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Futuridade - Volume 8: Novas necessidades de aprendizagem

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<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong><strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>


GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULOJosé SerraGovernadorRita PassosSecretária Estadual <strong>de</strong> Assistência e Desenvolvimento SocialNivaldo Campos CamargoSecretário AdjuntoCarlos Fernando Zuppo FrancoChefe <strong>de</strong> Gabinete


Secretaria Estadual <strong>de</strong> Assistência e Desenvolvimento Social – SEADSDepartamento <strong>de</strong> Comunicação Institucional – DCIPaulo José Ferreira MesquitaCoor<strong>de</strong>nadorCoor<strong>de</strong>nadoria <strong>de</strong> Gestão Estratégica – CGECláudio Alexandre LombardiCoor<strong>de</strong>nadorCoor<strong>de</strong>nadoria <strong>de</strong> Ação Social – CASTânia Cristina Messias RochaCoor<strong>de</strong>nadoraCoor<strong>de</strong>nadoria <strong>de</strong> Desenvolvimento Social – CDSIsabel Cristina MartinCoor<strong>de</strong>nadoraCoor<strong>de</strong>nadoria <strong>de</strong> Administração <strong>de</strong> Fundos e Convênios – CAFCarlos Alberto FacchiniCoor<strong>de</strong>nadorFundação Padre AnchietaPaulo MarkunPresi<strong>de</strong>nteFernando AlmeidaVice-Presi<strong>de</strong>nteCoor<strong>de</strong>nação Executiva – Núcleo <strong>de</strong> EducaçãoFernando AlmeidaFernando Moraes Fonseca Jr.Mônica Gar<strong>de</strong>li FrancoCoor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Conteúdo e Qualida<strong>de</strong>Gabriel PriolliCoor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> Produção – Núcleo <strong>de</strong> Eventos e PublicaçõesMarilda FurtadoTissiana Lorenzi GonçalvesEquipe <strong>de</strong> Produção do ProjetoCoor<strong>de</strong>nação geralÁurea Eleotério Soares BarrosoSeadsFernando Moraes Fonseca Jr.Fundação Padre AnchietaDesenvolvimentoSeadsElaine Cristina MouraIvan CerlanJanete LopesMárcio <strong>de</strong> Sá Lima MacedoOrganização dos conteúdos/textosÁurea Eleotério Soares BarrosoColaboradoresClélia la Laina, Edwiges Lopes Tavares, Izildinha Carneiro,Ligia Rosa <strong>de</strong> Rezen<strong>de</strong> Pimenta, Maria Margareth Carpes,Marilena Rissuto Malvezzi, Paula Ramos Vismona,Renata Carvalho, Rosana Saito, Roseli OliveiraProdução editorialMaria Carolina <strong>de</strong> AraujoCoor<strong>de</strong>nação editorialMarcia MeninCopi<strong>de</strong>sque e preparaçãoPaulo Roberto <strong>de</strong> Moraes SarmentoRevisãoProjeto gráfico, arte, editoração e produção gráficaMare Magnum Artes GráficasIlustraçõesAdriana Alvesuma realização


Direitos <strong>de</strong> cópiaSerão permitidas a cópia e a distribuição dos textos integrantes <strong>de</strong>sta obra sob asseguintes condições: <strong>de</strong>vem ser dados créditos à SEADS – Secretaria Estadual <strong>de</strong> Assistência eDesenvolvimento Social do Estado <strong>de</strong> São Paulo e aos autores <strong>de</strong> cada texto;esta obra não po<strong>de</strong> ser usada com finalida<strong>de</strong>s comerciais; a obra não po<strong>de</strong> ser alterada,transformada ou utilizada para criar outra obra com base nesta;esta obra está licenciada pela Licença Creative Commons 2.5 BR(informe-se sobre este licenciamento em http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.5/br/)As imagens fotográficas e ilustrações não estão incluídas neste licenciamento.<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong><strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Dados Internacionais <strong>de</strong> Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Kachar, Vitória<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong> / Vitória Kachar, MariaAmélia Vampré Xavier, Ângela Maria Machado <strong>de</strong> Lima ;[coor<strong>de</strong>nação geral Áurea Eleotério Soares Barroso]. -- São Paulo :Secretaria Estadual <strong>de</strong> Assistência e Desenvolvimento Social :Fundação Padre Anchieta, 2009.Bibliografia.1. Administração pública 2. Cidadania 3. Envelhecimento4. Idosos - Cuidados 5. Planejamento social 6. Política social7. Políticas públicas 8. Qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida 9. Serviço social junto aidosos I. Xavier, Maria Amélia Vampré. II. Lima, Ângela MariaMachado <strong>de</strong>. III. Barroso, Áurea Eleotério Soares. IV. Título.09-09547 CDD-362.6Índices para catálogo sistemático:1. São Paulo : Estado : Idosos : Estado e assistência e<strong>de</strong>senvolvimento social : Bem-estar social 362.62. São Paulo : Estado : Plano Estadual para a Pessoa Idosa-<strong>Futurida<strong>de</strong></strong> : Bem-estar social 362.6


[...] nós envelheceremos um dia, se tivermos este privilégio.Olhemos, portanto, para as pessoas idosas como nós seremos nofuturo. Reconheçamos que as pessoas idosas são únicas, com<strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> e talentos e capacida<strong>de</strong>s individuais, e não um grupohomogêneo por causa da ida<strong>de</strong>.Kofi Annan, ex-secretário-geral da ONU.Prezado(a) leitor(a),Temos a grata satisfação <strong>de</strong> fazer a apresentação <strong>de</strong>ste material elaborado pelaSecretaria Estadual <strong>de</strong> Assistência e Desenvolvimento Social <strong>de</strong> São Paulo (Seads)e pela Fundação Padre Anchieta – TV Cultura.Um dos objetivos do Plano Estadual para a Pessoa Idosa do Governo do Estado <strong>de</strong>São Paulo – <strong>Futurida<strong>de</strong></strong>, coor<strong>de</strong>nado pela Seads, é propiciar formação permanente<strong>de</strong> profissionais para atuar com a população idosa, notadamente nas DiretoriasRegionais <strong>de</strong> Assistência Social (Drads).No total, esta série contém <strong>de</strong>z livros e um ví<strong>de</strong>o, contemplando os seguintesconteúdos: o envelhecimento humano em suas múltiplas dimensões: biológica,psicológica, cultural e social; legislações <strong>de</strong>stinadas ao público idoso; informaçõessobre o cuidado com uma pessoa idosa; o envelhecimento na perspectiva dacidadania e como projeto educativo na escola; e reflexões sobre maus-tratos eviolência contra idosos.


Com esta publicação, <strong>de</strong>stinada aos profissionais que <strong>de</strong>senvolvem ações comidosos no Estado <strong>de</strong> São Paulo, o <strong>Futurida<strong>de</strong></strong> dá um passo importante aodisponibilizar recursos para uma atuação cada vez mais qualificada e uma práticabaseada em fundamentos éticos e humanos.Muito nos honra estabelecer esta parceria entre a Seads e a FundaçãoPadre Anchieta – TV Cultura, instituição que acumula inúmeros prêmios emsua trajetória, em razão <strong>de</strong> serviços prestados sempre com qualida<strong>de</strong>.Desejo a todos uma boa leitura.Um abraço,Rita PassosSecretária Estadual <strong>de</strong> Assistência e Desenvolvimento SocialSumárioInclusão digital e terceira ida<strong>de</strong>Vitória Kachar.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11Inclusão digital: conceito, história e iniciativas....................................... 14Inclusão digital e terceira ida<strong>de</strong> .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18Introdução ao universo virtual. .................................................. 18O processo <strong>de</strong> ensino e <strong>aprendizagem</strong>.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20Benefícios da internet........................................................... 22Sugestões <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s pedagógicas para idosos................................. 24Referências bibliográficas. ......................................................... 26Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadorasMaria Amélia Vampré Xavier........................................................... 29Contextualização da <strong>de</strong>ficiência intelectual.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31O difícil diálogo entre pais e médicos.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36A Liga Internacional.............................................................. 37A Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) <strong>de</strong> São Paulo. ............ 38A população brasileira com alguma <strong>de</strong>ficiência.................................... 41Os auto<strong>de</strong>fensores.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43O envelhecimento das famílias cuidadoras........................................... 49Algumas perguntas norteadoras para <strong>de</strong>bate em grupo .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50Inovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: aexperiência da USP-LesteÂngela Maria Machado <strong>de</strong> Lima........................................................ 51A educação superior, a gestão pedagógica e os novos paradigmas<strong>de</strong> ensino-<strong>aprendizagem</strong>.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53Bacharelado em Gerontologia: inovação necessária, <strong>de</strong>safio assumido pela USP.. . . . . . 58O Projeto Político-Pedagógico do Curso <strong>de</strong> Gerontologia........................... 61Referências bibliográficas. .........................................................68


Inclusão digital eterceira ida<strong>de</strong>Vitória Kachar


Tenho fome da extensão do tempo,e quero ser eu sem condições.Fernando PessoaRecentemente, uma aluna veio me perguntar, com certo olharpreocupado, o que eu achava do fato <strong>de</strong> ela ficar várias horas àtar<strong>de</strong> na frente do computador, acessando a internet, sem percebero tempo passar.Essa situação po<strong>de</strong>ria ser vista como algo corriqueiro e nãogerar nenhum estranhamento se ela fosse do ensino fundamentalou médio e estivesse no período da adolescência.Mas, diferentemente do que se imagina, a alunafrequenta uma universida<strong>de</strong> aberta à terceiraida<strong>de</strong> e tem 70 anos.Vitória Kachar é mestre e doutora em Educação pela Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> SãoPaulo (PUC-SP), professora da Universida<strong>de</strong> Aberta à Maturida<strong>de</strong> da PUC-SP e da Universida<strong>de</strong>Municipal <strong>de</strong> São Caetano do Sul.Quando pensamos nos recursos computacionais,quase <strong>de</strong> imediato associamos seu uso aos adolescentes,que gastam muitas horas explorandotodas as possibilida<strong>de</strong>s que as máquinas oferecem,sobretudo <strong>de</strong> entretenimento e socia-13


