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O Brasil de Betinho - Ibase

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<strong>de</strong>Orasil<strong>Betinho</strong>REALIZAÇÃO:PATROCÍNIO:


ORGANIZADORESDulce PandolfiAugusto GazirLucas Corrêa


Realização:Patrocínio:


Um ousado cidadão brasileiroOlivro O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> é um sopronas brasas vivas da lembrança. Lembraré viver. <strong>Betinho</strong> se foi, docemente,em casa, com amigos e Maria, 15anos atrás. Mas a lembrança <strong>de</strong> sua ousadia empensar e fazer, em sonhar e propor, em criticar eagir, sem per<strong>de</strong>r o humor, ficará sempre viva. Eleencampou em seu corpo franzino uma motivaçãoprofundamente humana e ética, uma enorme capacida<strong>de</strong><strong>de</strong> indignar-se frente à mínima injustiça,e uma corajosa e generosa luta na promoção dosdireitos e da cidadania. Não foi um carrancudo,pelo contrário, soube emocionar-se diante dasnossas crianças <strong>de</strong> rua, dos <strong>de</strong>serdados, dos quevivem em lixões, dos que lutam por seu direito <strong>de</strong>viver, dos que praticam a solidarieda<strong>de</strong>, dos queexprimem tudo isto na música, na arte, na dança,na literatura. Sua fina crítica do humanamente“inaceitável” e sua luta incansável pela <strong>de</strong>mocraciacombinaram ousadia <strong>de</strong> sonho, <strong>de</strong>terminação,ironia, poesia e prazer <strong>de</strong> viver. Enfim, uma espécie<strong>de</strong> herói na sua exemplarida<strong>de</strong> cidadã. Foi umprivilégio conviver com o <strong>Betinho</strong> e compartilharos seus sonhos e i<strong>de</strong>ias.A sensação que a gente tem folheando este livroé que estamos diante da história do <strong>Brasil</strong> dosanos 50 ao final dos 90, do século passado, sendovivida, feita e pensada na singularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> umintelectual militante como o <strong>Betinho</strong>. São fios <strong>de</strong>história que surgem nos momentos, imagens, opções,ações e reflexões do <strong>Betinho</strong>, que agregamsentido e revelam dimensões importantes paraenten<strong>de</strong>r tanto as contradições em ação no período,como o diferencial que faz a ação humana.No livro, <strong>Betinho</strong> se revela plenamente como atore testemunha, ator que tece a ação e reflete sobreela, entre muitos atores e fazeres <strong>de</strong> seu tempo.O <strong>Ibase</strong>, organização <strong>de</strong> cidadania ativa, pública enão estatal, é parte direta <strong>de</strong>sta história do <strong>Betinho</strong> edo <strong>Brasil</strong>. Com este livro procuramos, nós mesmos,resgatar o que ele nos legou, sobretudo a dimensãoda política, da cidadania viva, da construção <strong>de</strong>mocrática,com ousadia e humanida<strong>de</strong>, com gentileza,por assim dizer. É uma satisfação socializar tal legado<strong>de</strong> uma história <strong>de</strong> busca generosa – vivida plenamente,no dia a dia, apesar das adversida<strong>de</strong>s – <strong>de</strong> ummundo melhor, <strong>de</strong> felicida<strong>de</strong> para todos e todas, nadiversida<strong>de</strong> com igualda<strong>de</strong> cidadã.Cândido Grzybowskisociólogo e diretor do <strong>Ibase</strong>


SumárioApresentação 13O nascimento na Revolta 17Vida e morte juntas 25A revolução se faz, não acontece 29A AP e a UNE 35Sem a política não se vive 39O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> JK 47O estado <strong>de</strong> circo 51Reforma ou revolução? 57o patricídio 61A ditadura e os seus turnos 71O AI-5 e o Milagre 77Da distensão à Abertura 83Da “guerra popular” ao exílio 87Ao exílio 93Anistia 101A tragédia grega 105Diretas Já 113A Nova República 117Constituinte 125Tragédia, <strong>de</strong> novo 129O fim da <strong>de</strong>sgraça 133A vez da cidadania 137Reforma agrária 145Rio <strong>de</strong> Janeiro 151Eco-92 157Ação da Cidadania 163O que é <strong>de</strong>mocracia 175Um sociólogo no po<strong>de</strong>r 181Aids, luta política 187O caso do jogo do bicho 203O fim da mudança 207Cronologia 210


O<strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> marca os 15 anos da morte <strong>de</strong>Herbert José <strong>de</strong> Souza, o <strong>Betinho</strong>, completadosem 2012. O livro reúne pensamentos, tiradas,falas <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> sobre 60 anos <strong>de</strong> história recentedo <strong>Brasil</strong>. Selecionadas <strong>de</strong> livros, textos e entrevistas <strong>de</strong>diferentes épocas, as citações <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> tratam <strong>de</strong> eventosocorridos do seu nascimento, em 3 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1935,até a sua morte, aos 61 anos, em 9 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 97. O fundadorda Ação Popular, o militante maoísta, o exilado político,o criador do <strong>Ibase</strong>, o coor<strong>de</strong>nador da Ação da Cidadaniacontra a Fome, o ativista da aids, o sociólogo <strong>Betinho</strong> participou<strong>de</strong> muitos dos momentos por ele aqui comentados.Em O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>, o relato e a reflexão do sociólogosobre os fatos históricos se confun<strong>de</strong>m com a <strong>de</strong>scrição e aanálise <strong>de</strong>le sobre a sua própria trajetória, já que ela foi tãomarcada pelas distintas conjunturas políticas, quanto as influencioue <strong>de</strong>finiu. Vida e história nesse caso revelam muitouma sobre a outra.Apesar <strong>de</strong> agrupadas <strong>de</strong> formas temática e cronológica,as citações <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> mantêm certa soberania entre elas eem relação aos <strong>de</strong>mais conteúdos da publicação. Não há umtexto-guia que as costure ou algo do gênero. A opção foi pelomosaico. Os organizadores se limitam a uma <strong>de</strong>scrição docontexto histórico no início <strong>de</strong> cada capítulo e subcapítuloe às legendas das imagens. Fotografias, ilustrações,reproduções <strong>de</strong> documentos são parte <strong>de</strong>stacada do mosaico.O papel <strong>de</strong>las é menos ilustrar as aspas <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>, emais estabelecer o clima e o ambiente do período sobre oqual os comentários tratam e ao qual eles pertencem. Nacomposição entre imagens e citações, O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>propicia a contemplação e o passeio históricos.


O livro se divi<strong>de</strong> em nove capítulos: “O nascimentona Revolta”, “A revolução se faz, nãoacontece”, “Sem a política não se vive”, “O patricídio”,“A ditadura e os seus turnos”, “Da ‘guerrapopular’ ao exílio”, “A tragédia grega”, “A vezda cidadania” e, por último, “Aids, luta política”.Neles, <strong>Betinho</strong> fala da Revolta Comunista<strong>de</strong> 1935, ocorrida no mês em que ele nasceu, dasua infância, da militância política católica, daUnião Nacional dos Estudantes (UNE), da fundaçãoda Ação Popular, dos governos <strong>de</strong> GetúlioVargas, JK, Jânio Quadros e João Goulart, dogolpe <strong>de</strong> 1964, do regime militar, do combateà ditadura, da clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>, do exílio, da re<strong>de</strong>mocratização,da ascensão e da <strong>de</strong>rrocada <strong>de</strong>Fernando Collor, do <strong>Ibase</strong>, da Campanha contraa Fome, da Presidência <strong>de</strong> Fernando HenriqueCardoso, da tragédia da aids e da luta contra adoença. Encartado na publicação, há um DVDcom quatro ví<strong>de</strong>os: O dia da cura, um curta <strong>de</strong>ficção sobre a aids, em que <strong>Betinho</strong> faz participaçãoespecial, Super-<strong>Betinho</strong>, em que o próprio éentrevistado, e dois filmes da Ação da Cidadania,um <strong>de</strong>les com o <strong>de</strong>poimento do sociólogo.O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> é <strong>de</strong>vedor <strong>de</strong> uma série <strong>de</strong>outras iniciativas, que lhe serviram como fonte,parâmetro, inspiração. Ele só foi possível graçasespecialmente a três projetos anteriores sobre <strong>Betinho</strong>.A principal referência e fonte <strong>de</strong>ste livro éOs caminhos da <strong>de</strong>mocracia (2009), filme do CanalImaginário, em que <strong>Betinho</strong> discute a história do<strong>Brasil</strong>. Os realizadores do documentário gravaramquase 20 horas <strong>de</strong> entrevistas com o sociólogo,pouco antes <strong>de</strong> ele morrer. O segundo projeto quenorteia o livro é a exposição <strong>Betinho</strong> e o <strong>Ibase</strong>, montadaem 2011 na Caixa Cultural Rio <strong>de</strong> Janeiro,por conta dos 30 anos <strong>de</strong> vida da entida<strong>de</strong> criadapor <strong>Betinho</strong>. O esforço <strong>de</strong> seleção e organização domaterial para a mostra muito ajudou na empreitada<strong>de</strong>sta publicação. A terceira referência marcanteé Um abraço, <strong>Betinho</strong> (2005), livro no qual DulcePandolfi e Luciana Heymann navegam pelas cartas,documentos e materiais diversos do ArquivoHerbert <strong>de</strong> Souza, que se encontra no Centro <strong>de</strong>Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação GetúlioVargas (FGV).Por fim, fica aqui registrado o agra<strong>de</strong>cimento especiala pessoas e instituições que colaboraram <strong>de</strong>forma <strong>de</strong>cisiva com a organização e a edição <strong>de</strong> O<strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>. O CPDOC da FGV ce<strong>de</strong>u a gran<strong>de</strong>maioria das imagens históricas <strong>de</strong>ste livro. A generosida<strong>de</strong>do CPDOC, a gentileza e a paciência dos estagiáriose pesquisadores da instituição foram chavespara que O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> fosse viabilizado. Cley<strong>de</strong>Afonso, do Canal Imaginário, foi incentivadora ecompanheira do projeto, como tem sido <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>e do <strong>Ibase</strong> há décadas. France Martin, uma das poucascaricaturistas mulheres do <strong>Brasil</strong>, não hesitou emnos ce<strong>de</strong>r o <strong>de</strong>senho que ilustra a capa do livro. Muitoobrigado também a Izabel Ferreira e Raquel Silva,ao Museu Histórico da Or<strong>de</strong>m dos Advogados do<strong>Brasil</strong> (OAB), ao Museu da Comunicação HipólitoJosé da Costa, ao Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação(CPDoc) do Jornal do <strong>Brasil</strong>, à revista Isto É e àFundação Maurício Grabois.Bem-vindos ao <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>. Boa leitura.Boa viagem.14O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Os revoltosos <strong>de</strong> 1935na Praia Vermelha,no Rio <strong>de</strong> JaneiroO nascimento na Revolta


(“Mas a verda<strong>de</strong> éque 1935 é um anoque tem seu charme:aí nascia em plena or<strong>de</strong>m e progresso,contra um bando <strong>de</strong> latifundiários, a i<strong>de</strong>ia<strong>de</strong> uma revolução que nunca foi capaz<strong>de</strong> transformar-se em realida<strong>de</strong>.”[ betinho, em Sem vergonha da utopia, p. 15 ](


Quartel da Força Pública Militardo Rio Gran<strong>de</strong> do Norte <strong>de</strong>pois doatAQue dos revoltosos <strong>de</strong> 1935Um dos nove filhos <strong>de</strong> Henrique José <strong>de</strong> Souza e Maria da ConceiçãoFigueiredo <strong>de</strong> Souza, Herbert José <strong>de</strong> Souza, o <strong>Betinho</strong>,nasceu em novembro <strong>de</strong> 1935, mês da Revolta Comunista,chamada por alguns <strong>de</strong> Intentona, ação da Aliança NacionalLibertadora (ANL) para tomar o po<strong>de</strong>r no <strong>Brasil</strong>. O movimento tinhacomo lí<strong>de</strong>r o comunista Luís Carlos Prestes. O levante foi reprimido e<strong>de</strong>rrotado pelo regime <strong>de</strong> Getúlio Vargas, que dois anos <strong>de</strong>pois instalaria oEstado Novo no país.O nascimento na Revolta19


Integralistas <strong>de</strong> Viçosa do ceará“A época <strong>de</strong> Getúliofoi um tempo <strong>de</strong>gran<strong>de</strong> acirramentodas lutas i<strong>de</strong>ológicas,época em que houve o integralismo, que era a versãocabocla do nazismo, com Plínio Salgado <strong>de</strong> um ladoe o Partido Comunista <strong>de</strong> outro. Aquilo foi a guerrafria, foi a guerra i<strong>de</strong>ológica, a luta i<strong>de</strong>ológica. No<strong>Brasil</strong> isso estava presente <strong>de</strong> forma muito viva, comconflitos, com tentativas <strong>de</strong> assalto ao po<strong>de</strong>r, com<strong>de</strong>bates i<strong>de</strong>ológicos, com mobilizações <strong>de</strong> rua.Era realmente um tempo quente.”[ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 7 ]20O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Membros do governo revolucionário no RNHino da ANLNosso povo que vive oprimidoJá não po<strong>de</strong> sofrer tanta dorÉ preciso fazer do gemidoUma voz <strong>de</strong> esperança e amor;Nosso peito há <strong>de</strong> ser a muralhaContra quem explorar a Nação.Esse povo que vive e trabalhaQuer justiça, quer Terra, quer Pão!Aliança! Aliança!Contra vinte ou contra mil!Mostraremos nossa pujança!Libertemos o <strong>Brasil</strong>!O nascimento na Revolta21


Com o <strong>de</strong>clínio domovimento armadodo Nor<strong>de</strong>ste, voltAVA a população atranquilizar-se, quando ontem, pela manhã,a cida<strong>de</strong> amanheceu alarmada pelo levante daPraia Vermelha e da Escola <strong>de</strong> Aviação.Com admirável espírito <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m, firmemente aolado da legalida<strong>de</strong>, o povo prestigiou o governo,pela confiança com que assistiu às medidastomadas para serem jugulados os rebel<strong>de</strong>s.[ texto do Jornal do <strong>Brasil</strong> DE 28/11/1935 ]22


Luís CARLOS Prestes, lí<strong>de</strong>rdo levante <strong>de</strong> 1935, noTribunal <strong>de</strong> SegurançaNacional, em 36A Aliança Nacional Libertadora (ANL) foi criada emmarço <strong>de</strong> 1935. O seu presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> honra era o lí<strong>de</strong>r comunistaLuís Carlos Prestes. A ANL <strong>de</strong>fendia propostasnacionalistas e tinha como ban<strong>de</strong>ira a luta pela reformaagrária. Embora li<strong>de</strong>rada pelos comunistas, conseguiucongregar os mais diversos setores da socieda<strong>de</strong> e rapidamentetornou-se um movimento <strong>de</strong> massas. Muitos <strong>de</strong>siludidoscom o rumo do processo político iniciado em 1930,quando Getúlio Vargas, pela força das armas, assumiu aPresidência da República, a<strong>de</strong>riram ao movimento.Em julho <strong>de</strong> 1935, a ANL foi posta na ilegalida<strong>de</strong>. Em agosto,a organização intensificou os preparativos para um movimentoarmado com o objetivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>rrubar Vargas. O primeirolevante militar foi <strong>de</strong>flagrado no dia 23 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1935,na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Natal (RN). No dia seguinte, outro ocorreu emRecife (PE). No dia 27, a revolta eclodiu no Rio <strong>de</strong> Janeiro, entãoDistrito Fe<strong>de</strong>ral. As rebeliões foram rapidamente <strong>de</strong>beladas.A partir daí, uma forte repressão se abateu não só contraos comunistas, mas contra todos os opositores do governo.A revolta forneceu pretexto para o endurecimento do regime,o que culminou com o golpe <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> novembro<strong>de</strong> 1937, que fechou o Congresso, cancelou eleiçõese manteve Vargas no po<strong>de</strong>r. Instituiu-se assim uma ditadurano país, o chamado Estado Novo, que foi até 1945.“Eu nasci parao <strong>de</strong>sastre, porémcom sorte. Nasci vivo ehemofílico em Bocaiúva, Minas Gerais.Era uma madrugada <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> novembro<strong>de</strong> 1935. Luís Carlos Prestes iniciavasua coluna, e eu, minha vida. Não nosconhecíamos. Pensando bem, Prestes,em 35, não estava na Coluna, mas naIntentona, assim chamada pelos militares,que, na quinta linha <strong>de</strong> meu texto, jácomeçam a perseguir a minha memória.”(<strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 14)O nascimento na Revolta23


(“Quando nasci, e sóaí começa a história,a hemofilia começou.Vida e morte juntas na mesma pessoa: a hemorragiano umbigo foi o começo, já que é no umbigo quetudo começa. (...) Era eu <strong>de</strong> nome Herbert, umahomenagem <strong>de</strong> meu pai a um artista <strong>de</strong> cinemaalemão. Meu pai era o pioneiro do cinema mudo emBocaiúva, e Herbert, o artista, vivia em algum Reich.Eu, hemofílico, em Bocaiúva.”[ <strong>Betinho</strong>, em “eu”, Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ](


O registro do nome <strong>de</strong><strong>Betinho</strong> na certidão <strong>de</strong>nascimento (ao lado) ficouerrado: Herbet. Apesar doengano, <strong>Betinho</strong> usaria oHerbert com os dois erres.Abaixo, <strong>Betinho</strong>, criança,e a casa da sua família.Vida e morte juntasEm 3 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1935, <strong>Betinho</strong> nasceu em Bocaiúva (MG).Nasceu hemofílico, como os seus irmãos. A hemofilia, genéticae hereditária, consiste na ausência <strong>de</strong> fatores sanguíneos responsáveispela coagulação. “Ela [a hemofilia] é muito concreta. Sãohemorragias intra-articulares que disten<strong>de</strong>m os músculos, os tendões, osnervos e a pele. Estes sangramentos enchem e incham a parte afetada, opé, por exemplo, ou o joelho, e provocam dores insuportáveis”, <strong>de</strong>finiucerta vez <strong>Betinho</strong>.O nascimento na Revolta25


“A nossa experiência <strong>de</strong>infância é uma experiênciaon<strong>de</strong> isso que se chama morte,tragédia, tudo que <strong>de</strong>nominam <strong>de</strong> anormal, fazia parte do nosso cotidiano. Omeu cotidiano na infância foi viver numa penitenciária. Isso não é cotidianopara ninguém. Na minha adolescência, o meu cotidiano passou a ser viver numafunerária. Ali estava ninguém mais ninguém menos que o meu próprio pai.Então, on<strong>de</strong> é que meu pai trabalhava, que é a pessoa que você mais quer viva?Numa funerária. A nossa casa pertencia à Santa Casa <strong>de</strong> Misericórdia e era umaextensão da funerária. O Henfil sempre brincou ali, entre os caixões. Brincar coma morte. Nós brincávamos com os símbolos da morte. E a própria i<strong>de</strong>ia da mortese confundia com as nossas brinca<strong>de</strong>iras. O gerente da morte era o nosso pai. (...)O nosso começo estava no fim, e o nosso fim no começo.”[ <strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 8 e 9 ]<strong>Betinho</strong> contraiu aos15 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>tuberculose. Ficou trêsanos confinado em casapor causa da doença.Na página ao lado,<strong>Betinho</strong>, doente,no quintal <strong>de</strong> casa.“Tive uma infância marcada (...)pelo fato <strong>de</strong> ter passado oito anosmorando com minha famílianuma penitenciária, on<strong>de</strong> meu paitrabalhava. Uma parte da infância eda adolescência eu vivi num outroambiente inusitado, uma funerária.Acho que ninguém nasceu numapenitenciária e se criou numafunerária. Eu acho que é umacombinação altamente política.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista Teoria eDebate, nº 16 ]Acima e à direita, betinho na infância26


“Naquele sanatório particularíssimo, eu escuteitodas as novelas do rádio. Li todos os livros queme chegavam às mãos, fiz aeromo<strong>de</strong>lismo, aprendiradiotécnica, tentei a escultura. Três vezes ao diaeu tomava a temperatura. Invariavelmente 37 a 38graus <strong>de</strong> febre. (...) As minhas chances <strong>de</strong> salvaçãoeram muito poucas, ou quase nenhuma. Todomundo chorava. Ninguém <strong>de</strong>sconhecia oresultado <strong>de</strong>sta equação fatal: hemofilia maistuberculose igual à morte.”[ <strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 49 ]“Ao ler o último número da revista semanalO Cruzeiro, a mais importante na época,do grupo <strong>de</strong> Assis Chateaubriand, eu vi oanúncio <strong>de</strong> um remédio, Idrazida, apesentadocomo a mais nova <strong>de</strong>scoberta na cura datuberculose. Deu-se então em mim uma certezainstantânea: este remédio vai me curar. Entrever o anúncio e estar tomando o primeirocomprimido se passaram outros três meses <strong>de</strong>tensa expectativa, até que a Idrazida chegouao comércio <strong>de</strong> Belo Horizonte. O efeito foiigualmente fulminante. Logo nas doses iniciaiseu comecei a engordar. Três meses mais tar<strong>de</strong>eu tirei uma radiografia limpa, a mancha havia<strong>de</strong>saparecido completamente.”[ <strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 51 ]“A família chorouminha morte e <strong>de</strong>cidiuque eu não iria paraum sanatório, mas para o fundodo quintal, para o quarto <strong>de</strong> Maria Leal [empregada dacasa], agora transformado em meu sanatório particular, oúnico <strong>de</strong> Belo Horizonte. Um quarto com duas camas, naoutra dormia seu Henrique [pai <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>], <strong>de</strong>claradominha companhia. Foi construída uma porteira <strong>de</strong>ma<strong>de</strong>ira que me isolava, atrás das gra<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> meus irmãose irmãs. (...) Durante três anos aquele quarto foi minhatrincheira on<strong>de</strong> poucos entravam. O mundo para mimestava dividido entre os tuberculosos e os sãos.”[ <strong>Betinho</strong>, em “Eu”, Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ]O nascimento na Revolta27


Fi<strong>de</strong>l Castro visita o <strong>Brasil</strong> e discursa emreunião da União Nacional dos Estudantes(UNE), no Rio <strong>de</strong> Janeiro, em maio <strong>de</strong> 1959A revolução se faz,não acontece


(“A gran<strong>de</strong> novida<strong>de</strong> políticada América Latina foi aRevolução Cubana.Uma novida<strong>de</strong> que sinalizava o seguinte: a revolução se faz,ela não acontece. Portanto, quem faz a revolução são osrevolucionários, e fazer a revolução é uma tarefa concreta, quetem que ser programada, organizada e feita.”[ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 10 ](


Faixas <strong>de</strong> protesto na fachada da UNE,nos anos 1960Avitória da Revolução Cubana, em janeiro <strong>de</strong> 1959, provocouum gran<strong>de</strong> impacto na esquerda brasileira e, consequentemente,no movimento católico <strong>de</strong> esquerda, no qual <strong>Betinho</strong> militava<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1953. <strong>Betinho</strong> integrou a Juventu<strong>de</strong> Estudantil Católica(JEC) e, <strong>de</strong>pois, a Juventu<strong>de</strong> Universitária Católica (JUC). “Tivemos naJEC um começo, que se politizou mesmo e virou movimento estudantil naJUC, quando disputávamos a direção da UNE”, relembraria <strong>Betinho</strong>.A revolução se faz, não acontece31


Companheiros operáriose camponeses, esta é a revoluçãosocialista e <strong>de</strong>mocrática doshumil<strong>de</strong>s, com os humil<strong>de</strong>s e para oshumil<strong>de</strong>s. E por esta revolução doshumil<strong>de</strong>s e pelos humil<strong>de</strong>s e para oshumil<strong>de</strong>s estamos dispostos a dar avida. (…) Viva a revolução socialista!Viva Cuba livre! Pátria ou morte![ Discurso <strong>de</strong> Fi<strong>de</strong>l Castro em 16 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1961,quando ele <strong>de</strong>clara pela primeira vez o carátersocialista da Revolução Cubana ]“Des<strong>de</strong> o momentoem que entrei paraa Ação Católica, sercatólico para mimera ser revolucionário.Não era simplesmente comungar e obe<strong>de</strong>cer regras.Era também transformar o mundo e a socieda<strong>de</strong>.”[ <strong>Betinho</strong>, em <strong>Betinho</strong> – sertanejo, mineiro, brasileiro, p. 82 ]32


“A verda<strong>de</strong> é que entrei na políticapela porta <strong>de</strong> um engajamentoreligioso e social, que foi oengajamento na Ação Católica.Saí da minha tuberculose em 1953 e entrei na JEC, na Juventu<strong>de</strong> Estudantil Católica,que estava sendo fundada naquele momento em Belo Horizonte (MG). Participamos dafundação junto com Frei Mateus. (...) A JEC era uma permanente reunião. A gente sereunia na porta da Igreja São José para bater papo todo dia. Havia reuniões da JEC on<strong>de</strong>se discutia, organizava. E o objetivo político maior da JEC, e <strong>de</strong>pois o da JUC, era mudaro país <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma visão cristã, era a transformação da socieda<strong>de</strong> através do que FreiMateus chamava ‘a revolução pelo evangelho’.”[ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 7 e 8 ]Frei Mateus, com a mãe <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>, Dona Maria“Quem era essa figura, Frei Mateus? Esseapaixonado por Dostoiévski teve como suagran<strong>de</strong> experiência humana, política e religiosaa instalação da JEC em Belo Horizonte. (...)Ele tinha uma visão da Igreja extremamentecrítica, achava que o cristianismo <strong>de</strong>via voltarpara a época das comunida<strong>de</strong>s e percebia nofinal da vida que a Or<strong>de</strong>m dos Dominicanosestava se acabando.”[ <strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 55 ]A revolução se faz, não acontece33


(“Aquela i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong>organização revolucionáriados anos 1960 era o que<strong>de</strong>finia a Ação Popular.O que é fazer a revolução? É um grupo revolucionário quechega ao po<strong>de</strong>r e muda tudo. Acaba com a fome, acaba coma miséria, acaba com a exploração do homem pelo homem.Era uma espécie <strong>de</strong> messianismo político. Então, nós que jáestávamos na Ação Católica, uma religião a mais, uma religiãoa menos, não fazia gran<strong>de</strong> diferença.”[ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 10 ](


A AP e a UNESentado, <strong>de</strong> gravata, o presi<strong>de</strong>nte da UNE em1962, Aldo Arantes, companheiro <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>no movimento estudantil e na Ação Popular<strong>Betinho</strong> ingressou no curso <strong>de</strong> Sociologia, na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> CiênciasEconômicas da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Minas Gerais (UFMG),em 1958. A faculda<strong>de</strong> não só foi o núcleo principal da JUC,como formou uma geração <strong>de</strong> importantes cientistas sociais. Entreo caminho acadêmico e a militância política, <strong>Betinho</strong> ficou com a segunda.Em 1962, ele ajudou a fundar a Ação Popular (AP), que seria umadas principais organizações <strong>de</strong> combate à ditadura militar, e tornou-se umdos seus dirigentes nacionais. <strong>Betinho</strong> passaria a <strong>de</strong>dicar cada vez maistempo aos temas da UNE, sediada no Rio <strong>de</strong> Janeiro.A revolução se faz, não acontece35


