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O impacto no Brasil e no Mundo - Nestlé

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palavraentrevista_Maria Fernanda Elias Lla<strong>no</strong>socultaFomeO relatório daOrganização dasNações Unidaspara Agriculturae Alimentação(FAO), divulgadoem dezembro de2010, salientou quea desnutrição jáatinge mais de umbilhão de pessoas.A palavra da ProfessoraDra. Andréa Ramalho


palavra 5A carência de micronutrientesafeta cerca de um terço dapopulação mundialNas palavras do Dr. Jacques Diouf, diretor-geral da FAO, a fome permanecea maior tragédia e o maior escândalo do mundo, sendo que o número depessoas subnutridas encontra-se inaceitavelmente alto [1]. De modo geral,a desnutrição infantil resulta em retardo do crescimento, subdesenvolvimentofísico e mental e aumento da mortalidade. Entre os adultos, suas maioresconsequências são letargia, diminuição da capacidade física e reprodutiva,declínio da função cognitiva e debilidade imu<strong>no</strong>lógica. Nesse sentido, a fomee a desnutrição são fatores que impedem o desenvolvimento econômico esocial de comunidades e grandes nações [2].A carência de micronutrientes, conhecida como fome oculta, afeta cercade um terço da população mundial e está relacionada principalmente àdeficiência de ferro, zinco, iodo e vitamina A [1]. A fome oculta recebe essa<strong>no</strong>menclatura por se instalar de forma silenciosa, sem sinais clínicos aparentes.Entretanto, mesmo que o quadro não seja avançado, ela já é capaz decausar da<strong>no</strong>s relevantes à saúde, aos sistemas de saúde e à sociedade [3].Os custos envolvidos <strong>no</strong> tratamento e <strong>no</strong> gerenciamento das consequênciasda desnutrição sejam eles medidos em termos huma<strong>no</strong>s, fiscais ou econômicossão extremamente elevados. Por outro lado, os especialistas defendemque os valores necessários para a prevenção da desnutrição são baixos.As ações governamentais e os investimentos em nutrição são justificáveis,não apenas por questões morais, mas também pela redução dedespesas com saúde, aumento da produtividade e consequente crescimentoeconômico e social [1,2].A convite da <strong>Nestlé</strong>.Bio, a nutricionista Andréa Ramalho, professora--titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, coordenadora do Núcleode Pesquisa em Micronutrientes e autora do livro Fome Oculta: Diagnóstico,Tratamento e Prevenção, compartilha seu conhecimento sobre o tema.Anemia (deficiência de ferro) em crianças em idade pré-escolarCategoria de significância para saúde pública (prevalência de anemia)n Normal (


6 palavraComo é definida a fome oculta (FO)?A FO é uma carência não explícita de um ou mais micronutrientes,em que há alterações fisiológicas mínimas,não perceptíveis <strong>no</strong> exame clínico de rotina, sendo estefato uma consequência da falta ou consumo marginal,sobretudo, de micronutrientes. É o estágio anterior aosurgimento dos sinais clínicos de carência detectáveise não está necessariamente associado a patologias claramentedefinidas, como as observadas na desnutriçãoproteico-calórica. A FO já causa prejuízos à saúde, levandoa um maior risco de morbimortalidade, mesmo quenão evolua para os estágios terminais da deficiência.Quais são as principais causas de FO <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> e <strong>no</strong>mundo?A FO é causada, tanto em nível mundial como nacional, porrazões econômicas, geográficas e/ou educacionais, nasquais o indivíduo tem acesso a uma dieta básica pouco diversificadae, <strong>no</strong>rmalmente, deficiente em vários micronutrientes.Pode estar associada à pouca disponibilidade dealimentos na natureza, aumento das demandas nutricionais,restrições alimentares, situações patológicas instaladas,desinformação sobre hábitos alimentares saudáveise exclusão (ou baixo consumo) de alimentos fonte de nutrientesem razão de preferências, crenças ou costumes regionais.Ainda que a FO possa ocorrer por deficiência de ummicronutriente específico, frequentemente ocorre de formacombinada a outras deficiências de vitaminas e minerais,em razão da estreita associação entre fontes alimentares,vias metabólicas e funções fisiológicas.Quais nutrientes merecem destaque?Tradicionalmente, vitamina A, iodo e ferro estão associadosàs maiores deficiências, consideradas deelevado <strong>impacto</strong> social e priorizadas pela OrganizaçãoMundial da Saúde (OMS) em todo o mundo. Entretanto,desde o final da última década, deficiências de outrosmicronutrientes passaram a ter destaque em nível desaúde pública mundial. Dentre eles destacam-se a vitaminaD, o zinco e o ácido fólico.Considerando o <strong>Brasil</strong>, quais são as deficiênciasmais significativas?No país, as deficiências mais significativas são as deferro e de vitamina A. A prevalência de anemia estáem tor<strong>no</strong> de 30% a 60% em crianças, principal grupoafetado, juntamente com as gestantes e lactantes.Estima-se que 25% delas estejam enquadradas comoportadoras de anemia grave, causada pela deficiênciade ferro e/ou ácido fólico. Com relação à vitamina A, estudosmostram que 30% a 50% de crianças com me<strong>no</strong>sde 5 a<strong>no</strong>s sofrem de algum grau de deficiência dessavitamina. O <strong>Brasil</strong> está entre os 60 países onde a deficiênciade vitamina A é, atualmente, um importanteproblema de saúde pública. Todas as regiões do paísfazem parte do “mapa nacional” de hipovitami<strong>no</strong>se A.E com relação ao iodo?Dentre as carências de micronutrientes de elevado<strong>impacto</strong> social, a deficiência de iodo é a em que o <strong>Brasil</strong>se encontra em melhor situação, visto que o país jáobrigou à adição de iodo ao sal, por meio de lei, desde1953. Aproximadamente 90% das famílias em todo opaís utilizam sal iodado.Quais são os <strong>impacto</strong>s dessas carências para a saúde?As carências nutricionais exercem um efeito direto<strong>no</strong> crescimento e desenvolvimento do ser huma<strong>no</strong>,bem como efeitos secundários que invariavelmentese refletem na capacidade de trabalho e, consequentemente,na independência econômica e tec<strong>no</strong>lógicadas nações. A deficiência de micronutrientes pode levara um maior risco de morbimortalidade por comprometimentode vários processos metabólicos, merecendodestaque as alterações observadas <strong>no</strong> sistema


palavra 7imune, nas defesas antioxidantes e <strong>no</strong> desenvolvimentofísico e mental dos indivíduos. Qualquer carênciade macro ou micronutrientes tem múltiplos efeitosdeletérios, uma vez que o organismo necessita delespara manter sua homeostase e integridade.Quais são os grupos de risco para FO?Os grupos mais vulneráveis à deficiência de micronutrientessão as gestantes, as nutrizes e os lactentes, peloaumento das demandas nutricionais nesses momentosbiológicos. O não atendimento de tais demandas acarretaconsequências para as gestantes e para o desenvolvimentofetal como, por exemplo, o comprometimentoda época de lactação num período em que as reservasdo recém-nascido são baixas. Há consenso universal deque as crianças me<strong>no</strong>res de seis a<strong>no</strong>s também pertençamao grupo de maior risco para FO, pois as suas necessidadesnutricionais são proporcionalmente maiores emrazão de seu rápido crescimento e da maior prevalênciade doenças infecciosas nesse grupo etário.E quanto aos demais segmentos populacionais?Os conhecimentos disponíveis da participação dosmicronutrientes em várias funções primordiais e o <strong>impacto</strong>que eles exercem sobre o metabolismo intermediáriotêm despertado interesse da comunidade científicapela investigação de outros grupos de indivíduos,com o objetivo de subsidiar estratégias de intervenção.As evidências acumuladas sugerem importante papelda deficiência de micronutrientes como fator predisponentee agravante na fisiopatologia de diversas doençascrônicas não transmissíveis, como as cardiovasculares,a hipertensão, o diabetes mellitus, a obesidade,alguns tipos de câncer, a osteoporose, dentre outras.Tais achados podem contribuir para a valorização dessacondição nutricional em outros segmentos populacionais,além de apontar a necessidade de maior ênfase<strong>no</strong> protocolo de atenção nutricional.Deficiência de Vitamina A em crianças em idade pré-escolarCategoria de significância para saúde pública (prevalência de reti<strong>no</strong>l sérico


8 palavraDeficiência de Iodo em crianças em idade escolarn Deficiência severa de iodo (300 µg/L)Não há dados disponíveisE por que a fortificação é tão eficaz?A fortificação apresenta várias vantagens, dentre elasa alta cobertura populacional, a não modificação doshábitos alimentares e o baixo risco de toxicidade. Emgeral, pode-se dizer que a fortificação dos alimentos éuma forma segura de suplementar a dieta da população,uma vez que a margem de i<strong>no</strong>cuidade é muito alta.Segundo o Banco Mundial, nenhuma outra tec<strong>no</strong>logiaoferece tão ampla oportunidade para melhorar o estadonutricional dos indivíduos a um custo tão baixo e emtão pouco espaço de tempo. Atualmente, os alimentosfortificados <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> são o sal iodado, a água fluoretadae as farinhas de trigo e milho com ferro e ácido fólico.World Health Organization 2007Existem outros nutrientes que deveriam ser considerados?Sim, sobretudo a fortificação com vitamina A. Algunsalimentos de largo consumo podem ser consideradoscomo bons veículos para a fortificação, porém, dentrealgumas possibilidades, chamo a atenção para o arroz.Até a segunda metade da década de 1980, a deficiênciade vitamina A causava preocupação apenas em relaçãoa seus sinais clínicos, que vão desde a cegueira <strong>no</strong>turnaaté a cegueira nutricional irreversível. Na segundametade dessa década, surgiram evidências, que se tornaramcada vez mais consistentes, de que a carênciasubclínica da vitamina A, sem sinais como xero ftalmia,mancha de Bitot e ceratomalacia, também pode contribuirpara a morbidade e mortalidade em crianças,recém-nascidos e mulheres em idade fértil, puérperase nutrizes. Atualmente, sabe-se que, em razão de suaatuação <strong>no</strong> sistema imu<strong>no</strong>lógico, a deficiência de vitaminaA pode tornar fatais doenças como diarreias eo sarampo. De fato, a deficiência dessa vitamina podeprovocar quadros de imu<strong>no</strong>deficiência de origem exclusivamentenutricional. Além disso, existem evidênciasde que os programas de intervenção nutricional, aindaque não integrados a outros programas de intervençãoem saúde e nutrição, podem evitar, a cada a<strong>no</strong>, a mortede um número expressivo de indivíduos.Seus projetos de pesquisa sempre tiveram a vitaminaA como foco? Por quê?Após analisar dados do período de 1990 a 1995, em queas autoridades de saúde <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong> consideraram que ainformação era insuficiente para definir a situação da carênciade vitamina A <strong>no</strong> país, me senti motivada a traba-A fortificação de outros alimentos que não os básicostambém contribui para o aumento de micronutrientes?Sim. Ainda que outros alimentos não apresentem umconsumo em larga escala e em grande quantidade, poderãocontribuir para uma maior ingestão de micronutrientesem diferentes segmentos populacionais e emmomentos biológicos de maior demanda nutricional.


palavra 9lhar com esse micronutriente. Meu intuito foi o de contribuirpara a avaliação dessa deficiência em seu contextoepidemiológico, além de abordar a necessidade do empregoefetivo de todos os recursos huma<strong>no</strong>s, científicose tec<strong>no</strong>lógicos disponíveis para o seu combate — umaestratégia vital para a sobrevivência das crianças e parao desenvolvimento dos países afetados.O <strong>Brasil</strong> tem evoluído <strong>no</strong> combate à FO?O combate a deficiências nutricionais não só tem apresentadoresultados tímidos diante da grandeza do problema,como não tem conseguido impedir que o consumo denutrientes indispensáveis ao desenvolvimento orgânicodos indivíduos atinja regiões consideradas fora do eixotradicional da miséria <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>. Tal fato explica-se uma vezque o principal fator determinante da carência de micronutrientesna população é a baixa ingestão de alimentos fontedesses nutrientes. O fato está mais relacionado a questõesculturais e a padrão de consumo alimentar do que afatores econômicos. Tal constatação aponta o aumentodo consumo de alimentos fonte de vitaminas e mineraiscomo a principal estratégia, <strong>no</strong> longo prazo, <strong>no</strong> combateà FO. A fortificação e a suplementação são as medidas decurto prazo. Os suplementos representam uma excelentealternativa em casos <strong>no</strong>s quais a disponibilidade local dealimentos fonte de nutrientes, aspectos culturais ou ausênciade alimentos enriquecidos venham a comprometera ingestão adequada desses nutrientes.envolvidos na busca de uma solução — a universidade,os gover<strong>no</strong>s, a indústria, a mídia e a população — falemlinguagens diferentes. Precisamos, então, de interfacesentre esses setores para permitir que o conhecimentocientífico se traduza em ações e programas de intervençãonutricional de alcance social.O que a senhora almeja com o resultado do seu trabalho?A erradicação ou, pelo me<strong>no</strong>s, a redução da FO <strong>no</strong><strong>Brasil</strong>. Só assim será possível reverter uma situaçãoque já está afetando as gerações futuras e comprometendoo desenvolvimento que se almeja para opaís. Um desenvolvimento que depende basicamenteda vitalidade de seu povo e, em última instância,garante o passaporte para a <strong>no</strong>ssa auto<strong>no</strong>mia econômica,científica e tec<strong>no</strong>lógica.Essas medidas são eco<strong>no</strong>micamente viáveis?Calcula-se que o custo de não intervir adequadamenteseja muito maior do que o custo de programas deintervenção. Mesmo assim, não é raro que os setoresConheça as pesquisas mais recentes sobre o <strong>impacto</strong>global da deficiência de micronutrientes, <strong>no</strong> workshop do<strong>Nestlé</strong> Nutrition Institute.www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspxreferências[1] Food and Agriculture Organization of the United Nations. Food-based approaches for improving diets and raising levelsof nutrition. Concept Note. Roma, Dec 2010. [2] Kennedy G, Nantel G, Shetty P. The scourge of “hidden hunger”: globaldimensions of micronutrient deficiencies. Food, Nutrition and Agriculture 32: 8-16. [3] Ramalho A. Fome Oculta: Diagnóstico,Tratamento e Prevenção. Rio de Janeiro: Atheneu, 2008. [4] Ramalho RA, Flores H. Saunders C. Hypovitami<strong>no</strong>sis A in Brazil:a public health problem. Revista Panamericana de Salud Pública, Washington, v. 12, n. 2, p. 117-122, 2002. [5] RamalhoRA ; Saunders C, Natalizi D, Cardoso L, Accioly E. Níveis Séricos de Reti<strong>no</strong>l em Escolares de 7 a 17 A<strong>no</strong>s <strong>no</strong> Município do Riode Janeiro. Revista de Nutrição da PUCCAMP, São Paulo, v. 17, n. 4, p. 461-468, 2004. [6] Gomes MM, Saunders C, RamalhoA, Accioly E. Serum vitamin A in mothers and newborns in the city of Rio de Janeiro. International Journal of Food Sciencesand Nutrition, v. 1, p. 01-08, 2007. [7] Ramalho RA, Paes C, Souza GG et al. Vitamin A Liver Store: A Case-Control Study.International Journal of Food Sciences and Nutrition, v. 12, p. 01-09, 2007. [8] Chaves GV, Souza GG, Matos AC et al. SerumReti<strong>no</strong>l and -carotene Levels and Risk Factors for Cardiovascular Disease in Morbid Obesity. Int J Vitam Nutr Res 2010 May;80(3):159-67. [9] Pereira SE, Saboya C, Saunders C. Association between night blindness, vitamin A liver store and serumreti<strong>no</strong>l in class III obesity group. Obesity Surgery, 2010.


