Houve um rapaz que, julgando que o po<strong>de</strong>roso Viscon<strong>de</strong> queria umamanuense chic e lindo, supondo-se ser tudo isso, requereu o lugar, juntandoos seus retratos, tanto <strong>de</strong> perfil como <strong>de</strong> frente. Pancome fê-lo virà sua presença. Olhou o rapaz e disse:-- Sabe sorrir?-- Sei, Excelentíssimo Senhor Ministro.-- Então mostre.Pancome ficou contente e indagou ainda:-- Sabe cumprimentar?-- Sei, Senhor Viscon<strong>de</strong>.-- Então, cumprimente ali o Major Marmeleiro.Este major era o seu secretário e estava sentado, em outra mesa, aolado da do Ministro, todo ele embrulhado em uma vasta sobrecasaca.O rapaz não se fez <strong>de</strong> rogado e cumprimentou o major com todosos "ff" e "rr" diplomáticos.O Viscon<strong>de</strong> ficou contente e perguntou ainda:-- Sabe dançar?-- Sei. Excelentíssimo Senhor Viscon<strong>de</strong>.-- Dance.-- Sem música?O viscon<strong>de</strong> não se atrapalhou. Determinou ao secretário:-- Marmeleiro, ensaia aí uma valsa.-- Só sei "Morrer sonhando" (exemplo).-- Serve.O candidato dançou às mil maravilhas e o Viscon<strong>de</strong> não escondia ogran<strong>de</strong> contentamento <strong>de</strong> que sua alma exuberava.Indagou afinal.-- Sabe escrever com <strong>de</strong>sembaraço?-- Ainda não, doutor.-- Não faz mal. O essencial, o senhor sabe. O resto o senhor apren<strong>de</strong>rácom os outros.E foi nomeado, para bem documentar, aos olhos dos estranhos, a belezados homens da Bruzundanga.Sobre os sábios(a <strong>de</strong>senvolver)OS engenheiros, tanto os civis como os militares, mais estes que aqueles,julgam-se geômetras. Não o são absolutamente; os melhores são simplesprofessores.* * *<strong>Os</strong> médicos da Bruzundanga imaginam-se sábios e literatos.Po<strong>de</strong>-se afirmar que não são nem uma cousa nem outra.* * *É sábio, na Bruzundanga, aquele que cita mais autores estrangeiros; equanto mais <strong>de</strong> país <strong>de</strong>sconhecido, mais sábio é. Não é, como se podia crer,aquele que assimilou o saber anterior e concorre para aumentá-lo com osseus trabalhos individuais. Não é esse o conceito <strong>de</strong> sábio que se temem tal pais.Sábio, é aquele que escreve livros com as opiniões dos outros.Houve um que, quando morreu, não se pô<strong>de</strong> ven<strong>de</strong>r-lhe a biblioteca,pois todos os livros estavam mutilados. Ele cortava-lhes as páginas parapregar no papel em que escrevia os trechos que citava e evitar a tarefamaçante <strong>de</strong> os copiar.* * *Há mais <strong>de</strong> século que se estudam nas suas escolas superiores, asaltas ciências; entretanto os sábios da Bruzundanga não têm contribuídocom cousa alguma para o avanço <strong>de</strong>las.Em toda a parte, os sábios, <strong>de</strong> qualquer natureza, são homens <strong>de</strong>
ecursos medianos, mo<strong>de</strong>stos, retraídos, pouco mundanos, mesmo quandoricos. Na Bruzundanga, não; os sábios são nababos, têm carros e automóveis<strong>de</strong> luxo, palácios; freqüentam teatros caros, durante temporadascompletas; dão festas suntuosas nos seus hotéis, etc., etc.* * *Não há médico afreguesado que não seja consi<strong>de</strong>rado um sábio pelagente da Bruzundanga, e, para firmar tal reputação, não fabrique umacompilação escrita em sânscrito. O médico sábio não po<strong>de</strong> escrever emoutra língua que o sânscrito. Isto lhe dá foros <strong>de</strong> literato e aumenta-lhea clínica.Com a vida dos sábios da Bruzundanga ninguém po<strong>de</strong>ria escrever<strong>Os</strong> Mártires da Ciência. Têm eles a precaução preliminar <strong>de</strong> inaugurarema sua sabedoria com um casamento rico.Sobre a músicaA música, na Bruzundanga, é, em geral, a arte das mulheres.