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inclusão digital e terceira ida<strong>de</strong>e urbana, dificultam a implementação <strong>de</strong> propostas <strong>de</strong> inclusão digital.Esta, no entanto, não se restringe ao acesso aos recursos computacionaise à internet; <strong>de</strong>ve garantir, também, seu aproveitamento namelhoria da vida pessoal e profissional. Assim, para sua implementação,é preciso levar em conta três aspectos (Costa, 2006):• Econômico: situação financeira que permita à pessoa a aquisição damáquina.• Técnico: domínio dos conhecimentos operacionais para acessar osprogramas e a internet.• Cognitivo: competência para utilizar com autonomia os meiosdigitais.Para diminuir a exclusão do acesso às TICs pela população <strong>de</strong> baixarenda, alguns projetos têm sido promovidos por órgãos públicos epelo terceiro setor em diferentes regiões do Brasil.A primeira iniciativa <strong>de</strong> inclusão digital do governo fe<strong>de</strong>ral foi oPrograma Socieda<strong>de</strong> da Informação (SocInfo), instituído pelo DecretoPresi<strong>de</strong>ncial nº 3.294 em 15 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1999. Coor<strong>de</strong>nadopelo Ministério da Ciência e Tecnologia, foi concebido para preparara geração <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s, possibilitando a viabilização <strong>de</strong> uma novafase <strong>de</strong> evolução da internet no Brasil, para garantir serviços avançados<strong>de</strong> comunicação e informação.O objetivo do SocInfo é fomentar e promover a integração <strong>de</strong>propostas com o aproveitamento das TICs, contribuindo para ainclusão social e <strong>de</strong>senvolvimento econômico, com sete linhas <strong>de</strong>ação: mercado, trabalho e oportunida<strong>de</strong>s; universalização <strong>de</strong> serviçose formação para a cidadania; educação na socieda<strong>de</strong> da informação;conteúdos e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural; governo ao alcance <strong>de</strong>todos; tecnologias-chave e aplicações; infraestrutura avançada enovos serviços.Outra iniciativa do governo é o programa <strong>de</strong> inclusão digital GovernoEletrônico – Serviço <strong>de</strong> Atendimento ao Cidadão (Gesac). Coor-<strong>de</strong>nado pelo Ministério das Comunicações, privilegia a conexão àinternet em alta velocida<strong>de</strong> em escolas públicas, hospitais, postos <strong>de</strong>saú<strong>de</strong>, <strong>de</strong>legacias e <strong>de</strong>mais órgãos públicos <strong>de</strong> todo o país, conectandoas comunida<strong>de</strong>s indígenas e quilombolas, postos militares e regiõescarentes. O Gesac promove a inserção no mundo da informação,por meio <strong>de</strong> computadores e conexão à internet, até em áreas isoladasou em situação <strong>de</strong> risco social.Uma contribuição a ser <strong>de</strong>stacada no terceiro setor é a da organizaçãonão governamental Comitê pela Democratização da Informática(CDI), cuja re<strong>de</strong> é formada por diversos comitês regionais e internacionais.A matriz, no Rio <strong>de</strong> Janeiro, coor<strong>de</strong>na e orienta as ativida<strong>de</strong>s.O projeto nasceu em 1993, quando passou a aten<strong>de</strong>r jovens <strong>de</strong> baixarenda por meio da campanha “Informática para todos”, com a finalida<strong>de</strong><strong>de</strong> arrecadar computadores usados para comunida<strong>de</strong>s pobres.Além do acesso aos recursos computacionais, os jovens são instigados,nessas escolas informais, a <strong>de</strong>bater e refletir sobre a própria realida<strong>de</strong>,po<strong>de</strong>ndo exercer sua cidadania.A tecnologia, visando a contribuir para o crescimentocultural e formação do cidadão, não apenas constituium canal <strong>de</strong> lazer e entretenimento para a camada carenteda população, como também aumenta as possibilida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> inserção no mercado <strong>de</strong> trabalho, agregandoqualificação ao indivíduo e inserindo-o no movimento<strong>de</strong> mudanças sociais.A inclusão digital está estritamente atrelada à inclusãosocial, objetivando o <strong>de</strong>senvolvimento da autonomia eo exercício da cidadania, com ações<strong>de</strong> ampliação do universo cultural,profissional, social eintelectual da pessoa. Parapropor encaminhamentosA inclusão digitalestá estritamenteatrelada à inclusãosocial, objetivandoo <strong>de</strong>senvolvimentoda autonomiae o exercícioda cidadania.paulo pelegrino16


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inclusão digital e terceira ida<strong>de</strong>e procedimentos socioeducacionais <strong>de</strong> combate à exclusão, é precisoconhecer o público que será beneficiado, sua realida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>manda,nível cognitivo e cultural.Inclusão digital e terceira ida<strong>de</strong>1. Trecho do texto “Processo”,<strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> Anna Burgatt Meneghesso,aluna da Universida<strong>de</strong>Aberta à Maturida<strong>de</strong> daPUC-SP, elaborado nas aulas <strong>de</strong>informática e publicado na íntegrano jornal Compuctador, n. 9,editoria Reflexões, jun. 2001.Disponível em: .Acesso em: 1º jan. 2009.Introdução ao universo virtualQuando optei pela aula <strong>de</strong> informática, não imaginei até on<strong>de</strong> ela me levaria.Completamente leiga tanto no computador como em escrever, mevejo redigindo e digitando textos. Para mim, ele representava um bicho<strong>de</strong> sete cabeças. A expectativa vinha <strong>de</strong>s<strong>de</strong> ligar o botão. Às vezes acho queo computador se assemelha a uma casa. Dentro <strong>de</strong>la, ferramentas,réguas, lápis e borrachas, pincéis, tintas e muitas coisas mais.Possui portas e janelas para abrir e fechar e ainda portas menorespara po<strong>de</strong>r escapar. O guarda é um ratinho preguiçoso,que só trabalha se você o carregar. Tem também uma máquina<strong>de</strong> escrever sofisticada e maravilhosa que tudo faz: apaga, acrescenta,modifica, reduz, muda a letra, aumenta e diminui.Procuro estar sempre atenta, mas isso nem sempre basta. O nome<strong>de</strong> cada tecla e a ansieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r me atrapalham. 1A socialização contemporânea incorpora as relações produzidas pelare<strong>de</strong> <strong>de</strong> interconexões <strong>de</strong> pessoas mediadas pelas tecnologias <strong>de</strong> comunicaçãoe informação. É imprescindível, portanto, a preparação<strong>de</strong> cidadãos que saibam ler, compreen<strong>de</strong>r e analisar cri ticamente asinformações, selecionando as mais significativas e pertinentes parauso próprio. A população ainda está apren<strong>de</strong>ndo a lidar com as tecnologiasno dia a dia pessoal, profissional e educacional, vivenciandoas ambiguida<strong>de</strong>s do local e global, dos espaços físico e virtual.Para saber maisEntre os programas <strong>de</strong> inclusão social que o governo fe<strong>de</strong>ral executa e apoia<strong>de</strong>stacam-se:• Computador para Todos – Direcionado para a classe C, permite a aquisição<strong>de</strong> computador e o acesso à internet a preços subsidiados e com linha <strong>de</strong>financiamento específica.• Computadores para Inclusão – Reaproveita equipamentos <strong>de</strong> informáticaem iniciativas <strong>de</strong> inclusão digital <strong>de</strong> todo o Brasil.• Programa Estação Digital – Com o apoio <strong>de</strong> um parceiro local, busca aproximaro computador da vida <strong>de</strong> estudantes, donas <strong>de</strong> casa e trabalhadores.• Programa Nacional <strong>de</strong> Informática na Educação (ProInfo) – Visa a introduziras tecnologias <strong>de</strong> informação e comunicação nas escolas públicas, emparceria com os governos estaduais e municipais.• Telecentros Comunitários Banco do Brasil – Implanta telecentros comunitáriose salas <strong>de</strong> informática, com doação <strong>de</strong> computadores, capacitação eacompanhamento.O universo <strong>de</strong> relações que incorpora a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formas <strong>de</strong>comunicação e a complexa circulação <strong>de</strong> informações tornam-se fatores<strong>de</strong> exclusão para a terceira ida<strong>de</strong>, restringindo suas oportunida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> participar das transformações sociais. Para inserir-se na socieda<strong>de</strong>mo<strong>de</strong>rna, o idoso precisa conhecer a nova linguagem, ter acesso àinformática para conectar-se com o mundo e utilizá-la para extrairbenefícios para sua vida.A população idosa, quando questionada em estudo sobre a representaçãodo computador (Kachar, 2003), apresentou duas categorias<strong>de</strong> respostas:a) atualização, inclusão, mo<strong>de</strong>rno, novo horizonte;b) <strong>de</strong>safio, incógnita, fera, caixinha <strong>de</strong> surpresas.Observamos, assim, que apren<strong>de</strong>r a usar o computador po<strong>de</strong> significara conquista da atualização e a inclusão na mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> e nouniverso virtual.Em pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo em parceriacom o Serviço Social do Comércio – Sesc (Néri, 2007), apenas1819


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inclusão digital e terceira ida<strong>de</strong>22Além das estratégias pedagógicas, esse grupo <strong>de</strong> aprendizes <strong>de</strong>mandaum professor com paciência, cuja preleção seja clara, pausada e objetiva,constituindo um ambiente afetivo, <strong>de</strong> segurança e tranquilida<strong>de</strong>.Benefícios da internetA internet possibilita à terceira ida<strong>de</strong> a <strong>aprendizagem</strong> contínua, aampliação da autonomia e da comunicação, para manter contatos eestabelecer novas relações, amenizando a solidão e as perdas afetivas.O indivíduo tem a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acessar as últimas notícias, receitasculinárias, opções <strong>de</strong> lazer e cultura, informações sobre direitos dosidosos, produções poéticas e literárias, memórias e reflexões em relaçãoao mundo e à expe riência vivida por outras pessoas. Po<strong>de</strong> pesquisarsobre orientações <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong> vários especialistas para prevenir doenças,medidas e cuidados com o próprio corpo e nutrição, artigos queexplicam as mudanças biopsicossociais do envelhecimento, <strong>de</strong> acordocom a heterogeneida<strong>de</strong>, interesses e perspectivas <strong>de</strong> vida.Na navegação na re<strong>de</strong>, por meio da leitura e seleção das informações,e na escrita <strong>de</strong> e-mails, entre outrasativida<strong>de</strong>s, a pessoa estimula a memória,recomendável para a prevenção <strong>de</strong> perdascognitivas e manutenção <strong>de</strong> uma mentesaudável. Adquire maior <strong>de</strong>senvoltura paralidar com outros equipamentos eletrônicose digitais, como máquinas <strong>de</strong> banco e celulares,e reconquista a confiança emsua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r.Walter CraveiroPara saber mais• Jornal Maturida<strong>de</strong>s – Jornal on-line da Universida<strong>de</strong> Aberta à Maturida<strong>de</strong>da Pontifícia Universida<strong>de</strong> Católica <strong>de</strong> São Paulo (PUC-SP), antes chamadoCompuctador, organizado e produzido por uma equipe <strong>de</strong> alunos. Disponívelem: .• Universida<strong>de</strong> Aberta à Terceira Ida<strong>de</strong> da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> São Paulo(Unifesp) – Oferece ativida<strong>de</strong>s a pessoas com mais <strong>de</strong> 50 anos, inclusivecursos a distância. Informações em: .A internet po<strong>de</strong> ser uma conexãocom o mundo para os idosos quevivem em instituições <strong>de</strong> longa permanência,são <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e estãocomprometidos fisicamente, rompendoas fronteiras <strong>de</strong> tempo e espaço, esten<strong>de</strong>ndo as possibilida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> comunicação e minimizando as limitações físicas. Com o correioeletrônico, fazem contato mais frequente com familiares que moramlonge, sem <strong>de</strong>slocamentos, o que para alguns é difícil ou inviável,permitindo-lhes, por exemplo, receber notícias <strong>de</strong> sobrinhos, netose bisnetos, em um intercâmbio intergeracional (Kachar, 2006[a]).E-mails, chats, conversas por meio <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> áudio e ví<strong>de</strong>o einternet colocam os cuidadores e profissionais da área da saú<strong>de</strong> emcontato com os idosos que permanecem em casa. Para tanto, é necessáriotreinar e conectar a terceira ida<strong>de</strong> com equipamentos a<strong>de</strong>quados,adaptados e configurados <strong>de</strong> acordo com suas dificulda<strong>de</strong>s e<strong>necessida<strong>de</strong>s</strong>.O correio eletrônico também é utilizado para a troca<strong>de</strong> e-mails que já circulam na re<strong>de</strong> sobre temas culturais,políticos, assim como poemas, crônicas e textos <strong>de</strong>autoajuda.Alguns sites se constituem em comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> intercâmbioentre usuários que gostam <strong>de</strong> escrever sobreseus sentimentos, inquietações e experiências ecompartilhá-los com os outros. As salas <strong>de</strong> bate-paposão ocupadas por pessoas acima <strong>de</strong> 50 anos, em geralmulheres. Algumas relações que se iniciam na re<strong>de</strong>A internetpossibilitaaos idosos a<strong>aprendizagem</strong>contínua, aampliaçãoda autonomia e dacomunicação, paramanter contatose estabelecernovas relações.23