sabor e saúdepor_Claudio GalperinDietado MediterrâneoHerança Cultural da Humanidade pela UnescoNo Antigo Egito, quando o Nilo transbordava para além de suas margens ao finalde cada verão, trazia com ele a boa fortuna de minerais que tornavam o solo fecundopara a agricultura e para a vida que emanava dela.Muitos estudiosos defendem que a abundância de alimentos, dependente dessascheias, tenha sido crucial para o extraordinário desenvolvimento da civilizaçãoegípcia em praticamente todas as áreas do conhecimento.Ao mesmo tempo, analisam que em a<strong>no</strong>s de seca, com os baixos níveis do rio e osolo mal preparado para o plantio, sobrevinha a fome e a morte.Em uma região onde a água constitui um bem tão precioso quanto escasso, aimportância estratégica do Nilo chegou intacta aos séculos XX e XXI.Assim, com o intuito de controlar seus níveis e sua vazão, o gover<strong>no</strong> egípcio decidiuconstruir, em meados da década de 1950, a represa Aswan Alta — sobre outra, jáobsoleta, erguida pelos ingleses entre 1889 e 1902.


12 sabor e saúdeAssim, a DMT, enriquecida por diversas culturas,manteve a mesma estrutura alimentar e as mesmasproporções ao longo de séculos: óleo de oliva, cereais ederivados, frutas frescas, vegetais, <strong>no</strong>zes e, em me<strong>no</strong>rquantidade, peixe e derivados lácteos. Além da presençaessencial de condimentos e temperos e do consumomoderado de vinho e chá durante as refeições.Já nas longas mesas que reúnem a família e os amigos— ou até mesmo grande parte de vilarejos e cidades,por ocasião de festividades —, encontra-se outro ritualmarcante que integra a DMT: a tradição oral das conversasque compartilham o presente e adivinham o futuro.Na voz do filósofo grego Plutarco: “Nós não sentamos à mesa para comer, mas para comer juntos”.Primeiros estudosApesar do <strong>no</strong>me, a DMT não é típica da cozinhamediterrânea como um todo. No Nordeste da Itália, porexemplo, banha de porco e manteiga são amplamenteutilizadas para cozinhar, enquanto o óleo de oliva é <strong>no</strong>rmalmentereservado para o tempero de saladas.Já <strong>no</strong> Norte da África, os muçulma<strong>no</strong>s tradicionalmentenão consomem vinho, por motivos religiosos.Naquela região, também, assim como em certos paísesdo Mediterrâneo Oriental e da Ásia Me<strong>no</strong>r, é tradicionalo uso de manteiga fundida e de gordura proveniente dorabo de ovelha [1].A prática alimentar reconhecida contemporaneamentecomo DMT foi identificada pela primeira vez <strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s1950, como parte de um estudo que investigava a saúde eos hábitos de vida em sete países: Finlândia, Grécia, Itália,Iugoslávia, Japão, Holanda e Estados Unidos [2].Um de seus aspectos mais intrigantes foi o achadode que habitantes de Creta e outras regiões da Grécia,assim como os do Sudeste da Itália, exibiam maior longevidadee me<strong>no</strong>r incidência de doenças cardiovasculares,a despeito de uma dieta rica em gordura e de limitadaatenção médica [2].


sabor e saúde 13Não resta dúvida de que a tradicional DMT, escassaem carnes e açúcares e repleta de alimentos de origemvegetal e gorduras insaturadas (sobretudo do óleode oliva) tenha contribuído para a proteção cardiovascularverificada.O mesmo, porém, poderia se dizer da prática deatividade física, do baixo índice de tabagismo e do pesovia de regra saudável exibidos por aquelas populações.A herança genética, por sua vez, poderia ser um fatorpreponderante também. Deste modo, a simples transposiçãoda dieta para outras populações frustraria a expectativade se obter reais benefícios à saúde [3].Ocorre, contudo, que a DMT, nas palavras do Dr.Walter Willet, da Escola de Saúde Pública da Universidadede Harvard e uma das maiores autoridades sobre o tema,“mostrou-se benéfica tanto para um funcionário de escritóriode Iwoa (EUA) quanto para um agricultor grego”[4].Tal afirmação recebe amplo suporte do U.S. NationalInstitutes of Health — AARP Diet and Health Study,um estudo longitudinal de longo prazo do qual participaram400 mil homens e mulheres. Nele, os indivíduos queaderiram a um padrão alimentar que se aproximava daDMT exibiram um risco 20% me<strong>no</strong>r de morrer por doençacardiovascular, câncer ou qualquer outra causa <strong>no</strong> períodode 5 a<strong>no</strong>s [5].Significativamente, a DMT mostrou-se tão efetivaem tratar doenças cardíacas como em preveni-las.No The Heart Institute of Spokane Diet Intervention andEvaluation Trial (THIS-DIET), sobreviventes de infartoagudo do miocárdio que adotaram esse padrão dietéticomostraram me<strong>no</strong>r risco de um segundo evento, quandocomparados a indivíduos na mesma condição que seguiamuma dieta típicamente <strong>no</strong>rte-americana [6].Revisão sistemáticaEm 2008, pesquisadores da Universidade de Florença,na Itália, utilizaram um desenho de meta-análisepara avaliar os principais estudos de coorte que analisavama associação entre DMT, mortalidade e incidênciade doenças crônicas realizados de 1966 até então —um total de 1.574.299 indivíduos, acompanhados porperíodos de tempo de 3 a 18 a<strong>no</strong>s [7].Para avaliar a aderência à dieta, os autores utilizaramuma escala específica, na qual, para cada tipo dealimento, foi atribuído um valor que gerava um escore.A análise final revelou que dois pontos a mais naescala de aderência, em relação à média da população,estavam associados à redução da mortalidade global epor doenças cardiovasculares (9%), redução da incidênciae mortalidade por câncer (6%) e me<strong>no</strong>r incidência dedoença de Parkinson e Alzheimer (13%).Reflexo do interesse que a dieta tem despertado<strong>no</strong>s meios científicos, entre 2008 e 2010, sete <strong>no</strong>vosestudos prospectivos foram publicados: um para mortalidadeem geral, três para incidência e mortalidade pordoenças cardiovasculares, um para incidência e mortalidadepor câncer e dois para doenças neurológicas.Significativamente, estes últimos incluíram doisresultados esperados que não haviam sido previamenteestudados: comprometimento cognitivo leve e acidentevascular cerebral.


14 sabor e saúdeLevando em conta esses <strong>no</strong>vos estudos, os pesquisadoresda Universidade de Florença promoveramuma atualização do trabalho original, publicando seusresultados na edição de <strong>no</strong>vembro de 2010 do AmericanJournal of Clinical Nutrition [8].Para a <strong>no</strong>va meta-análise, foram selecionados 18estudos de coorte, que, em conjunto, somaram uma populaçãode 2.190.697 indivíduos, acompanhada por umperíodo de 4 a 20 a<strong>no</strong>s.Os resultados referendaram os achados prévios,apontando a aderência à DMT como associada à reduçãoda mortalidade por qualquer causa (8%), redução damortalidade e/ou incidência de doenças cardíacas oucerebrovasculares (10%), redução de mortalidade e/ouincidência de câncer (6%) e redução da incidência dedoenças neurodegenerativas (13%).Uma das conclusões mais relevantes deste estudoestá na observação de que mesmo uma modesta adoçãoda dieta (2 pontos na escala de aderência) está significativamenteassociada à me<strong>no</strong>r mortalidade e incidênciadas principais doenças crônicas não transmissíveis [8].É importante <strong>no</strong>tar, ainda, a existência de estudosrelevantes de coorte que associam a DMT à perda de peso<strong>no</strong> combate à obesidade [9], ao melhor controle do diabetestipo 2 [10, 11] e a um me<strong>no</strong>r risco de depressão [12].Significativa, também, é a associação positivaentre a DMT e a prevenção primária e secundária dasíndrome metabólica e seus componentes individuais— observada em meta-análise de 50 estudos epidemiológicoscom mais de meio milhão de pessoas e publicadasemanas atrás <strong>no</strong> Journal of the American College ofCardiology [12].Sem diminuir a importância dos resultados demeta-análise, é preciso, contudo, levar em conta certaslimitações dessa ferramenta. Seu uso para avaliaro efeito protetor de um padrão alimentar em relação àocorrência de múltiplas doenças pode levar a resultadossuperestimados [8].Mecanismos de açãoO papel protetor atribuído à DMT em relação a enfermidadescrônicas como a doença arterial coronarianadeve-se, em grande medida, a seus elevados teoresde gordura mo<strong>no</strong>insaturada — oriunda, principalmente,do óleo de oliva.Isto se dá por meio de uma melhora do perfil lipídico,da redução da oxidação lipídica e do DNA, da diminuiçãoda resistência à insulina e da modulação de estadoscrônicos de inflamação sistêmica de baixa intensidade.Recentemente, sugeriu-se, ainda, que a dieta poderiareduzir o da<strong>no</strong> e a disfunção endotelial, fundamentaispara a progressão da doença aterosclerótica [13].


conhecer 19Pródigo século XXA primeira metade do século XX testemunhou descobertasmarcantes em nutrição. O último ami<strong>no</strong>ácido encontrado em proteínasde alimentos, a treonina, foi isolado em 1935. E, até 1948, todasas vitaminas essenciais já haviam sido descobertas e sintetizadas[1,2]. Nesse século, ainda, foram descobertas as funções dos mineraisessenciais da dieta, bem como dos mineirais-traço [2].Fruto disso, inúmeros Prêmios Nobel foram outorgados.O que <strong>no</strong>s leva à questão fundamental deste artigo: mais recentemente,<strong>no</strong> período entre 1971 e 2011, quais descobertas merecemuma posição de destaque?Terapia de Reidratação OralEmbora o emprego da terapia de reidratação oral (TRO) remonteà década de 1950, seu uso era então restrito a profissionaisespecializados. O marco que consagrou sua utilidade e autorizouseu emprego rotineiro por familiares e agentes de saúde ocorreriatempos mais tarde, há exatos 40 a<strong>no</strong>s [3].Com a utilização de TRO por pessoas leigas <strong>no</strong> tratamentode pacientes com cólera durante a Guerra de Independência deBangladesh, verificou-se uma queda dramática e sem precedentesde mortalidade.É ao redor dessa época, também, a descrição mais acuradados mecanismos de transporte de água, glicose e eletrólitos atravésda mucosa intestinal, o desenvolvimento de uma formulaçãopadrão e sua recomendação pela Organização Mundial da Saúde(OMS) [3].Indispensável ao tratamento da doença diarreica, credita-se àTRO ter salvo milhões de vidas em todo o mundo nas últimas décadas.Prevenção de malformaçõesdo tubo neural pelo ácido fólicoA suspeita de que a deficiência de ácido fólico contribui paraa maior parte dos casos de malformações do tubo neural (MTN)data de, pelo me<strong>no</strong>s, 40 a<strong>no</strong>s atrás. Achados conclusivos, porém,ocorreriam em meados da década de 1980 e início dos a<strong>no</strong>s 1990[4]. Nesse período, múltiplos estudos controlados, randomizados,demonstraram uma redução entre 50%-70% de MTN, com a administraçãopreventiva de ácido fólicoantes da gestação [5].Diante dessa constatação, políticasde fortificação de alimentoscomo a farinha de trigo ganharam omundo, reduzindo de maneira substantivaa causa mais comum de mal--formações congênitas [5].Efeito dos ácidos graxos transna saúde humanaOs ácidos graxos (AG) trans alcançaram papel de destaquena dieta humana dos últimos cem a<strong>no</strong>s, particularmente na segundametade do século XX, com o substancial aumento <strong>no</strong> consumode alimentos industrializados. Embora presentes em alimentosde origem animal, como a carne e o leite, seu teor é consideravelmentepeque<strong>no</strong>.O processo de hidrogenação que gera os AG trans, cuja patentedata de 1902, consiste em converter óleos vegetais líquidosem gorduras sólidas ou semissólidas, utilizadas na fabricação deprodutos como margarinas, gordura para fritura, massas, sorvetes,entre outros.A suspeita de que os AG trans industriais estariam associadosa uma maior incidência de doença arterial coronariana (DAC)data de meados dos a<strong>no</strong>s 1950. A questão, porém, não foi aprofundadaaté o início da década de 1990, quando múltiplos estudosconfirmaram este efeito [6].Desde então, esta descoberta tem moldado políticas públicasde saúde em todo o mundo e profunda reestruturação da indústriade alimentos. A substituição de óleos parcialmente hidrogenadospor óleos não processados deve responder por uma substancialqueda <strong>no</strong> risco de infarto do miocárdio.


