12.07.2015 Views

Construindo um Natal mais solidário E vencendo os desafios ... - CTT

Construindo um Natal mais solidário E vencendo os desafios ... - CTT

Construindo um Natal mais solidário E vencendo os desafios ... - CTT

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Ceia de <strong>Natal</strong>a branco e pretoUm Bacalhau à Moda do Zé do Gato acompanhado pelas aventuras de Firmino Baldéem terras de Viana do Castelo é a prop<strong>os</strong>ta para a noite da Consoada,servida como habitualmente pelo chefe Raul Moreira. Bom apetite e Feliz <strong>Natal</strong>!O meu amigo Firmino Baldé, espertíssimocolega de Faculdade e cidadãoguineense, veio para Lisboa cedo coma família e passou muit<strong>os</strong> Natais longeda sua terra. Conheci-o quando tiravao curso de Gestão conn<strong>os</strong>co. EstudavaCastelo, e com ela casou mesmo antesde terem acabado as licenciaturas.Ele pretíssimo e ela branquíssima.Isto n<strong>os</strong> mead<strong>os</strong> da década de 70,quando não era assim tão politicamenteincorrecto olhar de s<strong>os</strong>laio paraMas antes deste final feliz, FirminoBaldé alg<strong>um</strong>a coisa teve que penar.Sobretudo quando conheceu pela primeiravez <strong>os</strong> Sogr<strong>os</strong>, lá no Minho.E é a história de <strong>um</strong> desses Natais,o primeiro que passou em casa d<strong>os</strong>e trabalhava, n<strong>um</strong> restaurante da Feira estes casament<strong>os</strong> <strong>mais</strong> colorid<strong>os</strong>. que haviam de ser seus Sogr<strong>os</strong> e quePopular, pois aqueles temp<strong>os</strong> não eramfáceis…Excelente camarada e amigo sincero,com <strong>um</strong> riso fácil e contagiante, Firminoenamorou-se de <strong>um</strong>a colega n<strong>os</strong>sa,a Maria João, oriunda de Viana doMormente no Portugal profundo.Firmino e a esp<strong>os</strong>a — p<strong>os</strong>so já descansara marinhagem — estão bem erecomendam-se. A última vez que soubedeles o Firmino trabalhava na UNESCOem Paris e tinham dois filh<strong>os</strong>.o Firmino nunca se cansava de n<strong>os</strong>contar entre grandes gargalhadas, queaqui v<strong>os</strong> deixo. Obviamente que algo“envolvida pelo manto diaphano daphantasia”, a começar pel<strong>os</strong> nomesutilizad<strong>os</strong>.- «A tua família está prevenida?», perguntavaele pela vigésima vez enquantoque o comboio se fazia à linha.- «Sim, está descansado!», respondiaela.- «E mandaste fotografias minhas?»- «Mandei sim», mentia ela tambémpela vigésima vez…O Comboio lá chegou a Viana e quemse apressava para receber o feliz casalera nem <strong>mais</strong> nem men<strong>os</strong> do que o JoãoLuis, irmão da dit<strong>os</strong>a namorada.Primeiro choque frontal. O João Luisapertou a mão civilizadamente ao Firminomas não lhe saía palavra que jeitotivesse da boca…- «OOOlhem que teeeempo d’<strong>um</strong>raio que praqui está».Foi o que se aproveitou desse primeiroencontro.Pelo caminho, curt<strong>os</strong> 12 km até chegaremà aldeia, parecia que o automóvelera conduzido por freiras… levaramquase <strong>um</strong>a hora para parar mesmoao lado da pequena quintarola d<strong>os</strong>«Sogr<strong>os</strong>». Pareceu, nessa altura, que oJoão Luis manobrava a viatura de formaa fazê-la