste país e as exigências para os psicólogospo<strong>de</strong>rem fazer um signifi cativo trabalho em relação a elas. Quem chega até aUniversida<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira representa apenas uma percentagem me<strong>no</strong>r do que 5%da população. Nossas experiências, nesse sentido, po<strong>de</strong>m dirigir <strong>no</strong>ssa atenção,interesse e cultura para um tipo <strong>de</strong> vida, preocupação profi ssional e serviçosque, talvez, nem <strong>de</strong> longe sejam orientados às necessida<strong>de</strong>s dos outros 95% dapopulação que sequer se aproximam da Universida<strong>de</strong>, em gran<strong>de</strong> parte nemcomo longínquos benefi ciários.Ainda é ouvido <strong>no</strong>s cursos <strong>de</strong> Psicologia que a razão principal para aescolha da Psicologia é o interesse individual. Nisso há um claro problema: esseinteresse é formado pelas experiências <strong>de</strong> uma classe social que tem interessesbem distintos e geralmente congruentes com os “do<strong>no</strong>s da socieda<strong>de</strong>” ou “do<strong>no</strong>sdo po<strong>de</strong>r” <strong>no</strong> país. Um profi ssional apropriado para este país, parece-<strong>no</strong>s, teriaque ser uma pessoa capaz <strong>de</strong> prestar um serviço voltado às necessida<strong>de</strong>s damaioria da população e não ao que interessa mais diretamente a um peque<strong>no</strong>segmento <strong>de</strong>la como ainda parecemos estar ten<strong>de</strong>ndo a realizar. É nesse sentidoque <strong>no</strong>ssa formação obtida com “experiências <strong>de</strong> vida” acadêmica e até pessoaltalvez <strong>no</strong>s afastem daquilo que constitui a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida da maior parcelada população do país. Nossas leituras, hábitos, lazer, referenciais, valores,repertórios sociais, técnicos, políticos, éticos etc. longinquamente dirão respeitoou se aproximarão do que vive, sofre ou necessita a maior parte dos brasileiros.


186 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A formação escolar parece somar-se a tudo isso ou potencializar essedistanciamento. Não só aten<strong>de</strong> a uma pequena parcela da população, mastambém o faz <strong>de</strong> uma forma que estreita ainda mais as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuaçãodos psicólogos nesse contexto. Ni<strong>de</strong>lcoff (1974) mostra com seus dados erespectiva análise que o professor com seus procedimentos correspon<strong>de</strong> muitomais a “um policial que vigia a fronteira das classes sociais”, impedindo osme<strong>no</strong>s privilegiados <strong>de</strong> conhecerem, questionarem e participarem daquilo queé a realida<strong>de</strong> social em que vivem e estudam. A educação universitária, assimexaminada, parece manter a perigosa ilusão <strong>de</strong> que o povo (e até o alu<strong>no</strong>) é“coitado” e que nós, os psicólogos, vamos atendê-lo com <strong>no</strong>ssa “capacitaçãoprofi ssional”.O tipo <strong>de</strong> formação acadêmica que existe <strong>no</strong>s cursos <strong>de</strong> Psicologia exigeque os alu<strong>no</strong>s tenham tempo integral à disposição do curso. Quem po<strong>de</strong> terisso e pagar ou manter-se na escola até os 25 a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, sustentado porseus familiares? Provavelmente, muito poucas das famílias brasileiras po<strong>de</strong>mfazer isso. As escolas <strong>de</strong> Psicologia ainda mantêm as clássicas divisões entreclínica, escola e indústria (ou trabalho). Serão essas as melhores categorias paraorganizar a formação dos psicólogos em relação às necessida<strong>de</strong>s da populaçãobrasileira? Essas – e outras – características dos cursos <strong>de</strong> Psicologia selecionammuito os interesses, percepções e capacitações dos profi ssionais <strong>de</strong> Psicologiaegressos <strong>de</strong>sses cursos e que constituirão a Psicologia que será realizadapredominantemente nas próximas décadas.É difícil, com a formação acadêmica existente, que os atuais estudantes<strong>de</strong> psicologia percebam, analisem, conheçam, avaliem e proponham providênciasrelacionadas aos fatos e difi culda<strong>de</strong>s reais da população que constitui o país.É mais fácil as informações acadêmicas dirigirem e <strong>de</strong>terminarem o quepensamos e fazemos como profi ssionais como se as circunstâncias <strong>de</strong> seu usonão importassem para constituir o trabalho <strong>de</strong> formação dos futuros psicólogos.Isso tudo po<strong>de</strong> construir uma percepção “acadêmica” (ou “livresca”, acentuandoainda mais o que parece acontecer <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> superior) da realida<strong>de</strong> social e nãoum compromisso signifi cativo com a superação das atuais condições <strong>de</strong> vida damaior parte das pessoas que vivem e constituem o país real em que vivemos.


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 187Muitas vezes, o tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> que é <strong>de</strong>senvolvido com os alu<strong>no</strong>snas universida<strong>de</strong>s leva a crer que o conhecimento é um dom ou uma qualida<strong>de</strong><strong>de</strong> quem o tem. Por que não dizemos, da mesma forma, que um serrote eum martelo são dons ou qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> um carpinteiro? Os conhecimentos econceitos produzidos nas pesquisas, experimentos e laboratórios científi cossão instrumentos <strong>de</strong> trabalho e <strong>de</strong>veriam servir à população que produz ascondições (inclusive os impostos) que sustentam o cientista e o professor <strong>de</strong>ensi<strong>no</strong> superior e não apenas servir aos intermediários que pagam esse cientista,o psicólogo e o professor <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior, particularmente nas universida<strong>de</strong>spúblicas do país.O que vemos, porém, parece ser algo diferente do que seria necessárioou importante para um efetivo <strong>de</strong>senvolvimento do país e <strong>de</strong> sua população.O conhecimento que produzimos – muito comumente, o conhecimento queoutros produziram e, quando muito, adaptamos ou fazemos repetições e algumasextensões – é para uso dos profi ssionais autô<strong>no</strong>mos (e relembramos o estudo <strong>de</strong>Sylvia Leser <strong>de</strong> Mello, i<strong>de</strong>ntifi cando a preferência dos psicólogos por esse tipo <strong>de</strong>trabalho) e dos patrões na socieda<strong>de</strong>. Raramente esse conhecimento é acessível,mesmo que indiretamente, à população em geral. Vale consi<strong>de</strong>rar as exceçõespara algumas revistas que acentuam os “mistérios psicológicos” e os mitos <strong>de</strong> umaPsicologia mais próxima à mistifi cação e ao “fantasmagórico” do que aos reais eefetivos processos comportamentais que ocorrem e aos seus <strong>de</strong>terminantes maispróximos, físicos ou sociais, do que pensamos ou percebemos.Um conceito “aprendido” parecer servir para dominar e “cobrar”pelo seu uso. E, em geral, em ativida<strong>de</strong>s profi ssionais que se caracterizamfundamentalmente por contar e esperar (o que é pior!) que haja cada vez maisproblemas, difi culda<strong>de</strong>s, sofrimentos para, então, mobilizar tais profi ssionais emtor<strong>no</strong> <strong>de</strong> um “mercado mais garantido” para obter lucro ou ganhos em escalasvariadas. Recentemente, o exame do currículo <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> escola <strong>de</strong> nívelsuperior do Estado <strong>de</strong> São Paulo mostrou entre os objetivos <strong>de</strong>ssa escola “fazerpla<strong>no</strong>s <strong>de</strong> tratamento <strong>de</strong> acordo com as posses do cliente”. Quem tiver poucasposses irá ser pouco ou mal tratado. Não parece ser algo <strong>de</strong>sse tipo um bomobjetivo para o ensi<strong>no</strong> superior. Além disso, não foi encontrada, nesse currículo,


188 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>em parte alguma, a preparação dos profi ssionais para oferecer, divulgar oufacilitar o acesso, para a população que <strong>de</strong>veriam aten<strong>de</strong>r, aos conhecimentose benefícios que a disciplina (ou área) científi ca e a tec<strong>no</strong>logia relacionadas àescola e ao curso dispõem.É oportu<strong>no</strong> reiterar a pergunta: é o conhecimento científi co umrecurso <strong>de</strong> dominação a instrumentar profi ssionais autô<strong>no</strong>mos para a “cura” <strong>de</strong>indivíduos com problemas, difi culda<strong>de</strong>s ou sofrimento? Ou <strong>de</strong>veríamos alterarisso e ensinar, nas escolas <strong>de</strong> Psicologia, a prevenir os problemas e a promovermelhores condições para a ocorrência <strong>de</strong> comportamentos huma<strong>no</strong>s maissignifi cativos, mais relevantes para as interações das pessoas na constituição<strong>de</strong> um país em que valha a pena viver em uma extensão muito maior do queo atendimento individual? Qual o caminho que escolhemos ou escolheremoscomo estudantes, como psicólogos, como professores <strong>de</strong> Psicologia, comopesquisadores <strong>de</strong>ssa área ou como administradores <strong>de</strong> tudo isso?Parece ser pouco que, além da parcial experiência <strong>de</strong> vida pessoal eprofi ssional <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssos psicólogos, professores e estudantes <strong>de</strong> Psicologia, aindaseja selecionada essa experiência, afastando-os da investigação, i<strong>de</strong>ntifi cação,análise e proposição <strong>de</strong> soluções relativas aos problemas existentes com arespectiva avaliação <strong>de</strong>ssas “soluções” e correções ou aperfeiçoamentos <strong>de</strong>vidos<strong>no</strong> caso <strong>de</strong> ainda não “solucionarem” efetivamente os problemas. A ênfase emmanter os estudantes lendo (e não estudando) os autores e autorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> outrospaíses e <strong>de</strong> outros tempos, como se o conhecimento estivesse apenas <strong>no</strong>s livros enão fosse produzido pela experiência humana, principalmente quando orientadapelo método científi co ou pelo fi losófi co. A manutenção do conhecimento daPsicologia como “escolas”, “teorias” ou “abordagens”, por exemplo, encobrea <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> que são contribuições datadas historicamente e condicionadascontextualmente, exigindo que o estudo da história da Psicologia capacite aavaliar seu <strong>de</strong>senvolvimento como conhecimento e como profissão até osdias <strong>de</strong> hoje.A esta altura já iniciamos o exame <strong>de</strong> um terceiro aspecto em relaçãoao que prometemos <strong>no</strong> começo <strong>de</strong>ste texto. Além do mercado <strong>de</strong> trabalho e daformação do psicólogo, examinar a produção e a utilização do conhecimento<strong>sobre</strong> Psicologia.


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 189A produção e a utilização do conhecimento <strong>sobre</strong> PsicologiaParece necessário dar mais importância e estudar melhor a proposiçãodo currículo da formação dos psicólogos <strong>no</strong> País. Não é raro encontrar osestudantes, ao terminarem o curso <strong>de</strong> Psicologia, abandonando o verbalismoi<strong>de</strong>alista das salas <strong>de</strong> aula para obter apenas um emprego. E, nessas condições,contentar-se em <strong>de</strong>senvolver apenas rotinas <strong>de</strong> trabalho corriqueiras em<strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> em esforço (às vezes nada peque<strong>no</strong>) para <strong>de</strong>senvolver trabalhosefetivamente signifi cativos para a socieda<strong>de</strong>. Os cursos superiores, com isso, são,ainda mais, apenas meios <strong>de</strong> as classes mais altas na socieda<strong>de</strong> manterem ouganharem privilégios (emprego, garantias, salários). E o conhecimento existentedisponível e acessível aos professores nas escolas faz com que isso se perpetue.A escola superior, <strong>de</strong> certa forma, tem sido uma garantia <strong>de</strong> obter empregos comsalários “melhores”. Reduzir o papel do conhecimento científi co a isso po<strong>de</strong> serum perigoso problema para o <strong>de</strong>senvolvimento da socieda<strong>de</strong>. O benefício a quea população terá acesso, graças à existência <strong>de</strong>sse conhecimento, fi ca reduzidoe até anulado, tornando a Ciência em Psicologia, um empreendimento quesomente a um prazo muito longo po<strong>de</strong>rá fazer com que seus benefícios sejamefetivamente amplos e acessíveis.A comparação entre um trabalho <strong>de</strong> estudantes universitários compessoas <strong>de</strong> “classes sociais baixas”, feito <strong>no</strong> início <strong>de</strong>sta década, e um trabalhorealizado, também por estudantes, antes <strong>de</strong> 1964, com pessoas pobres <strong>de</strong> algumasfavelas do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, po<strong>de</strong> ilustrar diferentes possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acesso aoconhecimento e indicar direções para a produção e o uso do conhecimento <strong>sobre</strong>processos psicológicos. Era mais comum, antes <strong>de</strong> 1964, encontrar estudantestrabalhando com os mais pobres e participando <strong>de</strong> sua vida e organização socialpara superar as condições adversas em que viviam.Na meta<strong>de</strong> da década <strong>de</strong> 1970, parece que a preocupação é maisvoltada para conhecer e “saber” falar <strong>sobre</strong> a miséria dos outros. Os problemas<strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa socieda<strong>de</strong> não são ponto <strong>de</strong> partida do estudo, da investigação e dotrabalho dos estudantes universitários. Tais problemas são, em sua maior parte,ilustração das “teorias” ou informações que são lidas nas ativida<strong>de</strong>s escolarese que professores, e mesmo os próprios estudantes quando comunicam seus


190 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>trabalhos, ten<strong>de</strong>m a apresentar aos alu<strong>no</strong>s como opções <strong>de</strong> “verda<strong>de</strong>” <strong>sobre</strong> oque sejam os fenôme<strong>no</strong>s ou processos psicológicos e o que sejam as maneiras ouprocedimentos para trabalhar com tais processos ou fenôme<strong>no</strong>s, principalmentecomo patologias existentes nas pessoas. O estudo não é um compromissosocial e um exercício para transformação <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> concreta, existente.Parece ser mais um intenso exercício <strong>de</strong> assimilar, dominar e usar a literatura(as informações, a linguagem, as técnicas ou “truques”) em voga. Dá impressão<strong>de</strong> que <strong>no</strong>ssos trabalhos <strong>de</strong> pesquisa são apenas apropriação da experiência– muitas vezes, difícil, trabalhosa e sofrida – <strong>de</strong> outros para apresentar aosestudantes, falar aos colegas, “curtir uma contestação”, apresentar em congressosou publicar como se essas fossem as fi nalida<strong>de</strong>s do trabalho científi co ou atémesmo como exibicionismo pessoal. No entanto, é a vida e a experiência <strong>de</strong>trabalhar com ela ou com o conhecimento <strong>sobre</strong> ela que têm importância e nãoa comunicação, a “conversa” ou a publicação como uma “espécie” <strong>de</strong> status queé possível obter por meio disso. O conhecimento produzido e a aprendizagemconsolidada dos alu<strong>no</strong>s <strong>de</strong>veriam ser efetivas contribuições para a superaçãodos problemas sociais e não apenas um exercício <strong>de</strong> conhecimento acadêmico.Não parece ser correto, justo, legítimo, ou mesmo legal, <strong>no</strong>s informarmos <strong>sobre</strong>como vivem as pessoas sem lhes <strong>de</strong>volver o conhecimento produzido por meioda produção <strong>de</strong>ssas informações e que po<strong>de</strong>ria melhorar essa vida que foi objeto<strong>de</strong> investigação, estudo ou exame. A pergunta que permanece e se impõe, ainda,parece ser: que conhecimentos produzimos para servir a quem?A administração da PsicologiaO último aspecto que foi apresentado como objeto <strong>de</strong> exame dizrespeito à administração da Psicologia. Não somos apenas psicólogos. Tambémadministramos os recursos, condições e oportunida<strong>de</strong>s que po<strong>de</strong>m produzir<strong>no</strong>vos caminhos para as pessoas que estão envolvidas, direta ou indiretamente,com o trabalho da Psicologia. As oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho, as verbas <strong>de</strong>pesquisa, os tipos <strong>de</strong> curso ou <strong>de</strong> estágios que oferecemos, as publicações que<strong>de</strong>cidimos apresentar à socieda<strong>de</strong> e as situações profi ssionais que construímos ouviabilizamos para nós ou para outros darão uma direção, orientação ou ritmo ao


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 191<strong>de</strong>senvolvimento da Psicologia. E, talvez, seja necessário examinar com honestaprofundida<strong>de</strong> quanto colocamos <strong>de</strong> cumplicida<strong>de</strong>, inclusive co<strong>no</strong>sco mesmos,<strong>no</strong>s juízos e <strong>de</strong>cisões que tomamos ao realizar cada uma <strong>de</strong>ssas ações profi ssionaisque dizem respeito à administração da Psicologia como conhecimento e comoprofi ssão.Em um trabalho <strong>de</strong>senvolvido <strong>no</strong> Departamento <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> daComunida<strong>de</strong> da Secretaria <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> do Município <strong>de</strong> São Paulo esses problemasapareceram <strong>de</strong> forma a assustar qualquer profi ssional. O que acontecia <strong>no</strong>trabalho era a própria constatação <strong>de</strong> que éramos tudo o que acusamos e que<strong>no</strong>s preocupa ver <strong>no</strong> exercício da profi ssão. A direção do trabalho <strong>de</strong>pendia dosriscos que os psicólogos aceitam ou conseguem enfrentar, junto com a resistênciapara aguentar as exigências, difi culda<strong>de</strong>s e sofrimentos que trabalhar <strong>de</strong> formadiferente do que é usual acarreta para a vida <strong>de</strong> um profi ssional. Os problemase o <strong>de</strong>sconhecimento são muito maiores, em quantida<strong>de</strong> e complexida<strong>de</strong>, doque as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> solução existentes. No entanto, urge haver maiorenvolvimento dos psicólogos com problemas <strong>de</strong>ssa or<strong>de</strong>m ou porte, indo além doenvolvimento com o que é dito <strong>sobre</strong> eles. Parece ser necessário olhar e envolver<strong>no</strong>smais direta, imediata e profundamente com situações e exigências <strong>no</strong>vas e,examinando-as, produzir conhecimento e recursos <strong>no</strong>vos para a Psicologia po<strong>de</strong>rprogressivamente aumentar suas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ajuda à socieda<strong>de</strong>.O trabalho realizado na Secretaria <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> do Município <strong>de</strong> SãoPaulo resumiu-se, para a participação dos psicólogos, em integrar uma equipemultidisciplinar e ajudar na melhoria das ofertas <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> para apopulação do município <strong>de</strong> São Paulo (SP). Foi necessário apren<strong>de</strong>r a analisarcomportamentos – <strong>de</strong> agentes em todas as instâncias do sistema – e suasrelações – inexistentes, fracas ou fortes – com os problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> dosmunícipes em uma frequência, intensida<strong>de</strong>, extensão e complexida<strong>de</strong> que nemsequer era possível imaginar ao iniciar o trabalho. Sem dúvida, o processo <strong>de</strong><strong>de</strong>senvolvimento e atuação profi ssional é difícil <strong>de</strong> realizar e nem sequer é fácili<strong>de</strong>ntifi car se o processo realizado é o melhor.


192 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>As necessida<strong>de</strong>s da comunida<strong>de</strong>, também sem dúvida, exigem não apenasuma “aplicação” do conhecimento disponível, mas, fundamentalmente, umapercepção dos processos comportamentais, um raciocínio e um compromissocom pessoas e problemas por nós ainda <strong>de</strong>sconhecidos em múltiplos aspectos.E, na maioria das vezes, com tarefas difíceis <strong>de</strong> elaborar, <strong>de</strong> realizar e <strong>de</strong> suportaro esforço para sua realização integral.Depois da concretização <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte do trabalho que precisavaser feito, já é possível oferecer alguma ajuda na organização dos serviços <strong>de</strong>saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Essa ajuda parece caracterizar-se tanto pela análise doscomportamentos dos profi ssionais e dirigentes da instituição responsável pelaprestação dos serviços, como pela criação <strong>de</strong> condições para que sua atuação,<strong>de</strong> fato, atenda às necessida<strong>de</strong>s das pessoas que precisam dos serviços que aagência <strong>de</strong>ve prestar. A criação <strong>de</strong> recursos (inclusive estruturas organizacionais),instrumentos e rotinas <strong>de</strong> serviço <strong>no</strong>s postos <strong>de</strong> assistência médica e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>ainda continuam a exigir muito e nem sequer sabemos <strong>no</strong> que exatamente aindaseremos capazes <strong>de</strong> ajudar.O que falta? Talvez tenhamos que rever o que apren<strong>de</strong>mos comoprofi ssionais e como estudantes <strong>de</strong> Psicologia. Nossos currículos não <strong>no</strong>spreparam para viver e atuar <strong>no</strong> complexo “cenário” ou sistema das difi culda<strong>de</strong>sque constituem a vida da população do país. Talvez só estejamos preparadospara as ativida<strong>de</strong>s mais próximas às salas <strong>de</strong> aula, situações <strong>de</strong> testes, salas<strong>de</strong> clínicas ou dos laboratórios e ambientes <strong>de</strong> treinamento. O que acontece<strong>no</strong>s ambientes constituintes das rotinas da socieda<strong>de</strong> é muito diferente e maiscomplexo do que aquele ambiente <strong>no</strong>s quais são produzidos o conhecimento, asaprendizagens tradicionais ou os exercícios e <strong>de</strong>bates acadêmicos. Não basta, naescola, apren<strong>de</strong>r a fazer coisas... É preciso apren<strong>de</strong>r a fazer o que é necessário,o que é útil, o que vale a pena, o que é importante, o que vai, <strong>de</strong> fato, contribuirpara a melhoria, permanente e não apenas circunstancialmente, das condições<strong>de</strong> vida dos que mais precisam melhorá-las.Talvez nós, psicólogos, estejamos aten<strong>de</strong>ndo a quem me<strong>no</strong>s necessita.O problema está em nem sequer conseguirmos ver direito, <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> em quevivemos, quais as necessida<strong>de</strong>s a aten<strong>de</strong>r. Apren<strong>de</strong>mos a fazer muita coisa em


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 193<strong>no</strong>ssos cursos <strong>de</strong> Psicologia, sem dúvida. Mas, para que exatamente? E essa éuma pergunta que exige respostas precisas e que sejam inequivocamenterelacionadas às necessida<strong>de</strong>s das pessoas que constituem o país e não vaida<strong>de</strong>sracionalizadoras a justifi car <strong>no</strong>ssa existência como profi ssão em qualquerinstância <strong>de</strong> sua constituição.À acusação, insinuação ou questionamento <strong>sobre</strong> a Psicologia ser um“luxo” na socieda<strong>de</strong>, talvez seja útil respon<strong>de</strong>r com as mesmas questões queHolland (1973; 1976; 1978) faz em seus artigos: a quem <strong>de</strong>vemos “tratar e mudar”:o homem que sofre ou as condições que o fazem sofrer ou produziram seusofrimento? A segunda alternativa <strong>de</strong> resposta exige experiência e conhecimentoem perceber, i<strong>de</strong>ntifi car, analisar, produzir conhecimento e tec<strong>no</strong>logia, <strong>de</strong>nunciar,administrar e intervir <strong>no</strong>s fatores que <strong>de</strong>terminam os problemas huma<strong>no</strong>s naorganização, <strong>no</strong> ambiente social e <strong>no</strong>s agentes que criam ou produzem essesfatores mais do que apenas naqueles que sofrem suas infl uências.Urge para nós, psicólogos, estabelecer um contato vivo e não apenaslivresco com esses problemas. Urge ter uma experiência real em interferir<strong>sobre</strong> tais problemas por meio do manejo <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>terminantes e não apenasinterferir com a ocorrência dos próprios problemas <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> instalados e emgrau avançado <strong>de</strong> evolução e comprometimento. Será pouco a escola informare ajudar a ver, das salas e instâncias acadêmicas, os problemas apenas comoilustrações <strong>de</strong> informações que os professores preferem ou escolhem mostraraos que vão constituir o futuro e as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento,estagnação ou involução do campo <strong>de</strong> atuação profi ssional. Parece necessárioolhar em outras ou em mais direções e arriscar <strong>no</strong>vas formas <strong>de</strong> trabalho comos problemas existentes na socieda<strong>de</strong>. Caminhos ou procedimentos <strong>no</strong>vos<strong>de</strong>vem existir. Talvez baste procurá-los em todas as instâncias <strong>de</strong> realização ou<strong>de</strong> administração do trabalho com Psicologia. Talvez seja necessário procurá-loson<strong>de</strong> ainda não é usual fazê-lo, on<strong>de</strong> não costumamos “caminhar” ou on<strong>de</strong> nãoprocuramos “caminhos” ainda.Cabe a cada um <strong>de</strong> nós, estudantes, profi ssionais, professores ouadministradores da Psicologia, contribuir com alguma transformação. Qual é, acada momento, a <strong>no</strong>ssa contribuição? Essa po<strong>de</strong> ser a pergunta inicial. As crises


194 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>e confl itos que a resposta produzir po<strong>de</strong>rão ser o “caminho” <strong>no</strong>vo a se fazer aospoucos, ao “caminhar”. Os <strong>no</strong>ssos procedimentos <strong>de</strong> trabalho também precisamser objeto <strong>de</strong> avaliação, <strong>de</strong> estudo, <strong>de</strong> investigação científi ca. Aí po<strong>de</strong> estar umapreciosa fonte <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobertas para a transformação e para o <strong>de</strong>senvolvimentoda Psicologia, seja como conhecimento, seja como um campo <strong>de</strong> atuaçãoprofi ssional.Mais <strong>de</strong> trinta a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois... mudamos a quem, nós psicólogos, servimos?Mais <strong>de</strong> trinta a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>sse artigo ser apresentado na Reunião Anualda Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> Ribeirão Preto (em 2009 já é Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira<strong>de</strong> Psicologia há vários a<strong>no</strong>s) muita coisa, obviamente mudou. Os dados <strong>sobre</strong>cursos, matrículas e psicólogos formados cresceram exponencialmente. A atuaçãotambém fi cou ampliada e há muito mais psicólogos assalariados, embora aindaseja gran<strong>de</strong> a concentração em trabalho clínico e muitos psicólogos atuandocomo profi ssionais liberais. Nos últimos, porém, há mais trabalho assalariadorealizado em muitas organizações públicas (postos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, hospitais) a serviçodo Estado.A multiplicação <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> graduação em Psicologia não parece terincorporado as melhores experiências e aperfeiçoado o ensi<strong>no</strong> superior. Pelocontrário a “abertura <strong>de</strong>senfreada” <strong>de</strong> cursos superiores pelo país aumentoua cópia <strong>de</strong> quaisquer currículos ou experiências existentes e a contratação<strong>de</strong> pessoas formadas com pouca ou nenhuma preparação para ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong>profi ssionais <strong>de</strong> nível superior. Aumentou extraordinariamente o ensi<strong>no</strong> do quecada um apren<strong>de</strong>u ou sabe e não necessariamente o que é necessário para acapacitação do psicólogo do futuro. As palavras <strong>de</strong> Luiz Antonio Cunha (1989)<strong>sobre</strong> evi<strong>de</strong>ntes sinais <strong>de</strong> <strong>de</strong>terioração institucional a respeito da Universida<strong>de</strong><strong>Brasil</strong>eira parecem ter sido seguidas à risca nas últimas décadas, do fi nal doséculo XX e do começo do século XXI.Os custos dos serviços <strong>de</strong> Psicologia, assim como muitos do campoda Saú<strong>de</strong>, continuam inacessíveis para gran<strong>de</strong> parcela da população, emboratenhamos muitos pla<strong>no</strong>s <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong>. Neles, porém, ainda há umagran<strong>de</strong> exclusão do atendimento psicológico. O conceito <strong>de</strong> mercado (com o