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inclusão digital e terceira ida<strong>de</strong>Para saber mais• Centro <strong>de</strong> Referência do Envelhecimento (CRE) – Link <strong>de</strong>ntro do site doSesc que apresenta artigos sobre gerontologia distribuídos por tema.Disponível em: .• Mais <strong>de</strong> 50 – Portal com editorias sobre saú<strong>de</strong>, comportamento, beleza,cultura e lazer, nutrição, esportes etc., direcionadas às <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> dafaixa etária indicada. O usuário, ao se associar ao clube, tem acesso atodos os conteúdos, <strong>de</strong>scontos e serviços. Disponível em: .• Portal do Envelhecimento – Criado por alunos e professores do Programa<strong>de</strong> Estudos Pós-Graduados em Gerontologia e do Núcleo <strong>de</strong> Estudo e Pesquisado Envelhecimento (Nepe) da PUC-SP, permite a estudiosos da área e usuáriosinteressados no tema o acesso a informações sobre livros, pesquisasacadêmicas, notícias, entrevistas, leis e direitos dos idosos, vi<strong>de</strong>oteca etc.,com informações nacionais e internacionais. Disponível em: .prolongam-se a outros espaços, com encontros presenciais e coletivosentre os internautas, levando a vínculos e trocas afetivas nosgrupos (Goldman, 2002).A internet, portanto, cria um espaço para novas aprendizagens eformas <strong>de</strong> comunicação, diminuindo o isolamento e promovendoa autonomia, gerando novas oportunida<strong>de</strong>s e relações com o mundo,revitalizando as expectativas e os projetos <strong>de</strong> vida do indivíduo daterceira ida<strong>de</strong>, tornando-o mais presente e atuante na socieda<strong>de</strong>.b) Relatar por escrito e <strong>de</strong>pois compartilhar com os colegas comoapren<strong>de</strong>u informática, quem ensinou e quais foram os esforçosempreendidos, pon<strong>de</strong>rando sobre os aspectos positivos e osfatores dificultadores nas situações <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>.2. Solicitar que façam uma pesquisa em revistas, jornais e/ou sitessobre reportagens que tratam da interação da terceira ida<strong>de</strong> coma informática. Depois, <strong>de</strong>stacar pontos a serem compartilhadoscom os colegas sobre o impacto da informática e suas contribuiçõesna vida da terceira ida<strong>de</strong>.3. Orientá-los na elaboração <strong>de</strong> um pré-projeto <strong>de</strong> informática paraa terceira ida<strong>de</strong>, consi<strong>de</strong>rando a realida<strong>de</strong> da instituição, contendoos seguintes itens:a) objetivo geral e específico;b) público-alvo;c) metodologia;d) duração;e) recursos físicos.Socializar e discutir as propostas com a turma.Sugestões <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s pedagógicas para idosos1. Propor que reflitam sobre a <strong>aprendizagem</strong> do computador:a) Relembrar e relatar ao grupo o primeiro contato com o computadore i<strong>de</strong>ntificar os anseios, as dificulda<strong>de</strong>s, os erros, asexpectativas, os medos, entre outros sentimentos, dissertandosobre as impressões iniciais com a máquina.2425


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inclusão digital e terceira ida<strong>de</strong>Referências bibliográficasBrasil. Ministério da Ciência e Tecnologia. Programa Socieda<strong>de</strong> da Informação(SocInfo). Disponível em: .Acesso em: 17 fev. 2009.Néri, Anita Liberalesso (Org.). Idosos no Brasil: vivências, <strong>de</strong>safios e expectativasna terceira ida<strong>de</strong>. São Paulo: Fundação Perseu Abramo/Serviço Social doComércio (Sesc), 2007. Disponível em: . Acesso em: 30 abr. 2007.. Ministério das Comunicações. Governo Eletrônico – Serviço <strong>de</strong> Atendimentoao Cidadão (Gesac). Disponível em: .Acesso em: 8 fev. 2009.Costa, Leonardo Figueiredo. Inclusão Digital: conceitos, mo<strong>de</strong>lo e semânticas.In: Congresso Brasileiro <strong>de</strong> Ciências da Comunicação, 29, 2006, Brasília.Anais... Brasília: Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Brasília, 2006. Disponível em: . Acesso em:10 jan. 2009.Goldman, Sára Nigri. Internet e envelhecimento: um estudo exploratório <strong>de</strong> salas<strong>de</strong> bate-papo. In: XIII Congresso Brasileiro <strong>de</strong> Geriatria e Gerontologia, IICongresso <strong>de</strong> Geriatria e Gerontologia da SBGG-RJ, 19-22 jun. 2002. Disponívelem: .Acesso em: 2 maio 2005.Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística (IBGE). Idoso no mundo.Disponível em: .Acesso em: 20 ago. 2007.. Pesquisa Nacional por Amostra <strong>de</strong> Domicílios (Pnad) – 2007. Disponívelem: .Acesso em: 11 fev. 2009.Kachar, Vitória. A terceira ida<strong>de</strong> e a exploração do espaço virtual da internet. In:Côrte, Beltrina; Mercadante, Elisabeth Frohlich; Arcuri, Irene Gaeta(Orgs.). Envelhecimento e velhice: um guia para a vida. São Paulo: Vetor,2006[a].. Internet e terceira ida<strong>de</strong>: dificulda<strong>de</strong>s, interesses e benefícios. In: WorldCongress on Computer Science, Engineering and Technology Education(WCCSETE), 12-22 mar. 2006. Itanhaém, 2006[b].. Terceira ida<strong>de</strong> e informática: apren<strong>de</strong>r revelando potencialida<strong>de</strong>s. SãoPaulo: Cortez, 2003.2627


Pessoas com<strong>de</strong>ficiência intelectuale envelhecimento dasfamílias cuidadorasMaria Amélia Vampré Xavier


Assim... Ambos assim, no mesmo passo,Iremos percorrendo a mesma estrada;Tu – no meu braço trêmulo amparada,Eu – amparado no teu lindo braço.Ligados neste arrimo, embora escasso,Venceremos as urzes da jornada...[...]Mário Pe<strong>de</strong>rneiras.Contextualização da <strong>de</strong>ficiência intelectualMaria Amélia Vampré Xavier é diretora para Assuntos Internacionais da Fe<strong>de</strong>ração Nacionaldas Apaes (Fenapaes), que conta em todo o Brasil com 2.012 organizações <strong>de</strong> famílias<strong>de</strong> nome Apae.Representante do Brasil na Força-Tarefa <strong>de</strong> Comunicação nas Américas da organizaçãomundial <strong>de</strong> famílias Inclusion International, que coor<strong>de</strong>na o trabalho no mundo <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong>200 organizações nacionais <strong>de</strong> famílias com um filho com <strong>de</strong>ficiência intelectual e representa50 milhões <strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual.Membro do Conselho <strong>de</strong> Administração da entida<strong>de</strong> Sorri Brasil, do Grupo <strong>de</strong> Informações daAssociação Carpe Diem, da Re<strong>de</strong> Brasileira <strong>de</strong> Entida<strong>de</strong>s Filantrópicas (Rebrates) da InclusionInteramericana, braço da Inclusion International que representa as associações <strong>de</strong> famílias emtodo o continente americano que lutam pelos direitos dos filhos com <strong>de</strong>ficiência intelectual.Durante algum tempo, houve certa relutância noBrasil em aceitar que se dissesse “<strong>de</strong>ficiênciaintelectual” em alusão à <strong>de</strong>ficiência <strong>de</strong> aprendizado,ao aprendizado lento e a outras limitações,apesar <strong>de</strong> todos os documentos vindos do exteriornesses primeiros anos do século XXI mencionaremintellectual disabilities, discapacidad intelectualetc. Alegava-se que a Constituição brasileiramenciona “<strong>de</strong>ficiência mental” e que a expressãonão po<strong>de</strong>ria ser alterada, mas os fatos mudam ehoje ela é aceita <strong>de</strong> forma generalizada.Essa mudança <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição teve início em setembro<strong>de</strong> 2000, durante uma assembleia mun-31


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadoras“Não queremosmais serchamados<strong>de</strong> <strong>de</strong>ficientesmentais, e sim<strong>de</strong> ‘pessoascom <strong>de</strong>ficiênciaintelectual’,pois não somosdoentes mentais.”dial <strong>de</strong> organizações <strong>de</strong> famílias filiadas à Inclusion International, nacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cork, Irlanda. Dela participaram, como <strong>de</strong>scrito maisadiante, os auto<strong>de</strong>fensores, ou seja, as pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectualque se expressam e reivindicam por si mesmas o que querem.Como em muitos países há gran<strong>de</strong> confusão entre “doença mental”e “<strong>de</strong>ficiência mental”, os auto<strong>de</strong>fensores em Cork <strong>de</strong>clararam: “Nãoqueremos mais ser chamados <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficientes mentais, e sim <strong>de</strong> ‘pes soascom <strong>de</strong>ficiência intelectual’, pois não somos doentes mentais”.A questão das pessoas com <strong>de</strong>ficiências <strong>de</strong> diversos tipos, entre elas a<strong>de</strong>ficiência mental, atualmente conhecida na maioria dos paísescivilizados como “<strong>de</strong>ficiência intelectual”, foi tratada com totalincompreensão durante séculos. Aliás, em muitos lugares essa displicênciase acentuou nas últimas décadas, quando se chegou àconclusão <strong>de</strong> que enfrentar os <strong>de</strong>safios <strong>de</strong> incluir na socieda<strong>de</strong>, comoum direito humano, pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual representariaum ônus enorme para o governo, uma vez que gran<strong>de</strong> segmentoda população teria <strong>de</strong> receber cuidados médicos. As escolas,então, simplesmente ignoravam alunos com dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aprendizadoe outros transtornos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento por consi<strong>de</strong>rá-los“incapazes” <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r.No Brasil, alguns professores, na década <strong>de</strong> 1920, empenharam-seem conseguir ensino especial para crianças com<strong>de</strong>ficiência intelectual. Foram experiências difusas, algumasem Minas Gerais, outras em Campinas, Estado <strong>de</strong> SãoPaulo, e em outros lugares, que, no entanto, acabaramcaindo na vala comum, porque, naquela época, problemascomo esse não eram consi<strong>de</strong>rados obrigação do governo.As pessoas com <strong>de</strong>ficiência não interessavam ao censo <strong>de</strong>mográficoe por muito tempo foram classificadas como“incapazes, semelhantes a silvícolas e outros grupos minoritários”,não tendo nenhuma proteção da lei.Nas primeiras décadas do século XX, em muitos países, entre elesEstados Unidos, Canadá e, com muito maior força, Brasil e outros daAmérica Latina, a <strong>de</strong>ficiência mental, ou “<strong>de</strong>bilida<strong>de</strong> mental”, eraconsi<strong>de</strong>rada uma <strong>de</strong>sgraça que acometia algumas crianças, que precisavamser escondidas da vista <strong>de</strong> todos, pois o fato <strong>de</strong> terem nascidocom “mongolismo”, como se dizia então, um problema genético queafetava seu <strong>de</strong>senvolvimento, se <strong>de</strong>via, certamente, a algum <strong>de</strong>slizepraticado pelo pai ou pela mãe. Era como se um castigo divino seabatesse sobre a família, que tinha <strong>de</strong> explicar aos parentes e amigosuma situação <strong>de</strong>sagradável, nociva, vergonhosa que ela mesma nãoconseguia compreen<strong>de</strong>r.Era mais fácil, então, manter o filho “<strong>de</strong> cabeça fraca”, como se dizia,totalmente afastado da socieda<strong>de</strong>. Os pais abonados internavam aeduardo barcellos3233


