<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadorasSegundo a ONU,10% da populaçãomundial éconstituída porpessoas comalgum tipo <strong>de</strong><strong>de</strong>ficiência.No Brasil,essa populaçãoé <strong>de</strong> 14,5%.ção começou a melhorar. Crescia a conscientização da necessida<strong>de</strong><strong>de</strong> que crianças com <strong>de</strong>ficiência intelectual nãofossem ensinadas em escolas especiais, como as das Apaes,que prestam bons serviços, mas não são inclusivas, ou seja,não abrangem as diferentes raças, culturas e outras característicasque compõem a diversida<strong>de</strong> humana.Discussões infindáveis passaram a ser travadas em todo opaís entre aqueles que <strong>de</strong>fendiam que crianças com <strong>de</strong>ficiência,incluindo a intelectual, <strong>de</strong>veriam estudar em ambientesprotegidos, como os das Apaes, e os articuladoresda inclusão educacional, que consi<strong>de</strong>ravam um direitoinalienável <strong>de</strong>ssas crianças estudar com amigos, primos e irmãos naescola próxima <strong>de</strong> casa. Essas escolas, no entanto, <strong>de</strong>veriam oferecernão apenas currículos adaptados e estratégias pedagógicas que contemplassemalunos com <strong>de</strong>ficiência intelectual, mas também acessibilida<strong>de</strong>,já que eles têm frequentemente mobilida<strong>de</strong> reduzida e nãoconseguem enfrentar escadas, terrenos muito íngremes e todo tipo<strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong> para chegar à sala <strong>de</strong> aula.Ainda hoje, muitos educadores, não preparados para aceitar a diversida<strong>de</strong>humana proposta pela educação inclusiva, mostram evi<strong>de</strong>ntemá vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> aceitar em sua sala <strong>de</strong> aula alunos com <strong>de</strong>ficiência, porrepresentarem um <strong>de</strong>safio difícil. O que eles não sabem é que resultados<strong>de</strong> boas práticas educacionais em todo o mundo comprovam aimportância da educação inclusiva, porque esse ambiente <strong>de</strong> pertencimentofará com que os outros alunos, sem <strong>de</strong>ficiência, <strong>de</strong>senvolvamdisponibilida<strong>de</strong> afetiva em relação a coleguinhas com dificulda<strong>de</strong>s,tornando todas as crianças elementos que sempre contribuirão muitopara a aceitação do próximo como alguém importante. Os própriosprofessores também crescem e se <strong>de</strong>senvolvem espiritualmente comesse gran<strong>de</strong> mas maravilhoso <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> aceitar alunos com dificulda<strong>de</strong>sna sala <strong>de</strong> aula.eduardo barcellosA população brasileira com alguma <strong>de</strong>ficiênciaA Organização das Nações Unidas (ONU) estima que 10% da populaçãomundial é constituída por pessoas com algum tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência.No Brasil, segundo o Censo Demográfico <strong>de</strong> 2000, 14,5%da população tem alguma <strong>de</strong>ficiência, ou seja, um contingente <strong>de</strong>mais <strong>de</strong> 24 milhões <strong>de</strong> pessoas.Nas cida<strong>de</strong>s brasileiras, as pessoas com <strong>de</strong>ficiência quase não sãovistas nas ruas, nos ônibus, nas escolas, nos cinemas, nos restaurantes,pouco aparecem na televisão, na política etc., contrariamente ao queacontece em países <strong>de</strong> bons programas sociais, como o Canadá.Os especialistas e observadores em geral dizem que essa “invisibilida<strong>de</strong>”,amplamente reconhecida, é o resultado <strong>de</strong> umcírculo vicioso: as pessoas com <strong>de</strong>ficiência são poucovistas nas ruas porque a maioria dos ambientes não éacessível e a maioria dos ambientes não é acessívelporque quase não se veem pessoas com <strong>de</strong>ficiêncianas ruas. 11. Para mais informações, ver olivro: Re<strong>de</strong> Saci, projeto da USP.Educação inclusiva: o que o professortem a ver com isso?. SãoPaulo: Imprensa Oficial do Estado<strong>de</strong> São Paulo (Imesp), 2006.Portanto, a acessibilida<strong>de</strong> tornou-se um objetivo primordialpara a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> brasileiros com <strong>de</strong>ficiência.Grupos muito ativos <strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiênciaem todo o país têm lutado por esse direito ina lienável<strong>de</strong> qualquer cidadão: ter a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> locomover-se<strong>de</strong> um lugar para outro sem <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> alguémpara carregá-lo, empurrá-lo etc., porque háburacos no asfalto, <strong>de</strong>graus inacessíveis, enfim,uma série <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong>s que o cidadãocomum não percebe, pois não temlimitações físicas.A já citada iniciativa da Unesco <strong>de</strong>promover uma gran<strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> es-4041