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 195núcleo <strong>de</strong>fi nidor em tor<strong>no</strong> das <strong>de</strong>mandas feitas aos psicólogos e das ofertas <strong>de</strong>emprego que as empresas apresentam) domi<strong>no</strong>u cada vez mais, tornando muitosdos psicólogos meros “<strong>de</strong>spachantes <strong>de</strong> rotinas <strong>de</strong> serviços”. Estudos <strong>sobre</strong> oexercício da profi ssão <strong>de</strong> psicólogos realizados por Ana Almeida Carvalho (1982e 1984) e com Kava<strong>no</strong> (1982) encontram, claramente, uma consequencia doensi<strong>no</strong> superior lesiva para o exercício da profi ssão: profi ssionais formadoshá cerca <strong>de</strong> cinco a<strong>no</strong>s i<strong>de</strong>ntifi cam instrumentos <strong>de</strong> trabalho que apren<strong>de</strong>rama usar <strong>no</strong>s seus cursos, i<strong>de</strong>ntifi cam e até caracterizam diferentes “teorias ouescolas psicológicas”, i<strong>de</strong>ntifi cam várias categorias <strong>de</strong> “problemas psicológicos”,mas não são capazes <strong>de</strong> <strong>de</strong>fi nir minimamente o que constitui um “fenôme<strong>no</strong>psicológico”. Com isso, facilmente, “per<strong>de</strong>m a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> profi ssional”, uma vezque só a conseguem <strong>de</strong>fi nir pela “periferia” <strong>de</strong> seus componentes, enfatizadospela formação acadêmica. No MEC, na década <strong>de</strong> 1990 e na primeira décadado século XXI, proliferaram currículos que eram cópias <strong>de</strong> outras instituiçõesapresentados como projetos <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos cursos <strong>de</strong> Psicologia. Em um caso, forami<strong>de</strong>ntifi cados até quatro cópias xerox do mesmo currículo, quando já estavaem exame e <strong>de</strong>bate as diretrizes curriculares para o ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong> graduação emPsicologia. Infelizmente, ainda há muito por aperfeiçoar <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong> graduaçãoem Psicologia. Mormente com o surgimento <strong>de</strong> uma proposta <strong>de</strong> i<strong>no</strong>var esseensi<strong>no</strong> por meio <strong>de</strong> competências apropriadas para o trabalho em um campoprofi ssional em gran<strong>de</strong> parte ainda inexplorado. Os projetos <strong>de</strong> curso aindanão parecem estar em consonância com as possibilida<strong>de</strong>s que as diretrizescurriculares, mesmo com várias lacunas ou imperfeições, ensejam.Soares (1997) encontra seus ex-alu<strong>no</strong>s <strong>de</strong> matemática na graduação,alguns a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> formados, ig<strong>no</strong>rando o que apren<strong>de</strong>ram em matemáticaao exercitar a profi ssão <strong>de</strong> engenheiros, utilizando apenas matemática <strong>de</strong>segundo grau e o que lhes indicavam os ven<strong>de</strong>dores <strong>de</strong> equipamentos paraas empresas nas quais trabalhavam. Stédile (1996) acompanha egressos queestudaram com ela como <strong>de</strong>fi nir e realizar o trabalho <strong>de</strong> “prevenção em saú<strong>de</strong>”e encontra, alguns a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> formados, que seus alu<strong>no</strong>s, sistematicamente,abandonaram o que apren<strong>de</strong>ram na Universida<strong>de</strong> e adotaram os conceitos, muitome<strong>no</strong>s elaborados e pouco atualizados, a respeito do que consistia o conceito


196 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>e o trabalho <strong>de</strong> “prevenção em saú<strong>de</strong>”. Piazza (1997), ao investigar “o papel dascoor<strong>de</strong>nações <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> graduação segundo a percepção <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nadoresem exercício da função”, encontra uma absoluta ausência <strong>de</strong> preparaçãoespecífi ca para o exercício <strong>de</strong>ssa função <strong>no</strong> trabalho na Universida<strong>de</strong>. Marcon(2008) e Cruz (2008) encontram resultados similares em estudos com diferentescoor<strong>de</strong>nadores <strong>de</strong> cursos, sendo este último em outro Estado diferente daqueleem que foram realizados os estudos <strong>de</strong> Piazza e Marcon. As afi rmações <strong>de</strong> LuizAntonio Cunha parecem confi rmar-se, valendo isso para os cursos <strong>de</strong> Psicologia,conforme investigam também D’Agostini (2006) ao examinar os objetivosequivocados para garantir a formação do psicólogo em um curso <strong>de</strong> graduaçãoe Ferreira (2005) ao examinar as características dos serviços-escola <strong>de</strong> Psicologiados cursos <strong>de</strong> graduação <strong>no</strong> meio-oeste catarinense.Parece ainda permanecer urgente <strong>de</strong>slocar o conceito <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong>Psicologia e a formação correspon<strong>de</strong>nte para realizá-los <strong>de</strong> maneira apropriadapara além dos dois componentes nucleares do conceito <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong> trabalho(<strong>de</strong>mandas sociais e ofertas <strong>de</strong> emprego), na direção <strong>de</strong> outro conceito <strong>no</strong>rteadorpara tudo isso: campo <strong>de</strong> atuação profi ssional, <strong>de</strong>fi nido pelas necessida<strong>de</strong>s dapopulação e pelas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho do profi ssional em relação a elas.A diferença entre esses dois conceitos foi examinada por Rebelatto e Botomé(1987), Botomé (1988), por Paviani e Botomé (1993) e por Santos (2008) econtém um potencial <strong>de</strong> orientação diferenciada para a concepção <strong>de</strong> currículos<strong>de</strong> Psicologia. Uma orientação para um trabalho em relação a um campo <strong>de</strong> atuaçãoprofi ssional exige uma formação especial, fortemente marcada pela capacitaçãoem produzir conhecimento e em empreen<strong>de</strong>r serviços i<strong>no</strong>vadores <strong>no</strong> campo <strong>de</strong>atuação. Produzir conhecimento porque tanto as necessida<strong>de</strong>s da populaçãocomo as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação são <strong>de</strong>sconhecidas em sua gran<strong>de</strong> maioria emrelação ao que a Psicologia po<strong>de</strong> contribuir. E formação em empreen<strong>de</strong>dorismopara tornar as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação em empreendimentos concretos<strong>de</strong> serviços viáveis nas comunida<strong>de</strong>s nas quais o psicólogo vier a atuar comoprofi ssional.


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 197Há, também, um acentuado <strong>de</strong>senvolvimento em alguns setores.A “Psicologia Industrial” <strong>de</strong> outrora se ampliou muito e, melhor <strong>de</strong>signadapor “Psicologia Organizacional e do Trabalho” é um campo muito amplo<strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação do psicólogo. A Análise Experimental doComportamento, <strong>de</strong> forma semelhante, <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser restrita a uma formaçãopara trabalhar com pesquisa e algumas poucas técnicas <strong>de</strong> modifi cação <strong>de</strong>comportamento para abarcar uma e<strong>no</strong>rme amplitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>atuação com o comportamento em todas as esferas da ativida<strong>de</strong> humana. Oscongressos científi cos proliferaram por uma gran<strong>de</strong> varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong>scientífi cas especializadas e, embora, tenha aumentado uma tendência a exibirtrabalhos e a diminuir os <strong>de</strong>bates efetivamente científi cos, aumentou a quantida<strong>de</strong><strong>de</strong> reuniões científi cas, <strong>de</strong> pessoas participando <strong>de</strong>las e <strong>de</strong> trabalhos exibidosou apresentados mesmo prejudicados com me<strong>no</strong>s <strong>de</strong>bates e com um perigo<strong>de</strong> diminuição da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> muitos <strong>de</strong>les. A quantida<strong>de</strong>, <strong>no</strong> entanto, parececompensar e manter uma proporção <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> coexistindo commuita repetição, trabalhos superfi ciais ou até mal elaborados.Ainda falta um sistema <strong>de</strong> Ciência, Tec<strong>no</strong>logia e Educação Superiorintegrador <strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s, hoje divididas entre o Ministério da Ciência eTec<strong>no</strong>logia e o MEC, mantendo uma <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> que às Universida<strong>de</strong>s cabeainda serem “escolas”, quando seu papel po<strong>de</strong>ria ser muito mais avançado ediferenciado em relação à educação dos graus anteriores. Talvez <strong>no</strong>s falte aindauma formação educacional que integre a formação para a cidadania e a integraçãoprotagonista na socieda<strong>de</strong> com uma formação profi ssionalizante antes <strong>de</strong> iniciarprogramas <strong>de</strong> estudo (e não cursos) em nível superior, criando uma transiçãomais suave para a Universida<strong>de</strong> com já alguma experiência e possibilida<strong>de</strong>s emcampos <strong>de</strong> trabalho com afi nida<strong>de</strong>s aos programas <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong> nível superior.A própria pesquisa, que <strong>de</strong>veria ser <strong>de</strong>senvolvida em núcleosconstituintes <strong>de</strong> Departamentos <strong>de</strong> Psicologia passou a ser concebida comoativida<strong>de</strong> vinculada a “Cursos <strong>de</strong> Pós-graduação” (e não Programas <strong>de</strong> EstudosPós-graduados), chegando ao ponto <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ensinar pesquisa e ofereceruma sólida formação científi ca na graduação ou a, algumas instituições, quererem“ter pós-graduação para po<strong>de</strong>r fazer pesquisa”. As distorções aumentaram


198 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>e aprofundaram em uma quantida<strong>de</strong> muito maior <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong>Psicologia. Os gover<strong>no</strong>s facilitaram as expansões, aumentaram as exigênciasburocráticas, mas não garantiram as condições estruturais apropriadas para umaefetiva qualida<strong>de</strong> da organização e da produção do conhecimento e da produçãodas aprendizagens signifi cativas para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um campo <strong>de</strong>atuação profi ssional importante para a socieda<strong>de</strong>, como é o da Psicologia, indomuito além das fronteiras do trabalho clínico.A redução <strong>de</strong> seis para cinco a<strong>no</strong>s na duração dos cursos <strong>de</strong> Psicologiaaligeirou a formação <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos diplomados, mas não melhorou a capacitação<strong>de</strong>sse campo <strong>de</strong> atuação. A proliferação <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> especialização (valorizadosaté pela <strong>de</strong><strong>no</strong>minação genérica e oportunista <strong>de</strong> “pós-graduação lato sensu”),aperfeiçoamento e congêneres ajuda a manter cursos <strong>de</strong> graduação que nãopreparam para uma efetiva atuação profi ssional, mas mantém um bom mercado<strong>de</strong> trabalho às custas <strong>de</strong> um prolongamento artifi cial da preparação profi ssionalque a redução <strong>de</strong> seis para cinco a<strong>no</strong>s na graduação veio ajudar, agora fora douniverso acadêmico. Isso facilitou um mercado relativamente artifi cial <strong>de</strong> trabalhopara muitos psicólogos dando cursos em suas “especialida<strong>de</strong>s” para compensara insegurança e o <strong>de</strong>spreparo que os graduandos relatam ao tentar iniciar seutrabalho <strong>no</strong> campo <strong>de</strong> atuação.Mesmo com tudo isso, as condições para superar esses problemas sãomuito melhores, embora as políticas governamentais para a Educação ainda nãoaju<strong>de</strong>m muito nas i<strong>no</strong>vações signifi cativas. Ainda estamos muito mais voltadospara expansões e ampliações do que para aprofundamento, aperfeiçoamento e<strong>de</strong>senvolvimento do trabalho científi co, tec<strong>no</strong>lógico e <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong> nível superior.O movimento aumentou muito, mas a direção, profundida<strong>de</strong> e qualida<strong>de</strong> do queé feito não melhorou na mesma proporção, nem <strong>de</strong> longe.A quem servimos hoje? Talvez ainda estejamos voltados para os mesmostipos <strong>de</strong> clientes que po<strong>de</strong>m pagar os custos <strong>de</strong> um trabalho <strong>de</strong> psicólogos.Uma dimensão <strong>de</strong> Psicologia Pública ainda não parece clara na formação e naconcepção do campo <strong>de</strong> atuação mesmo com a multiplicação <strong>de</strong> <strong>de</strong>bates, escritose reuniões voltadas para isso e, em geral, patrocinadas pelos Conselhos Fe<strong>de</strong>rale Regionais <strong>de</strong> Psicologia, principalmente. Até aumentamos a concorrência e a


A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 199disputa pelo po<strong>de</strong>r para ditar como <strong>de</strong>ve ser a formação dos psicólogos, assimcomo multiplicamos a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> publicações, ten<strong>de</strong>ndo a cada grupo tersua revista quase particular para publicar os trabalhos cada vez em mais revistasespecializadas. Parece que fazer pesquisa e publicar ou ter uma publicação maisdo que serviço transformou-se em status ou po<strong>de</strong>r político ou acesso a verbaspúblicas. Será isso o melhor para o País e para o <strong>de</strong>senvolvimento da Psicologia?Talvez falte hoje um sistema articulador <strong>de</strong> todas as agências <strong>de</strong> trabalhocom a Psicologia, sem haver hegemonia, ou dominância. Um sistema organizadorque aumentasse o acesso e viabilizasse uma participação <strong>no</strong> trabalho coletivo e nãoapenas nas suas “correntes” cada vez mais fundamentalistas. As “contribuições”<strong>de</strong> diferentes autores cada vez mais fi cam “escolas”, “teorias”, “abordagens” ou“perspectivas’ exclu<strong>de</strong>ntes, com todo o arcaísmo que isso possa ter. O alerta <strong>de</strong>Fred Keller (19371970) já indicava a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> haver uma sistematização dasmúltiplas contribuições da Psicologia para auxiliar na orientação e velocida<strong>de</strong> <strong>de</strong>seu <strong>de</strong>senvolvimento. Nas palavras do autor, “uma ciência que se está fazendonão é, na prática, um negócio abstrato e impessoal. Inclui um grupo <strong>de</strong> sereshuma<strong>no</strong>s não inteiramente cooperador, cada um dos quais tem o seu passado<strong>de</strong> conhecimentos e pesquisas, suas próprias capacida<strong>de</strong>s, seus preconceitos epreferências” (p. 135-136). Embora <strong>de</strong>sacordos e controvérsias sejam inevitáveise até instrumentais, ainda estamos longe <strong>de</strong> um <strong>de</strong>bate que seja voltado paraproduzir o conhecimento e não para disputas para alguém “ter razão” ou “po<strong>de</strong>r”em relação ao núcleo <strong>de</strong>fi nidor do fenôme<strong>no</strong> psicológico que po<strong>de</strong> reunir osesforços e orientações <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> profi ssionais, pesquisadores, professores,administradores ou estudantes <strong>de</strong> Psicologia.Isso, ainda nas palavras <strong>de</strong> Keller (1937/1970), “é especialmente verda<strong>de</strong>para uma jovem ciência como a <strong>no</strong>ssa – recém libertada da fi losofi a e não sempredistinguida, em alguns <strong>de</strong> seus labores, da fi siologia” (p. 136). “Um sistema éuma tentativa sincera e cabal <strong>de</strong> manter a casa da Psicologia em or<strong>de</strong>m: <strong>de</strong> reporesta peça <strong>de</strong> mobiliário, <strong>de</strong> reparar aquela; <strong>de</strong> indicar a aparência fora da moda<strong>de</strong> uma sala ou a nu<strong>de</strong>z <strong>de</strong> outra; acrescentar uma ala aqui ou um andar ali; e, senecessário, <strong>de</strong> por a casa abaixo e construir uma <strong>no</strong>va – sempre <strong>de</strong> acordo coma quantida<strong>de</strong>, a necessida<strong>de</strong> e as posses <strong>de</strong> seus ocupantes” (Keller, 1937/1970,


200 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>p. 141). O autor continua, “a analogia é tentadora (...). Um sistema psicológico éuma tentativa <strong>de</strong> arranjar e coor<strong>de</strong>nar, <strong>de</strong> maneira lógica e inteligível, os fatos daciência em um todo signifi cativo e satisfatório; <strong>de</strong> indicar as fraquezas e lacunasdo <strong>no</strong>sso conhecimento; e mostrar o caminho para o <strong>de</strong>senvolvimento futuro.Além disso, um sistema é uma tentativa <strong>de</strong> dizer justamente o que a psicologiaé, do que é ciência, acerca do que se trata, <strong>de</strong>fi nir o objeto e, assim, dirigir apesquisa” (p. 141-142), o ensi<strong>no</strong>, a capacitação <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos profi ssionais, a atuaçãoprofi ssional, os serviços que po<strong>de</strong>mos prestar a tantos que, <strong>de</strong>svalidos ou<strong>de</strong>sprotegidos diante do obscurantismo ou do <strong>de</strong>sconhecido do que seja tal tipo<strong>de</strong> fenôme<strong>no</strong> sofrem ou fi cam limitados em suas condições <strong>de</strong> interação com omundo <strong>de</strong> maneira satisfatória ou, para usar um termo da moda, com “qualida<strong>de</strong><strong>de</strong> vida”.Ainda permaneceremos predominantemente nas esferas <strong>de</strong> atuação <strong>de</strong>atenuar sofrimento, compensar da<strong>no</strong>s, reabilitar organismos, curar patologias ou<strong>de</strong>senvolveremos competências para efetivamente prevenir problemas? Ou, indomais longe, seremos capazes <strong>de</strong> manter processos psicológicos <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong>ou mesmo aperfeiçoá-los ou, quem sabe, com melhor conhecimento, promover<strong>no</strong>vos mais signifi cativos processos psicológicos para constituir a vida <strong>de</strong> todosna socieda<strong>de</strong>? Vamos manter as disputas por po<strong>de</strong>r (garantir espaços, manterespaços, aumentar espaços etc.) ou vamos maximizar uma práxis que <strong>no</strong>s leve aum efetivo <strong>de</strong>bate para produzir maior visibilida<strong>de</strong> <strong>sobre</strong> o conhecimento e ascondições que <strong>de</strong>terminam os processos psicológicos e não para manter umadisputa com outros, na esfera social, acadêmica, política ou outras? Em qualquerdos casos, qual a melhor alternativa para respon<strong>de</strong>rmos: a quem servimos, <strong>de</strong>fato, com <strong>no</strong>sso trabalho <strong>de</strong> psicólogos na socieda<strong>de</strong>?Mudaram muitas das condições <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 1970 até o começo dasegunda década do século XXI, mas a pergunta parece merecer um permanenteexame. “A quem nós, psicólogos, servimos <strong>de</strong> fato?” permanece como umaexigência <strong>de</strong> resposta que precisa envolver bem mais do que os preços <strong>de</strong>serviços e alguns tipos <strong>de</strong> serviços. On<strong>de</strong> estaremos <strong>no</strong>s próximos a<strong>no</strong>s emrelação àqueles que mais necessitam do conhecimento da Psicologia sob as maisvariadas formas <strong>de</strong> serviços que os psicólogos po<strong>de</strong>m tornar acessíveis?


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A Quem Nós, Psicólogos, Servimos <strong>de</strong> Fato? 203Stédile, N. L. R (1996). Prevenção em Saú<strong>de</strong>: comportamentos profi ssionais a<strong>de</strong>senvolver na formação do enfermeiro. Dissertação <strong>de</strong> mestrado nãopublicada,Programa <strong>de</strong> Pós-graduação em Educação da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral<strong>de</strong> São Carlos, São Carlos.


CAPÍTULO 10*A FUNÇÃO SOCIAL DO PSICÓLOGORegina Helena <strong>de</strong> Freitas CamposA expressão contida <strong>no</strong> título do trabalho que me foi solicitado<strong>de</strong>senvolver – a função social do psicólogo – evocou em mim dois diferentesenfoques, a partir dos quais po<strong>de</strong>mos encarar a questão ali colocada.Em um primeiro momento, fui levada a pensar em como <strong>de</strong>fi nir, <strong>de</strong> umponto <strong>de</strong> vista científi co, a função social do psicólogo. Neste caso, para melhorfocalizar o problema, tratar-se-ia <strong>de</strong> precisar qual é, ou qual tem sido – <strong>de</strong>s<strong>de</strong>que se instituiu como profi ssional – o lugar do psicólogo na divisão social dotrabalho.Em um segundo momento, a expressão encerra a preocupação dabusca <strong>de</strong> alguma espécie <strong>de</strong> ética profi ssional: será que o psicólogo, enquantoprofi ssional, teria algum compromisso com a socieda<strong>de</strong> na qual insere suaprática, assumindo, pois, com referência a esta, uma função social?Nas <strong>no</strong>tas que trago hoje à consi<strong>de</strong>ração dos colegas, proponho assinalaralgumas observações elaboradas a partir do estudo da história da Psicologia tanto<strong>no</strong>s países capitalistas avançados quanto <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> que, a meu ver, po<strong>de</strong>riamajudar a analisar o problema sob os dois enfoques consi<strong>de</strong>rados.* Referência completa do texto original: Campos, R. H. F. (1983). A função social dopsicólogo. Educação e Socieda<strong>de</strong>, 16, 74-84.


206 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>1 SOBRE O LUGAR DO PSICÓLOGO NA DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHOPara analisar a questão do lugar do psicólogo na divisão social dotrabalho, é preciso consultar a história: história da divisão do trabalho que hojeconhecemos, e história do psicólogo como profi ssional.Com relação ao psicólogo, vale lembrar que sua história não se contaapenas, como costuma parecer à primeira vista, a partir dos progressos da técnica<strong>de</strong> observação e <strong>de</strong> manipulação do comportamento huma<strong>no</strong>. Foi preciso que,a partir <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado momento, se tornasse historicamente necessário ocontrole do comportamento para que tais técnicas aparecessem e passassem aser utilizadas.A <strong>no</strong>ssa consulta à história do psicólogo, para chegar a <strong>de</strong>limitar o lugarque este profi ssional veio a ocupar na divisão do trabalho social, tem portanto osentido <strong>de</strong> reconstituir as condições <strong>de</strong> produção da representação do mundoque <strong>de</strong>u origem aos mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> concepção e atuação <strong>sobre</strong> o psíquico utilizadospelo profi ssional psicólogo. Acredito que é por este caminho, ou seja, a partirda compreensão do quadro i<strong>de</strong>ológico <strong>de</strong> concepção do homem e do mundoque vigorava <strong>no</strong> momento histórico <strong>de</strong> constituição <strong>de</strong> seu lugar, que po<strong>de</strong>moschegar a compreen<strong>de</strong>r a que tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda veio a aten<strong>de</strong>r o profi ssional <strong>de</strong>que falamos.É neste sentido, pois, que po<strong>de</strong>mos afi rmar que a história do psicólogo<strong>de</strong>ve ser contada a partir do movimento engendrado pelas <strong>de</strong>mandas queemergem da formação social on<strong>de</strong> sua prática passa a ser requerida – mediadaspelo quadro i<strong>de</strong>ológico <strong>de</strong> representação do real formulado a partir daquelaorganização histórico-social – conjugados com o esforço em atendê-lasrepresentado pelo progresso da própria técnica.Ora, em que tipo <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> aparece este profi ssional especifi camenteencarregado <strong>de</strong> conhecer e trabalhar o comportamento huma<strong>no</strong>?Vamos localizar o seu surgimento nas socieda<strong>de</strong>s capitalistas da Europado fi nal do século XIX.Observe-se, a propósito, que o tipo <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> dominação <strong>de</strong> classeinstaurada pelo capitalismo é das me<strong>no</strong>s transparentes da história, pois que seexerce mediada por toda uma i<strong>de</strong>ologia da liberda<strong>de</strong> individual e da igualda<strong>de</strong><strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s.


