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A legitimação do intelectual negro no meio acadêmico brasileiro

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Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s por causa de sua cor. Segun<strong>do</strong> Landes, o rosto de ÉdisonCarneiro se contorceu como se ela o tivesse chicotea<strong>do</strong> sobre os olhos.“Agoniada”, Ruth Landes pensou que um america<strong>no</strong> — branco, acrescento— não devia fazer tais coisas a um mulato aristocrata, erudito.63 Para mim, a contorção <strong>do</strong> rosto de Édison é o receio <strong>do</strong> <strong>intelectual</strong>fora de lugar de transformar uma “cicatriz (contorção) psicológica” emautovitimização. E por que evitamos a discussão sobre a “cicatriz psicológica”da identidade negra?Um <strong>intelectual</strong> deve evitar a vitimização, sob o risco de não sairde si mesmo e fragilizar sua argumentação científica. Para o <strong>intelectual</strong><strong>negro</strong>, evitar, o que é de fato um risco, torna-se muitas vezes esquecerque pertence a um segmento social que nunca foi alcança<strong>do</strong> por políticaspúblicas que atendessem e reparassem a histórica discriminaçãoque esse grupo racial sofre <strong>no</strong> Brasil. Esquecer que este segmento,expressivo na constituição <strong>do</strong> país, parece acreditar que só tem a perdercom o enfrentamento político e científico da questão racial, uma vez quea evocação da harmonia racial, <strong>do</strong> mínimo de tensão, o desprezo àproblematização coletiva de uma situação dramática, é uma solução queatende tanto aos interesses pessoais e imediatos <strong>do</strong>s brancos, racistas enão racistas, beneficia<strong>do</strong>s por uma determinada ordem racial, política,social e econômica que naturaliza, ou racializa, seus poderes e privilégios,quanto <strong>do</strong>s <strong>negro</strong>s, convenci<strong>do</strong>s de que o melhor é a busca por satisfaçãoindividual ou da pequena coletividade que pertence.No PPGAS da Universidade de Brasília, <strong>no</strong> a<strong>no</strong> de 1998, eu era oúnico <strong>do</strong>utoran<strong>do</strong> <strong>negro</strong> e, segun<strong>do</strong> informações extra-oficiais, o primeiroem toda a história <strong>do</strong> curso de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> e o primeiro também a ser reprova<strong>do</strong>numa disciplina obrigatória. Decidi ir para a UnB, apostan<strong>do</strong> napositividade <strong>do</strong> deslocamento espacial, temporal e de hierarquia social 64 ,<strong>no</strong> enriquecimento <strong>intelectual</strong> e huma<strong>no</strong> que um programa ti<strong>do</strong> como deexcelência, instala<strong>do</strong> numa cidade atípica e inóspita, poderia me oferecer.Negro, homossexual, baia<strong>no</strong>, egresso de outra área disciplinar, num<strong>meio</strong> conserva<strong>do</strong>r, tornei-me potencial vítima e agente desestabiliza<strong>do</strong>rde uma estrutura social cujo curso regular das <strong>no</strong>rmas, desconhecia.64Claude Lévi-Strauss, Tristes Trópicos, São Paulo, Companhia das Letras, 1996.Afro-Ásia, 25-26 (2001), 281-312 307

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