<strong>OS</strong> <strong>PENSADORES</strong>objeto. Mas, a esse pensamento, garantido nos diversos ramosda ciência em face dos sonhos <strong>de</strong> um visionário, é apresentadaa conta: a dominação mundial sobre a natureza vira-secontra o próprio sujeito pensante, <strong>de</strong>le nada mais resta doque justamente aquele eternamente idêntico eu penso que<strong>de</strong>ve po<strong>de</strong>r acompanhar todas as minhas representações. Sujeitoe objeto tornam-se ambos nulos. O si-mesmo abstrato,o título legal para fazer relatórios e sistematizar só tem diante<strong>de</strong> si o material abstrato que não possui outra proprieda<strong>de</strong>senão a <strong>de</strong> ser substrato <strong>de</strong> semelhante posse. A equaçãoentre espírito e mundo é solucionada sem <strong>de</strong>ixar resto, mas<strong>de</strong>vido apenas a seus dois membros serem reciprocamentesimplificados. Na redução do pensar ao aparato matemáticoestá implícita a consagração do mundo como medida <strong>de</strong> simesmo. O que aparece como triunfo da racionalida<strong>de</strong> subjetiva,a sujeição <strong>de</strong> todo ente ao formalismo lógico, é pagocom a subordinação dócil da razão aos achados imediatos.Compreen<strong>de</strong>r o achado como tal, notar nos dados não apenassuas relações espaço-temporais abstratas, por on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>mentão ser apanhados, mas pensá-los, em vez disso, como superfície,como momentos mediatizados do conceito que sóse preenchem no <strong>de</strong>sdobramento <strong>de</strong> seu sentido social, histórico,humano — toda a pretensão ao conhecimento é abandonada.Ela não consiste no mero perceber, classificar e calcular,mas justamente na negação <strong>de</strong>terminante do que acada momento é imediato. Mas o formalismo matemático,cujo meio é o número, a figura mais abstrata do imediato,fixa, em vez disso, o pensamento na mera imediatez. O fatualconserva o seu direito, o conhecimento se restringe à suarepetição, o pensamento converte-se em mera tautologia.Quanto mais a maquinaria do pensamento subjuga o ente,mais cega é a sua resignação ao reproduzi-lo. Com isso, oiluminismo recai na mitologia, da qual nunca soube escapar.Pois a mitologia tinha nas suas figuras, espelhada como verda<strong>de</strong>,a essência do subsistente: ciclo, <strong>de</strong>stino, dominação domundo; havia renunciado à esperança. No semblante <strong>de</strong> ima-— 44 —
ADORNOgem mítica, bem como na clareza da fórmula científica, ératificada a eternida<strong>de</strong> do fatual e a mera existência é proclamadacomo sentido que o fatual obstrui. O mundo enquantogigantesco juízo analítico, o único que restou <strong>de</strong> todosos sonhos da ciência, tem o mesmo cunho do mito cósmico,que ligava a mudança da primavera e do outono ao rapto<strong>de</strong> Perséfone. A unicida<strong>de</strong> do acontecimento mítico, que <strong>de</strong>velegitimar o acontecimento fatual, é enganosa. Originariamente,o rapto da <strong>de</strong>usa era imediatamente i<strong>de</strong>ntificado à morteda natureza. Repetia-se a cada outono, e nem mesmo a repetiçãoera uma sucessão <strong>de</strong> acontecimentos separados, masera, cada vez, o mesmo. Com