enc<strong>os</strong>tar-se o <strong>mais</strong> p<strong>os</strong>sívelao portão da entrada, mas do lado daporta onde estava sentado o Firmino.A ideia seria fazê-lo sair do carroe entrar rapidamente, tal e qual <strong>um</strong>camarada do PCP na clandestinidaden<strong>os</strong> temp<strong>os</strong> da outra senhora.Saem <strong>os</strong> namorad<strong>os</strong> do carro, vema Mãe a correr à porta e o Pai lá mesmoatrás. A Mãe ainda cambaleia, mas nãocai. Quanto ao Pai, dá <strong>um</strong>a olhadelae… desata a correr na direcção op<strong>os</strong>ta.A orgulh<strong>os</strong>a minhota c<strong>um</strong>primentaamb<strong>os</strong>, esboça <strong>um</strong> sorriso terrivelmenteforçado, <strong>mais</strong> <strong>um</strong> esgar do que<strong>um</strong> sorriso, e convida o casal a entrar.Depois das amenidades habituaise com <strong>um</strong>a desculpa <strong>mais</strong> ou men<strong>os</strong>esfarrapada, a Mãe finalmente encontra<strong>um</strong> pretexto para falar a sós coma Maria João.- «Ai querida Filha o que tu f<strong>os</strong>tearranjar!», chorava a Mãe agarrada àmão da Maria João.- «Então Mãe? Tenha mod<strong>os</strong> e deixe--me apresentar-lhe convenientementeo Firmino».- «Ai que até o Sr. Padre cá vemalmoçar hoje para o conhecer!»- «Mas que mal é que tem?»- «Ai que ele é preto como <strong>um</strong> barrotequeimado!»- «Mas g<strong>os</strong>tam<strong>os</strong> <strong>um</strong> do outro e é<strong>um</strong> bom rapaz e trabalhador!»- «Pois sim, mas é preto Filha! Podiaster escolhido <strong>um</strong> brasileiro ao men<strong>os</strong>…Ou então <strong>um</strong> galego! Vá lá, ao men<strong>os</strong><strong>um</strong> rapaz dessas praias de Cascais…mas preto…»Ao ver o caminho que as coisasestavam a levar a Maria João lá se saiucom esta:- «Mas a Mãe ainda não sabe queele é Rei lá na Guiné?»- «Qué qu’stás pr’aí a dizer Filha?Ele é Rei?»- «Sim, quero dizer, quando o Paidele morrer o Firmino será Rei. Lá naGuiné.»- «Homessa! Rei… E tu ficas RainhaFilha?»Alg<strong>um</strong>a t<strong>os</strong>se seca, mas aquelecaminho, depois de começado, já nãotinha marcha-atrás.- «Rainha sim Mãe! Onde é que eupodia chegar a tanto se casasse com<strong>um</strong> branco?»Deu-se <strong>um</strong>a pausa expectanteenquanto que a «caixa d<strong>os</strong> pirolit<strong>os</strong>»materna processava a informação.E depois o grito bem alto:- «OH MANEL, SAI JÁ DETRÁS DOSPIPOS E VEM CÁ IMEDIATAMENTE CUM-PRIMENTAR O TEU FUTURO GENRO!»Ao almoço, e ciente o Pároco dareal companhia que com ele compartilhavatalher e mesa, a conversa versou<strong>os</strong> c<strong>os</strong>t<strong>um</strong>es do povo Papel e a importânciadessa etnia marcante em Bissau,histórias do Régulo-rei, d<strong>os</strong> nobrese d<strong>os</strong> Jambac<strong>os</strong>ses (ou Baloubeir<strong>os</strong>,encarregues da “Balouba” — lugarsagrado do povo Papel).Firmino, educado aqui no Continentedesde <strong>os</strong> 12 an<strong>os</strong>, pouco sabia das suasgentes antigas. Imaginem-se as peripéciasque teve que inventar para aguentaras inquirições sem nunca abrir mãodo estatuto que a Maria João lhe dera.30 | natal . conto com ceia 92 | 31

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!