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Outros Retratos – Ensaiando um panorama do ... - Itaú Cultural

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62 Luiz Eduar<strong>do</strong> Jorge A expressão cinematográfica no território <strong>do</strong> <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental 63culturas h<strong>um</strong>anas e suas formas de organização social, política, econômica e religiosa. Umanecessidade de ir ao encontro da h<strong>um</strong>anidade <strong>do</strong> homem para saber como ele percebe,pensa, representa e sente a realidade. Porque, assim proceden<strong>do</strong>, se pretende buscarexpressões em nosso próprio ser, isto é, em nós mesmos, a fim de desvelar o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong>nosso próprio mun<strong>do</strong>.Na epígrafe deste texto, a descrição de <strong>um</strong> trecho <strong>do</strong> Cine-Olho <strong>do</strong> diretor russo DzigaVertov é <strong>um</strong>a sinalização da importância <strong>do</strong> cinema <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental como expressãoda vida social. O referi<strong>do</strong> realiza<strong>do</strong>r tornou-se <strong>um</strong>a referência clássica e, ao mesmotempo, moderna no mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> cinema como <strong>um</strong>a escola <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental em razão decolocar em prática e teorizar sobre os princípios gramaticais <strong>do</strong> cinema-verdade.Por meio dessa expressão, Vertov desenvolveu suas idéias sobre a função <strong>do</strong> cinema<strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental influencian<strong>do</strong> <strong>um</strong>a geração de jovens cineastas <strong>do</strong> pós-guerra que, maistarde, se tornaram também referências <strong>do</strong> <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental em seus países: “na França comJean Rouch (Moi un Noir, La Pyramide H<strong>um</strong>aine, Chronique d’un Étè), Mario Ruspoli (LêsInconunus de la Terre, Regards sur la Folie), na Itália (especialmente com Baldi), na Grã-Bretanha com o Free Cinema, nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s com Rechard Leacock (Primary, YanquiNo), com Lionel Rogosin (On the Bowery, Come Back África) e diversos segui<strong>do</strong>res daEscola de Nova York” (Sa<strong>do</strong>ul, 1971) Esse recenseamento realiza<strong>do</strong> por Sa<strong>do</strong>ul limita-se,como ele mesmo afirma, a citar alguns filmes apresenta<strong>do</strong>s em Paris ou em festivaisinternacionais nos anos 1960.Ao chamar atenção para o cine-olho, Dziga Vertov defendia a tese de <strong>um</strong> cinema-verdadecomo forma de expressão não-ficcional, para, com base em <strong>um</strong> plano de trabalho, alcançara realidade e apresentá-la no processo de montagem. A montagem, para Vertov, é <strong>um</strong>conceito, isto é, <strong>um</strong> exercício subjetivo de concatenação <strong>do</strong> fluxo <strong>do</strong>s acontecimentospor meio da razão. Para ele, entretanto, o conceito é <strong>um</strong>a relação entre teoria e prática: opensar, o elaborar e o fazer.O méto<strong>do</strong> de Vertov está basea<strong>do</strong> na sincronização <strong>do</strong> som e da imagem que eledenominou câmera-olho e rádio-orelha para filmar A Vida ao Improviso. A realidadeda forma cinematográfica é <strong>um</strong>a representação <strong>do</strong> improviso in<strong>do</strong> ao encontro <strong>do</strong>sacontecimentos <strong>do</strong> cotidiano para apreendê-los, a fim de compô-los dentro de <strong>um</strong>alógica dialética da montagem para serem afirma<strong>do</strong>s ou nega<strong>do</strong>s. A vida representa-sepor si mesma no cinema.El méto<strong>do</strong> del cine-ojo el méto<strong>do</strong> de estúdio científico-experimental delmun<strong>do</strong> visible: a) basa<strong>do</strong> en una fijación planificada de los hechos de la vidasobre la película; b) basa<strong>do</strong> en una organización planificada de los cinemateriales<strong>do</strong>c<strong>um</strong>entales fija<strong>do</strong>s