“Em 1961, a AP não existia, estavasendo criada. A AP só realmentecomeçou a ter existência política pós-Jânio, no período do João Goulart.Aí surgiu a Ação Popular.”[ <strong>Betinho</strong>, emOs caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 10 ]“A Ação Popularfoi um movimentoque tratou <strong>de</strong> retirara política do campoda Igreja, porque naAção Católica nóséramos subordinadosà hierarquia.E houve muitos problemas entre a nossapostura política e a hierarquia católica. Entãonós achávamos que a política não <strong>de</strong>via estarsubordinada à Igreja, quer dizer, nós éramos contrao confessionalismo na política.”[ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 9 ]<strong>Betinho</strong> dança no baile <strong>de</strong> formatura36O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“No mundo contemporâneo acultura popular, tal como surge, é aexpressão da consciência crítica domundo social e das suas contradições.O homem em sua existência social,construindo socialmente a si mesmo,segundo projetos <strong>de</strong>finidos. É,portanto, não só uma consciênciacrítica da realida<strong>de</strong>, mas umaconsciência que dinamiza uma lutapela superação concreta das alienaçõessociais: é assim também uma visãopolítica. (...) A cultura popular é umprojeto <strong>de</strong> cultura universal e plural,em sua origem, porque surge da lutapela ascensão das gran<strong>de</strong>s massashumanas; é experimental e dialéticaporque tem como fim a superação <strong>de</strong>todas as contradições (...); finalmentea cultura popular é evolutiva porqueacompanha o projeto humano nacriação <strong>de</strong> sua História.”“Percebemos que, paraa UNE crescer, suainfluência não po<strong>de</strong>riase limitar à Guanabara.Nasce daí a i<strong>de</strong>ia da UNE Volante. Começamos a pensarna reforma universitária e a estruturar o Centro Popular<strong>de</strong> Cultura (CPC), que já existia. Sua proposta era aformulação <strong>de</strong> uma política <strong>de</strong> cultura popular. Tudoisso em busca da participação em nível nacional damassa estudantil, faculda<strong>de</strong> por faculda<strong>de</strong>, assembleiapor assembleia, do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul ao Amazonas. Eraum po<strong>de</strong>r nacional solidamente enraizado que queríamoscriar. O CPC marcou época! O Oduvaldo Vianna Filhoe outros, todo esse pessoal que cria a arte engajada no<strong>Brasil</strong> nasce no CPC da UNE.”[ <strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 65 ][ <strong>Betinho</strong>, em Tribuna Universitária,16/04/1962 ]<strong>Betinho</strong> escreveu em 1962 um artigo para ojornal do Diretório Central dos Estudantes(DCE) da UFMG, Tribuna Universitária, chamado“Cultura popular”A revolução se faz, não acontece37


Funeral <strong>de</strong> Getúlio VARGASSem a política não se vive


(“Quando ele morreuque me <strong>de</strong>i conta <strong>de</strong> que a política era uma coisasem a qual não podia se viver, sem a qual nãopodia se passar. A política era fundamental.Era 1954. Nasci em 1935, eu tinha 19 anos.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 7 ](


Carro do jornal O Globo, <strong>de</strong> oposição aoGOVERNO, é virado por simpatizantes <strong>de</strong> VARGASapós a morte do presi<strong>de</strong>nteOpresi<strong>de</strong>nte Getúlio Vargas se suicidou em 24 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1954.Hostilizado pelos conservadores, pela imprensa e por setores militares,que pediam o seu impeachment, Vargas se matou comum tiro. Ele, que havia governado o país da Revolução <strong>de</strong> 1930até 45, se elegera em 1950 pelo PTB (Partido Trabalhista <strong>Brasil</strong>eiro) e o PSP(Partido Social Progressista), do lí<strong>de</strong>r paulista Adhemar <strong>de</strong> Barros. O seu principalopositor foi o briga<strong>de</strong>iro Eduardo Gomes, da UDN (União DemocráticaNacional), o partido anti-Vargas por excelência.Sem a política não se vive41


42PropAGANDA daCAmpanha <strong>de</strong>VARGAS em 1950


“Getúlio foitoda uma época,Getúlio foi 30, 40 anos <strong>de</strong> história brasileira.Getúlio foi o nascimento do Estado mo<strong>de</strong>rno,do Estado-nação, do Estado com a questão do<strong>de</strong>senvolvimento. Getúlio foi Volta Redonda, foiPetrobras, essa noção <strong>de</strong> que o <strong>de</strong>senvolvimentose faz sob a regência do Estado, e a or<strong>de</strong>m socialtambém se faz sob a regência do Estado.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 7 ]“O período Vargassintetiza o processo on<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimentoindustrial, nacionalismo e autoritarismoandam juntos.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 15 ]acima, Morte <strong>de</strong> VARGAS: cortejo da população carioca.à esquerda, Mulher pASSA mal durante o funeral <strong>de</strong> VARGASSem a política não se vive43


JK, <strong>de</strong> costas, abraça Getúlio VARGAS44O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Dos anos 30 até o fim daSegunda Guerra Mundiala industrialização se <strong>de</strong>ugraças à ação <strong>de</strong> umaincipiente burguesia local,protegida, amparada pela ação e intervenção do Estado naeconomia. A nova burguesia industrial nasce também, emgran<strong>de</strong> medida, da velha burguesia agrária, que reorienta osseus investimentos para novas oportunida<strong>de</strong>s. O capital muda<strong>de</strong> forma, mas não muda o espírito autoritário. (...) O fim daSegunda Guerra enterrou as pretensões expansionistas <strong>de</strong> algumasnações capitalistas e abriu o mundo para a expansão do capital<strong>de</strong>sacompanhado dos Exércitos <strong>de</strong> suas respectivas nações.Começava a era da internacionalização do capital produtivo, daschamadas empresas multi ou transnacionais. O <strong>Brasil</strong> se entrega aesse processo com Juscelino Kubitschek (1956-60), que abre o paísao investimento direto estrangeiro.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 15 e 16 ]Sem a política não se vive45


(“A partir <strong>de</strong> JK,industrialização einternacionalizaçãose transformaram em sinônimos perfeitos.O primeiro carro brasileiro era ‘brazileiro’.”[ betinho, em Escritos indignados, p.33 ](


O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> JKSe comparados com outros períodos da história brasileira, os anos JKpo<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>rados <strong>de</strong> estabilida<strong>de</strong> política, apesar <strong>de</strong> persistiremalguns focos <strong>de</strong> conflito. De 1945 a 64, Juscelino foi o único presi<strong>de</strong>ntecivil que começou e terminou o mandato. O seu programa <strong>de</strong> governo,centrado no Plano <strong>de</strong> Metas, recebeu apoio do Congresso e das Forças Armadas.Graças à aliança do Partido Social Democrático (PSD) com o PTB, ogoverno aprovou os seus principais projetos no Legislativo. JK aten<strong>de</strong>u reivindicações<strong>de</strong> salários e equipamentos dos militares.Sem a política não se vive47


JK (segundo da dir. para a esq.) analisa plano <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> Brasília“Foi a era do <strong>de</strong>senvolvimento que Juscelinoencarnou e realizou <strong>de</strong> alguma maneira, através<strong>de</strong> um acontecimento inédito, que foi fundar umacida<strong>de</strong> no planalto, mudar a capital fe<strong>de</strong>ral do Riopara Brasília e chamar, atrair capitais estrangeirospara a indústria automobilística e outros setores.”[ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 48 ]48O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


JK, <strong>de</strong> terno claro, no local dafutura rodovia Belém-Brasília“Durante o seu mandatoJuscelino jogou o <strong>Brasil</strong>para cima. Ele disse: ‘O <strong>Brasil</strong> vai mudar 50 anosem cinco. Vamos construir Brasília’. No tempo <strong>de</strong> JK, fazíamosprofundas críticas aos partidos políticos (...). Tanto que nos anos1960 surgiram várias i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> organização revolucionária, queeram a AP, a Polop, o Movimento Tira<strong>de</strong>ntes, ligado às LigasCamponesas (...). Essa juventu<strong>de</strong> que surgiu criando essas coisastinha um sopro <strong>de</strong> audácia muito gran<strong>de</strong>, e ela queria fazer arevolução. (...) Nesse período nós achávamos que tudo era possível,e o Estado brasileiro também achava que tudo era possível. Eesse tudo, tudo, tudo é possível foi o sorriso do JK, uma políticabem-humorada, quer dizer, não era uma política trágica. Era umapolítica que achava que podia fazer o <strong>de</strong>senvolvimento.”[ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 48 ]Sem a política não se vive49


(“Ele criou umestado <strong>de</strong> circo.Em vez <strong>de</strong> um estado <strong>de</strong> sítio,foi um estado <strong>de</strong> circo.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 48 ](


O estado <strong>de</strong> circoJânio Quadros em Brasília comChe Guevara, a quem con<strong>de</strong>corouA<strong>de</strong>speito do crescimento do país, JK não conseguiu fazer o seusucessor. Apoiado pela UDN, Jânio Quadros foi eleito em 1960.Ele prometia com uma vassoura, símbolo da sua campanha,combater a corrupção. Como se votava em separado para vice-presi<strong>de</strong>nte,João Goulart (Jango), her<strong>de</strong>iro político <strong>de</strong> Vargas, levou avice. Em 25 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1961, Jânio renunciou e abriu uma crise institucionalno país. <strong>Betinho</strong> partiu para o Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, on<strong>de</strong> participouda Campanha da Legalida<strong>de</strong>, que exigia a posse <strong>de</strong> Jango. Os ministrosmilitares tentavam impedir que o vice assumisse.Sem a política não se vive51


“Jânio era o homem damídia. Era do espetáculo.(...) O governo Jânio era assim: notícia todo dia, proibição dobiquíni, da briga <strong>de</strong> galo, incertezas, era uma festa da mídia.De repente con<strong>de</strong>corou Che Guevara, fez uma política econômicamuito ortodoxa, muito tradicional, e pôs Clemente Mariani,que era um banqueiro, para ser o ministro da Fazenda.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 48 ]52O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Jânio criou as condições paraque o golpe <strong>de</strong> 1964 se <strong>de</strong>sse,ao ser o presi<strong>de</strong>nte que tentava encarnar o po<strong>de</strong>r absoluto na suapessoa, na sua vonta<strong>de</strong>, na sua loucura, e ao subestimar e menosprezartodos os mecanismos e instituições <strong>de</strong>mocráticas.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 50 ]João Goulart (<strong>de</strong> perfil)acabou tomando possecomo presi<strong>de</strong>nte em1961, mas <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> feitoum acordo para evitar umconflito interno. Jangoassumiu o Planalto,mas o <strong>Brasil</strong> adotou oparlamentarismo.O pessedista TancredoNeves (ao lado, comJango) virou primeiroministro.Sem a política não se vive53


da esquerda para a direita:O governador do RS, Leonel Brizola,discursa da janela do Palácio Piratini apósa renúncia <strong>de</strong> Jânio Quadros;Manifestação pública em frente ao PalácioPiratini favorável a João Goulart;Soldado protege barricada montADA nopALácio Piratini“Aldo [Arantes] e eu, representando a UNE, fomos para Porto Alegre,assim que Brizola montou a Re<strong>de</strong> da Legalida<strong>de</strong>, e ficamos ao seu lado,no Palácio Piratini. Foi um momento inesquecível. Havia cem milpessoas na praça, <strong>de</strong>fronte à se<strong>de</strong> do governo. Mais <strong>de</strong> 70 mil se alistarampara lutar na guerra civil, se necessário. E quando tudo terminou coma instituição do parlamentarismo e a <strong>de</strong>signação <strong>de</strong> Tancredo paraprimeiro-ministro, ainda havia gente treinando marcha unida nasruas da capital gaúcha. Uma experiência emocionante. A li<strong>de</strong>rança <strong>de</strong>Brizola era indiscutível porque ele dominava a situação tanto no âmbitocivil quanto no militar. O sucesso da resistência, no entanto, se <strong>de</strong>veuà a<strong>de</strong>são em massa da população. Foi um movimento só comparávelcom o da Campanha das Diretas, em 1984. Se houvesse outros agentesmobilizadores como aconteceu no Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, o país inteiro selevantaria. Como ocorreu em Goiânia, on<strong>de</strong> o governador Mauro Borgestambém li<strong>de</strong>rou um amplo foco <strong>de</strong> resistência. A diferença é que ele nãoconseguiu, como Brizola, neutralizar ou capitalizar a participação militar.O importante, <strong>de</strong> qualquer maneira, foi a gigantesca a<strong>de</strong>são civil.”[ betinho, em Sem vergonha da utopia, p. 66 ]54O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“E o soldado do Rio Gran<strong>de</strong>do Sul ia atirar na massa?Ia atirar em seus parentes, primos, irmãos? Mas, <strong>de</strong> jeito nenhum. Aliás,nenhum soldado do <strong>Brasil</strong> quis atirar em tempo algum. Eu costumodizer que militar brasileiro <strong>de</strong>testa briga, <strong>de</strong>testa guerra. Se pu<strong>de</strong>ssem, osmilitares brasileiros ficavam sem arma, só com o po<strong>de</strong>r. Guerra não é oseu forte. Na época, entretanto, a ameaça <strong>de</strong> tiros, brigas e guerras pareciabem real. Nós fomos para a capital gaúcha <strong>de</strong> avião, o último a <strong>de</strong>scer lá.Chegamos, entramos no Palácio e ficamos. Saíamos para comer e dormir,mediante uma senha que nos permitia o livre trânsito. Ainda vivemos uns<strong>de</strong>z dias, escrevendo e divulgando manifestos pelo rádio, acompanhandoo <strong>de</strong>senrolar dos acontecimentos em níveis nacional e internacional eobservando aquela mobilização histórica. À noite íamos comer churrasco.”[betinho, em Sem vergonha da utopia, p. 66 ]Sem a política não se vive55


(“Não que ele fosse umrevolucionário, Jangoera um <strong>de</strong>mocrata.Ele era um institucional, ele queria o caminho institucional.Colocar Jango como uma pessoa que queria dar o golpeé uma gran<strong>de</strong> injustiça com a memória <strong>de</strong>le, com opassado <strong>de</strong>le. Ele queria resolver tudo na base da lei.Nós é que às vezes queríamos na lei ou na marra.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 51 ](


Reformaou revolução?Empossado em 7 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1961, o presi<strong>de</strong>nte João Goulartse comprometeu com as chamadas reformas <strong>de</strong> base, entre elas, amais importante, a agrária. No <strong>de</strong>correr do seu mandato, a pressãodos movimentos sociais pelas reformas só cresceu. No dia 13<strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1964, 200 mil pessoas se reuniram em frente à Central do<strong>Brasil</strong> e ao Ministério do Exército, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, num comício a favordas reformas <strong>de</strong> base, para pressionar o Legislativo a votar as medidas.Dias <strong>de</strong>pois, Jango seria <strong>de</strong>stituído pelos militares.Sem a política não se vive57


“Eu fui coor<strong>de</strong>nador da assessoria do [ministroda Educação,] Paulo [<strong>de</strong> Tarso,] durante o tempo emque ele esteve no ministério, sete meses. A assessoriaera chamada ‘os meninos do po<strong>de</strong>r’, porque eratoda uma moçada, uns sete ou oito. (...) Mas nãose po<strong>de</strong> dizer que tenha havido algum tipo <strong>de</strong>influência mais organizada da AP no governo Jango.Fora o Ministério da Educação, on<strong>de</strong> tínhamosuma influência gran<strong>de</strong>, nós atuávamos muito maiscomo pressão em torno do governo Jango, na Frente<strong>de</strong> Mobilização Popular, na Frente ParlamentarNacionalista, etc. A representação política da APcorrespondia muito mais a uma força <strong>de</strong> base.”[ betinho, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]<strong>Betinho</strong> (o segundo da dir. para a esq.) numa reunião do governo Jango“Participar do governo João Goulartfoi uma experiência fascinante.Eu fiquei sete meses no Ministério da Educação e foi a minha primeira experiênciana máquina estatal burocrata. Foi aí, por exemplo, que <strong>de</strong>scobri que Tancredo Nevese vários senadores brigavam lá <strong>de</strong>ntro do ministério por borracha e ca<strong>de</strong>rno. (...) Nãopara eles. Para eles ganharem votos. Mas também tive o lado positivo, que foi o PauloFreire. O plano <strong>de</strong> alfabetização do Paulo Freire era para um milhão <strong>de</strong> novos eleitoresna próxima eleição. E ele ia fazer isso se o golpe não tivesse ocorrido. Mas nós éramosmuitos divididos. Por exemplo, a UNE e eu éramos muito ligados ao Brizola. Agora, oBrizola naquela época já era criador <strong>de</strong> caso, principalmente com o cunhado <strong>de</strong>le.”[ betinho, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]58O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Se alguém pegasse as propostas mais radicais que existiam na época,se elas fossem realizadas, realizaria algumas reformas, e bem mo<strong>de</strong>radas.Melhoraria o ensino, <strong>de</strong>mocratizaria um pouco mais o capital dos bancos,faria uma mo<strong>de</strong>sta reforma agrária em terras públicas, em terras <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>slatifundiários. Era um conjunto <strong>de</strong> respostas que hoje são perfeitamenteassimiláveis, por exemplo, numa proposta social-<strong>de</strong>mocrata. Na verda<strong>de</strong>,o que se fez foi um gran<strong>de</strong> clima <strong>de</strong> histeria política, produzida e dirigidaexatamente por aqueles que temiam que seus privilégios fossem afetados.É claro que essas reformas mudariam o <strong>Brasil</strong>. Nisso eles estavam certos:se queria mudar o <strong>Brasil</strong>. Nos anos 60 se percebeu que o país não podiacontinuar como estava. Esses setores, que são a história velha do <strong>Brasil</strong>,eles jamais concordariam com isso e tinham muito po<strong>de</strong>r, e um dosprincipais po<strong>de</strong>res que eles tinham era o po<strong>de</strong>r da mídia.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 79 ]Lí<strong>de</strong>r das Ligas Camponesas,Francisco Julião (à esq.),com Tancredo Neves,durante congresso <strong>de</strong>trabalhadores rurais. ParaJulião, era “REFORma agráriana lei ou na marra”Sem a política não se vive59


primeiro presi<strong>de</strong>nte da ditadura, Castelo Branco,sem farda, em visita a Ouro Preto (MG). Entre ele eo general Ernesto Geisel, o governador mineiro,mAGALhães Pinto, encara a câmeraO patricídio


(“O que o golpe fezfoi praticamenteum patricídio.Foi tentar matar uma pátria,matar uma nação, matar um povo,matar o sentido <strong>de</strong> cidadania.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 74 ](


Se<strong>de</strong> da UNE no Rio <strong>de</strong> Janeiro incendiada durante ogolpe. “A direita estAVA histérica”, afirmaria <strong>Betinho</strong>Em 31 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1964, <strong>Betinho</strong> foi pela manhã ao Palácio Laranjeiras,no Rio <strong>de</strong> Janeiro, on<strong>de</strong> estava o presi<strong>de</strong>nte Jango. Perto domeio-dia, com a certeza <strong>de</strong> que o golpe estava em curso, seguiu para oDepartamento <strong>de</strong> Correios e Telégrafos, na Praça XV, on<strong>de</strong> seria possívelacompanhar telefonemas e telegramas trocados entre os principais dirigentesdo país. Lá estavam o presi<strong>de</strong>nte da UNE, José Serra, e o lí<strong>de</strong>r do PTB,Neiva Moreira, entre outros. Da Praça XV, eles saíram para a se<strong>de</strong> da UNE, naPraia do Flamengo, que foi <strong>de</strong>struída.O patricídio63


“Esse golpe po<strong>de</strong>ria ter sidobarrado se houvesse umareação firme do Jango.A reação a um golpe tem que ser dada pelo presi<strong>de</strong>nte.Se o presi<strong>de</strong>nte não reagiu ao golpe, ao contrário, viajou para o sule saiu do país, na verda<strong>de</strong> ele foi quem consumou o golpe. Jangotinha apoio militar. O golpe <strong>de</strong> 64 não era uma unanimida<strong>de</strong>militar. No Sul, em vários lugares, em vários níveis, podia-se contarcom militares que fariam uma reação ao golpe. Mas isso, <strong>de</strong>ntro dai<strong>de</strong>ologia militar, só seria possível se o presi<strong>de</strong>nte or<strong>de</strong>nasse. Se nãohouve or<strong>de</strong>m do presi<strong>de</strong>nte, não houve reação. Po<strong>de</strong>ria haver guerracivil, mas não era isso que estava colocado no cenário (...). No casodo Chile, não houve condições <strong>de</strong> dirigir a reação porque mataramo presi<strong>de</strong>nte. No caso do <strong>Brasil</strong>, não mataram, mas Jango não teveessas condições políticas, e ele abandonou o campo. Jango não soubesair <strong>de</strong>ssa, ele acabou saindo para o Uruguai.”Dez anos antes do golpe,Jango no funeral <strong>de</strong> VARGAS[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 51 ]64O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Aquilo foi uma mutilação.Foi isso que eu senti, se mutilou todo o processo <strong>de</strong> gerações e gerações quequiseram fazer do país um outro país. (...) O golpe produziu um resultadopolítico, econômico e social extremamente grave para o país. Até hoje nósestamos recuperando aquilo que nos foi tomado, até hoje nós estamosrecuperando o sentido da dignida<strong>de</strong>, o sentido <strong>de</strong> direitos individuais e sociais.Até hoje nós estamos distribuindo cesta básica para acabar com a miséria, coma miséria que não foi criada pelo golpe <strong>de</strong> 1964, mas que foi profundamenteacrescentada e resultou <strong>de</strong> uma política econômica criminosa, (...) altamenteconcentradora <strong>de</strong> renda e <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 74 ]Castelo Branco (à dir.) eseu chefe da Casa Militar,general Ernesto GeiselO patricídio65


“Ao longo do tempo,o golpe foi se transformandonaquilo que no início ele dizia que não era. Ele foi se transformando numaditadura militar clássica, com todas as características <strong>de</strong> uma ditadura.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 73 ]O presi<strong>de</strong>nte Castelo Brancoem discurso na presença dogeneral que iria sucedê-LO,Costa e Silva (à esq. <strong>de</strong> óculosescuros), e do generalErnesto Geisel, que assumiriao Planalto nos anos 1970“Do ponto <strong>de</strong> vista da influência externa, o golpe do Chile é meta<strong>de</strong>americano. No <strong>Brasil</strong> não precisavam ter essa influência americanaporque o Ipes (Instituto <strong>de</strong> Pesquisa e Estudos Sociais) [organização,criada por empresários, responsável por propaganda e mobilizaçãocontra o governo Jango] já era essa própria presença. Quer dizer, elestinham (...) articulações políticas com a CIA (agência <strong>de</strong> inteligêncianorte-americana), com o Pentágono, com o diabo. Dizem quequando o golpe estava acontecendo havia na Baía <strong>de</strong> Guanabaraalguns navios <strong>de</strong> guerra americanos, que estavam ali prontos parauma intervenção. Mas o golpe foi brasileiro.”Antes <strong>de</strong> participar do golpe<strong>de</strong> 1973 no Chile, AugustoPinochet se encontrouno <strong>Brasil</strong> com o generalErnesto Geisel[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 80 e 81 ]66O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“A Igreja Católica, no fundamental, apoiou ogolpe <strong>de</strong> 1964. (...) Uma outra parte, minoritária,foi contra. Inclusive, logo <strong>de</strong>pois do golpe foiperseguida, foi torturada, foi colocada fora docenário. (...) O problema era Deus, proprieda<strong>de</strong>e família. Diga-se <strong>de</strong> passagem que essa era umatrilogia que tinha sido levantada numa pesquisa<strong>de</strong> opinião, coisa nova também no <strong>Brasil</strong>. Fizeramuma pesquisa em várias capitais do <strong>Brasil</strong>, vendoquais eram os valores que a população mais prezava.(...) Se a família era o valor, diziam que o governoGoulart queria <strong>de</strong>struir a família, o comunismoqueria <strong>de</strong>struir a família. Se era a proprieda<strong>de</strong>,falavam então que se estava querendo acabar coma proprieda<strong>de</strong> (...). Esse golpe não visava apenascriar uma opinião pública, mas mobilizar a opiniãopública. Então, nesse sentido, o golpe foi precursor,e ele foi uma espécie <strong>de</strong> escola <strong>de</strong> outros golpes quevieram na América Latina.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 80 ]“Carlos Lacerda, Adhemar <strong>de</strong> Barrose Magalhães Pinto. Esses três lí<strong>de</strong>res, que representavam Rio <strong>de</strong>Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, respectivamente, disputavam a paternida<strong>de</strong> da ‘revolução’.Na verda<strong>de</strong>, eles foram os gran<strong>de</strong>s mobilizadores e articuladores, mas não tinham o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><strong>de</strong>cisão, que estava na mão dos militares. (...) A partir <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado momento, essesatores começam a fazer a crítica do próprio golpe que eles tinham dado e começam a sedistanciar, a gerar conflitos com esse po<strong>de</strong>r, e os militares foram se fechando cada vez maisem seu próprio mundo.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 78-81 ]O patricídio67


Brizola, em 1961. A Campanha daLegalida<strong>de</strong> não foi reeditADA em 64“Nós fomos para oUruguai para iniciar aluta contra a ditadura,(...) estava a esquerda brasileira toda no Uruguai. (...) A gente faziareunião com todo mundo, só faltava o povo, só faltava o país, mas achamada direção política do passado estava lá.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 75 e 76 ]68O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Para o Uruguai foram, logo <strong>de</strong>pois do golpe, todas as li<strong>de</strong>rançasconhecidas do CGT (Comando Geral dos Trabalhadores), PUA(Pacto <strong>de</strong> Unida<strong>de</strong> e Ação), UNE, AP, Polop, trotskistas, o grupodo Brizola, representantes do Arraes, etc. Fazíamos lá a reuniãoda Frente <strong>de</strong> Mobilização Popular. Basicamente, foram formadosdois grupos: um articulado em torno do Jango (...) e outro quese articulava em torno do Brizola. Nós estávamos neste. A linhada mobilização propunha uma insurreição. O Brizola entraria emPorto Alegre e formaria a Re<strong>de</strong> da Legalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> novo. O Brizolatrabalhava intensamente nisso. Havia contatos com setores dasForças Armadas, da Brigada Militar do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul, comsindicatos. À medida que essa linha não apresentava resultados,que o dia da insurreição era <strong>de</strong>smarcado sucessivamente e queo golpe ia se consolidando, nós começamos a ler Mao. Eu melembro que lá no Uruguai eu li Escritos militares.”[ betinho, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]“Decidimos voltar parapropor à AP a guerrilha.Viemos para São Paulo, retomamos a direção da AçãoPopular e foi aí que se <strong>de</strong>cidiu que o caminho da revoluçãoera o da luta armada. (...) A nossa visão era muitoesquemática, e eu diria que profundamente equivocada.Nós achávamos que <strong>de</strong>víamos fazer a luta armada, porintermédio da guerrilha, (...) e este conflito jogaria aditadura contra nós, mas a revelaria à socieda<strong>de</strong>. Esta,sob o impacto da revelação, iria nos apoiar e se rebelar.”[ betinho, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]O patricídio69