A Função Social do Psicólogo 207Esta i<strong>de</strong>ologia – a i<strong>de</strong>ologia liberal – construída <strong>sobre</strong> a <strong>no</strong>ção daliberda<strong>de</strong> individual e da igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s, só po<strong>de</strong> funcionar comoprodutora do consenso acerca da justeza do mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> convivência social docapitalismo liberal na medida em que as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s provocadas pela divisãoem classes e pela proprieda<strong>de</strong> privada são atribuídas à <strong>de</strong>sigual distribuição <strong>de</strong>dons e aptidões pela natureza, ou à responsabilida<strong>de</strong> individual <strong>de</strong> cada um.É através da conceituação das aptidões como dons naturais que se po<strong>de</strong>explicar por que os indivíduos ocupam diferentes lugares na escala <strong>de</strong> ocupações,e a própria divisão do trabalho em trabalho manual e trabalho intelectual,enten<strong>de</strong>ndo-se aqui o trabalho intelectual como o trabalho <strong>de</strong> planejamento econtrole.Ora, esta i<strong>de</strong>ologia, fundada na negação da responsabilida<strong>de</strong> do todosocial pela <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>, <strong>de</strong>manda o aprofundamento da <strong>no</strong>ção da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>natural entre os indivíduos, assim como o surgimento <strong>de</strong> mecanismos <strong>de</strong> controledo comportamento e das reações das populações submetidas à sua lógica.Por isso a <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> progresso, típica do advento do capitalismo, seracompanhada sempre pela <strong>no</strong>ção da or<strong>de</strong>m a ser mantida, na prática e naconsciência, pelo consenso.Para proce<strong>de</strong>r à análise do surgimento da prática profi ssional dopsicólogo <strong>de</strong>ste ponto <strong>de</strong> vista, <strong>de</strong>vemos estabelecer, portanto, a que tipo <strong>de</strong><strong>de</strong>manda veio ele a aten<strong>de</strong>r, e a relação que os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> concepção do real e<strong>de</strong> trabalho por ele instituídos guardam com o quadro da i<strong>de</strong>ologia liberal.Po<strong>de</strong>mos começar citando Gramsci, a propósito da formação dacategoria dos intelectuais:Segundo este autor,“Cada grupo social, nascendo <strong>no</strong> terre<strong>no</strong> originário <strong>de</strong> umafunção essencial <strong>no</strong> mundo da produção econômica, criapara si, ao mesmo tempo, <strong>de</strong> um modo orgânico, uma oumais camadas <strong>de</strong> intelectuais, que lhe dão homogeneida<strong>de</strong>e consciência da própria função, não apenas <strong>no</strong> campoeconômico, mas também <strong>no</strong> social e <strong>no</strong> político: o empresário


208 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>capitalista cria consigo o técnico da indústria, o cientista daeco<strong>no</strong>mia política, o organizador <strong>de</strong> uma <strong>no</strong>va cultura, <strong>de</strong> um<strong>no</strong>vo direito...”De um <strong>no</strong>vo conceito <strong>de</strong> homem diríamos, completando o pensamento<strong>de</strong> Gramsci, e para voltar a <strong>no</strong>sso tema: o psicólogo.E digo isto pensando <strong>no</strong> conhecido marco <strong>de</strong> surgimento da PsicologiaCientífi ca: a criação do laboratório <strong>de</strong> Wundt, na Alemanha.Por que foi criado este laboratório, com a preocupação <strong>de</strong> elaborar eutilizar instrumentos precisos <strong>de</strong> medição, predição e controle das possibilida<strong>de</strong>se limites da percepção humana?A divisão do trabalho capitalista, naquele momento, progredia doaperfeiçoamento da institucionalização do trabalhador coletivo, próprio doperíodo manufatureiro, à introdução da máquina <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> produção.A quem po<strong>de</strong>ria interessar, naquela época, o estudo da percepção e dashabilida<strong>de</strong>s humanas?Minha hipótese é que a própria institucionalização do trabalhadorcoletivo, <strong>no</strong> período manufatureiro, constituído <strong>de</strong> muitos trabalhadoresparcelares (cada um encarregado <strong>de</strong> uma tarefa partida <strong>no</strong> processo <strong>de</strong> produçãoda mercadoria) engendrou consigo a reelaboração do próprio conceito <strong>de</strong>percepção e <strong>de</strong> aptidão.Como lembra Husserl ao tratar do mundo da vida como fundamento dosentido esquecido da Física, a necessida<strong>de</strong> da precisão e da previsão nas medidasé própria da era mo<strong>de</strong>rna, ou seja, do capitalismo.Assim, penso que, na medida mesma em que a fábrica “fabricava” <strong>no</strong>vasaptidões, pelo parcelamento do processo <strong>de</strong> trabalho, os psicólogos registravame <strong>no</strong>meavam o resultado do parcelamento.O mesmo se po<strong>de</strong> dizer a propósito da elaboração dos conceitos do<strong>no</strong>rmal e do excepcional, <strong>no</strong>ções que atravessam permanentemente o trabalhodo psicólogo.


A Função Social do Psicólogo 209É na exata medida em que o processo <strong>de</strong> produção cria a fi gura dohomem <strong>no</strong>rmal – aquele que se a<strong>de</strong>quar ao processo <strong>de</strong> trabalho instituído pelocapital – e do excepcional – aquele cujo trabalho não po<strong>de</strong> ser convertido emvalor-<strong>de</strong>-troca – que o psicólogo registra e separa estas duas categorias: o <strong>no</strong>rmale o excepcional.Acrescente-se a isto o fato <strong>de</strong> que o processo <strong>de</strong> institucionalização daempresa capitalista <strong>de</strong>sorganiza o tipo <strong>de</strong> produção predominantemente ruralanterior a ela, gerando gran<strong>de</strong>s movimentos <strong>de</strong> massa em busca do mercado <strong>de</strong>trabalho na cida<strong>de</strong> – com as previsíveis conseqüências psíquicas <strong>de</strong>correntes do<strong>de</strong>sligamento das relações com a comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> origem – e teremos o quadro<strong>de</strong> patologias registradas e <strong>no</strong>meadas como distúrbios da personalida<strong>de</strong> e docomportamento.Po<strong>de</strong>mos avançar, pois, a hipótese <strong>de</strong> que, se Freud – conforme observaLourau, ao tratar da Psicanálise na divisão do trabalho – trabalhou <strong>sobre</strong> o terre<strong>no</strong>da insatisfação sexual e do ócio das mulheres da burguesia vienense (quadro estetambém produzido historicamente pela divisão capitalista do trabalho), tambéma Psicologia Científi ca oriunda dos laboratórios e da organização científi ca dotrabalho na fábrica trabalhou <strong>sobre</strong> o terre<strong>no</strong> da dominação do capital <strong>sobre</strong> otrabalho.A diferença resi<strong>de</strong>, <strong>no</strong> entanto, <strong>no</strong> fato <strong>de</strong> que a Psicologia Científi canão construiu o conceito <strong>de</strong> inconsciente. Pelo contrário, a ela fi cou reservado oespaço i<strong>de</strong>ológico do <strong>de</strong>sconhecimento da exploração, pois sua função resultouem ser exatamente o lugar da elaboração das práticas <strong>de</strong>stinadas a adaptar ohomem a esta <strong>no</strong>va realida<strong>de</strong> do trabalho parcelado, <strong>no</strong> interior da divisão dotrabalho em manual e intelectual.Po<strong>de</strong>mos acompanhar a institucionalização dos procedimentos <strong>de</strong>adaptação oriundos da Psicologia em diversas instituições.Aqui mesmo, em Minas Gerais, o surgimento do profi ssional psicólogoobe<strong>de</strong>ceu a lógica semelhante.Tive oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reconstituir o quadro <strong>de</strong> surgimento do psicólogoem Minas Gerais nas décadas <strong>de</strong> 20 e 30, <strong>de</strong>ste século, e verifi quei o seguinte:


210 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>O trabalho do psicólogo foi aqui <strong>de</strong>mandado, primeiramente na áreaescolar, em função da expansão da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> primário <strong>no</strong> Estado ocorridana década <strong>de</strong> 20, processo semelhante ao ocorrido <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> da época.Esta expansão se <strong>de</strong>veu à combinação <strong>de</strong> dois fatores: <strong>de</strong> um lado, acrescente pressão da população da periferia urbana pelo acesso aos bens urba<strong>no</strong>sutilizados pela burguesia e pela pequena burguesia, entre eles a escola.De outro, a burguesia nacional, presa à lógica do capitalismo dospaíses centrais pela exportação <strong>de</strong> não-manufaturados e sentindo os prenúnciosda crise daquele tipo <strong>de</strong> eco<strong>no</strong>mia, se interessava em assumir o projeto <strong>de</strong>industrialização do país.O resultado <strong>de</strong>ste processo foi o investimento do Estado na expansãoda re<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> público e gratuito, sob o mo<strong>de</strong>lo da i<strong>de</strong>ologia da igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong>oportunida<strong>de</strong>s.Ora, mas para que a escola passasse, naquele momento, a exercer a suafunção especifi camente capitalista – a <strong>de</strong> separar os indivíduos e <strong>de</strong> alocá-los emdiferentes lugares da escala ocupacional – era necessário justifi car por que nãohavia lugar para todos <strong>no</strong> topo da pirâmi<strong>de</strong>, isto é, nas profi ssões não-manuais.Para isto, a i<strong>de</strong>ologia dominante se apropria da <strong>no</strong>ção das diferençasindividuais e abre espaço, <strong>no</strong> interior do sistema escolar, para este <strong>no</strong>voprofi ssional – o psicólogo – encarregado <strong>de</strong> utilizar a tec<strong>no</strong>logia já então<strong>de</strong>senvolvida na Europa, <strong>de</strong> medida da inteligência e das aptidões.Ao lado disso, a entrada <strong>no</strong> sistema escolar <strong>de</strong>ste contingente <strong>de</strong> criançasportadoras <strong>de</strong> padrões e <strong>no</strong>rmas culturais diferentes daquelas veiculadas pelaescola tradicional – os padrões das classes dominantes – cria a necessida<strong>de</strong> dareforma dos métodos <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>, e da adoção do i<strong>de</strong>ário da Escola Nova, ouEscola Ativa.Assinale-se que o i<strong>de</strong>ário da Escola Ativa se inscreveu também <strong>no</strong>contexto do capitalismo europeu do fi nal do século XIX e início do século XX:por um lado, o resultado das lutas pela humanização do trabalho nas fábricasfez surgir um <strong>no</strong>vo personagem: a criança da classe operária. Já <strong>no</strong> séculoXIX, o discurso e a prática dominantes se preocuparam em <strong>de</strong>limitar o lugarsocial da criança burguesa e em marcar sua diferença em relação aos adultos,


A Função Social do Psicólogo 211procurando explorar as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> educá-la. No início do século seguinte,surge a preocupação com a educação da criança oriunda das classes dominadas.Se isto signifi cou a superação <strong>de</strong> um problema da fase do capitalismo selvagemna Europa – crianças pequenas trabalhando em minas, manufaturas, etc. – poroutro lado assinala a elaboração <strong>de</strong> uma consciência relativa à formação da mão<strong>de</strong>-obrapara o trabalho na gran<strong>de</strong> indústria posterior à II Revolução Industrial.Ora, são os métodos <strong>de</strong> medida da inteligência e <strong>de</strong> estudo docomportamento da criança que serão <strong>de</strong>mandados pelo grupo <strong>de</strong> psicólogostrazido a Minas por Francisco Campos, então Secretário do Interior, em 1929.Na Reforma do Ensi<strong>no</strong> proposta na mesma época pelo Secretário,institui-se a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Psicologia Educacional <strong>no</strong> Curso Normal e criou-se umLaboratório <strong>de</strong> Psicologia em anexo à Escola <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong> Professores,fundada na mesma época.A continuação da história é muito conhecida: Helena Antipoff éconvidada a permanecer <strong>no</strong> país para assumir <strong>de</strong>fi nitivamente a gestão doLaboratório, e passa a lecionar a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Psicologia Educacional.São então introduzidos, <strong>no</strong> interior do aparelho escolar, os instrumentos<strong>de</strong> medida da inteligência e do interesse.Qual o sentido histórico <strong>de</strong>sta preocupação com a medida da capacida<strong>de</strong>intelectual?Obviamente, <strong>no</strong> quadro da i<strong>de</strong>ologia liberal, tratava-se <strong>de</strong> justifi car elegitimar, por via da <strong>no</strong>va ciência do comportamento, a questão da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>.E através <strong>de</strong> que tipo <strong>de</strong> operação po<strong>de</strong>rá a Psicologia preencher a funçãoque lhe é solicitada? Po<strong>de</strong>mos respon<strong>de</strong>r a esta questão lembrando que, quandoa Psicologia se refere à criança, ela a toma como um ser abstrato e a-histórico – acriança em geral – <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> reconhecer a existência da criança particular,marcada pelas diferenças <strong>de</strong> classe <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o meio familiar até o universo cultural esimbólico <strong>no</strong> qual <strong>de</strong>ve apren<strong>de</strong>r a buscar sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. A crença na existência<strong>de</strong> aptidões naturais acompanha o mesmo tipo <strong>de</strong> lógica: a natureza é que dotadiferencialmente os indivíduos, não a relação com a natureza que lhes é impostapelo lugar que ocupam na estrutura social.


212 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Daí o esvaziamento do conteúdo social da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>, já presente nai<strong>de</strong>ologia liberal.As posteriores ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> seleção e orientação profi ssional, na década<strong>de</strong> 50, acompanham o mesmo tipo <strong>de</strong> lógica.Sabemos hoje em dia o quanto os instrumentos <strong>de</strong> medida da capacida<strong>de</strong>intelectual estão atravessados pelo conteúdo cultural dominante.Ora, <strong>no</strong>ssa hipótese é que esse pretenso erro correspon<strong>de</strong> exatamenteà realida<strong>de</strong> necessária ao funcionamento do teste <strong>de</strong> medida psicológico: estestestes se revelaram, historicamente, extremamente efi cientes para <strong>de</strong>tectardifi culda<strong>de</strong>s sócio-econômicas <strong>no</strong>s indivíduos a ele submetidos e em apresentartais difi culda<strong>de</strong>s como difi culda<strong>de</strong>s psicológicas, naturais.Esta observação foi feita aqui mesmo em Belo Horizonte, na década <strong>de</strong>30, pela própria Helena Antipoff, quando ela propôs o conceito <strong>de</strong> “inteligênciacivilizada” para <strong>de</strong>screver o atributo medido pelos testes psicológicos.Em trabalho publicado em 1936, Helena Antipoff, com e<strong>no</strong>rmesensibilida<strong>de</strong> para a época, discutia a <strong>de</strong>fi nição <strong>de</strong> inteligência proposta por Binete observava que difi cilmente os instrumentos <strong>de</strong> medida utilizados po<strong>de</strong>riamatingir o atributo em estado puro, como queria Binet, tantas eram as infl uênciasrecebidas do meio a que se po<strong>de</strong>riam atribuir seus resultados.Este tipo <strong>de</strong> observação, <strong>no</strong> entanto, na maioria das vezes permaneceig<strong>no</strong>rado, uma vez que não é passível <strong>de</strong> ser absorvido pelas instituições sociaisque se alimentam dos conceitos e práticas produzidas pelos psicólogos.Este tipo <strong>de</strong> observação, repito, que contém <strong>no</strong> seu interior a <strong>de</strong>núnciado signifi cado social <strong>de</strong> certas práticas adotadas pelo psicólogo, ten<strong>de</strong> aser <strong>de</strong>sconhecido, negado, vindo a constituir uma espécie <strong>de</strong> história dacontrapsicologia.Sim, porque se po<strong>de</strong>mos contar a história do psicólogo do ponto <strong>de</strong>vista <strong>de</strong> sua colaboração à reprodução da dominação <strong>de</strong> classe – e com e<strong>no</strong>rmeriqueza <strong>de</strong> exemplos – é <strong>de</strong> se supor que também é possível reconstituir a históriada contrapsicologia, com mais difi culda<strong>de</strong>, é certo, pela falta <strong>de</strong> registro do tipo<strong>de</strong> iniciativa que buscamos.


A Função Social do Psicólogo 213É possível porque, como toda instituição que se estabelece <strong>sobre</strong> oterre<strong>no</strong> social da contradição <strong>de</strong> classe, também a prática do psicólogo seránecessariamente atravessada por aquela contradição, que reaparecerá comorealida<strong>de</strong> ora negada, ora <strong>de</strong>nunciada em seu trabalho.Observe-se, além disso, que todo saber social – inclusive o saber daPsicologia – é produzido em função e na luta que se trava a nível econômico,político e i<strong>de</strong>ológico entre as classes fundamentais.Assim, <strong>no</strong> momento <strong>de</strong> sua produção, ele não é um saber <strong>de</strong> classe, poisque só o será <strong>no</strong> instante <strong>de</strong> sua apropriação.Ocorre que esta apropriação do saber pelas classes dominantes se dáatravés exatamente da malha <strong>de</strong> instituições que virão a constituir a peneira quenão <strong>de</strong>ixa passar a informação que não interessa à dominação.Faço referência a esta necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reconstituição <strong>de</strong>ssa história dacontrapsicologia, ou, melhor dizendo, da psicologia que <strong>de</strong>nuncia a dominaçãopara passar à segunda parte <strong>de</strong>sta exposição, quando se coloca a questão: serápossível que a categoria dos psicólogos, nascendo, conforme <strong>de</strong>monstramos,como uma das categorias <strong>de</strong> intelectuais orgânicos da burguesia, po<strong>de</strong>ráreencontrar este lado obscurecido <strong>de</strong> seu saber, que é o saber <strong>sobre</strong> a dominação?Esta questão me parece atual por dois motivos:Em primeiro lugar, pelo fato <strong>de</strong> que, por razões ligadas ao própriomo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> expansão e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento do capitalismo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, <strong>no</strong>ssacategoria profi ssional enfrenta <strong>no</strong> momento uma crise <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong> trabalho.Esta crise se apresenta, atualmente, na quase saturação do mercado<strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>stinado às classes <strong>de</strong> mais alta renda, o que <strong>no</strong>s obriga a buscarampliar o mercado <strong>no</strong> sentido <strong>de</strong> buscar a prestação <strong>de</strong> serviços às classes <strong>de</strong>me<strong>no</strong>r renda.Ora, é neste momento que po<strong>de</strong>mos tentar reencontrar, na história daprática do psicólogo, a história da prática da contradominação.Isto porque os <strong>no</strong>vos psicólogos, que estão <strong>no</strong> momento enfrentando arealida<strong>de</strong> do mercado das classes <strong>de</strong> baixa renda – seja <strong>no</strong> hospital psiquiátrico,na escola ou na própria indústria – verifi cam a sua falta <strong>de</strong> instrumentos paralidar com os problemas com que se <strong>de</strong>frontam, ou melhor, a ina<strong>de</strong>quação dos


214 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>seus instrumentos tradicionais <strong>de</strong> trabalho para o tipo <strong>de</strong> problemática que,cada vez <strong>de</strong> forma mais transparente, lhes aparece como <strong>de</strong>corrente da própriarelação <strong>de</strong> dominação <strong>de</strong> classe socialmente instituída.E é neste momento <strong>de</strong> refl exão <strong>sobre</strong> as ferramentas <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>que precisamos para enfrentar este mercado que eu percebo a possibilida<strong>de</strong> dacriação, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que possamos, enquanto categoria, <strong>no</strong>s apropriar dosmeios <strong>de</strong> produção da Psicologia e <strong>de</strong>svendar os seus não-ditos, aquilo que elanega, embora esteja presente, sob a forma da negação, <strong>no</strong> interior <strong>de</strong> sua própriaprática.Por isso não concordo quando se fala na crise da Psicologia: não setrata <strong>de</strong> que a Psicologia esteja, como ciência, atravessando uma crise teórica oumetodológica.Trata-se, muito mais, do fato <strong>de</strong> que as próprias contingências domercado estão levando os psicólogos a se haverem com a insufi ciência <strong>de</strong> seusmo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> interpretação do real.E é sabendo do que esta situação traz <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> criação –pela própria possibilida<strong>de</strong> histórica <strong>de</strong> alteração do lugar do psicólogo na divisãosocial do trabalho – que penso na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se reencontrar, na história daPsicologia, exemplos <strong>de</strong> <strong>de</strong>núncia como o <strong>de</strong> Helena Antipoff.Foi também pensando nisso que trouxe à consi<strong>de</strong>ração dos colegas essaminha interpretação da história da Psicologia, não pensando em negar a <strong>no</strong>ssaprática, mas em transformá-la.Lembro ainda uma vez que o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> interpretação da história como qual aprendi a trabalhar me obriga a analisar o fato histórico na relação que eleguarda com as forças antagônicas <strong>de</strong> constituição do real social.Assim, se cada momento <strong>de</strong> criação na prática da Psicologia po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>veser analisado em sua contribuição à reprodução da dominação, cabe tambémanalisá-lo em sua função <strong>de</strong> negação <strong>de</strong> um instituído anterior, que ele ajudoua superar.


CAPÍTULO 11REFLEXÕES SOBRE A EVOLUÇÃO ETENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS NAHISTORIOGRAFIA DA PSICOLOGIAEDUCACIONAL NO BRASILRegina Helena <strong>de</strong> Freitas CamposEsta é uma oportunida<strong>de</strong> especial para falar <strong>de</strong> um trabalho feito a<strong>no</strong>satrás, mas que continua a ren<strong>de</strong>r frutos até hoje. Aten<strong>de</strong>ndo ao convite doseditores <strong>de</strong>ssa preciosa coletânea, que traz refl exões dos psicólogos brasileiros<strong>sobre</strong> a trajetória da <strong>no</strong>ssa ciência e <strong>de</strong> <strong>no</strong>ssa profi ssão, lembro os motivos queme levaram a iniciar minha participação nessa refl exão, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 1980, ecomo vejo hoje a relação entre o psicólogo (especialmente na área educacional)e o contexto histórico-cultural em que vem se <strong>de</strong>senvolvendo a profi ssão.1 Pensando as relações entre a profissão do psicólogo e a educaçãoO artigo “A função social do psicólogo” (Campos, 1983) <strong>de</strong>corre <strong>de</strong>pesquisa <strong>sobre</strong> o sentido da introdução da psicologia educacional como disciplinaobrigatória <strong>no</strong>s cursos <strong>no</strong>rmais e <strong>no</strong> programa da Escola <strong>de</strong> Aperfeiçoamento <strong>de</strong>Professores <strong>de</strong> Belo Horizonte em 1927 (Campos, 1980). Esse dispositivo faziaparte da reforma do sistema <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> público mineiro, realizada pelo jurista


216 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Francisco Campos, durante sua gestão <strong>no</strong> gover<strong>no</strong> <strong>de</strong> Antônio Carlos Ribeiro <strong>de</strong>Andrada (1926-1930). A reforma fi cou muito conhecida <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> e fazia parte dociclo <strong>de</strong> reformas dos a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 1920, realizadas em vários estados brasileiros pelos<strong>no</strong>ssos pioneiros escola<strong>no</strong>vistas. As fi nalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ssas reformas eram voltadaspara a expansão e mo<strong>de</strong>rnização dos sistemas <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> público. Expansãosignifi cava ampliar o acesso à educação à população, <strong>sobre</strong>tudo a urbana.Mo<strong>de</strong>rnização signifi cava introduzir técnicas <strong>de</strong> gestão mais atualizadas <strong>no</strong>sistema: estatísticas educacionais, ensi<strong>no</strong> seriado, homogeneização das classespor níveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento cognitivo e/ou resultados escolares, sistemas <strong>de</strong>avaliação mais objetivos etc. (Saviani, 2007).Nesse contexto, a psicologia educacional comparecia como umaferramenta privilegiada para a mo<strong>de</strong>rnização do sistema: oferecia procedimentose teorias para o melhor conhecimento dos educandos, ao lado <strong>de</strong> instrumentos<strong>de</strong> avaliação objetiva <strong>de</strong> seus níveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, buscando a a<strong>de</strong>quaçãodos conteúdos e processos <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> a esses níveis. Lourenço Filho assimresumiu as contribuições da psicologia à educação, <strong>no</strong> âmbito do movimentoda Escola Nova: a <strong>de</strong>scrição das variações psicológicas através das ida<strong>de</strong>s, acaracterização objetiva das semelhanças humanas e das diferenças individuais, aproposição <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo explicativo genético-funcional. Tratava-se <strong>de</strong> realizaro antigo sonho <strong>de</strong> Rousseau – conhecer a criança para melhor educá-la, partindo<strong>de</strong> suas tendências espontâneas e possibilida<strong>de</strong>s individuais. A compreensãodas variações psicológicas através das ida<strong>de</strong>s implicava o reconhecimentodas diferenças nas formas <strong>de</strong> pensamento e <strong>de</strong> aprendizagem em crianças,adolescentes e adultos. Recomendava-se utilizar os métodos da observação oudo questionário (inventado por Stanley Hall) para <strong>de</strong>fi nir esses perfi s evolutivos.O conhecimento das semelhanças e diferenças individuais em relação a algumascaracterísticas psicológicas e psicossociais tinha se tornado possível <strong>de</strong> formamais objetiva com as técnicas da psicometria, especialmente com o trabalho<strong>de</strong> Alfred Binet e Théodore Simon em Paris, <strong>no</strong> início do século XX. Dessetrabalho <strong>de</strong>correu a formulação dos conceitos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> mental (posteriormentequociente <strong>de</strong> inteligência <strong>de</strong> Stern) e <strong>de</strong> aptidões, expressando relaçõesentre ida<strong>de</strong> cro<strong>no</strong>lógica e níveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento intelectual, emocional


Refl exões <strong>sobre</strong> a Evolução e Tendências Contemporâneas na Historiografi a da Psicologia Educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>217ou social, através <strong>de</strong> comparações por coorte <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> nas respostas a testesespecífi cos. Já o mo<strong>de</strong>lo explicativo genético-funcional, baseando-se <strong>no</strong> estudoda gênese das diferentes estruturas psicológicas e na sua funcionalida<strong>de</strong> parao <strong>de</strong>senvolvimento e adaptação a formas cada vez mais complexas <strong>de</strong> relaçãoentre sujeito e ambiente, seria a contribuição teórica específi ca da psicologia ditaexperimental. Quando diziam psicologia experimental, autores como LourençoFilho não se referiam apenas a estudos feitos <strong>no</strong> ambiente <strong>de</strong> laboratório (<strong>no</strong> qualera possível isolar e manipular <strong>de</strong>terminadas variáveis e verifi car seus efeitos),mas também os estudos que se valiam <strong>de</strong> propostas <strong>de</strong> observação e escutados sujeitos através <strong>de</strong> questionários e testes. Enfi m, tratava-se, sem dúvida,<strong>de</strong> aperfeiçoar os instrumentos <strong>de</strong> conhecimentos dos educandos, visandofornecer aos educadores elementos objetivos para o planejamento das ativida<strong>de</strong>seducativas e a transmissão <strong>de</strong> conhecimentos (Lourenço Filho, 1930/2002).O artigo, publicado na Educação e Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1983,faz a análise <strong>de</strong>ssa utilização dos conceitos da psicologia na educação e emoutros domínios <strong>de</strong> aplicação a partir <strong>de</strong> um nível elevado <strong>de</strong> abstração – hoje eudiria, como Willem Doise (2002), <strong>no</strong> nível <strong>de</strong> análise que se po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong><strong>no</strong>minarsocietal. Nessa análise, tratava-se <strong>de</strong> localizar o lugar do psicólogo na divisãosocial do trabalho, explorando sua função na socieda<strong>de</strong> capitalista e, ao mesmotempo, refl etir <strong>sobre</strong> a função do psicólogo, do ponto <strong>de</strong> vista ético, <strong>no</strong> estudo eintervenção <strong>sobre</strong> questões humanas vivenciadas na socieda<strong>de</strong> contemporânea.Sobre a questão da divisão social do trabalho, a i<strong>de</strong>ia era relacionar a divisãoda socieda<strong>de</strong> em classes à visão <strong>de</strong> mundo e <strong>de</strong> ser huma<strong>no</strong> difundida pelapsicologia científi ca – uma hierarquia <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong>s intelectuais e aptidõescorrespon<strong>de</strong>ndo a <strong>de</strong>terminadas funções a serem <strong>de</strong>sempenhadas (the rightman in the right place, como diriam os proponentes da administração científi cado trabalho). Na pesquisa feita na época, achei ter i<strong>de</strong>ntifi cado essa matriz <strong>de</strong>pensamento na introdução dos conceitos <strong>de</strong> <strong>no</strong>rmal e <strong>de</strong> excepcional <strong>no</strong> sistemaescolar, matriz também presente <strong>no</strong> extenso programa <strong>de</strong> pesquisa <strong>sobre</strong> o<strong>de</strong>senvolvimento mental das crianças mineiras empreendido pelo Laboratório<strong>de</strong> Psicologia dirigido por Helena Antipoff na Escola <strong>de</strong> Aperfeiçoamento<strong>de</strong> Professores <strong>de</strong> Belo Horizonte, durante os a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 1930. Era realmente