sobre la película. (Vertov, 1927).Ao utilizar o material de arquivo <strong>do</strong> Kino-Pravda, Vertov realiza, em 1928, com seuirmão Mikail Kaufman, o longa-metragem intitula<strong>do</strong> O Homem da Câmera, metafilmecientífico-experimental no qual emprega o méto<strong>do</strong> aludi<strong>do</strong> por meio de <strong>um</strong> ensaiodialético-pedagógico mostran<strong>do</strong> a vida cotidiana de <strong>um</strong>a grande cidade <strong>do</strong> amanhecerao anoitecer. Fazen<strong>do</strong> uso de inúmeras técnicas de montagem, consagradas até osdias atuais, elabora o cinema <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental como <strong>um</strong> cinema de idéias. E idéias quecontinuam revolucionárias.O Homem da Câmera, <strong>um</strong> filme dentro <strong>do</strong> filme, que demonstra to<strong>do</strong> o processo deconfecção <strong>do</strong> <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental, in<strong>do</strong> da idéia ao produto final, coloca em cena o trabalho daequipe técnica – filmagem e montagem – como se fossem personagens que participam<strong>do</strong> filme no contexto <strong>do</strong> cenário e <strong>do</strong>s atores sociais <strong>do</strong>c<strong>um</strong>enta<strong>do</strong>s.Vertov pesquisou as possibilidades estéticas e científicas <strong>do</strong> cinema <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental a pontode experimentar inúmeros conceitos e comportamentos de câmera, de montagem e deinserção da equipe de filmagem no processo de construção da peça cinematográfica.Além disso, teorizou, nos anos 1920, sobre preocupações ainda atuais correlatas aocinema-verdade e ao cinema direto, às dicotomias verdade x falsidade, subjetividade xobjetividade, objeto x sujeito e realidade x ficção, colocadas, ainda hoje, como temas <strong>do</strong>sdebates sobre cinema <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental e cinema ficcional.Declara Vertov:El campo visual es la vida;la materia de construcción para el montaje es la vida;los decora<strong>do</strong>s es la vida;los artistas es la vida.” (Vertov, 1927)Partin<strong>do</strong> <strong>do</strong>s princípios técnicos e heurísticos de Vertov, Jean Rouch, em parceria comEdgar Morin, realizou, teorizou e desenvolveu estu<strong>do</strong>s e produções cinematográficascom base em <strong>um</strong>a nova concepção <strong>do</strong> <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental. Tomou para si a expressão cine-olho,transforman<strong>do</strong> o cinema-verdade em <strong>um</strong> des<strong>do</strong>bramento de méto<strong>do</strong>s e técnicas alia<strong>do</strong>sa <strong>um</strong>a nova prática <strong>do</strong> cinema <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental, baliza<strong>do</strong> com o campo da antropologia.Não é por acaso que Vertov se tornou <strong>um</strong>a matriz fundamental para Jean Rouch. Esseetnólogo-cineasta passou a praticar e a teorizar o cinema-verdade com vistas à produçãode filmes antropológicos, n<strong>um</strong>a combinação <strong>do</strong> méto<strong>do</strong> vertoviano e <strong>do</strong>s princípiosda pesquisa etnográfica. Aliou, também, em muitos de seus filmes sobre o processomigratório <strong>do</strong>s camponeses nigerianos para a cidade, o méto<strong>do</strong> de observação fílmicade A Vida ao Improviso à “mise-en-scène <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ental” <strong>do</strong> irlandês Robert J. Flaherty. Desteúltimo, tomou como ponto de partida a gramática <strong>do</strong> clássico Nanook of the North (1922)e também <strong>do</strong>s filmes de atores naturais como Moana (1926), Tabu (1931), realiza<strong>do</strong> comMurnau, O Homem de Aran (1936). Histórias reais interpretadas por atores da cultura localdirigi<strong>do</strong>s pelo diretor com base em <strong>um</strong> roteiro pré-elabora<strong>do</strong>. A respeito desse modelo de<strong>do</strong>c<strong>um</strong>entário etnoficcional de Rouch, pronunciou-se Sa<strong>do</strong>ul:

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