Reunião <strong>de</strong> gabinete: o presi<strong>de</strong>nte Ernesto Geisel,na cabeceira da mesa, com Golbery do Couto e Silva,à sua direita, e Hugo Abreu, à sua esquerda. Ao lado<strong>de</strong> Golbery, João Baptista Figueiredo, sentado <strong>de</strong>frente para João Paulo dos Reis VellosoA ditadura e os seus turnos


(“A ditadura militarbrasileira era militar,era ditadura, mas tinha períodos. Cada general tinha seuturno. Havia uma formalida<strong>de</strong>, que era uma coisa maissimbólica: a ditadura escolhia o presi<strong>de</strong>nte, mas queria queo Congresso participasse, (...) que o Congresso ratificassea <strong>de</strong>cisão que era feita pelo Comando Militar.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 101 ](


O general João Baptista Figueiredo, já naPresidência da República, em conversacom o ex-presi<strong>de</strong>nte Emílio MédiciOs militares ocuparam o Palácio do Planalto <strong>de</strong> 1964 a 1985. Foramao todo cinco presi<strong>de</strong>ntes-generais, governos que estimularamo crescimento e concentraram como nunca a renda nopaís. O regime manteve, <strong>de</strong> forma limitada, alguns mecanismosda <strong>de</strong>mocracia representativa. O Congresso, apesar <strong>de</strong> cerceado, permaneceuem funcionamento. Embora a eleição para a Presidência fosse indireta, pormeio do Colégio Eleitoral, as legislativas eram diretas. Implantou-se o bipartidarismo.De um lado, o partido governista, a Aliança Renovadora Nacional, aArena, e, do outro, o Movimento Democrático <strong>Brasil</strong>eiro (MDB), <strong>de</strong> oposição.A ditadura e os seus turnos73


“Pretendia-se queo <strong>Brasil</strong> não tinhavivido um golpe.Essa era a questão do período Castelo Branco.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p.100 ]74O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Foto oficial: o Ministério <strong>de</strong> Castelo Branco“Até hoje tem genteque diz que Casteloera um <strong>de</strong>mocrata.Ora, não po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>mocrata quem acaba com a<strong>de</strong>mocracia. A história tem que ser rigorosa na avaliaçãodos atos políticos e das consequências políticas <strong>de</strong>ssesatos. A ditadura brasileira, 1964, chama-se CasteloBranco. Não há outra forma <strong>de</strong> caracterizar. (...) Osmilitares pretendiam que isso fosse somente umasolução provisória, para <strong>de</strong>pois se restabelecer o processo<strong>de</strong>mocrático. Nos primeiros dias do golpe houve muitaviolência, mas não o estabelecimento <strong>de</strong> um regimerepressivo claro. Setores da socieda<strong>de</strong> achavam queisso era absolutamente normal, que era necessário, e,portanto, achavam que o governo Castelo Branco <strong>de</strong>viaexistir mesmo. Aí ele colocou Roberto Campos comoministro da Economia [na foto, o 2º da esq. para a dir.na última fila]. (...) Roberto Campos estabeleceu todas aspremissas do que <strong>de</strong>pois viria a ser o Milagre <strong>Brasil</strong>eiro.Em poucos meses ele realizou todos os sonhos da vida<strong>de</strong>le: abrir para o capital estrangeiro, cumprir o programaliberal diante <strong>de</strong> uma inflação que era 90% ao ano e queera consi<strong>de</strong>rada uma ameaça à segurança nacional. (...)O Congresso ‘assimilou’ isso tudo.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 99 ]A ditadura e os seus turnos75


(“Começou a se dar,no interior do golpe,uma gran<strong>de</strong> lutaentre o que se chamou linha-dura, cuja cabeça eraCosta e Silva, e linha-mole, que era o presi<strong>de</strong>nte[Castelo]. Essa luta foi radicalizando o golpe para adireita. (...) A linha-mole queria um projeto maisinstitucional, mais internacionalista, mais aberto.A linha-dura tinha conotações mais nacionalistas.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 100 ](


O general Costa e Silva é beijado pela netaO AI-5e o MilagreCom o general Costa e Silva, sucessor <strong>de</strong> Castelo Branco, veio o AI-5em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1968. O ato, uma resposta a greves e manifestaçõesque ocorriam no país, conce<strong>de</strong>u po<strong>de</strong>res ilimitados ao presi<strong>de</strong>nteda República e impôs forte censura sobre os meios <strong>de</strong> comunicação.Inúmeros oposicionistas foram presos, torturados e mortos. Quase ameta<strong>de</strong> dos representantes do MDB no Congresso tiveram os seus mandatoscassados. Com a socieda<strong>de</strong> silenciada, Emílio Garrastazu Médici substituiriaCosta e Silva e comandaria o Milagre Econômico, período <strong>de</strong> crescimento,concentração <strong>de</strong> renda e prosperida<strong>de</strong> para as classes mais altas. A repressão seintensificaria, assim como a propaganda política do governo.A ditadura e os seus turnos77


“O períodoCosta e Silva foi umperíodo em que todasas contradições quetinham ficado maisou menos congeladasno período Castelo Branco voltaram a se manifestar.Houve manifestações sindicais <strong>de</strong> oposição, houvemanifestações estudantis, teve a Passeata dos Cem Mil.(...) A socieda<strong>de</strong> começou não só a <strong>de</strong>scobrir a dimensãodo golpe, como a reagir contra. Se no período CasteloBranco o movimento estudantil não reagiu <strong>de</strong> formamassiva, no governo Costa e Silva reagiu. (...) Juntaram-sena luta contra a ditadura: Carlos Lacerda, Juscelino, Jango,e já iam chegando junto outros apoios também. Era umafrente política que queria criar uma alternativa e fazercom que a ditadura militar chegasse a seu fim, acabasse operíodo <strong>de</strong> recessão e voltasse ao que era antes. A FrenteAmpla foi cassada pelo governo Costa e Silva.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 102 ]CARLOS Lacerda (à dir.) faz campanha para oseu candidato a governador em 1965, FlexaRibeiro (à esq.), que acabaria <strong>de</strong>rrotado78O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


ATO INSTITUCIONAL Nº 5,DE 13 DE DEZEMBRO DE 1968O PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL,ouvido o Conselho <strong>de</strong> Segurança Nacional, eCONSIDERANDO que a Revolução <strong>Brasil</strong>eira <strong>de</strong> 31 <strong>de</strong> março<strong>de</strong> 1964 teve, conforme <strong>de</strong>corre dos Atos com os quaisse institucionalizou, fundamentos e propósitos que visavamdar ao país um regime que, aten<strong>de</strong>ndo às exigências<strong>de</strong> um sistema jurídico e político, assegurasse autênticaor<strong>de</strong>m <strong>de</strong>mocrática, baseada na liberda<strong>de</strong>, no respeito àdignida<strong>de</strong> da pessoa humana, no combate à subversão e àsi<strong>de</strong>ologias contrárias às tradições <strong>de</strong> nosso povo, (...)Resolve editar o seguinte ATO INSTITUCIONAL“Foi o período emque, por exemplo,O Estado <strong>de</strong> S. Paulo,censurado, (...) editava Camõese o Jornal da Tar<strong>de</strong> publicava receitas <strong>de</strong> bolo. Foiquando surgiu também, e foi censurado, mas surgiucomo uma reação à ditadura, o humor no Pasquim,que atacou a ditadura com as armas do riso, do<strong>de</strong>boche, da ironia e da produção cultural.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 137 ](...) Art. 2º – O Presi<strong>de</strong>nte da República po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>cretaro recesso do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativase das Câmaras <strong>de</strong> Vereadores, por Ato Complementar,em estado <strong>de</strong> sítio ou fora <strong>de</strong>le, só voltandoos mesmos a funcionar quando convocados pelo Presi<strong>de</strong>nteda República.(...) Art. 3º – O Presi<strong>de</strong>nte da República, no interessenacional, po<strong>de</strong>rá <strong>de</strong>cretar a intervenção nos Estados eMunicípios, sem as limitações previstas na Constituição.(...) Art. 4º – No interesse <strong>de</strong> preservar a Revolução, oPresi<strong>de</strong>nte da República, ouvido o Conselho <strong>de</strong> SegurançaNacional, e sem as limitações previstas na Constituição,po<strong>de</strong>rá suspen<strong>de</strong>r os direitos políticos <strong>de</strong> quaisquercidadãos pelo prazo <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos e cassar mandatos eletivosfe<strong>de</strong>rais, estaduais e municipais.(...) Art. 10 – Fica suspensa a garantia <strong>de</strong> habeas corpus,nos casos <strong>de</strong> crimes políticos, contra a segurança nacional,a or<strong>de</strong>m econômica e social e a economia popular.Art. 11 – Excluem-se <strong>de</strong> qualquer apreciação judicialtodos os atos praticados <strong>de</strong> acordo com este Ato Institucionale seus Atos Complementares, bem como osrespectivos efeitos. (...)A ditadura e os seus turnos79


“O governo Médiciestabeleceu umaterrível dicotomiaentre o <strong>Brasil</strong> oficial, o <strong>Brasil</strong> do Milagre, o <strong>Brasil</strong>potência, <strong>de</strong> um lado, e a socieda<strong>de</strong>, do outro.Foi o período em que (...) mais se concentrouriquezas, mais se concentrou a renda, maisse excluiu a população dos benefícios do<strong>de</strong>senvolvimento. É a famosa época do bolo, querdizer, primeiro o bolo cresce, <strong>de</strong>pois se divi<strong>de</strong> obolo, e <strong>de</strong>pois o bolo tomou Doril e sumiu.E ninguém mais dividiu coisa nenhuma.”Ulysses Guimarães, do MDB, discursano Colégio Eleitoral que elegeu ErnestoGeisel como o sucessor <strong>de</strong> Médici. Mesmosabendo que não ganharia, Ulyssesdisputou com Geisel a eleição, se disse o“anticandidato” e tornou-se símbolo daresistência à ditadura.[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 104 ]80O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


O “<strong>Brasil</strong>: ame-o ou <strong>de</strong>ixe-o”FOI uma marca do períodoA ditadura e os seus turnos81


(“As portas daAbertura não seabriram <strong>de</strong> repente,elas foram se abrindo, tal como previa Geisel,lenta, gradual, segura. E foi assim. E foi assimque chegamos à Anistia, em 1979, que marcouo período do general Figueiredo e praticamenteassinalou o fim da ditadura.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 107 ](


Da distensãoà AberturaFigueiredo e Geisel se cumprimentamdurante visita a uma plantação <strong>de</strong> sojaOpresi<strong>de</strong>nte Ernesto Geisel, nove meses <strong>de</strong>pois da sua posse, teveem outubro <strong>de</strong> 1974 um primeiro e importante revés político. OMDB conquistou uma vitória consagradora nas eleições legislativas.Com a crise econômica internacional, o Milagre Econômicose fazia miragem. Geisel iniciou uma distensão lenta e gradual do regime. Elepassaria a faixa ao general João Baptista Figueiredo, o presi<strong>de</strong>nte que exerceuo mais longo mandato da ditadura, seis anos. No mesmo ano em que chegouao po<strong>de</strong>r, Figueiredo proclamou a Lei da Anistia. A socieda<strong>de</strong> civil havia feitouma gran<strong>de</strong> campanha por “anistia ampla, geral e irrestrita”, mas o regimeconce<strong>de</strong>u apenas uma parcial. Mesmo assim, a distensão virava a Abertura.A ditadura e os seus turnos83


“O período Geisel tem comocaracterística básica terpassado <strong>de</strong> uma ditadura àla Médici para um regimeautoritário altamente ciosodo seu po<strong>de</strong>r, mas comabertura para a imprensa erepressão à repressão.”[ betinho, em Os caminhosda <strong>de</strong>mocracia, p. 106 ]“Geisel <strong>de</strong>scobriu quea ditadura não podiaseguir daquele jeito,que haveria que se fazer um processo <strong>de</strong> distensão, comoeles chamavam, tinha que haver uma distensão, que é onome antigo, e que hoje se chama flexibilização. Distensãolenta, gradual e segura. Mais tar<strong>de</strong> ele admitiu a abertura<strong>de</strong>mocrática, lenta, gradual e segura. Sempre assim: lenta,gradual e segura, isto é, controlada por ele.”O presi<strong>de</strong>nte João Figueiredo,em visita a Minas Gerais,com o governador mineiro,tANCREDO Neves[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 105 ]84O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Os governosdos generaisconseguiram o milagre <strong>de</strong> produzir um paísrico com uma população pobre (...).Como diagnosticou um economistabrasileiro, [Edmar] Bacha, uma Belíndia,a combinação da Bélgica e da Índia.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 16 e 17 ]Luiz Inácio Lula da Silva em assembleia <strong>de</strong>metalúrgicos, em Vila Eucli<strong>de</strong>s, São Bernardodo Campo (SP)“O movimento sindical que parecia morto, ouinexistente, ou adormecido, <strong>de</strong> repente (...) começoua se <strong>de</strong>senvolver, a se transformar em manchetesdos jornais e das rádios e TVs, através <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>sconcentrações <strong>de</strong> massa, inicialmente feitas nas igrejas(...). Com o processo <strong>de</strong> abertura as Igrejas se abrirammais ainda, e passou a haver gran<strong>de</strong>s manifestações.Depois, essas manifestações se realizaram nos estádios<strong>de</strong> futebol. Foi aí que nasceu Vila Eucli<strong>de</strong>s. Foi aí quesurgiu a nova li<strong>de</strong>rança que <strong>de</strong>u origem ao PT (Partidodos Trabalhadores) (...). E o <strong>Brasil</strong> já tinha passadoum longo período sem que o movimento operáriopropriamente dito tivesse se manifestado, porque aditadura reprimiu muito os sindicatos, reprimiu muitoos trabalhadores. Então, quando eles saíram, saíramcom toda força, tirando o atraso histórico <strong>de</strong> quemtinha ficado no jejum da luta política.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 107 ]


<strong>Betinho</strong>, no exílio no Canadá, emconversa com o jornalista RodolfoKon<strong>de</strong>r; Henfil (à esq.) observaDa “guerra popular” ao exílio


(“Viver naclan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> eratensão permanentee uma preocupação absolutamente constante (...).Não explico como consegui viver nessa época eprincipalmente como consegui escapar <strong>de</strong>ssa época.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 136 ](


<strong>Betinho</strong> com o filho Daniel no exílio<strong>Betinho</strong> ficou exilado <strong>de</strong> 1971 a 79, no Chile, Panamá, Canadáe México. Voltou ao <strong>Brasil</strong> com a Lei da Anistia. Até sair para oexílio, ele militou na clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> na Ação Popular. Em 67,foi a Cuba para representar a AP num evento da Organização Latino-americana<strong>de</strong> Solidarieda<strong>de</strong> (Olas), encontro que acabou não acontecendo.Ao retornar <strong>de</strong> Cuba, <strong>Betinho</strong> trabalhou como operário numafábrica paulista, como exigia a nova linha maoísta da AP.Da “guerra popular” ao exílio89


“[Che Guevara] era o pivô <strong>de</strong> toda a articulação da Olas.Na verda<strong>de</strong> ela estava articulada tendo como centro a lutaguerrilheira do Che na Bolívia. Quando ele morreu, morreua Olas. Só que os cubanos não enterraram, e eu fiqueiesperando onze meses a Olas se reunir, e a organizaçãonunca se reuniu. Até que eu <strong>de</strong>cidi que não tinha nadapara fazer lá e vim embora (...). Quando eu cheguei a AçãoPopular estava totalmente dividida entre a linha maoísta e alinha cubana. Eu a<strong>de</strong>ri à linha maoísta (...). Só havia duasalternativas: ou a<strong>de</strong>ria a tudo o que ela fazia, que era umaespécie <strong>de</strong> guerra santa, um negócio <strong>de</strong> um furor i<strong>de</strong>ológicoincrível, ou então eu tinha que sair da AP. Sair da AçãoPopular naquelas circunstâncias era como pedir para alguémsair <strong>de</strong> seu próprio corpo. Porque eu era fundador. Só <strong>de</strong>pois,em 71, é que eu elaborei a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> sair.”[betinho, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]<strong>Betinho</strong> conheceu a sua segunda mulher,Maria Nakano, numa reunião da AP,quando os dois viviam na clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>.Ele era Wilson, e ela, Marli. Na foto àdireita, os dois exilados no Panamá.A Ação Popular no fim dos anos 1960se dividiu em duas tendências: umapróxima da Revolução Cubana, <strong>de</strong>fensorada guerrilha, e outra alinhada com aRevolução Chinesa, li<strong>de</strong>rada por Mao Tsé-Tung. O grupo maoísta terminou vitorioso.Eles pregavam que o melhor caminhopara o socialismo era uma “guerrapopular prolongada”, como havia ocorridona China, e não via um “foco guerrilheiro”.“Nosso slogan na épocaera ‘só a luta armada<strong>de</strong>rruba a ditadura’.Nós viramos maoístas, e aí o lema passou a ser ‘só aguerra popular <strong>de</strong>rruba a ditadura’. (...) A gente faziatrabalho <strong>de</strong> oposição sindical, fazíamos trabalhos nosbairros, com jovens, trabalhávamos já com igrejas, mas,obviamente que guerra, no sentido que nós pensávamos epropúnhamos, obviamente, não havia. Quem acreditavamuito na guerra era a repressão, e achava que íamos fazerguerra mesmo e vinha em cima.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 135 ]90O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Eu fui trabalhar numafábrica <strong>de</strong> porcelana,em Mauá, on<strong>de</strong> fiquei seis meses. (...) Na primeira semana,eu carregava caixotes com louça. Eu que nunca tinha carregadocaixote na minha vida punha no ombro e saía. No primeiro diacomeçou uma hemorragia no joelho. Eu trabalhei <strong>de</strong> segunda asábado com hemorragia. No sábado eu não conseguia nem andar.Fui transferido para outro trabalho. Passei a ser lixador <strong>de</strong> xícara.”(<strong>Betinho</strong>, na revista Teoria e Debate, nº 16)“A clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> é tão difícil <strong>de</strong> ser entendidapor quem não a viveu, como a doença para quemsempre esteve são. Clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> é uma situaçãoanormal, invertida em todos os seus aspectos. Onormal para qualquer pessoa é ter seu nome ea sua história, o reconhecimento social da suaindividualida<strong>de</strong>. O clan<strong>de</strong>stino <strong>de</strong>ve ao contrárioocultar seu próprio nome e buscar que a sua própriahistória não seja conhecida. (...) Em permanentesituação <strong>de</strong> perigo, vivendo a tensão cotidiana dorisco <strong>de</strong> ser localizado, isolado <strong>de</strong> seus ambientesanteriores, cortado em sua história pessoal, vivendoartificialmente uma história em parte verda<strong>de</strong>ira eem parte inventada, o clan<strong>de</strong>stino acaba por sofreruma série <strong>de</strong> condicionamentos que o testam sobmuitos aspectos.”“A coisa em Mauá começou a ficar meio tensa, porque a gentefazia trabalho <strong>de</strong> panfletagem, pregando a luta armada. Eu memu<strong>de</strong>i para Santo André, e, em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1970, caiu todo otrabalho em Mauá. (...) Pren<strong>de</strong>ram 60 caras, batendo, torturando.(...) Eu saí da casa on<strong>de</strong> estava. Segundo soube, algumas horas<strong>de</strong>pois a polícia chegou lá. Eu ainda fiquei em São Paulo umano criando as condições <strong>de</strong> saída para o exterior, porque aorganização não tinha condições <strong>de</strong> dar nada (...). E foi aí queeu comecei a tomar uma consciência claríssima do quão suicidaera a nossa situação. A gente pensava: ‘Se eu cair, eu tenho duaschances: ou eu falo, e me transformo num traidor, ou eles vão mematar’. (...) Foi aí que eu realmente tive medo.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista Teoria e Debate, nº 16 ][ <strong>Betinho</strong>, em “Sobre a clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>”, ArquivoHerbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ]Da “guerra popular” ao exílio91


(“O exílio brasileiro nunca<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser político.A gente, em todos esses lugares, formava grupos <strong>de</strong> brasileiros,que faziam comitês contra a ditadura. Então, faziam logo umjornal, faziam logo uma publicação, se articulavam com aimprensa local para <strong>de</strong>nunciar os crimes da ditadura. (...)Foi sempre um exílio com essa característica <strong>de</strong> não parar<strong>de</strong> trabalhar. E com o sonho da volta.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 180 e 181 ](


Ao exílio<strong>Betinho</strong> e Henfil entrevistaram FranciscoJulião para o Pasquim, no México<strong>Betinho</strong> partiu para o Chile em novembro <strong>de</strong> 1971. Viver no Chilefoi “fantástico”, <strong>de</strong>finiria ele. <strong>Betinho</strong> foi assessor do governosocialista <strong>de</strong> Salvador Allen<strong>de</strong>. Com o golpe contra Allen<strong>de</strong>,em setembro <strong>de</strong> 1973, <strong>Betinho</strong> e Maria Nakano passaram cincomeses no Panamá e, em fevereiro <strong>de</strong> 1974, <strong>de</strong>sembarcaram no Canadá.Lá, <strong>Betinho</strong> iniciou o doutorado em Ciência Política e criou com outrosexilados a Latin American Research Unit (Laru), centro <strong>de</strong> pesquisas sobrea América Latina. Depois <strong>de</strong> por alguns meses dar aulas na Escócia, ele eMaria se mudaram para o México, última parada antes <strong>de</strong> voltar ao <strong>Brasil</strong>.Da “guerra popular” ao exílio93


“O Chile era uma espécie<strong>de</strong> céu quando a gente chegava,porque a gente saía da ditadura militar (...) e encontrava um país <strong>de</strong>mocrático,(...) com manifestações <strong>de</strong> massa por toda parte. Então era como se tivessesaído do inferno e chegado no céu (...). Passei a viver a experiência maisfantástica que se possa imaginar: um clan<strong>de</strong>stino chamado Wilson [nome<strong>de</strong> guerra <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>], perseguido por todo mundo, perseguido pela polícia,sair do <strong>Brasil</strong>, chegar no Chile e ir trabalhar com o assessor do presi<strong>de</strong>nte daRepública (...) Discuti com ele i<strong>de</strong>ias e propostas, elaborando textos, tendoi<strong>de</strong>ias numa terça-feira e vendo o presi<strong>de</strong>nte Allen<strong>de</strong> anunciar essa i<strong>de</strong>ia naquinta-feira, na imprensa (...). O golpe dado no Chile foi uma das maiorestragédias da história contemporânea da América Latina.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 179 e 180 ]“O José Serra era o coor<strong>de</strong>nadorda Ação Popular. Todos os gruposbrasileiros se reuniam numa espécie<strong>de</strong> frente, com representantes <strong>de</strong> 40ou 50 grupos <strong>de</strong> esquerda. Era umaloucura. Começou nessa época o meuprocesso <strong>de</strong> <strong>de</strong>sengajamento da AçãoPopular. Depois do golpe do Chile, fuipara o Canadá. Meu <strong>de</strong>sengajamentojá era total. A partir daí, voltar a falarda AP é sempre penoso.”[ betinho, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]José Serra (em pé), no Chile, companheiro <strong>de</strong>exílio <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>. “Tomei muito vinho <strong>de</strong>le”, diria<strong>Betinho</strong> sobre a relação com Serra no país.94O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“A hipótese central da investigaçãoque estamos <strong>de</strong>senvolvendo (e da qualeste trabalho resume os primeirosresultados) é que, com a emergência dosistema produtivo capitalista à escalamundial (que chamamos <strong>de</strong> ‘capitalmultinacional’) e <strong>de</strong> modo especial apósa crise político-militar <strong>de</strong> 1964, o Estadobrasileiro se <strong>de</strong>fine por uma política <strong>de</strong>integração e subordinação da economianacional à dinâmica e às necessida<strong>de</strong>sdo sistema do capital mundial, a qual érealizada através <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo políticoautoritário e exclu<strong>de</strong>nte em relação àsvárias classes que participavam do pactopopulista dos períodos anteriores.”[ betinho, em O Estado e o <strong>de</strong>senvolvimentocapitalista no <strong>Brasil</strong>, p. 9 e 10 ]Com Carlos Afonso, parceiro na Latin American Research Unit (Laru) efuturamente companheiro no <strong>Ibase</strong>, <strong>Betinho</strong> publicou em 1977 O Estado eo <strong>de</strong>senvolvimento capitalista no <strong>Brasil</strong>. Eles buscavam enten<strong>de</strong>r o papel doEstado no “<strong>de</strong>senvolvimento capitalista subordinado” dos países da AméricaLatina, em especial do <strong>Brasil</strong>, uma preocupação típica dos anos 1960 e 70.À direita, publicações <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> pela Laru.“No Canadá, <strong>de</strong>cidi reassumir aminha responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intelectual.Voltei a fazer cursos e escrever. Eu acho que a maior conquista que fiz, principalmentecom a experiência do Chile, foi recolocar como foco da minha reflexão a questão <strong>de</strong>mocrática.Até um certo momento o estudo do capital ainda era o centro da minha atenção:multinacionais, internacionalização, etc. O meu pensamento girava muito em torno daeconomia política. A partir <strong>de</strong> um <strong>de</strong>terminado momento eu disse: ‘não é a economia política, éa política, e <strong>de</strong>ntro da política, é a questão <strong>de</strong>mocrática, por on<strong>de</strong> passa tudo’. (...) Nós criamoso Centro <strong>de</strong> Estudos Latino-americanos, através do qual produzimos análises sobre a AméricaLatina, publicações, textos, livros, até audiovisuais, uma espécie <strong>de</strong> pré-<strong>Ibase</strong>.”[ betinho, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]Da “guerra popular” ao exílio95