20 conhecerTecido gorduroso como um órgão endócri<strong>no</strong>Até muito recentemente, acreditava-se que o tecido adiposonão passava de um sítio para armazenamento de energia. A mudançade paradigma em favor de um órgão com funções imu<strong>no</strong>neuroendócrinas,com efeito regulador sobre o balanço energético, teriainício em 1994 com a descoberta da leptina.Produzida predominantemente por adipócitos, a leptina estimulao gasto energético e a saciedade, e contribui para restaurarestados de glicemia <strong>no</strong>rmal. Na maioria dos casos de obesidade,seus níveis circulantes encontram-se aumentados, embora uma resistênciaa ela pareça limitar tais efeitos [7,8].Em contraste com a leptina, a adiponectina, produzida exclusivamentepor adipócitos, apresenta-se frequentemente diminuídana obesidade. Atua promovendo um aumento da sensibilidade àinsulina, da oxidação de AG e do gasto energético, além de reduzira produção hepática de glicose [7,8].Me<strong>no</strong>s estudado, o aumento da expressão de resistina e daproteína-4 ligadora de reti<strong>no</strong>l está intimamente relacionado com aadiposidade e parece implicado <strong>no</strong> desenvolvimento de resistênciaà insulina [7,8].Mais recentemente, descobriu-se que macrófagos representamuma parte importante da função secretora do tecidoadiposo, atuando como principal fonte de citocinas pró-inflamatóriascomo TNF-a e IL-6. O aumento de seus níveis circulantes naobesidade é capaz de induzir a um estado de inflamação crônicade baixa intensidade que tem sido associado à resistência à insulinae ao diabetes [7,8].Em seu conjunto, a descoberta desses mediadores hormonaismuda de maneira categórica <strong>no</strong>ssa visão do tecido gorduroso, colocandoem evidência seu papel crítico para a homeostase energética.Além disso, fornece importantes subsídios para linhas de pesquisaque investigam o vínculo entre obesidade e doenças como o diabetestipo 2, a aterosclerose e a síndrome metabólica [1].Água duplamente marcadapara medida do gasto energéticoEste método é realizado a partir da ingestão de água quecontém isótopos estáveis de hidrogênio e oxigênio. O declínio desuas concentrações é então medido em algum fluido do corpo,como a urina [9].A diferença entre a taxa de perda de ambos os isótopos éutilizada para estimar a produção de dióxido de carbo<strong>no</strong> e o gastoenergético. E, como o indivíduo pode manter suas atividades <strong>no</strong>rmaisdurante o teste, a avaliação espelha com maior precisão oque ocorre na realidade [9,10].Utilizada em animais desde os a<strong>no</strong>s 1950, o emprego daágua duplamente marcada (ADM) em seres huma<strong>no</strong>s só foi validadoem 1986 — provocando uma mudança radical <strong>no</strong> estudo daobesidade.Até então, debatia-se o aparente paradoxo de que quantomais obesa a pessoa, me<strong>no</strong>s alimentos parecia ingerir. Por contadisso, chegou-se a postular que indivíduos obesos teriam um gastoenergético inferior ao de pessoas eutróficas.Com o advento da ADM, foi possível constatar que um altoconsumo, e não um me<strong>no</strong>r gasto, era a causa do desequilíbrio energético.Em outras palavras, verificou-se que métodos tradicionaiscomo recordatório alimentar apresentavam um bias que era proprorcionalmentemaior ao aumento de gordura corporal [10].Desde então, o teste tem sido aplicado com outras finalidadescomo, por exemplo, medida da demanda energética decorrentede doenças crônicas e de atividade física, estudo das consequênciasda desnutrição e validação de outros métodos que avaliam ogasto energético total.Prevenção do diabetes pelamudança do estilo de vidaO conhecimento de que fatores ambientais estão associados aum maior risco para o desenvolvimento do diabetes tipo 2 (DM 2) antecedeo escopo de tempo adotado neste artigo.Curiosamente, a constatação de que mudanças de estilo devida são altamente eficazes na prevenção da doença só ocorreriacom grandes estudos longitudinais realizados a partir dos a<strong>no</strong>s1990 [11].


conhecer 21A constatação de que mudanças deestilo de vida são altamente eficazes naprevenção do diabetes tipo 2 só ocorreriacom grandes estudos longitudinaisrealizados a partir dos a<strong>no</strong>s 1990Quando avaliados em conjunto, esses estudos demonstram,de forma inequívoca, o <strong>impacto</strong> positivo (i) da restrição <strong>no</strong> consumode carboidratos refinados e gorduras, e o aumento da ingestãode fibras; (ii) da prática de exercício físico por 30-40 minutos aodia, pelo me<strong>no</strong>s 5 vezes por semana; (iii) da restrição do consumoexcessivo de álcool; e (iv) da perda de peso por indivíduos obesos.Dig<strong>no</strong> de <strong>no</strong>ta é que os estudos sublinham a relevância dessasmudanças de estilo de vida para indivíduos com maior risco deDM2, como aqueles com tolerância diminuída à glicose e intolerânciaà glicose de jejum [11].O DM2, assim como a obesidade, atingiu proporções epidêmicasem grande parte do mundo. Além de efetiva, a adoção depequenas mudanças <strong>no</strong> estilo de vida provaram ser altamenteseguras, com <strong>no</strong>tável custo-benefício. O desafio atual reside emtransformar esta descoberta em programas de prevenção de amploalcance.O papel do meio ambiente sobre a obesidadeAté recentemente, a busca por alterações metabólicas e genéticasem pessoas obesas ocupava o centro de gravidade daspesquisas sobre o ganho excessivo de peso. Além disso, essesindivíduos eram rotulados pela pouca força de vontade para comerme<strong>no</strong>s e se exercitar mais (1).Embora influências biológicas e comportamentais possamdeterminar certas variações da gordura corporal entre pessoasque vivem em um dado ambiente, essas influências não explicamo fenôme<strong>no</strong> na população em geral.Do ponto de vista de saúde pública, o reconhecimento de quea obesidade traduz uma reação <strong>no</strong>rmal do organismo a um ambientea<strong>no</strong>rmal, obesogênico, representa um avanço importante e umamudança <strong>no</strong> paradigma tradicional de que esta é uma enfermidadeindividual que necessita de tratamento (11). A pandemia de obesidadeque assola hoje grande parte do mundo ocorre ao mesmotempo em que aumenta o conhecimento, a concientização e a educaçãosobre temas como a própria obesidade, nutrição e exercíciofísico. De fato, a promoção individual de mudança dietética ou daprática de atividade física, assim como a instituição de programasfocados em mudança individual de comportamento, parecem promoverresultados apenas limitados (12).A história <strong>no</strong>s ensina que o controle de epidemias costumalograr êxito apenas depois que mudanças ambientais tenham sidoimplementadas. No que diz respeito à prevenção e ao controle daobesidade, essas medidas parecem incluir a criação de um ambienteescolar mais saudável e o planejamento racional das cidades (1).Efeito dos ácidos graxos ômega-3na doença arterial coronarianaO efeito de AG marinhos sobre a redução da mortalidade porDAC tem sido motivo de re<strong>no</strong>vado interesse desde o início dos a<strong>no</strong>s1970 — quando se observou uma baixa incidência da doença emesquimós das regiões árticas do Canadá, do Alasca e da Groenlândia,apesar do elevado teor de gordura de sua dieta [13].No rastro dessa observação, seguiram-se múltiplas investigaçõesclínicas e epidemiológicas apontando para o papel protetor dosácidos graxos poli-insaturados (PUFA) ômega-3.Entre os mecanismos mais ativamente estudados, destaca-seuma ação anti-inflamatória mediada por seus derivados (como resolvinase protectinas), com possível estabilização da placa aterosclerótica.Hoje, a associação entre AG ômega-3 e a diminuição dos níveisde triglicérides continua sendo validada pelo rigor dos estudos maisrecentes. No entanto, seu papel na redução da mortalidade, mortesúbita, arritmias, infarto agudo do miocárdio e insuficiência cardíacaainda não pôde ser estabelecido [13].Ácidos graxos ômega-3ALAEPADHA


22 conhecerModulação de lipídeos plasmáticos pela dietaEm meados dos a<strong>no</strong>s 1970, início da década de 1980,modelos animais consagraram a ação redutora promovida pelosácidos graxos saturados da dieta sobre as concentraçõesplasmáticas de LDL-colesterol (LDL-C) e, consequentemente,sobre o risco de DAC [14,15]. Tais modelosressaltavam o papel dos receptores hepáticos deLDL-C na mediação desse efeito.Estudos recentes aprofundaram esta descoberta, revelandoque os PUFAs da dieta regulam os níveis plasmáticos de LDL-Caumentando a afinidade, a abundância de RNAm e a expressãode seu receptor [15].Com resultados ainda inconclusivos, outros mecanismoscontinuam a ser investigados. Avanços em biologia moleculartêm permitido investigar o envolvimento de pelo me<strong>no</strong>s 4 famíliasde fatores de transcrição: PPARs (receptores ativados porproliferadores de peroxissoma), LXR (Receptor hepático X), fatornuclear do hepatócito-4 (HNF-4) e proteína de ligação ao elementode resposta a esterol (SREBP) [15].Como veremos a seguir, a modulação de receptores de LDL--C e dos níveis de lipídeos por AG da dieta é uma descoberta quepertence a uma ampla moldura de estudos.Regulação da transcrição gênica pela dietaOs estudos de sequenciamento de DNA iniciados na décadade 1990 se desenvolveram com impressionante dinamismo,tornando conhecido, em pouco tempo, o ge<strong>no</strong>ma huma<strong>no</strong> inteiro.Este avanço inaugurou uma extraordinária <strong>no</strong>va era dedicada ainvestigar de que maneira respondemos a estímulos ambientaiscomo, por exemplo, à dieta.Hoje em dia, não apenas transcriptômica mas proteômicae metabolômica fazem parte do <strong>no</strong>sso vocabulário diário. Nutrigenéticae nutrigenômica buscam ativamente identificar genescuja expressão pode ser modificada por componentes alimentares.A epigenética, por sua vez, amplia a busca por estratégias nutricionaispara prevenção de doenças investigando alterações domaterial genético que não afetam a sequência de nucleotídeos— como, por exemplo, certos padrões de metilação do DNA [16].É este mecanismo que dá suporte à tese de “programaçãofetal”, segundo a qual o aporte inadequado de nutrientes<strong>no</strong> período crítico do desenvolvimento está associadoa um risco aumentado de doenças crônicas na vida adulta [17].Se <strong>no</strong>sso conhecimento sobre a regulação gênica pela dietaavança com velocidade exponencial é forçoso admitir a existênciade um e<strong>no</strong>rme contingente de perguntas que apenas começaa ser respondido. Esta área encerra, a um só tempo, algumas dasmais relevantes descobertas dos últimos 40 a<strong>no</strong>s e alguns dosmaiores desafios nas décadas por vir.Em tempoUm considerável número adicional de descobertas poderia,ou deveria, integrar a lista compilada acima. Para reduzirminimamente algumas omissões, vale a pena lembrar que aação multissistêmica da vitamina D, para além de sua ação <strong>no</strong>metabolismo ósseo, é cada vez mais aceita. A maior parte dosdados disponíveis deriva, contudo, de estudos observacionaisepidemiológicos, úteis para a geração de hipóteses, mas limitadospara provar causalidade [18].A descoberta do gene da hemocromatose, por sua vez, emmeados dos a<strong>no</strong>s 1990, desencadeou uma série de outras, relacionadascom o metabolismo do ferro. Incluindo a interação daproteína produzida por ele com o receptor da transferrina 1 e como hormônio hepticidina, descoberto <strong>no</strong> a<strong>no</strong> 2000 [19].No início da década de 1990, estudos como o Age-RelatedEye Diseases Study [20] observaram que altas doses combinadasde vitamina C, vitamina E, betacarote<strong>no</strong> e zinco diminuíamo risco de progressão da degeneração macular relacionada com