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadorascriança em instituições especializadas, para receber os cuidados penososque eles se recusavam a dar por não enten<strong>de</strong>rem bem o quehavia <strong>de</strong> fora <strong>de</strong> comum.As famílias brasileiras ilustres costumavam mandar os filhos paraseus sítios e fazendas, <strong>de</strong>ixando-os aos cuidados <strong>de</strong> algum empregado,e nunca os visitavam. Em muitos casos, assim que a criançacom <strong>de</strong>ficiência mental nascia, os pais a isolavam em uma das poucase caras instituições, e às vezes nem os outros filhos sabiam daexistência daquele irmão, consi<strong>de</strong>rado uma vergonha enorme paratodos os parentes.O difícil diálogo entre pais e médicoseduardo barcellosPor muito tempo se acreditou que a <strong>de</strong>ficiência mental, ou “retardamentomental”, como também se dizia, fosse uma condição reservadaapenas à infância, e os jovens que tivessem <strong>de</strong>ficiências <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento,entre elas a síndrome <strong>de</strong> Down e outros problemascongênitos, eram consi<strong>de</strong>rados “crianças retardadas”. Nos anos 40,50 e 60, os médicos usavam um linguajar muito duro com os paisaflitos. Não lhes explicavam que tinham um filho com dificulda<strong>de</strong>s,que teriam <strong>de</strong> superar seus naturais sentimentos <strong>de</strong> perda, <strong>de</strong> lutomesmo, pelo nascimento <strong>de</strong> uma criança atípica, um processo muitonatural, que po<strong>de</strong> ocorrer em qualquer família, e que <strong>de</strong>veriam aceitá-lacomo alguém importante, querido, por quem vale a pena lutar.Os médicos não diziam aos pais que toda criança necessita receberamor, especialmente as mais vulneráveis, apenas <strong>de</strong>stacavam os aspectosnegativos do fato.Essa falta <strong>de</strong> comunicação entre pais e profissionais da saú<strong>de</strong> era umarepresentação muito clara do que então se intitulava “mo<strong>de</strong>lo médico”,ou seja, os médicos eram onipotentes, todo-po<strong>de</strong>rosos, tinham achave da ciência para <strong>de</strong>terminar o que aquela criança sofreria atéchegar, se chegasse, à adolescência, quando, então, a morte se encarregaria<strong>de</strong> dar um final à tristeza da família, <strong>de</strong> tornar sua vida maisleve. Os pais, portanto, eram tratados sempre a distância e não comocolaboradores efetivos dos processos educacionais e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> pelosquais o filho tivesse <strong>de</strong> passar.No início dos anos 60, quando as primeiras organizações <strong>de</strong> famíliascom filho com <strong>de</strong>ficiência intelectual estavam se constituindo emdiversos países, todos <strong>de</strong>senvolvidos, claro, como Estados Unidos,Canadá, Inglaterra, Dinamarca e Suécia, houve uma série <strong>de</strong> realizaçõesque enfatizavam a questão <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ficiência mental era assunto médicoe se referia apenas a crianças. O filme cana<strong>de</strong>nse Eternal children(Crianças eternas), famoso na época, retrata bem essa situação. É umarepresentação muito clara <strong>de</strong> que <strong>de</strong>ficiência ou retardamento mental,hoje intelectual, era algo que se limitava a crianças e que, pior ainda,essas pessoas ficavam presas à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que eram crianças para sempre.Então, por que se preocupar em treiná-las, <strong>de</strong>senvolvê-las, para que3435


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadorasA Convençãosobre os Direitosdas Pessoas comDeficiência setornou o pontomais importantedos trabalhosem prol <strong>de</strong> pessoascom <strong>de</strong>ficiência,incluindoa intelectual.36mais tar<strong>de</strong> ingressassem no mercado <strong>de</strong> trabalho ou tivessem direito alazer com os amigos que escolhessem e a ter uma vida mais autônoma,conforme as circunstâncias permitissem?Com as dificulda<strong>de</strong>s que as crianças e jovens tinham a enfrentar, e comoa medicina não havia alcançado os extraordinários progressos que registraatualmente, era natural que não existisse a preocupação <strong>de</strong> comodar qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida a pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual, como expandirseus direitos e tê-los oficialmente reconhecidos pelos governos.A Convenção sobre os Direitosdas Pessoas com DeficiênciaNesta primeira década do século XXI, a Organização Mundialda Saú<strong>de</strong> (OMS), com toda a experiência acumuladaem muitos anos <strong>de</strong> pesquisas, sempre baseadas em mo<strong>de</strong>lomédico, passou a reconhecer e a aceitar o trabalho voluntário,<strong>de</strong>dicado, constante, incansável dos pais comfilho com <strong>de</strong>ficiência intelectual no mundo inteiro. Emoutubro <strong>de</strong> 2004, em Montreal, Canadá, patrocinou aConferência Internacional sobre Deficiência Intelectual,da qual participaram 25 pais (e mães) consi<strong>de</strong>rados autorida<strong>de</strong>sem <strong>de</strong>ficiência intelectual na América Latina. Fuia mãe escolhida em nome do Brasil e guardo ótima recordaçãodos três dias estudando os direitos fundamentais daspessoas com <strong>de</strong>ficiência.Como acontece em eventos como esse, cada país foi representado porum pai ou mãe e um psiquiatra ou outro profissional da saú<strong>de</strong>, e nós,os pais, somos tidos pela OMS como “os melhores especialistas”, umavez que <strong>de</strong>dicamos todos os nossos esforços à reabilitação e encaminhamento<strong>de</strong> nossos filhos à comunida<strong>de</strong>, sempre <strong>de</strong>monstrandoprofundo sentimento <strong>de</strong> afeto e <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> humana em relaçãoa essas pessoas tão especiais.Sem dúvida, a conferência <strong>de</strong> Montreal foi fundamental para queincentivássemos diversos grupos <strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiência, em todoo mundo, que já reivindicavam uma Convenção sobre os Direitosdas Pessoas com Deficiência, por acreditarem que esse seria o documento-chavepara sua vida.Aprovada em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2006 pela Assembleia Geral das NaçõesUnidas, tal convenção se tornou o ponto mais importante dos trabalhosem prol <strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiência em geral, principalmente <strong>de</strong>nossos filhos com <strong>de</strong>ficiência intelectual, pois durante muitas décadasforam o segmento mais esquecido entre os <strong>de</strong>mais, o mais <strong>de</strong>svalorizado,o mais atingido pela pobreza.A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência entrouem vigor em maio <strong>de</strong> 2008, quando o vigésimo país a ratificou,aprovando seu conteúdo. Atualmente, mais <strong>de</strong> uma centena <strong>de</strong>países já ratificou o documento, entre eles o Brasil, que o fez emagosto <strong>de</strong> 2008.Os artigos que compõem a convenção foram exaustivamente <strong>de</strong>batidose estudados pelas próprias pessoas com <strong>de</strong>ficiência, e issofoi fundamental para que o documento seja hoje consi<strong>de</strong>radoem todo o mundo um instrumento importantíssimo para a verda<strong>de</strong>irainclusão social, educacional, profissional <strong>de</strong> pessoascom <strong>de</strong>ficiência, entre elas as com <strong>de</strong>ficiência intelectual.A Liga InternacionalUm gran<strong>de</strong> marco na <strong>de</strong>fesa dos direitos das pessoascom <strong>de</strong>ficiência intelectual foi a criação, nos anos 60,da Liga Internacional <strong>de</strong> Associações Pró-Pessoas comDeficiência Intelectual (hoje chamada Inclusion International)em Bruxelas, capital da Bélgica. Por intermédio<strong>de</strong> suas li<strong>de</strong>ranças, principalmente <strong>de</strong> famílias, começoua irradiar informações, a divulgar livros escritos por pais37


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadorassobre o filho com <strong>de</strong>ficiência intelectual, a distribuir materiais educacionaissobre coisas simples, como esquema corporal e formas <strong>de</strong>ensinar crianças com dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aprendizado.A Liga Internacional foi se fortalecendo sobretudo graças à atuação<strong>de</strong> um casal que se tornou famoso em muitos países, o advogadoalemão Gunnar Dybwad e a socióloga norte-americana Rosemary F.Dybwad, que se empenharam para que os pais no mundo todo seorganizassem em prol <strong>de</strong> seus filhos com <strong>de</strong>ficiência intelectual.No Brasil, principalmente <strong>de</strong>pois que a Organização das Nações Unidaspara a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) convocou educadores<strong>de</strong> todo o mundo para se reunirem em Salamanca, Espanha,em junho <strong>de</strong> 1994, em torno da i<strong>de</strong>ia “educação para todos”, a situaarquivoapae <strong>de</strong> são pauloA Associação dos Pais e Amigosdos Excepcionais (Apae) <strong>de</strong> São PauloTivemos a sorte, em São Paulo, <strong>de</strong> ter na Apae uma gran<strong>de</strong> mãe,fundadora da entida<strong>de</strong> paulistana em 1960 com um grupo <strong>de</strong> pais,entre os quais estávamos meu marido e eu. Poliglota, moça culta,com boa situação econômica e <strong>de</strong> espírito muito elevado, AldaMoreira Estrázulas é ainda hoje citada como lí<strong>de</strong>r mundial, que <strong>de</strong>fato foi, pois não limitou sua ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mãe pioneira à Apae <strong>de</strong>São Paulo.Alda e eu instalamos, em 1962, um mo<strong>de</strong>sto escritório, com umamáquina <strong>de</strong> escrever e uma escrivaninha muito velhas, no meio <strong>de</strong>uma sala da instituição. Enquanto outras pessoas discutiam diversosproblemas da Apae, nós escrevíamos para o exterior e nos informávamosdo que estava acontecendo na Dinamarca, nos Estados Unidos ou naInglaterra, entre outros países que mantinham contato conosco.Em junho <strong>de</strong> 1966, a convite <strong>de</strong> Alda Moreira Estrázulas, recebemosa primeira visita <strong>de</strong> Gunnar e Rosemary Dybwad em São Paulo paraconversar conosco, fazer palestras, explicar suas i<strong>de</strong>ias tão avançadaspara a época, em prol <strong>de</strong> nossos filhos com <strong>de</strong>ficiência intelectual.Logo <strong>de</strong> início percebemos que as poucas classes e escolas especiaismantidas pelo governo do Estado, assim como as creches municipais,estavam muito longe dos padrões que o casal Dybwad sustentava,<strong>de</strong>fensor do convívio <strong>de</strong> crianças com <strong>de</strong>ficiência, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> bebês, comoutras que não a tivessem. Nenhum outro casal, famoso e muitoexperiente, compartilhou com tanta simplicida<strong>de</strong> e sabedoria conceitosque conduziriam à inclusão da pessoa com <strong>de</strong>ficiência intelectualna educação, nos serviços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, na preparação profissional e nomercado <strong>de</strong> trabalho. Tudo o que se sabe hoje no mundo todo sobrepessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual tem a sementinha plantada porGunnar e Rosemary Dybwad. Ambos fizeram mais por milhões <strong>de</strong>pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual do que já se conseguiu porque seu<strong>de</strong>votamento a nossa causa era imenso e total!3839