“Amorzinho lindo,Aproveito aqui uma conferência do F. H.[Fernando Henrique] Cardoso para escrever umacartinha para você. (...) Vamos aos pontos:(...) 5- Fernando acabou sua conferênciae agora o pessoal está colocando perguntas...Foi interessante e bastante provocativo.A sala aqui está cheia <strong>de</strong> gente, e Fernando érealmente visto como uma ‘star’... para a moçada.Por falar nisso, o Serra está no <strong>Brasil</strong>, por um mês.Foi interrogado quatro horas no aeroporto e saiu...(...) Houve várias manifestações da massaestudantil em várias cida<strong>de</strong>s e em São Paulo duasmanifestações, uma com <strong>de</strong>z mil estudantes.(...) Tenha certeza que estes dois meses forama última separação... Vou comprar a correntinha<strong>de</strong> ouro pra pren<strong>de</strong>r você no meu pescoço eo meu no teu... Mas veja: não pense triste, não pensesauda<strong>de</strong> triste, pense no reencontro, lembre alegre etrabalhe tudo que você pu<strong>de</strong>r. Vou enviar agoraum beijão que con<strong>de</strong>nsa todos os que tenho, e umabraço geral para todos os companheiros aí.Bet.”Durante os meses em que <strong>Betinho</strong> foiprofessor em Glasgow, na Escócia,Maria Nakano prestou assessoria parao novo governo <strong>de</strong> São Tomé e Príncipe,na África. O período ficou marcado pelaintensa correspondência entre os dois.A carta ao lado é datada <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> maio<strong>de</strong> 1977. Os grifos são originais.[ arquivo herbert <strong>de</strong> souza, cpdoc/FGV ]96O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Em carta <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1978, Henfil buscaanimar o irmão com a política brasileirae a campanha pela Anistia. No trechoabaixo, os grifos são do próprio Henfil:Henfil e sua mulher, Berenice, visitam Maria e <strong>Betinho</strong> no Canadá“A verda<strong>de</strong> é que o exíliocriou um circuito,criou uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação e informação que eraalimentada pelas entida<strong>de</strong>s, quer dizer, pelas organizaçõese pelas famílias (...). Durante todo o meu período noCanadá, fui informado semanalmente por pacotes <strong>de</strong>materiais enviados pelo Henfil para mim. Eu nunca li tantosobre o <strong>Brasil</strong> como nesse período, porque o Henfil era umsistemático, ele seguia todos os jornais, todas as publicações.”Mano, tá difícil seguir os fatos. Toda hora(hora não é dia, é hora) acontece novida<strong>de</strong>.Eu disse: basta um empurrão. Quem empurra?Perguntou você... (...) Mas chamoatenção na sua leitura aí para a confe<strong>de</strong>raçãodos xavantes empurradores (...). Prestaatenção na sua leitura para as seguintespedras: OAB (tá cada dia mais mais), Igreja<strong>de</strong> Base (...) está ocupando um imenso terreno(...). Imprensa (...). Estamos vendo naTV, horário nobre, até <strong>de</strong>núncias <strong>de</strong> maustratos a presos... Os programas humorísticosjá gozam o salário mínimo... Novida<strong>de</strong><strong>de</strong> três meses pra cá... Outro dia a RádioJB entrevistou o Márcio Moreira Alves! EM-PRESÁRIOS estão aumentando no queixumebem articulado. (...) 114 milhões <strong>de</strong>brasileiros – vão votar em massa no MDBem nov. 78 e criar um puta impasse. (...)SINDICATOS – taí uma novida<strong>de</strong>! A oposiçãosindical está toda hora se elegendo. (...)ANISTIA – a campanha é incontrolável. Subestimadano início, vem crescendo tantoque quase ficou mais importante que o habeascorpus. (...) Então? Que me diz? Temquem empurre?[ arquivo herbert <strong>de</strong> souza, cpdoc/FGV][ <strong>Betinho</strong>, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 185 e 186 ]Da “guerra popular” ao exílio97


O cientista social RenéDreyfuss foi uma daspessoas que maistrocaram cartas com<strong>Betinho</strong> durante o exílio.<strong>Betinho</strong> revisou a tese<strong>de</strong>le, que <strong>de</strong>pois setornaria o livro clássico1964: a conquista doEstado. Nesta carta <strong>de</strong>1979 (1ª página ao lado),Dreyfuss, além <strong>de</strong> falardo trabalho, cobra que<strong>Betinho</strong> termine a suaprópria tese. Abaixo,trecho da mensagem.Manda brasa na tua tese, faz espação paraela, é importantíssimo para você funcionarcomo Doutor <strong>de</strong> Souza (sem gozação), émuito importante. Descarrega os <strong>de</strong>talhesdo ativismo com outras pessoas, pe<strong>de</strong> umpouco <strong>de</strong> compreensão e manda brasa na tuatese. Você tem que passar a ser um politólogofalando, não um ex-lí<strong>de</strong>r da AP. Teu status <strong>de</strong>intelectual nesta briga que vem agora temque ser enfatizado, não teu lado <strong>de</strong> político.Você é um político intelectual que triunfou nomundo acadêmico, essa imagem é necessáriapara a tua legitimação. Sugestão <strong>de</strong> amigo.[ arquivo herbert <strong>de</strong> souza, cpdoc/FGV]98O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Pasquim <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1979 <strong>de</strong>stACOuentrevista com <strong>Betinho</strong>“No México, fui professor nodoutorado <strong>de</strong> Economia, fizemos umcentro lá também, mas foi muitotumultuado. O México é um turbilhão.Veio a Anistia, eu queria terminar aminha tese, mas quando vi já estavatomando o avião para vir embora.”[ betinho, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]“Acho que,se quiser voltaragora, volto,mas daqui a um ano estamoscorrendo <strong>de</strong> novo. Só com anistia não dá.Quero <strong>de</strong>mocracia. A seco, não! (...)Não fiquem me esperando com banda,que só com anistia não volto!”[ betinho, no Pasquim, nº 519 ]“Acredito que nenhum exilado imaginou quepu<strong>de</strong>sse morrer no país on<strong>de</strong> estivesse, todospensavam que iam voltar para o <strong>Brasil</strong>, podia<strong>de</strong>morar. Eu, por exemplo, fui surpreendido pelofim da ditadura, praticamente, e pela Anistia,porque eu imaginava que eu teria que viver noMéxico mais uns três ou quatro anos.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 180 e 181 ]Da “guerra popular” ao exílio99


(“Estar fora do paísé uma questão quedói, profundamente.Talvez seja um dos piores castigos que a pessoa possa ter.(...) Aquela rua, aquele bairro, aquela família, aqueleespaço, aquela história que você faz num <strong>de</strong>terminadolugar. Tirar isso <strong>de</strong> uma pessoa é uma violência terrível.Quem viveu o exílio sabe disso.”[ betinho, no programa Roda Viva, 14/12/1987 ](


Certidão pós-anistia que restituiuos direitos políticos <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>Anistia<strong>Betinho</strong> e vários outros exilados retornaram ao <strong>Brasil</strong> em 1979, coma Lei da Anistia. No aeroporto, ele foi recepcionado ao som <strong>de</strong> “Obêbado e a equilibrista”, <strong>de</strong> Aldir Blanc e João Bosco, cuja letra pediaa “volta do irmão do Henfil”. A música virou o hino da Anistia.Da “guerra popular” ao exílio101


O bêbado e a equilibristaCaíaA tar<strong>de</strong> feito um viadutoE um bêbado trajando lutoMe lembrou CarlitosA luaTal qual a dona do bor<strong>de</strong>lPedia a cada estrela friaUm brilho <strong>de</strong> aluguelE nuvensLá no mata-borrão do céuChupavam manchas torturadasQue sufocoLoucoO bêbado com chapéu-cocoFazia irreverências milPra noite do <strong>Brasil</strong>Meu <strong>Brasil</strong>Que sonhaCom a volta do irmão do HenfilCom tanta gente que partiuNum rabo-<strong>de</strong>-fogueteChoraA nossa pátria mãe gentilChoram Marias e ClarissesNo solo do <strong>Brasil</strong>Mas seiQue uma dor assim pungenteNão há <strong>de</strong> ser inutilmenteA esperançaDançaNa corda bamba <strong>de</strong> sombrinhaE em cada passo <strong>de</strong>ssa linhaPo<strong>de</strong> se machucarAzarA esperança equilibristaSabe que o show <strong>de</strong> todo artistaTem que continuar102O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Para mim hoje estar aqui é algoabsolutamente fundamental.Eu evito até viajar para fora, porque eu já perdi nove anos fora.”[ betinho, no programa Roda Viva, 14/12/1987 ]acima: Carteira <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>, tirada em 1979, quandoele regressou ao <strong>Brasil</strong>; <strong>Betinho</strong> na praia em Natal (RN), em 1980,com o irmão Henfil“Isso é obra do Henfil.Ele tinha uma forma muito interessante <strong>de</strong> fazer aluta política (...). Ele escrevia as cartas ao mano esimbolizava a volta <strong>de</strong> todos do exílio na minha volta, elepersonalizava. O Aldir pegou aquilo e fez. Eu não conheciao Aldir. Eu vim conhecê-lo rencentemente, quando voltei.(...) E eu durante muito tempo passava nas ruas e aspessoas diziam: ‘Lá vai o irmão do Henfil’. Tinha algunsque ainda me chamavam <strong>de</strong> Henfil. Até hoje tem genteque fala assim: ‘Oi, Henfil’. Eu digo: ‘Oi’.”[ betinho, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]Da “guerra popular” ao exílio103


A tragédia grega


(“Acho que ele jánasceu candidatoa alguma coisa.E foi amadurecendo, foi se transformando numali<strong>de</strong>rança expressiva, até que ele conseguiu sereleito presi<strong>de</strong>nte. Na véspera da posse ele adoeceu.Adoeceu e a situação <strong>de</strong>le se agravou dia a dia,e ele morreu sem ver realizado o gran<strong>de</strong> sonhoda vida <strong>de</strong>le. E essa morte foi acompanhada pelaopinião pública, ela foi visualizada pela opiniãopública como uma gran<strong>de</strong> tragédia nacional.Era uma tragédia grega, era algo que não podiaacontecer. O presi<strong>de</strong>nte não podia morrer.Tancredo, que tinha simbolizado tantas lutas,fosse ele o que fosse, ele não podia morrer.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 221 ](


Tancredo Neves, na frente,e José Sarney, atrásOprocesso <strong>de</strong> re<strong>de</strong>mocratização foi tão cheio <strong>de</strong> idas e vindas, que ospróprios historiadores divergem sobre quando ele começa e acaba.Os vários marcos ilustram o quão longa e paulatina foi a transiçãodo regime autoritário para um <strong>de</strong> maiores liberda<strong>de</strong>s políticas. Onzeanos <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> Ernesto Geisel anunciar a sua distensão lenta e gradual, TancredoNeves, eleito <strong>de</strong> forma indireta, com o conservador José Sarney como vice, se tornouo primeiro presi<strong>de</strong>nte civil <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1964. Tancredo morreu antes <strong>de</strong> tomar posse,e Sarney assumiu. Em 88, viria a Constituição <strong>de</strong>mocrática, e, um ano <strong>de</strong>pois,as eleições diretas para presi<strong>de</strong>nte.A tragédia grega107


“Sarney era vice <strong>de</strong> Tancredono Colégio Eleitoral.Morreu Tancredo, assumiu o vice. Essa foi a gran<strong>de</strong> tragédia do <strong>Brasil</strong>.O <strong>Brasil</strong> teve duas tragédias numa só: a morte <strong>de</strong> Tancredoe a eleição do vice. Ele vinha pela Arena, ele vinha pela direita,ele vinha pelo golpe. Ele era li<strong>de</strong>rança do golpe militar,que tomava carona no processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 199 ]À esquerda, caixão com Tancredo Nevesem brasília. Acima, faixa <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>a Risoleta Neves, mulher <strong>de</strong> Tancredo,durante a internação do presi<strong>de</strong>nte eleito108O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


À esquerda, José Sarney ajuda a fechar o caixão <strong>de</strong>tANCREDO Neves. Acima, homenagem da população. abaixo,mENSAGEm <strong>de</strong> Tancredo, internado, ao presi<strong>de</strong>nte emexercício, Sarney: “A Nação está registrando o exemploirrepreensível que o prezado amigo lhe transmite noexercício da Presidência da República”“A década começou ainda tendo que aguentaro general Figueiredo no po<strong>de</strong>r. De 1979 a 83tivemos que conviver com o <strong>de</strong>senvolvimentodo processo <strong>de</strong>mocrático e a sobrevivência doautoritarismo em nível do Executivo fe<strong>de</strong>ral,ainda senhor absoluto do Estado, apesar <strong>de</strong>quase ignorado pela socieda<strong>de</strong>. Figueiredoterminou o seu período pedindo à socieda<strong>de</strong>que o esquecesse. A alternância no po<strong>de</strong>r se<strong>de</strong>u através <strong>de</strong> negociações entre a ditadura eo Congresso e se realizou <strong>de</strong> forma dramáticacom a escolha e a morte <strong>de</strong> Tancredo na portado po<strong>de</strong>r que tanto aspirou durante toda asua vida. Sarney é colocado no cenário e nelefica durante cinco anos para <strong>de</strong>sgraça do paíse felicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uns poucos que do po<strong>de</strong>r seserviram como nunca.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 26 ]A tragédia grega109


Em 1974, quando tem início adistensão <strong>de</strong> Geisel, <strong>Betinho</strong>escreve no exílio o texto,“10 anos e 4 generais” (1ª páginaAO lado), no qual discute a<strong>de</strong>mocracia no <strong>Brasil</strong>“Des<strong>de</strong> o golpe militar <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1964,o <strong>Brasil</strong> já teve quatro militares na Presidência da República. Todos os militares abrem a perspectiva<strong>de</strong> um processo <strong>de</strong> ‘<strong>de</strong>mocratização’ do país, que se daria se as condições estivessem maduras parareceber a recompensa da Democracia. (...) Porém falar <strong>de</strong> Democracia no <strong>Brasil</strong> é uma questão <strong>de</strong>saber Democracia para quem.(...) Nunca como agora os gran<strong>de</strong>s proprietários, a gran<strong>de</strong> burguesia,principalmente estrangeira, gozaram <strong>de</strong> uma ‘Democracia’ tão ampla e tão profunda. Po<strong>de</strong>m dizersem medo <strong>de</strong> exagerar ou errar que têm no <strong>Brasil</strong> a <strong>de</strong>mocracia que tanto sonharam, sem os riscos da<strong>de</strong>mocracia que sempre temeram (como a <strong>de</strong> antes <strong>de</strong> 1964). (...) No entanto, se falamos <strong>de</strong> povo, <strong>de</strong>80% ou 90% da população brasileira, o quadro é calamitoso, e não há muito a acrescentar na <strong>de</strong>núnciainternacional que vem sendo feita em relação ao <strong>Brasil</strong>. Porém a Democracia não é somente umproblema <strong>de</strong> ótica, e sim <strong>de</strong> opção: como propiciar ou permitir a Democracia para a classe trabalhadorabrasileira e ao mesmo tempo garantir o máximo <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> para o gran<strong>de</strong> capital internacional (...)?Como permitir liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> reunião, <strong>de</strong> associação e reivindicação para a classe trabalhadora do <strong>Brasil</strong>e ao mesmo tempo construir um país on<strong>de</strong> a força <strong>de</strong> trabalho possa ser explorada ao máximo (...) ?Os dados que estão sendo revelados pouco a pouco na imprensa brasileira sobre ascondições <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong> trabalho da massa assalariada são <strong>de</strong> espantar.”[ betinho, em “10 anos e 4 generais”, Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ]110O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“O <strong>de</strong>senvolvimentodas <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>schegou a tal ponto que o Estado se <strong>de</strong>sgarroutotalmente da socieda<strong>de</strong>, e uma crise geral <strong>de</strong>legitimida<strong>de</strong> e governabilida<strong>de</strong> obrigou a ditadura aabrir o caminho para a <strong>de</strong>mocratização. É verda<strong>de</strong>que cerca <strong>de</strong> 10% a 15% da população ganharamcom a industrialização internacionalizada.Às custas do resto que ficou na margem.”[betinho, em Escritos indignados, p. 17 ]acima, Geisel no funeral <strong>de</strong> Tancredo. À esquerda, no primeiroplano, Tancredo e o presi<strong>de</strong>nte Figueiredo“Des<strong>de</strong> o começo dos anos 1980 que o capitalmundial se reconcentra nas economias<strong>de</strong>senvolvidas. (...) Isso foi o suficiente paraque o <strong>Brasil</strong> gran<strong>de</strong> ficasse pequeno, e o Milagrebrasileiro fizesse água.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 17 ]111


(“A ditadura nãoentregou a rapaduraporque quis.Essa rapadura foi sendo tomada <strong>de</strong>la,aos pedaços, mas foi sendo tomada <strong>de</strong>la.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 195 ](


Diretas JáUm dos maiores movimentos populares da história brasileira, acampanha Diretas Já, cujo ápice foi em 1984, reivindicou o votodireto para a escolha do próximo presi<strong>de</strong>nte. A proposta foi, noentanto, <strong>de</strong>rrotada no Congresso. O Colégio Eleitoral, formado porparlamentares, escolheria o próximo mandatário.Manifestação na Praça da Sé, em São Paulo,pelas eleições presi<strong>de</strong>nciais diretasA tragédia grega113


“A campanha das eleiçõesdiretas foram manifestaçõesda oposição política,era a oposição política que queria a eleição direta, eram os estudantes, osartistas, os intelectuais, o movimento sindical, enfim, as chamadas forçassociais <strong>de</strong>mocráticas, essas é que pressionavam pelas eleições diretas eque foram crescendo <strong>de</strong> baixo para cima. Cada vez mais se falava dasdiretas, aí surgiu o slogan ‘Diretas Já’, e esse slogan passou a dominar ocenário político durante todo o tempo. Não foi nada que tivesse surgidodas elites políticas ou nas direções dos partidos. Ela veio <strong>de</strong> baixo.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 198 ]114O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Acho que o processo <strong>de</strong> abertura também é filhoda esquerda, com seus acertos e com seus erros.Foi a esquerda que manteve acesa a chama daluta pela <strong>de</strong>mocracia. Os setores dominantes,a elite, eles se acomodaram. Da forma como aditadura tocava, eles dançavam. Quem dançavana contramão, quem andava na contramão,quem pregava a contramão era a esquerda. Isso éum mérito que ninguém po<strong>de</strong> tirar da esquerda.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 195 ]à esquerda, Luiz Inácio Lula da Silva, UlyssesGuimarães, Leonel Brizola, Tancredo Neves,entre outros, no palanque das Diretas JáManifestação pelas diretas no Rio <strong>de</strong> JaneiroLula e Tancredo no palanque das Diretas JáA tragédia grega115


(“A Nova Repúblicaterminou e amiséria aumentou.O ‘tudo pelo social’ se realizoucomo tudo pelo capital.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 51 ](


A Nova RepúblicaNo Colégio Eleitoral <strong>de</strong> 1985, Tancredo Neves era o candidatoda oposição, e Paulo Maluf, da situação. A base política doregime militar rachou, e vários políticos importantes da direitaapoiaram a chapa <strong>de</strong> Tancredo e Sarney. A coalizão foibatizada <strong>de</strong> Aliança Democrática e fundaria a Nova República.Tancredo Neves vitorioso no Colégio EleitoralA tragédia grega117


“A Aliança Democrática,majoritariamente liberal,se constitui num marco da história política do <strong>Brasil</strong>,exatamente por ser a primeira vez em que os liberais,um setor <strong>de</strong>les agora dissi<strong>de</strong>nte no governo e no partidodo governo, se aliam à esquerda, e não à direita. Esse fatoé tão importante que funda a Nova República.”[ betinho, em Construir a utopia, p. 39 ]à direita, multidão acompanhou em são paulo votação docolégio eleitoral. acima, tancredo, em campanha118O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Nos anos 1960, o confronto político colocavaem campos opostos uma direita conservadora,disputando hegemonia com uma esquerda liberalreformista. (...) O golpe <strong>de</strong> 64 colocou no po<strong>de</strong>ruma aliança liberal autoritária que (...) tentoumo<strong>de</strong>rnizar o capitalismo, sob tutela militar.Queriam garantir a livre iniciativa e a liberda<strong>de</strong> docapital (...) às custas da supressão da luta política.(...) Cresceu a resistência ao regime militar, queterminou por <strong>de</strong>finir nos anos 70 e 80 um novoconfronto, <strong>de</strong>ssa vez colocando em campos opostosconservadores autoritários e uma aliança liberal<strong>de</strong>mocrática que <strong>de</strong>rrotou o regime militar (...).Liberalismo e <strong>de</strong>mocracia ganhavam com suascoincidências contra o autoritarismo conservador.Essa foi a razão e a base da aliança. Diga-se <strong>de</strong>passagem que, se a inspiração do movimento era<strong>de</strong>mocrática e popular, o i<strong>de</strong>ário, no entanto, e opo<strong>de</strong>r real pertenciam ao mundo do liberalismo.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 111 e 112 ]Tancredo diante do Colégio Eleitoral que o elegeuA tragédia grega119


em sentido horário, Tancredoe Getúlio VARGAS, Tancredo e JK,tANCREDO e Jango,tANCREDO e Jânio120O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Tancredo Neves, quandofoi eleito, tinha mais <strong>de</strong>50 anos <strong>de</strong> vida pública.Ele veio da época do Getúlio. Ele foi a pessoa que ficou com acaneta, a famosa caneta <strong>de</strong> Getúlio, da carta.O Tancredo andava com ela o tempo todo para mostrar queele tinha essa história. Ele lutou no processo político brasileiropara ser governador, presi<strong>de</strong>nte, todos os cargos.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 199 ]A tragédia grega121


“José Sarney era o homem<strong>de</strong> confiança dos militares.Ele era a expressão da ditadura militar no governo. Viroupresi<strong>de</strong>nte! (...) Sarney representa a oligarquia brasileira, o atrasobrasileiro que sempre fez a política, que sempre dominou napolítica, e que tem uma trajetória <strong>de</strong> oportunismos e aci<strong>de</strong>ntesque o colocam em evidência, o colocam na história, tiram dahistória. Enquanto houver figuras como Sarney, os caminhos da<strong>de</strong>mocracia estarão com muitas pedras pela frente e as forçasconservadoras estarão bem tranquilas.”[ betinho, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 222 ]122O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


em sentido horário: José Sarneyreunido com o Ministério;Sarney e Leonel Brizola; sarneycom figueiredo em evento dopartido do governo; sarneyentre geisel e castelo no inícioDA ditadura“O período Sarney foi um dos <strong>de</strong>sgovernos mais prolongadosda história brasileira, caracterizado pela produção da crise socialmais profunda, pelo agravamento da crise econômica, por todasas tentativas <strong>de</strong> continuísmo e <strong>de</strong> <strong>de</strong>smoralização do processo <strong>de</strong><strong>de</strong>mocratização em curso da socieda<strong>de</strong>. Em cinco anos, consegueenviar para o sistema financeiro mundial mais <strong>de</strong> 56 bilhões<strong>de</strong> dólares a título <strong>de</strong> juros e amortizações da dívida externa,enquando aprofunda a falência do sistema público <strong>de</strong> ensino,saú<strong>de</strong>, habitação e saneamento. (...) O governo Sarney só nãoacabou com o país porque o <strong>Brasil</strong> é maior que a crise.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 26 e 27 ]A tragédia grega123


(“Apesar <strong>de</strong> Sarney,o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratização do país avançacom a elaboração <strong>de</strong> uma nova Constituição,a primeira elaborada com expressivaparticipação da socieda<strong>de</strong>.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 18 ](


ConstituintePresi<strong>de</strong>nte da Assembleia Constituinte,Ulysses Guimarães, diante <strong>de</strong> uma pilha <strong>de</strong>emendas populares para a ConstituiçãoUm dos principais eventos durante a chamada Nova Repúblicafoi a Assembleia Constituinte (1986-88). Presidida por UlyssesGuimarães, ela foi responsável por elaborar uma Carta <strong>de</strong>mocráticapara o <strong>Brasil</strong>, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tantos anos <strong>de</strong> autoritarismo.<strong>Betinho</strong> foi um dos que trabalharam por uma Constituição com preocupaçõessociais e pelo envio <strong>de</strong> emendas populares à Assembleia.A tragédia grega125


“Durante os dois últimos anos participamosdo processo constituinte. Milhões <strong>de</strong> pessoasdiscutiram a institucionalização do Estado, a<strong>de</strong>mocratização do po<strong>de</strong>r e da socieda<strong>de</strong> e asgran<strong>de</strong>s questões nacionais e internacionais. O<strong>Brasil</strong> realizou um gran<strong>de</strong> seminário e ao finalse votou uma Constituição, que tem falhasgraves, como a questão agrária, mas também temmuitas conquistas no plano dos direitos sociais,das liberda<strong>de</strong>s individuais e, principalmente, noplano político com o fim do po<strong>de</strong>r absoluto doExecutivo fe<strong>de</strong>ral e a restauração da função dospo<strong>de</strong>res do Legislativo em todos os níveis. A novaConstituição é uma obra ainda a ser acabada,aperfeiçoada, mas é uma pedra fundamental naconstrução <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> mais <strong>de</strong>mocrática.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 27 ]126O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


da esquerda para a direita: manifestação por novaConstituição; publicação dos movimentos sociais sobre aconstituinte; ulysses Guimarães e o texto constitucional;Ulysses Guimarães saúda plenário“Tivemos pela primeira vez nanossa história uma experiência coletiva<strong>de</strong> discussão sobre Constituição.Através, por exemplo, das emendas populares. Milhões <strong>de</strong> pessoas participaram do <strong>de</strong>bateda Constituição. Isso é um capital que ninguém tira. Essa é uma experiência acumuladaque ninguém tira. É uma consciência nossa, é uma consciência da socieda<strong>de</strong> civil. Agora,eu creio que nossa história é um pouco ingrata conosco mesmo, nesse sentido. Nós, asocieda<strong>de</strong>, sempre fazemos a coisa boa, ou pelo menos fazemos muito melhor, não é?Agora, quando chega um <strong>de</strong>terminado nível, a classe dominante, ou pelo menos setoresdominantes da classe dominante, sempre fazem uma resposta bastante pífia. Eu creio quemesmo que a Constituição seja ruim... Aí eu diria como os portugueses: a luta continua,nós vamos seguir essa luta mesmo que leve duzentos anos.”[ betinho, no programa Roda Viva, 14/12/1987 ]A tragédia grega127


(“Collor assumiu,com toda a arrogância<strong>de</strong> quem achava que, com aqueles 35 milhões<strong>de</strong> votos, ele po<strong>de</strong>ria fazer o que quisesse. E duranteos anos em que ele foi presi<strong>de</strong>nte nós assistimosao maior festival <strong>de</strong> loucura <strong>de</strong> que se tem notícia.”[ BETINHO, em Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 224 ](


Tragédia, <strong>de</strong> novoO jovem Fernando Collor (1º à esq.) num evento emALAGOAS com o general-presi<strong>de</strong>nte Ernesto Geisel(centro da mesa)Um ano <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> promulgada a Constituição, o <strong>Brasil</strong> finalmenteelegeu o seu presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> forma direta. FernandoCollor <strong>de</strong> Mello <strong>de</strong>rrotou no segundo turno Luiz Inácio Lulada Silva, do PT. A apertada vitória <strong>de</strong> Collor ficou marcada poruma polêmica: a reportagem do Jornal Nacional, da Re<strong>de</strong> Globo, sobre oúltimo <strong>de</strong>bate entre os presi<strong>de</strong>nciáveis. Profissionais da própria emissoraacusaram a edição do <strong>de</strong>bate <strong>de</strong> ter sido ten<strong>de</strong>nciosa, a favor <strong>de</strong> Collor. Onovo presi<strong>de</strong>nte, com discurso e práticas personalistas, pregava o Estadomínimo, mas iniciou o seu governo com uma intervenção <strong>de</strong> choque: obloqueio <strong>de</strong> contas bancárias, parte <strong>de</strong> um plano anti-inflação.A tragédia grega129