218 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>impressionante a articulação entre a i<strong>de</strong>ologia liberal e a visão da psicologia.A i<strong>de</strong>ologia liberal propunha oportunida<strong>de</strong>s iguais para todos, e a oferta<strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento a cada um conforme sua natureza. Apsicologia i<strong>de</strong>ntifi cava as diferentes “naturezas”, compatíveis com diferentesfunções na divisão social do trabalho. No entanto, já naquela época estava claropara nós, psicólogos, o impacto da cultura <strong>sobre</strong> o <strong>de</strong>senvolvimento e como esseimpacto engendrava as diferenças individuais tidas como naturais. A psicologiasocial <strong>de</strong> orientação sócio-histórica se fazia presente em <strong>no</strong>sso meio intelectualcom o trabalho da própria Antipoff (1931/2002), com o conceito <strong>de</strong> “inteligênciacivilizada”, e <strong>de</strong> autores como Célio Garcia (1974), Sílvia Lane e Wan<strong>de</strong>rley Codo(1984), e o pessoal da Análise Institucional (Lapassa<strong>de</strong> e Lourau, 1972). A partir<strong>de</strong>ssa perspectiva psicossocial, fazia-se a crítica à naturalização das diferençassocioculturais.Célio Garcia falava <strong>de</strong> uma sócio-lógica para explicar o efeito dosocial <strong>sobre</strong> o sujeito. Lourau e Lapassa<strong>de</strong> propunham a interpretação da açãohumana <strong>no</strong>s grupos sociais como resposta a pressões contraditórias. Para aAnálise Institucional, todos os grupos seriam atravessados pelas contradiçõesdo meio social em que estavam inseridos – contradições <strong>de</strong> gênero, <strong>de</strong> classe,<strong>de</strong> status social, <strong>de</strong> raça etc. A ação humana estaria sempre <strong>de</strong> alguma formarelacionada à forma como essas contradições estavam sendo elaboradas pelossujeitos participantes do grupo (ou instituição), e nesse movimento é que adinâmica da história se realizava. Sem as contradições, os embates e as diferenças<strong>de</strong> perspectivas entre os sujeitos, que ocupavam diferentes lugares sociais,não haveria movimento, transformação. Uma das formas <strong>de</strong> expressão <strong>de</strong>ssesmomentos <strong>de</strong> transformação estava presente na construção <strong>de</strong> analisadores– aqueles acontecimentos privilegiados que, eventualmente, tornavamtransparentes os mecanismos <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, <strong>de</strong> dominação e <strong>de</strong> contradominação<strong>sobre</strong> os quais as práticas grupais se organizavam.Também Foucault ensinava <strong>sobre</strong> a importância <strong>de</strong> se prestar atençãoaos jogos <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e <strong>de</strong> verda<strong>de</strong> que se instauram <strong>no</strong>s grupos e nas instituições,e que, por serem a eles imanentes, provocam a transformação. Foucault nãoconcordava com as interpretações da história que distinguiam os grupos sociais


Refl exões <strong>sobre</strong> a Evolução e Tendências Contemporâneas na Historiografi a da Psicologia Educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>219entre os que possuíam ou não o po<strong>de</strong>r, a chamada hipótese repressiva. Para ele,o po<strong>de</strong>r trazia a marca da positivida<strong>de</strong>, e mesmo os grupos dominados <strong>de</strong>tinhamo po<strong>de</strong>r da contradominação (Foucault, 1994). Mais que isso, esse autor tratavaa história da psicologia como a história das práticas discursivas e não discursivasque engendraram as formas mo<strong>de</strong>rnas <strong>de</strong> exercício do po<strong>de</strong>r (e do contrapo<strong>de</strong>r,eu diria). Na História da Loucura, o fi lósofo mostrava as relações entre aelaboração <strong>de</strong> um discurso libertador e práticas <strong>de</strong> sujeição, em uma dialéticaque provocou o enquadramento da doença mental através <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong><strong>no</strong>rmalização <strong>de</strong>rivadas da <strong>no</strong>sologia psiquiátrica. As classifi cações da psicologiaeducacional em termos <strong>de</strong> diferenças <strong>de</strong> inteligência ou aptidões, e mesmo asatribuições <strong>de</strong> <strong>no</strong>rmativida<strong>de</strong> a essas classifi cações estão relacionadas <strong>de</strong> maneiraevi<strong>de</strong>nte à dinâmica da distribuição do po<strong>de</strong>r social mediada pela centralida<strong>de</strong>que as instituições escolares adquiriram nas socieda<strong>de</strong>s contemporâneas,capitalistas, social-<strong>de</strong>mocratas ou socialistas. A imbricação entre os conceitosproduzidos pela psicologia dita científi ca, quando apropriados pelas instituiçõese pela cultura, os jogos <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e <strong>de</strong> produção/fabricação <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>s <strong>sobre</strong> asubjetivida<strong>de</strong> parecia muito interessante a partir <strong>de</strong>ssa leitura.Implicava-me, contudo, a suposição <strong>de</strong> que era possível contar umahistória sem sujeitos, a partir apenas do jogo das estruturas. Aliás, o próprioFoucault admitia que a psicologia <strong>de</strong>veria se libertar dos reducionismos presentesnas abordagens comportamentalistas ou existencialistas, e partir para umarefl exão <strong>sobre</strong> o huma<strong>no</strong> em sua história concreta. Essa i<strong>de</strong>ia me fazia voltar aoconceito do concreto em Marx, como a síntese (sempre provisória) <strong>de</strong> múltiplas<strong>de</strong>terminações. A crítica <strong>de</strong> Thompson ao estruturalismo tomava essa mesmadireção: não era possível contar uma história sem sujeito, pois é a construção dosujeito que constrói a história (Thompson, 1988).Assim, foi com a soma <strong>de</strong> todas essas infl uências intelectuais queelaborei minha tese <strong>de</strong> Doutorado na Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Stanford (Campos,1989), buscando contar um episódio da história da psicologia educacional <strong>no</strong><strong>Brasil</strong> a partir da experiência concreta <strong>de</strong> dois psicólogos bastante conhecidose infl uentes: Helena Antipoff (1892-1974) e Lourenço Filho (1897-1970). Nessa


220 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>tese, investiguei o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> visões alternativas <strong>sobre</strong> a inteligênciana obra dos dois psicólogos, e as relações <strong>de</strong> suas propostas <strong>sobre</strong> a evoluçãodo sistema público <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. A i<strong>de</strong>ia foi verifi car até que ponto aspolíticas e práticas educacionais foram atravessadas por diferentes interpretaçõesacerca das origens da inteligência, bem como acerca das relações entrecapacida<strong>de</strong>s intelectuais e sucesso escolar. Visões alternativas <strong>sobre</strong> a inteligênciacorrespondiam a orientações divergentes para a prática escolar. A i<strong>de</strong>ia dainteligência como atributo geneticamente <strong>de</strong>terminado, diferencialmentedistribuído pela natureza e cujo <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>pendia prioritariamente damaturação do indivíduo correspondia a uma mo<strong>de</strong>lo escolar seletivo, as escolassendo consi<strong>de</strong>radas agências <strong>de</strong> distribuição dos indivíduos entre as ocupaçõesdisponíveis, <strong>de</strong> acordo com seu potencial herdado. A visão ambientalista, emesmo a construtivista, acerca da inteligência po<strong>de</strong>ria correspon<strong>de</strong>r a ummo<strong>de</strong>lo educacional mais <strong>de</strong>mocrático, <strong>no</strong> qual as escolas seriam consi<strong>de</strong>radasresponsáveis pelo <strong>de</strong>senvolvimento das capacida<strong>de</strong>s intelectuais das crianças.Encontrei elementos <strong>de</strong>sses mo<strong>de</strong>los (aqui <strong>de</strong>scritos como tipos i<strong>de</strong>ais) nasobras dos dois psicólogos, sendo a infl exão <strong>de</strong>mocratizante mais forte naobra <strong>de</strong> Antipoff. Em Helena Antipoff, formada na escola genebrina, encontreiuma perspectiva original <strong>no</strong> tratamento das diferenças individuais com forteênfase <strong>no</strong>s efeitos da cultura <strong>no</strong> <strong>de</strong>senvolvimento cognitivo, <strong>de</strong>rivada também<strong>de</strong> seu conhecimento da psicologia soviética <strong>de</strong> orientação histórico-cultural.A partir <strong>de</strong>sse trabalho, tenho acompanhado o <strong>de</strong>senvolvimento das teoriasconstrutivista e socioconstrutivista em psicologia, buscando evidências darelação entre a psicologia e o contexto sociocultural. Como exemplo da relaçãoda teoria construtivista com a <strong>de</strong>mocracia e os movimentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa dos direitoshuma<strong>no</strong>s, pesquisei a participação dos psicólogos e educadores do InstitutoJean-Jaques Rousseau, em Genebra, na elaboração da Declaração <strong>de</strong> Genebra,primeira <strong>de</strong>claração internacional <strong>de</strong> direitos huma<strong>no</strong>s, aprovada em 1924 pelaLiga das Nações (Campos, 2003a; 2003b).


Refl exões <strong>sobre</strong> a Evolução e Tendências Contemporâneas na Historiografi a da Psicologia Educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>2212 Tendências contemporâneas na pesquisa <strong>sobre</strong> história da psicologia daeducação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Antunes (2003) propôs uma periodização para o <strong>de</strong>senvolvimento da áreada psicologia da educação entre nós a partir do início do século XX em três fases:em primeiro lugar, a fase da auto<strong>no</strong>mização (1890-1930), na qual o campo dapsicologia científi ca se constitui como área específi ca <strong>de</strong> conhecimento; a seguir,a fase da consolidação (1930-1962), na qual a organização da psicologia comocampo <strong>de</strong> conhecimento e <strong>de</strong> atuação profi ssional se consolida, especialmentea partir do trabalho dos psicólogos que se ocupam das questões educacionais;fi nalmente, a partir <strong>de</strong> 1962, a autora i<strong>de</strong>ntifi ca uma fase caracterizada peloreconhecimento legal da profi ssão, na qual ocorreu a expansão dos cursos <strong>de</strong>formação <strong>de</strong> psicólogos e a profi ssionalização, que privilegiou a abordagemclínica, voltada para a análise dos distúrbios a partir da perspectiva individual.Essa perspectiva teria sido também adotada pelos psicólogos que atuavam naárea educacional, tendo sido duramente criticada, a partir <strong>de</strong> meados dos a<strong>no</strong>s<strong>de</strong> 1970, tendo em vista a difi culda<strong>de</strong> dos psicólogos em lidar com as questõessocioculturais, institucionais e/ou pedagógicas que contribuíam na emergênciados problemas ditos “<strong>de</strong> aprendizagem”.Durante os a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 1970 e 1980, alguns estudos críticos apontaramos problemas <strong>de</strong>correntes da aplicação indiscriminada dos conceitos e teoriaspsicológicos a questões geradas pelo sistema <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> contraditório e exclu<strong>de</strong>nteque se instalou <strong>no</strong> país. Tomando como referência a historiografi a crítica dapsicologia que vinha sendo produzida em outros países, especialmente na França,na Inglaterra e <strong>no</strong>s Estados Unidos da América, buscava-se especialmente avaliara real participação dos instrumentos <strong>de</strong> medida psicológica e dos conceitosclassifi catórios <strong>de</strong>les <strong>de</strong>rivados na reprodução da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social e culturalatravés do sistema educacional. Essa literatura focalizava, <strong>sobre</strong>tudo:o <strong>de</strong>sconhecimento, por parte dos psicólogos, dos efeitos sóciopolíticosdas classifi cações e diagnósticos por eles realizados; a falta<strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> dos instrumentos <strong>de</strong> medida psicológica a questõessocioculturais; e, fi nalmente, o prejuízo objetivo que a aplicação <strong>de</strong>ssesinstrumentos vinha causando a grupos e estratos sociais culturalmentemarginalizados ou oprimidos (Campos, 1996, p. 125).


222 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Alguns <strong>de</strong>sses estudos adotavam a perspectiva reprodutivista, epropunham pensar a aplicação <strong>de</strong> instrumentos e procedimentos psicológicos<strong>no</strong>s sistemas <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> como parte da i<strong>de</strong>ologia liberal e meritocrática:embora todos os indivíduos <strong>de</strong>vessem ser consi<strong>de</strong>rados como iguais diantedas oportunida<strong>de</strong>s oferecidas pela educação, as diferenças inatas <strong>de</strong> aptidõese capacida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>terminariam a ocupação <strong>de</strong> lugares diferenciados na estruturasocial. Outros trabalhos, analisando a relação da psiquiatria com os movimentosda eugenia e da higiene mental infantil também contribuíram para redirecionara interpretação <strong>sobre</strong> a aplicação da psicologia à educação em direção a umaperspectiva crítica, na qual as questões socioculturais <strong>no</strong> contexto educativo nãofossem traduzidas na linguagem do défi cit cognitivo ou linguístico (Costa, 1976;1979; Machado, Loureiro, Luz & Muricy, 1978).Nessa direção, os estudos <strong>de</strong> Maria Helena Patto (1984; 1991) exerceramgran<strong>de</strong> infl uência <strong>sobre</strong> a historiografi a da psicologia na área da educação. Noprimeiro, publicado em 1984, a autora analisa as abordagens da carência e damarginalida<strong>de</strong> cultural, comparando-as com a concepção liberal das diferençasindividuais inatas. No segundo, publicado em 1991, apresenta um históricodas concepções <strong>de</strong> “fracasso escolar” presentes na literatura em psicologia eeducação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> ao longo do século XX.A contribuição maior <strong>de</strong>sses estudos críticos talvez tenha sido,justamente, chamar a atenção para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudar em maiorprofundida<strong>de</strong> a evolução da psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, superando a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que elapo<strong>de</strong>ria ser caracterizada apenas como refl exo da história das i<strong>de</strong>ias e das ciências<strong>no</strong> pla<strong>no</strong> internacional. Tornava-se cada vez mais claro que “a psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>tem história” (Bock, 1999, p. 63). História <strong>no</strong> sentido ple<strong>no</strong>, isto é, <strong>no</strong> sentido <strong>de</strong>que é possível encontrar contribuições originais entre os teóricos da psicologia<strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, que <strong>de</strong>vem ser compreendidas não como a aplicação mecânica dasi<strong>de</strong>ias <strong>de</strong>senvolvidas em outros países, mas como respostas elaboradas a partirda dinâmica sociocultural própria, e <strong>no</strong> diálogo com a produção internacional.Compreen<strong>de</strong>r esse processo <strong>de</strong> produção do conhecimento a partir das práticassociais e institucionais e da própria criativida<strong>de</strong> dos autores locais é o trabalhoque instiga os pesquisadores em história da psicologia na atualida<strong>de</strong>.


Refl exões <strong>sobre</strong> a Evolução e Tendências Contemporâneas na Historiografi a da Psicologia Educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>223Nos últimos a<strong>no</strong>s, <strong>no</strong>vos estudos têm sido feitos, buscando <strong>de</strong>terminarcom maior precisão em que medida os problemas apontados nesses estudoscríticos foram prevalentes, e os efeitos sociopsicológicos e culturais provocadospor diferentes utilizações feitas por psicólogos e educadores dos conhecimentosgerados pela psicologia científi ca (Bock, 2003; Martinez, 2005; Meira & Antunes,2003; Vieira, 2008). O estudo <strong>de</strong> Vieira (2008) é importante por evi<strong>de</strong>nciar quea atenção ao contexto sociocultural é importante para a avaliação <strong>de</strong> escolaresque apresentam os chamados “problemas <strong>de</strong> aprendizagem”. Nesse trabalho,a autora fez um estudo <strong>de</strong> caso da Clínica Édouard Claparè<strong>de</strong>, estabelecidaem 1955 na Fazenda do Rosário, em Ibirité, Minas Gerais, pela psicóloga eeducadora Helena Antipoff, cuja obra se <strong>de</strong>stacou pela atenção às questõessocioculturais. Assim, o estudo <strong>de</strong> caso <strong>de</strong>ssa Clínica po<strong>de</strong>ria evi<strong>de</strong>nciar umtrabalho diferenciado e implicado com as questões sociais, voltado para ainclusão. Os dados foram coletados através <strong>de</strong> entrevistas semiestruturadas comas psicólogas, análise dos laudos psicológicos e estudo dos arquivos documentaisda Clínica cobrindo todo o período <strong>de</strong> seu funcionamento. A análise dos dadosfoi feita utilizando a modalida<strong>de</strong> fe<strong>no</strong>me<strong>no</strong>lógica <strong>de</strong> pesquisa em Psicologia.Concluiu-se pela confi rmação da hipótese levantada. Na instituição estudada,realmente <strong>de</strong>senvolve-se um processo diferenciado <strong>de</strong> trabalho, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>stacaa preocupação com a interpretação sociocultural dos processos psicológicos ecom a inclusão escolar e social dos sujeitos atendidos. A partir <strong>de</strong>ssa análise,são feitas consi<strong>de</strong>rações <strong>sobre</strong> a importância <strong>de</strong> uma sólida formação teórica etécnica para o exercício profi ssional, obtida através da associação entre ensi<strong>no</strong>,pesquisa e extensão.Outra característica dos trabalhos atuais na historiografi a da psicologiabrasileira é buscar compreen<strong>de</strong>r as i<strong>de</strong>ias, conceitos e práticas <strong>de</strong>senvolvidosem cada momento da história em seu contexto específi co. Procura-se evitarassim o risco do presentismo – a avaliação do passado a partir <strong>de</strong> categorias eintencionalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>rivadas da organização da área <strong>no</strong> presente, ou a compreensãodo passado como preparação para o presente sempre mais elaborado. Trata-se,ao contrário, <strong>de</strong> buscar compreen<strong>de</strong>r o pensamento em relação a seu própriotempo e lugar, procurando a lógica que levou os autores a se posicionarem <strong>de</strong>staou daquela maneira em relação a sua própria época.


224 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Para este enfoque, a compreensão da história da psicologia como parteda história da ciência tem sido importante, <strong>sobre</strong>tudo tomando como referência aspropostas <strong>de</strong> superação da dicotomia internalismo-externalismo (Hacking, 2001;Latour, 2001). Tanto para Hacking como para Latour, a separação dos estudosem história da ciência como internalistas ou externalistas (Lakatos, 1989) nãofaz muito sentido, já que a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> conhecimentos científi cosimplica uma releitura do “mundo vivido” a partir <strong>de</strong> uma gra<strong>de</strong> <strong>de</strong> conceitosproduzidos na interação entre saberes e práticas sociais e culturais, e na dinâmicadas instituições que tornam possível essa releitura. Ou seja, o <strong>de</strong>senvolvimento<strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> conceitos científi cos supõe a existência <strong>de</strong> uma cultura queos promove, e <strong>de</strong> uma linguagem que os acolhe e veicula (Carroy, 2001). Opróprio laboratório <strong>de</strong> pesquisa se constitui como uma instituição social, comtoda a dinâmica <strong>de</strong> interações entre práticas e representações sociais que istoimplica.A contribuição <strong>de</strong> Latour a esse <strong>de</strong>bate concentra-se <strong>no</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<strong>de</strong> uma metodologia para o estudo da construção <strong>de</strong> conceitos científi cos a partirdas práticas <strong>de</strong> laboratório e estudos <strong>de</strong> campo, ou do que ele <strong>de</strong><strong>no</strong>mina asinterações entre huma<strong>no</strong>s e não huma<strong>no</strong>s (os produtos da pesquisa <strong>de</strong> laboratórioou <strong>de</strong> campo), e do estabelecimento <strong>de</strong> instituições que fazem perdurar osconceitos assim construídos através da criação e recriação <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstraçõesempíricas das manifestações dos fenôme<strong>no</strong>s <strong>de</strong>scritos. No caso das ciênciashumanas, é preciso ainda consi<strong>de</strong>rar o “efeito <strong>de</strong> elo”, <strong>de</strong>scrito por Hacking: a<strong>de</strong>scrição científi ca da realida<strong>de</strong> empírica ten<strong>de</strong> a se reproduzir na medida emque os próprios sujeitos da experiência passam a se i<strong>de</strong>ntifi car e <strong>de</strong>screver com aajuda dos conceitos científi cos propostos pelos estudiosos.Em conclusão, po<strong>de</strong>-se dizer que o estudo das relações entre a históriada psicologia e a história da educação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> é uma área em expansão, na qualainda há muito a pesquisar. É preciso não só reconstruir as trajetórias dos atoresque contribuíram na construção da área da psicologia educacional entre nós,como também compreen<strong>de</strong>r melhor como a produção teórica em psicologia temsido incorporada, <strong>de</strong>batida e transformada em conhecimento prático <strong>no</strong> interiordas instituições educativas. Em outras palavras, é importante compreen<strong>de</strong>r como


Refl exões <strong>sobre</strong> a Evolução e Tendências Contemporâneas na Historiografi a da Psicologia Educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>225os conceitos e procedimentos propostos pela psicologia, especialmente pelapsicologia científi ca, vieram a fazer parte da cultura escolar, <strong>sobre</strong>tudo a partirdas primeiras décadas do século XX. A melhor compreensão <strong>de</strong>ssas relações po<strong>de</strong>contribuir para iluminar as opções contemporâneas em matéria <strong>de</strong> organizaçãodas instituições educativas, uma vez que, como diria Tyack (1974), a maneiracomo compreen<strong>de</strong>mos o passado mo<strong>de</strong>la profundamente a maneira comofazemos escolhas <strong>no</strong> presente.Referências BibliográficasAntipoff, H. (2002). O <strong>de</strong>senvolvimento mental das crianças <strong>de</strong> Belo Horizonte.In R. H. F. Campos (Org.), Helena Antipoff: Textos Escolhidos (pp. 83-125).São Paulo: Casa do Psicólogo. (Reedição <strong>de</strong> Boletim, 7, 1931).Antunes, M. A. M. (2003) Psicologia e educação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>: um olhar históricocrítico.In M. E. M. Meira & M. A. M. Antunes (Orgs.), Psicologia Escolar:Teorias Críticas (pp. 139-168). São Paulo: Casa do Psicólogo.Bock, A. M. B. (1999). Aventuras do Barão <strong>de</strong> Münchhausen na Psicologia. SãoPaulo: EDUC/FAPESP/Cortez Editora.Bock, A. M. B. (2003). Psicologia da Educação: Cumplicida<strong>de</strong> I<strong>de</strong>ológica. In M. E.M. Meira & M. A. M. Antunes (Orgs.), Psicologia Escolar: Teorias Críticas (pp.79-104). São Paulo: Casa do Psicólogo.Campos, R. H. F. (1980). Psicologia e i<strong>de</strong>ologia - um estudo da formação dapsicologia educacional em Minas Gerais. Dissertação <strong>de</strong> mestrado nãopublicada,Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação da UFMG, Belo Horizonte.Campos, R. H. F. (1983). A função social do psicólogo. Educação e socieda<strong>de</strong>,16, 74-84.Campos, R. H. F. (1989). Confl icting Interpretations of Intellectual AbilitiesAmong Brazilian Psychologists and Their Impact on Primary Schooling(1930-1960). Tese <strong>de</strong> Doutorado não publicada, Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Stanford,Stanford (EUA).Campos, R. H. F. (1996). Em busca <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo teórico para o estudo dahistória da psicologia <strong>no</strong> contexto sociocultural. In R. H. F. Campos (Org.),História da Psicologia – Pesquisa, Formação, Ensi<strong>no</strong> (pp. 125-145). SãoPaulo: EDUC/ANPEPP.


226 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Campos, R. H. F. (2003a). Helena Antipoff: razão e sensibilida<strong>de</strong> na psicologia ena educação. Estudos Avançados, 49, 209-234.Campos, R. H. F. (2003b). Psicologia e direitos huma<strong>no</strong>s: a relação entre ciênciae ética na perspectiva do Instituto Rousseau, em Genebra (1920-1940). In A.M. C. Guerra, L. Kind, L. Afonso & M. A. M. Prado (Orgs.), Psicologia social edireitos huma<strong>no</strong>s (pp. 77-90). Belo Horizonte: ABRAPSO-MG.Carroy, J. (1991). Hyp<strong>no</strong>se, suggestion et psychologie – l’invention <strong>de</strong>s sujets.Paris: PUF.Costa, J. F. (1976). História da psiquiatria <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Documentário.Costa, J. F. (1979). Or<strong>de</strong>m médica e <strong>no</strong>rma familiar. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Graal.Doise, W. (2002). Da psicologia social à psicologia societal. Psicologia: Teoria ePesquisa, 18(1), 27-35.Foucalt, M. (1994). Dits et Écrits 1954-1988. Paris: Gallimard.Garcia, C., Luz, M. A., Chaim, S. K., & Lapassa<strong>de</strong>, G. (1974). Análise institucional:teoria e prática. Revista <strong>de</strong> Cultura Vozes, 4(67), .Hacking, I. (2001). Entre science et réalité: la construction sociale <strong>de</strong> quoi? Paris:La Découverte.Lakatos, I. (1989). La metodología <strong>de</strong> los programas <strong>de</strong> investigación científi ca.Madrid: Alianza.Lane, S. T. M., & Codo, W. (1984). Psicologia social – o homem em movimento.São Paulo: Editora <strong>Brasil</strong>iense.Lapassa<strong>de</strong>, G., & Lourau, R. (1972) Chaves da Sociologia. Rio <strong>de</strong> Janeiro:Civilização <strong>Brasil</strong>eira.Latour, B. (2001). L’espoir <strong>de</strong> Pandore - pour une version réaliste <strong>de</strong> l’activitéscientifi que. Paris: La Découverte.Lourenço Filho, M. B. (1930/2002). Introdução ao Estudo da Escola Nova (16aed.). São Paulo: Melhoramentos.Machado, R., Loureiro, A., Luz, R., & Muricy, K. (1978). Danação da <strong>no</strong>rma:Medicina social e constituição da psiquiatria <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Graal.Martinez, A. M. (2005). Psicologia Escolar e Compromisso Social. Campinas:Alínea.Meira, M. E. M., & Antunes, M. A. M. (Orgs.) (2003). Psicologia Escolar: TeoriasCríticas. São Paulo: Casa do Psicólogo.


