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da Tulipa CANTORA E COMPOSITORA LANÇA TUDO TANTO E ...

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TEXTO juliana faddulFOTOS alexia santi“O que aconteceria se Deus fosse almoçar?” Foi esse pensamento que motivou Ferréz a escreverDeus Foi Almoçar (Editora Planeta, 2012), após ver uma bati<strong>da</strong> de carro envolvendo umacriança e um cachorro em seu bairro, o Capão Redondo, na zona sul de São Paulo. Morador <strong>da</strong>periferia desde a infância, Reginaldo Ferreira <strong>da</strong> Silva, como consta em seus documentos, acabouse consagrando, aos 36 anos, um dos grandes nomes <strong>da</strong> literatura marginal <strong>da</strong> atuali<strong>da</strong>de.To<strong>da</strong>via, seu papel como agente social está com os dias contados. Mais calmo, mas não menosindignado, Ferréz tenta mostrar um lado mais literário numa obra que prioriza os conflitos internosaos externos e sociais. O personagem <strong>da</strong> trama é Calixto, um homem aparentemente comume passivo, bem diferente dos heróis protagonistas de grandes romances. O intuito é mostrar adensi<strong>da</strong>de psicológica do personagem e como a vi<strong>da</strong> age por nós, sem ao menos percebermos.Você passou oito anos escrevendo Deus Foi Almoçar.Como foi esse processo?FERRÉZ: Quando terminei o Manual [Prático do Ódio](Editora Objetiva, 2003) me veio à cabeça o nome DeusFoi Almoçar. Eu queria escrever sobre um personagemapenas, diferentemente dos meus outros livros. Entãoveio o Calixto. Queria fazer uma história que não fosseconstruí<strong>da</strong>, mas, sim, desconstruí<strong>da</strong>. Todo mito é construído.A ideia era mu<strong>da</strong>r isso. A forma de narrar de umjeito, de pôr um personagem falando de outro. Foi tudopensado para resultar num livro diferente.Diferentemente dos seus outros livros, esse não sepassa no Capão. É um lugar indeterminado. Por quê?FERRÉZ: Eu sofri muito por causa de alguns livros. Vocêacaba virando porta-voz de certa cultura, de certa literatura.Tinha época em que eu estava num aniversário euma pessoa falava: “Eu tenho uma história para te contar.Morreram três caras na minha rua”. Eu não queriaser cronista do inferno a vi<strong>da</strong> to<strong>da</strong>. Eu já moro no tema.Ter de remoer isso é doloroso. Não é que não vou maisabor<strong>da</strong>r o assunto, mas nesse romance eu quis mostraroutro tipo de treta, o conflito interno. Eu tenho ONG naminha quebra<strong>da</strong> e vários projetos sociais. Tenho essecompromisso forte, mas também quero ser livre parapoder exercer o meu lado criativo. Eu sou escritor, né?Esse livro é a sua libertação? Ou você acreditaque ain<strong>da</strong> há muita coisa a ser debati<strong>da</strong>?FERRÉZ: Eu acho que é apenas uma <strong>da</strong>s correntes,um pulso que já se soltou. O outro vai se soltar, talvez,no próximo livro. Na ver<strong>da</strong>de, acho que mesmo noNinguém É Inocente em São Paulo (Editora Objetiva,2006) eu já estava trazendo uma mu<strong>da</strong>nça. Claro queo protesto e o tema social estão ali, mas também querofazer o que minha cabeça pedir.“EU NÃO QUERIA SER CRONISTA DOINFERNO A VIDA TODA. EU JÁ MORO NOTEMA. TER DE REMOER ISSO É DOLOROSO.”Você acha que a cobrança <strong>da</strong>s pessoas tem melhorado?FERRÉZ: Tem melhorado, mas porque eu também comeceia impor isso. Você representa o bairro também.Se fala alguma coisa, alguma besteira, é como se o bairrotodo falasse isso. Tem um monte de gente aqui quequer ouvir o que você vai falar. Já tenho brigas demais,já colecionei muito inimigo. Chegou uma hora que ficoufo<strong>da</strong>. Decidi que vou fazer meu trampo e prestaratenção na minha família e nos meus amigos. Eu sóquero ser escritor. Só.Essa responsabili<strong>da</strong>de lhe foi imposta, então?FERRÉZ: Sim. Veio com o pacote de entrevista no Jô Soares,na TV Cultura. Você não fala do tema? Ah, entãovamos pôr o tema em ação. É como se fosse um castigo.É como se Zezé Di Camargo & Luciano tivessem de transarcom todo mundo porque falam de amor. Rola umacobrança. Tenho responsabili<strong>da</strong>de social, mas tambémpreciso desenvolver a literatura.Você está mais calmo nesse livro. Você acha que oCapão melhorou?FERRÉZ: Acho, mas hoje eu vejo um monte de gente comcarro gigantesco em torno de si e na<strong>da</strong> dentro. Incrívelcomo o cara ocupou to<strong>da</strong> a carência dele com coisas queele pode comprar, mas não trabalhou melhor a família.Eu queria colocar no livro um pouco desse conflito, queagora é interno. A gente, <strong>da</strong> periferia, também tem conflitosinternos. To<strong>da</strong>s as classes passam por isso. Queriaretratar esse cara, que não quer mu<strong>da</strong>r, mas as coisas estãomu<strong>da</strong>ndo em volta dele. É mais ou menos o que avi<strong>da</strong> faz com a gente, né? Você pode ter uma carreira eaté achar que ela está defini<strong>da</strong>, mas o sistema está mu<strong>da</strong>ndoe articulando por você. Enquanto você não pensa,ele está agindo. Daqui a cinco anos você pensa: “Nossa,o que estou fazendo aqui?”. É meio o que o Calixto pensa.As coisas não têm mais sentido para ele.33CONTINUUM32

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