É raro aparecer no país uma obra musical.Sobre a indústriaA indústria nacional da Bruzundanga tem por fim espoliar o povocom os altos preços dos seus produtos. É nacional, mas recebe a matéria--prima, já em meia manufatura, do estrangeiro.A última nota soltaA habilida<strong>de</strong> dos governantes da Bruzundanga é tal, e com tanto eacendrado carinho velam pelos interesses da população, que lhes foramconfiados, que os produtos mais normais à Bruzundanga, mais <strong>de</strong> acordocom a sua natureza, são comprados pelos estrangeiros por menos da meta<strong>de</strong>do preço pelo qual os seus nacionais os adquirem.A última nota soltaA habilida<strong>de</strong> dos governantes da Bruzundanga é tal, e com tanto eacendrado carinho velam pelos interesses da população, que lhes foramconfiados, que os produtos mais normais à Bruzundanga, mais <strong>de</strong> acordocom a sua natureza, são comprados pelos estrangeiros por menos da meta<strong>de</strong>do preço pelo qual os seus nacionais os adquirem.OUTRAS HISTÓRIAS DOSBRUZUNGANGASAs letras na Bruzundanga"A solenida<strong>de</strong> que aqui nos reúne e para aqual foram convocados os po<strong>de</strong>res do Céu e daTerra, e o mar, é <strong>de</strong> tanta magnitu<strong>de</strong> que a nãopo<strong>de</strong>mos avaliar senão rastreando, através dassombras do Tempo, a sua projeção no Futuro."Coelho Neto.Discurso na inauguração da piscina do Fluminense F.C.O meu livro <strong>de</strong> viagem à República dos Estados Unidos da Bruzun-
- Page 1 and 2:
Os Bruzundangas, de Lima BarretoTex
- Page 4 and 5:
tantes. Por isso entrara no coupé
- Page 6 and 7:
com pelotiquices e passes de mágic
- Page 8 and 9:
da Bruzundanga; era assim como o se
- Page 10:
E muitas outras de que me esqueci,
- Page 13 and 14: Certo dia, Idle Bhras de Grafofone
- Page 15 and 16: chem de orgulho a família toda, os
- Page 17 and 18: Entretanto, as primeiras têm um an
- Page 19 and 20: A minha estadia na Bruzundanga foi
- Page 21 and 22: ao fim.Não desanimarei e ainda mai
- Page 23 and 24: Eis como são as riquezas do país
- Page 25 and 26: Pode-se dizer que todos anseiam por
- Page 27 and 28: esse negócio de condecorações e
- Page 29 and 30: etc.Os deputados não deviam ter op
- Page 31 and 32: homem cuja única habilidade se res
- Page 33 and 34: gado e quase sempre generoso, e eu,
- Page 35 and 36: aritmética, era a conta de juros,
- Page 37 and 38: suas correrias, encontrou-se com um
- Page 39 and 40: da inteligência humana e da nature
- Page 41 and 42: sabem quem ele é, quais são os se
- Page 43 and 44: traziam. Via perfeitamente tais arm
- Page 45 and 46: fregueses e a ter cuidado com os ca
- Page 47 and 48: desse "defeito" apresentavam alguns
- Page 49 and 50: Assim, em uma espécie de Rua da Al
- Page 51 and 52: cho coletivo, levando tão estranha
- Page 53 and 54: hediondas! Quanta insuficiência ar
- Page 55 and 56: fácil de explicar.Ele veio, no fim
- Page 57 and 58: Não ficou aí. Mostrou a necessida
- Page 59 and 60: exímio em dança; e, enquanto ele
- Page 61 and 62: hortaliças, legumes e a criação
- Page 63: grandes festas o centenário da fun
- Page 67 and 68: tudo...Recentemente, na Bruzundanga
- Page 69 and 70: Quando ficam ricos, estão completa
- Page 71 and 72: nossa opinião que essa questão de
- Page 73 and 74: janelas da sala.Careta, Rio, 5-11-2