Refl exões <strong>sobre</strong> a Evolução e Tendências Contemporâneas na Historiografi a da Psicologia Educacional <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>227Patto, M. H. S. (1984). Psicologia e I<strong>de</strong>ologia: uma introdução crítica à PsicologiaEscolar. São Paulo: T. A. Queiroz.Patto, M. H. S. (1991). A produção do fracasso escolar. São Paulo: T. A. Queiroz.Saviani, D. (2007). História das i<strong>de</strong>ias pedagógicas <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. São Paulo: AutoresAssociados.Thompson, E. P. (1988). A formação da classe operária inglesa (2ª. Ed.). Rio <strong>de</strong>Janeiro: Paz e Terra.Tyack, D. B. (1976). The One Best System – A history of American urbaneducation. Cambridge: Harvard University Press.Vieira, R. C. (2008). O psicólogo e seu fazer na educação: contando uma outrahistória. Tese <strong>de</strong> Doutorado não publicada, Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação daUFMG, Belo Horizonte.


CAPÍTULO 12*O PSICÓLOGO BRASILEIRO:SUA ATUAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONALAntonio Virgílio Bittencourt BastosPaula Inez Cunha Gomi<strong>de</strong>Apesar <strong>de</strong> pouco mais <strong>de</strong> vinte e cinco a<strong>no</strong>s <strong>no</strong>s separarem daregulamentação da Psicologia como profi ssão é signifi cativo o número <strong>de</strong> estudosque visam <strong>de</strong>screvê-la e tentam compreen<strong>de</strong>r os seus <strong>de</strong>terminantes históricos,sociais e políticos. Não dispúnhamos, entretanto, <strong>de</strong> um estudo abrangenteda realida<strong>de</strong> nacional, pois os trabalhos disponíveis até então se apoiavam emamostras reduzidas e <strong>de</strong> âmbito regional ou local. Visando suprir esta lacuna,assim como fornecer elementos para uma atuação mais efetiva junto às instituições<strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>, é que o Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong>senvolveu uma pesquisacujos resultados completos estão disponíveis <strong>no</strong> livro QUEM É O PSICOLÓGOBRASILEIRO? O presente artigo apresenta um sumário dos principais resultados<strong>de</strong>sta pesquisa que abrangeu uma amostra <strong>de</strong> 2448 psicólogos <strong>de</strong> diferentesregiões do País e que teve seus dados coletados através <strong>de</strong> um questionárioaplicado entre 1986 e 87.* Referência completa do texto original: Bastos, A. V. B., & Gomi<strong>de</strong>, P. I. C. (1989). Opsicólogo brasileiro: sua atuação e formação profi ssional. Psicologia: Ciência e Profi ssão,9(1), 6-15.


230 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>A profissão <strong>no</strong> PaísUm crescimento acentuadoDe 1962 até hoje, experimentamos um gran<strong>de</strong> crescimento do número<strong>de</strong> psicólogos graduados pelas instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>, que não vem acompanhadopor idêntico índice <strong>de</strong> inscrições <strong>no</strong>s Conselhos Regionais, condição paraa legalida<strong>de</strong> do exercício profi ssional. Os dados da fi gura 1 mostram que oestoque <strong>de</strong> psicólogos graduados (segundo o MEC) atingiu 102.862 em 1985,tendo crescido, exponencialmente, a partir dos a<strong>no</strong>s 70, com a conhecidaproliferação das instituições particulares <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>. Apesar disso, o número <strong>de</strong>inscritos <strong>no</strong>s Conselhos, <strong>no</strong> mesmo a<strong>no</strong>, atingia apenas 53.338 (uma perda <strong>de</strong>aproximadamente 50%). Em setembro <strong>de</strong> 1988, os registros <strong>no</strong> CFP apontavam aexistência <strong>de</strong> 61.738 psicólogos em exercício <strong>no</strong> País. A que atribuir tão elevadaperda <strong>de</strong> profi ssionais graduados que não se inserem <strong>no</strong> mercado enquantopsicólogos? Muitos fatores <strong>de</strong>vem ser buscados para explicar o fato <strong>de</strong> que aprofi ssionalização não é a meta <strong>de</strong> todos os que buscam o curso <strong>de</strong> Psicologia. Aanálise dos motivos apontados pelos psicólogos para a escolha do curso fornecealgumas pistas. Divididos em três gran<strong>de</strong>s blocos, os motivos apontados pelosentrevistados revelam um peso elevado <strong>de</strong> razões pessoais (“motivos voltadospara si”, a exemplo do autoconhecimento e crescimento pessoal ou solução <strong>de</strong>problemas), ou razões humanísticas (“motivos voltados para o outro”, tais comoconhecer ou ajudar o ser huma<strong>no</strong>), em comparação com os “motivos voltadospara a profi ssão”. Mesmo neste último grupo, o motivo que apresenta maiorfreqüência caracteriza-se por um interesse genérico pela Psicologia, enquantoárea <strong>de</strong> conhecimento (35,4%), sem um interesse mais explícito pela práticaprofi ssional. Há, ainda, 8,2% <strong>de</strong> citações <strong>de</strong> motivos extrínsecos à profi ssão (erasegunda opção, a faculda<strong>de</strong> era perto etc...). Assim, parte das razões que levamas pessoas a cursarem Psicologia não garante, necessariamente, seu ingresso <strong>no</strong>mercado <strong>de</strong> trabalho enquanto psicólogos. Se agregarmos a isso o contingentedos que se “<strong>de</strong>silu<strong>de</strong>m” com o curso, ou que fazem outros cursos paraleloscom melhores chances <strong>no</strong> mercado, talvez encontremos a <strong>de</strong>fasagem apontadana fi gura 1. Tal <strong>de</strong>fasagem é, sem dúvida, um sintoma da crise maior do <strong>no</strong>sso


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional231sistema universitário e, <strong>no</strong> <strong>no</strong>sso caso em particular, da ausência <strong>de</strong> uma políticamais global para a formação <strong>de</strong> psicólogos <strong>no</strong> País, que atenda às peculiarida<strong>de</strong>sregionais.Características geraisA distribuição dos psicólogos <strong>no</strong> País revela-se bastante <strong>de</strong>sigual com quase 75% dosprofissionais concentrados <strong>no</strong> su<strong>de</strong>ste como po<strong>de</strong>mos ver na figura 2.


232 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>O CRP-06 (São Paulo, especialmente) concentra 42,1% dos psicólogosem exercício <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> e o Rio <strong>de</strong> Janeiro apresenta a me<strong>no</strong>r relação habitantex psicólogo (1.187 hab/psicólogo). Em oposição, o CRP-03 (BA e SE) apresentao me<strong>no</strong>r quantitativo <strong>de</strong> profi ssionais e a mais elevada taxa <strong>de</strong> habitantes porpsicólogos (próxima a 1 psicólogo para cada 13 mil habitantes). Outra informaçãoimportante trata da elevada concentração <strong>de</strong> psicólogos nas capitais dos estados.No geral, aproximadamente 70% dos profi ssionais trabalham nas capitais (índiceque atinge 88% <strong>no</strong> CRP-03 e que se mostra mais atenuado <strong>no</strong>s estados do sul,incluindo São Paulo). Como coloca ROSAS et alii (1988), o mercado estabelecidonas capitais e as condições <strong>de</strong> vida que as tornam sedutoras são fortes fatores <strong>de</strong>fi xação do psicólogo <strong>no</strong>s centros urba<strong>no</strong>s mais <strong>de</strong>senvolvidos (p. 39), o que não<strong>de</strong>ve inibir iniciativas <strong>de</strong> incentivo à interiorização das práticas psicológicas.Outros dados que caracterizam o exercício profi ssional são maisconhecidos: o predomínio absoluto das mulheres, com percentuais que vão <strong>de</strong>81,9 (CRP-04) a 90,4% (BA e SE). Esse dado é importante para a compreensão<strong>de</strong> vários aspectos ligados ao exercício profi ssional, como por exemplo, oentendimento das mulheres do que seja uma profi ssão complementar asua ativida<strong>de</strong> principal – o casamento, com inclusive perda <strong>de</strong> profi ssionaisgraduados, a que <strong>no</strong>s referirmos anteriormente, como vários trabalhos jáapontaram anteriormente, (vi<strong>de</strong> ROSENBERG, 1983 e 1984 por exemplo).Somos, também, uma categoria jovem, com pequenas variações regionais, entre73 e 90% dos psicólogos têm me<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 40 a<strong>no</strong>s, sendo reduzido o percentualdaqueles com 50 a<strong>no</strong>s ou mais.O exercício profissionalEmprego, <strong>de</strong>semprego e remuneraçãoOs resultados expressos na fi gura 3 mostram que, mesmo entre os quese inscrevem <strong>no</strong> Conselho (logo, preten<strong>de</strong>m atuar como psicólogos), a situaçãonão é satisfatória.


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional233Não mais do que 60% dos profi ssionais atuam exclusivamente comopsicólogos (<strong>no</strong>s CRPs-01 e 04 este percentual é me<strong>no</strong>r que 50% e, <strong>no</strong> CRP-06, caipara me<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 40% dos casos), sendo signifi cativo o índice dos que combinama atuação em Psicologia com outras ativida<strong>de</strong>s profi ssionais (esta realida<strong>de</strong> éme<strong>no</strong>s forte <strong>no</strong> CRP-02 e 05). Consi<strong>de</strong>rando-se, conjuntamente, os psicólogos<strong>de</strong>sempregados e os que trabalhavam fora da Psicologia, observamos queeste contingente perfaz 25,6% da força <strong>de</strong> trabalho do CRP-06 e 18,6% do CRP-05, regiões que concentram, como vimos, a maioria dos psicólogos brasileiros.Estamos diante <strong>de</strong> mais um dado a exigir uma <strong>no</strong>va política para a abertura <strong>de</strong>cursos e vagas nestas regiões.


234 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Quanto à remuneração, cujos dados po<strong>de</strong>m ser vistos na fi gura 4, nãotemos, também, um quadro animador.No País, encontramos 22,3% que não obtêm rendimentos comopsicólogos (<strong>de</strong>sempregados, trabalho em outras ativida<strong>de</strong>s, trabalho voluntário),realida<strong>de</strong> que se mostra mais grave <strong>no</strong> CRP-06 e 02, vindo a seguir os CRPs-05 e


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional23504. A média salarial (excluindo o grupo que não tem rendimento) fi cou em tor<strong>no</strong><strong>de</strong> 10.21 salários mínimos, sendo mais elevada em São Paulo (13.2), seguidopor Brasília (10.84) e pela Bahia (10.45). A remuneração média dos psicólogosrevela-se mais baixa <strong>no</strong> <strong>no</strong>r<strong>de</strong>ste (7.04) e <strong>no</strong> Paraná (7.35). Consi<strong>de</strong>randoseos níveis salariais conhecidos <strong>de</strong> outras categorias profi ssionais, <strong>de</strong> nívelsuperior, po<strong>de</strong>mos verifi car que <strong>no</strong>s situamos em patamares mais baixos do queo nível inicial <strong>de</strong> muitas outras profi ssões (por exemplo, Engenharia, Direito,Administração etc). Mesmo o fato <strong>de</strong> o contingente expressivo <strong>de</strong> psicólogos serautô<strong>no</strong>mo não faz com que a média salarial se eleve signifi cativamente, o que não<strong>no</strong>s distancia, <strong>sobre</strong>maneira, das <strong>de</strong>mais profi ssões da área social, especialmentedaquelas em que há o predomínio da força <strong>de</strong> trabalho feminina (fatores <strong>de</strong>me<strong>no</strong>r valorização em termos <strong>de</strong> mercado).Áreas <strong>de</strong> atuaçãoEmbora a legislação que regulamenta a profi ssão não se refi ra à área <strong>de</strong>atuação, este conceito vem sendo largamente usado para <strong>de</strong>screver o conjunto <strong>de</strong>características que, <strong>de</strong> alguma forma, <strong>de</strong>marca o campo <strong>de</strong> trabalho do psicólogoe confere alguma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> ao grupo <strong>de</strong> profi ssionais que se <strong>de</strong>dica àquelasativida<strong>de</strong>s. Tradicionalmente, o conjunto <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s e objetivos da atuaçãodo psicólogo foi agrupado em quatro gran<strong>de</strong>s áreas: clínica, escolar, industriale docência. Hoje, os conceitos associados a estas áreas encontram-se ampliadose <strong>no</strong>vas áreas foram concebidas (comunitária, social, pesquisa, por exemplo). Aclínica absorve 43,4% dos empregos, vindo a seguir a área organizacional (18,8%),escolar (14,3%), e a docência (11,5%). “Embora não haja, <strong>no</strong> curso <strong>de</strong> graduação,qualquer propósito e, inclusive, condições <strong>de</strong> especializar o psicólogo em uma<strong>de</strong>terminada área, verifi camos, como po<strong>de</strong> se observar na tabela 1, que 73% dosprofi ssionais entrevistados se <strong>de</strong>dicam, exclusivamente, a uma área, enquanto22% combinam duas áreas e apenas 5% combinam três áreas. Dentre os 73% doprimeiro grupo, a clínica, a organizacional e a escolar aparecem, respectivamente,com 39,3% 17,6% e 7,1%, signifi cando que as <strong>de</strong>mais áreas caracterizam-sepor serem predominantemente complementares (na maioria dos casos vêm


236 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>acompanhadas por trabalhos numa <strong>de</strong>stas áreas). A freqüência com que a áreaclínica aparece associada às <strong>de</strong>mais áreas é um indicador <strong>de</strong> que o número <strong>de</strong>psicólogos atuando nesta área (exclusivamente ou não) é bem superior ao quevimos apontando até aqui.” (BASTOS, 1988, p. 175). Na tabela 2, po<strong>de</strong>mosobservar que 60,7% dos psicólogos brasileiros têm, pelo me<strong>no</strong>s, um empregoem clínica. Este índice é me<strong>no</strong>r <strong>no</strong>s CRPs-01 e 03, regiões que apresentam umaparticipação maior da área organizacional (acima da média nacional <strong>de</strong> 23,6%).As áreas escolar e docência aparecem com percentuais iguais <strong>de</strong> 16,5%, sendomais expressivas <strong>no</strong> sul do País (<strong>no</strong> caso da docência) e <strong>no</strong> CRP-04 e 03 (<strong>no</strong> caso<strong>de</strong> escolar). Apenas 5,6% dos psicólogos atuam na área comunitária (ela é maior<strong>no</strong> CRP-04, on<strong>de</strong> atingiu 10, 2%) e 3,0% se <strong>de</strong>dicam à pesquisa.Tabela 1Distribuição <strong>de</strong> psicólogos por área <strong>de</strong> atuação <strong>no</strong> trabalho atualUma só área(73%)Duas Áreas(22%)Três Áreas(5%)Clínica 39,3 Cli+Doc 5,7 Cli+Esc+Doc 1,0Escolar 7,1 Cli+Esc 4,6 Cli+Org+Doc 0,7Organizacional 17,6 Cli+Org 2,8 Cli+Doc+Org 0,6Docência 4,3 Cli+Outra 1,7 Cli+Doc+Com 0,5Pesquisa 0,4 Cli+Com 1,6 Cli+Doc+Pesq 0,5Comunitária 1,9 Org+Doc 1,3 Cli+Esc+Com 0,5Outra 2,3 Esc+Doc 0,8 Cli+Esc+Org 0,3Doc+Pesq 0,7 Div. Combinações 0,9Esc+Org 0,6Cli+Pesq 0,5Div. Combin. 1,8Nº <strong>de</strong> casos (1.862).


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional237Tabela 2Percentuais <strong>de</strong> psicólogos que atuam nas diversas áreas, por região.Área 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª <strong>Brasil</strong>Clínica 46,9 55,9 52,2 64,1 64,4 60,9 61,6 65,9 60,7Escolar 9,4 12,4 21,3 22,5 13,5 16,5 16,7 19,7 16,5Organizacion. 42,2 30,5 36,4 19,5 18,5 20,7 27,6 21,9 23,6Docência 12,5 16,4 12,3 17,4 16,0 14,6 21,2 23,8 16,5Pesquisa 6,3 1,7 2,4 1,5 1,1 4,9 3,2 1,2 3,0Comunitária 3,1 5,6 4,9 10,2 1,9 2,0 5,4 5,5 5,6Outras 3,1 0,5 4,9 3,6 2,5 10,2 3,8 1,2 5,0Nº Casos 64 179 122 197 362 589 185 164 1862*Exclui: não inseridos/<strong>de</strong>sempregados/empregados fora da Psicologia/não informantes.Como vemos, o predomínio da clínica é patente. Esta área, certamente,<strong>de</strong>ve continuar <strong>de</strong>fi nindo a profi ssão para o público exter<strong>no</strong> e se constituir emforte pólo <strong>de</strong> atração para os que buscam a profi ssão (algo compatível com oconjunto <strong>de</strong> valores expressos <strong>no</strong>s motivos <strong>de</strong> escolha da Psicologia, como vimosanteriormente).Relações <strong>de</strong> trabalho e carga horáriaCoerente com o predomínio visível da clínica, criou-se uma imagem daPsicologia como uma profi ssão liberal; os dados obtidos, e apresentados nas trêsáreas que absorvem o maior contingente <strong>de</strong> psicólogos, mostram uma realida<strong>de</strong>um pouco diferente.


238 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Mesmo na área clínica, aproximadamente, apenas a meta<strong>de</strong> dospsicólogos trabalha como autô<strong>no</strong>mos. Este índice cai, signifi cativamente,nas áreas escolar e organizacional. Consi<strong>de</strong>rando-se toda amostra, o trabalhoautô<strong>no</strong>mo participa com 41,3% dos casos, enquanto a existência <strong>de</strong> algumvínculo empregatício caracteriza 51,8% dos trabalhos em Psicologia.Quanto à carga horária <strong>de</strong> trabalho, encontramos dados que diferenciamas áreas <strong>de</strong> atuação e a natureza do vínculo empregatício. Assim, a média <strong>de</strong> horas<strong>de</strong> trabalho por semana é superior entre os empregados e servidores estatutários(34 horas), o que caracteriza o trabalho, por exemplo, na área organizacional.Esta média cai para 14 horas entre os autô<strong>no</strong>mos que, em gran<strong>de</strong> parte, selocalizam na área clínica. Comparados com a realida<strong>de</strong> das outras profi ssões,PASQUALI (1988) conclui que a <strong>no</strong>ssa carga horária semanal média <strong>de</strong> trabalhoé “visivelmente inferior à média das profi ssões em geral <strong>no</strong> País” (p. 157), pois,segundo dados do IBGE, em 1985, <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, 80,8% dos trabalhadores tinham umencargo <strong>de</strong> trabalho igual ou superior a 40 horas semanais. Tal discrepância po<strong>de</strong>ser compreendida sob dois pontos <strong>de</strong> vista: como um traço do caráter femini<strong>no</strong>da <strong>no</strong>ssa profi ssão (a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> tempo parcial) ou como umafragilida<strong>de</strong> do mercado <strong>de</strong> trabalho, que impele o psicólogo a combinar trabalhosem locais e áreas diferentes para complementação dos seus rendimentos.Locais <strong>de</strong> trabalhoAs clínicas e consultórios psicológicos são, indiscutivelmente, os locaison<strong>de</strong> mais se concentra o trabalho do psicólogo... seja para ali <strong>de</strong>senvolverem suasativida<strong>de</strong>s principais ou complementares (SASS, 1988, p. 206). Consi<strong>de</strong>rando-sea amostra global, o consultório atinge 34,2% dos locais <strong>de</strong> trabalho, vindo, aseguir: empresas (14,8%), escolas até o 2º grau (10,4%), instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>e pesquisa (8,5%), hospitais (7,8%), instituições <strong>de</strong> atendimento psicológico(5,9%), órgãos da administração (4,5%).


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional239Evi<strong>de</strong>ntemente, há uma forte associação entre área/ativida<strong>de</strong> e locais<strong>de</strong> trabalho. Assim, 2/3 dos que atuam em clínica trabalham em consultórios ouhospitais; idêntico índice <strong>de</strong> psicólogos organizacionais trabalha em empresasou órgãos públicos. Alguns dados, entretanto, merecem <strong>de</strong>staque: o consultórioé o terceiro local mais freqüente entre os psicólogos organizacionais (8,7%) e osegundo na área escolar (16,2%). A reduzida <strong>de</strong>marcação entre as áreas clínica eescolar ressalta-se ao verifi carmos que a escola é o terceiro local <strong>de</strong> trabalho maiscitado entre os psicólogos clínicos (7,2%).A discussão do local <strong>de</strong> trabalho é importante por tangenciar a questãoda <strong>de</strong>mocratização dos serviços do psicólogo. Há, <strong>de</strong> fato, uma reduzida inserçãodo psicólogo <strong>no</strong>s serviços públicos – o po<strong>de</strong>r público (municipal, estaduale fe<strong>de</strong>ral) mantém, apenas, cerca <strong>de</strong> 26% dos psicólogos que <strong>de</strong>claram atuarprofi ssionalmente (SASS, 1988 p. 211). As fi guras 5 e 6 mostram, comparandoas diversas regiões, como se dá a inserção do psicólogo <strong>no</strong> setor público nasáreas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e educação. No Rio e em São Paulo, encontramos um índiceligeiramente superior à média nacional <strong>de</strong> 10% <strong>de</strong> trabalhos em postos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>,ambulatórios e hospitais, nestas mesmas regiões, entretanto, encontramostambém os maiores índices <strong>de</strong> trabalho em consultórios particulares. O trabalhoem instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> público absorve apenas 34,5% dos que atuam naárea escolar, revelando-se me<strong>no</strong>r, ainda, <strong>no</strong>s CRPs-03 (26,3%), 06 (28,6%) e 02(29,0%). Embora a questão da <strong>de</strong>mocratização seja bem mais complexa, não<strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser preocupante a constatação <strong>de</strong> que os serviços do psicólogo chegam,prepon<strong>de</strong>rantemente, ainda hoje, a parcelas privilegiadas da população (queestuda em escolas particulares ou po<strong>de</strong> freqüentar consultórios particulares).Romper o elitismo da profi ssão requer, certamente, medidas <strong>de</strong> amplo espectroque passam pela formação <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos profi ssionais e pela luta por políticaspúblicas para a área social que privilegiem o atendimento global dos indivíduose suas múltiplas necessida<strong>de</strong>s.


240 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional241Ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidasNa fi gura 7, encontramos as ativida<strong>de</strong>s mais freqüentemente<strong>de</strong>senvolvidas pelo psicólogo.A psicoterapia individual foi citada por 42,9% dos entrevistados, sendoesta ativida<strong>de</strong> exercida por 68,5% dos que atuam em clínica. A aplicação <strong>de</strong>testes é a segunda mais freqüente (33,5%) e aparece como uma ativida<strong>de</strong> quepermeia todas as áreas <strong>de</strong> atuação, chegando a atingir 48% dos que trabalhamem organizacional. Olhando-se a fi gura fi ca visível o peso <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s que,tradicionalmente, <strong>de</strong>fi nem o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atuação do psicólogo. A ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>mensuração <strong>de</strong> características psicológicas (seja para a intervenção clínica, paraseleção <strong>de</strong> pessoal ou aconselhamento psicopedagógico) parece ter o núcleobásico da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> profi ssional, ainda hoje. Todavia, como assinala CARVALHO(1988), “há sinais, embora ainda numericamente inexpressivos, <strong>de</strong> umatendência à diversifi cação da atuação” (p. 235). Uma série <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s foi citadapor profi ssionais que se formaram mais recentemente a exemplo <strong>de</strong>: orientação agestantes, pesquisas <strong>de</strong> mercado, diagnóstico situacional, assistência a pacientesclínicos e cirúrgicos, orientação sexual (a partir <strong>de</strong> 1971) ou, criação publicitária,estimulação precoce, planejamento <strong>de</strong> políticas educacionais (a partir <strong>de</strong> 1975).


242 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional243Orientação teórico metodológicaA fragmentação da Psicologia, enquanto área <strong>de</strong> conhecimento, refl etese,inevitavelmente, na atuação profi ssional. Questionados acerca <strong>de</strong> queorientação teórica fundamentava o seu trabalho, os psicólogos posicionaram-secomo se vê na fi gura 8 que expressa os dados da primeira orientação citada pelossujeitos.O predomínio da psicanálise, como esperado, é inquestionável, <strong>no</strong> geral,aparece com 37,1% das citações, sendo a orientação mais citada em todas as áreas<strong>de</strong> atuação – em clínica, atinge 57,7%, caindo para 30,9% em escolar e 22,0% emorganizacional. A hegemonia da psicanálise manifesta-se em todas as regiões doPaís, sendo especialmente forte <strong>no</strong>s CRPs 05 e 07 on<strong>de</strong>, respectivamente, 66,8e 68,3% dos psicólogos, nela, se fundamentam. Em contrapartida, mesmo semper<strong>de</strong>r a condição <strong>de</strong> orientação predominante, ela é me<strong>no</strong>s citada em Brasília(31,1%) e <strong>no</strong> CRP-02 (34,0%). A análise do comportamento e a fe<strong>no</strong>me<strong>no</strong>logiavêm a seguir, com, respectivamente, 8,7 e 6,8% das opções. A análise docomportamento é a segunda orientação mais citada nas três principais áreas (emclínica atinge apenas 6,5%, crescendo para 11,9% em escolar e para 14,9% emorganizacional) e em três regiões: CRP-08 (28%), <strong>no</strong> CRP-06 (20,0%) e o CRP-03 (16,2%). A fe<strong>no</strong>me<strong>no</strong>logia revela-se mais forte entre os psicólogos clínicose é a segunda orientação mais citada em todas as cinco regiões restantes. Agestalt é a terceira orientação predominante na clínica e <strong>no</strong>s CRPs-01-02 e 04.O psicodrama e a abordagem humanística / existencialista alternam, nas diversasregiões, a quarta e quinta colocações como orientações citadas e aparecem, commaior força, entre os psicólogos clínicos. Como abordagens mais específi cas <strong>de</strong>uma área <strong>de</strong> atuação aparece, em escolar, a orientação piagetiana (7,1%) e, emorganizacional, o conjunto <strong>de</strong> pressupostos agrupados sob o rótulo <strong>de</strong> recursoshuma<strong>no</strong>s (9,3%).


