○ ○ ○ ○IntroduçãoO período recente tem sidomarcado por uma relativa turbulênciana arena <strong>da</strong> regulamentação profissionalna área <strong>da</strong> Saúde. Mais que aum crescimento simplesmente quantitativo,assiste-se a uma importantediferenciação destas deman<strong>da</strong>s e istoem duas direções. Em primeiro lugar,assiste-se a uma ampliação <strong>da</strong>saudiências <strong>da</strong> regulamentação profissional.Muitas <strong>da</strong>s disputas entre asprofissões do setor que eram trava<strong>da</strong>sprincipalmente nos locais de trabalhoatingem hoje, com renovado vigor, aesfera pública. E mais que isso, se osesforços realizados pelas profissõespara alcançar seus pleitos se dirigiam,até muito recentemente, sobretudo,aos apoios do poder legislativo e ao“convencimento” do executivo, hojeeles avançam em direção à opiniãopública e ao judiciário. Este último,que era acionado principalmente pararesolver disputas individuais,envolvendo especialmente processosde erro profissional e questões relaciona<strong>da</strong>sà prática ilegal <strong>da</strong>s profissões,passa a ser crescentementechamado para resolver disputascoletivas entre as profissões. Asprofissões de saúde têm se valido ca<strong>da</strong>vez mais de decisões judiciais paralegitimar, em contextos mais amplos,as resoluções expedi<strong>da</strong>s pelos respectivosconselhos profissionais. Asdisputas em torno do exercício pleno<strong>da</strong> acupuntura pelos diversos profissionaisde saúde, constituem apenasum, dentre muitos exemplos. Essatransformação é decisiva, uma vez queo judiciário passa a ser um ator depeso no processo de legitimação <strong>da</strong>sdeman<strong>da</strong>s de regulamentaçãoprofissional. É preciso notar que essemovimento se inscreve dentro de umprocesso mais amplo que correspondeao que Habermas (1987), entre outrosautores, define como processo dejudicialização <strong>da</strong>s políticas sociais,característico <strong>da</strong>s democraciascontemporâneas 1 .Em segundo lugar, é possívelidentificar uma nova quali<strong>da</strong>de nasdeman<strong>da</strong>s de regulamentação profissionalna área <strong>da</strong> Saúde. Na ver<strong>da</strong>de,observa-se uma duali<strong>da</strong>de nas deman<strong>da</strong>s.Por um lado, as profissõesregulamenta<strong>da</strong>s do setor, comprerrogativas de autogovernar-se,disputam em torno dos atos privativosou exclusivos. Numa palavra, oaumento <strong>da</strong> concorrência interprofissionaltem levado a uma disputa porampliação de prerrogativas monopólicasno exercício de ativi<strong>da</strong>des eserviços profissionais na área <strong>da</strong>Saúde. Os recentes Projetos de Lei do“Ato Médico” e do “Ato de Enfermagem”constituem os exemplos maisclaros. Ao lado dessas deman<strong>da</strong>s,existem aquelas que expressam, maisque tudo, lutas por reconhecimento.A maior parte dos projetos relativosàs práticas complementares e alternativase à regularização de profissõesexerci<strong>da</strong>s de forma ilegal (os práticos),que constituem a maioria dosprojetos tramitando no Congresso, selocaliza nesta segun<strong>da</strong> categoria. Oreconhecimento dessa duali<strong>da</strong>de nasdeman<strong>da</strong>s de regulamentação profissionaltem implicações práticas eteóricas. No plano teórico, a questãoexige uma abor<strong>da</strong>gem que ultrapasseexplicações relativas aos processos deprofissionalização baseados exclusivamentena realização do “autointeresse”e <strong>da</strong> concorrência por jurisdiçõesde trabalho. É preciso incorporaràs análises, a categoria do reconhecimentosocial, trata<strong>da</strong> noâmbito <strong>da</strong>s chama<strong>da</strong>s políticas <strong>da</strong>diferença e <strong>da</strong>s políticas do reconhecimento.No plano prático, a questãoexige um tratamento diferenciadodessas deman<strong>da</strong>s, se quisermos, paradizer o mínimo, <strong>da</strong>r a elas um tratamentojusto e digno de uma socie<strong>da</strong>dedemocrática “inclusionista”.O presente artigo tem comoobjetivo trazer à tona alguns elementosque, acreditamos, contribuemcomo subsídio para este debate.Apresentamos, de início aspectosgerais <strong>da</strong> regulação entendi<strong>da</strong> comoempreendimento simultaneamenteético e econômico. Em segui<strong>da</strong> dis-1 Para uma discussão do processo, ver especialmenteVianna et al.(1999).Formação31