à esquerda, Capa da revista Istoé/Senhor<strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1989. abaixo, <strong>Betinho</strong> vota em 1989“Apresentaram-se cinco ou seis candidatos, uma parte<strong>de</strong>les já conhecida da história política brasileira (...), e seapresentaram dois candidatos que, pela dimensão da novida<strong>de</strong>e também da linguagem, começaram a capturar a imaginaçãopolítica brasileira, a opinião pública. De um lado foi oLula, com o PT, que era um operário, a oposição, o novo napolítica, ‘sem medo <strong>de</strong> ser feliz’, uma série <strong>de</strong> coisas novasque capturaram a população. E um jovem, 40 anos, FernandoCollor <strong>de</strong> Mello, <strong>de</strong> uma família oligárquica do Nor<strong>de</strong>ste,começou a ter um comportamento, uma linguagem, ummodo <strong>de</strong> se apresentar totalmente novo na política, umcandidato à Presidência da República que gostava <strong>de</strong> jetsky, que falava da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. E esse jovem, cuja histórianão era das melhores e era muito pouco conhecida na vidapolítica brasileira, acabou se transformando numa aposta dosetor dominante que passou a ter um medo muito gran<strong>de</strong> davitória do Lula. (...) Nós assistimos, então, um dos maioresespetáculos <strong>de</strong> armação política <strong>de</strong> mídia com repercussão naopinião pública, que foi a eleição <strong>de</strong> Collor <strong>de</strong> Mello.”[ BETINHO, EM Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 223 e 224 ]130O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“O objetivo maior do governo atual é transformar o<strong>Brasil</strong> num país <strong>de</strong> Primeiro Mundo. Em nome doparaíso capitalista do Primeiro Mundo se justificatudo. O programa maior do governo é mo<strong>de</strong>rnizaro capitalismo, internacionalizar a economia (...),privatizar tudo o que for possível, reduzir o Estadoà sua dimensão mínima (...). Por isso, (...) éfundamental estabelecer a perspectiva <strong>de</strong> mudançae <strong>de</strong>ixar claro qual é o caminho para o PrimeiroMundo. (...) No Primeiro Mundo capitalista, nãose bota a mão na conta-corrente dos cidadãos e serespeita a proprieda<strong>de</strong> privada tal como <strong>de</strong>finidana Constituição. O governo só vai até on<strong>de</strong> a leipermite e só vai além quando se muda a lei.”[ BETINHO, em Escritos indignados, p. 72-75 ]“Estamos ainda vivendo osecos <strong>de</strong> um dos momentosmais impressionantes<strong>de</strong> nossa vida política, quando um lí<strong>de</strong>r operário quase se elegeu presi<strong>de</strong>nteda República da oitava economia capitalista, caracterizada por uma classedominante elitista, autoritária e intolerante. A lembrança das gran<strong>de</strong>smobilizações <strong>de</strong> massa, do entusiasmo produzido pelo processo <strong>de</strong> discussãodos gran<strong>de</strong>s problemas nacionais, dos lances do golpe, da manipulaçãoda mídia, <strong>de</strong> candidaturas tiradas <strong>de</strong> algumas cartolas, do baixo níveltransformado em tática eleitoral ainda está diante <strong>de</strong> nossos olhos como queinsistindo em permanecer no presente (...). No segundo turno, a vitória <strong>de</strong>Collor também é a vitória <strong>de</strong> Lula. O <strong>Brasil</strong> dividido ao meio.”O presi<strong>de</strong>nte Fernando Collor[ BETINHO, EM Escritos indignados, p. 28 e 29 ]A tragédia grega131


(“Acho que nós vivemosum momento trágico,dramático da vida brasileira, mas com final feliz.Finalmente nós saímos do ciclo da <strong>de</strong>sgraça.Porque com Getúlio acaba em morte, com Jânio,em renúncia, com Jango, em ditadura, com Tancredo,em morte. Nós só tínhamos final infeliz.O impeachment foi o primeiro final felizda nossa vida política.”[ BETINHO, EM Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 225 e 226 ](


O fim da <strong>de</strong>sgraçaRepresentantes da socieda<strong>de</strong> civil marcharam pelaEsplanada dos Ministérios para entregar pedido <strong>de</strong>impeachment <strong>de</strong> Collor ao CongressoAcusado <strong>de</strong> se beneficiar <strong>de</strong> um esquema <strong>de</strong> corrupção li<strong>de</strong>rado pelotesoureiro da sua campanha, Paulo César Farias, o PC, o presi<strong>de</strong>nteFernando Collor passou a ser investigado por uma Comissão Parlamentar<strong>de</strong> Inquérito (CPI), que recomendaria o seu impeachment.A população, principalmente os estudantes, tomaram as ruas do <strong>Brasil</strong> paraexigir o “Fora Collor”. Criado naquele período por, entre outros, <strong>Betinho</strong>, oMovimento pela Ética na Política ganhou força e a a<strong>de</strong>são <strong>de</strong> cada vez maisorganizações e personalida<strong>de</strong>s. A Câmara acabaria aprovando o impeachmentdo presi<strong>de</strong>nte e, antes que o Senado também o fizesse, Collor renunciou em1992. O seu vice, Itamar Franco, assumiu o Planalto.A tragédia grega133


Representantes da socieda<strong>de</strong> civil se dirigem aoCongresso para entregar o pedido <strong>de</strong> impeachmentao Congresso Nacional, no dia 1º <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong>1992. <strong>Betinho</strong> segue na fila da frente. Mais tar<strong>de</strong> elecomentaria sobre a marcha: “Não conheço fato maisbonito pelo seu simbolismo, pela sua força, do que esse<strong>de</strong> que eu tive a satisfação e a honra <strong>de</strong> participar”.“Esse jovem nãosó tinha tomadodinheiro públicoatravés <strong>de</strong> uma medida <strong>de</strong> políticaeconômica, como ele estava, com o seu PCFarias, tomando dinheiro da socieda<strong>de</strong>, dosempresários e, por via indireta, do próprioEstado, para fins do seu projeto pessoal (...).E o susto maior ainda porque essa <strong>de</strong>núncianão veio <strong>de</strong> um inimigo político. Essa<strong>de</strong>núncia veio do próprio irmão, Pedro Collor.Eu acho que aí nós entramos <strong>de</strong> novo naquelasituação em que a política se transforma, foiuma paixão, foi um drama, foi uma tragédia.Era algo que só podia terminar em tragédia.”[BETINHO, EM Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 224 ]“[O impeachment] foi uma gran<strong>de</strong> surpresa para todo mundo,porque nós mesmos dizíamos: ‘Isso no <strong>Brasil</strong> não vai darcerto’. Todos os analistas políticos diziam: ‘Isso no <strong>Brasil</strong> nãoacontece, isso é uma coisa para acontecer uma vez ou outranos Estados Unidos, no Primeiro Mundo, mas aqui isso nãovai acontecer; o Congresso é todo pró-Collor, vai ser todocomprado’. Mas um grupo <strong>de</strong> cidadãos saiu da OAB (Or<strong>de</strong>mdos Advogados do <strong>Brasil</strong>), eram cento e poucos cidadãos, entreos quais eu estava, saímos num <strong>de</strong>terminado momento da se<strong>de</strong>da OAB, em Brasília, <strong>de</strong> braços dados, com uma solicitaçãoformal <strong>de</strong> impeachment do presi<strong>de</strong>nte ao Congresso. Efomos andando pela Esplanada dos Ministérios até chegarao Congresso. Eu não consegui chegar até lá <strong>de</strong>ntro porqueera tal a massa que foi se formando... Nós começamos centoe poucos. Quando chegamos lá havia umas três mil pessoasentupindo as salas e cantando o hino nacional e tudo mais.Era a força da cidadania que estava ali. Obviamente, a essaaltura, nós avançávamos pela rua, e a mídia, os fotógrafos, ascâmeras <strong>de</strong> televisão recuavam para filmar aquela caminhada(...). O dr. Barbosa Lima Sobrinho foi quem passou às mãosdo Congresso o pedido da cidadania.”[ BETINHO, EM Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 225 e 226 ]134O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Aí acho que a própriasocieda<strong>de</strong> se <strong>de</strong>u conta da sua força,se <strong>de</strong>u conta da sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lutar contra a corrente e <strong>de</strong> andar na contramão.Na contramão dos analistas, na contramão dos partidos, na contramão dosinteresses, na contramão do governo, na contramão do po<strong>de</strong>r. Tinha nascido ali umaconcepção, uma experiência fundamental do ponto <strong>de</strong> vista da <strong>de</strong>mocracia.Tinha nascido ali o cidadão. Tinha nascido a cidadania.”[ BETINHO, EM Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia, p. 226 e 227 ]Manifestantes em frente ao congresso pe<strong>de</strong>mo impeachment do presi<strong>de</strong>nte Collor“A história política brasileira apresenta até agorabasicamente dois tipos <strong>de</strong> lí<strong>de</strong>res políticos. Oorgânico, aquele que surge <strong>de</strong> um processo<strong>de</strong> composição <strong>de</strong> interesses <strong>de</strong> classe, atravésda participação nos movimentos sociais, empartidos políticos ou na administração pública.O inorgânico, aquele que surge no cenário comouma novida<strong>de</strong>, um fenômeno. (...) O orgânicopo<strong>de</strong>, como Tancredo, viver toda uma vida<strong>de</strong>dicado ao po<strong>de</strong>r, ao partido, ser eleito paradiferentes funções e nessa trajetória <strong>de</strong>finir umabiografia com um perfil claro (...). O inorgânicotem uma trajetória rápida, inexplicável à primeiravista (...). Neste último século, tivemos no<strong>Brasil</strong> pelo menos dois exemplos <strong>de</strong> políticosinorgânicos: Jânio Quadros e Fernando Collor <strong>de</strong>Mello. (...) Creio que a característica fundamentaldo político inorgânico, e particularmente daquelesque triunfam, é o voluntarismo.”(<strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 44-47)A tragédia grega135


Mantimentos arrecadadospela Ação da CidadaniaA vez da cidadania


(“No combate àfome há o germe damudança do país.Começa por rejeitar o que era tido comoinevitável. Todos po<strong>de</strong>m e <strong>de</strong>vem comer,trabalhar e obter uma renda digna, ter escola,saú<strong>de</strong>, saneamento básico, educação, acesso àcultura. Ninguém <strong>de</strong>ve viver na miséria. Todostêm direito à vida digna, à cidadania.A socieda<strong>de</strong> existe para isso. Ou, então,ela, simplesmente, não presta para nada.”[ betinho, em Ética e cidadania, p. 34 ](


FRAGMENTO DA Carta em que CARLOS Afonsopropõe o <strong>Ibase</strong> a <strong>Betinho</strong> e Marcos Arruda“O <strong>Ibase</strong> nasceu <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>iado Carlos Afonso, que me escreveuuma carta quando a gente estavano México dizendo o seguinte:‘Olha, dado que a anistia vai acontecer e nós vamos voltar mesmo,por que a gente não faz um instituto no <strong>Brasil</strong> para estudar políticasgovernamentais?’ Essa foi a primeira i<strong>de</strong>ia do <strong>Ibase</strong>. Formulamoso projeto, eu cheguei com ele e comecei a discutir a i<strong>de</strong>ia.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]140O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


<strong>Betinho</strong> no início dos anos 1980, e <strong>Betinho</strong>com o seu segundo filho, Henrique, nascido em 1982“Instalado no Rio, eu peguei os US$ 6 mil dotrabalho [<strong>de</strong> consultoria feito em 1980] para a FAO(Organização das Nações Unidas para a Alimentaçãoe a Agricultura) e os dividi em 12 envelopes com500 dólares cada. Sem emprego, eu <strong>de</strong>veria gastarapenas um envelope por mês, durante um ano.Nesse meio tempo o projeto do <strong>Ibase</strong> precisava seraprovado. Perto <strong>de</strong> completar os 12 meses, chegueia conversar com a Maria: ‘Olha, se chegar no finale não tiver solução nenhuma, eu não vou aceitarqualquer emprego. Declaro minha falência, voltopara minha mãe e você volta para a sua’. (...)Brinca<strong>de</strong>iras como esta ajudavam a manter o humor,mas o aperto continuava. Parti para mais <strong>de</strong> 60reuniões, discutindo a i<strong>de</strong>ia do <strong>Ibase</strong> com grupos <strong>de</strong>professores, <strong>de</strong> cientistas e <strong>de</strong> possíveis colaboradores.Formulamos a proposta e a apresentamos às fontes<strong>de</strong> financiamento. Ao encerrar 1980, nós tínhamosconseguido US$ 60 mil.”[ <strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 159 e 160 ]A vez da cidadania141


“Inicialmente pretendíamos montar um institutoque fizesse um acompanhamento crítico daspolíticas <strong>de</strong> governo. Ao mesmo tempo daríamosassessoria aos movimentos sociais para elesterem como agarrar no pé do governo. No<strong>de</strong>correr das nossas discussões nos <strong>de</strong>mos conta<strong>de</strong> que os sindicatos, as associações <strong>de</strong> bairro, ascomunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> base, as pastorais queriam maisdo que isso. Elas queriam também informação,porque o nível <strong>de</strong> <strong>de</strong>sinformação era muito alto.Daí a proposta mudou para uma organizaçãoem quatro módulos, o econômico, o social,o político e o internacional. Aten<strong>de</strong>ríamos atodos os grupos, seríamos suprapartidários esuprarreligiosos. O esquema compreen<strong>de</strong>ria,portanto, quatro gran<strong>de</strong>s bancos <strong>de</strong> dados paraservir à <strong>de</strong>manda dos interessados. Era umai<strong>de</strong>ia nova, especialmente há oito anos, quandochegamos já dispostos a usar a informatização.Des<strong>de</strong> o início, dizíamos que tudo <strong>de</strong>veriaser computadorizado, <strong>de</strong> modo a agilizar aomáximo o atendimento aos movimentos sociais.Como projeto audacioso é claro que provocouuma certa perplexida<strong>de</strong> inicial.”[ <strong>Betinho</strong>, em Sem vergonha da utopia, p. 161 ]Um dos primeiros trabalhos do<strong>Ibase</strong> resultou no livro Carajás,sobre os projetos militares paraESSA região no norte do país142O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Em plena Abertura, <strong>Betinho</strong> participou dacoletânea <strong>de</strong> artigos Alternativas popularesda <strong>de</strong>mocracia: <strong>Brasil</strong> anos 80“É um anti-SNI.O ministério dainformação dos pobres.(...) Lutamos por uma socieda<strong>de</strong> igualitária eparticipativa. O <strong>Ibase</strong> não quer substituir os atoressociais. Não tem pretensão <strong>de</strong> dirigir os movimentospopulares. Nossa particularida<strong>de</strong> é justamente essa:não queremos ser po<strong>de</strong>r do Estado nem manipular osmovimentos contra ele.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 23/06/1985 ]A vez da cidadania143


(“As 18 maioresproprieda<strong>de</strong>s do<strong>Brasil</strong> somam 18milhões <strong>de</strong> hectarese têm um território equivalente a Portugal,Suíça e Holanda juntos. Dezoito senhorescercaram para si o espaço equivalente a trêspaíses europeus! Esse exemplo dá a dimensão donível <strong>de</strong> exclusão a que chegamos e da imensadistância que estamos da <strong>de</strong>mocracia.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 109 ](


Reforma agráriaAreforma agrária foi uma das primeiras ban<strong>de</strong>iras do <strong>Ibase</strong> e talveztenha sido a mais importante para os movimentos sociaisnos anos 1980, quando os conflitos agrários matavam centenas<strong>de</strong> pessoas no campo brasileiro. A disputa entre conservadorese progressistas pela reforma agrária mobilizou boa parte do processo constituinte(1986-88). Em 1983, o <strong>Ibase</strong> e outras entida<strong>de</strong>s lançaram a CampanhaNacional Pela Reforma Agrária (CNRA). <strong>Betinho</strong> foi indicado coor<strong>de</strong>nadorda campanha. O <strong>Ibase</strong> produziu estudos e organizou ativida<strong>de</strong>s sobreo tema. Em 1990, o instituto foi um dos promotores do evento “Terra e Democracia”,que levou milhares <strong>de</strong> pessoas ao Aterro do Flamengo, no Rio <strong>de</strong>Janeiro, para ativida<strong>de</strong>s relacionadas ao meio ambiente e shows musicais.A vez da cidadania145


“Enquanto membro daCampanha Nacional pelaReforma Agrária (CNRA),continuo achando que a luta pela reforma agrária é uma luta políticafundamental. É uma das reformas mais graves, mais sérias e maisdifíceis <strong>de</strong> realizar. Ela está na raíz da socieda<strong>de</strong> brasileira; <strong>de</strong> tudoque a socieda<strong>de</strong> brasileira tem <strong>de</strong> autoritária, atrasada, <strong>de</strong> negativo.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista <strong>Brasil</strong> Agrícola, julho DE 1986 ]Os donos da terra,publicação do <strong>Ibase</strong>146O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“No <strong>Brasil</strong>, é assim,Osmarino. Tudo émuito mais importante<strong>de</strong>pois que se per<strong>de</strong>.A vida só tem valor <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> morta. (...) Na últimaconversa que tivemos, (...) você estava <strong>de</strong>cidido a viverjunto com os teus companheiros, a não pedir asilonas cida<strong>de</strong>s (...). Assim mesmo, tentei dizer que nãovia sentido em lí<strong>de</strong>r morto, dado que o fundamental éo movimento. Mas no seu olhar brilhava uma estrelavoltada para outro norte, on<strong>de</strong> lutar pela própria vida nãoafasta a solidarieda<strong>de</strong> para com todos os <strong>de</strong>mais. Eu já viessa luz em outros olhos. Seu espelho é Chico Men<strong>de</strong>s.”<strong>Betinho</strong> <strong>de</strong>nuncia as ameaças à vida <strong>de</strong>Osmarino Amâncio, lí<strong>de</strong>r seringueiro doAcre, e faz menção a Chico Men<strong>de</strong>s (foto),assassinado em 1988, no mesmo Estado,por <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os direitos dos seringueiros.Osmarino permanece vivo e na luta.[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 71 ]148O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“A terra não é só umespaço on<strong>de</strong> vivemos.É um mundo que produz e condiciona nossa própriaexistência, que antece<strong>de</strong> e se prolonga em nossa vidaem todas as suas dimensões. Somos seres terrestres.A <strong>de</strong>mocracia não é só um espaço institucional dapolítica. Ela, para existir, <strong>de</strong>ve também realizar-se e estarpresente em todas as dimensões <strong>de</strong> nossas vidas. Talvezpor isso haja uma relação histórica tão estreita entreterra e <strong>de</strong>mocracia. Quando a terra é apropriada, usada,monopolizada por uns poucos, a <strong>de</strong>mocracia não existe.Quando a <strong>de</strong>mocracia não existe, a terra se transformaem um mundo <strong>de</strong> uns poucos, contra a maioria.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 108 e 109 ]A vez da cidadania149


(“Em qualquer paísdo mundo umacida<strong>de</strong> como o Rioseria tratada como patrimônio nacional.Pena que aqui não seja.”[ betinho, em Escritos indignados, p. 94 ](


Rio <strong>de</strong> Janeiromanifestação no centro do rio <strong>de</strong> janeirocontra a violênciaRadicado no Rio <strong>de</strong> Janeiro após a Anistia, <strong>Betinho</strong> virou um militantedas causas da cida<strong>de</strong>. Em 1988, quando o Rio passava porgrave crise financeira, e o clima era <strong>de</strong> pessimismo, <strong>Betinho</strong> coor<strong>de</strong>noua campanha “Se liga, Rio” e assumiu o cargo não remunerado<strong>de</strong> Defensor do Povo da Cida<strong>de</strong> junto à Prefeitura. Em 1995, eletambém participaria do “Reage, Rio”, contra a onda <strong>de</strong> violência. Tambémnos anos 90, <strong>Betinho</strong> lançou o projeto “Se essa rua fosse minha”, voltadopara as crianças <strong>de</strong> rua do Rio <strong>de</strong> Janeiro.A vez da cidadania151


“Todas as cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> mais <strong>de</strong>4 milhões <strong>de</strong> habitantes sãoviolentas e têm crime organizado.O problema é que em Nova York o crime é realmente organizado: você éassaltado nesse quarteirão, mas não no outro. No Rio, o empobrecimento,o esvaziamento econômico e o incremento do tráfico <strong>de</strong> drogas está<strong>de</strong>sorganizando o crime, está re<strong>de</strong>finindo o território da violência (...). E issonuma cida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sprotegida. Se não partirmos para uma ofensiva, vamos parauma situação colombiana, <strong>de</strong> <strong>de</strong>saparecimento do Estado, on<strong>de</strong> os juízes sãoassassinados e etc. Os riscos são gran<strong>de</strong>s, por isso o Rio tem <strong>de</strong> se ligar.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 23/10/1988 ]“Atualmente não é fácil falar bem do Rio.De repente é como se tudo <strong>de</strong> mal tivesseescolhido o Rio para morar: pobreza, violência,sequestros, narcotráfico, infância abandonada,ruas esburacadas, sujas, praias poluídas. (...)Morar no Rio é como se fosse uma coisainsuportável. No entanto, o Rio po<strong>de</strong> ser vistosob muitos outros ângulos, que, sem fugir àrealida<strong>de</strong>, mostra o que está à vista <strong>de</strong> todos.O Rio é a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> referência internacional parao <strong>Brasil</strong> (...). Vivo há <strong>de</strong>z anos no Rio e a únicavez que fui roubado foi num hotel em Nova York.A violência urbana é uma realida<strong>de</strong> trágica, quenão constitui privilégio do carioca. (...)O Rio ainda consegue ser uma cida<strong>de</strong> bela, alegre,<strong>de</strong>spreocupada, viva, aberta, <strong>de</strong>mocrática.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 92 e 93 ]152O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


A vez da cidadania153


“Ao longo dos últimos anosvários jornais foram registrandonotícias sobre a morte <strong>de</strong> criançase <strong>de</strong> adolescentes no <strong>Brasil</strong>.Eram mortas a tiro, <strong>de</strong>ixadas nas praças e ruas <strong>de</strong> algumas das gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s,Rio, São Paulo, Recife, Salvador. (...) A morte <strong>de</strong>ssas crianças não tinha autoria. Eracomo se <strong>de</strong> repente algo tivesse acontecido para interromper <strong>de</strong> forma brutal umavida (...). A verda<strong>de</strong>, a triste e efetiva verda<strong>de</strong>, é que as crianças assassinadas no<strong>Brasil</strong> e <strong>de</strong>nunciadas pela Anistia Internacional não valem nada! (...) Quando numpaís (...) a vida <strong>de</strong> crianças per<strong>de</strong> o sentido é <strong>de</strong> se perguntar em que mundo estamosvivendo. E essa é a pergunta que a morte das crianças pobres e negras brasileirasfaz a todos nós, governo e socieda<strong>de</strong>. (...) Mas bastou que o anúncio fosse feito noPrimeiro Mundo pela Anistia Internacional para que uma tempesta<strong>de</strong> <strong>de</strong> consciênciairrompesse no <strong>Brasil</strong>. (...) No <strong>Brasil</strong>, não valem nada, no exterior viram pessoas.O que está acontecendo conosco?”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 23/09/1990 ]154O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Manifestação contra a violência no Rio“É claro que dar um abrigoàs crianças <strong>de</strong> rua é apenasum primeiro passo.Estamos conscientes <strong>de</strong> que elas precisam é <strong>de</strong> família, e que asfamílias precisam <strong>de</strong> emprego, <strong>de</strong> distribuição <strong>de</strong> renda, <strong>de</strong> terrapara trabalhar, <strong>de</strong> garantia dos seus direitos fundamentais. Porém,um primeiro passo precisa ser dado. E já! (...) Maldito é o país queconsegue transformar essas crianças <strong>de</strong> vítimas em culpadas, emameaça à segurança, e que <strong>de</strong>clara guerra a quem precisa <strong>de</strong> amor.”[ <strong>Betinho</strong>, em O Dia, 01/04/1992 ]A vez da cidadania155


(“Nós temos algunscuidados emrelação a ela.O primeiro é que nós não gostaríamos <strong>de</strong> jeitonenhum que ela fosse um show dos chefes <strong>de</strong>Estado para falar nada. Para que isso não ocorra,é fundamental que os movimentos sociais seconstituam numa espécie <strong>de</strong> contrapeso forte,claro, <strong>de</strong>finido, com propostas e principalmentecom manifestações, quer dizer, que não sejasimplesmente um gran<strong>de</strong> seminário.”[ betinho, NA REVISTA Teoria e Debate, nº 16 ](


Eco-92Debate durante o Fórum Global, na Eco-92Omundo veio ao Rio <strong>de</strong> Janeiro em 1992 para a Conferênciadas Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,a Eco-92 ou Rio-92, e para o Fórum Global da socieda<strong>de</strong>civil, que ocorreu <strong>de</strong> forma paralela. O <strong>Ibase</strong> teve papel <strong>de</strong><strong>de</strong>staque na conferência. Com o apoio da Organização das Nações Unidas(ONU), a instituição instalou uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> computadores no encontro.Na época, o <strong>Ibase</strong> já tinha o provedor <strong>de</strong> internet Alternex. Um ano antesda Eco-92, <strong>Betinho</strong> recebera da ONU o Prêmio Global 500, um dos maisimportantes do mundo na área ambiental.A vez da cidadania157


“Para mim o cenário i<strong>de</strong>alseria aquele em que houvesseum gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>bate, gran<strong>de</strong>smanifestações nesta cida<strong>de</strong>,uma pressão <strong>de</strong> massa que levasse os chefes <strong>de</strong> Estado a se mancareme fazerem um discurso que, se eu pu<strong>de</strong>sse escrever, começaria assim: ‘Primeiro,nós somos os principais responsáveis por tudo o que aconteceu. Segundo,nós assumimos diante da humanida<strong>de</strong> tais compromissos concretos...’. Issojá seria importante. Principalmente se o <strong>Brasil</strong> e o Rio <strong>de</strong> repente tomassemconsciência <strong>de</strong> que somos um gran<strong>de</strong> problema a ser enfrentado e que somoso resultado <strong>de</strong> um processo que tem que ser totalmente mudado. Se a gente forcapaz <strong>de</strong> produzir essa consciência, através <strong>de</strong> uma participação maciça <strong>de</strong> todomundo, acho que valerá a pena.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]158O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Publicações do <strong>Ibase</strong>“Des<strong>de</strong> o começo o <strong>Ibase</strong> trabalha temas que relacionam meioambiente, <strong>de</strong>senvolvimento e <strong>de</strong>mocracia. Quando surgiucom força a questão do meio ambiente, foi como se ela se<strong>de</strong>spregasse das outras dimensões e adquirisse a cor ver<strong>de</strong> –como se esta cor pu<strong>de</strong>sse ser separada do restante. Para nósela não se separa. Este prêmio Global correspon<strong>de</strong> a umacerta experiência realizada <strong>de</strong>ntro do <strong>Ibase</strong> nesta direção, masprincipalmente à iniciativa <strong>de</strong> uma pessoa, o Carlos Minc.Ele fez o meu currículo e convenceu o júri <strong>de</strong> que eu era umglobal, no bom sentido global do prêmio das Nações Unidas.É claro que receber um prêmio <strong>de</strong>sses hoje, particularmentepara o <strong>Ibase</strong>, tem um sentido, porque é uma espécie <strong>de</strong>reconhecimento, <strong>de</strong> aval <strong>de</strong> uma instituição internacional.E são só quinhentos ganhadores do prêmio no mundo inteiro.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista Teoria e Debate, nº 16 ]A vez da cidadania159