o endurecimento da consciênciado tempo, o acontecimento foi fixado no passado como único,e buscou-se aplacar ritualmente o tremor perante a morte,em cada novo ciclo das estações do ano, recorrendo-se aoque era uma vez, há muito tempo. Mas a separação é impotente.Em virtu<strong>de</strong> do posicionamento daquele passadocomo acontecendo uma só vez, o ciclo assume o caráter doinevitável e o tremor se irradia do antigo para o acontecerinteiro, enquanto mera repetição sua. A subsunção do fatual,quer à fabulosa pré-história, quer ao formalismo matemático,o relacionamento simbólico do presente, no rito, com o acontecimentomítico, ou, na ciência, com a categoria abstrata, fazcom que o novo apareça como o pre<strong>de</strong>terminado que, na verda<strong>de</strong>,é assim o antigo. O que é sem esperança não é a existência,mas o saber, que no símbolo afigurativo ou matemático se apropriada existência e a perpetua como um esquema.No mundo do iluminismo, a mitologia entrou na esferado profano. A existência radicalmente purificada dos <strong>de</strong>môniose <strong>de</strong> sua prole conceituai assume, na sua naturalida<strong>de</strong>límpida, o caráter luminoso que o antemundo atribuiu aos<strong>de</strong>mônios. Sob o/tíÇulp <strong>de</strong> fato bruto, a injustiça social daqual eles se originam é hoje sacralizada como uma injustiçaque se subtrai eternamente a investidas, assim como o curan<strong>de</strong>iroera sacrossanto, sob a proteção <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>uses. Adominação não é paga apenas com a alienação do homem— 45 —
- Page 1: OS PENSADORES
- Page 4 and 5: FundadorVICTOR CIVITA(1907-1990)Í*
- Page 6 and 7: OS PENSADORESUnidimensional (ou Ide
- Page 8 and 9: OS PENSADORESradiofônicas, pronunc
- Page 10 and 11: OS PENSADORESúnico e mesmo ato da
- Page 13 and 14: CRONOLOGIA1903 — Em Frankfurt, na
- Page 15: BIBLIOGRAFIASCHIMIDT, A. e RUSCONI,
- Page 18 and 19: OS PENSADORESuma união tão glorio
- Page 20 and 21: OS PENSADORESneutras de um jogo. O
- Page 22 and 23: OS PENSADOREStes escolas interprete
- Page 24 and 25: OS PENSADORESse estende do alto a t
- Page 26 and 27: OS PENSADORESUm átomo não é desi
- Page 28 and 29: OS PENSADORESnêncía, de explicaç
- Page 30 and 31: OS PENSADOREStituído por homens qu
- Page 32 and 33: OS PENSADORESse separam dessa mesma
- Page 34 and 35: OS PENSADORESintacto o essencial. A
- Page 36 and 37: OS PENSADOREScomo espiritual, como
- Page 38 and 39: OS PENSADORESdividido numa esfera d
- Page 40 and 41: OS PENSADORESque o conteúdo mau ne
- Page 42 and 43: OS PENSADORESà sobriedade pela qua
- Page 46 and 47: OS PENSADOREScom respeito aos objet
- Page 48 and 49: OS PENSADORESele força o autodespo
- Page 50 and 51: OS PENSADORESmal menor. Os neopagã
- Page 52 and 53: OS PENSADORESdemais. Ninguém que o
- Page 54 and 55: OS PENSADOREScia ao servo que traba
- Page 56 and 57: OS PENSADOREStrabalho. São as cond
- Page 58 and 59: OS PENSADORESpoder e impotência, c
- Page 60 and 61: OS PENSADORESciência, à cega tend
- Page 62 and 63: OS PENSADORESsobre as quais não se
- Page 65 and 66: O FETICHISMO NA MÚSICA E AREGRESS
- Page 67 and 68: ADORNOHuxley levantou em um de seus
- Page 69 and 70: ADORNOmúsica da opressão mágica
- Page 71 and 72: ADORNOtecidas, mas antes por rigoro