<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadoraspecialistas em educação do mundo inteiro em Salamanca, em junho<strong>de</strong> 1994, teve gran<strong>de</strong> importância, porque foi o divisor <strong>de</strong> águasentre a conceitualização até ali aceita <strong>de</strong> que crianças sem <strong>de</strong>ficiência<strong>de</strong>viam estudar em escolas comuns, vizinhas a suas casas, e criançascom algum tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência tinham <strong>de</strong> frequentar classesespeciais, com métodos pedagógicos específicos. Isso criou a i<strong>de</strong>ia<strong>de</strong> que essas crianças não <strong>de</strong>vem estudar juntas, o que contraria umdos mais elementares direitos humanos:o <strong>de</strong> que todos po<strong>de</strong>mos viverjuntos como parte da comunida<strong>de</strong> edar nossa contribuição, sejam quaisforem os empecilhos ou limites colocadosdiante <strong>de</strong> nós.eduardo barcellosSeguindo o princípio da educaçãopara todos, o Brasil assumiu o compromisso<strong>de</strong> que todas as criançastêm o direito <strong>de</strong> estudar juntas, salvonos raros casos em que <strong>de</strong> fato seimpõem outras soluções. A questão,no entanto, vem gerando, sobretudono último <strong>de</strong>cênio, gran<strong>de</strong> polêmicanacional, que não tem se realizadosem mágoas, sem sofrimentos,sem profundos medos e incertezasdos pais <strong>de</strong> crianças com <strong>de</strong>ficiência,receosos <strong>de</strong> que os filhos, ao estudaremcom alunos mais bem-dotadosou sem problemas <strong>de</strong> aprendizado,sejam repelidos por esses colegas,com zombarias, apelidos <strong>de</strong>strutivose outras atitu<strong>de</strong>s negativas.Ainda hoje muitos educadores brasileiros, malgradoos expressivos esforços do Ministério da Educação,recusam-se a aceitar alunos com alguma <strong>de</strong>ficiênciaem suas classes, <strong>de</strong>clarando que não foram preparadospara enfrentar os <strong>de</strong>safios, os problemas que criançascom limitações muitas vezes impõem. Esses professores,cujo número vem diminuindo gradativamente,teriam <strong>de</strong> reformular primeiro os próprios valores,refletir sobre o motivo <strong>de</strong> terem escolhido a nobremissão <strong>de</strong> ensinar. Os ganhos que um professor conquistaquando consegue dar apoio e orientação a umacriança com <strong>de</strong>ficiên cia, seja qual for, sobretudo a intelectual,são enormes para sua felicida<strong>de</strong> pessoal, suasensação <strong>de</strong> bem-estar com a vida, por crescer com os problemasdos alunos, adquirindo confiabilida<strong>de</strong> e reforçando a autoestima.Sabemos, pois, que foram os pais os gran<strong>de</strong>s artífices <strong>de</strong> um mundoque se dispusesse a bem receber seus filhos com limitações, mas,certamente, com qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caráter que só quem convive intimamentecom pessoas com <strong>de</strong>ficiência é capaz <strong>de</strong> reconhecer eaquilatar.Os auto<strong>de</strong>fensoresA convenção nãopropõe direitosnovos parapessoascom <strong>de</strong>ficiência,mas explica<strong>de</strong> que modoos direitos queelas já têm<strong>de</strong>vem serpromovidose protegidos.No começo dos anos 70, surgiu o movimento New Voice (Nova Voz),uma manifestação a princípio pequena e <strong>de</strong>sorganizada, <strong>de</strong>pois cadavez mais bem estruturada. Jovens e adultos com <strong>de</strong>ficiência intelectualque a<strong>de</strong>rem a esse movimento são conhecidos, no Brasil, como“auto<strong>de</strong>fensores” e, na Argentina, no México e em outros países <strong>de</strong>língua espanhola, como “personas primero”. São grupos <strong>de</strong> pessoasque se organizam, se preparam para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os próprios interesses,mesmo que tenham dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> fala e necessitem, com frequência,<strong>de</strong> alguém que as oriente ou seja sua “pessoa <strong>de</strong> apoio”.4243