<strong>Betinho</strong> e o “micro”“O micro pra mim é um instrumento<strong>de</strong> quebra <strong>de</strong> monopólio. Comoequipamento, é a coisa mais próxima docidadão que você possa imaginar. (...)Quando você senta diante <strong>de</strong> um micro,ou você está se comunicando porqueestá fazendo um texto, ou porque entrouna internet. Você está tomando umapostura ativa na comunicação.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 24/10/1995 ]Lançado em 1989, o Alternexseria o primeiro servidor<strong>de</strong> internet do país fora dacomunida<strong>de</strong> acadêmica.160O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


A Eco-92 dariavisibilida<strong>de</strong> a umnovo ator político: aONG. No mesmo ano,<strong>Betinho</strong> escreveu textosobre o tema.“As ONGs nascem quando um grupo<strong>de</strong> pessoas <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> criar uma organizaçãopara fazer alguma coisa, nascem como comunida<strong>de</strong>. Não querem o po<strong>de</strong>r e nem têm fins <strong>de</strong> lucro.São entida<strong>de</strong>s públicas, mas não estatais ou empresariais. Nesse mundo do mercado ou do Estadoconstituem uma novida<strong>de</strong>. (...) São flexíveis, eficientes, inteligentes, não tem burocracia (...). UmaONG <strong>de</strong>smoralizada não prospera, <strong>de</strong>saparece. (....) No <strong>Brasil</strong> elas começaram a existir durante aprópria ditadura. Enquanto os militares perseguiam os partidos e sindicatos, as ONGs conseguiamcriar espaços <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> para colaborar com os setores sociais dominados. (...) Com a Abertura,elas se <strong>de</strong>senvolveram mais ainda e foram cada vez mais revelando sua vocação (...). As ONGsforam sendo <strong>de</strong>scobertas pelos atores nacionais e internacionais (...). Hoje estamos aí, trazendopara o <strong>Brasil</strong> mais <strong>de</strong> US$ 50 milhões <strong>de</strong> cooperação internacional (...). Cabe ao Estado, se for<strong>de</strong>mocrático e nessa medida, <strong>de</strong>scobrir que as ONGs são parceiras que <strong>de</strong>vem ser tratadas comosócias <strong>de</strong> um <strong>de</strong>stino comum em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> uma causa comum, em <strong>de</strong>fesa do bem público (...).Cabe às ONGs <strong>de</strong>scobrir que têm que cobrar do Estado esse comportamento (...). No momentoem que o <strong>Brasil</strong> busca caminho para a <strong>de</strong>mocracia e a superação da pobreza e da miséria, éfundamental <strong>de</strong>scobrir que as ONGs são um meio para isso e que não existirá <strong>de</strong>mocracia nessepaís sem o <strong>de</strong>senvolvimento amplo, geral e irrestrito da socieda<strong>de</strong> civil.”[ <strong>Betinho</strong>, em “ONGs: opção pela <strong>de</strong>mocracia”, Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ]A vez da cidadania161


(“A Ação daCidadania,essa luta pela<strong>de</strong>mocracia,cria, inventa, inova, não espera, tomainiciativa, transforma a realida<strong>de</strong> pelaspróprias mãos, e não pelas dos outros.”[ betinho, em <strong>de</strong>mocracia: cinco princípios e um fim, p. 74 ](


Ação da CidadaniaApartir <strong>de</strong> 1993, <strong>Betinho</strong> comandaria a Ação da Cidadaniacontra a Fome, a Miséria e pela Vida. A chamada Campanhacontra a Fome tomaria o país e tornaria <strong>Betinho</strong> símbolo eporta-voz da cidadania no <strong>Brasil</strong>. A Ação da Cidadania nasceu<strong>de</strong>ntro do Movimento pela Ética na Política. Ela pregava um trabalho<strong>de</strong>scentralizado, em que qualquer grupo, em qualquer local, po<strong>de</strong>ria e <strong>de</strong>veriarecolher alimentos e distribuí-los. A campanha e <strong>Betinho</strong> conquistaramgran<strong>de</strong> espaço nos meios <strong>de</strong> comunicação. Artistas, <strong>de</strong>signers, publicitáriospassaram a colaborar com a ação. Centenas <strong>de</strong> comitês contraa fome se formaram em todo o <strong>Brasil</strong>.A vez da cidadania163


Chegou a hora <strong>de</strong> colocar umbasta nesse processo insensatoe genocida gerador da misériaabsoluta que coloca milhões <strong>de</strong>pessoas nos limites insuportáveisda fome e do <strong>de</strong>sespero. (...)O tempo da miséria absoluta eda resignação com esse quadroacabou (...). Esse é o clamorético <strong>de</strong> nossos tempos, ao qualtudo mais <strong>de</strong>ve se subordinar.(...) Esse é hoje o gran<strong>de</strong> divisor<strong>de</strong> águas entre nós: entre osque querem erradicar a misériaainda nessa geração e os queinsistem em ficar indiferentes(...). Não se po<strong>de</strong> viver em pazem situação <strong>de</strong> guerra. Nãose po<strong>de</strong> comer tranquilo emmeio à fome generalizada.(...) O <strong>Brasil</strong> precisa mobilizartodas as suas energias para(...) colocar um fim à miséria.Deve criar em todos os lugarese com a participação <strong>de</strong> todasas pessoas a ação da cidadaniaem luta contra a miséria e pelavida. Conclamamos a todosa constituir esse movimento.(...) Que 1993 seja um ano <strong>de</strong>mudança <strong>de</strong> rumo <strong>de</strong> nossahistória a partir da ação <strong>de</strong> cadaum, da Ação da Cidadania.Carta da Ação da cidadania, assinadapelo Movimento pela Ética na Política[ trecho da carta da ação da cidadania ]164O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Foi <strong>de</strong>pois doimpeachment queo Movimento pelaÉtica na Políticaabriu os olhos para a incrível convivênciaentre <strong>de</strong>mocracia e miséria. Nasceu omovimento da Ação da Cidadania contra aFome, a Miséria e pela Vida.”[ <strong>Betinho</strong>, em <strong>de</strong>mocracia: Cinco princípios e um fim, p. 73 ]A vez da cidadania165


“Nós nãoestamos diante<strong>de</strong> uma simplescampanha,mas sim diante <strong>de</strong> um movimento.Um movimento que não tem comitê central,que não <strong>de</strong>ve obediência a nenhuma pessoa.Um movimento que po<strong>de</strong> mudar esse país.”[ <strong>Betinho</strong>, em publicação do Comitê RioDA campanha, agosto <strong>de</strong> 1994 ]Materiais da Ação da Cidadania166O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Eu acho que o assistencialista não queracabar com a miséria, ele quer perpetuá-la<strong>de</strong> outra forma. Na verda<strong>de</strong> ele é uma espécie <strong>de</strong> gigolô da miséria e não quer promover quem ajuda.Eu acho que a solidarieda<strong>de</strong> é uma coisa completamente diferente. E foi exatamente a confusãoque muita gente estabeleceu, entre uma coisa e outra, que nos prejudicou muito no início dacampanha. Porque eu dizia assim: ‘quem tem fome tem pressa’ e se você não oferece comida a quemestá morrendo <strong>de</strong> fome, não adianta você pensar na reforma estrutural daqui a <strong>de</strong>z anos, porquenão vai ter população para viver a reforma. Aí, as pessoas diziam: ‘mas isso é assistencialismo’,principalmente a esquerda. A esquerda tinha uma reação muito furiosa com a campanha da fome,porque ela dizia ‘você está atrapalhando a revolução’.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]A vez da cidadania167


“Uma pesquisa realizadapelo Ibope mostrouque 90% da populaçãoapóia a campanhae 30%, levando em conta apenas os adultos, jáparticipou <strong>de</strong> alguma forma do movimento. Isso dá emtorno <strong>de</strong> 28 milhões a 30 milhões <strong>de</strong> pessoas atuantes.No <strong>Brasil</strong> inteiro, a campanha gerou solidarieda<strong>de</strong> econsciência da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mudar o país em cima <strong>de</strong>questões essenciais: a fome e o <strong>de</strong>semprego. (...) Achoque os 30% têm que passar a, pelo menos, 70%. Temosque fazer crescer esse movimento pela ação <strong>de</strong> cada um.Quem não fez nada, que tome a iniciativa; não fiqueesperando que os outros resolvam os problemas do país.Se eu tivesse uma re<strong>de</strong> nacional <strong>de</strong> TV, faria um apelo:‘Por favor, que todo o cidadão e cidadã ocupe o seu lugar– não precisa apertar o cinto – e boa viagem’.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista Caras, nº 39 ]Materiais da Ação da Cidadania168


A vez da cidadania169


“Lula propôs ao presi<strong>de</strong>nteItamar Franco a criaçãodo Conselho Nacional<strong>de</strong> Segurança Alimentar,on<strong>de</strong> governo e socieda<strong>de</strong> trabalhariam juntos, e indicoutrês nomes: Marcelo Lavanère (Or<strong>de</strong>m dos Advogados do <strong>Brasil</strong>),dom Luciano Men<strong>de</strong>s (Conferência Nacional dos Bispos do <strong>Brasil</strong>)e o meu. Itamar se fixou no meu nome e me convidou para dirigiro que seria uma espécie <strong>de</strong> Ministério da Fome. Recuseie indiquei no meu lugar dom Mauro Morelli.”[ <strong>Betinho</strong>, em carta para O<strong>de</strong>d Grajew, Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ]acima, Dom Mauro Morelli (em pé) no 1º Congresso do Consea, com <strong>Betinho</strong>(no canto esquerdo). ao lado, o público do congresso170O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Com a saída <strong>de</strong> Collor, o novo presi<strong>de</strong>nteItamar Franco (entre <strong>Betinho</strong> e domMauro Morelli) <strong>de</strong>cidiu criar em 1993o Conselho Nacional <strong>de</strong> SegurançaAlimentar (Consea). <strong>Betinho</strong> recusariao convite para presidir o conselho, masaceitou integrá-lo. Dom Mauro Morellificou com a presidência do Consea.“O governoItamar foi muitoimportante.Ele estava, pessoalmente, comprometidocom isso [o combate à fome].”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]A vez da cidadania171


“Muitos participam. Mas ainda não é um movimento <strong>de</strong>conjunto. Não são poucos os que têm uma expectativa gran<strong>de</strong><strong>de</strong> que o governo resolva todos os problemas. A solução <strong>de</strong>ssasquestões – fome e <strong>de</strong>semprego – está na própria socieda<strong>de</strong>.Alguns empresários não assumem seu papel na cidadania.O normal seria que todos eles puxassem a campanha pelageração <strong>de</strong> empregos. Aí, eu só iria apoiar.”[ <strong>Betinho</strong>, na revista Caras, nº 39 ]172O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


A Ação da Cidadania se preocupou emmobilizar os empresários e combater o<strong>de</strong>semprego. Em 1997, <strong>Betinho</strong> foi umdos primeiros a propor um balanço socialpara as empresas.“É possível pensar nessa realida<strong>de</strong>: ternão somente um balanço financeirodas empresas, mas um social,para que o conjunto da socieda<strong>de</strong> tome conhecimento do que já avançamos e do queteremos ainda que avançar nessa direção. Os tempos e as consciências estão madurospara que essa i<strong>de</strong>ia caia em terreno fértil e se transforme em realida<strong>de</strong>. Que cada umtome a iniciativa e faça a sua parte enquanto há tempo. O <strong>Brasil</strong> não po<strong>de</strong> esperar que o<strong>de</strong>senvolvimento passe por cima dos interesses e das cabeças <strong>de</strong> milhões <strong>de</strong> pessoas.”[ <strong>Betinho</strong>, na Folha <strong>de</strong> S. Paulo, 26/03/1997 ]A vez da cidadania173


(“A solidarieda<strong>de</strong>é para mim hojeo cimento da<strong>de</strong>mocracia.”[ betinho, no programa roda viva, 23/12/1996 ](


o que é <strong>de</strong>mocracia<strong>Betinho</strong> autOGRAFA exemplar do livro<strong>de</strong>mocracia: Cinco princípios e um fim, sobre a<strong>de</strong>mocracia, lançado em 1996Se nos anos 1970 e 80, a preocupação do <strong>Betinho</strong> sociólogo era oEstado, nos anos 90, ainda antes da Campanha contra a Fome, ofoco <strong>de</strong>le se direcionava para a cidadania, à qual o Estado para ele<strong>de</strong>veria se subordinar. Na visão <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>, <strong>de</strong>mocracia e cidadania,“<strong>de</strong> mãos dadas”, seriam incompatíveis com o capitalismo e com asexperiências socialistas totalitárias.A vez da cidadania175


<strong>Betinho</strong> e os <strong>de</strong>mais autores do livro autOGRAFAm a obra“Inspirado nos cincoprincípios da <strong>de</strong>mocracia(liberda<strong>de</strong>, participação, diversida<strong>de</strong>, solidarieda<strong>de</strong> e igualda<strong>de</strong>),a Ação da Cidadania se propôs a obra do século: erradicar a miséria,mobilizar a socieda<strong>de</strong>, gerar atos <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>, distribuir alimentos,criar empregos e mudar a face, a cara da socieda<strong>de</strong> brasileira.Esse movimento ganhou a socieda<strong>de</strong>, corações e mentes, e virourealida<strong>de</strong>. É que <strong>de</strong>mocracia não vive sem solidarieda<strong>de</strong>, sem amorà igualda<strong>de</strong>, sem a participação <strong>de</strong> todas as pessoas nas mudançasque vêm através da ação, que não é puro discurso nem vive daspromessas do amanhã, esse amanhã estrutural que nunca acontecena conjuntura. Entramos com a Ação da Cidadania numa nova era,numa nova política, no caminho da <strong>de</strong>mocracia.”[ <strong>Betinho</strong>, em <strong>de</strong>mocracia: Cinco princípios e um fim, p. 73 e 74 ]176O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Cidadania e <strong>de</strong>mocraciaandam <strong>de</strong> mãos dadase não existem separadas.(...) Cidadania e <strong>de</strong>mocracia (...) têm o infinito comolimite. Não existe limite para a solidarieda<strong>de</strong>, a liberda<strong>de</strong>e a igualda<strong>de</strong>, a participação e diversida<strong>de</strong>. A <strong>de</strong>mocraciaé uma obra inesgotável.”[ <strong>Betinho</strong>, em <strong>de</strong>mocracia: Cinco princípios e um fim, p. 67 ]“Virar a política pelo avesso entre nós é produzir a proposta <strong>de</strong>uma política <strong>de</strong>mocrática que supere tanto a or<strong>de</strong>m autoritáriaque nos oprime como as propostas liberais que nos ilu<strong>de</strong>m. Édar um passo à frente em direção a uma socieda<strong>de</strong> que tenhacomo base os princípios da igualda<strong>de</strong>, diversida<strong>de</strong>, participação,solidarieda<strong>de</strong> e liberda<strong>de</strong>. (...) Uma política <strong>de</strong>mocrática começapor afirmar a soberania do cidadão, (...) e a subordinação doEstado aos objetivos livremente <strong>de</strong>finidos pela cidadania. (...)A socieda<strong>de</strong> vem primeiro, o Estado vem <strong>de</strong>pois. (...)No <strong>Brasil</strong>, o po<strong>de</strong>r estabelecido no Estado preten<strong>de</strong> semprecriar o mundo às avessas, e o <strong>Brasil</strong> que produz é um <strong>de</strong>sastre.A política liberal parte do Estado para a socieda<strong>de</strong>.A <strong>de</strong>mocrática parte da socieda<strong>de</strong> para o Estado.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 125 ]A vez da cidadania177


“Sem mudar a socieda<strong>de</strong>não adianta mudar o governo.A mudança é aparente,é uma armadilha, é uma mentira. Por isso meu olhare minha atenção estão concentrados sobre a socieda<strong>de</strong>.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 18/08/1994 ]“Numa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>mocrática o objetivo daeconomia é a produção <strong>de</strong> bens e serviçosnecessários para a satisfação plural e diversificada<strong>de</strong> todos os membros <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminadasocieda<strong>de</strong>. A produção <strong>de</strong>sses bens requer aparticipação <strong>de</strong> toda a socieda<strong>de</strong> em todas as suasetapas e po<strong>de</strong> ser realizada sob variadas formas,privadas, comunitárias e estatais ou outras porinventar. É nesse sentido que afirmamos seremincompatíveis <strong>de</strong>mocracia e capitalismo e que ficaclaro como o liberalismo tropeça em contradiçõesquando preten<strong>de</strong> se passar pelo que não é.Se pensamos, portanto, em uma proposta<strong>de</strong>mocrática para a economia, <strong>de</strong>veríamos(...) tentar percorrer o <strong>de</strong> sua superação[do capitalismo] por uma nova economia,um novo modo <strong>de</strong> produzir que tivesse objetivose formas <strong>de</strong> organização compatíveis com osprincípios da <strong>de</strong>mocracia: igualda<strong>de</strong>, diversida<strong>de</strong>,participação, solidarieda<strong>de</strong> e liberda<strong>de</strong>.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 121 ]Construir a utopia. Proposta <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocracia,lançado em 1987178O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“A radicalida<strong>de</strong>da proposta<strong>de</strong>mocráticaestá em (...) contrapor o capital àsocieda<strong>de</strong> excluída e tomar partidopela socieda<strong>de</strong> contra o capital.”[ <strong>Betinho</strong>, em Construir a utopia, p. 22 ]“O processo <strong>de</strong>mocrático que se<strong>de</strong>senvolve a nível mundial estárecolocando a questão da <strong>de</strong>mocraciano centro do <strong>de</strong>bate. (...)O socialismo submetido à críticada <strong>de</strong>mocracia só tem sentido comoreinvenção total. O socialismo sótem sentido como <strong>de</strong>mocracia.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 89 ]“Uma coisa que vai direto aos intelectuais(...). Nós temos uma imensa capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong>diagnósticos, <strong>de</strong> análises e etc. Quando chegao momento da ação, o sujeito pega o boné e vaiembora. (...) Quando a verda<strong>de</strong> não é assim.Você <strong>de</strong>ve pagar os seus impostos e, ainda,fazer muita ação. (...) Eu <strong>de</strong>fendo a tese <strong>de</strong> quegoverno só anda empurrado.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]“O socialismo <strong>de</strong>veria estarrediscutindo também o seu próprio nome.O verda<strong>de</strong>iro nome do socialismo é <strong>de</strong>mocracia, assim como a natureza da crise do socialismoestá na ausência da <strong>de</strong>mocracia.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 89 ]A vez da cidadania179


(“Esperava o anúncio<strong>de</strong> um New Dealpara o <strong>Brasil</strong>,sonhei com um Roosevelt dos anos 1930para um <strong>Brasil</strong> dos anos 90 e me frustrei.”[ betinho, no Correio Braziliense, 17/05/1996 ](


Um sociólogono po<strong>de</strong>rO sociólogo e político Fernando Henrique Cardoso,antes <strong>de</strong> ser presi<strong>de</strong>nte, participa com <strong>Betinho</strong><strong>de</strong> evento do <strong>Ibase</strong>No dia da posse <strong>de</strong> Fernando Henrique Cardoso na Presidência daRepública em 1995, <strong>Betinho</strong> entregou ao seu colega sociólogoe <strong>de</strong> exílio a Carta da Terra, documento da Ação da Cidadania.<strong>Betinho</strong> assumiria um lugar no conselho do programa Comunida<strong>de</strong>Solidária, que substituiu o Conselho Nacional <strong>de</strong> Segurança Alimentar(Consea). <strong>Betinho</strong>, contudo, se <strong>de</strong>sligaria do programa no segundo ano domandato <strong>de</strong> Fernando Henrique e passaria a ser um crítico do governo.A vez da cidadania181


Assinam esta carta os que <strong>de</strong>sejam mudar a terra,querem <strong>de</strong>mocratizar a terra, querem <strong>de</strong>mocracia naterra. Mas ainda neste século. Já se esperou <strong>de</strong>mais.A <strong>de</strong>mocracia na terra é condição <strong>de</strong> cidadania. Estaé uma tarefa fundamental da Ação da Cidadania[grifo original]. Que o novo presi<strong>de</strong>nte execute essareforma. Que os novos governadores participem<strong>de</strong>ssa mudança. E que a socieda<strong>de</strong> seja o verda<strong>de</strong>iroator <strong>de</strong>ssa nova peça para mudar a face da terra.A partir daí a vida na terra será melhor.[ TRECHO DA CARTA DA TERRA ]182O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Exílio político o sociólogoFernando Henrique conhece.E com esse exílio a Anistia acabou há 15 anos. Mas o <strong>Brasil</strong> temproduzido uma legião <strong>de</strong> exilados econômicos para os quais os governostêm sido incapazes <strong>de</strong> olhar. Para esses excluídos tem sobrado apenas oassistencialismo simplista, que só serviu para <strong>de</strong>ixar tudo como está.É nessa armadilha que não gostaria <strong>de</strong> ver o sociólogo cair.”[ <strong>Betinho</strong>, na Folha <strong>de</strong> S. Paulo, 10/10/1994 ]acima, <strong>Betinho</strong> em encontrocom o presi<strong>de</strong>nte FernandoHenrique CardosoA vez da cidadania183


“Eu acho que, sem nenhumapretensão, a minha saída e ascríticas que eu fiz à Comunida<strong>de</strong>Solidária, que foram muito diretase francas, tiveram efeito. Hoje, aComunida<strong>de</strong> Solidária está muitomais ativa e muito mais concreta.Inclusive, agora, eles estão entrandona Agenda Social, e eu tenho todaa disposição <strong>de</strong> trabalhar com aComunida<strong>de</strong> Solidária.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva,23/12/1996 ]Edição da revista Democracia, do <strong>Ibase</strong>,sobre as eleições presi<strong>de</strong>nciais <strong>de</strong> 1994“Estou convencido <strong>de</strong>que a miséria não éuma questão centraldo governo brasileiro,nem <strong>de</strong> nossa elite. E nunca foi. (...) Por tudo issoe <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> fazer tudo o que me foi possível <strong>de</strong>cidisair do Conselho. Daqui da planície vou continuar acolaborar e criticar exercendo minha cidadania.”[ <strong>Betinho</strong>, no Correio Braziliense, 17/05/1996 ]184O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“A Agenda Social nasceu<strong>de</strong> uma reunião <strong>de</strong> váriasentida<strong>de</strong>s com o Unicef(Fundo das Nações Unidas para a Infância) aqui e <strong>de</strong> umapreocupação com o problema da infância, do adolescente e <strong>de</strong>suas famílias. Nós estávamos discutindo isso quando alguémlembrou: ‘Vai ter Olimpíada no <strong>Brasil</strong>’, e aí se fez o gancho. Entãonós falamos: ‘Bom, nós precisamos transformar esses pontos quenós queremos numa agenda social para que seja viável e justa aexistência da Olimpíada no Rio’. (...) Então levantamos cincopontos que são: toda criança na escola <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>; toda criançae adolescente com alimentação <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> a<strong>de</strong>quada; ninguémvivendo nas ruas do Rio <strong>de</strong> Janeiro (...); urbanização, integração<strong>de</strong> todas as favelas (...) e, finalmente, esportes e cidadania jogandono mesmo time. Então esses cinco pontos transformaram-se naAgenda. (...) Então isso hoje é um documento oficial da cida<strong>de</strong>, quevai ser integrado (...) aos documentos dos Jogos Olímpicos.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]No mesmo ano em que <strong>de</strong>ixou oComunida<strong>de</strong> Solidária, <strong>Betinho</strong> foi um dosque i<strong>de</strong>alizou e lançou a Agenda Social dacandidatura do Rio <strong>de</strong> Janeiro à se<strong>de</strong> dasOlimpíadas <strong>de</strong> 2004 (imagens ao lado). ORio não foi escolhido a se<strong>de</strong>. mas o <strong>Ibase</strong>seguiu com o trabalho da Agenda SocialRio, após a morte <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>.A vez da cidadania185


<strong>Betinho</strong> na sua casaem Itatiaia (RJ)Aids, luta política


(“Agora, o fato<strong>de</strong> eu estarlutando alivia.Porque se você se concentra só na dimensãoda tragédia, você afunda com ela. Então porisso é que o fato <strong>de</strong> a gente transformar issonuma luta política dá uma outra dimensão.”[ betinho, no programa roda VIVa, 14/12/1987 ](


Edição nº 1 da revista Democracia Viva,lançADA pelo <strong>Ibase</strong> após a morte <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>e editADA até hoje pela instituição<strong>Betinho</strong> <strong>de</strong>scobriu em 1986 ser portador do HIV, o vírus da aids, doençainfecciosa que <strong>de</strong>strói as células responsáveis pela <strong>de</strong>fesa do organismo.<strong>Betinho</strong> pega o vírus durante alguma das transfusões <strong>de</strong> sangue queprecisava fazer por conta da hemofilia. O mesmo ocorreu com os seusirmãos, também hemofílicos, Henfil e Francisco Mário. <strong>Betinho</strong> incorporaria aaids entre as suas ban<strong>de</strong>iras. Ele assumiu publicamente ser portador do vírus,quando não havia ainda muitas informações sobre a doença, e no mesmo ano <strong>de</strong>86 ajudou a fundar a Associação <strong>Brasil</strong>eira Interdisciplinar <strong>de</strong> Aids, a Abia.Aids, luta política189


“Esse <strong>de</strong>sastretem muitas origens,tem muitas causas.A primeira causa é a ausência quase (...) absoluta <strong>de</strong>controle da qualida<strong>de</strong> do sangue na história do <strong>Brasil</strong>.(...) Esse sangue está contaminando pessoas hoje, aqui,agora. Não só hemofílicos, está contaminando crianças,está contaminando mulheres, homens, jovens e velhos.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 14/12/1987 ]“A aids surgiu nos anos 1980 comouma doença mortal e sem cura. Umvírus transmitido pela relação sexualou pelo sangue que entrava no sistemaimunitário e protegido (...), <strong>de</strong>ixandosuas vítimas expostas a todo tipo<strong>de</strong> doenças, que, em última análise,<strong>de</strong>terminavam uma morte rápida, trágicae sem remédio. Associando sexo e morte,a aids transformou-se na bomba doséculo 20, que pretendia haver liberadoo sexo e estar anulando gradualmentea morte. (...) Esse nascimento trágico<strong>de</strong>terminou até agora as atitu<strong>de</strong>s básicasdiante da aids: o medo, a impotência,a fuga, a clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>, a omissão, oterror e o abandono.”[ <strong>Betinho</strong>, em A cura da aids, p. 37 e 38 ]190O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Na outra página, <strong>Betinho</strong> e o filho Henrique.Ao lado, <strong>Betinho</strong> e Maria Nakano“Eu <strong>de</strong>scobri um vírus que não estáisolado em laboratórios, que é o vírus domedo, que é o vírus do medo da aids.Esse vírus já se propagou pela humanida<strong>de</strong> inteira. (...) E é esse vírus que está mudando ocomportamento das pessoas, em alguns casos <strong>de</strong> forma absolutamente irracional.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 14/12/1987 ]Aids, luta política191


