ANAIS DE FILOSOFIA CLÁSSICA, vol. V nº 9, 2011ISSN 1982-5323SANTOS, José Trin<strong>da</strong><strong>de</strong>Princípios <strong>da</strong> <strong><strong>na</strong>tureza</strong> <strong>na</strong> Física A, <strong>de</strong> Aristóteles: pré-socráticos, PlatãoSublimi<strong>na</strong>rmente, o Estagirita está a dizer aos seus leitores que é este mesmo problema que asua concepção <strong>da</strong> investigação física vai afrontar e resolver com sucesso através <strong>da</strong> propostado hilemorfismo.OS FÍSICOSPor isso, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter <strong>de</strong>nunciado os vícios e a i<strong>na</strong><strong>de</strong>quação <strong>da</strong> argumentação eleática,entre A4 e e A6, a Física A se entrega à abor<strong>da</strong>gem do estudo dos Físicos, propriamente ditos.Elimi<strong>na</strong><strong>da</strong> a argumentação que constrangia o ser à uni<strong>da</strong><strong>de</strong> e imobili<strong>da</strong><strong>de</strong>, a próxima tarefa <strong>da</strong>análise é <strong>da</strong>r conta <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s que o eleatismo fazia constitutivas <strong>da</strong> Natureza: atríplice proibição:– <strong>da</strong> <strong>de</strong>rivação do múltiplo a partir do uno, e vice-versa;– do movimento a partir do repouso, e vice-versa;– <strong>da</strong> gênese tanto a partir do ser, quanto do não-ser.O seu ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> é a divisão dos estudiosos <strong>da</strong> <strong><strong>na</strong>tureza</strong> quanto ao número e<strong><strong>na</strong>tureza</strong> dos contrários:“Alguns, fazendo um só o corpo subjacente – ou um dos três, ou outro, mais <strong>de</strong>nso queo fogo, porém mais sutil que o ar –, geram as outras coisas, fazendo-as muitas, por<strong>de</strong>nsi<strong>da</strong><strong>de</strong> e rareza (estas são contrárias e, em geral, são excesso e falta, como Platãoconcebe o gran<strong>de</strong> e o pequeno, embora ele faça <strong>de</strong> tais coisas matéria, e do um forma,ao passo que os outros fazem do um, do subjacente, matéria, e dos contráriosdiferenças e formas). Outros geram as diversas coisas por discrimi<strong>na</strong>r, <strong>de</strong> uma sócoisa, as contrarie<strong>da</strong><strong>de</strong>s lá inerentes, como A<strong>na</strong>ximandro 33 ...” (Fís. A4,187a12-21).Aristóteles divi<strong>de</strong> os Físicos em dois grupos: o dos que partem <strong>de</strong> um dos contrários eo dos que partem <strong>da</strong> mistura. Descartando os primeiros – presumivelmente os outros Milésios–, sem se referir à teoria cósmica do vórtice, que explica a emergência dos contrários a partirdo apeiron ou <strong>da</strong> mistura 34 , liga A<strong>na</strong>ximandro a Empédocles e A<strong>na</strong>xágoras.O seu objetivo é, nos dois últimos citados, assi<strong>na</strong>lar a releitura dos postulados jônicosque, por influência <strong>da</strong> argumentação eleática, se obrigam a fazer. A proibição <strong>da</strong> geração apartir do não-ser e <strong>da</strong> corrupção no não-ser (Empédocles B11.2,. B12.1; A<strong>na</strong>xágoras B17)reduz a mu<strong>da</strong>nça ao estatuto <strong>de</strong> mera aparência, “salva” pela or<strong>de</strong>m imutável do ser (ver,Melisso B8).33 Angioni 2009.34 Vejam-se as referências ao “turbilhão” que terá provocado a emergência dos contrários (por exemplo, emA<strong>na</strong>xágoras B12, e <strong>na</strong> doxografia dos Atomistas).30
ANAIS DE FILOSOFIA CLÁSSICA, vol. V nº 9, 2011ISSN 1982-5323SANTOS, José Trin<strong>da</strong><strong>de</strong>Princípios <strong>da</strong> <strong><strong>na</strong>tureza</strong> <strong>na</strong> Física A, <strong>de</strong> Aristóteles: pré-socráticos, PlatãoEmbora aceite a teoria jônica, segundo a qual os contrários “emergem a partir <strong>de</strong>” 35(ekkrinesthai: A4,187a10-11, 13) uma substância origi<strong>na</strong>l, A<strong>na</strong>xágoras – bem como “todos osfísicos” – a<strong>de</strong>re à argumentação eleática que o impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> aceitar a geração a partir do