Não Somente Semicondutores:O Vale do Silício e a Cultura da InovaçãoAshlee VanceEmpresa “herdeira da Fairchild” fundada por ex-membros da Fairchild Semiconductor, a Advanced Micro Devices Corporation (AMD) fabricamicroprocessadores em instalações que incluem uma fábrica em Dresden, na Alemanha, onde um técnico exibe uma lâmina de silício de 300 milímetrosMatthias Rietschel/© AP ImagesO sucesso da região do Vale do Silício, no norte da Califórnia,não é produto do acaso, mas de desdobramentos históricosque criaram uma cultura de inovação e de informaçõescompartilhadas entre os empreendedores.Ashlee Vance é autor de Geek Silicon Valley [O Valedo Silício e seus especialistas “high-tech”], guia culturale histórico da região. É também editor do site de tecnologiaon-line The Register e colaborador freqüente da revistaEconomist e do jornal New York Times.Quem estiver familiarizado com as complexidadese singularidades históricas por trás da ascensãorumo à excelência tecnológica do Vale doSilício compreenderá a enorme tarefa enfrentadapelos que procuram copiar seu sucesso em qualquer parte<strong>dos</strong> Esta<strong>dos</strong> Uni<strong>dos</strong> e do mundo. Várias lideranças civise empresariais parecem ter decidido que a combinaçãoda mistura “certa” de capital, apoio acadêmico, talentoe perspicácia empresarial será capaz de clonar o Valedo Silício de forma convincente. Isso é compreensível,porém subestima as forças culturais que colocaram oVale do Silício no epicentro da indústria mundial de altatecnologia.Se voltássemos aos anos 1950, seríamos possivelmenteincapazes de identificar o conjunto de bairros residenciaisde classe média interliga<strong>dos</strong> a cerca de 65 km ao sul deeJournal USA 24
Shockley tenha sido fundamental para odesenvolvimento do Vale do Silício, umasérie de fatores empresariais e culturaissubjacentes já havia preparado o Vale paraseu novo papel e maximizado o impacto dachegada de Shockley.Os co-fundadores da Google Larry Page (esquerda) e Sergey Brin descansam sobre pufes nasede da empresa em Mountain View, na CalifórniaSão Francisco como a futura capital da tecnologia dacomputação. Naquela época, os habitantes da regiãoo chamavam de Vale das Delícias do Coração. Semnenhuma lâmina de silício a ser encontrada, pomaresde pêras, cerejas, pêssegos e outras frutas dominavam aárea da península central aninhada entre a Baía de SãoFrancisco e as Montanhas de Santa Cruz.Diversos historiadores indicam a volta de WilliamShockley da Costa Leste, em 1956, como o gatilho datransformação dessas terras exuberantes em parquesempresariais, centros de compra e campi empresariais.Shockley, creditado como co-inventor do transistor em1947 (trabalhava, nessa época, para os Laboratórios Bell),selecionou Mountain View, na Califórnia, como a novacasa para sua empresa iniciante de semicondutores desilício. Em vez disso, ele poderia ter escolhido Dallas,no Texas, ou Los Angeles, como teria preferido seuinvestidor, mas Shockley estava tentando recuperar-se deum ambiente de trabalho estressante e de um divórcio. Eleprecisava de uma mudança. Também precisava ficar pertoda mãe, que ainda vivia na casa da família, no norte daCalifórnia, próximo à Universidade de Stanford.Veteranos do Vale do Silício como Gordon Moore— que inicialmente trabalhava para Shockley e depois setransformou em co-fundador da Fairchild Semiconductore da Intel Corporation — dizem que a indústria desemicondutores provavelmente teria irrompido emalgum outro lugar não fosse a decisão de Shockley. Eleatraiu algumas das mentes mais brilhantes do país paraMountain View e, numa jogada arriscada, escolheu osilício como o substrato fundamental por trás de suainiciativa com semicondutores. Embora a jogada deRandi Lynn Beach/© AP ImagesNo começo f o i o r á d i oNo alvorecer do século 20, amadorese empreendedores curiosos começarama trabalhar com tecnologia de rádioe eletrônica. A área da Baía de SãoFrancisco era um local natural para essetrabalho devido à presença da Marinha<strong>dos</strong> EUA, que tinha intenção de usarradiocomunicação em alto-mar.Em 1909, um <strong>dos</strong> mais conheci<strong>dos</strong>entre os primeiros forman<strong>dos</strong> daUniversidade de Stanford, Cyril Elwell,ampliou as fronteiras da radiocomunicaçãoao criar o que se tornaria a Companhia Federal deTelégrafos. Essa empresa construiu alguns <strong>dos</strong> maiorestransmissores de arco da época — dispositivos capazesde enviar a fala por ondas sonoras em um raio de até240 quilômetros. Poucos anos após sua fundação, aCompanhia Federal de Telégrafos havia criado para aMarinha uma cadeia de transmissores de arco ligandoSão Francisco ao Havaí. Enquanto isso, o laboratórioda empresa em Palo Alto, Califórnia, financiou trabalhoinovador sobre o “audion” — dispositivo capaz deamplificar sinais elétricos em um tubo de vácuo.Essa tecnologia e seus deriva<strong>dos</strong> contribuiriam para ofuncionamento <strong>dos</strong> primeiros computadores.Com freqüência atormenta<strong>dos</strong> pela falta deinvestimento, talento e infra-estrutura, esses pioneirosforam força<strong>dos</strong> a inventar novos maneiras de concorrercom rivais maiores e mais antigos da Costa Leste.Conseqüentemente, muitos <strong>dos</strong> primeiros inventores daárea da Baía se concentraram na fabricação de produtos decusto mais baixo e melhor qualidade ou na resolução deproblemas muito específicos. Com freqüência, achavammais vantajoso compartilhar suas idéias com pares e rivais.Essa abertura e o reconhecimento dessa engenhosidadeestiveram presentes em to<strong>dos</strong> os perío<strong>dos</strong> de invençãoimportantes do Vale do Silício.Empresas como Eitel and McCullough, LittonEngineering Laboratories e Varian Associates deramcontinuidade ao trabalho com eletrônica na penínsulacentral. Em 1939, seus esforços haviam criado condiçõessuficientemente favoráveis para seduzir dois profissionaisforma<strong>dos</strong> por Stanford — Bill Hewlett e Dave Packard —a iniciar sua própria empresa de equipamentos eletrônicoseJournal USA 25