“Decidi ajudar osmeus irmãos hemofílicos,e quando digo irmãos não são só os meus, mas todos os milhemofílicos que estão registrados: 70% estão contaminados, mais <strong>de</strong>35% já morreram, e <strong>de</strong>ve haver uns 60% em tratamento. Foi entãoque <strong>de</strong>cidi fundar a Abia. No dia da fundação brinquei: ‘Aceito ser opresi<strong>de</strong>nte e sou a primeira vítima <strong>de</strong>ssa presidência’. Não fui.Aí comecei todo o processo <strong>de</strong> enfrentar a aids, não só na minhavida pessoal, mas também com os outros, porque essa doençamiserável estigmatiza. A vítima passou a ser vista como culpada.Há amigos, conhecidos meus, que optaram pela morte comanonimato. É uma coisa terrível você não enfrentar nem a suaprópria vida, seu ato final, sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> final. Às vezes, amigosmeus se espantam: ‘Como você assumiu publicamente que éportador do vírus?’. Hoje enfrento qualquer autorida<strong>de</strong> pública,fe<strong>de</strong>ral, municipal ou estadual, qualquer instituição, e digo queestou atuando em legítima <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> mim e <strong>de</strong> milhares <strong>de</strong> pessoasque estão pre<strong>de</strong>stinadas, milhares que vão ser contaminadas.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 13/09/87 ]192O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Ainda existem pessoasque se dão ao luxo <strong>de</strong> fazerdiscriminação contra aidético,quer dizer, quem tem culpa é o aidético. Dizem: ‘A aids é uma doença<strong>de</strong> homossexual’. Não, homossexual (...) é uma vítima da aids,hemofílico é uma vítima da aids.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 14/12/1987 ]“A aids é talvez a coisa mais pública nomundo, hoje. No entanto, o aidéticoé clan<strong>de</strong>stino. Quer dizer, todos osaidéticos, com exceção <strong>de</strong> poucos, entreos quais me coloco, são clan<strong>de</strong>stinos.Os aidéticos estão vivendo na maiscompleta clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>. E não temDoi-Codi, Operação Ban<strong>de</strong>irantes,polícia, que os <strong>de</strong>scubra. E a maioriaesmagadora está morrendo naclan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>. Alguns saem daclan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> pós-morte. Outros,nem <strong>de</strong>pois da morte. Para alguns, aclan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> é superior à morte,e isso é um lado que me chocaprofundamente.”[ <strong>Betinho</strong>, em Ca<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> história e saú<strong>de</strong>,nº 2, p. 26 ]A cura da aids (1994) reuniu textos <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>sobre a doença, como “O dia da cura”, queresultou num curta-metragem <strong>de</strong> ficção coma participação especial do próprio <strong>Betinho</strong>193


Na charge ao lado, a visão <strong>de</strong> PauloCaruso sobre o encontro <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>com o irmão Henfil no céu. Henfile Francisco Mário morreram <strong>de</strong>aids em 1988, nove anos antes <strong>de</strong><strong>Betinho</strong>. Em 87, <strong>Betinho</strong> falara aZuenir Ventura, do Jornal do <strong>Brasil</strong>,e ao Roda Viva, da TV Cultura, sobrea sua condição como portador doHIV. Na TV, ele cobrou o acesso <strong>de</strong>todos ao AZT, remédio usado paracontrolar a doença. Demorariaainda uma década para o <strong>Brasil</strong>disponibilizar na re<strong>de</strong> pública ocoquetel <strong>de</strong> medicamentos antiaids.“Não acredito que vámorrer <strong>de</strong> aids. Acho quevou aguentar até a cura.”[ <strong>Betinho</strong>, na Folha <strong>de</strong> S. Paulo, 13/09/1987 ]194O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“O principal remédio é mantero horizonte <strong>de</strong> esperança.Por isso eu me recuso a dizer que sou um con<strong>de</strong>nado e que a aids não temcura. Me recuso até a dizer que é um <strong>de</strong>sastre; não é um <strong>de</strong>sastre, é umgran<strong>de</strong> <strong>de</strong>safio que a humanida<strong>de</strong> está enfrentando. E me recuso sobretudo aaceitar o estigma, a internalizar o sofrimento. Isso faz um mal terrível. (...)A melhor forma é enfrentar o problema em campo aberto.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 13/09/1987 ]“O governo brasileiro disse que tinha resolvido oproblema do AZT. Não resolveu. A única coisa quefizeram foi dizer que não é mais ilegal comprar oAZT. Foi só isso. Por que o governo brasileiro nãopôs o AZT no <strong>Brasil</strong>, que é a única forma <strong>de</strong> vocêter o AZT? De que me adianta dizer que eu tenhoAZT nos Estados Unidos? (...) Não adianta dizerque está dando uma chance simplesmente porqueliberou e disse: ‘Não é mais contrabando’. Eu estavafazendo contrabando. (...) Para comprar para omeu irmão Francisco eu tive que arranjar um amigonos Estados Unidos, que <strong>de</strong>u uma receita. Foi todoum esquema (...) para trazer o AZT (...). Agora, onível <strong>de</strong> cinismo que às vezes eu vejo, enten<strong>de</strong>? Emcertos discursos oficiais, é fantástico, porque elesvão para a televisão, dizem que resolveram, todomundo acha que resolveu. Não resolveu. (...) Sabecomo é que eu estou comprando o AZT? Como nósestamos conseguindo dinheiro para comprar o AZTpara o Chico? Através da solidarieda<strong>de</strong> dos amigos!(...) Quando é um direito do cidadão, um direito dapessoa ter o tratamento.”“A velocida<strong>de</strong> com que a pesquisa científica está se<strong>de</strong>senvolvendo no caso da aids já nos permite muitaesperança. Em dois anos, em um ano e até menos,não está afastada a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cura. (...)Daqui a pouco, vão ter que fazer a ‘<strong>de</strong>scampanha’da aids: furem as camisinhas, trepem à vonta<strong>de</strong>,façam amor adoidado porque acabou a paranoia. Oimportante é que o investimento científico na aidsfaz com que as pessoas (...) se sintam autorizadaspela vida a ter esperança, porque os caminhos da<strong>de</strong>scoberta são imprevisíveis.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 13/09/1987 ][ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 14/12/1987 ]Aids, luta política195


À ESQUERDA, A graúna, famosa personagem <strong>de</strong> Henfil, ajudana Ação da CidadaniA. À direita, <strong>Betinho</strong> com o irmão Chico Mário“Chico resolveu falar tudo sobre a doença e quersaber tudo sobre ela, mas Henfil sempre se recusoua entrar na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que estava doente. Ele semprenegou radicalmente a hemofilia, sempre viveucomo se não sofresse doença nenhuma, é o jeito<strong>de</strong>le. (...) Ele sempre lutou bravamente contraa doença, mas o que eu mais queria é que ele aassumisse. Agora ele não tem mais condições.”[ <strong>Betinho</strong>, na Folha <strong>de</strong> S. Paulo, 13/09/1987 ]“Ainda a lembrança do Chicono enterro do Henfil dizendopara mim, entre espanto e humor:‘Hoje é o Henfil, amanhã serei eu,e você irá daqui a três anos...Bem, digamos cinco’.”[ <strong>Betinho</strong>, no Jornal do <strong>Brasil</strong>, 30/01/1992 ]Aids, luta política197


“Depois <strong>de</strong> verificar que já sepassaram quase três anos <strong>de</strong>minha morte anunciada, chegueià conclusão que o melhor quefaço é me preparar mesmo paracontinuar vivendo.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 137 ]“Completo em janeiro <strong>de</strong> 1991 um ano <strong>de</strong> AZT. (...)Esse AZT foi comprado graças a iniciativas <strong>de</strong> algumasamigas que reuniram outros amigos e amigas paraajudarem na compra <strong>de</strong>sse remédio e <strong>de</strong> outros gastosmédicos. Aceitei essa espécie <strong>de</strong> ação entre amigos porqueacredito na força terapêutica da solidarieda<strong>de</strong> e porquetemos razões <strong>de</strong> sobra para continuar lutando por causasque são maiores do que nossas doenças pessoais.”[ <strong>Betinho</strong>, na mensagem para amigos “Boletim da vida”,NatAL DE 1990 ]198O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Atualmente estou tomando umremédio, cerveja, que eu aconselho atodo mundo. Aliás, está provado que éuma gran<strong>de</strong> medicação”, disse <strong>Betinho</strong>,antes <strong>de</strong> começar a tomar o AZT.“As pessoas infectadas pelovírus, os soropositivos,que no princípio se pensava podiam viver alguns poucos anos, têmhoje uma expectativa <strong>de</strong> vida, sem o <strong>de</strong>senvolvimento da doença, daor<strong>de</strong>m <strong>de</strong> nove a <strong>de</strong>z anos, e acredita-se até que uma porcentagem<strong>de</strong>las possa não <strong>de</strong>senvolver a doença. (...) A i<strong>de</strong>ia dos grupos <strong>de</strong>risco, que servia para isolar e criminalizar as vítimas, foi abandonada.Fala-se hoje em comportamento <strong>de</strong> risco, e sabe-se que em tese todasas pessoas po<strong>de</strong>m vir a ser afetadas pela epi<strong>de</strong>mia.”[ <strong>Betinho</strong>, em A cura da aids, p. 37 e 38 ]Aids, luta política199


à direita, Rotina <strong>de</strong> trabalho: <strong>Betinho</strong> se reúne com lí<strong>de</strong>r doTimor Leste José Ramos-Horta, vencedor do Nobel da Paz.abaixo, Carta enviada a Fi<strong>de</strong>l Castro, em 1992, na qual<strong>Betinho</strong> se negava a participar <strong>de</strong> um ato <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong>a Cuba e criticava o tratamento que os portadoresdo HIV recebiam na ilha“Presi<strong>de</strong>nte Fi<strong>de</strong>l Castro,Sou do tempo da Revolução Cubana. Defendie <strong>de</strong>fendo o direito do povo cubano fazer suarevolução e <strong>de</strong>cidir o seu próprio <strong>de</strong>stino seminterferência <strong>de</strong> inimigos ou amigos.Defendo para Cuba o que <strong>de</strong>fendo para mim epara o meu próprio povo: liberda<strong>de</strong>, igualda<strong>de</strong>,participação, respeito, diversida<strong>de</strong> e solidarieda<strong>de</strong>.Feita essa introdução, <strong>de</strong>sejo apresentar umaquestão e fazer um apelo. A questão é a aids. Souhemofílico <strong>de</strong> nascimento e soropositivo há quase<strong>de</strong>z anos. Sou também presi<strong>de</strong>nte da Associação<strong>Brasil</strong>eira Interdisciplinar <strong>de</strong> Aids <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1986e <strong>de</strong>senvolvo em meu país uma luta constantecontra as políticas públicas do governo fe<strong>de</strong>ralem relação à aids.(...)Conhecendo a tradição humanista erevolucionária <strong>de</strong> Cuba, sabendo dos avanços <strong>de</strong>sua medicina, eu esperava que também Cuba setransformasse num exemplo mundial <strong>de</strong> comoenfrentar a aids. O que li no Granma e soube porpessoas que visitaram Cuba, no entanto, constituipara mim um choque: soube que os soropositivossão submetidos a um processo <strong>de</strong> controle poragentes sanitários, que se caracteriza por umaespécie <strong>de</strong> vigilância à curta distância paraimpedir que a pessoa contaminada contamineoutras pessoas. Como sabemos que a transmissãodo vírus se dá basicamente por via sexual,estaríamos diante do controle da vida sexualdos soropositivos por processos <strong>de</strong> vigilância quetenho dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> imaginar como seriamfeitos, além <strong>de</strong> discordar frontalmente <strong>de</strong> tal tipo<strong>de</strong> controle. Soube, também, que os doentes sãolevados aos hospitais e internados como doentes<strong>de</strong> aids, separados <strong>de</strong> suas famílias, do trabalho,<strong>de</strong> suas ativida<strong>de</strong>s. Para ser franco e direto: osdoentes são segregados da socieda<strong>de</strong> pelo Estado ese transformam em presos políticos da epi<strong>de</strong>mia.(...) Agora que o presi<strong>de</strong>nte já tem quase o direito<strong>de</strong> se consi<strong>de</strong>rar eterno, gostaria <strong>de</strong> terminarcom uma frase que vai começar uma novapostura nossa diante da aids: A aids não é mortal,mortais somos todos nós. A aids terá cura, e o seuremédio hoje é a solidarieda<strong>de</strong>.Abraços e sauda<strong>de</strong>s,Herbert <strong>de</strong> SouzaPresi<strong>de</strong>nte da Abia(Associação <strong>Brasil</strong>eira Interdisciplinar <strong>de</strong> Aids)”[ <strong>Betinho</strong>, em O dia da cura, p. 21-25 ]200O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Como todo brasileiro vejo televisão.Depois <strong>de</strong> um dia <strong>de</strong> trabalho intenso cheguei em casa e liguei a TV para ver os noticiários quandofui pego <strong>de</strong> surpresa. Aparecia na tela um jovem que dizia ter tuberculose mas que estava curado.Respirei aliviado. Uma jovem dizia que tinha câncer e que teve cura. Fiquei mais animado ainda como estado da medicina. Aí entra um jovem olha para mim e diz: ‘Eu tenho aids e não tenho cura!’. (...)Custava a crer que fosse uma propaganda promovida pelo Ministério da Saú<strong>de</strong>, mas era. (...) Hojeme vejo nessa situação embaraçosa para mim e meus amigos. Minha morte não ocorreu! (...) Minhasaú<strong>de</strong> continua boa apesar <strong>de</strong> todas as campanhas do Ministério da Saú<strong>de</strong> e <strong>de</strong> todos os remédiosque tomo, incluindo a cerveja, que até hoje não apresentou nenhum efeito colateral tomada comAZT. Trabalho intensamente como se estivesse realmente vivo. Vou ao cinema, a shows musicais semprovocar nenhum espanto entre aqueles que me veem entrar vivo. (...) Meu analista, <strong>de</strong>sesperadocom a minha insistência em não morrer, já me propôs o fim do tratamento. (...)Foi aí que a propaganda do Ministério da Saú<strong>de</strong> veio me recolocar no meu <strong>de</strong>vido lugar.”[ <strong>Betinho</strong>, em Escritos indignados, p. 136-138 ]Aids, luta política201


(“Esse foi ogran<strong>de</strong> erro.Eu tentei resolver um problemapúblico, por meios privados.”[ betinho, no programa roda VIVa, 23/12/1996 ](


O caso dojogo do bicho<strong>Betinho</strong> viveu, em 1994, o episódio, segundo ele, “mais duro, do ponto<strong>de</strong> vista pessoal”, da sua vida. Veio à tona que ele e Nilo Batista, entãogovernador do Rio <strong>de</strong> Janeiro, haviam recebido dinheiro do jogo dobicho para a Abia, que passava por dificulda<strong>de</strong>s financeiras.Charge <strong>de</strong> Laerte, em que o cartunista fazreferência ao caso <strong>Betinho</strong> e o dinheiro dojogo do bichoAids, luta política203


Depois da morte <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>, Nani eMarco também fizeram a sua leiturasobre o céu com <strong>Betinho</strong>. Nos últimosanos <strong>de</strong> vida, <strong>Betinho</strong> recebeu váriascartas <strong>de</strong> pessoas que procuravamse solidarizar, pedir conselhos e atéoferecer curas milagrosas para a aids(veja na outra página).“Se eu sou pai e meu filho estápassando fome, eu roubo. Se eu nãotiver outro meio, eu roubo, porqueo antiético, no caso, é <strong>de</strong>ixar meufilho passar fome. (...) O raciocínioda contribuição foi parecido, porquenós dissemos: ‘Nós estamos falindo,precisamos <strong>de</strong> US$ 40 mil’. Eu fui aoNilo e pedi a ele. Aí ele falou assim:‘Olha, eu me separei, estou comproblemas, mas a gente po<strong>de</strong> pensarem outras formas’. Aí, se lembrou –não sei se fui eu, quem foi. Eu assumo,fui eu, tá? ‘Quem tem dinheiro vivosonante é bicheiro’; e o Nilo dizia: ‘Istoé contravenção, não é crime’. Eu falei:‘Bom, está liberado’.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]“A novida<strong>de</strong> da Açãoda Cidadania não estáem ter um santo (...).O santo <strong>Betinho</strong>. Sempre disse que essa campanha nãotem dono (...). Por facilida<strong>de</strong> ou por vício, a verda<strong>de</strong> é que amídia sempre concentrou um dos maiores movimentos dahistória brasileira na minha pessoa, tal como foi nos anos1986 e 88 na questão da aids. (...) Quem sabe esse episódionão sirva para acabar com essa mania que tem a mídia <strong>de</strong>encarnar todas as causas nos seus santos ou <strong>de</strong>mônios (...).A ética no <strong>Brasil</strong> não está órfã, ela está mais viva do quenunca (...). Felizmente, a ética, ela não precisa <strong>de</strong> mim.É muito bom que se perca essa fé na minha infalibilida<strong>de</strong>.”[ <strong>Betinho</strong>, em carta ao Jornal do <strong>Brasil</strong>, 09/04/1994, na quAL ele rebateucríticas do jornal por conta do caso do jogo do bicho ]204O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Esse episódiome atingiunum momentoem que eu precisava <strong>de</strong> credibilida<strong>de</strong> paratocar a Ação da Cidadania, e ele foi emcima da minha credibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma formaimpiedosa. O que acontece é que, talvez pelaminha formação cristã, eu sou o único réuconfesso neste país, porque eu assumi, chameia imprensa, contei tudo, chorei, não é?”“Preciso muito <strong>de</strong> sua ajuda. Apesar <strong>de</strong> não nos conhecermospessoalmente, tomo a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> recorrer a vocêneste momento em que estou sofrendo muito. (...) Tenho ovírus da aids há, no mínimo, cinco anos. Fiquei sabendo hátrês anos. Não tive coragem <strong>de</strong> partilhar isso com nenhumamigo ou parente. (...) Estou apavorada principalmenteporque o médico me receitou AZT. (...) Sinto que cada cápsulaque tomar é um veneno que vai me fazer mal e matar.E se não tomar...!!!??? Por isso, <strong>Betinho</strong>, estou recorrendoa você. Tudo que leio sobre você (...) me leva a crer que vocêestá enfrentando com muita garra, equilíbrio e consciência(...) a sua situação. Tenho pensado: ‘Será que ele está tomandoAZT? O que ele pensa disso?’.”[ Carta a BetINho, datADA <strong>de</strong> 08/02/1993,Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV][ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]“Estou horrorizada pelo fato <strong>de</strong> que uma pessoa muitoquerida tenha se infeccionado com o vírus HIV (...) e achoque o senhor é a pessoa certa para me dar algumas informações,por tudo que passa <strong>de</strong> positivo. (...) Por favor,responda-me estas perguntas: o que faz para ter tantaenergia?; qual o médico que o acompanha em seu tratamento?;fez uso <strong>de</strong> alguma medicação? Por favor, preciso<strong>de</strong>mais da sua ajuda.”[ Carta a BetINho, datADA <strong>de</strong> 04/12/1995,Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ]“Estando a par <strong>de</strong> sua enfermida<strong>de</strong> pela TV, (...) com aajuda <strong>de</strong> Deus eu faço questão <strong>de</strong> te curar. Como acerteicom a cura (...) <strong>de</strong> várias outras doenças, como bronquite,asma, tuberculose (...), posso também acabar com essadoença terrível. Combato essas doenças através <strong>de</strong>remédios homeopáticos e também orações. Você nãoprecisa <strong>de</strong> mais do que um litro do meu remédio paraficar curado. (...) Se você se interessar faço questão da suapresença aqui em minha casa. (...) Não custará nada paravocê. Juntos vamos alcançar essa vitória.”[ Carta a BetINho, datADA <strong>de</strong> 16/08/1993,Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV ]Aids, luta política205


(“Irei ao meuenterro semgran<strong>de</strong>s penase principalmente sem trabalho, carregado.Não tenho curiosida<strong>de</strong> para saber quando,mas sei que não <strong>de</strong>mora muito.Quero morrer em paz, na cama, sem dor,com Maria ao meu lado e sem muitosamigos, porque a morte não é ocasião para sechorar, mas celebrar um fim, uma história.”[ betinho, em Estreitos nós, p. 23 ](


O fim da mudançaHerbert José <strong>de</strong> Souza, o <strong>Betinho</strong>, morreu <strong>de</strong> aids, em casa, aos61 anos, no dia 9 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1997. A citação da página aolado correspon<strong>de</strong> a um trecho da carta que ele <strong>de</strong>ixou para amulher, Maria Nakano.A primeira edição do Jornal da Cidadaniado <strong>Ibase</strong> após a morte <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>Aids, luta política207


<strong>Betinho</strong> no eventodo aniversário <strong>de</strong> 15anos do <strong>Ibase</strong>, em 1996, aolado <strong>de</strong> CARLOS Afonsoe Cândido Grzybowski(no centro), dirigentesDA instituição. Na outrapágina, Com amigos, nosítio em Itatiaia“Eu não tenho nenhumaexpectativa sobre o além.Se ele existir, para mim vai ser uma tremenda surpresa.Aí, eu vou encontrar com o Henfil, com o Chico, eu vou saberquem está no céu, quem está no inferno, o que vai ser um prazer(...). Mas isso não é coisa que me preocupa. Eu não me preocupoem provar que exista Deus ou não exista Deus. Acho que a vida é acoisa fundamental, viver é que é fundamental, e só existe mudançaenquanto existe vida. Para mim a morte é o fim da mudança.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]208O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


“Apesar <strong>de</strong> todos os problemas,eu posso dizer enfaticamente que estou vivo por causa do coquetel, porqueantes eu era uma pessoa assintomática. Depois, as infecções começaram aaparecer e, normalmente, quando isso acontecia, com um ano você estavamorto. Então, eu estive muito perto, recentemente eu estive muito perto.E, hoje, estou ativo na resistência (...). O que me <strong>de</strong>ixa pessoalmente comum drama <strong>de</strong> consciência, porque uma minoria tem acesso ao coquetel.”[ <strong>Betinho</strong>, no programa Roda Viva, 23/12/1996 ]Aids, luta política209


CronologiaBRASIL / MUNDO1935 Levantes comunistas em Natal (25 <strong>de</strong> novembro),Recife (26 <strong>de</strong> novembro) e Rio <strong>de</strong> Janeiro(27 <strong>de</strong> novembro) com o objetivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>rrubaro presi<strong>de</strong>nte Getúlio Vargas, no po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>s<strong>de</strong> aRevolução <strong>de</strong> 1930.1937 Em 10 <strong>de</strong> novembro, Vargas instala via golpe oregime ditatorial conhecido como Estado Novoe garante a sua continuida<strong>de</strong> no po<strong>de</strong>r.BETINHOEm 3 <strong>de</strong> novembro, nasce Herbert José <strong>de</strong> Souza,em Bocaiúva (MG), filho <strong>de</strong> Henrique José<strong>de</strong> Souza e <strong>de</strong> Maria da Conceição Figueiredo<strong>de</strong> Souza. O casal teve muitos filhos. Todos oshomens sofriam <strong>de</strong> hemofilia.A família <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> se transfere para Ribeirãodas Neves (MG). O pai <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong> vai trabalharnuma penitenciária agrícola.1943 Seu Henrique, pai <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>, é nomeado prefeito<strong>de</strong> Bocaiúva.1945 Fim do Estado Novo. Eleições diretas, em <strong>de</strong>zembro,elegem Eurico Gaspar Dutra para presi<strong>de</strong>ntedo <strong>Brasil</strong>.A família volta a Ribeirão das Neves e pouco<strong>de</strong>pois se instala em Belo Horizonte. <strong>Betinho</strong>interrompe os estudos <strong>de</strong>vido a complicaçõesda hemofilia.1949 <strong>Betinho</strong> inicia o curso ginasial.1950 Getúlio Vargas é eleito, em outubro, presi<strong>de</strong>ntedo <strong>Brasil</strong>.<strong>Betinho</strong> contrai tuberculose e interrompe novamenteos estudos. Por três anos fica confinadonum quarto nos fundos da sua casa, maneiraencontrada pelos seus pais para não interná-lo.1953 Conhece frei Mateus, da Juventu<strong>de</strong> EstudantilCatólica (JEC), ramo da Ação Católica <strong>Brasil</strong>eira.210O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


BRASIL / MUNDO1954 Em 24 <strong>de</strong> agosto, Vargas se suicida. Seu vice,Café Filho, assume a Presidência.1955 Juscelino Kubitschek é eleito presi<strong>de</strong>nte da República.BETINHO<strong>Betinho</strong> obtém certificado equivalente ao <strong>de</strong> conclusãodo curso ginasial.Ingressa no curso clássico do Colégio Estadual<strong>de</strong> Belo Horizonte, on<strong>de</strong> participa do grêmioestudantil.1958 <strong>Betinho</strong> ingressa no curso <strong>de</strong> Sociologia e Políticada UFMG. Passa a militar na Juventu<strong>de</strong>Universitária Católica (JUC).1961 Jânio Quadros, eleito no final <strong>de</strong> 1960 presi<strong>de</strong>nteda República, renuncia no dia 25 <strong>de</strong> agosto. Ovice, João Goulart, só assume a Presidência daRepública no dia 7 <strong>de</strong> setembro.<strong>Betinho</strong> viaja para Porto Alegre (RS) on<strong>de</strong> o governadorLeonel Brizola li<strong>de</strong>rava a Campanhada Legalida<strong>de</strong>, em <strong>de</strong>fesa da posse do vice--presi<strong>de</strong>nte João Goulart (Jango). Os ministrosmilitares eram contra.<strong>Betinho</strong> visita a União Soviética como lí<strong>de</strong>restudantil.1962 Formado, trabalha alguns meses como técnicodo Banco <strong>de</strong> Desenvolvimento Econômico <strong>de</strong>Minas Gerais e em seguida transfere-se para oRio <strong>de</strong> Janeiro.Participa da fundação e torna-se um dos dirigentesda Ação Popular, a AP.211


BRASIL / MUNDOBETINHO1963 Torna-se assessor do ministro da Educação, Paulo<strong>de</strong> Tarso, e empenha-se na campanha <strong>de</strong> alfabetização<strong>de</strong> adultos li<strong>de</strong>rada por Paulo Freire.É transferido para a Superintendência <strong>de</strong> PolíticaAgrária (Supra) e passa a assessorar o diretor,Francisco Whitaker.Colabora com o então <strong>de</strong>putado fe<strong>de</strong>ral LeonelBrizola na formação do chamado Grupo dos Onze,movimento <strong>de</strong> pressão pelas reformas <strong>de</strong> base.1964 Golpe militar, no dia 31 <strong>de</strong> março, <strong>de</strong>rruba opresi<strong>de</strong>nte João Goulart. O general CasteloBranco assume a Presidência da República.<strong>Betinho</strong> é <strong>de</strong>mitido da Supra e inicia então umlongo período na clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>.Em julho, o Centro <strong>de</strong> Informações da Marinha(Cenimar) pe<strong>de</strong> a prisão <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>.Em agosto <strong>Betinho</strong> vai para Montevidéu, on<strong>de</strong>participa da Frente <strong>de</strong> Mobilização Popular,organização <strong>de</strong> oposicionistas brasileiros <strong>de</strong>diversas tendências i<strong>de</strong>ológicas.Casa-se por procuração com Irles Coutinho <strong>de</strong>Carvalho, que havia conhecido na UNE. Ela vaiao seu encontro no Uruguai.1965 <strong>Betinho</strong> viaja a Cuba para angariar recursosfinanceiros para um movimento insurrecional aser li<strong>de</strong>rado por Brizola.Nasce em São Paulo o seu primeiro filho, Daniel.1966 <strong>Betinho</strong> é preso em casa, no bairro carioca <strong>de</strong>Botafogo, em 22 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro, e levado parao Departamento <strong>de</strong> Or<strong>de</strong>m Política e Social(Dops). No dia seguinte, por ser antevéspera <strong>de</strong>Natal, o <strong>de</strong>legado permite que ele vá para casae volte na segunda-feira. No domingo, <strong>Betinho</strong>pe<strong>de</strong> abrigo no Consulado do México, on<strong>de</strong> fica<strong>de</strong>z dias. Volta à clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>.212O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