conhecer 23Produtos enriquecidos com estanóisvegetais provaram ser seguros eefetivos como estratégia nutricionalpara a redução do colesterol em cercade 60 estudos clínicos publicados <strong>no</strong>s16 a<strong>no</strong>s em que estão <strong>no</strong> mercadoa idade em até 25% dos pacientes com doença intermediária ouavançada. Embora não haja dados suficientes para justificar seuuso em estratégias de prevenção primária, a descoberta tem autorizadosua indicação para pacientes em risco imediato da doençae para aqueles portadores da condição em estágio avançado [21].Produtos enriquecidos com estanóis vegetais provaram serseguros e efetivos como estratégia nutricional para a redução docolesterol em aproximadamente 60 estudos clínicos publicados aolongo dos 16 a<strong>no</strong>s em que estão <strong>no</strong> mercado [22]. Pacientes comfitosterolemia (homozigóticos) constituiriam a exceção, uma vezque absorvem exageradamente estanóis vegetais, desenvolvendoxantomas e aterosclerose.A tradicional redução de 10% de LDL-C obtida com a ingestãode 2 g/dia de esteróis vegetais mostrou, recentemente, serdose dependente: 9 g/dia promovem uma redução de até 17% deLDL-C, sem efeitos colaterais.A despeito desse benefício e de uma possível melhora dafunção endotelial, é importante <strong>no</strong>tar, contudo, que não existemestudos que avaliem desfechos cardiovasculares relacionadoscom a DAC ou outras doenças cardiovasculares [22].Nas últimas décadas, ficou demonstrado, ainda, que oálcool — possivelmente, mesmo em pequenas doses, como umdrinque ao dia [23] — e a obesidade são os fatores dietéticos quemais contribuem para elevar o risco de câncer, em particular o demama [24, 25]; e que o álcool, por outro lado, em doses pequenasou moderadas, pode reduzir o risco de DAC [25].Finalmente, como <strong>no</strong>s lembram Katan e cols. [1], a descobertados receptores do cheiro em 1991, que rendeu um PrêmioNobel a Richard Axel e Linda Buck, pode não figurar como umadescoberta <strong>no</strong> campo da nutrição. Não há como negar, entretanto,sua importância para este campo de estudo.A substituição da manteigapor margarina enriquecidacom estanóis vegetais foi umadas estratégias nutricionaisconcebidas para reduzir ahipercolesterolemiareferências[1] Katan MB, Boekschoten MV, Con<strong>no</strong>r WE, et al. Which are the greatest recent discoveries and the greatest future challenges in nutrition? Eur. J. Clin. Nutr. 2009;63(1):2-10.[2] Baker DH. Comparative nutrition and metabolism: explication of open questions with emphasis on protein and ami<strong>no</strong> acids. Proc. Natl. Acad. Sci. USA. 2005; 102(50):17897-902.[3] Ruxin JN. Magic bullet: the history of oral rehydration therapy. Med. Hist. 994;38(4):363-97. [4] MRC Vitamin Study Research Group. 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dossiê bioAdriana Trejger KachaniNutricionista responsávelpelo Programa da MulherDependente Química doInstituto de Psiquiatria doHospital das Clínicas daFaculdade de Mediciana daUniversidade de São Paulo(PROMUD - IPq - HC -FMUSP)Mestre e Doutoranda daFaculdade de Medicina daUniversidade de São PauloAutora e organizadorado livro Nutrição emPsiquiatria.Nutrição empsiquiatriaMarcela Salim KotaitNutricionista do Programade Transtor<strong>no</strong>s Alimentaresdo Instituto de Psiquiatriado Hospital das Clínicas daFaculdade de Medicina daUniversidade de São Paulo(AMBULIM - IPq - HC -FMUSP)Aprimoramento emTranstor<strong>no</strong>s Alimentares doAMBULIMIntroduçãoDesde os primórdios das civilizações, a alimentaçãoé algo fundamental para a sobrevivênciahumana e um ato inscrito na cultura do homem.A alimentação caracteriza-se por ser um fenôme<strong>no</strong>de extrema complexidade, que envolve aspectos psicológicos,fisiológicos e socioculturais. O alimento, etudo o que o rodeia, envolve a história de cada pessoa,suas lembranças, sentimentos, fantasias conscientese inconscientes [1]. O homem tem uma importanterelação emocional e social com o alimento, que ficaevidenciada <strong>no</strong> ato de participar de refeições em conjunto,celebrar datas em tor<strong>no</strong> de uma mesa, serviralimentos para visitas, <strong>no</strong> crescente interesse pelaculinária e gastro<strong>no</strong>mia, entre outros [2].Dessa forma, é difícil separar a alimentaçãoda afetividade, e tudo aquilo que se vive e que sesente pode interferir <strong>no</strong> comportamento alimentar.O alimento é cheio de simbolismos e envolvemuito mais do que comer: o alimento pode ser umrefúgio, uma carícia, um vício [3]. Alguns autoresacreditam que o corpo pode ser a expressão de umcaráter, revelado pela maneira pela qual o indivíduose alimenta. Nesse sentido, compreender ocomportamento alimentar torna-se essencial paraa apreensão da dinâmica pessoal do indivíduo [4].Transtor<strong>no</strong>s psiquiátricos e suarepercussão clínica-nutricionalA psiquiatria pode definir-se firmementecomo a especialidade que emprega as ferramentastradicionais da medicina (diagnóstico, tratamento,estabelecimento de prognóstico e medidas preventivas)para abordar manifestações mentais e padrõesde comportamento variantes em relação à experiênciahumana habitual [5]. No entanto, o diagnósticodos transtor<strong>no</strong>s psiquiátricos assume característicasparticulares em relação à grande maioria das especialidadesmédicas uma vez que a subjetividade e oNota do editorEm razão da importância e da extensão deste tema, o artigo foi dividido em duas partes. Nesta edição, ele prioriza a avaliação do paciente.Na próxima edição da <strong>Nestlé</strong>.Bio, ele discutirá, em detalhes, aspectos ligados à terapia nutricional.


dossiê bio 25estreitamento da aliança terapêutica são necessáriospara a correta elaboração diagnóstica. Ao contráriode outras especialidades em que o diagnóstico éelaborado a partir de achados laboratoriais e examesfísicos, os transtor<strong>no</strong>s psiquiátricos baseiam-se emcritérios diagnósticos clínicos, e requerem o reconhecimentode sinais e sintomas [6].Atualmente, dois sistemas permitem a universalizaçãodiagnóstica dos transtor<strong>no</strong>s psiquiátricos.Um deles é a Classificação Internacional de Doenças(CID-10), elaborada pela Organização Mundialda Saúde [7], que apresenta <strong>no</strong> seu quinto capítuloos transtor<strong>no</strong>s mentais e comportamentais. O segundosistema é o Diag<strong>no</strong>stic and Statistical Manualof Mental Disorders (DSM), elaborado pela AssociaçãoPsiquiátrica Americana [8], o mais utilizadopela comunidade científica internacional.A seguir, a fisiopatologia e aspectos clínicosde alguns transtor<strong>no</strong>s psiquiátricos que discutiremosneste artigo.Transtor<strong>no</strong>s Alimentares (TA)Os TAs têm etiologia multifatorial presumida,isto é, uma pluralidade de fatores interagem entresi de modo complexo para produzir e/ou perpetuara doença [9]. Esses fatores podem ser classificadoscomo predisponentes (p. ex.: traços de personalidade,risco para desenvolvimento de obesidade),precipitantes (p. ex.: dieta, proximidade da menarca,evento estressor que desorganiza a rotina) e osmantenedores (p. ex.: alterações fisiológicas e psicológicasproduzidas pela desnutrição e pelos constantesepisódios de compulsão, tais como diminuiçãoda cognição, insatisfação e/ou distorção da imagemcorporal e aumento da depressão determinam se otranstor<strong>no</strong> vai ser perpetuado ou não) [9,10].A a<strong>no</strong>rexia nervosa caracteriza-se por perda de peso intensa à custa dedietas restritivas na busca incansável pela magreza, distúrbios de imagemcorporal e irregularidades menstruais. Já a bulimia nervosa caracteriza-sepor grande e rápida ingestão de alimentos com sensação de perda de controle– episódios bulímicos –, acompanhados de métodos compensatórios inadequadospara controle de peso, como vômitos autoinduzidos, uso de medicamentos(laxantes, diuréticos, inibidores de apetite) e exercícios físicos.Nessas pacientes, a excessiva preocupação com o peso e a forma corporaisestá invariavelmente presente [11]. O transtor<strong>no</strong> da compulsão alimentarperiódica, comumente referido como um TA, encontra-se <strong>no</strong> apêndice doDSM-IV [8] e caracteriza-se por episódios compulsivos, mas sem medidascompensatórias restritivas e ou purgativas como na bulimia nervosa [12].Transtor<strong>no</strong>s de HumorOs principais transtor<strong>no</strong>s de humor são os transtor<strong>no</strong>s depressivos eaqueles do espectro bipolar, <strong>no</strong>s quais ocorrem episódios de mania (caracterizadospela euforia, verborragia, agitação psicomotora, ideias de grandezae fácil irritabilidade) ou hipomania (caracterizados pela presença de humorexpansivo, elevado ou irritável), comumente em alternância com umou mais episódios depressivos [5]. Tanto os sintomas de depressão comoos de mania devem ser diferenciados da tristeza e da alegria – respostashumanas <strong>no</strong>rmais a situações desagradáveis ou felizes da vida.Os transtor<strong>no</strong>s de humor estão associados a um alto custo pessoal,social e físico. Entre os custos físicos, podem-se encontrar as alteraçõesdo apetite [13]. Esses sintomas são tão importantes que a alteração dopeso – sem estar em dieta – de mais de 5% <strong>no</strong> mês é critério diagnósticopara a depressão [8]. Além da alteração <strong>no</strong> peso, a depressão ainda é associadaa problemas endocri<strong>no</strong>lógicos, tais como hipo e hipertireoidismo,hiperparatireoidismo, síndrome de Cushing, entre outros [14].


26 dossiê bioTranstor<strong>no</strong>s de ansiedadeO transtor<strong>no</strong> de ansiedade generalizada é caracterizadopor sintomas de ansiedade persistentesque afetam grande parte dos comportamentos doindivíduo. As manifestações podem variar, incluemsintomas de tensão motora, hiperatividade autonômicae sintomas de hipervigilância [5,15]. Nos pacientescom transtor<strong>no</strong>s de ansiedade, alteraçõesde apetite ou do padrão de consumo alimentar nãosão sintomas centrais para o diagnóstico, mas suapresença não é rara, trazendo grande prejuízo [15].É importante salientar que os estados de ansiedadeestão associados a alterações fisiológicasligadas à atividade de sistemas neurobiológicos dedefesa e resposta ao estresse, que podem repercutirtanto na imunidade como em funções metabólicascomo apetite e termogênese [16].Dependência químicaSubstâncias psicoativas são todas aquelas compropriedade de alterar o psiquismo. Uma amplavariedade dessas substâncias é passível de consumoabusivo, com desenvolvimento de tolerância eabstinência, dois critérios importantes para o diagnósticode dependência. As substâncias psicoativaspodem ser classificadas em depressoras do sistemanervoso central - SNC (álcool, benzodiazepínicos,barbitúricos, opioides, etc.), estimulantes do SNC(cocaína, anfetamina, crack, nicotina, etc.) e alucinógenas(maconha, ácido lisérgico, etc.), e seusefeitos adversos vão depender da droga consumida,da frequência e do tempo de utilização [17].O uso frequente de substâncias psicoativaspode comprometer o estado nutricional dos usuários,uma vez que repercute na ingestão de alimentose água, assim como <strong>no</strong> metabolismo, peso e comportamento alimentar.As deficiências nutricionais são comuns, <strong>no</strong>rmalmente causadas peloaumento das necessidades de nutrientes para desintoxicar ou metabolizara droga, pela inativação de vitaminas e coenzimas necessárias para a metabolizaçãode energia, pelos da<strong>no</strong>s <strong>no</strong> epitélio intestinal e fígado e peloaumento da perda de nutrientes com a diurese e diarreia decorrentes doconsumo de substâncias psicoativas [18].Transtor<strong>no</strong> Obsessivo-compulsivo (TOC)O Transtor<strong>no</strong> Obsessivo-compulsivo é caracterizado pela intrusão depensamentos súbitos e indesejados ou de imagens desprazerosas. Muitasvezes, essas obsessões são acompanhadas por profundo temor ou urgênciapara realizar determinadas compulsões para se aliviar. As compulsões sãoatos repetitivos e estereotipados que o indivíduo é compelido a realizarmesmo que tenha a percepção de que são excessivos [19].Alguns pensamentos obsessivo-compulsivos do indivíduo com TOCpodem ser direcionados para a alimentação, causando assim inadequações<strong>no</strong> consumo, padrão e comportamento alimentares, além de diversascrenças e tabus equivocados sobre a alimentação. Esses pacientes costumamtemer que as preparações tenham sido elaboradas por indivíduossem o conhecimento suficiente sobre a higiene e o cuidado com objetos ealimentos possivelmente “contaminados”, fazendo com que deixem de ir arestaurantes, festas e outros eventos que incluam refeições, o que muitasvezes causa brigas com familiares e isolamento social [20].Avaliação nutricionalA avaliação nutricional em psiquiatria envolve alguns desafios quemerecem especial atenção. Talvez o maior deles esteja relacionado ao fato


dossiê bio 27de que cada transtor<strong>no</strong> tem suas particularidades,que devem ser consideradas <strong>no</strong> momento da avaliação.De qualquer forma, independentemente doproblema psiquiátrico, a avaliação nutricional deveser detalhada e incluir os quatro grandes quesitos:anamnese, exame físico, exames bioquímicos e antropometria[21].Algumas particularidades na avaliação dopaciente psiquiátrico não podem ser esquecidas.Na anamnese, não podemos <strong>no</strong>s esquecer de que amaioria dos medicamentos utilizados <strong>no</strong> tratamentocostuma levar a um aumento de peso, que podeser um fator de risco para comorbidades clínicas,tais como hipertensão, diabetes mellitus tipo 2,dislipidemias, doenças cardiovasculares, entreoutras, além da diminuição da qualidade de vidae da autoestima [22,23]; Aronne, 2003). O medodo ganho de peso pode prejudicar a adesão e aumentaro risco de recaídas [23]. Dessa forma, avaliaro padrão alimentar, ou seja, a frequência dasrefeições, suas características, a presença ou nãode compulsões alimentares e jejuns prolongados,entre outros, é importante, mas o comportamentoalimentar é fundamental. Conhecer a relação coma comida pode trazer informações importantes sobreo paciente, uma vez que o ato de comer é umsintoma que condensa muito bem os afetos e suasrepresentações [1]. Algumas perguntas que nãopodem faltar na anamnese do paciente psiquiátricoestão destacadas na Figura 1.Em relação ao exame físico, é importante lembrarque alguns sinais são indicadores de sintomasimportantes, por exemplo, o sinal de Russel (calona mão), os dentes manchados e/ou corroídos, asparótidas aumentadas são característicos de quemFigura 1. Perguntas que não podem faltar na anamneseVocê percebeu alguma variação do peso e apetite nas últimas semanas?Você tem estado mais guloso, sempre procurando alimentos doces pela casa?Você se levanta <strong>no</strong> meio da <strong>no</strong>ite para comer?Você consegue identificar se come porque tem fome ou se é por outra motivação?Você se sente culpado depois de comer alguma coisa que gosta?Você divide os alimentos em bons-saudáveis e ruins?Alguma vez você comeu uma quantidade e<strong>no</strong>rme de comidada qual tem até vergonha de contar?Você faz alguma coisa para aliviar a culpa de ter comido tanto?Você costuma beber ou usar algum tipo de droga?Qual tipo e com que frequência?Quando usa alguma dessas substâncias, costuma ficar longos períodos sem comer?E, depois que o efeito delas passa, como se alimenta?Você já usou álcool-drogas propositalmente para não comer?Você está feliz com seu corpo?Já deixou de ir a lugares, ou vestir determinadas roupas porque está infeliz comsua forma física?Como você higieniza seus alimentos?Você tem receio de consumir alimentos preparados por outras pessoas?Na sua casa, costuma utilizar sempre os mesmos pratos e talheres?Você possui algum ritual alimentar?Você costuma ingerir substâncias incomuns?Sua alimentação muda antes e/ou durante a menstruação?Você faz atividade física? Quanto?