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadorasSegundo a ONU,10% da populaçãomundial éconstituída porpessoas comalgum tipo <strong>de</strong><strong>de</strong>ficiência.No Brasil,essa populaçãoé <strong>de</strong> 14,5%.ção começou a melhorar. Crescia a conscientização da necessida<strong>de</strong><strong>de</strong> que crianças com <strong>de</strong>ficiência intelectual nãofossem ensinadas em escolas especiais, como as das Apaes,que prestam bons serviços, mas não são inclusivas, ou seja,não abrangem as diferentes raças, culturas e outras característicasque compõem a diversida<strong>de</strong> humana.Discussões infindáveis passaram a ser travadas em todo opaís entre aqueles que <strong>de</strong>fendiam que crianças com <strong>de</strong>ficiência,incluindo a intelectual, <strong>de</strong>veriam estudar em ambientesprotegidos, como os das Apaes, e os articuladoresda inclusão educacional, que consi<strong>de</strong>ravam um direitoinalienável <strong>de</strong>ssas crianças estudar com amigos, primos e irmãos naescola próxima <strong>de</strong> casa. Essas escolas, no entanto, <strong>de</strong>veriam oferecernão apenas currículos adaptados e estratégias pedagógicas que contemplassemalunos com <strong>de</strong>ficiência intelectual, mas também acessibilida<strong>de</strong>,já que eles têm frequentemente mobilida<strong>de</strong> reduzida e nãoconseguem enfrentar escadas, terrenos muito íngremes e todo tipo<strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong> para chegar à sala <strong>de</strong> aula.Ainda hoje, muitos educadores, não preparados para aceitar a diversida<strong>de</strong>humana proposta pela educação inclusiva, mostram evi<strong>de</strong>ntemá vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> aceitar em sua sala <strong>de</strong> aula alunos com <strong>de</strong>ficiência, porrepresentarem um <strong>de</strong>safio difícil. O que eles não sabem é que resultados<strong>de</strong> boas práticas educacionais em todo o mundo comprovam aimportância da educação inclusiva, porque esse ambiente <strong>de</strong> pertencimentofará com que os outros alunos, sem <strong>de</strong>ficiência, <strong>de</strong>senvolvamdisponibilida<strong>de</strong> afetiva em relação a coleguinhas com dificulda<strong>de</strong>s,tornando todas as crianças elementos que sempre contribuirão muitopara a aceitação do próximo como alguém importante. Os própriosprofessores também crescem e se <strong>de</strong>senvolvem espiritualmente comesse gran<strong>de</strong> mas maravilhoso <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> aceitar alunos com dificulda<strong>de</strong>sna sala <strong>de</strong> aula.eduardo barcellosA população brasileira com alguma <strong>de</strong>ficiênciaA Organização das Nações Unidas (ONU) estima que 10% da populaçãomundial é constituída por pessoas com algum tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência.No Brasil, segundo o Censo Demográfico <strong>de</strong> 2000, 14,5%da população tem alguma <strong>de</strong>ficiência, ou seja, um contingente <strong>de</strong>mais <strong>de</strong> 24 milhões <strong>de</strong> pessoas.Nas cida<strong>de</strong>s brasileiras, as pessoas com <strong>de</strong>ficiência quase não sãovistas nas ruas, nos ônibus, nas escolas, nos cinemas, nos restaurantes,pouco aparecem na televisão, na política etc., contrariamente ao queacontece em países <strong>de</strong> bons programas sociais, como o Canadá.Os especialistas e observadores em geral dizem que essa “invisibilida<strong>de</strong>”,amplamente reconhecida, é o resultado <strong>de</strong> umcírculo vicioso: as pessoas com <strong>de</strong>ficiência são poucovistas nas ruas porque a maioria dos ambientes não éacessível e a maioria dos ambientes não é acessívelporque quase não se veem pessoas com <strong>de</strong>ficiêncianas ruas. 11. Para mais informações, ver olivro: Re<strong>de</strong> Saci, projeto da USP.Educação inclusiva: o que o professortem a ver com isso?. SãoPaulo: Imprensa Oficial do Estado<strong>de</strong> São Paulo (Imesp), 2006.Portanto, a acessibilida<strong>de</strong> tornou-se um objetivo primordialpara a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> brasileiros com <strong>de</strong>ficiência.Grupos muito ativos <strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiênciaem todo o país têm lutado por esse direito ina lienável<strong>de</strong> qualquer cidadão: ter a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> locomover-se<strong>de</strong> um lugar para outro sem <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> alguémpara carregá-lo, empurrá-lo etc., porque háburacos no asfalto, <strong>de</strong>graus inacessíveis, enfim,uma série <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong>s que o cidadãocomum não percebe, pois não temlimitações físicas.A já citada iniciativa da Unesco <strong>de</strong>promover uma gran<strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> es-4041


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadoraspecialistas em educação do mundo inteiro em Salamanca, em junho<strong>de</strong> 1994, teve gran<strong>de</strong> importância, porque foi o divisor <strong>de</strong> águasentre a conceitualização até ali aceita <strong>de</strong> que crianças sem <strong>de</strong>ficiência<strong>de</strong>viam estudar em escolas comuns, vizinhas a suas casas, e criançascom algum tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>ficiência tinham <strong>de</strong> frequentar classesespeciais, com métodos pedagógicos específicos. Isso criou a i<strong>de</strong>ia<strong>de</strong> que essas crianças não <strong>de</strong>vem estudar juntas, o que contraria umdos mais elementares direitos humanos:o <strong>de</strong> que todos po<strong>de</strong>mos viverjuntos como parte da comunida<strong>de</strong> edar nossa contribuição, sejam quaisforem os empecilhos ou limites colocadosdiante <strong>de</strong> nós.eduardo barcellosSeguindo o princípio da educaçãopara todos, o Brasil assumiu o compromisso<strong>de</strong> que todas as criançastêm o direito <strong>de</strong> estudar juntas, salvonos raros casos em que <strong>de</strong> fato seimpõem outras soluções. A questão,no entanto, vem gerando, sobretudono último <strong>de</strong>cênio, gran<strong>de</strong> polêmicanacional, que não tem se realizadosem mágoas, sem sofrimentos,sem profundos medos e incertezasdos pais <strong>de</strong> crianças com <strong>de</strong>ficiência,receosos <strong>de</strong> que os filhos, ao estudaremcom alunos mais bem-dotadosou sem problemas <strong>de</strong> aprendizado,sejam repelidos por esses colegas,com zombarias, apelidos <strong>de</strong>strutivose outras atitu<strong>de</strong>s negativas.Ainda hoje muitos educadores brasileiros, malgradoos expressivos esforços do Ministério da Educação,recusam-se a aceitar alunos com alguma <strong>de</strong>ficiênciaem suas classes, <strong>de</strong>clarando que não foram preparadospara enfrentar os <strong>de</strong>safios, os problemas que criançascom limitações muitas vezes impõem. Esses professores,cujo número vem diminuindo gradativamente,teriam <strong>de</strong> reformular primeiro os próprios valores,refletir sobre o motivo <strong>de</strong> terem escolhido a nobremissão <strong>de</strong> ensinar. Os ganhos que um professor conquistaquando consegue dar apoio e orientação a umacriança com <strong>de</strong>ficiên cia, seja qual for, sobretudo a intelectual,são enormes para sua felicida<strong>de</strong> pessoal, suasensação <strong>de</strong> bem-estar com a vida, por crescer com os problemasdos alunos, adquirindo confiabilida<strong>de</strong> e reforçando a autoestima.Sabemos, pois, que foram os pais os gran<strong>de</strong>s artífices <strong>de</strong> um mundoque se dispusesse a bem receber seus filhos com limitações, mas,certamente, com qualida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caráter que só quem convive intimamentecom pessoas com <strong>de</strong>ficiência é capaz <strong>de</strong> reconhecer eaquilatar.Os auto<strong>de</strong>fensoresA convenção nãopropõe direitosnovos parapessoascom <strong>de</strong>ficiência,mas explica<strong>de</strong> que modoos direitos queelas já têm<strong>de</strong>vem serpromovidose protegidos.No começo dos anos 70, surgiu o movimento New Voice (Nova Voz),uma manifestação a princípio pequena e <strong>de</strong>sorganizada, <strong>de</strong>pois cadavez mais bem estruturada. Jovens e adultos com <strong>de</strong>ficiência intelectualque a<strong>de</strong>rem a esse movimento são conhecidos, no Brasil, como“auto<strong>de</strong>fensores” e, na Argentina, no México e em outros países <strong>de</strong>língua espanhola, como “personas primero”. São grupos <strong>de</strong> pessoasque se organizam, se preparam para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r os próprios interesses,mesmo que tenham dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> fala e necessitem, com frequência,<strong>de</strong> alguém que as oriente ou seja sua “pessoa <strong>de</strong> apoio”.4243


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadoras“Não queremosque previnamnosso nascimento.Queremos serincluídos,queremos ser parteda comunida<strong>de</strong> emque vivemos,queremos vivervidas felizes, serrespeitados portodos, e nãopo<strong>de</strong>mos aceitariniciativas que nos<strong>de</strong>svalorizem.”44Os grupos mais organizados vêm <strong>de</strong> países adiantados. NaNova Zelândia, on<strong>de</strong> os auto<strong>de</strong>fensores são chamados <strong>de</strong>“people first”, eles foram responsáveis pelo fechamento<strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 3 mil instituições <strong>de</strong> acolhimento <strong>de</strong> pessoasadultas com <strong>de</strong>ficiência intelectual. Não se concebe maisaquela situação difícil que ocorria nos anos 30, 40, 50,quando pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual ficavam confinadasem hospitais-lares, nosocômios com espaço para amoradia <strong>de</strong> 8 mil pessoas, on<strong>de</strong> não havia nenhuma privacida<strong>de</strong>.Esses “<strong>de</strong>pósitos” <strong>de</strong> gente sofrida, esquecida, maltratada,sem direito algum eram comuns na Inglaterra, nosEstados Unidos e em outros países <strong>de</strong>senvolvidos e aindaexistem no Leste Europeu, a região mais pobre e mais sofridada Europa, em que os direitos do cidadão tambémsão muito <strong>de</strong>srespeitados, como acontece no Oriente, nocontinente americano e em outras partes do mundo.A primeira auto<strong>de</strong>fensora a se apresentar na ONU foi a cana<strong>de</strong>nseBarb Goo<strong>de</strong>, em 1992, que ali compareceu acompanhada do entãopresi<strong>de</strong>nte da organização mundial <strong>de</strong> famílias Inclusion International,o sueco Victor Wahlstrom. Sua participação foi um enorme sucesso,além <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> surpresa!Em 2006, como visto, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovoua Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, o primeirodocumento cuja elaboração contou com o envolvimento direto<strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiência. Entre outros pontos importantes, aconvenção:1. Não propõe direitos novos para pessoas com <strong>de</strong>ficiência, mas explica<strong>de</strong> que modo os direitos que elas já têm <strong>de</strong>vem ser promovidose protegidos.2. Diz aos governos <strong>de</strong> que forma promover e apoiar os direitos <strong>de</strong>seus cidadãos com <strong>de</strong>ficiência.3. Afirma que, uma vez que um governo assine a convenção, <strong>de</strong>verespeitar esses direitos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> suas leis. As Nações Unidas monitorarãoesses governos para terem a garantia <strong>de</strong> que estão fazendoo que a convenção estabelece.A convenção reconhece que a família exerce papel fundamental navida <strong>de</strong> crianças e adultos com <strong>de</strong>ficiência e que ela precisa receberapoio. Para as crianças, a família representa o vínculo com todos osaspectos da comunida<strong>de</strong>: escola, recreação, re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho social,saú<strong>de</strong>, entre outros; para os adultos, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apoio e inclusãona comunida<strong>de</strong>.Uma das questões que mais perturbam as famílias e os própriosauto<strong>de</strong>fensores está incluída no artigo 10: o direito à vida. Os auto<strong>de</strong>fensores,em suas contínuas manifestações em <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> seusinteresses e <strong>de</strong> sua humanida<strong>de</strong>, chamam a atenção para o fato <strong>de</strong>que existem pesquisas científicas que indicam a adoção <strong>de</strong> fórmulaspara impedir o nascimento <strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiên cia intelectual.Alertam que isso já está ocorrendo com pessoas com síndrome <strong>de</strong>Down e que provavelmente outros grupos com problemas genéticospo<strong>de</strong>rão ser afetados. Dizem eles com veemência: “Não queremosque previnam nosso nascimento. Queremos ser incluídos, queremosser parte da comunida<strong>de</strong> em que vivemos, queremos viver vidasfelizes, ser respeitados por todos, e não po<strong>de</strong>mos aceitar iniciativasque nos <strong>de</strong>svalorizem”.Uma vez que por séculos consecutivos as pessoas com <strong>de</strong>ficiência <strong>de</strong>qualquer tipo foram excluídas da comunida<strong>de</strong>, em muitas ocasiõesescondidas dos próprios familiares por causa <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias preconceituosas<strong>de</strong> “ira divina”, <strong>de</strong> “maldição”, <strong>de</strong> “vergonha para a família”, osprogramas sociais eram contra a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que pessoas comsíndrome <strong>de</strong> Down ou outros problemas genéticos, consi<strong>de</strong>radas“incapazes”, se casassem e tivessem filhos. Essa situação vem mudando,embora muito vagarosamente.45


