11.07.2015 Views

O caso Mussalém. Fonte: Douglas Tavolaro. A casa do delírio ...

O caso Mussalém. Fonte: Douglas Tavolaro. A casa do delírio ...

O caso Mussalém. Fonte: Douglas Tavolaro. A casa do delírio ...

SHOW MORE
SHOW LESS
  • No tags were found...

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

estática. De repente, escorrega a mão pela barba malfeita e respira fun<strong>do</strong> antesde dizer:- Eles estão por toda a parte. Se reproduzem como um pungente vírusbiológico e são mortais como um vírus biológico.Começa o <strong>delírio</strong>. <strong>Mussalém</strong> traz à memória a caliginosa conspiração quesepultou seus projetos de vida e o confinou no Manicômio de Franco da Rocha.Nos becos e vielas, nas ruas e praças, na benéfica rotina de trabalho, nosconflitos com a família, nos soturnos sonhos da madrugada. Os conspira<strong>do</strong>resestão por toda a parte, mancomuna<strong>do</strong>s com Deus e o mun<strong>do</strong>. É preciso protegerse.Contra-atacar. Avançar sobre os inimigos antes que a morte chegue, como amaré que tragou o marinheiro Gilliat no romance Os trabalha<strong>do</strong>res <strong>do</strong> mar, obraprimade Victor Hugo.Impulsiona<strong>do</strong> pelo seu <strong>delírio</strong>, o professor aceitou o convite de seuadvoga<strong>do</strong> para conhecer uma das melhores lojas de armas de Campinas. Naprimeira visita comprou uma pistola Taurus PT-380, uma semi-automática 6,5 mme um revólver calibre 38, além de muita, muita munição. Guarda até hoje a notafiscal e a autorização para o porte de armas em seu apartamento de <strong>do</strong>is quartos,num con<strong>do</strong>mínio da região norte de Campinas. Ele sempre apreciou prédiosespaçosos em bairros arboriza<strong>do</strong>s. Era caseiro, odiava badalações e festasnoturnas. Preferia passar as noites em sua biblioteca particular ou senta<strong>do</strong> navaranda, observan<strong>do</strong> a movimentação da rua.Atento ao vaivém <strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> edifício, começou a desconfiar dascontas <strong>do</strong> con<strong>do</strong>mínio. Em outro de seus devaneios, convenceu-se de que osíndico liderava uma máfia audaciosa, responsável pela criação de um caixa <strong>do</strong>iscom parte <strong>do</strong> dinheiro de aluguéis e con<strong>do</strong>mínios. Não tinha como comprovar oesquema. Armou, então, uma armadilha para flagrar um <strong>do</strong>s mentores daquadrilha – o zela<strong>do</strong>r.Numa sexta-feira de frio rigoroso, inventou um vazamento de água nobanheiro de sua <strong>casa</strong> e pediu ajuda ao zela<strong>do</strong>r. Sua idéia era persuadi-lo aentregar o ban<strong>do</strong> e desmascarar to<strong>do</strong>s publicamente. O funcionário demorou asubir e, minutos depois, pelo interfone, prometeu verificar o problema no diaseguinte. Alegava estar substituin<strong>do</strong> o porteiro naquela noite, sem condições deaban<strong>do</strong>nar o posto. <strong>Mussalém</strong> ficou furioso. Desceu as escadas transtorna<strong>do</strong>,carregan<strong>do</strong> nas mãos o martelo usa<strong>do</strong> para provocar o vazamento. Não houvetempo para a reação <strong>do</strong> zela<strong>do</strong>r: <strong>Mussalém</strong> desferiu-lhe marteladas nas costas,mandan<strong>do</strong> o homem para o setor de traumatologia <strong>do</strong> Hospital das Clínicas deCampinas. Foi convoca<strong>do</strong> para depor na Justiça, acusa<strong>do</strong> de agressão, mas oprocesso não resultou em nada. A partir <strong>do</strong> incidente, o professor passou a servisto como uma ameaça iminente no prédio. To<strong>do</strong>s tinham receio de encontrá-losozinho no eleva<strong>do</strong>r ou no estacionamento. As crianças eram orientadas pelasmães para não falar com “aquele senhor esquisito” ou para correr dele ao primeirosinal de agressão.As perseguições criadas por sua mente logo se estenderam para aUnicamp. Seus trabalhos acadêmicos passaram a ser duramente critica<strong>do</strong>s poroutros professores, e suas propostas de reformulação da grade de ensino eramsempre desprezadas. Nas salas e corre<strong>do</strong>res da faculdade, vivia atribula<strong>do</strong> pela4

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!