28 dossiê bioprovoca vômitos – comum em pacientes com bulimianervosa. Cortes e queimaduras de cigarro pelocorpo, falhas <strong>no</strong>s pelos e pequenas feridas na pelepodem indicar, respectivamente, automutilação, tricotilomania,e skin peacking, sintomas relacionadosaos transtor<strong>no</strong>s do impulso. Uma vez que a desnutriçãoé frequente <strong>no</strong>s pacientes psiquiátricos, seussinais físicos também devem ser observados [21].Apesar de os exames bioquímicos serem úteispara avaliar alguns da<strong>no</strong>s causados pela medicaçãopsicotrópica [22], eles podem detectar também adesnutrição causada por certas doenças como a<strong>no</strong>rexianervosa e dependência química, bem comoapontar consumo alimentar inadequado <strong>no</strong>s qua-dros de pica (ingestão persistente de substâncias não nutritivas) ou aindapurgações como uso de laxantes e vômitos na bulimia nervosa. É importantelembrar que carências nutricionais podem favorecer a manifestação de irregularidadesna saúde física, mas também na saúde mental, gerando, entreoutros sintomas, ansiedade, apreensão, irritabilidade, nervosismo excessivo,agitação, hiperatividade, humor lábil ou deprimido, tristeza, o que pode atépiorar o quadro psiquiátrico [24].Já a antropometria deve ser realizada de maneira delicada. Uma vez quea alteração do peso é critério diagnóstico para certas doenças como os transtor<strong>no</strong>sde humor e a preocupação com o corpo e peso são o core dos transtor<strong>no</strong>salimentares, esse momento pode causar muita angústia, ansiedade eexpectativa. Em alguns casos, deve-se pesar o paciente de costas (para quenão saiba seu peso) apesar deste comportamento estar sendo muito questionado<strong>no</strong>s trabalhos mais atuais [25].Referências Bibliográficas[1] <strong>Brasil</strong>ia<strong>no</strong> S, Bucaretchi HA, Kachani AT. 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30 qualidadePROBIÓTICOSPelo me<strong>no</strong>s estudos de quatro meta-análises avaliaram a eficácia dos probióticosna diarreia aguda, especialmente infantil [4-7]. Em síntese, os resultados apontam umaredução de 24 horas na duração da diarreia, em particular aquela causada por rotavírus.Em uma recente revisão Cochrane (63 estudos, totalizando 8.014 pacientes), o uso deprobióticos diminuiu o risco de duração da diarreia por quatro ou mais dias em 59% [8].Três mecanismos principais justificam o uso de probióticos na diarreia aguda [2]:1. ANTAGONISMO DIRETO: micro-organismos probióticos secretam moléculas epeptídeos bioativos, que exercem ação antimicrobiana, e bacteriocinas, que protegemo organismo de translocação bacteriana e disseminação sistêmica da infecção. Dig<strong>no</strong>sde <strong>no</strong>ta, os probióticos podem antagonizar ou interferir na produção de toxinas.2. EXCLUSÃO: os probióticos podem criar um ambiente hostil para agentes patogênicosao promoverem aumento de bactérias simbiontes, redução do pH colônico,incremento da barreira intestinal, interferência na ligação entre o patóge<strong>no</strong> e a célulaepitelial, competição por consumo de nutrientes e estimulação de fatores de proteçãocomo IgA secretora, mucina, defensinas e Hsp 27.Os probióticos podem ainda (i) aumentar a atividade de enzimas da borda emescova, (ii) sintetizar niacina, ácido pantotênico, biotina, ácido fólico e vitaminas C,K e B12 e (iii) interagir com o sistema nervoso entérico, atenuando a diarreia secretora,a hipercontratilidade e a sensibilidade visceral.IMUNOMODULAÇÃO: probióticos podem exercer efeitos imu<strong>no</strong>moduladores aoparticiparem na rede de interações entre ligantes microbia<strong>no</strong>s de<strong>no</strong>minados MAMPs(microbial-associated molecular patterns) e receptores transmembrana presentesem células imu<strong>no</strong>lógicas como macrófagos, células dendríticas e células epiteliaisde<strong>no</strong>minados TLRs (toll-like receptors). Probióticos podem também reduzir citocinaspró-inflamatórias como fator TNF-α e induzir citocinas anti-inflamatórias como IL-10.LACTOBACILLUS REUTERIPara alcançarem o status de probiótico os micro-organismos devem preencheruma série de pré-requisitos associados à sua segurança e efetividade.No caso do Lactobacillus reuteri, cepa ATCC 55730, confirmou-se que é de origemhumana e seguro. De fato, mais de 1 bilhão de doses diárias de 1x10 8 UFC de L. reuteriforam consumidas <strong>no</strong>s últimos dez a<strong>no</strong>s, inclusive por prematuros, neonatos e lactentes,sem relatos de efeitos adversos [16]. Verificou-se, ainda, que o L. reuteri é resistenteao ácido e à bile, adere ao epitélio intestinal e coloniza com eficiência o TGI [17].Além disso, observou-se que o L. reuteri produz reuterina, substância com vigorosaação antimicrobiana, que age contra E. coli, Salmonella, Shigella, Proteus, Pseudomonas,Clostridium, Staphylococcus e H. pylori, entre outros patóge<strong>no</strong>s.Na dose de 10 7 CFU, L. reuteri foi capaz de reduzirem 50% a frequência de diarreia <strong>no</strong> 2º dia de tratamento,com melhores índices à medida que a concentraçãofoi aumentada [18].Estudos adicionais apontam, ainda, um <strong>impacto</strong>positivo do L. reuteri cepa ATCC 55730 (10 7 CFU) naredução da atividade de urease nas fezes de criançascom diarreia, sobretudo aquelas causadas por Rotavírus[18, 19].Weizman et al., por sua vez, avaliaram os efeitospreventivos do consumo de probióticos em um estudorandomizado, duplo-cego e placebo-controlado.Ao todo, 201 crianças entre 4 e 10 meses de idade foramrecrutadas em 14 creches em Israel [20].No fim de 12 semanas, os dois grupos que receberamprobióticos (B. lactis e L. reuteri) apresentaramme<strong>no</strong>s episódios de febre e de diarreia e me<strong>no</strong>s diascom diarreia. Entretanto, o grupo L. reuteri apresentoume<strong>no</strong>s dias com febre, me<strong>no</strong>r número de consultas médicas,me<strong>no</strong>s faltas na creche e me<strong>no</strong>s prescrição deantibióticos do que os grupos controle e B. lactis.Digna de <strong>no</strong>ta, ainda, a associação do L. reutericom a inulina foi recomendada por Stewart e cols. porser a combinação que demonstrou melhor perfil de curvade fermentação, sem “picos” de fermentação, o queimplica me<strong>no</strong>r produção de gases e me<strong>no</strong>s desconfortoabdominal [21].FIBRAS SOLÚVEIS E PREBIÓTICOSÁcidos graxos de cadeia curta (AGCC) como o butirato,produzidos a partir da fermentação de fibras solúveise prebióticos <strong>no</strong> cólon, são capazes de estimulara diferenciação da célula epitelial, contribuir para manutençãoda integridade da mucosa e para aumentara proteção contra bactérias patogênicas [24, 25, 26].Entre as fibras solúveis, a goma guar parcialmentehidrolisada (GGPH) tem sido particularmenteempregada <strong>no</strong> tratamento da diarreia. Em crianças de


qualidade 314-18 meses de idade, quando adicionada à solução de hidratação oral, foi associadaa uma significativa redução <strong>no</strong> tempo de duração da diarreia e redução <strong>no</strong> volumediário de perda fecal. O mesmo benefício foi observado em crianças entre 5 e 24meses de idade com diarreia persistente [9]. Estudos clínicos (como doses entre25 g/l ou 50 g/l) e experimentais com cólera apontam ainda uma ação benéfica <strong>no</strong>que diz respeito à redução do peso fecal [10,11].A ação da GGPH é explicada principalmente por geração de AGCC, maior absorçãoepitelial de sódio e água, inibição da secreção colônica de cloreto mediada porAMP-cíclico e lentificação <strong>no</strong> tempo de trânsito colônico [11,12].Por sua vez, prebióticos como a inulina favorecem o crescimento de Bifidobacteriume Lactobacillus e a redução de patobiontes. Seu emprego também foi associadoa um aumento de IgA secretora fecal [13].É interessante <strong>no</strong>tar que a associação de inulina com um probiótico configurauma interessante abordagem na prevenção e <strong>no</strong> tratamento da diarreia infantil.Trabalhos recentes com o uso de simbióticos versus controle destacam significativaredução na duração da doença em crianças entre 1-3 a<strong>no</strong>s [14] e entre 3 e 12 mesesde idade [15].simbióticosRecentemente, o uso combinado de prebióticos e probióticos (simbióticos)tem sido observado com resultados animadores. Seu emprego para restauração daMI e para a prevenção de infecção em grupos de pacientes internados em unidadesde terapia intensiva constitui um relevante exemplo disso; sobretudo quando os resultadosmostram-se mais promissores do que aquelesobtidos pelo emprego de prebióticos e probióticosisoladamente (22, 23).Diante da importante morbimortalidade da diarreiaaguda, a <strong>Nestlé</strong> desenvolveu FiberMais Flora: uma i<strong>no</strong>vadoracombinação de probiótico com fibras solúveis comoaliado <strong>no</strong> combate da diarreia por meio da regeneraçãoda MI e regulação da atividade intestinal. Para isso, suacomposição reflete parte substancial do conhecimentomais recente adquirido nesta área: 1x10 8 UFC de Lactobacillusreuteri, 60% de GGPH e 40% de inulina.Acesse mais informações sobre as propriedades doFiberMais Flora.www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspxreferências[1] Sarker AS, Fuchs GJ. 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nutrição e culturapor_Julia AlquérescozinhaPétalas naO encontro poético de Adélia Prado e Cora Coralinaentre aromas e paladares de Minas e GoiásDescascar laranjas-da-terra e cortar cada uma em quatro pétalas, sem que aspartes se separem. Depois, retirar cuidadosamente o bagaço, lavar bem e ferver pordez minutos. Deixá-las de molho, recebendo água da biquinha debaixo da casa por doisou três dias, até eliminar o amargor. Preparar uma calda e espargir cravos-da-índia juntamentecom as pétalas, sem que se quebrem. Cozinhar até que elas fiquem macias,e deixá-las dormir em calda. No dia seguinte, retirá-las uma a uma com escumadeira ecolocá-las sobre uma peneira de taquara para que escorram da calda. Estendê-las emtabuleiros, juntando as pétalas duas a duas e deixando-as ao sol para secar.Uma receita com sabor de poesia. Que termina quando se deita o doce de laranja prontosobre um papel de seda, <strong>no</strong> abrigo de uma caixa segura e adornada por um laço de fita.Como quem brinca de despetalar flores e encontra bem-quereres, Cora Coralina,já idosa, fazia doces para vender em Goiás, sua terra natal, para onde voltou em 1956,após ter vivido por 45 a<strong>no</strong>s entre cidades do interior de São Paulo e a capital.Poesia ela fez durante a vida toda, não só com palavras, mas com alimentos. Escrevendosobre a infância de um tempo em que o cozinhar – a comida doce ou a salgada– era o que despertava aquele sentimento delicioso que costumam chamar de felicidade.


nutrição e cultura 33Sobre esse mesmo tempo e também sobre laranjas escreveua poetisa Adélia Prado, que nasceu em 1935, na cidade deDivinópolis, interior de Minas Gerais, onde ainda vive.Na minha cidade, <strong>no</strong>s domingos de tarde,as pessoas se põem na sombra com faca e laranjas.Tomam a fresca e riem do rapaz de bicicleta,A campainha desatada, o aro enfeitado de laranjas:‘Eh bobagem!’ (...)Em cidadezinhas interioranas, domingo não era apenasdia de missa, mas de gula. As pessoas permitiam-se oritual de descascar laranja e saboreá-la vendo a vida passarpelo aro das bicicletas. De perder-se <strong>no</strong>s gomos da frutae esquecer que o tempo, como eles, é efêmero. E rumoao poente, fim do poema Para comer depois:(...) Daqui a muito progresso tec<strong>no</strong>-ilógico,quando for impossível detectar o domingopelo sumo das laranjas <strong>no</strong> ar e bicicletas,em meu país de memória e sentimento,basta fechar os olhos:é domingo, é domingo, é domingo.


