2. A história <strong>da</strong> Bíblia <strong>como</strong> história <strong>do</strong> <strong>livro</strong> 53 Figura 20 . Abertura <strong>do</strong> Evangelho Segun<strong>do</strong> Mateus, no Novo Testamento de Johann Froben, 1516, onde o latim é apresenta<strong>do</strong> na gestual fonte romana enquanto o grego reproduz o traço cursivo <strong>do</strong>s manuscritos helênicos.
2. A história <strong>da</strong> Bíblia <strong>como</strong> história <strong>do</strong> <strong>livro</strong> 54 Durante o primeiro milênio de sua existência, a Igreja não promulgou qualquer lei a respeito <strong>da</strong> leitura <strong>da</strong> Bíblia no vernáculo. Os fiéis eram, ao contrário, incentiva<strong>do</strong>s a ler os Livros Sagra<strong>do</strong>s de acor<strong>do</strong> com suas necessi<strong>da</strong>des espirituais. Os próximos 500 anos mostraram apenas regulamentações locais acerca <strong>do</strong> uso <strong>da</strong> Bíblia no vernáculo. (HER- BERMANN, 2003, p.1260) Mesmo a língua alemã já conhecia outras versões <strong>da</strong> Bíblia Sagra<strong>da</strong> desde 1350 aproxima<strong>da</strong>mente (VOLZ, 1963, p.94). Lucien Febvre (1982) chega a indicar que essas versões chegariam a 19 edições diferentes. O fato é que as traduções trazi<strong>da</strong>s com a Reforma implicaram em uma atitude responsiva de total impedimento por parte <strong>da</strong> Igreja Romana a quaisquer práticas envolven<strong>do</strong> a tradução e leitura <strong>do</strong>s <strong>livro</strong>s sagra<strong>do</strong>s que não estivessem escritos em latim, particularmente as cópias inspira<strong>da</strong>s na Vulgata de São Jerônimo, e que não fossem media<strong>da</strong>s por clérigos em situações e espaços devi<strong>da</strong>mente estabeleci<strong>do</strong>s. Durante o recesso <strong>do</strong> Concílio [de Trento] (1552-1562), Pio IV publicou a bula Domini gregis custodias, que estabelecia as regras para a elaboração <strong>do</strong> Índice <strong>do</strong>s Livros Proibi<strong>do</strong>s, incluin<strong>do</strong> a proscrição <strong>da</strong> Bíblia em traduções para as línguas vernáculas. (ZIMMER, 2006, p. 125) O que a Bíblia de Lutero (Figura 21) representa, se não pela originali<strong>da</strong>de na tradução, é o começo de um movimento que impulsionou a retoma<strong>da</strong> <strong>do</strong> interesse pela leitura <strong>do</strong> Livro Sagra<strong>do</strong> pelos leigos até então conforma<strong>do</strong>s com a mediação <strong>da</strong> Igreja. Se já é consenso que o surgimento <strong>da</strong> imprensa foi o grande impulsiona<strong>do</strong>r <strong>da</strong> Reforma Protestante, é notório também que se deve a essa última o fato de a Bíblia ter si<strong>do</strong> produzi<strong>da</strong> tão largamente a partir <strong>da</strong>quela tecnologia. Lucien Febvre (1992, p.407) destaca que, apesar <strong>do</strong> aumento considerável na produção de <strong>livro</strong>s religiosos com o advento <strong>da</strong> imprensa, essa não representaria, em relação aos demais <strong>livro</strong>s de outras naturezas, senão “uma porcentagem diminuí<strong>da</strong>”. De fato, os movimentos de contestação trazi<strong>do</strong>s pelos reforma<strong>do</strong>res, assim <strong>como</strong> o ávi<strong>do</strong> impulso missionário desses em prol <strong>da</strong> propagação <strong>do</strong> Evangelho aos povos além <strong>da</strong> Europa, fez com que houvesse a necessi<strong>da</strong>de de uma produção intensa <strong>da</strong> Bíblia e que, ain<strong>da</strong> <strong>como</strong> frutos <strong>do</strong> pensamento humanista que aflorava, deveriam seguir ca<strong>da</strong> vez mais as traduções vernaculares. Alguns <strong>do</strong>s avanços mais consideráveis, no que se trata <strong>da</strong> leitura hipertextual <strong>da</strong> Bíblia, se deram nesse contexto em que uma nova formação canônica e o uso <strong>da</strong> Bíblia <strong>como</strong> instrumento <strong>da</strong> nova <strong>do</strong>utrina impulsionaram uma leitura ca<strong>da</strong> vez mais acadêmica e, contraditoriamente, também mais fun<strong>da</strong>mentalista.