11.07.2015 Views

Os Bruzundangas, de Lima Barreto Texto ... - Universia Brasil

Os Bruzundangas, de Lima Barreto Texto ... - Universia Brasil

Os Bruzundangas, de Lima Barreto Texto ... - Universia Brasil

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

fácil <strong>de</strong> explicar.Ele veio, no fim, da tal história das con<strong>de</strong>corações que já lhes contei-- fato que encheu <strong>de</strong> júbilo todo o povo daquela pátria, porque a Repúblicadas Planícies que Pancome trabalhava para sempre andar às turrascom a Bruzundanga, não as tinha obtido, apesar <strong>de</strong> disputá-las. Antesdisso, porém, ele já tinha um ascen<strong>de</strong>nte bem forte, <strong>de</strong>vido a uma gran<strong>de</strong>proeza. Pancome tinha subido ao cume do Tiaya, o mo<strong>de</strong>sto Himalaia dacorografia da República da Bruzundanga, dois mil e novecentos a três milmetros <strong>de</strong> altitu<strong>de</strong>. Vou-lhes contar como a cousa foi.Um dia, estando Pancome nas proximida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ssa montanha, anuncioua todos os quadrantes que ia escalá-la.<strong>Os</strong> bruzundanguenses do lugar sorriram diante do projeto daquelehomem gordo e pesado. Aquilo (o monte) diziam, era muito alto e elenão teria fôlego para chegar ao cume; havia fatalmente <strong>de</strong> rolar pelasencostas abaixo, antes <strong>de</strong> atingir o meio da jornada.O viscon<strong>de</strong>, porém, não se temorizou, subiu e dizem que foi ao picoda montanha.A vista <strong>de</strong> semelhante proeza, os naturais do país, logo que a novase espalhou, exultaram, pois andavam <strong>de</strong> há muito necessitados <strong>de</strong> umherói. Não contentes da notícia da façanha ter corrido toda a nação,telegrafaram para as cinco partes do mundo exaltando a ousadia aindamais.E verda<strong>de</strong> que, antes <strong>de</strong> Pancome, muitos outros, entre os quais oKaetano Phulgêncio, um roceiro do local, tinham subido o Tiaya váriasvezes, em aventuras <strong>de</strong> caça, e até esse Phulgêncio serviu-lhe <strong>de</strong> guia; masisto não foi lembrado e Pancome passou por ser o primeiro a fazê-lo.De tal proeza e das consequências que <strong>de</strong>la advieram, nasceu a famado viscon<strong>de</strong>, a sua consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> herói nacional, tanto mais que os clubesalpinos da Europa tomaram nota do ilustre feito e, graças à diplomacia daBruzundanga, o retrato e a biografia do portentoso varão foram estampadosnas revistas especiais <strong>de</strong> sport.Durante um mês, os jornais da capital do interessante país que oranos ocupa, não <strong>de</strong>ixaram um só dia <strong>de</strong> publicar telegramas do seguinte teorou parecidos: "La Vie au Grand Air, importante revista francesa, publicao retrato do Viscon<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pancome, o <strong>de</strong>stemido herói do Tiaya, e os seustraços biográficos".Um outro quotidiano dizia: "Army, Navy and Sport, célebre magazineinglês, estampando o retrato do Viscon<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pancome, essa legítima glóriado nosso país, afirma que a sua ascensão ao cume do Tiaya é sem prece<strong>de</strong>ntesna história do alpinismo"; e assim transcreviam ou noticiavamreferências <strong>de</strong> outras revistas alemãs, italianas, sírias, gregas, tcheques, etc.Recebendo esse impulso do estrangeiro, os jornais da Bruzundanga,os mais lidos e os mais obscuros, e as revistas <strong>de</strong> toda a natureza redobrarama sua habitual gritaria em casos tais. Enchiam-se <strong>de</strong> artigos louvandoo herói que fizera a Bruzundanga conhecida na Europa, afirmaçãoessa em que logo o povo do país acreditou piamente; mostraram tambémcom períodos bem caídos, como o fato tinha um alcance excepcional eproclamaram o homem o primeiro <strong>de</strong> todos os bruzudanguenses.A seguir-se aos jornais, vieram os poetas louvaminheiros com as suaso<strong>de</strong>s, poemas, sonetos, cantatas, erguendo às nuvens o viscon<strong>de</strong> e a suaextraordinária proeza. Eles sacavam com atilamento sobre o futuro, porquanto,quando Pancome veio a ser ministro, os encheu <strong>de</strong> propinas efartos jantares.É ocasião <strong>de</strong> notar aqui uma singular feição dos poetas da Bruzundanga.Todos os vates <strong>de</strong> lá, em geral, são incapazes <strong>de</strong> comparação, <strong>de</strong> criticae impróprios para a menor reflexão mais <strong>de</strong>tida, e, com a sua mentalida<strong>de</strong><strong>de</strong> parvenus aperuados, estão sempre dispostos a bajular os titulares ou osapatacados burgueses, para terem o prazer <strong>de</strong> ver mais perto as suas mulherese filhas, pois se persuadiram que são elas feitas <strong>de</strong> outra substância

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!