244 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Três fatos chamam a atenção e requerem refl exão futura: (a) a pulverização<strong>de</strong> respostas (veja que 19,1% <strong>de</strong>las estão na categoria outras que consiste <strong>de</strong> umaglomerado e<strong>no</strong>rme <strong>de</strong> rótulos, os mais diferentes e que não guardam relaçãocom os gran<strong>de</strong>s sistemas em que se divi<strong>de</strong> a Psicologia, (b) o acentuado número<strong>de</strong> respostas em branco (22,8%) que po<strong>de</strong> signifi car <strong>de</strong>sconhecimento ou falta <strong>de</strong>uma <strong>de</strong>fi nição frente a um aspecto central da ciência e prática psicológicas e, (c)a junção <strong>de</strong> orientações teóricas, incompatíveis em seus pressupostos fi losófi cose metodológicos, por um mesmo profi ssional. Esse aspecto particularmentegrave, revela profundo défi cit da sua formação.Trajetória na profissão – alguns dadosNo levantamento realizado, embora não tenhamos coletado todosos dados da vida profi ssional <strong>de</strong> cada psicólogo, caracterizamos a sua atuaçãoem dois momentos: o primeiro emprego e os empregos atuais. Os dados que


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional245apresentamos anteriormente referem-se à situação atual. Comparando-se,todavia, estes dois momentos, po<strong>de</strong>mos observar algumas tendências que serão,sumariamente, apontadas a seguir.• quanto à área <strong>de</strong> atuação: cresce bastante o número <strong>de</strong>trabalhos na área da docência, na sua maioria, como algo complementar. Aclínica revela gran<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> atração, pois per<strong>de</strong> poucos profi ssionais queingressam nesta área e recebe um gran<strong>de</strong> contingente dos que <strong>de</strong>ixam as <strong>de</strong>maisáreas, especialmente a organizacional e a escolar. Estas áreas, na realida<strong>de</strong>, nãoexperimentam um crescimento entre o primeiro emprego e o atual (o índice daárea organizacional mantém-se estável e, em escolar, há uma pequena redução).• quanto às relações <strong>de</strong> trabalho: o crescimento da área clínicavem acompanhado do crescimento <strong>de</strong> diversas características do trabalhoassociadas a esta área <strong>de</strong> atuação. Assim, cresce o percentual <strong>de</strong> autô<strong>no</strong>mos e<strong>de</strong>cresce o número <strong>de</strong> empregados; aumenta o contingente dos que conseguiramo trabalho investindo recursos próprios, diminuindo formas <strong>de</strong> concurso ouseleção.• quanto às ativida<strong>de</strong>s: entre o primeiro trabalho e os trabalhosatuais verifi ca-se uma tendência <strong>de</strong> redução da diversifi cação das ativida<strong>de</strong>sou uma especialização. Isto po<strong>de</strong> refl etir, segundo CARVALHO (1988), umaconcentração em ativida<strong>de</strong>s mais valorizadas, por qualquer motivo, ou a maiorconcentração na área clínica. Observou-se, por exemplo, que cresceram as citaçõesdas psicoterapias (inclusive <strong>de</strong> casal, família) e diminuíram, signifi cativamente, aaplicação <strong>de</strong> teste (quase 20%), o aconselhamento psicológico e o atendimentoa crianças com distúrbios <strong>de</strong> aprendizagem. Na área organizacional, diminuírama seleção, recrutamento e acompanhamento <strong>de</strong> pessoal, tendo crescido o índice<strong>de</strong> planejamento e execução <strong>de</strong> projetos ou a ocupação <strong>de</strong> cargos <strong>de</strong> direção.A formação profissional – como os psicólogos a avaliamCurso <strong>de</strong> graduaçãoUma crescente preocupação com o nível dos conhecimentos adquiridosdurante a graduação tem tomado conta dos <strong>de</strong>bates ocorridos <strong>no</strong>s Encontros,Congressos e Reuniões <strong>de</strong> Psicologia dos últimos a<strong>no</strong>s. Esta pesquisa do CFP


246 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>apresentou aos entrevistados 14 questões, para que estes se posicionassem,<strong>sobre</strong> os níveis <strong>de</strong> conhecimentos e habilida<strong>de</strong>s adquiridos durante a graduação.Os temas abordados preten<strong>de</strong>ram avaliar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a infl uência da formaçãohumanística e biológica, dos conteúdos dos processos psicológicos básicos,das disciplinas técnica-instrumentais, da formação em pesquisa científi ca, daspráticas <strong>no</strong>s estágios profi ssionalizantes até a infl uência que a realida<strong>de</strong> sócioeconômica,na qual o psicólogo atua, tem <strong>sobre</strong> a sua prática profi ssional.Os Currículos <strong>de</strong> Psicologia foram elaborados com o objetivo <strong>de</strong>formar indivíduos com um certo nível <strong>de</strong> conhecimento genérico em temaspsicológicos, com uma razoável formação metodológica e com alguma habilida<strong>de</strong>técnica para auxiliar na intervenção. No entanto, ao analisarmos as respostasdos <strong>no</strong>ssos entrevistados verifi camos que, <strong>no</strong> que se refere à fundamentaçãofi losófi ca, metodológica e científi ca, mais <strong>de</strong> 50% <strong>de</strong>les estão insatisfeitos comos conhecimentos adquiridos na graduação e este índice aumenta para 64,4%quando se refere à experiência científi ca. Weber (1985), ao analisar o CurrículoMínimo, <strong>no</strong> que se refere à formação científi ca, afi rma que não se trata <strong>de</strong>introduzir ou re<strong>de</strong>fi nir disciplinas e/ou matérias <strong>no</strong> Currículo Mínimo quevenham a favorecer a formação científi ca, mas o mais importante seria repensar aestruturação do Curso <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> tal forma que se permitisse ao estudante asua participação em um processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> conhecimento em realização,<strong>no</strong> Departamento em que está inscrito.Quanto às ciências que fundamentam a Psicologia (Biologia, Sociologia,Antropologia etc) 41,7% <strong>de</strong>clararam ter sido insufi cientes os conhecimentosadquiridos na graduação. Já, 52,8% disseram ter adquirido sufi cientesconhecimentos teóricos dos processos psicológicos básicos (cognição, percepção,<strong>de</strong>senvolvimento, socialização, afetivida<strong>de</strong>, etc).As áreas <strong>de</strong> conhecimento que se referem à atuação clínica mostraramum índice um pouco mais elevado <strong>de</strong> sufi ciência, ou seja, 46,8% enten<strong>de</strong>ramter adquirido sufi ciente conhecimento e domínio <strong>de</strong> técnicas <strong>de</strong> observação<strong>de</strong> comportamentos; 47% estão satisfeitos quanto aos seus conhecimentos emtestes psicológicos; 44% disseram ter conhecimento e domínio <strong>de</strong> técnicas <strong>de</strong>entrevistas e 48,3% tiveram sufi ciente prática <strong>de</strong> Psicologia Clínica, dado coerente


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional247com o encontrado por Carvalho (1984-b) que, pesquisando modalida<strong>de</strong>salternativas <strong>de</strong> trabalho para psicólogos recém-formados, relata que 66% dosentrevistados indicaram a área clínica como sendo a área <strong>de</strong> atuação em queforam melhor preparados durante o seu curso <strong>de</strong> graduação. Mais da meta<strong>de</strong>(54,4%) dos sujeitos afi rmaram ter adquirido consciência <strong>de</strong> problemas éticosna prática da Psicologia, durante o curso, porém uma parcela equivalente (52%)disse que teve insufi ciente conhecimento <strong>sobre</strong> a realida<strong>de</strong> sócio-econômicana qual o psicólogo atua e também pouco apren<strong>de</strong>u <strong>sobre</strong> o papel social <strong>de</strong>steprofi ssional. Estes dados <strong>no</strong>s levam a concordar integralmente com Carvalho(1984) quando diz que a atual formação em Psicologia não transmite ao alu<strong>no</strong> –ou não o leva a elaborar – um conceito amplo <strong>de</strong> atuação psicológica; parece-<strong>no</strong>sque não estamos formando profi ssionais capazes <strong>de</strong> construir a Psicologia, masapenas a <strong>de</strong> repeti-la. Em alguns casos, po<strong>de</strong>ríamos dizer que o estudante apenasapren<strong>de</strong> técnicas e busca o cliente para aplicá-las.Os conhecimentos práticos (em estágios) na área escolar e naárea organizacional foram avaliados como insufi cientes por 47,1% e 48,9%,respectivamente, dos entrevistados. É evi<strong>de</strong>nte que existe, na maioria dos <strong>no</strong>ssoscurrículos, uma preferência por disciplinas clínicas em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> disciplinasda área escolar ou organizacional. A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> disciplinas voltadas, direta ouindiretamente, para o exercício profi ssional nestas duas áreas é extremamentelimitada. Em média 22% dos entrevistados respon<strong>de</strong>ram “em dúvida” diante dasquestões formuladas.Ensi<strong>no</strong> Público versus Particular. A proliferação <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> Psicologiaem todo o País, principalmente <strong>de</strong> escolas particulares, levou-<strong>no</strong>s a buscarpossíveis diferenças entre as Universida<strong>de</strong>s Públicas e as Faculda<strong>de</strong>s Particulares.Existem 56 cursos <strong>de</strong> Psicologia em Faculda<strong>de</strong>s Particulares (incluindo as PUCs)e 25 cursos em Universida<strong>de</strong>s Públicas, ou seja, 70% do ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong> Psicologiado País estão concentrados nas Faculda<strong>de</strong>s Particulares. Verifi camos que estasdiferenças não são muito contun<strong>de</strong>ntes, pois dos 14 quesitos estudados, emapenas 4 <strong>de</strong>les apareceram diferenças estatisticamente signifi cativas. Em doiscasos, Conhecimentos Metodológicos e Processos Psicológicos básicos, ossujeitos formados pelas Escolas Particulares avaliaram seus conhecimentos mais


248 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>favoravelmente dos que os formados em Instituições Públicas. Em contrapartida,a avaliação <strong>sobre</strong> a Atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> Investigação Científi ca e Experiência em PesquisaPsicológica foi mais positiva entre os egressos das Instituições Públicas.Ao longo dos a<strong>no</strong>s: Satisfação ou Insatisfação? Com a fi nalida<strong>de</strong> <strong>de</strong>avaliar se a formação oferecida pelos cursos <strong>de</strong> graduação melhorou, permaneceuinalterada ou piorou, ao longo dos 25 a<strong>no</strong>s passados, agrupamos os sujeitos em 4níveis, <strong>de</strong> acordo com os respectivos a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> formação, a saber: nível 1, até 1969;nível 2, <strong>de</strong> 1970 a 1975; nível 3, <strong>de</strong> 1975 a 1980 e nível 4, após 1980. Discute-semuito <strong>no</strong> meio acadêmico <strong>sobre</strong> a qualida<strong>de</strong> da formação, enfatizando-se que naúltima década o nível do ensi<strong>no</strong> tem sofrido um sério prejuízo. De uma maneirageral, não observamos nenhuma diferença entre o ensi<strong>no</strong> até 1975. As principaisdiferenças são encontradas quando comparamos o nível 3 com o 4. A tendênciados dados indica uma clara insatisfação com a formação na década <strong>de</strong> 80, <strong>no</strong>que se refere aos Conhecimentos Filosófi cos, aos Conhecimentos das CiênciasBásicas e às Técnicas <strong>de</strong> Entrevistas. Os sujeitos formados entre 1975 e 1980 sãoos mais satisfeitos com o seu Conhecimento e Domínio <strong>de</strong> Testes Psicológicos. AAtitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> Investigação Científi ca <strong>de</strong>senvolvida através dos cursos <strong>de</strong> graduaçãosofreu uma queda na avaliação da sua qualida<strong>de</strong> a partir <strong>de</strong> 1975. Isto se <strong>de</strong>veriaàs crescentes difi culda<strong>de</strong>s que as Instituições <strong>de</strong> Ensi<strong>no</strong> vêm enfrentando?Todavia, tanto a Prática Clínica como a Prática Escolar foram avaliadas <strong>de</strong> maneiramais positiva pelos formados na década <strong>de</strong> 80. Sabemos que a área <strong>de</strong> atuaçãopreferida pelos psicólogos é a Clínica e que a Docência é a área mais escolhidacomo segunda opção, <strong>de</strong> tal forma que os Psicólogos clínicos – docentes estariampassando seus conhecimentos e habilida<strong>de</strong>s com maior efi ciência à medida queesta área <strong>de</strong> atuação vem se fi rmando ao longo dos últimos a<strong>no</strong>s.A formação complementarA necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação complementar foi largamente apontadapelos psicólogos. Mais <strong>de</strong> 95% dos entrevistados revelaram que, para oseu exercício profi ssional após a graduação, tiveram que recorrer a formascomplementares <strong>de</strong> formação (cursos, estágios, terapias etc). A necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>aprofundar a “experiência prática” foi a mais apontada nas diversas áreas <strong>de</strong>


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional249atuação, especialmente na clínica. Nas <strong>de</strong> conhecimentos teóricos e domínio dastécnicas não se observam diferenças entre os psicólogos das diversas áreas.Langenbach e Negreiros (1988), ambas psicoterapeutas, fi zeram umaanálise bastante consistente da trajetória percorrida pelo psicólogo durante eapós a formatura. As autoras chamam atenção para a abrangência e complexida<strong>de</strong><strong>de</strong>sta caminhada, mostrando que esta não se limita à aquisição contínua do saber,mas também envolve um permanente aperfeiçoamento da própria personalida<strong>de</strong>,que é promovido basicamente pelas psicoterapias. Neste trabalho, realizadona cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong> Janeiro, as autoras verifi caram que 79,5% dos psicólogossubmetem-se e/ou submeteram-se a algum tipo <strong>de</strong> tratamento psicológico.Fazendo parte do percentual, inclusive, profi ssionais não empregados (20%)e subempregados (50%). O fracasso profi ssional é atribuído, muitas vezes, adifi culda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caráter emocional, já que é consensual que sua personalida<strong>de</strong> éseu principal instrumento <strong>de</strong> trabalho. O tempo gasto nas psicoterapias está nafaixa <strong>de</strong> 1 a 5 a<strong>no</strong>s, salientando-se que 30% da amostra fazem terapia <strong>de</strong> longaduração (+ <strong>de</strong> 5 a<strong>no</strong>s). A orientação teórica predominante nas psicoterapias é apsicanalítica (70%).Salientam, também, que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o ingresso do alu<strong>no</strong> na faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong>Psicologia, a mensagem da formação complementar lhe é passada, apontandopara além dos muros universitários, tornando a Universida<strong>de</strong> esvaziada, poisesta passa a ser percebida com uma “efêmera passagem”, com o objetivoprecípuo <strong>de</strong> titulação, já que não tem compromisso “real” com a formaçãodo estudante. Existe, por parte do alu<strong>no</strong> ou recém-formado, a expectativa <strong>de</strong>um espaço protetor, pelo pertencimento a um grupo que legitime o exercícioprofi ssional. Pertencer a uma organização com características corporativasremete à segurança em vários pontos: <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a obtenção <strong>de</strong> um respaldo teóricocom uma abordagem já procurada por i<strong>de</strong>ntifi cação; passando pelo compartilhar<strong>de</strong> angústias profi ssionais vividas a um nível técnico, através <strong>de</strong> supervisões;até a expectativa <strong>de</strong> reconhecimento profi ssional por certos pares especiais(terapeuta, supervisor, coor<strong>de</strong>nador), que po<strong>de</strong>rão signifi car encaminhamento<strong>de</strong> clientela. De tal maneira que quase não se formam grupos <strong>de</strong> colegas paraestudo, supervisão e discussões gerais: tornando-se sempre necessário a fi gura


250 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong><strong>de</strong> um saber-po<strong>de</strong>r maior que orientará os trabalhos <strong>de</strong>senvolvidos, cobrando,quase sempre, ho<strong>no</strong>rários altos, muitas vezes em dólares.Para o exercício da clínica, afi rmam Langenbach e Negreiros, énecessário, tanto para os estudantes como para os recém-formados, e até paraos antigos profi ssionais, seguir um ritual que incluirá: grupos <strong>de</strong> estudo Freu<strong>de</strong> Lacan “sine que <strong>no</strong>n”; estágios – sem remuneração, já que estão formados,restando o consolo da gratifi cação por conta da aprendizagem e do seu usofuturo; supervisões – individuais e em grupos; além <strong>de</strong> seminários, encontros,jornadas, maratonas, congressos em número nunca dantes existentes –oportunida<strong>de</strong>s pouco exigentes (a não ser fi nanceiramente) <strong>de</strong> se obter contatosprofi ssionais e <strong>de</strong> se mostrar atualização. Esta prática mantém a categoria presaa um compromisso elitista e o psicólogo passa a ser constante consumidor <strong>de</strong>serviços psicológicos – o que representa, em gran<strong>de</strong> parte, um mercado <strong>de</strong>trabalho autofágico.Para manter todo o peso <strong>de</strong> sua formação e as incertezas inerentes aoexercício liberal, sem garantias trabalhistas, dizem Langenbach e Negreiros, senteseo profi ssional autorizado e legitimado a cobrar altos ho<strong>no</strong>rários, reajustáveis<strong>de</strong> acordo com o ritmo infl acionário. Outro aspecto problemático é a práticada redução <strong>de</strong> ho<strong>no</strong>rários em troca da não <strong>de</strong>claração dos serviços ao Imposto<strong>de</strong> Renda. Embora esta prática seja generalizada também por outras categorias,como médicos, <strong>de</strong>ntistas, advogados, etc., ela tem co<strong>no</strong>tações específi cas em setratando <strong>de</strong> uma psicoterapia, po<strong>de</strong>ndo constituir-se num fator comprometedorda confi ança <strong>de</strong>sejável na relação terapeuta-cliente. As autoras terminam o textoafi rmando que provavelmente o País, diante do atual pa<strong>no</strong>rama, não permitirá a“recompensa merecida” pela “eterna formação”.A avaliação do exercício profissionalInteressou-<strong>no</strong>s também saber como os psicólogos avaliam sua profi ssãoquanto ao “status” que ela tem junto à comunida<strong>de</strong>; quanto às difi culda<strong>de</strong>s queo psicólogo encontra para o seu exercício profi ssional e quanto aos <strong>de</strong>sejos quea categoria tem em mudar <strong>de</strong> profi ssão, <strong>de</strong> área <strong>de</strong> atuação ou <strong>de</strong> emprego.Borges-Andra<strong>de</strong> (1988) analisou com precisão as respostas dadas pelacategoria na pesquisa do CFP. O “status” da profi ssão dos psicólogos, segundo


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional251o autor, não é muito elevado, embora os profi ssionais acreditem que suaimportância ou relevância para a comunida<strong>de</strong> ainda seja bem maior do que aremuneração e os recursos <strong>de</strong> que dispõem para atuar. Na área organizacional,a situação fi nanceira é mais bem avaliada, enquanto na comunitária e escolar,ela é julgada mais negativamente. As opiniões mais otimistas <strong>sobre</strong> o “status”encontram-se entre os pesquisadores, especifi camente <strong>no</strong> que concerne àcredibilida<strong>de</strong>, importância, relevância e prestígio <strong>de</strong> sua profi ssão. No Rio<strong>de</strong> Janeiro estão concentradas as pessoas com uma visão mais pessimista, asaber: baixa disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recursos, ina<strong>de</strong>quação da remuneração, baixacredibilida<strong>de</strong> da profi ssão junto a outros profi ssionais e pouca importânciaatribuída pela comunida<strong>de</strong> à profi ssão; enquanto que <strong>no</strong>s Estados do Sul doPaís, encontram-se as avaliações mais positivas: maior prestígio e credibilida<strong>de</strong> daprofi ssão junto à comunida<strong>de</strong>, bem como remuneração mais a<strong>de</strong>quada.As difi culda<strong>de</strong>s <strong>no</strong> exercício profi ssional que têm intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ocorrência mais elevada são as provocadas pela política sócio-econômica do Paíse as relacionadas ao <strong>de</strong>sconhecimento, por outros profi ssionais, da contribuiçãoque o psicólogo po<strong>de</strong> oferecer. Talvez sintomaticamente, diz o autor, ambasrefi ram-se a atribuições <strong>de</strong> causas externas aos psicólogos.Apesar dos problemas apontados, não se verifi ca, como se vê na fi gura9, um elevado índice <strong>de</strong> profi ssionais que <strong>de</strong>sejam mudar <strong>de</strong> profi ssão (5,6%).A insatisfação com a profi ssão revela-se um pouco maior exatamente naquelasregiões que apresentam maior índice <strong>de</strong> <strong>de</strong>semprego e baixa remuneração(CRP-02, 04, 05 e 06). Observa-se, também, que a insatisfação é mais quanto aoemprego (média nacional <strong>de</strong> 25,2%, sendo maior <strong>no</strong> CRP-02 e 04) e a área <strong>de</strong>atuação (média <strong>de</strong> 13,6%, sendo mais expressivas <strong>no</strong> CRP-03 que apresenta umdos mais altos índices <strong>de</strong> psicólogos atuando na área organizacional).Dentre aqueles que querem mudar <strong>de</strong> profi ssão as razões dadas commaior freqüência para mudança são as <strong>de</strong> natureza econômica e <strong>de</strong> remuneração;em seguida vêm as razões psicológicas e <strong>de</strong> insatisfação com as característicassociais da profi ssão e, por último, aparece os interesses por outras profi ssões e asrazões <strong>de</strong> mercado e oportunida<strong>de</strong>s. Os mais <strong>de</strong>scontentes com seus empregos,embora sejam os que me<strong>no</strong>s <strong>de</strong>sejam mudar <strong>de</strong> área <strong>de</strong> atuação e profi ssão, são


252 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>os da área comunitária. Parece que existe uma clara opção (ou contentamento)dos psicólogos comunitários pelo que fazem, embora <strong>de</strong>sejassem fazê-lo emoutro emprego, é também nesta área que estão os maiores problemas com a falta<strong>de</strong> preparo específi co do psicólogo para aten<strong>de</strong>r as <strong>de</strong>mandas sociais. Os maissatisfeitos com seus empregos são os das áreas <strong>de</strong> pesquisa e docência. Po<strong>de</strong>ser que, <strong>de</strong>vido ao papel especial (mística?) que a população em geral atribui àpesquisa, os profi ssionais <strong>de</strong>sta área tendam a generalizar que a profi ssão comoum todo <strong>de</strong>sfrute <strong>de</strong> igual nível <strong>de</strong> “status”. Na área organizacional é que estãoos que mais gostariam <strong>de</strong> mudar <strong>de</strong> área <strong>de</strong> atuação e <strong>de</strong> profi ssão, mas não<strong>de</strong> seus empregos, pois é nela que se sente, com me<strong>no</strong>r intensida<strong>de</strong>, a falta <strong>de</strong>estabilida<strong>de</strong> profi ssional.Esta é a área em que a discriminação sexual foi percebida como umadifi culda<strong>de</strong> maior; e é também nesta área que são mais intensas as críticas àomissão <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s sindicais, associações e conselhos nas reivindicações dacategoria.


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional253ConclusãoTalvez este diagnóstico não agra<strong>de</strong> a maioria dos psicólogos eprofi ssionais responsáveis pela sua formação – os docentes. No entanto, estesdados <strong>de</strong>verão servir para respaldar as atitu<strong>de</strong>s daqueles que, com mais entusiasmoe competência, lutam por um Ensi<strong>no</strong> <strong>de</strong> Psicologia <strong>de</strong> melhor qualida<strong>de</strong>, poisatitu<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scompromissadas ou negligentes não po<strong>de</strong>rão mais ser, como atéentão o foram, atribuídas à ig<strong>no</strong>rância dos fatos. Embora preocupante, estediagnóstico <strong>de</strong>verá propiciar condições para análises, discussões e sugestõesimportantes, pois enxergar melhor a realida<strong>de</strong> favorece, sem dúvida alguma, aescolha dos caminhos mais a<strong>de</strong>quados para assegurar, <strong>no</strong> futuro, a qualida<strong>de</strong> doEnsi<strong>no</strong> da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.ClínicaQuadro 1ÁREAS RELAÇÕES DE TRABALHO CARGA HORÁRIAAutô<strong>no</strong>moEmpregado (CLT)53,2%31,1%Até 8h –24,9%Até 24h – 48,8%Até 40 horas ou mais – 26,3%EscolarEmpregado (CLT)Autô<strong>no</strong>moServidor43,9%27,2%18,7%Até 8h – 21,3%Até 24h – 46,1%Até 40horas ou mais – 32,6%OrganizacionalEmpregadoAutô<strong>no</strong>mo72,3%15,3%Até 8h – 17,2%Até 24h – 19,6%Até 40 horas ou mais – 63,2%Mais <strong>de</strong> 40 horas – 16,5%Referências BibliográficasBASTOS A.V.B. – Área <strong>de</strong> atuação: em questão o <strong>no</strong>sso mo<strong>de</strong>lo profi ssional. In:Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. Quem é o psicólogo brasileiro. São Paulo:Edicon, 1988, cap. 10, p. 163-193.BORGES-ANDRADE. J.E. – Avaliação do Exercício Profi ssional. In: ConselhoFe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. Quem é o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro. São Paulo: Edicon,1988, cap. 14, p. 252-272.