34 nutrição e culturaTal qual a vizinha, Adélia Prado rememora a mãe <strong>no</strong> fogãoatiçando as brasas para a família e o contentamento dafilha ao comer:Contra os malquereres da passagem do tempo, escreverame cozinharam Cora Coralina e Adélia Prado. A infância nacozinha é a primeira lembrança das duas. No poema O PratoAzul-Pombinho, Coralina conta sobre um prato herdado pelabisavó e estimado por todos:(...) Pesado. Com duas asas por onde segurar.Prato de bom-bocado e de mães-bentas.De fios de ovos.De receita dobrada de grandes pudins,recendendo a cravo,nadando em calda (...).(...) uma vez banqueteando-se, comeu feijão com arrozmais um facho de luz.Com toda fome.Também a mãe alegrava-se na cozinha. Nos poemas damineira, as mulheres não se sentem inferiores aos homens etampouco são assim tratadas. Não há submissão, e trabalharna cozinha é tão valoroso quanto trabalhar fora de casa. EmSolar, Adélia Prado conta:Minha mãe cozinhava exatamente:arroz, feijão-roxinho, molho de batatinhas.Mas cantava.Açúcar, coco, queijo, ovo, leite, farinha de trigo, fermentoem pó, ingredientes simples deixavam farta a mesa da famíliae os doces enlouqueciam a meninada, que, em dia de festa,traquinava comendo com as mãos e provando as raspas dotacho em grandes dedadas.Não é qualquer feijão, mas o roxinho; nem qualquer molho,mas o de batatinhas. Apesar da falta de carne, característicada região, a refeição é imaginada e preparada delicadamentepela mãe, que pensa <strong>no</strong>s sabores e nas cores do prato,canta e faz da casa um verdadeiro solar: castelo e luz.


nutrição e cultura 35Para Adélia, assim como para a menina do poema Ensinamento,a cozinha foi um espaço para aprender sobre as relaçõeshumanas para, mais tarde, apreender a vida:Minha mãe achava estudoa coisa mais fina do mundo.Não é.A coisa mais fina do mundo é o sentimento.Aquele dia de <strong>no</strong>ite, o pai fazendo serão,ela falou comigo:“Coitado, até essa hora <strong>no</strong> serviço pesado”.Arrumou pão e café, deixou tacho <strong>no</strong> fogo com água quente.Não me falou em amor.Essa palavra de luxo.A doceira e poetisa, que sofreu com a escassez de comida,dizia que um dia queria dar um tacho seu para cada filhoe cada neto, como legado de seu trabalho. Em tempos depobreza, a família da doceira regulava a comida e as criançasmuitas vezes fugiam do regulamento comendo laranjase bananas escondido. Depois se ajoelhavam <strong>no</strong> oratório epediam que não morressem por terem conquistado uma felicidadeclandestina.Privação também passava Cora Coralina quando podiacomer apenas uma fatia do bolo assado na panela, caso contrárioa irmã mais velha ralhava com ela. O doce tinha de ficarguardado para as visitas:(...) Era só olhos e boca e desejodaquele bolo inteiro.Minha irmã mais velhagovernava. Regrava.Me dava uma fatia,tão fina, tão delgada...E fatias iguais às outras manas.E que ninguém pedisse mais! (...)Meios para burlar as regras dessa vez não existiam,já que o bolo ficava guardado em um armário alto e fechado.Restava a fantasia:O gesto de cuidar da refeição do marido trabalhador comafinco denuncia aquele sentimento, sem que fosse preciso<strong>no</strong>meá-lo. Deixando as definições de amor para a vida adulta.Depois de perder muito cedo a mãe e a<strong>no</strong>s mais tarde opai, a filósofa, professora e poeta Adélia Prado, já casada e mãede cinco filhos, descobriria o amor como palavra de luxo.Sentimento forte tinha Cora Coralina não só pelas pessoas,mas por seus tachos, antigos vasos largos de barro oude ferro que substituíam as panelas. Coralina sempre compravaquando alguém oferecia, usava-os muito e, quando osséculos de uso os comprometiam, ela levava os tachos aosciga<strong>no</strong>s mestres na solda, que os consertavam.(...) E sonhava com o imenso armáriocheio de grandes bolosao meu alcance. (...)


36 nutrição e culturaAdélia parece lembrar-se bem dos ensinamentos damãe, e aquela palavra de luxo talvez seja mais bem compreendidapor ela agora:Sorte da menina do poema A Boca, de Adélia Prado, quepodia se esbaldar com feijão e arroz do prato dos pais, quese privaram “da metade do prato para me engordar”. É certoque na infância à mesa as crianças Cora e Adélia aprenderama felicidade, talvez sem <strong>no</strong>meá-la, mas já entendendo quetambém ela, como o amor, é palavra de luxo. É este mesmosentimento que as duas poetisas procuram ter não apenasmemorando a infância, mas vivendo.Depois da morte do marido, Cora Coralina passou por dificuldadesfinanceiras e teve de trabalhar muito para manter osfilhos até decidir voltar para sua terra e estabelecer-se comodoceira. Conseguiu. Sem jamais se sujar. Dizia ela que uma boadoceira só deveria lambrecar dois dedos, o indicador e o polegar,de uma mão. No poema Estas Mãos, Coralina conta:(...) Minhas mãos doceiras...Jamais ociosas.Fecundas, imensas e ocupadas.Mãos laboriosas.Abertas sempre para dar, ajudar,unir e abençoar. (...)Também as mãos de Adélia, em poesia e em vida, não permitemque o tempo escape:Há mulheres que dizem:Meu marido, se quiser pescar, pesque,mas que limpe os peixes.Eu não. A qualquer hora da <strong>no</strong>ite me levanto,ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.(...)(...) É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,de vez em quando os cotovelos se esbarram,ele fala coisas como ‘este foi difícil’‘prateou <strong>no</strong> ar dando rabanadas’e faz o gesto com a mãoO silêncio de quando <strong>no</strong>s vimos a primeira vezatravessa a cozinha como um rio profundo.Por fim, os peixes na travessa,vamos dormir.Coisas prateadas espocam:somos <strong>no</strong>ivo e <strong>no</strong>iva.O amor e a limpeza dos peixes misturam-se <strong>no</strong> poemaCasamento, e o sentimento é mesmo a coisa mais fina domundo, <strong>no</strong>s sussurra Adélia.Coralina, que viveu 96 a<strong>no</strong>s, costumava dizer que eramais doceira que poeta e escreveu que morreria tranquilamentedentro de um campo de trigo ou milharal. Adélia Pradopede a Deus, em poesia, para trabalhar na cozinha, porqueestá cansada de ser poeta. Talvez seja mais doloroso tratardo tempo em poesia — há os malquereres todos — do queentregar-se aos prazeres da cozinha e sentir a felicidade.Eterna, por enquanto, apenas a biquinha da Casa da VelhaPonte, por onde há séculos escorre a água pura, usada porCora Coralina para tirar o amargor da laranja-da-terra. Efêmera,a felicidade é como o tempo e os gomos de laranja. E tem aespessura de uma pétala de flor, de bem-querer.Leia na íntegra alguns dos mais belos poemas de Cora Coralina eAdélia Prado. E confira os livros de ambas em <strong>no</strong>vas edições.www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspx


focoIogurtepara uma vida longa e saudávelpor_Maria Fernanda Elias Lla<strong>no</strong>sCom os avanços da ciência e da tec<strong>no</strong>logia de alimentos,o que era muito bom ficou ainda melhorConquistar a Mongólia e vencer a Grande Muralha da China foram grandes êxitos de Gengis Khan, um dos comandantesmilitares mais bem-sucedidos da história da humanidade. Considerado herói máximo e pai da naçãoMongol, Gengis Khan atribuía parte de suas glórias ao fato de que seus soldados permaneciam fortes e saudáveis aoconsumirem um alimento muito nutritivo chamado airag. Era mandatório que todo o seu exército, dos grandes generaisaos mais baixos escalões, bebesse o poderoso elixir. Segundo dados históricos, o próprio comandante adorava osabor desse alimento, que era preparado à base de leite acidificado e fermentado [1].Existem muitos registros e lendas que permeiama origem e a história do iogurte. As maiores evidênciassugerem que o preparado nasceu por acidente, ao redorde 5.000 a<strong>no</strong>s a.C. Naquela época, os povos daMesopotâmia carregavam o leite da ordenha embolsas produzidas com o estômago de animais.As condições precárias de armazenamento,aliadas às altas temperaturas, permitiamque colônias de bactérias presentes <strong>no</strong> leite,em contato com a renina – enzima naturalmentepresente <strong>no</strong> estômago de alguns animais–, iniciassem o processo de fermentação,transformando o líquido, em poucas horas,em queijo ou iogurte. Não demorou muito paraque <strong>no</strong>tassem a maior vida útil desses alimentosem relação ao leite [1,2].


38 focoO que realmentedesperta ointeresse dospesquisadores sãoas característicasfuncionais doiogurte expressaspor uma série decomponentesO iogurte também tem suas raízesassociadas com os nômades dasmontanhas caucasianas da Rússia,onde é conhecido como kefir: “bomsentimento” ou “sentir-se bem”. Consideradoum presente dos deuses,alcançou tal reputação por restabelecera saúde de pessoas enfermas.Por isso, a colônia de bactérias utilizadapara o seu preparo era guardadaa sete chaves pela família real.Diz a lenda que essa situação perdurouaté que uma linda dama, depoisde seduzir o príncipe, tomou posse deuma colônia e a entregou à SociedadeMédica Russa. A jovem anônima teriasido a responsável pela disseminaçãoe popularidade do kefir pelo império e,consequentemente, pelo mundo [1].Entretanto, foi apenas <strong>no</strong> início do século 20 que o iogurteganharia, de fato, atenção mundial. Mais especificamente quandoo Prêmio Nobel de Medicina, Ilya Metchnikov, propôs que a suaingestão em grandes quantidades poderia explicar a longevidadeincomum dos búlgaros [1,3].Em 1905, o médico e microbiologista búlgaro Stamen Grigorovdescobriu que uma cepa específica de bacilos era responsávelpela formação do iogurte natural. Como reconhecimento, a comunidadecientífica batizou os micro-organismos com o <strong>no</strong>me deLactobacillus bulgaricus, atualmente de<strong>no</strong>minados Lactobacillusdelbrueckii subspecies bulgaricus [1].Das farmácias para o mercadoPor algum tempo, o iogurte foi considerado um medicamentoe era vendido apenas em farmácias. Com o passar dos a<strong>no</strong>s,seu consumo se generalizou graças ao desenvolvimento industrial,tec<strong>no</strong>lógico e, sobretudo, científico [2].O Codex Alimentarius define iogurte como “leite coagulado obtidopor fermentação lática devido à ação das bactérias Lactoctobacillusdelbrueckii substp. bulgaricus e Streptococcus thermophilussobre o leite pasteurizado e concentrado, com ou sem adição de leiteem pó”. Em diversos países, assim como <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>, outras culturasde bactérias podem ser adicionadas às culturas de base [4].Uma diversidade de estudos reconhece as múltiplas virtudesnutricionais do iogurte e a presença de fatores multidimensionaisimplicados em promoção da saúde humana. Seu perfilde nutrientes está diretamente relacionado com a composiçãonutricional do leite que o origi<strong>no</strong>u, assim como as espécies debactérias utilizadas em sua fermentação [5].Os derivados lácteos constituem importante fonte de cálcio,fósforo, proteínas de alto valor biológico e vitaminas A, D e B2. O GuiaAlimentar para a População <strong>Brasil</strong>eira recomenda a ingestão diária detrês porções de alimentos desse grupo, sendo que crianças, adolescentese gestantes saudáveis devem preferir a versão integral [5].De modo geral, os iogurtes costumam ser mais bem-aceitosdo que o leite por indivíduos que apresentam intolerância à lactose.A explicação se dá tanto pela me<strong>no</strong>r concentração de lactosecomo pela presença de lactase — que promove a lise de lactose emmo<strong>no</strong>ssacarídeos —, produzida por bactérias como as própriasL. delbrueckii substp. bulgaricus e S. thermophilus [6,7,8].Mas o que realmente desperta o interesse dos pesquisadoressão as características funcionais do iogurte expressaspor uma série de componentes como o ácido li<strong>no</strong>leico conjugado(ALC), esfíngolipídeos, ácido butírico, peptídeos bioativos ebactérias probióticas [9, 10].Propriedades funcionaisA composição lipídica dos produtos fermentados apresentateor aumentado de ALC quando comparada ao leite que origi<strong>no</strong>u oseu processamento. Foi demonstrado que o aumento do consumode gorduras lácteas está associado com a elevação das concentraçõesde ALC <strong>no</strong> tecido adiposo e <strong>no</strong> leite huma<strong>no</strong> [11]. Evidênciascientíficas sugerem que o ALC apresenta ação imu<strong>no</strong>estimulantee anticarci<strong>no</strong>gênica. Um estudo publicado <strong>no</strong> Journal of Nutritionconcluiu que a propriedade anticarci<strong>no</strong>gênica pode estar relacionadacom a habilidade de alguns isômeros do ALC de inibir a expressãodas ciclinas e, consequentemente, impedir o progressodo ciclo celular da fase G1 para a S [12]. Outro estudo publicado<strong>no</strong> mesmo periódico demonstrou que o tratamento das células do