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadorasComo todas as pessoas com <strong>de</strong>ficiência querem para si, e com justiça,o mesmo tratamento igualitário <strong>de</strong> qualquer cidadão, um casal<strong>de</strong> pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual, por exemplo, que tiver umfilho – o que tem ocorrido, em pequena escala, em diversos lugaresO que dizem os auto<strong>de</strong>fensores sobre famíliaO neozelandês Robert Martin, que tem <strong>de</strong>ficiência intelectual, morou muitosanos em uma instituição rígida e fechada em seu país e se tornou o gran<strong>de</strong>lí<strong>de</strong>r mundial dos auto<strong>de</strong>fensores, em vista <strong>de</strong> seu constante trabalho <strong>de</strong>esclarecimento e participação no conselho diretor da Inclusion International.Afirma ele:Fazendo parte <strong>de</strong> uma famíliaAcredito que todas as crianças têm direito <strong>de</strong> crescer como parte <strong>de</strong> suaprópria família. Sei através <strong>de</strong> minha própria experiência como isso éimportante. É bastante triste que aqueles <strong>de</strong> nós que mais precisamos <strong>de</strong>nossas famílias enfrentamos o maior risco <strong>de</strong> sermos separados <strong>de</strong> nossasfamílias. Um número gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> nós, por termos uma <strong>de</strong>ficiência, somoscolocados em lares adotivos e não moramos com nossos pais... Acreditoque uma família que permanece unida cresce unida. Deve ser direito <strong>de</strong>toda criança fazer parte <strong>de</strong> sua própria família.Ser queridoAcredito que toda criança tem o direito <strong>de</strong> ser amada e <strong>de</strong> transmitir amor.Sei o que a gente sente quando cresce sem esse amor. Cresci com membros<strong>de</strong> equipes e com estranhos. A equipe e os médicos iam para casa ter comsua família. Deixavam-me para trás na instituição, chorando. Não aprendiquando criança a transmitir amor. Fiz a única coisa que sabia, que erabrigar para ter o que queria. Levei muito tempo para perceber que issoestava errado. Levei muito tempo para apren<strong>de</strong>r a amar.A auto<strong>de</strong>fensora Mia Farah, da Associação <strong>de</strong> Famílias do Líbano, que tem umfilho com <strong>de</strong>ficiência intelectual, é muito resoluta. Em janeiro <strong>de</strong> 2008, veioao Brasil para participar <strong>de</strong> importante evento sobre educação para todos.Deu seu <strong>de</strong>poimento durante a Assembleia Mundial da Global Education Allianceem São Paulo, propondo que todos os alunos com <strong>de</strong>ficiência fizessem partedos programas educacionais dos países. A jovem afirma:Família é muito importante para nós.Ensino a meus pais muita coisa sobre síndrome <strong>de</strong> Down.Eles conhecem a minha condição.Eles sabem o que eu posso fazer, o que quero fazer.Eles conhecem meus sonhos, meus sentimentos.É por isso que eles po<strong>de</strong>m me ajudar.Quando eu era bebê, meus pais falavam em meu nome.Porém sei que posso falar por mim mesma e eles estão por perto parame ajudar.Fui para a escola. Aprendi acerca <strong>de</strong> meus direitos.Falei com meus pais acerca disso e eles me ajudam a tomar <strong>de</strong>cisões.– precisará contar com o apoio constante da família mais próxima,para garantir uma criação a<strong>de</strong>quada e uma vida saudável à criançaque nasceu.Muitas famílias acham terrível a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter um netinhonascido <strong>de</strong> um casal com <strong>de</strong>ficiência e, em muitos casos, mandamesterilizar as filhas ainda pequenas. Essa prática po<strong>de</strong> ser razoavelmentecomum, mas, com certeza, contraria todos os avanços quetêm sido registrados quanto aos direitos adquiridos das pessoas com<strong>de</strong>ficiência.E sobre trabalhoAs observações <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>fensores <strong>de</strong> muitos países a esse respeito são clarase imperativas:• A maioria <strong>de</strong> nós, que temos <strong>de</strong>ficiência intelectual, temos sido excluídos daforça <strong>de</strong> trabalho remunerada.• Alguns <strong>de</strong> nós fomos colocados em oficinas <strong>de</strong> trabalho on<strong>de</strong>, na melhor dashipóteses, recebemos pagamento muito reduzido.• Isso reforçou as atitu<strong>de</strong>s negativas, quanto a nosso valor, na mente <strong>de</strong> outraspessoas. Isso quebra nosso espírito.• Nossa falta <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conseguir trabalho remunerado fez com quemuitos <strong>de</strong> nós permanecêssemos aprisionados na pobreza.4647


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Pessoas com <strong>de</strong>ficiência intelectual e envelhecimento das famílias cuidadoraseduardo barcellos• Promover oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> autoemprego.• Oferecer apoio para que pessoas com <strong>de</strong>ficiência participem <strong>de</strong>trabalho remunerado.48No mundo todo a tendência é fazer com que pessoas com <strong>de</strong>ficiência,sobretudo intelectual, tenham direito ao próprio corpo, a manifestarsua sexualida<strong>de</strong> da forma que lhes parecer mais viável, a ter uma vidaemocional plena, como qualquer outra pessoa.Entretanto, como toda mudança causa sofrimento, há a possibilida<strong>de</strong><strong>de</strong> que a família imediata não tenha condições <strong>de</strong> criar <strong>de</strong> formaa<strong>de</strong>quada o filho da pessoa com <strong>de</strong>ficiência, legítimo membro da família.Em casos assim, os Estados signatários da Convenção sobre osDireitos das Pessoas com Deficiência têm <strong>de</strong> fazer o máximo esforçopara fornecer cuidados alternativos <strong>de</strong>ntro da família maior ou, se issonão for possível, <strong>de</strong>ntro da comunida<strong>de</strong>, em um ambiente familiar.A convenção também exige dos governos que a ratificaram:• Não permitir a discriminação com base na <strong>de</strong>ficiência.• Possibilitar o acesso das pessoas com <strong>de</strong>ficiência a treinamentovocacional.• Garantir seu direito <strong>de</strong> procurar emprego tanto no setor públicocomo no privado.O envelhecimento das famílias cuidadorasUma questão muito importante, que vem surgindo nos últimos anosem São Paulo, Brasília, Minas Gerais e outras partes do Brasil e domundo, é a do envelhecimento das famílias cuidadoras, ou seja, <strong>de</strong> paiscomo nós, que há quase 50 anos damos apoio e procuramos cuidare organizar a vida <strong>de</strong> nosso filho.Não é fácil envelhecer com um filho com <strong>de</strong>ficiência intelectual, porqueele está sujeito às mesmas enfermida<strong>de</strong>s que acometem as outraspessoas quando estão envelhecendo, em geral a partir dos 50 anos.É um período crítico, em que a mulher que foi mãe durante todaa vida <strong>de</strong> uma pessoa com <strong>de</strong>ficiência está sobrecarregada <strong>de</strong> problemas,tensões, casos <strong>de</strong> pressão alta ou outros males e, assim mesmo,precisa <strong>de</strong>dicar a maior parte do tempo a esse filho. Há relatos<strong>de</strong> pais na faixa dos 80 e poucos anos cuja memória começa a falhar.E <strong>de</strong> que forma po<strong>de</strong>rá um pai, uma mãe com artrite reumatoi<strong>de</strong>,diabetes ou outro problema que exija cuidados médicosespecíficos cuidar também das ativida<strong>de</strong>s diárias dofilho que envelhece?Esse é um aspecto <strong>de</strong> nossa luta <strong>de</strong> família engajada háquase 50 anos com esses problemas sérios, que têmmerecido muita atenção nos dias <strong>de</strong> hoje. Vemos comsatisfação que estão se formando, especificamente emSão Paulo, grupos <strong>de</strong> estudo do envelhecimento dosquais fazem parte gerontólogos, cuidadores, psicólogos,assistentes sociais, pessoas cujo maior i<strong>de</strong>al na vida é serútil a outros cidadãos, a seu próximo na comunida<strong>de</strong>.Uma questãomuito importante,que vem surgindonos últimos anosem várias partesdo Brasil e domundo, é oenvelhecimentodas famíliascuidadoras.49


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Existem muitos caminhos a nossa frente, todos eles plenos <strong>de</strong> <strong>de</strong>safios.Mas vamos adiante em nosso esforço coletivo, sem vacilar em facedas dificulda<strong>de</strong>s da empreitada.Contamos com gente do maior valor ligada a estudos do envelhecimentoe estamos apren<strong>de</strong>ndo cada dia mais a envelhecer comsaú<strong>de</strong> e pensando no que acontecerá com esses nossos filhos com <strong>de</strong>ficiênciaque estão envelhecendo e que certamente nos superarão.Mais dia, menos dia, teremos <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixá-los. Façamos isso com firmeza,os olhos bem abertos e muita fé em Deus, em um po<strong>de</strong>rmaior, para que nossos filhos tenham a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida que sempresonhamos para eles.Algumas perguntas norteadoras para <strong>de</strong>bate em grupo• A socieda<strong>de</strong> está preparada para aceitar como membros efetivos aspessoas com <strong>de</strong>ficiência, com seus direitos assegurados pela Convençãosobre Direitos das Pessoas com Deficiência?• Quais são as estratégias a serem adotadas para ajudar as famíliasenvelhecidas, cuidadoras <strong>de</strong> seus filhos com <strong>de</strong>ficiência?• O po<strong>de</strong>r público, compreen<strong>de</strong>ndo a angústia dos pais envelhecidos,incapazes <strong>de</strong> cuidar <strong>de</strong> si próprios, quanto mais do filho com <strong>de</strong>ficiência,está preparado para lhes dar uma contribuição real, aliviandosua carga <strong>de</strong> trabalho?Inovação pedagógica eformação do profissionalgeneralista em gerontologia:a experiência da USP-LesteÂngela Maria Machado <strong>de</strong> Lima50


Que ida<strong>de</strong> tens, Colombina?Será a ida<strong>de</strong> que pareces?...Tivesses a que tivesses!Tu para mim és menina.Manuel Ban<strong>de</strong>ira, “Arlequinada”.A educação superior, a gestão pedagógica e osnovos paradigmas <strong>de</strong> ensino-<strong>aprendizagem</strong>ALei nº 9.394, <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1996, a Lei <strong>de</strong> Diretrizes eBases da Educação Nacional (LDB), trouxe importantes possibilida<strong>de</strong>s<strong>de</strong> transformações no ensino superior do Brasil. Aslegislações complementares, incluindo leis, <strong>de</strong>cretos, portarias ministeriaise resoluções do Conselho Nacional <strong>de</strong> Educação, <strong>de</strong>terminaramuma série <strong>de</strong> modificações na vida acadêmica e das instituições <strong>de</strong>ensino superior (IES).Ângela Maria Machado <strong>de</strong> Lima é médica sanitarista, mestre em Medicina, doutora em Ciências,professora doutora e coor<strong>de</strong>nadora do curso <strong>de</strong> graduação em Gerontologia da Escola <strong>de</strong>Artes, Ciências e Humanida<strong>de</strong>s da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (EACH/USP). É supervisoradocente da Liga Acadêmica <strong>de</strong> Gerontologia da EACH/USP na gestão 2007 a 2009.Alinhados aos argumentos <strong>de</strong> Paulo Roberto da Silva (2007) e apenaspara ilustrar tais mudanças, citamos as novas diretrizes curriculares,com a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> flexibilização curricular, a extinção doscurrículos mínimos e a articulação da graduação com a pós-graduaçãoao introduzir o conceito <strong>de</strong> “educação continuada e permanente” para53