BRASIL / MUNDO1967 Assume a Presidência da República o generalCosta e Silva, representante da chamadalinha-dura militar.1968 Decretado em <strong>de</strong>zembro o Ato Institucionalnº 5 (AI-5), que amplia os po<strong>de</strong>res do presi<strong>de</strong>ntee endurece o regime.1969 Em outubro, o general Emílio GarrastazuMédici é escolhido o novo presi<strong>de</strong>nte daRepública.BETINHO<strong>Betinho</strong> viaja a Cuba para participar do Congressoda Organização Latino-americana <strong>de</strong> Solidarieda<strong>de</strong>(Olas). Permanece por 11 meses no país, na expectativada realização do encontro.<strong>Betinho</strong> volta <strong>de</strong> Cuba para o <strong>Brasil</strong> em setembro evai trabalhar como operário numa fábrica <strong>de</strong> porcelanaem Mauá (SP).Por problemas <strong>de</strong> segurança, <strong>Betinho</strong> transfere-separa Santo André, no ABC paulista.1970 <strong>Brasil</strong> é tricampeão mundial <strong>de</strong> futebol. Após a prisão <strong>de</strong> 60 militantes da AP na região doABC, <strong>Betinho</strong> segue para a capital São Paulo.Separa-se <strong>de</strong> Irles.Começa a namorar Maria Nakano, militante da AP,que se tornaria a sua companheira até o fim da vida.1971 <strong>Betinho</strong> exila-se no Chile, que vivia sob o governosocialista <strong>de</strong> Salvador Allen<strong>de</strong>. Trabalha como auxiliar<strong>de</strong> pesquisa na Faculda<strong>de</strong> Latino-americana <strong>de</strong>Ciências Sociais (Flasco).1972 Torna-se diretor-executivo do Instituto <strong>de</strong> EstudosSociais e Econômicos (lese), organismo <strong>de</strong> ensino epesquisa sobre a América Latina, e um dos diretores<strong>de</strong> Datos, boletim mensal da entida<strong>de</strong>.Em setembro, <strong>Betinho</strong> é julgado e con<strong>de</strong>nado no<strong>Brasil</strong>, à revelia, a cinco anos <strong>de</strong> prisão.Rompe com a AP.Cronologia213


BRASIL / MUNDO1973 Golpe <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong>rruba o governo Allen<strong>de</strong>, em11 <strong>de</strong> setembro.BETINHOA convite <strong>de</strong> Darcy Ribeiro, <strong>Betinho</strong> trabalha para aOficina <strong>de</strong> Planificação da Presidência da República(O<strong>de</strong>plan) do Chile. Paralelamente, ministra umcurso no Departamento <strong>de</strong> Sociologia da Universida<strong>de</strong>Católica, em Santiago.<strong>Betinho</strong> e Maria Nakano procuram asilo na Embaixadado Panamá. No mês seguinte, exila-se noPanamá, on<strong>de</strong> passa cinco meses.1974 Em 15 <strong>de</strong> março toma posse na Presidência do<strong>Brasil</strong> o general Ernesto Geisel, que anunciariaa distensão “lenta e gradual” do regime.<strong>Betinho</strong> transfere-se com Maria Nakano para oCanadá.Inicia o doutorado em Ciência Política na Universida<strong>de</strong><strong>de</strong> York. Cria com outros exilados a LatinAmerican Research Unit (Laru), entida<strong>de</strong> voltadapara estudos socioeconômicos da América Latina.Dirige a publicação Brazilian Studies.1975 O jornalista Vladimir Herzog, diretor <strong>de</strong> jornalismoda TV Cultura, <strong>de</strong> São Paulo, é, apóspreso, encontrado morto, nas <strong>de</strong>pendências do2ª Exército, em São Paulo.1976 O operário Manoel Fiel Filho é preso por orgãos<strong>de</strong> segurança em São Paulo e encontrado emseguida morto.1977 O presi<strong>de</strong>nte Geisel fecha o Congresso por 14dias e impõe o chamado Pacote <strong>de</strong> Abril, commedidas políticas restritivas para garantir amaioria governista no Legislativo.<strong>Betinho</strong> torna-se professor visitante do Institute ofLatin American Studies, da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Glasglow,por convite <strong>de</strong> Theotonio dos Santos, e ficana Escócia por alguns meses. Nesse mesmo período,Maria Nakano vai para São Tomé, na África,on<strong>de</strong> trabalha num projeto governamental na área<strong>de</strong> comunicação.214O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


BRASIL / MUNDO1978 Estouram as greves no ABC paulista, sob ali<strong>de</strong>rança do dirigente sindical Luiz Inácio Lulada Silva.BETINHOVivendo no México, <strong>Betinho</strong> leciona Ciência Políticana Universida<strong>de</strong> Nacional Autônoma doMéxico (Unam).Torna-se diretor do Conselho Latino-americano<strong>de</strong> Pesquisa para a Paz e membro da direção daUnida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Investigação Latino-americana.No México tem encontros com Francisco Julião,Leonel Brizola, Neiva Moreira, Theotonio dosSantos e outros para discutir a formação <strong>de</strong> umpartido no <strong>Brasil</strong>.1979 Toma posse na Presidência da República o generalJoão Baptista Figueiredo.Lei da Anistia, em 28 <strong>de</strong> agosto.Em junho, <strong>Betinho</strong> participa <strong>de</strong> <strong>de</strong> um encontro<strong>de</strong> trabalhistas, li<strong>de</strong>rado por Leonel Brizola, emLisboa.Carlos Afonso propõe a <strong>Betinho</strong>, Marcos Arrudae Paulo Freire a criação <strong>de</strong> uma entida<strong>de</strong>autônoma que acompanhasse as políticas governamentaise fornecesse informações aosmovimentos populares.Após oito anos <strong>de</strong> exílio, <strong>Betinho</strong> volta ao <strong>Brasil</strong>.No aeroporto, é recepcionado por cerca <strong>de</strong> 200pessoas que cantam O bêbado e a equilibrista.Retorna ao México e volta <strong>de</strong>finitivamente ao<strong>Brasil</strong> em <strong>de</strong>zembro.1981 <strong>Betinho</strong> funda com Carlos Afonso e Marcos Arrudao Instituto <strong>Brasil</strong>eiro <strong>de</strong> Análises Sociais eEconômicas (<strong>Ibase</strong>).Trabalha como consultor da FAO para projetosagrários e migrações na América Latina.1982 Eleições diretas para governadores. Em abril, nasce Henrique, seu segundo filho.Cronologia215


BRASIL / MUNDO1983 Começa um amplo movimento popular pelaseleições presi<strong>de</strong>nciais diretas, mobilização queficou conhecida como Diretas Já.BETINHO<strong>Betinho</strong> coor<strong>de</strong>na a Campanha Nacional pelaReforma Agrária, lançada pelo <strong>Ibase</strong> e outras entida<strong>de</strong>s.O <strong>Ibase</strong> lança o livro Carajás: o <strong>Brasil</strong> hipoteca o seufuturo.1984 O <strong>Ibase</strong> lança o livro Cerrados: uma ocupação japonesano campo.1985 Derrotado o movimento Diretas Já, o oposicionistaTancredo Neves é eleito <strong>de</strong> forma indireta,em 15 <strong>de</strong> janeiro, presi<strong>de</strong>nte da República.Entretanto, com a sua morte, o seu vice, JoséSarney, assume o cargo.1986 <strong>Betinho</strong> contrai o vírus da aids <strong>de</strong> uma dastransfusões <strong>de</strong> sangue que fazia com frequência<strong>de</strong>vido à hemofilia. O mesmo ocorre com osseus irmãos Henfil e Chico Mário.Em <strong>de</strong>zembro, <strong>Betinho</strong> funda a Associação <strong>Brasil</strong>eiraInterdisciplinar <strong>de</strong> Aids (Abia) e é eleito oseu presi<strong>de</strong>nte.1987 <strong>Betinho</strong> participa da campanha pela aprovação<strong>de</strong> emendas populares na Assembleia NacionalConstituinte.1988 Aprovada a nova Constituição. No início do ano morrem seus irmãos Henfil e ChicoMário, em <strong>de</strong>corrência da aids.O <strong>Ibase</strong> participa da campanha <strong>de</strong> valorização dacida<strong>de</strong> do Rio “Se liga, Rio”.1989 Fernando Collor é eleito presi<strong>de</strong>nte do <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong>forma, enfim, direta.Passa a funcionar plenamente o primeiro servidorbrasileiro a permitir acesso à internet, o Alternex,montado pela equipe do <strong>Ibase</strong>.216O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


BRASIL / MUNDOBETINHO1990 <strong>Betinho</strong> coor<strong>de</strong>na a campanha “Não <strong>de</strong>ixe sua corpassar em branco”, que tinha o propósito <strong>de</strong> incentivaros cidadãos a <strong>de</strong>clararem a sua cor no Censo.<strong>Betinho</strong> i<strong>de</strong>aliza o encontro “Terra e Democracia”,que se realiza em 23 <strong>de</strong> setembro, com o objetivo<strong>de</strong> <strong>de</strong>nunciar os elevados índices <strong>de</strong> violência nocampo. O evento reúne 200 mil pessoas no Aterrodo Flamengo.1991 Em julho, <strong>Betinho</strong> recebe o Prêmio Global 500, umdos mais importantes prêmios ambientais, oferecidopela ONU.Em outubro, coor<strong>de</strong>na o lançamento do projeto “Seessa rua fosse minha”, voltado para a população <strong>de</strong>crianças <strong>de</strong> rua do Rio <strong>de</strong> Janeiro.O curta-metragem “Acorda, Raimundo... Acorda!”,produzido pelo <strong>Ibase</strong>, é premiado no Festival do NovoCinema Latino-americano <strong>de</strong> 1991, em Cuba.1992 Depois <strong>de</strong> uma Comissão Parlamentar <strong>de</strong>Inquérito (CPI) no Congresso e gran<strong>de</strong> mobilizaçãopopular, Fernando Collor <strong>de</strong>ixa aPresidência da República. O seu vice, ItamarFranco, assume.<strong>Betinho</strong> participa do Movimento pela Ética na Política,que reúne importantes personalida<strong>de</strong>s e entida<strong>de</strong>s dasocieda<strong>de</strong> civil, a favor da apuração das <strong>de</strong>núncias <strong>de</strong>corrupção no governo Fernando Collor.O <strong>Ibase</strong> teve participação <strong>de</strong>stacada na Rio-92. Foiresponsável pela instalação <strong>de</strong> re<strong>de</strong> <strong>de</strong> computadoresem todos os espaços da conferência.1993 <strong>Betinho</strong> é um dos principais articuladores da Açãoda Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida,lançada em março.<strong>Betinho</strong> passa a fazer parte do Conselho Nacional<strong>de</strong> Segurança Alimentar (Consea).Recebe do Fundo das Nações Unidas para a Infância(Unicef) o Prêmio Crianças e Paz, concedido emreconhecimento ao seu trabalho em <strong>de</strong>fesa dascrianças brasileiras.Cronologia217


BRASIL / MUNDO1994 Fernando Henrique Cardoso é eleito presi<strong>de</strong>ntedo <strong>Brasil</strong>.BETINHOSob o lema “comida para combater a fome e trabalho paracombater a miséria”, <strong>Betinho</strong> lança a campanha contra o<strong>de</strong>semprego, segunda etapa da Ação da Cidadania.Em abril, torna-se público que <strong>Betinho</strong> e Nilo Batista, entãogovernador do Rio <strong>de</strong> Janeiro, receberam dinheiro dojogo do bicho para ajudar a Abia.Em agosto, faz um pronunciamento na ONU, em reuniãopreparatória para a Conferência das Nações Unidas parao Desenvolvimento Social.O <strong>Ibase</strong> lança a primeira edição do Jornal da Cidadania.A publicação duraria até o número 144, <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2009.1995 No dia da posse do presi<strong>de</strong>nte Fernando Henrique Cardoso,<strong>Betinho</strong> lhe entrega o documento Carta da Terra.Em fevereiro, toma posse como membro do conselhoconsultivo do projeto Comunida<strong>de</strong> Solidária, que substituio Consea.1996 No Carnaval carioca a Escola <strong>de</strong> Samba Império Serranohomenageia <strong>Betinho</strong> no enredo “E verás que um filho teunão foge à luta”. <strong>Betinho</strong> participa do <strong>de</strong>sfile.Deixa o conselho do projeto Comunida<strong>de</strong> Solidária e fazcríticas ao governo.Recebe o título <strong>de</strong> doutor honoris causa da Universida<strong>de</strong><strong>de</strong> York.Aproveitando a candidatura do Rio <strong>de</strong> Janeiro para sediaros Jogos Olímpicos <strong>de</strong> 2004, <strong>Betinho</strong> apresenta ao ComitêOlímpico Internacional (COI) a Agenda Social Rio 2004,progama que estabelece metas para a melhoria da qualida<strong>de</strong><strong>de</strong> vida dos moradores da cida<strong>de</strong>.1997 <strong>Betinho</strong> lança a campanha pela responsabilida<strong>de</strong> socialdas empresas.No dia 9 <strong>de</strong> agosto, <strong>Betinho</strong> morre em sua casa, em<strong>de</strong>corrência da aids.218O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Referências BibliográficasArquivos consultadosAcervo do Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação (CPDoc) do Jornal do <strong>Brasil</strong>Acervo do Museu da Comunicação Hipólito José da CostaAcervo no Museu Histórico da Or<strong>de</strong>m dos Advogados do <strong>Brasil</strong> (OAB)Arquivo André Carrazzoni, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Antônio Carlos Murici, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Castilho Cabral, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Costa e Silva, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo do Instituto <strong>Brasil</strong>eiro <strong>de</strong> Análises Sociais e Econômicas (<strong>Ibase</strong>)Arquivo Epitácio Cavalcanti Albuquerque, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong>História Contemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Ernâni do Amaral Peixoto, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Ernesto Geisel, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Flexa Ribeiro, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Getúlio Vargas, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Gustavo Capanema, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Henrique Teixeira Lott, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)219


Arquivo João Goulart, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Juracy Magalhães, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Mena Barreto, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Nelson <strong>de</strong> Mello, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Oswaldo Aranha, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoArquivo Tancredo Neves, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Ulysses Guimarães, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> História Contemporâneado <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Arquivo Vasco Leitão da Cunha, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV)Centro <strong>de</strong> Documentação e Memória da Fundação Maurício GraboisLivros, artigos e entrevistasAFONSO, Carlos A.; SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. O Estado e o <strong>de</strong>senvolvimento capitalista no<strong>Brasil</strong>. São Paulo: Paz e Terra, 1977.CASTRO GOMES, Angela; PANDOLFI, Dulce Chaves; ALBERTI, Verena (orgs.). ARepública no <strong>Brasil</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Nova Fronteira, 2002.CAVALCANTI, Pedro Celso Uchoa; RAMOS, Jovelino (orgs.). De muitos caminhos. Coleção“Memórias do exílio. <strong>Brasil</strong> 1964 -19??”. Lisboa: Arcádia, 1976.FICO, Carlos. <strong>Ibase</strong>: usina <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Garamond, 1999.GONTIJO, Ricardo; SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Sem vergona da utopia. Petrópolis (RJ): Vozes, 1988.JUNQUEIRA, Zilda Almeida (org.). Os caminhos da <strong>de</strong>mocracia. Entrevistas <strong>de</strong> Herbert <strong>de</strong>Souza e outros a Alfredo Alves. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Canal Imaginário, 2009.LIMA, Luiz Gonzaga <strong>de</strong> Souza; MOISÉS, José Álvaro; SOUZA, Herbert José <strong>de</strong> (orgs.).Alternativas populares da <strong>de</strong>mocracia: <strong>Brasil</strong> anos 80. Petrópolis (RJ): Vozes, 1982.220O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


LÖWY, Michael (org.). O marxismo na América Latina: uma antologia <strong>de</strong> 1909 aos diasatuais. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2006.MORAES, Dênis <strong>de</strong>. A esquerda e o golpe <strong>de</strong> 64. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Espaço e Tempo, 1989.NAKANO, Maria; ROITMAN, Ari (orgs.) Estreitos nós. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Garamond, 2001.PANDOLFI, Dulce; HEYMANN, Luciana (orgs.). Um abraço, <strong>Betinho</strong>. Rio <strong>de</strong> Janeiro:Garamond, 2005.RIDENTI, Marcelo. “Ação Popular: cristianismo e marxismo”. IN RIDENTI, Marcelo;REIS, Daniel Aarão (orgs.). História do marxismo no <strong>Brasil</strong>: partidos e organizações <strong>de</strong> 1920a 60. Campinas (SP): Unicamp, 2007.RODRIGUES, Carla. <strong>Betinho</strong> – sertanejo, mineiro, brasileiro. São Paulo: Planeta do <strong>Brasil</strong>, 2007.RODRIGES, Carla (org.). Democracia: cinco princípios e um fim. “Coleção Polêmica”. SãoPaulo: Mo<strong>de</strong>rna, 1996.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. A cura da aids. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Relume Dumará, 1994.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. A lista <strong>de</strong> Ailce. São Paulo: Cia. das Letras, 1996.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Construir a utopia – proposta <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocracia. “Coleção Fazer”.Petrópolis (RJ): Vozes, 1987.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. “Cultura popular”. IN jornal Tribuna Universitária, Diretório Centraldos Estudantes (DCE) da UFMG, 16/04/1962.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Depoimento no Car<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong> história e saú<strong>de</strong>, nº 2. Rio <strong>de</strong> Janeiro:Fundação Oswaldo Cruz, 1992.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Entrevista ao Jornal do <strong>Brasil</strong>, 13/09/1987.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Entrevista ao Paquim. Rio <strong>de</strong> Janeiro, número 519, 1979.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, 14/12/1987.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, 23/12/1996.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Entrevista à revista Teoria e Debate. São Paulo: Partido dosTrabalhadores, nº 16, 1991.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Escritos indignados. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Rio Fundo, 1991.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. “Limite do escândalo”. IN: Jornal do <strong>Brasil</strong>, 23/09/1990.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. No fio da navalha. Rio <strong>de</strong> Janeiro: Revan, 1996.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>. Revoluções da minha geração. São Paulo: Mo<strong>de</strong>rna, 1996b.SOUZA, Herbert <strong>de</strong>; RODRIGUES, Carla. Ética e cidadania. São Paulo: Mo<strong>de</strong>rna (ColeçãoPolêmica), 1994.Referências Bibliográficas221


Textos <strong>de</strong> jornais e revistas“O gigante <strong>Betinho</strong>”. IN: Caras, 05/08/1994.“O governo dominou rapidamente o movimento armado na Escola <strong>de</strong> Aviação e na PraiaVermelha”. IN: Jornal do <strong>Brasil</strong>, 28/11/1935.“Sangue com aids contamina Henfil e irmãos”. IN: Folha <strong>de</strong> S. Paulo, 13/09/1987.Documentos citados neste livroDo Arquivo do Instituto <strong>Brasil</strong>eiro <strong>de</strong> Análises Sociais e Econômicas (<strong>Ibase</strong>):“Carta da Ação da Cidadania”, sem data. Citada na p. 164“Carta da Terra”, sem data. Citada na p. 182Do Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio VARGAS (FGV):“10 anos e 4 generais” , 1974. Citado na p. 110“Boletim da vida”, 1990. Citado na p. 198Carta <strong>de</strong> Henfil a <strong>Betinho</strong>, <strong>de</strong> 10/05/1978. Citada na p. 97Carta <strong>de</strong> Herbert <strong>de</strong> Souza a Maria Nakano, <strong>de</strong> 23/05/1977. Citada na p. 96Carta <strong>de</strong> Herbert <strong>de</strong> Souza a O<strong>de</strong>d Grajew, <strong>de</strong> 17/08/1994. Citada na p. 170Carta <strong>de</strong> Herbert <strong>de</strong> Souza a Zuenir Ventura/Jornal do <strong>Brasil</strong>, <strong>de</strong> 08/04/1994. Citada na p. 204Carta <strong>de</strong> popular a <strong>Betinho</strong>, <strong>de</strong> 08/02/1993. Citada na p. 205Carta <strong>de</strong> popular a <strong>Betinho</strong>, <strong>de</strong> 16/08/1993. Citada na p. 205Carta <strong>de</strong> popular a <strong>Betinho</strong>, <strong>de</strong> 04/12/1995. Citada na p. 205Carta <strong>de</strong> René Dreyfuss a <strong>Betinho</strong>, <strong>de</strong> 09/08/1979. Citada na p. 98“Eu”, s/d. Citado nas p. 24 e 27“ONGs: opção pela <strong>de</strong>mocracia”, 1992. Citado na p. 161“Sobre a clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>”, 1972. Citado na p. 91Do Arquivo Tancredo Neves, Centro <strong>de</strong> Pesquisa e Documentação <strong>de</strong> HistóriaContemporânea do <strong>Brasil</strong> (CPDOC) da Fundação Getúlio VARGAS (FGV):Mensagem <strong>de</strong> Tancredo Neves a José Sarney, <strong>de</strong> 23/03/1985. Citada na p. 109222O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


Créditos das imagensPáginas 2 e 3:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPáginas 10 e 11:Arquivo do <strong>Ibase</strong>Páginas 12 e 13:Arquivo do <strong>Ibase</strong>Página 15:Arquivo do <strong>Ibase</strong>Páginas 16 e 17:Acervo IconographiaPágina 19:Arquivo Gustavo Capanema,CPDOC/FGVPágina 20:Wikimedia CommonsPáginas 20 e 21:Acervo IconographiaPágina 22:CPDoc do JBPágina 23:Acervo IconographiaPágina 25:Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV (certidão) e Arquivo pessoal <strong>de</strong>Maria Nakano (restante)Páginas 26 e 27:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPáginaS 28 e 29:Agência EstadoPágina 31:Agência EstadoPágina 33:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPágina 35:Agência EstadoPágina 36:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPáginaS 36 e 37:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPáginaS 38, 39 e 41:Arquivo André Carrazzoni, CPDOC/FGVPágina 42:Arquivo Ernâni do Amaral Peixoto,CPDOC/FGVPágina 43:Arquivo André Carrazzoni, CPDOC/FGVPáginaS 44 e 45:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPágina 48:Arquivo Henrique Teixeira Lott,CPDOC/FGV (no alto) e Câmarados DeputadosPáginaS 48 e 49:Arquivo Nelson <strong>de</strong> Mello, CPDOC/FGVPáginaS 51 e 52:Arquivo Castilho Cabral, CPDOC/FGVPágina 53:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPáginaS 54 e 55:Acervo do Museu da ComunicaçãoHipólito José da CostaPágina 57:CPDoc do JB223


Página 58:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPágina 59:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPáginaS 60 e 61:Arquivo Ernesto Geisel, CPDOC/FGVPágina 63:Blog do Planalto/FlickrPágina 64:Arquivo André Carrazzoni, CPDOC/FGVPáginaS 65 a 67:Arquivo Ernesto Geisel, CPDOC/FGVPáginaS 68 e 69:Acervo do Museu da ComunicaçãoHipólito José da CostaPáginaS 70 e 71:Arquivo Ernesto Geisel, CPDOC/FGVPágina 73:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPáginaS 74 e 75:Arquivo Ernesto Geisel, CPDOC/FGVPágina 77:Arquivo Costa e Silva, CPDOC/FGVPáginaS 78 e 79:Arquivo Flexa Ribeiro, CPDOC/FGVPáginaS 80, 81 e 83:Arquivo Ernesto Geisel, CPDOC/FGVPágina 84:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPágina 85:Agência EstadoPáginaS 86, 87, 89, 90, 91, 93:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPágina 94:Trajetória do Serra/FlickrPágina 95:Arquivo do <strong>Ibase</strong>PáginaS 96 e 97:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPágina 98:Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGVPágina 99:Capa do Pasquim número 519Página 101:Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGVPágina 103:Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGV (carteira <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>) e Arquivopessoal <strong>de</strong> Maria Nakano (foto)PáginaS 104, 105, 107, 108 e 109:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPágina 110:Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGVPáginaS 111, 113, 114, 115 e 117:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPágina 118:Arquivo Ulysses Guimarães,CPDOC/FGVPáginaS 118 e 119:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPágina 119:Agência Senado/FlickrPáginaS 120 e 121:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPágina 122:Arquivo Ernesto Geisel, CPDOC/FGV (1ª da esq. para dir.) e ArquivoTancredo Neves, CPDOC/FGV224O <strong>Brasil</strong> <strong>de</strong> <strong>Betinho</strong>


PáginaS 122 e 123:Arquivo Tancredo Neves, CPDOC/FGVPágina 125:Arquivo Ulysses Guimarães,CPDOC/FGVPágina 126:Arquivo do <strong>Ibase</strong>PáginaS 126 e 127:Agência Senado/FlickrPágina 127:Arquivo Ulysses Guimarães,CPDOC/FGVPágina 129:Arquivo Ernesto Geisel, CPDOC/FGVPágina 130:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria Nakanoe Isto ÉPágina 131:Agência <strong>Brasil</strong>Página 133:Acervo no Museu Histórico da OABPágina 134:Acervo no Museu Histórico da OABPágina 161:Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGVPáginaS 163, 164, 165, 166, 167, 168, 169,170, 171, 172, 173, 175, 176, 177, 178, 179,181, 182, 183, 184 e 185:Arquivo do <strong>Ibase</strong>PáginaS 186 e 187:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPágina 189:Arquivo do <strong>Ibase</strong>PáginaS 190 e 191:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPáginaS 193, 194, 196 e 197 (chARGE):Arquivo do <strong>Ibase</strong>PáginaS 197 e 199:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPáginaS 201, 203, 204, 205, 207 e 208:Arquivo do <strong>Ibase</strong>Página 209:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria Nakanoquarta capa:Fotos dos arquivos do <strong>Ibase</strong>, <strong>de</strong> MariaNakano e do Museu Histórico da OABPágina 135:Agência Senado/FlickrPáginaS 136, 137 e 139:Arquivo do <strong>Ibase</strong>Página 140:Arquivo Herbert <strong>de</strong> Souza, CPDOC/FGVPágina 141:Arquivo pessoal <strong>de</strong> Maria NakanoPáginaS 142, 143, 145, 146, 147, 148, 149,151, 152, 153, 154, 155, 157, 158, 159 e 160:Arquivo do <strong>Ibase</strong>Créditos das imagens225

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