foco 39A propriedadeanticarci<strong>no</strong>gênicapode estarrelacionada coma habilidade dealguns isômerosdo ALC de inibira expressãodas ciclinascâncer de cólon huma<strong>no</strong> com isômerosintético (10t,12c) aumentou substancialmentea expressão proteica e o acúmulode RNA mensageiro do CDK inibidorp21 (CIP1/WAF1) e diminuiu a fosforilaçãoda proteína reti<strong>no</strong>blastoma, fatoresque provocaram a parada do ciclo celularna fase G1. Não houve mudanças <strong>no</strong>comportamento da ciclina A, ciclina D,ciclina E e das CDK2 e CDK4, ciclinas dependentesda kinase 2 e 4 [13]Estudos em ratos sugerem que os esfingolipídios do iogurte— uma classe de lipídeos envolvida nas sinapses — podemexercer ação protetora contra o câncer de cólon ao reduzir o potencialmetastático e o crescimento de linhagens de células cancerosas[10].Já a presença do ácido butírico <strong>no</strong>s alimentos lácteos parecereforçar o efeito protetor contra o câncer de cólon. Estudos in vitroindicaram inibição da proliferação celular e indução da apoptose.O ácido está associado com a inativação da expressão da oncogênese,a inibição da ação invasiva da doença e da metástase.Os resultados de estudos em animais fortalecem o possível efeitoprotetor do ácido butírico contra o câncer de cólon [14,15].Os peptídeos funcionais do iogurte são produzidos pela fermentaçãoda caseína e outras frações proteicas do leite. Essescompostos são resistentes a hidrolise e produzem efeito fisiológicolocal, <strong>no</strong> trato gastrintestinal, ou sistêmico, após absorção.As classes mais estudadas são as que apresentam ação opioide,antiopioide, carreadora de minerais, imu<strong>no</strong>estimulante, anti-hipertensivae antitrombótica (Figura 1). Os estudos clínicos, contudo,são raros e o maior conhecimento sobre os efeitos biológicos dessespeptídeos vem de pesquisas in vitro e com animais [9,16,17].Um veículo para probióticosCulturas de bactérias associadas com a produção do iogurtesão, sem dúvida, objetos do maior número de pesquisase publicações. Para efeito de estudo, consideram-se tanto asespécies envolvidas <strong>no</strong> processo de fermentação como aquelasacrescentadas como probióticos [10].O termo probiótico significa “pró-vida” e foi originalmentecunhado para descrever “organismos vivos que, quando ingeridosem quantidade determinada, exercem efeito benéfico <strong>no</strong>balanço da microbiota intestinal do hospedeiro”. Atualmente, adefinição aceita é “suplemento alimentar microbia<strong>no</strong> vivo queafeta de forma benéfica seu receptor através da melhoria dobalanço microbia<strong>no</strong> intestinal” [10, 18].Uma série de benefícios para a saúde tem sido atribuídaa eles, sobretudo <strong>no</strong> que diz respeito à manutenção da saúdee ao tratamento adjuvante de doenças que afetam o trato gastrintestinal(Tabela 2) [19].Peptídeo Bioativo Proteína Precursora BioatividadeCasomorfinas a, b-caseína OpioideCasoquininas a, b-caseína Anti-hipertensivoCasoxinas k-caseína Opioide - antagonistaCasoplatelinas k-caseína AntitrombóticoImu<strong>no</strong>peptidases a, b-caseína Imu<strong>no</strong>estimulanteCasei<strong>no</strong>fosfopeptídeos a, b-caseína Carreador de mineraisUm número progressivamente maior de estudos aponta, ainda,uma possível relação entre o uso de probióticos e a redução dosníveis de triglicérides e de colesterol, ação anticancerígena, melhorada condição imu<strong>no</strong>lógica <strong>no</strong> idoso, prevenção de infecções urogenitaise prevenção e tratamento de eczema atópico [20].Indicações de probióticos em gastroenterologiaIntolerância à lactoseConstipação intestinalPrevenção e tratamento da diarreia agudaPrevenção da diarreia pós-antibióticoPrevenção da diarreia do viajantePrevenção da osteoporose pelo aumento da absorção colônica de cálcioDoenças inflamatórias intestinais (Crohn, Retocolite ulcerativa)Prevenção de infecções gastrintestinais (e respiratórias) em creches


40 foco<strong>Nestlé</strong> Research CenterO <strong>Nestlé</strong> Research Center (NRC), ou Centro de Pesquisas<strong>Nestlé</strong>, foi um dos pioneiros a estudarem a interação moleculardas bactérias probióticas com as células intestinais. Em um estudocolaborativo, pesquisadores do NRC observaram que as bactériasda microbiota intestinal materna são transferidas, via amamentação,para o intesti<strong>no</strong> do bebê. E esta microbiota transportadaauxilia a colonização do intesti<strong>no</strong> da criança e contribui para o desenvolvimentodo sistema imune [19].Os cientistas do NRC examinaram também os efeitos de determinadasespécies de probióticos na incidência e severidade dediarreia em crianças e adultos. Os estudos demonstraram que oLactobacillus GG antagoniza a diarreia por rotavírus, mas foi ineficazcontra diarreia bacteriana. Por outro lado, em um estudo randomizado,duplo-cego, demonstrou-se que o Lactobacillus paracaseiST11 apresentou benefício clínico significativo <strong>no</strong> gerenciamentoda diarreia bacteriana, mas foi ineficiente contra a diarreia por rotavírus.Concluiu-se que os probióticos podem ser consideradosuma intervenção útil na redução da incidência e severidade dediarreia viral e bacteriana [19].A segurança, a eficácia e a estabilidade das espécies de bactériastêm sido amplamente investigadas por cientistas da <strong>Nestlé</strong>em pesquisas pré-clínicas e clínicas. Cada probiótico potencial écuidadosamente avaliado por meio de tec<strong>no</strong>logia molecular deponta e sequenciamento de ge<strong>no</strong>ma. Como resultado, consegue-seobter uma melhor caracterização das espécies de bactérias, assimcomo seus mecanismos de ação [19].O Lactobacillus johnsonii La1, por exemplo, já teve suascaracterísticas probióticas amplamente estudadas, dentre elas:(a) não ser patogênico; (b) ser resistente ao ácido e à bile; (c)aderir ao epitélio intestinal promovendo maior interação com o sistemaimu<strong>no</strong>lógico; (d) colonizar o trato gastrintestinal; (e) exerceratividade antimicrobiana [21, 22].Com o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre sua fisiologiae identificar os genes potencialmente envolvidos em interaçõescom o hospedeiro, pesquisadores do NRC sequenciaram eanalisaram o ge<strong>no</strong>ma do L. johnsonii (La1). A conclusão do trabalhofoi um marco <strong>no</strong> entendimento dos mecanismos de ação do probiótico<strong>no</strong> nível molecular e culmina com o lançamento de produtos dequalidade e benefícios comprovados pela ciência [19, 21,22].Conheça o 67º Workshop do <strong>Nestlé</strong> Nutrition Institute, realizado <strong>no</strong>Marrocos entre 16-20 de março de 2010, sobre o tema Leite e seusderivados na nutrição humana.www.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspxreferências[1] Clark S, Costello M, Drake M, Bodyfelt F. The Sensory Evaluation of Dairy Products. Springer, 2nd edition, 2009. [2] Coyle LP. The World Encyclopedia of Food. Facts On File Inc.,1982 [3] The Official Website of The Nobel Prize. Disponível em: http://<strong>no</strong>belprize.org/<strong>no</strong>bel_prizes/medicine/laureates/1908/ [01 mar 2011]. [4] Chandan RC. Manufacturing yogurtand fermented milks. Wiley-Blackwell, 2006. [5] Philippi ST. Pirâmide dos alimentos. 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[17] Meisel H. Multifunctional peptides encrypted in milk proteins. Biofactors. 2004, 21(1-4):55-61. [18] <strong>Nestlé</strong> Research Center. Protection: Focus onProbiotics. Science in Action. [19] Damião AOMC. Prebióticos, probióticos e simbióticos: aplicações clínicas. Revista <strong>Nestlé</strong>.Bio, a<strong>no</strong> 1, <strong>no</strong>.1. [20] Dobrogosz WJ, Peacock TJ, Hassan HM.Evolution of the probiotic concept from conception to validation and acceptance in medical science. Adv Appl Microbiol. 2010;72:1-41. [21] Pridmore RD, Berger B, Desiere F et al. Thege<strong>no</strong>me sequence of the probiotic intestinal bacterium Lactobacillus johnsonii NCC 533. PNAS. 2004, vol. 101 <strong>no</strong>. 8; 2512–2517. [22] Neeser J, Granato D, Rouvet M et al. Lactobacillusjohnsonii La1 shares carbohydrate-binding specificities with several enteropathogenic bacteria. Glycobiology. 2000, vol.10, <strong>no</strong>. 11; 1193-1199.


Ao patrocinar e divulgar encontros científicos na área de Nutrição, a <strong>Nestlé</strong> esperacontribuir para que os profissionais de saúde possam debater e compartilhar suasexperiências a partir da produção acadêmica mais recente. Confira alguns dos principaiseventos focados em nutrição e saúde que vão ocorrer entre junho e setembro de 2011.jun.XI Jornada de Nutriçãode Botucatu (JONUB) >> 2 a 4A Universidade Estadual Paulista “Júliode Mesquita Filho” (UNESP) promovepalestras, minicursos e atividades culturaiscomplementares à nutrição. O evento ocorrena Faculdade de Medicina de Botucatu(FMB) e <strong>no</strong> Instituto de Biociências (IBB).Para a programação e a inscrição, acesse:www.ibb.unesp.br/eventos/jonub/index.phpIV Congresso <strong>Brasil</strong>eiro de NutriçãoIntegrada e GANEPÃO >> 15 a 18Simultaneamente, ocorrem o XXXIV CursoInternacional de Nutrição Parenteral e Enteral eo XIII Fórum Paulista de Pesquisa em NutriçãoClínica e Experimental. O tradicional encontrotem sede <strong>no</strong> Centro Fecomercio de Eventos,em São Paulo, e apresenta como tema central:Caminhando para o Equilíbrio Nutricionalhttp://ganep.com.br/ganepao/calendário11° Congresso Nacional da Sociedade <strong>Brasil</strong>eirade Alimentação e Nutrição >> 20 a 23Nutrição Baseada em Evidência será o temadessa <strong>no</strong>va edição do congresso. O assuntoserá discutido por meio de debates, colóquiose votação eletrônica. A Praia de Iracema, emFortaleza (CE), foi escolhida para abrigar oevento. As <strong>no</strong>rmas para envio de trabalhos eoutras informações podem ser obtidas emwww.sban.org.br/congresso2011/home.aspjul.XVI Congresso <strong>Brasil</strong>eiro Multidisciplinar em Diabetes >> 29 a 31Promovido pela Associação Nacional de Assistência ao Diabético(ANAD), o evento aborda todos os aspectos do diabetes. Aprogramação deste a<strong>no</strong> inclui 46 simpósios e, aproximadamente,200 palestras. Realiza-se em São Paulo, na Universidade Paulista(UNIP). www.anad.org.br/congresso/16_Congresso_Site/ago.V Jornada de Atualização em Nutrição Pediátrica >> 25 a 27Concomitantemente ao encontro, ocorre o III Simpósio Internacional deAlergia Alimentar. Realiza-se em São Paulo, <strong>no</strong> Centro de Convenções do HotelMatsubara. Informações sobre o envio de trabalhos e palestrantes confirmadospodem ser obtidas <strong>no</strong> site do Grupo de Apoio a Portadores de NecessidadesNutricionais Especiais (Instituto Girassol): www.girassolinstituto.org.brset.33rd ESPEN Congress >> 3 a 6Nutrition in translation – bridging science andpractice é o tema que a European Society forClinical Nutrition escolheu para o evento deste a<strong>no</strong>.O cenário das palestras e cursos será a cidade deGotemburgo, na Suécia, considerada modelo dequalidade de vida. Para mais detalhes, visite:www.espen.org/congress/gothenburg2011/default.htmlEncontro de Atualização emPediatria >> 16 e 17A Sociedade <strong>Brasil</strong>eira de Pediatria promove oevento, que será realizado em Campos do Jordão(SP), <strong>no</strong> Orotour Garden Hotel. Informaçõessobre a programação científica e inscriçõesserão adicionadas em breve <strong>no</strong> endereço:www.spsp.org.br/spsp_2008/agenda.asp?id=631XV Congresso <strong>Brasil</strong>eiro deNutrologia >> 21 a 23A cidade de São Paulo será a sede doencontro anual organizado pela Associação<strong>Brasil</strong>eira de Nutrologia (ABRAN). O tema doevento, a grade de programação e os prazospara envio de trabalhos serão divulgados <strong>no</strong>site da associação: www.abran.org.br


esultadopor_Alfaro Dantascolaboração_Teodoro HolckNo lugar de bater palmas, pais e filhos acompanhamo ritmo da música batendo colheres de pau. E cantam, respondendoà pergunta com estrofes nutritivas: “Será que temespinafre? Será que tem tomate? Será que tem feijão? Seráque tem agrião?” E se divertem com outras me<strong>no</strong>s apetitosase mais engraçadas: “Será que tem mandioca? Será que temminhoca? Será que tem jacaré? Será que tem chulé?”Foi isso o que se viu a<strong>no</strong>s atrás, <strong>no</strong> Estádio do Ibirapueraem São Paulo, durante uma apresentação do conhecidogrupo comandado por Sandra Peres e Paulo Tatit .Um dos maiores sucessos do Palavra Cantada em seusmais de dez a<strong>no</strong>s de carreira, a música chamou a atençãode Eliane Leandro Nogueira, professora da Escola MunicipalGeneral Clóvis Bandeira <strong>Brasil</strong>, em Santos, <strong>no</strong> litoral paulista.Em 2010, ela colocaria a canção <strong>no</strong> centro de um premiadoprojeto de educação alimentar.Embalados pela música do grupo PalavraCantada, estudantes do Ensi<strong>no</strong> Fundamentaldescobrem o prazer de comer bemQue que tem na sopa do


esultado 43Era uma vez...Tudo começou a partir de uma publicação que a Unifesp(ex-Escola Paulista de Medicina) distribuiu entre professorescom dicas sobre como melhorar a alimentação dos alu<strong>no</strong>s edo Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que,como prevê a lei, visa “atender às necessidades nutricionaisdos alu<strong>no</strong>s durante sua permanência em sala de aula, contribuindopara o crescimento, o desenvolvimento, a aprendizageme o rendimento escolar dos estudantes, bem como promovera formação de hábitos alimentares saudáveis”.É nesse último quesito, dos hábitos alimentares para aboa saúde, que hortaliças costumam figurar nas receitas damerenda escolar.Se parecem, a princípio, pouco atraentes ao apetitedos alu<strong>no</strong>s, ganham textura, cor, forma e até sabor mais interessantesnas estrofes da música do Palavra Cantada. Seriapossível utilizá-la para vencer a resistência das crianças aingredientes saudáveis, que cantados parecem muito melhordo que ingeridos?A professora Eliane entendeu que sim. E tinha razão,embora o início não tenha sido fácil. Um de seus alu<strong>no</strong>s, aoprovar pela primeira vez um rabanete, disparou que ele era“ardido como a água do mar”.Sandra Peres ePaulo Tatit, do GrupoPalavra Cantada,criadores da músicaque embala o projetoconcebido pelaprofessora ElianeLeandro Nogueira.Colocando a mão na massaDesde seu início, o projeto incorporou uma série de atividadeslúdicas associadas à letra, que bem poderia ser chamadade receita, da música Sopa do neném.Eliane e seus alu<strong>no</strong>s fizeram cartazes com os <strong>no</strong>mesdos ingredientes, criaram o hábito de passear pela horta docolégio e produziram réplicas dos vegetais com massinha demodelar. Também foi fundamental a participação dos pais <strong>no</strong>processo, que, aos poucos, incorporaram os ingredientes aospratos que cozinhavam para os filhos em casa.“Primeiro, eles degustaram todos os ingredientes dasopa, para tomar gosto, querer experimentar”, contou a professoraà <strong>Nestlé</strong>.Bio. “O tomate eles já comiam na merendada escola, o feijão a mesma coisa. Depois fui mostrando paraeles alguns ingredientes que eles nem conheciam, como aberinjela e o agrião.”neném?