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: a experiência da USP-Leste54os futuros profissionais. Segundo o autor, po<strong>de</strong>mos assim resumiressas inovações curriculares:• Estímulo ao estudante:−−raciocínio crítico/analítico;−−trabalho em equipe;−−educação continuada/permanente.• Diploma diferenciado: exige aprimoramento e regula o direitoautomático <strong>de</strong> exercício da profissão.• Redução da duração dos cursos: a graduação é consi<strong>de</strong>rada etapainicial da formação.• Formação integrada à pós-graduação (educação continuada epermanente).• Formação multidisciplinar: permite maior mobilida<strong>de</strong>no mercado <strong>de</strong> trabalho.• Inserção <strong>de</strong> até 20% <strong>de</strong> cursos semipresenciais (educaçãoa distância – EAD).• Avaliação pelo Sistema Nacional <strong>de</strong> Avaliação daEducação Superior – Sinaes (autoavaliação/avaliaçõesexternas para fins <strong>de</strong> reconhecimento/recre<strong>de</strong>nciamento<strong>de</strong> cursos e instituições).Além <strong>de</strong> promover essas inovações, a LDB aboliu aobrigatorieda<strong>de</strong> da existência <strong>de</strong> <strong>de</strong>partamentos nas instituições<strong>de</strong> ensino superior. Estes, criados como órgãosinovadores pela reforma universitária <strong>de</strong> 1968 para substituiros conselhos administrativos e cuidar diretamentedos assuntos acadêmicos, não se revelaram eficientes. Naprática, conforme nos indica Silva (2007), os <strong>de</strong>partamentosfalharam em conduzir sua principal missão, agestão acadêmica dos cursos, pois suas açõesse voltaram quase exclusivamentepara as ativida<strong>de</strong>s-meio, especialmentena gestão <strong>de</strong> pessoase recursos físicos. Nesse cenário, a nova LDB buscou,portanto, instruir a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> extinguir tal situação,que perdurava havia muito tempo.Segundo o mesmo autor, o impacto da exigência <strong>de</strong>avaliação permanente no ensino superior é bastanteconhecido. Tanto o Ministério da Educação (MEC)como as IES se apressaram em colocar a avaliação em<strong>de</strong>staque. Os primeiros planos <strong>de</strong> avaliação institucionalnas IES priorizavam a avaliação docente, isoladamente,sem levar em conta o conjunto <strong>de</strong> todo oprocesso <strong>de</strong> avaliação. Hoje, com a introdução doSinaes, as instituições <strong>de</strong> ensino evoluíram para a autoavaliação,articulada a um plano <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimentoinstitucional (PDI) e projetos pedagógicos institucionais(PPIs) e <strong>de</strong> curso (PPCs).Os primeirosplanos <strong>de</strong>avaliaçãoinstitucional nasIES priorizavam aavaliação docente,isoladamente.Com a introduçãodo S inaes, asinstituições<strong>de</strong> ensinoevoluíram paraa autoavaliação.Silva (2007) analisa os processos <strong>de</strong> avaliação executados pelo MECe pelas próprias IES. Observa que eles têm sido a face mais visível dosimpactos provocados pela LDB no âmbito das instituições <strong>de</strong> ensinoe aponta o surgimento da figura do coor<strong>de</strong>nador <strong>de</strong> curso, que temse revelado <strong>de</strong> fundamental importância na implantação e manutenção<strong>de</strong> um ensino <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. Os resultados da avaliação visam nãoapenas à qualida<strong>de</strong> no ensino, como também à renovação <strong>de</strong> reconhecimento<strong>de</strong> cursos e ao recre<strong>de</strong>nciamento das instituições, colocandoresponsabilida<strong>de</strong>s ainda maiores sobre os ombros do gestoracadêmico – o coor<strong>de</strong>nador <strong>de</strong> curso.Além das questões <strong>de</strong>correntes da nova legislação, sobretudo da maiorexigência <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> no ensino superior, Silva (2007) <strong>de</strong>staca aexpressiva expansão das IES e <strong>de</strong> cursos, cujo número dobrou empouco mais <strong>de</strong> uma década. Com os dados preliminares <strong>de</strong> 2006,afirma que há pelo menos 5,5 milhões <strong>de</strong> estudantes matriculadosnos cursos superiores presenciais e a distância no país.55


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: a experiência da USP-Leste56Embora a nova legislação atribua às instituições <strong>de</strong> ensino superior areformulação <strong>de</strong> estatutos e regimentos, <strong>de</strong> modo geral não ocorrerammudanças significativas em sua estrutura operacional. Esperava-seque as IES buscassem modificar essa prática <strong>de</strong> gestão burocrática <strong>de</strong><strong>de</strong>partamento/coor<strong>de</strong>nador <strong>de</strong> curso, usada, aliás, há mais <strong>de</strong> 40 anos,porém pouco se progrediu nesse quesito, conclui Silva (2007).Outra questão relevante a consi<strong>de</strong>rar é que a universida<strong>de</strong> brasileira,comprometida com o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ensino e gestão pedagógica tradicional,apesar das diretrizes da LDB, tem <strong>de</strong>parado com o fato <strong>de</strong> queé pouco vantajosa a postura reducionista <strong>de</strong> não valorização do estudanteno processo <strong>de</strong> ensino-<strong>aprendizagem</strong>.Apren<strong>de</strong>r, segundo o mo<strong>de</strong>lo tradicional, significa essencialmentememorizar conteúdos <strong>de</strong> disciplinas básicas ou profissionalizantes,walter craveironas quais o professor é o responsável por repassar conhecimentosou conteúdos ao estudante, que é receptorpassivo e acrítico. Paulo Freire (1996) postula que“formar” <strong>de</strong>ve ir muito além <strong>de</strong> treinar ou a<strong>de</strong>strar oestudante no <strong>de</strong>sempenho das tarefas ou ativida<strong>de</strong>s.Para Hentz (sem data), ativida<strong>de</strong> “é a ação <strong>de</strong> um sujeitoativo, o que implica consi<strong>de</strong>rar a vonta<strong>de</strong> e a motivaçãopara agir”. Essa abordagem é interessante, pois sem ainterativida<strong>de</strong> entre os sujeitos comprometidos coma <strong>aprendizagem</strong> (docentes e estudantes) será inviá vel<strong>de</strong>senvolver metodologia <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong> significativaou dialética <strong>de</strong> ensino, que pressupõe movimento <strong>de</strong>polos contrários, em contraposição à lógica da metodologiatradicional, com direção linear.Na obra Pedagogiada autonomia,Paulo Freirepostula que“formar” <strong>de</strong>veir muito além<strong>de</strong> treinar oua<strong>de</strong>straro estudanteno <strong>de</strong>sempenhodas tarefas ouativida<strong>de</strong>s.No entanto, sabemos que, apesar <strong>de</strong> minoritários, há em curso esforçosbem-sucedidos <strong>de</strong> projetos pedagógicos, no Brasil e em outrospaíses, que propõem mudanças em estruturas curriculares e quebuscam enfocar o papel parceiro entre docentes, estudantes e universida<strong>de</strong>como espaço <strong>de</strong> exercício <strong>de</strong> cidadania e formação inovadorae crítica.Nesse contexto <strong>de</strong> novos paradigmas, foi fundada, em 2005, a Escola<strong>de</strong> Artes, Ciências e Humanida<strong>de</strong>s da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> SãoPaulo (EACH/USP), unida<strong>de</strong> da USP situada no bairro <strong>de</strong> ErmelinoMatarazzo, zona leste do município <strong>de</strong> São Paulo. Organizadacom base no princípio da interdisciplinarida<strong>de</strong> e embasada em projetopedagógico adotado internacionalmente, a EACH/USP contacom <strong>de</strong>z cursos que visam a aten<strong>de</strong>r às emergentes <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong>sociais e profissionais do país, do Estado <strong>de</strong> São Paulo e da zonaleste da região metropolitana do município.No que se refere à gestão pedagógica, não possui <strong>de</strong>partamentos, eseus colegiados acadêmicos são representados pela Comissão <strong>de</strong>57


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: a experiência da USP-LesteEm sintoniacom os princípiosda EACH/USP,o bacharelado emGerontologia visaa contribuir para acompreensãodos fenômenosassociados aoenvelhecimentohumano.Graduação (CG) e pelas Comissões <strong>de</strong> Coor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong>Cursos Intraunida<strong>de</strong> (CoC-I). Estas últimas vêm assumindoposturas cada vez mais propositivas, com as atribuições<strong>de</strong> <strong>de</strong>bater e articular com a CG as estratégiasdos cursos, assim como <strong>de</strong> zelar pela implementação eavaliação dos projetos político-pedagógicos, privilegiandoa integração horizontal (entre cursos) e vertical (intracurso).São necessários, portanto, investimentos emprojetos que favoreçam o compromisso e maior atuaçãodo corpo docente em reuniões periódicas das CoC-I, cujoregimento está em processo <strong>de</strong> revisão, com ampla colaboraçãoda comunida<strong>de</strong> acadêmica.Essa iniciativa representa a participação ativa da universida<strong>de</strong> nomovimento <strong>de</strong> transformação da socieda<strong>de</strong>, ao criar novas profissõese ampliar as oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho para os egressos <strong>de</strong> novasáreas <strong>de</strong> conhecimento e práticas, entre elas a gerontologia.Apresentamos aqui a estrutura geral do Projeto Político-Pedagógicodo Curso <strong>de</strong> Gerontologia, que prevê a formação <strong>de</strong> profissional comcompetência generalista para atuar no processo <strong>de</strong> envelhecimentohumano. Trata-se do bacharel em Gerontologia, também conhecidocomo gerontólogo.Bacharelado em Gerontologia: inovação necessária,<strong>de</strong>safio assumido pela USPO projeto político-pedagógico <strong>de</strong>sse curso se embasa no princípio dainterdisciplinarida<strong>de</strong>, ou seja, formar estudantes <strong>de</strong> modo integrado,unindo bases teóricas <strong>de</strong> seu curso <strong>de</strong> ingresso a temas <strong>de</strong> formaçãogeral, como cidadania e direitos humanos, relação socieda<strong>de</strong>-natureza,tratamento <strong>de</strong> dados, entre outros. Essa lógica se distribui pelosníveis básico, fundamental e avançado do curso.walter craveiroPor exemplo, o conjunto <strong>de</strong> disciplinas com foco em saú<strong>de</strong> coletiva,em que atuamos diretamente, contribui para a formação do gerontólogo,apresentando e problematizando os conhecimentos fundamentais<strong>de</strong> epi<strong>de</strong>miologia, bioestatística e gerontologia. Discutem-seem sala <strong>de</strong> aula, sempre que pertinentes, as modificações que ocorremdurante o processo <strong>de</strong> envelhecimento e suas implicações na saú<strong>de</strong>individual e coletiva.Os temas são abordados com base nas discussões iniciais com os estudantes,e o conhecimento prévio ou cotidiano prece<strong>de</strong> as aulasteóricas. Além <strong>de</strong>ssa dinâmica, estimulam-se estudos <strong>de</strong> caso e discussões<strong>de</strong> trabalhos científicos para que os alunos se apropriem dosconhecimentos trabalhados em aulas teóricas e mantenham semprea motivação <strong>de</strong> resolver problemas, preparando-se para formularquestões <strong>de</strong> pesquisa e atuar em situações concretas.Desse modo, o bacharelado em Gerontologia, em sintonia com osprincípios que organizam a EACH/USP, visa a contribuir para acompreensão dos fenômenos associados ao envelhecimento humano.Os egressos <strong>de</strong>sse curso têm a habilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> organizar ou auxiliar naorganização <strong>de</strong> ações e serviços voltados à promoção do envelhecimentoativo e saudável e, também, <strong>de</strong> atuar no monitoramento das5859


paulo pellegrinoInovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: a experiência da USP-LesteO Projeto Político-Pedagógico do Curso <strong>de</strong> GerontologiaCrijem.condições sociais e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> dos idosos, <strong>de</strong> maneira a evitar ou postergarmaiores agravos. Em gran<strong>de</strong>s linhas, esses estudantes são formadospara atuar como gestores <strong>de</strong> atenção em gerontologia, mastambém po<strong>de</strong>m, após a conclusão do curso, seguir carreira acadêmicaou <strong>de</strong> pesquisa nas diversas áreas que compõem o campo das ciênciasque estudam o envelhecimento humano.O gerontólogo é um profissional com foco generalista que se ocupa<strong>de</strong> administrar as diversas <strong>de</strong>mandas com os recursos existentes e/oupotenciais, funcionando como um elo entre as diferentes profissõesque cuidam do idoso e do processo <strong>de</strong> envelhecimento. Tem competênciapara atuar na organização <strong>de</strong> programas e serviços <strong>de</strong> atençãoaos idosos e seus familiares, <strong>de</strong> modo a respon<strong>de</strong>r às <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong>constante reformulação das políticas assistenciais <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e <strong>de</strong> atençãoàs pessoas com mais <strong>de</strong> 60 anos, além <strong>de</strong> contribuir para promovero envelhecimento ativo e saudável.Esses objetivos se traduzem em disciplinas e ativida<strong>de</strong>s práticas contidasno Projeto Político-Pedagógico do Curso <strong>de</strong> Gerontologia,apresentado, em linhas gerais, a seguir (EACH/USP, 2008).Perfil do graduandoO profissional egresso do curso <strong>de</strong> Gerontologia estará preparadopara:• Reconhecer as dimensões física, emocional e sociocultural que integrama vida das pessoas e afetam o curso <strong>de</strong> vida, com ênfase noprocesso <strong>de</strong> envelhecimento.• Compreen<strong>de</strong>r o envelhecimento como fenômeno sociovital complexono qual estão envolvidas relações <strong>de</strong> alterida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>individual e social.• Contribuir para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um envelhecimento saudável,apoiando o cuidado e encorajando a participação ativa da família edo idoso nesse processo.• Participar <strong>de</strong> ações educativas e <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> com base nos princípios<strong>de</strong> autonomia e in<strong>de</strong>pendência.• Articular conhecimento científico, observações qualificadas, habilida<strong>de</strong>stécnicas, planejamento e avaliação <strong>de</strong> ações na tomada<strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões.• Desenvolver suas atribuições com base em responsabilida<strong>de</strong>ético-política, tomando como referência os princípios<strong>de</strong> integralida<strong>de</strong> e equida<strong>de</strong>, valorizando o conhecimentointerdisciplinar e a atuação multiprofissional.• Aprofundar os conhecimentos adquiridos duranteo curso em programas <strong>de</strong> pós-graduação stricto elato sensu.Objetivos do cursoO curso <strong>de</strong> Gerontologia da EACH/USP visa a <strong>de</strong>senvolveruma modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação que impacte positivamentea qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida do idoso e sua família.O curso <strong>de</strong>Gerontologia daEACH/USP visaa <strong>de</strong>senvolveruma modalida<strong>de</strong><strong>de</strong> formaçãoque impactepositivamentea qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>vida do idoso esua família.6061