254 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>CARVALHO, A.A. Olian, A.L. Bastos, A.V.B., Sodré, L.G., Cavalcante, M.L.P. Aescolha da profi ssão: alguns valores implícitos <strong>no</strong>s motivos apontados pelospsicólogos. Quem é o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro? S. Paulo: Edicon, 1988 cap. 3, p.49-68.CARVALHO. A.M.A. – A profi ssão em perspectiva. Psicologia, 1982. 8 (2).CARVALHO, A.M.A. – Modalida<strong>de</strong>s alternativas <strong>de</strong> trabalho para psicólogosrecém-formados. Ca<strong>de</strong>r<strong>no</strong>s <strong>de</strong> Análise do Comportamento, 1984-b, 6, 1-14.CARVALHO. A.M.A. – “Atuação Psicológica” Alguns elementos para uma refl exão<strong>sobre</strong> os rumos da profi ssão e da formação. Psicologia Ciência e Profi ssão1984, (2).CARVALHO. A.M.A. – Atuação Psicológica: uma análise das ativida<strong>de</strong>s<strong>de</strong>sempenhadas pelos Psicólogos. In: Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. Quemé o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro. São Paulo: Edicon, 1988. Cap. 12, p. 217-235.D’AMORIM. M.A. – Emprego e Desemprego. In: Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia.Quem é o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro. São Paulo: Edicon, 1988, cap. 8, p. 138-148.GOMIDE, P.I.C. – A Formação Acadêmica: on<strong>de</strong> resi<strong>de</strong>m suas <strong>de</strong>fi ciências? In:Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. Quem é o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro? São Paulo:Edicon, 1988, cap. 4, p. 69-85.LANGENBACH. M. & Negreiros. T.C.G. – A Formação Complementar: umlabirinto profi ssional. In: Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. Quem é o Psicólogo<strong>Brasil</strong>eiro. São Paulo: Edicon, 1988, cap 5. p. 86-99.PASQUALI.L.Condições <strong>de</strong> Trabalho do Psicólogo. In: Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong>Psicologia. Quem é o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro.São Paulo: Edicon, 1988, cap. 9.p. 149-162.PEREIRA S.L.M. A formação profi ssional dos psicólogos: apontamentos para umestudo. Psicologia, 1975, 1.ROSAS,P. & ROSAS, A & Xavier, l.B. – Quantos e quem somos. In: ConselhoFe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. Quem é o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro. São Paulo: Edicon,1988, cap 2, p. 32-48.ROSEMBERG,F.Psicologia, Profi ssão Feminina In: Cad. <strong>de</strong> Pesquisa(47) 32-37 SãoPaulo, <strong>no</strong>v. 83.


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional255– Afi nal, por que somos tantas psicólogas? Psicologia, Ciência e Profi ssão. CFPn° 1/84.SASS, O. – O Campo <strong>de</strong> Atuação Profi ssional do Psicólogo, esse confessormo<strong>de</strong>r<strong>no</strong>. In: Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia. Quem é o Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro.São Paulo: Edicon, 1988, cap 11, p. 194-216.WEBER, S. Currículo Mínimo e o Espaço da Pesquisa na Formação do Psicólogo.Psicologia, Ciência e Profi ssão, 198


CAPÍTULO 13O PSICÓLOGO BRASILEIRO:SUA ATUAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL.O QUE MUDOU NAS ÚLTIMAS DÉCADAS?Antonio Virgílio Bittencourt BastosSonia Maria Gue<strong>de</strong>s GondimJairo Eduardo Borges-Andra<strong>de</strong>O artigo “O psicólogo brasileiro: sua atuação e formação profi ssional”apresentou, <strong>de</strong> forma sintética, os resultados do primeiro estudo <strong>de</strong> abrangêncianacional <strong>sobre</strong> a profi ssão do psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Os a<strong>no</strong>s 1980 foram pródigosem estudos e refl exões <strong>sobre</strong> o exercício da psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Tais refl exões,congruentes com as transformações em curso <strong>no</strong> cenário político do país, tinhamcomo eixo básico a crítica ao caráter elitista ou exclu<strong>de</strong>nte da profi ssão, quer emtermos do vasto contingente da população excluída dos seus serviços, quer emtermos dos mo<strong>de</strong>los teóricos vigentes construídos fora do país e, muitas vezes,pouco sensíveis a elementos importantes da <strong>no</strong>ssa realida<strong>de</strong> cultural.Faltava, <strong>no</strong> entanto, uma visão abrangente da profi ssão e <strong>de</strong> como elase concretizava <strong>no</strong> vasto território nacional. Os estudos eram pontuais e restritosa realida<strong>de</strong>s regionais ou estaduais. Superar essa lacuna foi, talvez, o principalmérito da pesquisa que origi<strong>no</strong>u o livro “Quem é o psicólogo brasileiro?”,publicado em 1988 e que trata, <strong>de</strong> forma bem mais <strong>de</strong>talhada, o conjunto amplo<strong>de</strong> dados que estão resumidos <strong>no</strong> referido artigo.


258 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Os impactos <strong>de</strong>sta pesquisa foram expressivos gerando, <strong>de</strong> imediato,uma <strong>no</strong>va imagem da profi ssão, que em suas linhas gerais apontava na mesmadireção dos estudos anteriores. A pesquisa permitiu conhecer a face da profi ssão<strong>no</strong> país como um todo, já que eram relativamente superfi ciais as variações entreas regiões. O livro passou a ser uma referência importante não só para quem se<strong>de</strong>dicava a estudar a profi ssão, como para a própria formação do alu<strong>no</strong>, peloconjunto amplo <strong>de</strong> questões que, <strong>de</strong> forma crítica e refl exiva, discutiu a partirdos dados analisados.Passaram-se mais <strong>de</strong> vinte a<strong>no</strong>s sem um <strong>no</strong>vo estudo amplo e profundo<strong>sobre</strong> as transformações em curso <strong>no</strong> exercício profi ssional da Psicologia, apesardas evidências que foram acumuladas ao longo do tempo <strong>de</strong> que a profi ssãocrescera bastante e que existiam tendências i<strong>no</strong>vadoras ocorrendo em váriosdos seus domínios. O crescimento dos cursos <strong>de</strong> graduação em Psicologiafoi vertigi<strong>no</strong>so a partir da segunda meta<strong>de</strong> dos a<strong>no</strong>s 1990. Surgiram as <strong>no</strong>vasdiretrizes curriculares em substituição ao currículo mínimo <strong>de</strong> 1962 e uma <strong>no</strong>vageração <strong>de</strong> profi ssionais já ingressa na carreira tendo uma formação estruturadaa partir <strong>de</strong>ste <strong>no</strong>vo marco regulatório. Mesmo assim, não tínhamos um retrato<strong>de</strong>sta <strong>no</strong>va face da profi ssão e sequer sabíamos quão <strong>no</strong>va ela se mostrariaefetivamente.Como uma iniciativa do GT Psicologia Organizacional e do Trabalhoda Anpepp, realizou-se entre 2006 e 2008 uma <strong>no</strong>va pesquisa <strong>sobre</strong> a profi ssãodo psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Agora, além <strong>de</strong> se replicar parte importante do estudoinicialmente conduzido pelo Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Psicologia <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1980, otrabalho foi bem além, investigando a profi ssão a partir <strong>de</strong> várias categorias daPsicologia Organizacional e do Trabalho, compondo um painel ainda mais amploe complexo <strong>sobre</strong> o estado atual do exercício da Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.É com base <strong>no</strong>s resultados <strong>de</strong>sse <strong>no</strong>vo estudo que vamos retomar oartigo <strong>de</strong> 1989, buscando <strong>de</strong>stacar elementos que confi guram permanênciase mudanças <strong>no</strong> exercício profi ssional da psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. No escopo dopresente trabalho, <strong>no</strong>s <strong>de</strong>teremos apenas naquelas dimensões em que é possívelcomparar os resultados dos dois estudos, procurando, sempre que possível,discutir possíveis <strong>de</strong>terminantes das transformações <strong>de</strong>tectadas. Para tanto,


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional. O que Mudou nas Últimas Décadas259organizamos o capítulo em alguns segmentos que reproduzem, na medida dopossível, a estrutura do artigo que sintetizou os resultados da pesquisa <strong>de</strong> 1988.Para cada segmento serão <strong>de</strong>stacadas as principais tendências encontradas napesquisa <strong>de</strong> 2008, naquilo que confi rmam ou alteram a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>scrita duasdécadas atrás.1 O crescimento da profissãoNo fi nal dos a<strong>no</strong>s 1980, chamava atenção o expressivo crescimento doscursos <strong>de</strong> psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> e, em consequência, o aumento da comunida<strong>de</strong><strong>de</strong> psicólogos. Essa realida<strong>de</strong>, todavia, mostrava uma crescente <strong>de</strong>fasagem entreo número <strong>de</strong> psicólogos graduados pelos cursos e aqueles que se inscreviam<strong>no</strong>s Conselhos Regionais, indicador <strong>de</strong> inserção <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> trabalhocomo psicólogo. Questionava-se, então, que fatores explicariam a perda <strong>de</strong>aproximadamente 50% dos psicólogos graduados, apontando para o fato <strong>de</strong> quea escolha do curso <strong>de</strong> psicologia, para muitos, não se associava a um <strong>de</strong>sejo<strong>de</strong> profi ssionalização efetivo. A este fator, restrições do mercado <strong>de</strong> trabalhopo<strong>de</strong>riam estar impedindo que contingente expressivo <strong>de</strong> psicólogos nele seinserisse enquanto psicólogos.A pesquisa atual revela um <strong>no</strong>vo pico <strong>de</strong> crescimento acentuado daprofi ssão, com uma expansão ainda mais vigorosa do número <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong>graduação, agora não concentrados tanto nas capitais. Além do crescimento,verifi ca-se um claro processo <strong>de</strong> interiorização da profi ssão e <strong>de</strong> uma melhordistribuição <strong>no</strong> território nacional. Hoje, o percentual <strong>de</strong> psicólogos atuandoem cida<strong>de</strong>s do interior supera, ligeiramente, o dos que atuam em capitaisdos Estados, confi gurando uma importante mudança na profi ssão, pelo quepossibilita a ampliação da população que po<strong>de</strong> ter acesso aos serviços dapsicologia. Apesar <strong>de</strong> hegemônica, a região Su<strong>de</strong>ste per<strong>de</strong> relativamente suaparticipação <strong>no</strong> conjunto da profi ssão <strong>no</strong> país, com o crescimento do número <strong>de</strong>psicólogos nas regiões Sul, Nor<strong>de</strong>ste, Centro-Oeste e Norte.I<strong>de</strong>ntifi ca-se, ainda, que permanece uma importante <strong>de</strong>fasagem entreo número <strong>de</strong> psicólogos graduados e inscritos <strong>no</strong>s Conselhos. No entanto,a curva que parecia distanciar cada vez mais estas duas condições não revela


260 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>uma aceleração maior dos graduados. Pelo contrário, há sempre uma perda <strong>de</strong>profi ssionais formados que não se inserem <strong>no</strong> mercado, mas também há umcrescimento na mesma proporção <strong>de</strong> inserido. Este é um dado importante quesinaliza uma ampliação constante das oportunida<strong>de</strong>s do mercado <strong>de</strong> trabalhoque, <strong>no</strong> entanto, ainda não absorve todos os profi ssionais egressos do sistema<strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>.2 Características gerais da profissãoO largo predomínio das mulheres entre os profi ssionais da psicologia,o que a caracteriza como uma profi ssão feminina, é um traço marcante daprofi ssão que pouco se alterou ao longo das últimas décadas. As mulherescontinuam representando mais <strong>de</strong> oitenta por cento dos profi ssionais inscritos<strong>no</strong>s Conselhos, assim como são maioria esmagadora <strong>no</strong>s cursos <strong>de</strong> graduação empsicologia. Ao longo do tempo, registra-se um peque<strong>no</strong> acréscimo do número<strong>de</strong> homens, o que não altera o quadro geral. O caráter femini<strong>no</strong> associa-se acaracterísticas do exercício profi ssional – ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> apoio social e a condiçõesmais precárias <strong>de</strong> vínculos empregatícios, tanto em termos <strong>de</strong> regime <strong>de</strong>contratação como <strong>de</strong> remuneração.O contínuo crescimento da profi ssão, com um ingresso cada vez maior<strong>de</strong> jovens profi ssionais, faz com que a ida<strong>de</strong> média e o tempo médio <strong>de</strong> atuaçãoprofi ssional também não tenham se alterado <strong>de</strong> forma signifi cativa nas duaspesquisas. Ainda somos uma profi ssão com um gran<strong>de</strong> predomínio <strong>de</strong> jovensprofi ssionais. Apesar disso, quando comparado com os a<strong>no</strong>s 1980, verifi ca-se umcontingente bem mais expressivo <strong>de</strong> profi ssionais mais maduros e com maiortempo <strong>de</strong> atuação profi ssional.3 Emprego, <strong>de</strong>semprego e remuneraçãoApesar <strong>de</strong> lidarmos com os profi ssionais inscritos <strong>no</strong>s Conselhos, napesquisa dos a<strong>no</strong>s 1980, alguns indicadores apontavam inequívoca fragilida<strong>de</strong>do mercado <strong>de</strong> trabalho, em termos <strong>de</strong> condições oferecidas ao profi ssional.Naquele estudo, aproximadamente 30% dos psicólogos não atuavam <strong>no</strong> campoda Psicologia, quer por estarem <strong>de</strong>sempregados, quer por terem empregos ou


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional. O que Mudou nas Últimas Décadas261trabalhos em outras ocupações. Além disso, apenas 45% dos psicólogos viviamexclusivamente da profi ssão, enquanto 25% tinham que ter uma ativida<strong>de</strong> fora, namaioria dos casos para complementar ou mesmo ter alguma renda. Na pesquisaatual, já encontramos um quadro mais positivo. Cresceu o número <strong>de</strong> psicólogosque atuam na profi ssão, mesmo que tenham <strong>de</strong> conciliar com outras ativida<strong>de</strong>sfora do campo. Cresceu, também, o percentual <strong>de</strong> psicólogos que atuam apenasna psicologia, o que po<strong>de</strong> ser tomado como um importante indicador <strong>de</strong>estruturação das condições <strong>de</strong> trabalho. Mesmo assim, é importante registrara existência <strong>de</strong> quase 16% dos psicólogos que estão excluídos do exercício daprofi ssão, quer por estarem <strong>de</strong>sempregados, quer por exercerem ativida<strong>de</strong>s emoutros campos. Esse resultado é ligeiramente mais positivo do que o encontradona pesquisa dos a<strong>no</strong>s 1980.Quanto aos rendimentos, os dados das duas pesquisas <strong>de</strong>vem sercomparados com bastante cautela, consi<strong>de</strong>rando a distância <strong>no</strong> tempo e asmudanças da eco<strong>no</strong>mia e da moeda nacional. O levantamento atual apresentasinais contraditórios <strong>sobre</strong> a situação <strong>de</strong> remuneração dos psicólogos brasileiros.Por um lado, <strong>de</strong>cresceu o quantitativo <strong>de</strong> psicólogos sem qualquer renda. Poroutro lado, caiu, proporcionalmente, o número <strong>de</strong> psicólogos com renda maiselevada (acima <strong>de</strong> 20 salários mínimos). O dado mais importante, <strong>no</strong> entanto, éque a média salarial nacional dos psicólogos, que era <strong>de</strong> aproximadamente 11salários mínimos na pesquisa dos a<strong>no</strong>s 1980, cai, atualmente, para apenas seissalários mínimos. Apesar <strong>de</strong> os psicólogos ampliarem o seu campo <strong>de</strong> atuaçãoprofi ssional e conseguirem se inserir <strong>no</strong> mercado <strong>de</strong> múltiplas formas, poucosconseguem obter rendimentos mais elevados. Assim, mantém-se o padrão <strong>de</strong>manter vários vínculos <strong>de</strong> trabalho, <strong>de</strong> combinar empregos <strong>de</strong> tempo parciale, para muitos, para combinar o exercício da psicologia com trabalhos fora docampo.4 Áreas <strong>de</strong> atuaçãoOs resultados atuais, embora não revelem gran<strong>de</strong>s alterações em relaçãoao diagnóstico feito <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1980, especialmente <strong>no</strong> que tange ao expressivopeso da área clínica, apontam algumas mudanças que estão confi gurando uma


262 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong><strong>no</strong>va “cara” para a Psicologia brasileira. A primeira <strong>de</strong>las é a emergência <strong>de</strong>uma área, <strong>de</strong><strong>no</strong>minada saú<strong>de</strong>, que não fora contemplada na pesquisa <strong>de</strong> 1988e que, na atual pesquisa, é a segunda área <strong>de</strong> inserção <strong>de</strong> psicólogos. Emboraem muitas ativida<strong>de</strong>s se perceba uma afi nida<strong>de</strong> entre a clínica e a saú<strong>de</strong>, nãose po<strong>de</strong> minimizar o fato <strong>de</strong> que esse <strong>no</strong>vo domínio envolve uma signifi cativaampliação do escopo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s e contextos <strong>de</strong> inserção do psicólogo, nasunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> diferentes níveis <strong>de</strong> atenção, <strong>no</strong>s setores público e privado.A área organizacional e do trabalho cresce um pouco, embora passe a ser aterceira área a absorver mais psicólogos. Há uma expressiva queda <strong>no</strong> percentual<strong>de</strong> psicólogos atuando na área escolar/educacional. Aparecem, embora compercentuais bem reduzidos, as áreas social e jurídica, o que indica a consolidação<strong>de</strong> <strong>no</strong>vos campos <strong>de</strong> atuação profi ssional, muito incipientes na primeira pesquisa.Verifi ca-se, ainda, o crescimento da docência em função da expansão do sistema<strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior <strong>no</strong> país com oferta <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> psicologia.Permanece, todavia, a mesma tendência <strong>de</strong> o psicólogo, em gran<strong>de</strong>proporção, combinar inserções em diferentes áreas da Psicologia. Na realida<strong>de</strong>,essa característica parece aprofundar-se na pesquisa mais recente quandocomparada à primeira, o que po<strong>de</strong> ser tomado como um indicador adicional<strong>de</strong> fragilida<strong>de</strong> do mercado <strong>de</strong> trabalho, levando o psicólogo a ter que possuirvários empregos ou trabalhos. Essa crescente capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o psicólogo transitarpor duas, três ou até mais áreas <strong>de</strong> atuação coloca em pauta a própria discussão<strong>de</strong>sse conceito que historicamente estrutura a forma <strong>de</strong> pensar o <strong>no</strong>sso campoprofi ssional. Em que medida, quando se consi<strong>de</strong>ram as ativida<strong>de</strong>s efetivamente<strong>de</strong>senvolvidas, há limites nítidos entre as diferentes áreas? Isso é bastante claro,por exemplo, na <strong>sobre</strong>posição entre ações <strong>no</strong> campo da saú<strong>de</strong> e na área sociale mesmo entre a saú<strong>de</strong>, a clínica e a própria organizacional e do trabalho coma crescente preocupação com a saú<strong>de</strong> do trabalhador. Apesar <strong>de</strong>sta ampliaçãodas inserções em diferentes áreas, a área organizacional continua sendo aquelaem que há maior percentual <strong>de</strong> <strong>de</strong>dicação exclusiva do profi ssional. Outro dadoimportante é que a docência <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser uma ativida<strong>de</strong> complementar e passaa ser uma área <strong>de</strong> atuação exclusiva para importante contingente <strong>de</strong> psicólogos.


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional. O que Mudou nas Últimas Décadas263É importante <strong>de</strong>stacar neste momento que a i<strong>de</strong>ntifi cação da área <strong>de</strong>atuação na pesquisa recente foi feita a partir da associação entre local <strong>de</strong> trabalhoe ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidas, não sendo, como na anterior, uma informaçãoprestada pelo próprio psicólogo.5 Relações <strong>de</strong> trabalho e carga horáriaUma importante discussão que cercava o exercício profi ssional dapsicologia <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1980 era a disputa entre um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> atuação liberalou autô<strong>no</strong>ma (mais fortemente dominante, inclusive <strong>no</strong> imaginário social, emfunção do peso da ativida<strong>de</strong> clínica) versus o <strong>de</strong> trabalhador assalariado (vistocomo o caminho para tornar a psicologia mais acessível à população). Comorevela o artigo, já <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s <strong>de</strong> 1980, o trabalho autô<strong>no</strong>mo não constituía o padrãodominante entre os psicólogos. Na realida<strong>de</strong>, 41,3% dos profi ssionais atuavamcomo autô<strong>no</strong>mos e 51,8% já possuíam algum vínculo empregatício. Esse quadroparece ter se aprofundado ao longo das últimas décadas, já que na pesquisa maisrecente apenas 28% atuam exclusivamente como autô<strong>no</strong>mos, sendo que 73%possuem algum vínculo assalariado. Para a maioria, o trabalho autô<strong>no</strong>mo pareceser complementar ao trabalho assalariado. Ou seja, os resultados mais recentes<strong>no</strong>s permitem apontar um crescente assalariamento do psicólogo, que se insere<strong>no</strong> serviço público (especialmente em instituições <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>), seguido do setorprivado e, em me<strong>no</strong>r proporção, <strong>no</strong> terceiro setor.Quanto à carga horária semanal <strong>de</strong> trabalho, o quadro varia fortementequando se consi<strong>de</strong>ram os vínculos <strong>de</strong> trabalho e os setores em que se inseremo psicólogo. Esta diversifi cação associa-se, também, ao fato <strong>de</strong> a maioria dospsicólogos conciliarem ao me<strong>no</strong>s dois trabalhos distintos, não sendo raros aquelesque combinam três ou quatro inserções. O quadro revelado pela pesquisa atualnão apresenta gran<strong>de</strong> variação ao da primeira pesquisa apresentado <strong>no</strong> artigo.Nele fi ca evi<strong>de</strong>nte que o trabalho assalariado, especialmente <strong>no</strong> setor público,associa-se a um padrão <strong>de</strong> tempo integral, enquanto o trabalho autô<strong>no</strong>mo era,predominantemente, <strong>de</strong> tempo parcial. Na pesquisa atual, uma das <strong>no</strong>vida<strong>de</strong>s foiinvestigar o que está ocorrendo com o crescimento do terceiro setor e o maior


264 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>número <strong>de</strong> psicólogos inseridos em organizações do terceiro setor. Essa inserçãotem uma natureza complementar, pois aproximadamente 73% dos psicólogospossuem um regime <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> 20 horas semanais.A pulverização <strong>de</strong> vínculos com a combinação <strong>de</strong> vários trabalhos <strong>de</strong>tempo reduzido é, certamente, uma característica reveladora <strong>de</strong> fragilida<strong>de</strong> do<strong>no</strong>sso mercado <strong>de</strong> trabalho. No entanto, é também um indicador da multiplicida<strong>de</strong><strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho que é <strong>de</strong>sejada e mantida pelo psicólogo parapo<strong>de</strong>r exercitar conjuntos <strong>de</strong> competências e objetivos profi ssionais distintos. Ae<strong>no</strong>rme quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalhos na área clínica com cargas horárias reduzidasera na primeira pesquisa, e continua sendo na pesquisa atual, um indicador dopeso <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong> na própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> da categoria.6 Locais <strong>de</strong> trabalhoOs locais <strong>de</strong> trabalho do psicólogo refl etem as mudanças já apontadasquanto às áreas <strong>de</strong> atuação, pela estreita relação que existe entre as duascaracterísticas, sendo o local, muitas vezes um critério básico para <strong>de</strong>fi nição daárea, mais do que as próprias ativida<strong>de</strong>s lá <strong>de</strong>senvolvidas. O consultório continuasendo o espaço mais utilizado <strong>de</strong> trabalho pelo psicólogo, como se <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>do peso com que aparece entre quem atua em diferentes áreas. Como esperado,quase 70% dos psicólogos clínicos trabalham em consultórios próprios oualugados. Além disso, ele é o local <strong>de</strong> trabalho para aproximadamente ¼ dospsicólogos que atuam na área escolar, organizacional, saú<strong>de</strong> e mesmo ensi<strong>no</strong>/docência, algo que já fora i<strong>de</strong>ntifi cado na primeira pesquisa, como está explícito<strong>no</strong> artigo em análise. Em comparação com a pesquisa dos a<strong>no</strong>s 1980, há, todavia,um expressivo aumento do número <strong>de</strong> psicólogos inseridos em unida<strong>de</strong>s dosserviços públicos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> ou instituições privadas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, tais como hospitais.Nos hospitais encontram-se também um expressivo contingente <strong>de</strong> psicólogosque atuam na área organizacional. Finalmente, outro dado que aponta umamudança importante é a queda proporcional <strong>de</strong> psicólogos atuando eminstituições educacionais ou em escolas, mesmo entre aqueles que estão atuandona área educacional.