não-ser(Ibid. 26-35). Para a ultrapassar, propõe a tese <strong>de</strong> que as substâncias “provêm <strong>de</strong> entes jáinerentes” <strong>na</strong> mistura origi<strong>na</strong>l, “mas imperceptíveis a nós <strong>de</strong>vido à pequenez dos volumes” 36(Ibid. 31-32, 35-37; vi<strong>de</strong> A<strong>na</strong>xágoras DK59B3).No entanto, após a crítica circunstancia<strong>da</strong> <strong>da</strong>s opiniões <strong>de</strong> A<strong>na</strong>xágoras (A4,187b7-188a18), alarga<strong>da</strong>, em A5, a todos os Físicos 37 , Aristóteles, concor<strong>da</strong>ndo com eles, tor<strong>na</strong> ainsistir em apontar os contrários como os princípios <strong>de</strong> que se <strong>de</strong>ve partir para explicar agênese (A5,188a26-30; 188b26-189a10 38 ). Justifica o seu assentimento pela distinção, atrásaponta<strong>da</strong>, entre a alteração e a geração e corrupção, incluindo entre os contrários osintermediários nos processos <strong>de</strong> geração e corrupção. Po<strong>de</strong> então concluir:“....tudo o que vem a ser provém dos contrários, bem como tudo que se corrompe secorrompe nos contrários (e em seus intermediários)” (188b22-24).No entanto, antes <strong>de</strong> abor<strong>da</strong>r a exposição <strong>da</strong> teoria que Aristóteles vai propor, adistinção entre geração/corrupção e alteração merece um comentário aprofun<strong>da</strong>do que obrigaa exami<strong>na</strong>r resumi<strong>da</strong>mente a proposta física <strong>de</strong> A<strong>na</strong>xágoras.A FÍSICA DA ANAXÁGORASPo<strong>de</strong>rá perguntar-se por que inci<strong>de</strong> em A<strong>na</strong>xágoras o foco <strong>da</strong> crítica <strong>de</strong> Aristóteles.Sugeri atrás que a resposta a esta pergunta começa a ser <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> <strong>na</strong>s críticas apresenta<strong>da</strong>s aParmêni<strong>de</strong>s. Se o ser eleático correspon<strong>de</strong> ao mundo físico, a ele se aplicam, por um lado,tanto os argumentos a favor <strong>da</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> e imobili<strong>da</strong><strong>de</strong>/imutabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do ser; quanto, por outro,a proibição <strong>da</strong> geração e corrupção a partir do ser ou do não-ser.35 Na tradução cita<strong>da</strong>: “discrimi<strong>na</strong>m”. O verbo ekkrinesthai, do qual se propõem duas traduções, recorreconstantemente ao longo <strong>de</strong> to<strong>da</strong> a crítica a A<strong>na</strong>xágoras.36 Angioni 2009.37 Nos quais estranhamente inclui Parmêni<strong>de</strong>s, a quem, como se viu, atribui uma cosmologia dualista (Fís.A5,188a20-22). Mas a “estranheza” po<strong>de</strong>rá ter a explicação atrás referi<strong>da</strong> (vi<strong>de</strong> Aristóteles Do céu Γ1,298b19-25, GC A8,325a13-23: DK28A25; Plutarco Adv. Col. 13, p. 1114D; Simplício fís. 38,20; 25,15: DK28A34).Vi<strong>de</strong> ain<strong>da</strong> J. T. Santos, “Presença <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> eleática ...”, www.filosofiaantiga.com.38 Neste passo, Aristóteles compara as espécies <strong>de</strong> contrários (p. ex. “quente/frio”, “raro-<strong>de</strong>nso”), regressando àdistinção introdutória a A, entre “mais cognoscíveis” pela Razão ou pela sensação. O ponto mais sutil <strong>da</strong> suaanálise resi<strong>de</strong> <strong>na</strong> a<strong>na</strong>logia que une os Físicos em torno <strong>da</strong> contrarie<strong>da</strong><strong>de</strong>, mesmo quando apontam diferentesespécies <strong>de</strong> contrários. Creio que por <strong>de</strong>trás <strong>de</strong>ste ponto se acha a importante tese proposta adiante segundo aqual “a <strong><strong>na</strong>tureza</strong> que está subjacente po<strong>de</strong> ser reconheci<strong>da</strong> por a<strong>na</strong>logia” (A7,191a7-8; ver a nota sobre a“matéria prima”, em Angioni 2009, 163-165). Tal como, no que respeita ao substrato – a matéria –, os contráriospo<strong>de</strong>m ser reconhecidos por a<strong>na</strong>logia.31
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