11.07.2015 Views

VAGAS E DIREITO A ESTACIONAMENTO EM CONDOMÍNIO ...

VAGAS E DIREITO A ESTACIONAMENTO EM CONDOMÍNIO ...

VAGAS E DIREITO A ESTACIONAMENTO EM CONDOMÍNIO ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVILO CONDOMÍNIO EDILÍCIOA tendência dos seres humanos é a de se agrupar. De viver emsociedade. Daí deriva-se a máxima de Aristóteles, de que “o homem é um animal social”,afirmando que a união entre os homens ocorre de forma natural, porque o homem é um seressencialmente carente, que necessita de coisas e de outras pessoas para alcançar a suaplenitude. Assim afirma Aristóteles, em sua obra intitulada “Política”, in verbis:“As primeiras uniões entre pessoas, oriundas de uma necessidadenatural, são aquelas entre seres incapazes de existir um sem o outro,ou seja, a união da mulher e do homem para perpetuação da espécie(isto não é resultado de uma escolha, mas nas criaturas humanas, talcomo no outros animais e nas plantas, há um impulso natural nosentido de querer deixar depois de individuo outro ser da mesmaespécie).” (Política, I, 1252a e 1252b, 13-4) 1Portanto, não causa espanto que mesmo na mais tênue organizaçãotribal, existisse regras definidas para o convívio social, que por óbvio, longe de se parecercom a estrutura que define as Leis na forma como nós a conhecemos, eram basicamentenormas de caráter moral e, notadamente, patrimonial, pois como todo e qualquer animal, ohomem sempre se preocupou em delimitar seu território e, para sua defesa, estava disposto alutar ate à morte.Estas normas sociais primitivas na sua maioria não eram democráticase impunham penas severas para aqueles que as infringisse, não raro, a pena capital, perda demembros ou do patrimônio.A população humana não parava de crescer e de pequenos vilarejos,surgiram cidades não mais com normas, mas com Leis próprias e, finalmente, os Estados(gênero), com suas Constituições de regras supremas. Chegamos ao início do século XX, comuma população mundial em torno dos 2 (dois) bilhões de habitantes. Atualmente, estamos na1Do sítio http://projetophronesis.wordpress.com/2009/01/10/o-homem-e-um-animal-social-aristoteles/, consultarealizada em 17/12/2011.


ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVILconstruções), o nascimento da incorporação imobiliária e a comercialização mais acessível,através das vendas a crédito.Premente se fazia estabelecer ordem no meio do caos das construçõesdesenfreadas. Dentre as legislações pertinentes ao antigo “condomínio em plano horizontal”,assim chamado, pois o domínio do solo onde as unidades são edificadas, inclui a superfície, osubsolo e o espaço aéreo, encontramos sucessivamente o Decreto n.º 5.481, de 25 de junho de1928, modificado pelo Decreto-lei nº 5.234, de 8 de fevereiro de 1943 e pela Lei nº 285, de 5de junho de 1948. Entre outras disposições, estes diplomas legais vigoraram até a edição daLei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, baseada no projeto do professor Caio Mário daSilva Pereira, com as alterações da Lei nº 4.864/65, que veio a dispor sobre o Condomínio emEdificações (artigos 1º ao 27) e as Incorporações Imobiliárias (artigos 28 ao 70). A atualdenominação de “condomínio vertical” ou “edilício”, somente chegou a com a edição da Lei10.406/02 (Novo Código Civil), que derrogou a Lei 4.591/64, ou seja, esta ainda é aplicável,desde que não contrarie à novel codificação de direito privado.Chegamos então à definição de “condomínio”, que deriva do latimcum (junto) e dominum (domínio). Pelo novel Diploma Civil de 2002, os condomíniospassaram a ter tratamento especial nos Capítulos VI e VII.O novo Código Civil de 2002 dividiu o condomínio em três formas: ovoluntário (art. 1.314 et alli), que envolve a doação ou herança; o necessário (art. 1.327 etalli), que trata da meação de paredes, cercas, muros e valas; e o edilício (artigos 1.331 usque1.358), que trata de edifícios, casas e loteamentos. O vocábulo “edilício” vem do latimaedilitiu, que diz respeito à edificação. Assim, para que exista um condomínio edilício, énecessário que exista a co-propriedade em uma edificação.OS ABRIGOS PARA VEÍCULOS (GARAGENS)No §1º, do artigo 1.331, do CC, preconiza-se que "as partessuscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas,sobrelojas ou abrigos para veículos, com as respectivas frações ideais no solo e nas outraspartes comuns, sujeitam-se á propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadaslivremente por seus proprietários".


ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVILO abrigo de veículos, mais conhecido como “garagem” é fonte deinúmeros litígios nos condôminos edilícios, particularmente, naqueles mais antigos,constituídos antes da Lei 4.591/64, que ainda possuem Cartas Convencionais defasadas e quena sua edificação, não obedeceram por óbvio, as atuais regras para incorporação, construção eregistro. A própria Lei 4.591/64, foi promulgada sem normatizar as áreas de estacionamentosem condomínios edilícios. Somente com a edição da Lei 4.864/65, é que foram acrescentadostrês parágrafos ao art. 2º daquela Lei, regendo o assunto.A “vaga” de garagem não se mostra como área comum, ou comounidade autônoma, mostrando-se como verdadeiro tertium genus. Vejamos o §1º do art. 2º,um dos três acrescidos pela Lei 4.864/65, in verbis:"O direito à guarda de veículos nas garagens ou locais a issodestinados nas edificações ou conjuntos de edificações será tratadocomo objeto de propriedade exclusiva, com ressalva das restriçõesque ao mesmo sejam impostas por instrumentos contratuaisadequados, e será vinculada à unidade habitacional a quecorresponder, no caso de não lhe ser atribuída fração ideal específicade terreno."Observe-se que o comando suso apontado não individualiza a “vaga”de garagem, referindo-se apenas a existência de um “direito à guarda do veículo nasgaragens”. Em outras palavras, a primeira parte do §1º do art. 2º da Lei 4.864/65 não serefere a algo passível de propriedade strictu sensu, mas apenas ao exercício de um direitoumbilicalmente ligado a uma unidade habitacional, que é o de estacionar um veículo em áreaprópria (garagem) dentro do condomínio. Trata-se de direito exclusivo da unidadehabitacional à ele vinculado.Assim nos parece que tal direito é pessoal e não real, pois apesar deestar vinculado a uma unidade habitacional, sendo dela parte integrante, deve constar eminstrumento contratual próprio aos condomínios (Carta de Convenção), que, por si, podemimpor restrições no sentido de organizar seu uso. Cria-se, assim, uma relação obrigacional ao


ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVILcondomínio, em regulamentar o uso de uma fração não individualizada para guarda deveículos em área comum, para aqueles condôminos que detenham tal direito, que por seuturno, obrigam-se a cumprir as normas dispostas na Carta Convencional, que nada mais é doque um contrato entre todos os membros da comunhão.É comum a confusão entre direito ao uso de estacionar, com o termo“vaga”. O simples direito ao uso de guarda de veículo, não gera acréscimo na fração ideal doimóvel a ele vinculado, diferentemente da “vaga autônoma”, que será tratada adiante e éconsiderada como um bem imóvel strictu sensu, com fração ideal própria no terreno daconstrução, que, inclusive, pode dispor dela livremente e, neste ponto, se está falando emalienação direta por contrato de compra e venda, e não apenas de uma cessão de direitosaquisitivos, que fica clara na redação do § 2º do art. 2º da Lei 4.591/64, incluído pela Lei4.864/65, onde reza que “o direito de que trata o § 1º deste artigo poderá ser transferido aoutro condômino, independentemente da alienação da unidade a que corresponder, vedadasua transferência a pessoas estranhas ao condomínio”. Com relação ao aludido comando,este foi ab-rogado pelo art. 1.339 do CC/02, no que tange a alienação para pessoas estranhasao condomínio.Atualmente, a doutrina reconhece três espécies de vagas deestacionamentos em condomínios edilícios:a) Comum: é aquele no qual todas as unidades autônomas possuemo direito de estacionar veículos. A área é destinada pelo condomínio para fins deparqueamento, sem acréscimo na fração ideal das unidades habitacionais;b) Acessória: é aquela na qual um condômino ou um grupo deles,possui o direito de estacionar veículo em área exclusiva no condomínio, normalmentedemarcada no solo. Difere-se da vaga comum, por acrescer a fração ideal de terreno daunidade habitacional a qual está vinculada. Sendo assim, um condômino que possua duasvagas na garagem do condomínio, sempre terá uma fração ideal de terreno maior do queaquele que detenha o direito a apenas uma;c) Autônoma: considerar-se-á como unidade independente, avaga de veículo que possua fração ideal correlata no solo, bem como nas partes comuns da


ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVILedificação, sujeitando-se às normas de uma propriedade exclusiva, assim como umapartamento ou uma sala comercial. Trata-se de espécie incomum em condomínios edilícios,sendo mais frequente nos chamados “edifícios garagem”.Perante o Registro Geral de Imóveis, apenas a vaga de garagemautônoma possuirá matrícula própria, que a delimitará geograficamente no condomínio, frenteàs coisas comuns.Então temos que a garagem, ou abrigo para veículos existente em umaedificação, pode comportar-se como área de uso comum de todos os condôminos, onde cadaum tem direito sobre este espaço físico, considerado como um todo. No Registro Imobiliário,a área correspondente a este espaço será, de conformidade com os respectivos cálculosinformativos da constituição do condomínio, lançada como área comum nas própriasmatrículas das unidades autônomas, conjugada com as demais áreas comuns correspondentes.Igualmente segue-se que o espaço destinado ao abrigo para veículos,demarcado ou não, poderá constituir-se em direito vinculado a determinadas unidadesautônomas, como acessório. No Registro Geral de Imóveis tal direito será traduzido emdeterminado quantum de área e estará contido na matrícula da respectiva unidade autônoma.Em relação ao abrigo para veículos, outro mandamento legal, in casu,o art. 1.339 do CC/02, em especial da regra contida em seu § 2º, se pode inferir que, in verbis:"é permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidadeimobiliária a outro condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essafaculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se a ela nãose opuser à respectiva assembleia geral".Assim sendo, a cessão de parte acessória consistente no direito deestacionamento de veículo, sem fração 3 ideal individualizada, de uma determinada unidadeautônoma para outra do mesmo condomínio e, cuja área respectiva se junta na fração idealdessa unidade em uma única matrícula imobiliária, acarretará automaticamente alteração da3 Não se deve confundir fração individualizada (idealizada), com matrícula própria no RGI. Nesse sentido, cita-se a Súmula449 do STJ, onde consta que “a vaga de garagem com matrícula própria no Registro de Imóveis, não se constitui como bemde família para efeito de penhora”.


ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVILfração ideal de todas as demais unidades autônomas, quando menos, daquela que recepcionouo direito como cessionário.Isto porque, enquanto permitida a alienação de uma parte acessóriacomo um bem jurídico individuado, a ela deverá obrigatoriamente corresponder uma fraçãoideal no todo. A menos que essa aludida parte acessória seja cedida em comunhão com aunidade autônoma respectiva, tendo em vista, a regra geral emanada do artigo 92 do CC/02 4 ,haverá inexoravelmente implicações no fracionamento das áreas das demais unidades.Nesse sentido, então, importante se faz verificar quanto a eventualconflito de normas existente entre a regra emanada do §2º do art. 1.339 do CC/02, com a doart. 92 do mesmo Diploma Legal, pois se a coisa acessória pressupõe sua existência jurídica auma principal, qual das normas deverá ser aplicada?JOSÉ CRISTÓVAM faz a seguinte anotação, in verbis:"No conflito entre regras, a aplicação de duas diferentes prescriçõesjurídicas, ambas válidas, conduzem a resultados incompatíveis entresi". 5Citando NORBERTO BOBBIO, CRISTÓVAM soluciona a questãoapontando, dentre outras formas, in verbis:"Em determinados casos, tais tensões podem ser sanadas mediante oemprego de critérios de resolução de conflitos entre regras jurídicas.[...]. Pode-se estabelecer, ainda, a prevalência da regra especialsobre a regra geral (lex specialis derogat lex generali), usando ocritério da especificidade". 64 Art. 92. Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a doprincipal.5 CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva. A resolução das colisões entre princípios constitucionais. Jus Navegandi, Teresina, a. 7,nº 62, fev. 2003. Disponível em: Acessado em 16/12/2011.6 Op. Cit.


ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVILDessa forma, em se conferindo às normas destinadas ao condomínioedilício o condão de normas especiais, há de ter-se por derrogada a regra geral fixada peloartigo 92, em face do §2º, do art. 1.339, ambos do CC/02.Deve-se ressaltar, que o desmembramento da parte acessória, ou seja,do direito ao estacionamento na garagem, do principal, que seria a unidade autônoma em si,impende à prévia anuência de todos os condôminos em Assembleia Geral, e desde que seencontre previsto na Carta de Convenção do condomínio (parte final do §2º, do art. 1.339, doCC/02).CONCLUSÃOA matéria que se pretendeu debater nessas breves linhas é extensa, eainda não encontra pacificada, seja na jurisprudência ou na doutrina, mesmo entre grandesjuristas, como o saudoso CAIO MÁRIO, com sua posição polêmica quanto à alienação decoisa acessória, que aqui não foi discutida.Todavia, mesmo sem debater a fundo a matéria, esperamos que estetrabalho tenha atingido seu objetivo, que foi o de trazer ao lume de forma didática, o que debásico existe sobre estacionamento em condomínios edilícios, ajudando àqueles que lidamcom a fascinante, mas tormentosa área do Direito Imobiliário.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS1. AGHIARIAN, Hércules; Curso de Direito Imobiliário, Ed. LumenJuris, 10ª edição, Rio de Janeiro, 2011;2. NEGRÃO, Theotonio, GOUVÊA, José Roberto F,; Código CivilAnotado, Ed. Saraiva, 24ª edição, Rio de Janeiro, 2005;3. CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva; A Resolução das Colisõesentre Princípios Constitucionais, Revista Eletrônica Jus Navegandi,Teresina, a. 7, nº 62, fev. 2003. Disponível em:http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4816&p=2; Acessadoem 16/12/2011;


ACAD<strong>EM</strong>IA BRASILEIRA DE<strong>DIREITO</strong> PROCESSUAL CIVIL4. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA in http://www.stj.jus.br,pesquisa de súmulas em 16/12/2011.5. WIKIPÉDIAxhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Popula%C3%A7%C3%A3o_mundial consulta em 17/12/2011;6. PROJETOXPHRONESISXhttp://projetophronesis.wordpress.com/2009/01/10/o-homem-e-um-animal-social-aristoteles/, consultarealizada em 17/12/2011.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!