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional. O que Mudou nas Últimas Décadas2657 Ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidasEm relação às ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidas, o quadro <strong>de</strong>lineado pela maisrecente pesquisa mostra muito mais continuida<strong>de</strong>s do que mudanças em relaçãoao perfi l encontrado <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1980. Apesar das mudanças observadas nas áreas<strong>de</strong> atuação e da diversifi cação <strong>de</strong> campos e locais <strong>de</strong> trabalho ocorridas ao longodas duas últimas décadas, o psicólogo <strong>de</strong>senvolve ativida<strong>de</strong>s muito semelhantes,inclusive aproximando os fazeres <strong>de</strong> diferentes áreas. Este é o caso, por exemplo,das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> avaliação psicológica, psicodiagnóstico e aplicação <strong>de</strong> testes.Embora <strong>de</strong>scritas em níveis <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong> distintos, as três ativida<strong>de</strong>s estãopresentes <strong>no</strong>s mais diversos domínios, inclusive entre os docentes. Mas, a<strong>de</strong>speito <strong>de</strong>sse núcleo comum, é possível i<strong>de</strong>ntifi car também um núcleo <strong>de</strong>ativida<strong>de</strong>s que classicamente <strong>de</strong>fi nem a especifi cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada área <strong>de</strong> atuação.Em linhas gerais, comparando o cenário atual com o do fi nal da década<strong>de</strong> 1980, as mudanças não foram tão signifi cativas. No entanto, elas sinalizamque o psicólogo está atuando para além da clínica e substituindo o mo<strong>de</strong>loclínico <strong>de</strong> atendimento por mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> intervenção grupais com forte ênfasesocial. Consi<strong>de</strong>rando as áreas que mais absorvem os psicólogos brasileiros, aorganizacional e a docência são as que apresentam perfi s mais diferenciados<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s que lhes são específi cas. Entre as áreas clínica, saú<strong>de</strong> e mesmoeducacional há uma similarida<strong>de</strong> muito gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidas,mudando apenas a frequência com que foram citadas. Esse dado certamente<strong>de</strong>verá estimular a discussão <strong>sobre</strong> os limites reais entre as áreas <strong>de</strong> atuação,como <strong>de</strong>fi nidas classicamente <strong>no</strong> campo da Psicologia.8 Orientações teórico-metodológicasA Psicologia como um campo disperso e fragmentado em perspectivasteórico-metodológicas é fato amplamente reconhecido, quer <strong>no</strong> ambienteacadêmico, quer <strong>no</strong> profi ssional. Frente a essa realida<strong>de</strong>, duas posições seconfrontam: a primeira parte do princípio <strong>de</strong> que cada perspectiva, por se apoiarem concepções <strong>de</strong> homem, <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> e <strong>de</strong> ciência distintos, requer uma a<strong>de</strong>sãoclara do profi ssional, com refl exos <strong>sobre</strong> a sua prática profi ssional que <strong>de</strong>veriaser, então, consistente com a perspectiva adotada. A segunda relativiza a distância


266 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>entre essas perspectivas, aposta na possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> diálogo e aproximações,enfatiza a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que elas se reportem a dimensões distintas dosfenôme<strong>no</strong>s psicológicos e, em consequência, possam ser complementares. Logo,po<strong>de</strong> ser possível e até enriquecedor trabalhar com orientações distintas.Ao se examinar o posicionamento dos psicólogos, tanto na pesquisados a<strong>no</strong>s 1980 e, especialmente, na pesquisa atual, parece não haver dúvidaquando a clara opção pelo ecletismo. O padrão dominante é a combinação <strong>de</strong>pelo me<strong>no</strong>s duas abordagens, havendo casos <strong>de</strong> profi ssionais que combinamquatro e até cinco abordagens distintas. Como na pesquisa dos a<strong>no</strong>s 1980, apsicanálise continua sendo a orientação do maior número <strong>de</strong> psicólogos querisolada, quer acompanhada <strong>de</strong> outras. No entanto, o percentual <strong>de</strong> psicólogos<strong>de</strong> orientação psicanalítica caiu na pesquisa atual, pois foi escolhida porpouco mais <strong>de</strong> 20% dos participantes. Essa queda se <strong>de</strong>ve ao crescimento <strong>de</strong>várias outras abordagens, vindo, por or<strong>de</strong>m, a Humanista, Comportamental,Cognitivista e a Sócio-histórica. Quando se examinam as abordagens por áreas<strong>de</strong> atuação, o quadro também não se altera signifi cativamente entre as duaspesquisas. A psicanálise continua sendo a orientação mais presente entre ospsicólogos que atuam exclusivamente na clínica ou a combinam com outrasáreas, predominando, também, muito claramente na área <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>. Esse quadrose altera na área organizacional e do trabalho com um peso bem expressivo dasabordagens cognitivas e comportamentais.Os resultados da mais recente pesquisa apontam claramente anecessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>no</strong>vos estudos que aprofun<strong>de</strong>m a compreensão dos fundamentospara as combinações que os psicólogos fazem das diferentes abordagens.Aprofundar essa compreensão é <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> relevância para o processo <strong>de</strong>formação. Pouco se tem documentado em estudos empíricos <strong>sobre</strong> o processo<strong>de</strong> escolha dos alu<strong>no</strong>s por alguma orientação teórica, incluindo os mecanismosenvolvidos <strong>no</strong>s processo <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> e nas relações entre alu<strong>no</strong>s e professores quefavorecem a escolha <strong>de</strong> uma ou <strong>de</strong> várias abordagens.


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional. O que Mudou nas Últimas Décadas2679 A avaliação do exercício profissionalNas duas pesquisas, buscou-se saber como os psicólogos avaliam ostatus <strong>de</strong> sua profi ssão junto à comunida<strong>de</strong>; quais as difi culda<strong>de</strong>s que encontrampara o seu exercício profi ssional e as intenções <strong>de</strong> mudança <strong>de</strong> profi ssão, <strong>de</strong> área<strong>de</strong> atuação ou <strong>de</strong> emprego. Na avaliação do status da profi ssão não há alteraçõesmuito expressivas. O psicólogo faz uma avaliação mo<strong>de</strong>radamente positiva dacredibilida<strong>de</strong> e prestígio da profi ssão, com peque<strong>no</strong> incremento em relação àavaliação dos a<strong>no</strong>s 1980. No entanto, os participantes sinalizam que a socieda<strong>de</strong>não tem um reconhecimento à altura da sua relevância, especialmente quandose trata da questão da sua remuneração. Agora, como há vinte a<strong>no</strong>s, há umaavaliação <strong>de</strong> que a profi ssão é mal remunerada.Apesar dos problemas que cercam o exercício da profi ssão, as intenções<strong>de</strong> nela permanecer são elevadas e melhoraram bastante quando comparadascom os a<strong>no</strong>s 1980. Caiu <strong>de</strong> 25,2 para 17,3% aqueles que gostariam <strong>de</strong> mudar <strong>de</strong>emprego, mantendo-se na mesma área <strong>de</strong> atuação; reduziu <strong>de</strong> 13,6 para 8,9% aporcentagem daqueles que gostariam <strong>de</strong> mudar <strong>de</strong> área <strong>de</strong> atuação. E o peque<strong>no</strong>percentual <strong>de</strong> 5,6% <strong>de</strong> psicólogos que gostariam <strong>de</strong> abandonar a profi ssão em1988 caiu ainda mais para 2,4%.Os dados revelam que, apesar das difi culda<strong>de</strong>s encontradas <strong>no</strong> exercícioda profi ssão, o psicólogo possui forte i<strong>de</strong>ntifi cação com a sua ocupação, associadaa um alto comprometimento com a profi ssão e com a sua área <strong>de</strong> atuação.Evi<strong>de</strong>nte que estamos, aqui, <strong>no</strong>s referindo ao contingente daqueles que estãoatuando profi ssionalmente ou, mesmo sem atuarem na área, mantêm algumaexpectativa <strong>de</strong> voltarem a atuar, o que justifi ca a manutenção do seu vínculocom o sistema Conselho. É importante, todavia, relembrar que um expressivocontingente <strong>de</strong> graduados em psicologia termina não se inserindo na profi ssão,questão que está a merecer um estudo mais específi co e aprofundado.10 A avaliação da formação acadêmicaO tratamento da questão da formação profi ssional não permite que osresultados das duas pesquisas possam ser comparados. As próprias alterações <strong>no</strong>campo da formação – a emergência das diretrizes curriculares em substituição ao


268 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>currículo mínimo, a ênfase em competências <strong>no</strong> lugar do conhecimento – fi zeramcom que a avaliação da percepção dos psicólogos <strong>sobre</strong> a formação recebida eo domínio <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s básicas para o exercício profi ssional fosse estruturada<strong>de</strong> forma bem diferente entre as duas pesquisas. Todavia, <strong>de</strong>sprezando-se taisdiferenças, os resultados apontam para um quadro <strong>de</strong> difi culda<strong>de</strong>s sérias <strong>no</strong>processo <strong>de</strong> formação do psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>.Houve um expressivo crescimento do número <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> graduaçãoem Psicologia <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, <strong>sobre</strong>tudo, <strong>no</strong> segmento privado. Em comparação comos a<strong>no</strong>s 1980, cresceu a participação <strong>de</strong> profi ssionais egressos <strong>de</strong> instituiçõesprivadas, levando-<strong>no</strong>s a constatar que o perfi l dominante do exercício profi ssionalresulta do processo <strong>de</strong> formação que ocorre neste tipo <strong>de</strong> instituição. Por outrolado, houve um gran<strong>de</strong> crescimento do <strong>no</strong>sso sistema <strong>de</strong> pós-graduação, agora,<strong>sobre</strong>tudo, <strong>no</strong> sistema público <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>. Com isso, cresceu o número <strong>de</strong> mestrese doutores, embora esse quantitativo esteja distante <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r à <strong>de</strong>manda <strong>de</strong>docentes, consi<strong>de</strong>rando o crescimento dos cursos <strong>de</strong> graduação.Outro dado importante, um traço já i<strong>de</strong>ntifi cado <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 1980, é queentre os psicólogos existe uma busca contínua <strong>de</strong> aperfeiçoamento profi ssional,valendo-se <strong>de</strong> várias estratégias (cursos, congressos, grupos <strong>de</strong> estudo,supervisões etc.). Essa busca cria um verda<strong>de</strong>iro mercado <strong>de</strong> formação paraleloàs instituições <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong>, o que explica que a docência seja uma ativida<strong>de</strong> tãodifundida e combinada com todas as áreas <strong>de</strong> atuação profi ssional.Por outro lado, os psicólogos reconhecem uma distância signifi cativaentre as suas aprendizagens na graduação e as <strong>de</strong>mandas do exercício profi ssional.Os <strong>de</strong>safi os da qualifi cação profi ssional e as <strong>de</strong>fasagens entre o que é necessáriopara bem exercer a profi ssão e o que lhes é ensinado é uma das contribuiçõesricas oferecidas pelo estudo mais recente. Entre os pontos mais críticos <strong>no</strong> ensi<strong>no</strong>superior encontra-se a formação científi ca (algo presente na pesquisa <strong>de</strong> 1988) eas competências para trabalhar com unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> análise mais complexas que nãoo indivíduo, tais como grupos e organizações. As competências nas áreas maisclássicas <strong>de</strong> avaliação, psicodiagnóstico e a clínica em geral, como na pesquisaanterior, são reconhecidas como mais <strong>de</strong>senvolvidas <strong>no</strong>s cursos, o que aindarevela o viés clínico presente em gran<strong>de</strong> parte do <strong>no</strong>sso sistema <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> empsicologia.


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional. O que Mudou nas Últimas Décadas269Em síntese, apesar <strong>de</strong> tantas mudanças na estrutura da formação emPsicologia que <strong>no</strong>s levou a superar os limites do antigo currículo mínimo, aindasão e<strong>no</strong>rmes os <strong>de</strong>safi os que cercam a formação do psicólogo, especialmente emum momento <strong>de</strong> expansão acentuada <strong>de</strong> cursos, cada vez mais distribuídos <strong>no</strong>território nacional, atingindo cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> médio e peque<strong>no</strong> porte. Tal crescimentonão vem sendo acompanhado <strong>de</strong> condições, inclusive <strong>de</strong> corpo docenteefetivamente qualifi cado, para assegurar uma formação <strong>de</strong> elevada qualida<strong>de</strong>.11 Concluindo...O artigo conclui apontando que o retrato da profi ssão traçado <strong>no</strong>fi nal dos a<strong>no</strong>s 1980 talvez não seja do agrado da maioria dos psicólogos, comotambém dos profi ssionais responsáveis por sua formação. No entanto, <strong>de</strong>veriaser tomado como base para políticas que aprimorassem o processo <strong>de</strong> formaçãoe rompessem os limites impostos por um mercado <strong>de</strong> trabalho ainda restritoe claramente exclu<strong>de</strong>nte. O livro gerado por aquela pesquisa, do qual o artigoé uma pequena síntese, constitui-se num marco importante na trajetória <strong>de</strong> apsicologia tornar-se consciente dos problemas da categoria ocupacional e <strong>de</strong> suase<strong>no</strong>rmes responsabilida<strong>de</strong>s frente a uma realida<strong>de</strong> social complexa e <strong>de</strong>sigual.O estudo conduzido mais <strong>de</strong> vinte a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois <strong>no</strong>s permite atualizaresse retrato. Na atualização percebemos claros sinais <strong>de</strong> mudanças ao lado <strong>de</strong>permanências. Continuam existindo vários indicadores <strong>de</strong> fragilida<strong>de</strong> do mercado<strong>de</strong> trabalho, em termos das condições que oferece para o exercício da ocupaçãoprofi ssional. Há, <strong>no</strong> entanto, evidências <strong>de</strong> que a profi ssão se expan<strong>de</strong> e ampliao seu leque <strong>de</strong> serviços, contextos e segmentos da população benefi ciária, como<strong>no</strong> caso da área <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, e se mantém nas áreas <strong>de</strong> clínica e organizações etrabalho. Por outro lado, constata-se a perda <strong>de</strong> espaço do psicólogo <strong>no</strong> campoda educação, área tão fundamental para quaisquer processos <strong>de</strong> mudança nasocieda<strong>de</strong> e <strong>no</strong> país.O estudo atual revela que os problemas da formação ainda estãopresentes e talvez tenham até se estendido, apesar da mo<strong>de</strong>rnização doscurrículos. A <strong>de</strong>fasagem entre competências necessárias e adquiridas são um dosproblemas a exigir profunda refl exão, especialmente do segmento voltado para


270 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>a formação. A profunda confusão que cerca a adoção <strong>de</strong> referenciais teóricos porpsicólogos, e não apenas entre os recém graduados, é outra questão a merecermelhor escrutínio e propostas <strong>de</strong> solução, pelo papel central que tais referenciais<strong>de</strong>sempenham na estruturação dos <strong>no</strong>ssos cursos. Estudos complementares sãotambém imprescindíveis para se compreen<strong>de</strong>r melhor o que está acontecendocom a <strong>no</strong>ção <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> atuação. Esse conceito que embasa a organização do<strong>no</strong>sso campo profi ssional estaria <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> ter sentido, consi<strong>de</strong>rando a formacomo algumas ativida<strong>de</strong>s são comuns e a intensida<strong>de</strong> com que os psicólogostransitam entre elas?Certamente, estudos abrangentes e voltados para traçar retratosgerais do <strong>no</strong>sso campo profi ssional precisam ser conduzidos em intervalos <strong>de</strong>tempo mais reduzidos. Suas metodologias po<strong>de</strong>m e <strong>de</strong>vem ser aperfeiçoadas<strong>de</strong> forma a captar com maior precisão as transições que estão ocorrendo <strong>no</strong>campo profi ssional da Psicologia. Só assim seremos capazes <strong>de</strong> aperfeiçoarcontinuamente as <strong>no</strong>ssas práticas, assim como embasar políticas científi cas,profi ssionais e educacionais mais congruentes com as necessida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>mandaspostas pela socieda<strong>de</strong> à Psicologia.Para os mais pessimistas, vinte a<strong>no</strong>s <strong>de</strong>pois da primeira pesquisanacional, o exercício da profi ssão <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> não apresenta alterações signifi cativasem aspectos como <strong>de</strong> rendimentos, número <strong>de</strong> psicólogos atuantes na profi ssãoem relação aos graduados, profi ssão liberal e assalariada, ecletismo acrítico <strong>de</strong>orientações teóricas, <strong>de</strong>scompasso entre as competências requeridas para aformação científi ca e a atuação grupal, organizacional e institucional, e as <strong>de</strong>domínio profi ssional, o que seria preocupante e <strong>de</strong>veria <strong>no</strong>s manter alertas, vistoas mudanças que ocorreram nas políticas <strong>de</strong> ensi<strong>no</strong> superior, nas <strong>de</strong>mandassociais e na formação do psicólogo em <strong>no</strong>sso país. Para os mais otimistas,alguns dados comparativos <strong>de</strong> 1988 e <strong>de</strong> 2008 reafi rmam a forte i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>do psicólogo com a profi ssão, enquanto outros sinalizam peque<strong>no</strong>s avançosque merecem ser mais bem estudados. A livre escolha pela Psicologia, apercepção <strong>de</strong> status profi ssional, o forte comprometimento e a satisfação com aprofi ssão, além da intenção <strong>de</strong> permanência na profi ssão e na área <strong>de</strong> atuação,reafi rmam e fortalecem a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> profi ssional. A interiorização da profi ssão, a


O Psicólogo <strong>Brasil</strong>eiro: Sua Atuação e Formação Profi ssional. O que Mudou nas Últimas Décadas271<strong>de</strong>mocratização do atendimento psicológico, o fortalecimento do setor públicocomo maior empregador, o fortalecimento da docência como ativida<strong>de</strong> principal,hibridismo <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> atuação que obrigam a uma revisão <strong>de</strong>ste conceito ediversifi cação <strong>de</strong> algumas ativida<strong>de</strong>s, são todos dados indicativos <strong>de</strong> que talvezvinte a<strong>no</strong>s não seja um tempo tão longo para que as mudanças <strong>de</strong> maior escopose processem.


INFORMAÇÕES SOBRE OS AUTORESAna Ludmila Freire CostaPossui graduação (2004) e mestrado (2006) em Psicologia pelaUniversida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Norte. Tem experiência na área <strong>de</strong>Psicologia, com ênfase em Formação e Atuação do psicólogo em relação,principalmente, aos seguintes temas: psicologia comunitária, psicologiaambiental, saú<strong>de</strong> pública e publicação científi ca.Antonio Virgílio Bittencourt BastosPossui graduação em Psicologia pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral da Bahia(1976), mestrado em Educação pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral da Bahia (1982) edoutorado em Psicologia pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Brasília (1994), com concentraçãoem Psicologia Organizacional e do Trabalho. Atualmente é professor titular<strong>de</strong> Psicologia Social das Organizações, <strong>no</strong> Departamento <strong>de</strong> Psicologia daUniversida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral da Bahia. Foi membro presi<strong>de</strong>nte do Conselho Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong>Psicologia (1986). Atuou como membro da comissão <strong>de</strong> especialistas em ensi<strong>no</strong><strong>de</strong> Psicologia do MEC/SESu (1994-2000). Foi membro do CA <strong>de</strong> Psicologia doCNPq e membro da Comissão <strong>de</strong> Psicologia do INEP e da comissão <strong>de</strong> área daPsicologia na CAPES. Atualmente é Coor<strong>de</strong>nador Adjunto da Área <strong>de</strong> Psicologiada CAPES. Pesquisador I-A do CNPq, atuando principalmente em temas da área <strong>de</strong>Comportamento Organizacional, a exemplo <strong>de</strong>: comprometimento <strong>no</strong> trabalho,


274 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>mudanças organizacionais, signifi cado do trabalhar, cognições organizacionais,mapas cognitivos e re<strong>de</strong>s sociais em contextos organizacionais.Fellipe Coelho-LimaBacharel em Psicologia pela UFRN (2010). É Bolsista <strong>de</strong> IniciaçãoCientífi ca Voluntário (2009-2010), pesquisando <strong>no</strong>s temas <strong>de</strong>: ProduçãoCientífi ca, Atuação do Psicólogo e Psicologia do Trabalho e das Organizações.Jairo Eduardo Borges-Andra<strong>de</strong>Possui graduação (1972) em Psicologia pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Brasília(UnB) e mestrado (1977) e doutorado (1979) em Sistemas Instrucionais pelaFlorida State University. Estágios <strong>de</strong> pós-doutorado realizados: InternationalFood Policy Research Institute (1990) e University of Sheffi eld e RijksuniversiteitGröningen (2001). Foi pesquisador da Embrapa (1979-1993), on<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolveuativida<strong>de</strong>s ligadas a gestão <strong>de</strong> pessoas e <strong>de</strong> ciência e tec<strong>no</strong>logia. Des<strong>de</strong> 1993,é professor titular da UnB, on<strong>de</strong> faz pesquisa (Aprendizagem, ProcessosPsicossociais e Mudança nas Organizações), ensi<strong>no</strong> (Graduação, Mestrado eDoutorado) e extensão (Treinamento e Desenvolvimento <strong>de</strong> Pessoal). Gestãorealizada em entida<strong>de</strong>s científi cas e profi ssionais: Capes (Psicologia), CNPq(Psicologia), ANPEPP, SBPOT, CFP e CRP-01.Joyce Pereira da CostaEstudante <strong>de</strong> graduação em Psicologia da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do RioGran<strong>de</strong> do Norte e bolsista <strong>de</strong> Iniciação Científi ca pelo CNPq (2008-2010), comexperiência em pesquisa <strong>sobre</strong> produção do conhecimento em Psicologia.Keyla Mafalda <strong>de</strong> Oliveira AmorimEstudante do curso <strong>de</strong> mestrado em Psicologia pela Universida<strong>de</strong>Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Norte, bolsista CAPES (2008-2010); graduada emPsicologia pela mesma instituição (2008). Tem experiência em pesquisa na área<strong>de</strong> Psicologia, com ênfase em produção <strong>de</strong> conhecimento em Psicologia, práticasocial do psicólogo, e Psicologia e políticas sociais.


Informações <strong>sobre</strong> os Autores 275Maria do Carmo Gue<strong>de</strong>sDoutora em Ciências Humanas (Psicologia) pela Pontifícia Universida<strong>de</strong>Católica <strong>de</strong> São Paulo (1974). Atualmente é professora titular na PontifíciaUniversida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo, <strong>no</strong>s Programas <strong>de</strong> Estudos Pós-Graduadosem Psicologia Social e em Psicologia Experimental. Tem como linhas <strong>de</strong> pesquisa:História da Psicologia, Metodologia <strong>de</strong> Pesquisa, Disseminação do conhecimentocientífi co.Oswaldo Hajime YamamotoProfessor Titular do Departamento <strong>de</strong> Psicologia da Universida<strong>de</strong>Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Norte. Doutor em Educação pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> SãoPaulo (1994); mestre em Educação pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> doNorte (1986); graduado em Psicologia pela Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong>São Paulo (1975). Representante da área da Psicologia da CAPES (2005-2008);Representante Adjunto da área da Psicologia da CAPES (2002-2005); membrodo Conselho Técnico Científi co da CAPES (2005-2008); Membro do Comitê<strong>de</strong> Assessoramento da área da Psicologia do CNPq (2009-2012); Pró-Reitor <strong>de</strong>Planejamento e Coor<strong>de</strong>nação Geral da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> doNorte (2003-2007). Fundador e editor da revista Estudos <strong>de</strong> Psicologia Natal(ISSN1413-294X) (1996-2003). Diretor da Associação Nacional <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia - ANPEPP (2000-2002). Diretor e Membro do ConselhoDeliberativo da Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Editores Científi cos ABEC (2002-2007).Tem experiência nas áreas da Psicologia e da Educação, investigando temasrelacionados às políticas sociais e a teoria social marxiana.Pablo <strong>de</strong> Sousa SeixasDoutorando em Psicologia pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> doNorte, possuindo graduação e Mestrado em Psicologia pela mesma instituição.Tem experiência na área <strong>de</strong> Psicologia da Educação e Pesquisa em Psicologia, comênfase em Psicologia e Políticas Sociais, atuando principalmente <strong>no</strong>s seguintestemas: história da psicologia, psicologia na educação, psicologia <strong>no</strong> Rio Gran<strong>de</strong>do Norte e formação e atuação do psicólogo.


276 <strong>Escritos</strong> <strong>sobre</strong> a profi ssão <strong>de</strong> psicólogo <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>Paula Inez Cunha Gomi<strong>de</strong>Possui graduação em Psicologia pela Universida<strong>de</strong> Estadual <strong>de</strong> Londrina(1976), mestrado em Psicologia (Psicologia Experimental) pela Universida<strong>de</strong><strong>de</strong> São Paulo (1984) e doutorado em Psicologia (Psicologia Experimental) pelaUniversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (1990). Professora aposentada da UFPR. Atualmenteé professor titular da Faculda<strong>de</strong> Evangélica do Paraná e professor adjunto daUniversida<strong>de</strong> Tuiuti do Paraná. Tem experiência na área <strong>de</strong> Psicologia, com ênfaseem Estilos Parentais e Comportamentos Antissociais, atuando principalmente<strong>no</strong>s seguintes temas: comportamento moral, praticas educativas, estilo parental,adolescente infrator. Presi<strong>de</strong>nte da Socieda<strong>de</strong> <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicologia.Regina Helena <strong>de</strong> Freitas CamposPossui graduação em Psicologia pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> MinasGerais (1974), Mestrado em Educação pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> MinasGerais (1980) e PhD em Educação pela Stanford University (1989). Realizou pósdoutoradona Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Genebra (1998) e na École <strong>de</strong>s Hautes Étu<strong>de</strong>sen Sciences Sociales em Paris (2001-2002). Atualmente é professora titular daUniversida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Minas Gerais, pesquisador 1D do Conselho Nacional<strong>de</strong> Desenvolvimento Científi co e Tec<strong>no</strong>lógico, presi<strong>de</strong>nte do Centro <strong>de</strong>Documentação e Pesquisa Helena Antipoff. É lí<strong>de</strong>r do Grupo <strong>de</strong> Pesquisa emHistória da Psicologia e Contexto Sócio-cultural e pesquisadora do Laboratório<strong>de</strong> Psicologia da Educação Helena Antipoff, na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação da UFMG.Coor<strong>de</strong>na também Acordo <strong>de</strong> Cooperação Acadêmica e Científi ca entre a FAE/UFMG e os Arquivos Jean Piaget, da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Genebra. Tem experiênciana área <strong>de</strong> História da Psicologia e <strong>de</strong> Fundamentos da Educação, com ênfase emPsicologia Educacional , atuando principalmente <strong>no</strong>s seguintes temas: psicologiae educação <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, história da psicologia educacional, representações sociais eeducação, educação e direitos huma<strong>no</strong>s.Sílvio Paulo BotoméPsicólogo do Departamento <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> da Comunida<strong>de</strong> da Secretaria<strong>de</strong> Higiene e Saú<strong>de</strong> do Município <strong>de</strong> São Paulo (SP). Professor da Universida<strong>de</strong>


Informações <strong>sobre</strong> os Autores 277Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> São Carlos (SP) e da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo(SP). Pesquisador do CNPq. A partir <strong>de</strong> 1999, Professor Titular do Departamento<strong>de</strong> Psicologia da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Santa Catarina.Sonia Maria Gue<strong>de</strong>s GondimProfessora Associada do Instituto <strong>de</strong> Psicologia da Universida<strong>de</strong>Fe<strong>de</strong>ral da Bahia. Bolsista em Produtivida<strong>de</strong> em Pesquisa do CNPq. Doutoraem Psicologia Social pela Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Estágio pósdoutoralna Universidad Complutense <strong>de</strong> Madrid e na University of Cambridge<strong>no</strong> a<strong>no</strong> <strong>de</strong> 2007. Atua na graduação e na pós-graduação dos programas <strong>de</strong>Psicologia, Gestão Social e Administração da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral da Bahia.Interesses <strong>de</strong> pesquisa na área <strong>de</strong> emoções e afetos <strong>no</strong> trabalho, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>social e profi ssional, <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> competências, formação <strong>de</strong> gestores,aprendizagem, processos grupais e gestão <strong>de</strong> pessoas. Interesses metodológicosem pesquisa qualitativa, especialmente grupos focais. Vice-presi<strong>de</strong>nte da SBPOT(Associação <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> Psicologia Organizacional e do Trabalho). Editoraassociada da rPOT (Revista Psicologia, Organizações e Trabalho). Vice-diretorado Instituto <strong>de</strong> Psicologia da UFBA.Sylvia Leser <strong>de</strong> MelloPossui graduação em Filosofi a pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (1961),especialização em Psychologie pela École <strong>de</strong>s Hautes Étu<strong>de</strong>s en Sciences Sociales(1964) e doutorado em Psicologia pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (1972).Atualmente é professora titular da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Tem experiênciana área <strong>de</strong> Psicologia, com ênfase em Psicologia Social, atuando principalmente<strong>no</strong>s seguintes temas: Instituição, Profi ssão, Socieda<strong>de</strong>, Trabalho.

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