- Page 73 and 74: ADORNOmúsica ligeira em oposição
- Page 75 and 76: ADORNOvicioso fatal: o mais conheci
- Page 77 and 78: ADORNOcom a música na qual entram
- Page 79 and 80: ADORNOespecífico caráter fetichis
- Page 81 and 82: ADORNOo encantamento musical, perec
- Page 83 and 84: ADORNOjustificar os arranjos. No ca
- Page 85 and 86: ADORNOmais obscura da técnica do "
- Page 87 and 88: ADORNOsua destruição, visto que a
- Page 89 and 90: ADORNOmediação de maneira alguma
- Page 91 and 92: ADORNOsi mesma se tornam suas víti
- Page 93 and 94: ADORNOtração atenta, e por isso s
- Page 95 and 96:
ADORNOà consonância que substitui
- Page 97 and 98:
ADORNOconseguinte, de duas uma: ou
- Page 99 and 100:
ADORNOmodelos comerciais entrelaça
- Page 101 and 102:
ADORNOonda é tão maciça, que já
- Page 103 and 104:
ADORNOao presente abstrato- Este ef
- Page 105 and 106:
ADORNOgor, com seu conformismo. Os
- Page 107 and 108:
ADORNOCom muita facilidade toda a m
- Page 109 and 110:
A Fred Pollock,no seu septuagésimo
- Page 111 and 112:
ADORNOdiante a irrefletida identifi
- Page 113 and 114:
ADORNOda ciência, do seu caráter
- Page 115 and 116:
ADORNOcente, se bem que não mais c
- Page 117 and 118:
ADORNOempírica seria analisar os e
- Page 119 and 120:
ADORNOO não ser a dialética um m
- Page 121 and 122:
ADORNOficientes para a explicação
- Page 123 and 124:
ADORNOà sua contrainte por si mesm
- Page 125 and 126:
ADORNOvertida em clientela, sujeito
- Page 127 and 128:
ADORNOimporta se conscientemente ou
- Page 129 and 130:
ADORNOporque a sociedade recusa aos
- Page 131 and 132:
ADORNOtanto os interesses dos membr
- Page 133 and 134:
ADORNOcisava dar-se conta de que el
- Page 135 and 136:
ADORNOlidade efetiva tranqüilizado
- Page 137 and 138:
ADORNOargumentação torna-se quest
- Page 139 and 140:
ADORNOde uma maneira grandiosa que
- Page 141 and 142:
ADORNOcostumavam denominar de despr
- Page 143 and 144:
ADORNOenquanto o impulso popperiano
- Page 145 and 146:
ADORNOnistradores individuais. A ad
- Page 147 and 148:
ADORNOnum sentido aproximativo de u
- Page 149 and 150:
ADORNOglobal e impede a instauraç
- Page 151 and 152:
ADORNOpara quem o método vale ante
- Page 153 and 154:
ADORNOtos; segundo Habermas, "a dep
- Page 155 and 156:
ADORNOsocial mundana sobre o espír
- Page 157 and 158:
ADORNOde lei. Já não mais detém
- Page 159 and 160:
ADORNOconceito de problema aqui uti
- Page 161 and 162:
ADORNOcio, não encontra aptidão n
- Page 163 and 164:
ADORNOeliminado. Como modelo pode s
- Page 165 and 166:
ADORNOso de formas de reação simp
- Page 167 and 168:
ADORNOigual a todos os outros impot
- Page 169 and 170:
ADORNOda authoritarian personality
- Page 171 and 172:
ADORNOlos sentidos, mantém uma ár
- Page 173 and 174:
ADORNOPela sua renúncia a exemplos
- Page 175 and 176:
ADORNOse restringir aos dados, mas
- Page 177 and 178:
ADORNOlosofia. No que é inconfund
- Page 179 and 180:
ADORNOcom a consciência das massas
- Page 181 and 182:
ADORNOmento de tais faits sociaux c
- Page 183 and 184:
ADORNOO que posteriormente se solid
- Page 185 and 186:
ADORNOconsciência coletiva que coi
- Page 187 and 188:
ADORNOtisfaçam suas exigências, e
- Page 189 and 190:
ADORNOseu lugar nas questões da l
- Page 191:
ÍNDICEADORNO — Vida e Obra 5Cron