○ ○ ○ ○cutimos razões, vantagens e problemasatribuídos à regulamentação<strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des profissionais, com focona área <strong>da</strong> Saúde. À luz dessas considerações,trazemos alguns exemplosrepresentativos do que chamamos denovo paradigma <strong>da</strong> regulamentaçãoprofissional, desenvolvidos em experiênciasinternacionais para finalmentesituarmos a questão nacional dentrode um contexto mais amplo de possibili<strong>da</strong>desde entendimento e ação.Considerações gerais sobre a regulaçãoNa tradição <strong>da</strong> economia política,o termo regulação engloba um amploespectro de políticas disciplinadoras<strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>des econômicas e sociais,visando não apenas seu controle comoà prevenção ou atenuação de suasconseqüências para a comuni<strong>da</strong>de. Noprimeiro caso, fala-se em regulaçãoeconômica e no segundo, em regulaçãosocial (Samuelson, 1992). Esquematicamentefalando, as políticas dessaregulação compreendem regras deentra<strong>da</strong> e saí<strong>da</strong> em determinadosmercados, controle dos preços e lucros,varie<strong>da</strong>de e padrões de quali<strong>da</strong>de dosbens e serviços, regras de concorrênciaetc. A regulação econômica se justificapela existência de falhas de mercado,por motivos que envolvem economiasde escala (por exemplo, na produçãode bens públicos), concentração depoder de mercado (monopólios) e graveslacunas de informação entre produtorese consumidores ou clientes. Por seuturno, a regulação social visa conter avarie<strong>da</strong>de de efeitos negativos ouexternali<strong>da</strong>des que resultam domovimento normal <strong>da</strong> economia,incluindo as regulações ambientais edemais medi<strong>da</strong>s para promover a saúdee a segurança dos trabalhadores econsumidores. Juntamente com aspolíticas redistributivas e as políticasmacroeconômicas de estabilização, aregulação dos mercados constitui otriunvirato <strong>da</strong>s intervenções legítimasdo Estado na economia.De um modo bastante simplificado,o que existe de comum emto<strong>da</strong> e qualquer regulação é que elarepresenta uma “restrição intencional<strong>da</strong> livre escolha de um sujeito provenientede uma fonte externa que nãoas partes diretamente envolvi<strong>da</strong>s”(Mitnick, 1989). Em outros termos,a regulação corresponde a umaintervenção pública (ou <strong>da</strong> política)sobre a soberania dos mercados (oudo jogo <strong>da</strong>s trocas entre os agentesdescentralizados na economia).Um dos resultados <strong>da</strong> regulação –muitas vezes mesmo um dos seusobjetivos – é que ela opera umaredistribuição de riscos e privilégios,vantagens e prejuízos entre pessoas,grupos e setores <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de por elaafetados, num sentido distinto <strong>da</strong>queleque seria o resultado <strong>da</strong>s interações seestas fossem deixa<strong>da</strong>s ao livre sabor <strong>da</strong>sforças do mercado – entendido aqui naacepção braudeliana de um “jogo detrocas” entre agentes descentralizados.Por isso, precisamente, umsignificado socialmente compartilhadonas socie<strong>da</strong>des que valorizama “liber<strong>da</strong>de” dos mercados e aautonomia decisória dos indivíduos,é que to<strong>da</strong> regulação, para ser vistacomo legítima ou não tirânica, deveser constantemente justifica<strong>da</strong> e nãoapenas em termos de eficiênciaalocativa, mas também de justiçadistributiva 2 . Nesse sentido, a regulaçãotem que propiciar alocações edistribuições não apenas diferentes,mas melhores que a dos mercados.Pode-se dizer, com efeito, que to<strong>da</strong> acrítica <strong>da</strong> regulação <strong>da</strong>s teorias que avinculam a políticas de grupos deinteresse até as teorias que concebema regulação como apenas mais umadentre as mercadorias troca<strong>da</strong>s nomercado <strong>da</strong> política e <strong>da</strong>s burocraciaspúblicas, que carregam, em comum,este traço 3 . Varia, no entanto, o pesoque atribuem ca<strong>da</strong> uma delas aostrade offs entre eficiência e justiça.2 Utilizo o termo tirania na acepção de Fishkin (1979).3 Na ver<strong>da</strong>de, a discussão sobre os benefíciosdiferenciais <strong>da</strong> regulamentação <strong>da</strong>s ativi<strong>da</strong>deseconômicas e sociais – e mais restritamente, <strong>da</strong>intervenção governamental – tem ocupado to<strong>da</strong> ahistória <strong>da</strong> economia moderna, com o pêndulo<strong>da</strong>s avaliações, ora tendendo para o lado dosconsumidores de bens e serviços, ora para o lado<strong>da</strong>s indústrias e negócios regulados – o fiel semprerepresentado pela noção <strong>da</strong> utili<strong>da</strong>de pública. Aracionali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> regulação, esgrimi<strong>da</strong> tanto porseus defensores como detratores, é apresenta<strong>da</strong>: autili<strong>da</strong>de ou o interesse público.32Nº 05 MAIO DE 2002
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