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: a experiência da USP-LesteO profissional egresso <strong>de</strong>sse curso, integrado à equipe <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, serácapaz <strong>de</strong> atuar <strong>de</strong> forma autônoma, responsabilizando-se pela atençãoàs <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> físicas, psicológicas e socioculturais relacionadas aoenvelhecimento em diferentes contextos. Terá competência para participarativamente das transformações no perfil epi<strong>de</strong>miológico dasaú<strong>de</strong>, em processo <strong>de</strong> transição, bem como para prevenir os agravose promover o envelhecimento saudável e participativo.Competências e habilida<strong>de</strong>sAo final do curso, o graduando será capaz <strong>de</strong>:• Atuar em instituições públicas e privadas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> (hospitais, ambulatórios,unida<strong>de</strong>s básicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, centros e hospitais-dia, centros<strong>de</strong> referência, centros <strong>de</strong> convivência, programas e serviços <strong>de</strong>assistência domiciliar) e instituições <strong>de</strong> ensino e pesquisa.• Desenvolver processo interativo e complementar com os diversosníveis <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong> da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção à saú<strong>de</strong>.• Auxiliar o idoso e seus familiares a encontrar os serviços a<strong>de</strong>quadosa suas <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> assistenciais, assim como no planejamento,acompanhamento e avaliação dos resultados obtidos.walter craveiro• Coor<strong>de</strong>nar ações <strong>de</strong> assistência à saú<strong>de</strong> do idoso e sua família.• Atuar em equipe multiprofissional <strong>de</strong> atenção ao idoso.• Analisar criticamente a realida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção ao envelhecimento epropor ações criativas para solucionar os problemas encontrados,levando em conta o perfil epi<strong>de</strong>miológico, os fatores sociopolíticose culturais, a tecnologia, os equipamentos, os recursos disponíveis enecessários à prática profissional.• Contribuir para a construção do conhecimento gerontológico pormeio do ensino e da pesquisa.• Colaborar para a formação <strong>de</strong> recursos humanos na área dagerontologia.Organização do cursoO curso <strong>de</strong> Gerontologia foi concebido <strong>de</strong> modo a <strong>de</strong>senvolver,no futuro profissional, habilida<strong>de</strong>s multidisciplinares associadasàs <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> físicas, psicológicas e socioculturais dos idosos.Essas habilida<strong>de</strong>s, estabelecidas sob sólidos princípios científicos,<strong>de</strong>vem estar incluídas <strong>de</strong> forma competente, autônoma, ética eresponsável, nos mais diversos contextos que <strong>de</strong>mandarem a atuação<strong>de</strong>sse profissional.Inserido no projeto pedagógico da EACH, o curso <strong>de</strong> Gerontologiainicia-se no Ciclo Básico, que tem como objetivo ampliar a formaçãohumanista e científica. Nesse momento, os alunos <strong>de</strong>senvolvem trêseixos <strong>de</strong> formação inter-relacionados:1. Formação introdutória no campo <strong>de</strong> conhecimento da gerontologia,em que se apresentam os alicerces conceituais <strong>de</strong>ssa área.2. Formação geral, que abrange disciplinas das áreas <strong>de</strong> ciências naturais,humanida<strong>de</strong>s e artes, com ênfase nos aspectos teóricos emetodológicos, fundamentados em bases filosóficas do conhecimentocientífico, nas relações socieda<strong>de</strong>-natureza e nas noções <strong>de</strong>direitos humanos e cidadania.62Crijem.63


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: a experiência da USP-Leste3. Formação científica, em que se busca promover e incentivar ainiciação científica por meio <strong>de</strong> metodologia <strong>de</strong> ensino apoiadaem problemas, possibilitando a aproximação às temáticas <strong>de</strong> cidadaniae o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong> pesquisa vinculadosa problemáticas sociais.Consi<strong>de</strong>rando que o gerontólogo terá como foco principal <strong>de</strong> suaatuação a promoção do envelhecimento saudável e ativo, a qual pressupõea articulação das dimensões biológica, psicológica e social <strong>de</strong>sseprocesso, três eixos estruturantes se fazem presentes ao longo dosoito semestres do curso, cada um <strong>de</strong>les composto por disciplinascurriculares, sequenciadas por critérios <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conteúdos,requisitos <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong> e grau crescente <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong>:1. As Bases Biológicas do Envelhecimento, Cuidados e Promoção daSaú<strong>de</strong>.2. Fundamentos <strong>de</strong> Psicologia para Gerontologia.3. Envelhecimento, Cultura e Socieda<strong>de</strong>.Como forma <strong>de</strong> buscar garantir as inter-relações com áreas afins,assim como com os <strong>de</strong>mais cursos da EACH, o curso <strong>de</strong> Gerontologiatambém contempla um conjunto <strong>de</strong> disciplinas que ampliam osestudos e as práticas relacionadas ao envelhecimento. Em contextosinterdisciplinares, imprescindíveis para o futuro exercício profissional,os alunos entram em contato, por exemplo, com princípios <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>sfísicas, fisioterapia, nutrição, lazer e turismo etc., além <strong>de</strong> informática,saú<strong>de</strong> bucal, pedagogia e marketing, estes últimos comodisciplinas optativas, sempre dirigidas à atenção ao idoso.Os três eixos estruturantes entrelaçam-se e convergem no contextoprático e interdisciplinar estabelecido semestralmente pelos EstágiosCurriculares Integrados, que, caracterizados por graus <strong>de</strong> complexida<strong>de</strong>crescentes, levam em conta a organização da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> atenção àsaú<strong>de</strong> no município <strong>de</strong> São Paulo e o nível <strong>de</strong> participação e responsabilida<strong>de</strong>dos alunos nas ativida<strong>de</strong>s didáticas propostas.Crijem.A esta altura o leitor po<strong>de</strong>rá pensar: qual será a perspectiva <strong>de</strong> trabalhopara um recém-formado em Gerontologia?Em virtu<strong>de</strong> da formação oferecida na EACH, que valoriza a <strong>aprendizagem</strong>significativa em contextos interdisciplinares, o egresso <strong>de</strong>ssecurso terá perfil generalista e po<strong>de</strong>rá trabalhar em hospitais, ambulatórios,unida<strong>de</strong>s básicas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e escolas, programas/serviços <strong>de</strong>assistência domiciliar, instituições <strong>de</strong> média e longa permanência,hospitais, centros-dia e centros <strong>de</strong> convivência, bem como atuar naformação <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> formal <strong>de</strong> orientação, acompanhamento eapoio a cuidadores <strong>de</strong> idosos.Uma pergunta bastante frequente que temos ouvido, sobretudo damídia, é se outras profissões po<strong>de</strong>rão exercer a mesma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> umgerontólogo. A resposta mais a<strong>de</strong>quada é que rigorosamente nenhumapo<strong>de</strong>rá fazê-lo, pois se trata <strong>de</strong> um novo profissional generalistaque vai aten<strong>de</strong>r a uma necessida<strong>de</strong> específica, apto para apreen<strong>de</strong>r epaulo pellegrino6465


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Inovação pedagógica e formação do profissional generalista em gerontologia: a experiência da USP-LesteA formaçãogeneralistaem gerontologiaten<strong>de</strong> a ampliara possibilida<strong>de</strong><strong>de</strong> o profissionalnão reduzir oenvelhecimentoa patologiasmais prevalentesem idosos etrabalhar emequipe.66lidar com o processo do envelhecimento em suas dimensões biológica,psicológica e social. Essa formação generalista ten<strong>de</strong> a ampliar apossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o profissional não reduzir o envelhecimento a patologiasmais prevalentes em idosos e trabalhar em equipe.Em gerontologia, tanto as intervenções <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> como as sociais sãorealizadas por equipe multiprofissional composta por especialistas,porém essa configuração especializada tem se <strong>de</strong>monstrado insuficientepara que se realize a gestão integral <strong>de</strong> casos e recursos. Segundoexperiências internacionais, a gestão ampliada na organização dotrabalho favorece o planejamento e a avaliação das ações, sobretudopor seu potencial em promover a<strong>de</strong>quação <strong>de</strong> recursos às sofisticadas<strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> dos que envelhecem. O gerontólogo, portanto, <strong>de</strong>verápreencher essa lacuna em sua prática.Em outras palavras, o gerontólogo integrado a uma equipe multiprofissionalserá capaz <strong>de</strong> atuar <strong>de</strong> forma generalista e autônoma, responsabilizando-sepela gestão da atenção ao idoso em diferentes contextos.O curso <strong>de</strong> graduação em Gerontologia da EACH/USPpreten<strong>de</strong>, assim, formar profissionais críticos, preparadospara <strong>de</strong>senvolver investigações sobre o envelhecimentohumano e para contribuir para que os idosos saudáveise aqueles com problemas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e/ou sociais tenhammelhor qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida. Seu projeto pedagógico sedireciona para que os gerontólogos sejam capazes <strong>de</strong> auxiliaridosos e seus familiares a encontrar os cuidadosa<strong>de</strong>quados a sua atenção, ajudar no planejamento dasações <strong>de</strong> acompanhamento, monitorar o acompanhamento,avaliar resultados e, quando estes não forem a<strong>de</strong>quados,colaborar para o reajuste do equilíbrio entre<strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> e recursos.Para finalizar, acrescentamos que este texto, como tododiscurso escrito ou falado, coagula provisoriamente arealida<strong>de</strong>, fixando a plasticida<strong>de</strong> dos fenômenos em conceitos, regras,visões <strong>de</strong> mundo, <strong>de</strong> certo modo também representando um convitecom argumentos menos ou mais convincentes, porém transitórios,acerca do “<strong>de</strong>ver ser” na prática e teoria da educação emgerontologia.Assim, convidamos o leitor ao exercício crítico do <strong>de</strong>bate, atuandocomo nosso companheiro em busca da construção <strong>de</strong> projetos<strong>de</strong> educação essencialmente comprometidos com a emancipação <strong>de</strong>sujeitos em todas as suas dimensões no campo da gerontologia.67


<strong>Novas</strong> <strong>necessida<strong>de</strong>s</strong> <strong>de</strong> <strong>aprendizagem</strong>Referências bibliográficasEscola <strong>de</strong> Artes, Ciências e Humanida<strong>de</strong>s da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo(EACH/USP). Projeto Político-Pedagógico do Curso <strong>de</strong> Gerontologia (coor<strong>de</strong>nação<strong>de</strong> curso). Datilografado, maio 2008.Freire, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. SãoPaulo: Paz e Terra, 1996.Hentz, P. Dos diferentes significados do termo “ativida<strong>de</strong>”: tempo <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r.Datilografado, s/d.Silva, P. R. Coor<strong>de</strong>nador <strong>de</strong> curso: atribuições e <strong>de</strong>safios atuais. Brasília, 2007.Disponível em: . Acesso em: 30 out. 2008.68

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