44 resultadoUm a um, tomate, espinafre,berinjela, alho-poró e suascompanheiras hortaliçaspassaram de mão em mão,em rodas de discussão.Como nem o clima nem a época do a<strong>no</strong> eram adequadospara cultivar todos os ingredientes que compõem a letra damúsica, apenas alguns deles cresceram na terra plantada pelosalu<strong>no</strong>s. O restante foi comprado em feiras livres da cidade.Um a um, tomate, espinafre, berinjela, alho-poró e suascompanheiras hortaliças passaram de mão em mão, em rodasde discussão. Alu<strong>no</strong>s apalparam, cheiraram, tocaram,cortaram e experimentaram, enquanto conversavam sobre aimportância de cada um deles.Ao longo do trabalho, Eliane Nogueira se deparou comuma surpreendente constatação: o prestígio do agrião entreas crianças. Segundo a professora, foi o campeão da sopa,e requisitado até mesmo em casa, fora da merenda e longeda escola. “Na feira, eles falam para as mães: ‘Compra (sic)agrião’”, lembra Eliane. E reforça: “É bem isso, a ideia é levar acriança a querer experimentar. Experimentando, ela pode gostar.E, se gostar, pode pedir aos pais.”Da música para o fogãoEmbora a escolha dos ingredientes e sua ordem tenhamsido concebidos pelo Palavra Cantada para um melhor desempenhoso<strong>no</strong>ro e da composição musical, a letra também sepresta para cozinhar uma sopa bastante nutritiva. Com o avalde uma nutricionista, a lista de ingredientes da sopa musicalnão demorou a ser aprovada para a merenda escolar. “A diretoraaprovou o cardápio”, lembra Eliane. “É mesmo uma delícia!”Com maior ou me<strong>no</strong>r entusiasmo, alu<strong>no</strong>s se acostumarama comer uma diversidade de verduras, frutas e legumesda música. E, além de disso, estreitaram a convivência comesses <strong>no</strong>vos conhecidos por meio de outras disciplinas docurrículo escolar.Se português serviu para aprender a escrever os <strong>no</strong>mesdos ingredientes, matemática se prestou a contar, calcular epesar as receitas. Já na aula de artes, usaram massinha demodelar para construir réplicas dos itens da sopa, aprender<strong>no</strong>ções de cor, forma e proporção. “Eles ficaram encantadoscom a cor, com a textura da berinjela e a mudança dela quandoa gente corta”, lembra a professora.


esultado 45Brincar é coisa sériaO projeto “Sopa de neném” foi merecidamente reconhecidocom um dos prêmios Educador Santista de 2010. Suaessência toca em um dos pontos centrais ligados à promoçãoda saúde na infância: o papel da escola na formação da escolhaalimentar.Uma questão que ganha contor<strong>no</strong>s ainda mais relevantesquando levado em conta o estágio de transição nutricionalpelo qual passa o <strong>Brasil</strong> — em que um aumento na prevalênciada obesidade coexiste com a queda da desnutrição.A iniciativa da professora Eliane Nogueira encontrasubstrato em diferentes estudos da literatura. Como, porexemplo, o trabalho publicado por um grupo de pesquisadoresdo Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Públicada Universidade de São Paulo, em 2006 [1]. Nele, buscou-seidentificar a preferência dos alu<strong>no</strong>s pelos alimentos comercializadosna cantina ou distribuídos pelo PNAE.Dos 384 estudantes que cursavam as 7 as e 8 as sériesde uma escola pública, 81,51% compravam alimentos dacantina: doces (74,14%), salgados (54,17%), salgadinhos(28,39%) e refrigerantes (22,14%). Entre os principais motivoscitados para não consumirem a merenda escolar estavama falta de vontade ou ausência de fome (22,4%) e o fatode não gostarem dela (15,63%).Ao discutirem seus achados, os autores chamam aatenção para as consequências da<strong>no</strong>sas em termos do rendimentoescolar dos alu<strong>no</strong>s. E apontam para a necessidadepremente de que profissionais capacitados incentivem o consumode uma merenda nutricionalmente balanceada.No livro Reflexões sobre o brinquedo, a criança e a educação[2], o filósofo e sociólogo Walter Benjamin associa oato de brincar à produção de subjetividades, fundamentalpara a construção de um espaço de criação e, também, parao processo de transmissão educacional.Na horta, na sala de aula e na cozinha da Escola MunicipalGeneral Clóvis Bandeira <strong>Brasil</strong>, pitadas de nutrição,pedagogia e filosofia temperam um bem-sucedido processointegrado de educação alimentar <strong>no</strong> qual a brincadeira e a diversãofalam mais alto do que a coerção.Assista ao embalo de crianças e adultos com a música doPalavra Cantadawww.nestle.com.br/nestlenutrisaude/NestleBio.aspxreferências[1] Ochsenhofer, K., Quintella, L.C.M; Silva, E.C., et al. O papel da escola na formação da escolha alimentar: merenda escolar ou cantina? Nutrire Rev. Soc. Bras. Aliment. Nutr;31(1):1-16,2006. [2] Walter Benjamin. In: Reflexões sobre o brinquedo, a criança e a educação. Ed. 34, 2009.


leitura críticaGanho de peso na gestação como fatorde risco isolado para excesso de peso eobesidade do recém-nascido na vida adultaEstá bem documentado na literatura queo excesso de peso e a obesidade representamimportante problema de Saúde Pública <strong>no</strong> <strong>Brasil</strong>e <strong>no</strong> mundo. Além de estarem diretamenteassociados a doenças crônicas não transmissíveis(DCNT), como hipertensão, dislipidemia,síndrome de resistência à insulina e diabetes,sua incidência vem aumentando, a<strong>no</strong> após a<strong>no</strong>,entre adultos e crianças.Não é de estranhar, portanto, o númerotambém crescente de pesquisas que buscamdesvendar seus mecanismos etiológicos e fisiopatológicose, também, estratégias efetivasde prevenção.Por mais de uma década, evidênciascientíficas indicaram que mulheres que adquirempeso excessivo durante a gestaçãotendem a gerar filhos mais pesados e commaior risco de se tornarem pessoas obesas aolongo da vida (1). Até recentemente, contudo,não existiam evidências de que esta propensãoresulta do ganho de peso em si e não de outrosfatores como o genético e condições ambientaiscompartilhadas entre a criança e sua mãe.Com o apoio do US National Institutesof Health, um grupo de pesquisadores doChildren’s Hospital Boston (EUA) conduziu umestudo de coorte <strong>no</strong> qual foram examinadosos prontuários de mais de um milhão de nascimentos<strong>no</strong>s hospitais das cidades de Michigane New Jersey, entre os a<strong>no</strong>s de 1989 e 2003.No estudo publicado em setembro, <strong>no</strong>Lancet, o grupo identificou mulheres queconceberam dois ou mais filhos, possibilitandoa comparação entre gestações da mesmamãe (2). Foram excluídas da amostra criançaspré-termo e pós-termo, assim como aquelasnascidas com me<strong>no</strong>s de 500 g ou mais de7 kg. As mães com diabetes e cujos prontuáriosapresentavam ausência de informaçãotambém foram excluídas do grupo amostral.A análise apontou associação consistenteentre ganho de peso na gestação e pesoao nascer. Crianças cujas mães acumularammais de 24 kg durante a gravidez nasceramcom aproximadamente 149 g a mais do que ascrianças geradas por mães que adquiriram de 8a 10 kg. Além disso, os filhos de mulheres queganharam mais de 24 kg tiveram cerca de duasvezes mais chance de apresentar peso maiorque 4 kg ao nascer.A conclusão dos pesquisadores foi de queo ganho de peso durante a gestação aumenta opeso da criança ao nascer, independentementede fatores genéticos. Tendo em vista a aparenteassociação entre peso ao nascer e peso na vidaadulta, além de que o excesso de peso ao nasceraumenta o risco de DCNT na vida adulta, oestudo ressalta a importância do empenho emse manter uma condição saudável antes mesmodo nascimento.Nesse sentido, a saúde da criança parecedepender de maneira crítica da orientação e doacompanhamento nutricional da mãe durantea fase pré-natal; de sorte que ela mantenha osganhos de peso sugeridos por protocolos adotadosinternacionalmente. Segundo eles, asgestantes devem adquirir de 12,7 a 18,1 Kg, seengravidam com baixo peso; de 11,3 a 15,8 Kg,se forem eutróficas; de 6,8 a 11,3 Kg, se apresentaremexcesso de peso; e de 4,9 a 9,1 Kg seestiverem obesas (3).Se por um lado esse estudo não diminuio peso do <strong>impacto</strong> da herança genética comofator etiológico do excesso de peso e da obesidade,por outro reforça como a aderência degestantes a uma adequada orientação nutricionalpode contribuir de modo singular para a suasaúde e a do seu filho. Não apenas ao nascimento,como também na vida adulta.(1) Martorell R, Stein A, Schroeder D. Early Nutrition and Later Adiposity. J Nutr. 2001;131:874S-80S.(2) Ludwig DS, Currie J. The association between pregnancy weight gain and birthweight: a within-family comparison. Lancet. 2010:376(9745):984-90.(3) Institute of Medicine of the National Academies. Weight Gain During Pregnancy: Reexamining the Guidelines.Washington, DC: National Academies Press; 2009.Helen C. Laura é Mestre em epidemiologia, responsável pelo Sistema de Vigilância Nutricional Comunitário, Sistema Nacional de Informação em Saúde,Ministério de Saúde e Esporte-Bolívia e Membro do International Epidemiology Association.


leitura crítica 47Dieta e asma: implicações nutricionais,da prevenção ao tratamentoA etiologia da asma é fundamentada emcontrovérsias, provavelmente por ter causasmultifatoriais que incluem fatores genéticos,ambientais e alimentares. A maioria dos estudosque buscam esclarecer os determinantesdessa doença crônica é transversal e, portanto,de baixo valor de evidência. Estudos longitudinaisque incluem os hábitos alimentares e osfatores de risco desde o início da vida, inclusivedurante a gestação, são os mais indicados paraesclarecer os mecanismos que estão envolvidos<strong>no</strong> desenvolvimento da asma.O estudo 1 de revisão publicado recentemente<strong>no</strong> Journal of the American DieteticAssociation ressalta os aspectos dietéticosrelacionados com a prevenção e o tratamentoda asma, principalmente <strong>no</strong> período gestacionale <strong>no</strong>s primeiros a<strong>no</strong>s de vida. Foram utilizadosartigos publicados durante o período de1950 a 2009 relacionados com os sintomas deasma, os parâmetros fisiológicos e os diversostermos dietéticos, focando os antioxidantes,os ácidos graxos poli-insaturados (PUFAS) ea vitamina D. O estudo relata os achados relacionadoscom as possíveis causas do aumentoda prevalência de asma. Tanto a redução comoo aumento do consumo de antioxidantes pelapopulação, a ingestão de ácidos graxos poli-insaturados(redução do consumo de w3 e o aumentodo consumo de w6), a suplementaçãoprecoce e/ou a deficiência de vitamina D foramassociados com o aumento da prevalência deasma. Contudo, os resultados dos estudos sãocontraditórios e apresentam diferentes viéses.Assim, não há evidências conclusivas de queo consumo desses nutrientes esteja associadoao aumento da prevalência e/ou severidade daasma na população mundial.A segunda parte do artigo aborda a influênciada alimentação <strong>no</strong>s primeiros a<strong>no</strong>sde vida na etiologia da asma. Os estudos querelacionaram a ingestão materna de antioxidantes,como selênio e zinco, e de ácidos graxospoli-insaturados, como w3 e w6, durante agestação mostraram resultados contraditóriosem relação ao desenvolvimento de asma emcrianças. Já os resultados referentes à vitaminaD e a asma possuem baixas evidências,considerando-se que nenhum dos estudos mediuos níveis corporais da vitamina, mas apenasa ingestão dietética. Apesar de o estudoconcluir que existe associação entre a alimentaçãoe o desenvolvimento de asma, há outrosfatores que devem ser tomados em conta pararesponder à proposta inicial do estudo.Pesquisa longitudinal, recentemente publicada<strong>no</strong> Jornal de Pediatria 2 , mostrou que aintrodução precoce do leite de vaca foi importantefator de risco para o desencadeamento desintomas da asma aos 4 a<strong>no</strong>s de idade. Alémdisso, o aleitamento mater<strong>no</strong> por período superiora 6 meses também foi associado com aproteção contra o desenvolvimento de atopia.Assim, observou-se potencial de ingerênciapara diminuir o <strong>impacto</strong> da asma por meio deintervenções dietéticas <strong>no</strong> primeiro a<strong>no</strong> devida. Ressalta-se, ainda, a história familiarcomo um fator de risco para o desenvolvimentoda asma que deve ser considerado.O estudo 1 , alvo dessa leitura crítica , apesarde intensa revisão, não apresenta poder deevidência, pois não constitui uma revisão sistemáticade fato. Entretanto, a compilação devários estudos remete o leitor à e<strong>no</strong>rme complexidadedo tema e às lacunas existentes parao desenvolvimento de estudos futuros na área.[1] Keith, A. Graham, D. (2011). Diet and Asthma: Nutrition Implications from Prevention to Treatment. Am Diet Assoc 111(2):258-268.[2] Strassburger, S.Z. Vitolo, M.R. Bortolini, G.A. Pitrez, P.M. Jones M.H. Stein R.T. (2010). Erro alimentar <strong>no</strong>s primeiros meses de vida e sua associação com asma e atopia em pré-escolares. J Pediatr 86(5):391-399.Marcia Regina Vitolo é Professora-Adjunta do Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).Coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Nutrição (NUPEN) da UFCSPA.Fenanda Rauber é Doutoranda do Programa de Pósgraduação em Ciências da Saúde da UFCSPA.

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